Texto Contexto e Intertextualidade[1]

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Texto, contexto e (inter) textualidade: uma combinao de fios enredados

Pontifcia Universidade de Catlica de Gois Departamento de Cincias Aeronuticas CAERLngua Portuguesa IProfa. Ms. Gabriela Azeredo SantosTexto, contexto e (inter)textualidade: uma combinao de fios enredadosObdlia Santana Ferraz SilvaUm galo sozinho no tece uma manh:ele precisar sempre de outros galos.De um que apanhe esse grito que elee o lance a outro; de um outro galo que apanhe o grito que um galo antes e o lance a outro; e de outros galos que com muitos outros galos se cruzem os fios de sol de seus gritos de galo, para que a manh, desde uma teia tnue, se v tecendo, entre todos os galos. E se encorpando em tela, entre todos,se erguendo tenda, onde entrem todos, se entretendendo para todos [...](MELO NETO)

No tecer no hierarquizado dos fios texto tecido de palavras e de significaes que constituem um texto textualidade , autor e leitor vo compondo as diferenas, rumo, ao desfiar da(s) trama(s), a uma articulao coerente e voluntria de enunciados e produo de sentidos, cujo fenmeno constitutivo a intertextualidade, na qual vozes se cruzam e transformam em outras vozes, tornando o texto, como lembra Barthes, uma troca que espelha muitas vozes (1992, p. 73), que falam e polemizam o/no texto, instaurando, nesse espao, o dilogo com outros dizeres. Assim, um texto uma voz que dialoga com outras tantas vozes (polifonia); e, como o grito do galo, seu eco avana e se faz presente no tempo e na histria e cultura de um povo, de uma sociedade, gerando intertextualidades.

Como intertextualidade, entendem-se os [...] modos como a produo e recepo de um texto dependem do conhecimento que se tenha de outros textos com os quais ele, de alguma forma, se relaciona (KOCH, 1998, p. 46). Isso quer dizer que todo texto possui uma certa incompletude, marcada por lacunas, as quais sero sempre preenchidas pelas inferncias dos vrios leitores, os quais se tornaro, desse modo, co-autores do texto. Este, por sua vez, povoado por uma hibridizao de vozes sociais e histricas, formando um dilogo de textos; um dilogo dos tempos, das pocas, em que coexistncia e evoluo se enredam na diversidade das linguagens.

Instaura-se, ento, um novo modo de ler que provoca fissuras na linearidade da palavra escrita, a qual sempre deslocada para um novo contexto, a cada leitura. Assim, ainda citando Barthes, Impossvel [...] atribuir enunciao uma origem, um ponto de vista. E essa impossibilidade uma das medidas que permitem apreciar o plural de um texto. Quanto mais difcil situar a origem da enunciao, mais plural o texto (1992, p. 73), que se constitui como lugar, onde diferentes vozes sociais se defrontam, se entrechocam e se entretecem, revelando diferentes pontos de vista socioculturais sobre um dado assunto.

Destarte, contrariando o tom tcnico que sempre marcou a concepo e o ensino de linguagem, nas escolas de um modo geral, prope-se considerar a dialogizao interna da palavra, que sempre perpassada pela palavra do outro: o sujeito social, histrico e ideolgico, construdo na linguagem e constitudo por muitas vozes, sempre lana sua palavra ao outro que, por sua vez, lana para outrem, fazendo que, no discurso, muitas palavras se cruzem, revelando a polifonia existente nos textos, e na vida humana, que j um intertexto, em virtude das experincias de vida que so tecidas na cotidianidade. A polifonia (BAKHTIN, 2002) caracterizada como vozes polmicas em um discurso. Assim, um texto polifnico porque apresenta muitos pontos de vista, muitas vozes, convergentes ou divergentes.

Sendo um dos princpios da textualidade, a intertextualidade, como fenmeno da relao dialgica entre textos, da presena efetiva de um texto em outro, pode ocorrer de duas formas, conforme explicita Valente (2002), com base em Jenny: externa: o autor cita outros autores, havendo, portanto, uma relao intertextual entre textos de diferente autores; interna: o autor cita a si prprio, isto , h uma relao interna entre elementos e textos do mesmo autor.

A intertextualidade externa poder existir no texto de forma explcita ou implcita: a primeira se d quando o autor faz referncia a pensamentos e reflexes de determinado(s) autor(es), citando-o(s) entre aspas. A segunda, quando o autor no utiliza diretamente a idia de outro(s) autor(es), mas a(s) parafraseia, adequando-a(s), de acordo com sua necessidade, ao corpo do seu texto. Nesse sentido, Valente observa que a intertextualidade externa implcita pode ser mais sofisticada que a explcita, se considerarmos que exige muito mais do leitor no jogo intertextual, pressupondo maior grau de informatividade, mais conhecimento de mundo: mundo partilhado (2002, p. 181).

Fica patente que a percepo da intertextualidade num determinado texto, por parte do leitor, implica um conhecimento de mundo, um universo scio-histrico muito amplo, comum ao autor e ao leitor do texto. Por no ter indicao da fonte, requer do leitor os conhecimentos necessrios para recuper-la, assim como para detectar a possvel inteno do produtor do texto ao retomar o que foi dito por outro autor. Koch e Travaglia (1999) fazem aluso aos fatores de intertextualidade. A discusso aqui se limitar a comentar brevemente tais fatores, visto no ser objetivo desse texto ampliar e aprofundar essa discusso. Assim a autora classifica os fatores intertextuais:

a) fatores relacionados a contedo: dizem respeito ao conhecimento de mundo que o leitor precisa ter para fazer inferncias sobre o texto. Como exemplo, cita as matrias jornalsticas que se reportam a textos veiculados anteriormente na imprensa falada e/ou escrita sejam textos literrios ou no-literrios , que estabelecem intertextualidade com temas ou assuntos contidos em outros textos, ou outros artigos.

b) fatores intertextuais de carter formal: podem ou no estar relacionados tipologia textual; pode ser a repetio de expresses, enunciados, trechos de outros textos, ou ento, o estilo de determinado autor; como exemplo, os textos que imitam a linguagem dos textos bblico e jurdico.

c) a intertextualidade por fatores tipolgicos: remete a tipos textuais; est ligada s estruturas e superestruturas ou aos aspectos formais de carter lingstico, prprios de cada tipo de texto; tipologias ligadas a estilos de poca.

Nessa perspectiva, entende-se que, para alm do que est dito no texto, esto as marcas enviesadas, subjacentes, de uma trama social que to possvel de dizer quanto calar sentidos, exigindo do leitor desvendar os sentidos possveis dessas marcas, que so as referncias a outros textos e contextos.

Do mesmo modo que a palavra do autor perpassada pela palavra de outros, de forma que se entrelaam e se confrontam, tambm o leitor, ao tentar desfiar a trama dessa dialogizao interna, ao tentar significar esse jogo infinito de signos lingsticos e socioculturais, estabelece a interface entre leitura e produo textual.

Disponvel em: http://www.obdalia.pro.br/cap1.htm. Acesso em: 05 jun. 2008.PAGE 2