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FEMINISMO LÉSBICO NEGRO; UM CORPO EM AÇÃO SOBRE A AÇÃO SOCIAL. Ivanildes Teixeira de sena 1

Texto um corpo em ação sobre a ação social

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FEMINISMO LÉSBICO NEGRO; UM CORPO EM AÇÃO SOBRE A AÇÃO

SOCIAL.

Ivanildes Teixeira de sena

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FEMINISMO NEGRO LÉSBICO: UM CORPO EM AÇÃO SOBRE A AÇÃO

SOCIAL.

Resumo:

A produção desse artigo, tem como propósito fomentar reflexões e visibilizar relações sociais de negras lésbicas na sociedade atual. Através da escrita de intelectuais negras e ou lésbicas, a exemplo de Audre Lorde, que através da arte literária exerce o seu ativismo feminista, Conceição Evaristo que define a sua produção ativista como escrevivência. O que de certo modo o faremos, a partir de situações empíricas na vivencia de negras lésbicas e mulheres negras em espaço de poder que se confunde com a masculinidade, a exemplo da história da Rainha Ginga, fato do período escravização européia. Esse modo de escrita se dá com a ficção e relatos de fatos do cotidiano afro descendentes, revelando feitos de resistências do cotidiano dessas mulheres negras lésbicas, denunciando a violência da negação da existência dessas mulheres, versejando novos horizontes que vem se construindo no decorrer da história que atravessa os feminismos enegrecidos por mulheres negras como bell hooks, Sueli Carneiro, Ângela Davis dentre outras que através da suas escritas e ou histórias de vida fortalecem a luta política de combate a opressão racial, heterossexual, classista. Ainda que essa “identidade” esteja no universo da subjetividade e possa aparentar uma abordagem ampla. Ainda que diretamente não se pretenda revelar quem são e onde estão algumas dessas mulheres, o próprio ato de reflexão nos recaminhos indicará em que espaço e tempo transitaram essas individuas sociais que instauram uma resistência feminista negra nesse contexto. Qual o papel político e as estratégias de combate ao racismo, machismo e lesbofobia de coletivos de negras lésbicas e como se organizam? Há transformação de idéias em práticas naturalizadoras do lugar social atribuído para mulheres negras e lésbicas? Pensar o Brasil para o enfrentamento do racismo, do sexismo e da lesbofobia nas identidades interseccionadas que marcam multiplamente essas mulheres, especialmente, negras e lésbicas, que algumas dessas mulheres ainda levam o rótulo de masculinizadas. A desnaturalização do modelo tradicional fragmentado e segmentado por um fazer política de resistência com um corpo marcado pelos traços estruturantes identitários reescrevendo a historia. Discorrendo a partir das múltiplas possibilidades dos estudos culturais sobre os signos, símbolos e a construção dos sujeitos sociais à medida que esses símbolos são consumidos como marcas identitária dos sujeitos, propostos ou impostos pelos dispositivos e agencias sociais.

Palavras – chave:Feminismo negro lésbico, mulheres, feministas afro-americanas, negras lésbicas

Apresentação

Os signos que consumimos podem nos consumir ou serem re-elaborados e constituírem

a performance de cada um enquanto criadores e/ou reprodutores de realidades.

(MOREIRA, p.123)

Se nas frestas e tocas de todos os simulacros e falsificações sobre quem de fato e de

direito podem usufruir de toda a riqueza material existente, existem um mercado

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cultural anônimo, uma ética e uma estética socialista surda, mil formas de sintaxes entre

os excluídos, formas indiciárias de intercâmbio e coexistência de todas as

temporalidades, e, pipocando em todos os lugares, formas de guerrilhas como em jogos

de videogames.(MOREIRA, P.132)

Gênero e raça um corpo em ação, marcas de existência em construção.

Enquanto as irmãs negras não gostam de ouvir isto, eu teria que dizer que todas as

mulheres negras são lésbicas, porque fomos criadas nos restos de uma sociedade

basicamente matriarcal, não importa quão oprimidos que pode ter sido pelo patriarcado.

( LORDE, p.1).

Ainda bem que faz-se desnecessário um começo de conversa sobre a trajetória de

mulheres negras, percalços, tropeços e retomadas de andanças transformando, quando

necessário, trilhas estreitas em largas avenidas, para que outras tantas mulheres e

homens negros tantos, em suas diversidades negras possam também caminhar. Preciso

apenas dar prosseguimento a uma conversa que há muito já começou ... sobre seus

caminhos, segundo os princípios da legitimidade e fortalecimento das lutas de grupos

vulnerabilizados. A exemplo desse princípio, o presente na fala contemporânea da

socióloga ativista negra Vilma Reis, “vamos chegar de galera mulherada!”.

A constituição de um coletivo não pode prescindir de um devir coletivo de cada indivíduo nem de um devir indivíduo desse mesmo coletivo. O devir coletivo de cada indivíduo significa deixar-se marcar, consumir representações como formas de valor e de perspectivas inaugurais e práticas continuadas. O devir indivíduo do coletivo significa a constituição de um corpo, uma corporação, com vontades alinhadas por princípios e traduzidas por uma sintaxe. O pro-blemático na constituição desses devires é: destruir o indivíduo em nome do coletivo e destruir o coletivo como imposição de um indivíduo.(MOREIRA, p.126).

A partir das pesquisas, intervenções elaboração das escritas e falas de intelectuais

negras feministas ativistas nos deslocamos para reescrever as linhas da história,

fortalecidas as reflexões e princípios construídos historicamente por essas intelectuais,

sobre tudo no enegrecimento do feminismo. Tais intervenções são reconhecidamente,

papel político e estratégias de combate ao racismo, machismo e lesbofobia de coletivos

de negras lésbicas em suas peculiares formas de se organizam.

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A reflexão que por hora proponho, sustenta-se em base bem sedimentada pelo fato de

dar prosseguimento a textualização de falas e corpos de mulheres negras que marcaram,

marcam e foram marcadas e marcam a estética política da existência histórica, revelados

na trajetória de mulheres, ao pensar a questão de gênero e raça vivida pelas mulheres

negras, Sueli Carneiro diz que “as mulheres negras fazem parte de um continente de

mulheres [...] que são retratadas como antimusas da sociedade brasileira, porque o

modelo estético de mulher é a mulher branca”(2003, p.50).

As mulheres negras não precisaram repetir o discurso da necessidade de romper com a prisão do lar e do direito ao trabalho, pois elas sempre trabalharam desde a escravidão, inclusive nas ruas, como as escravas de ganho. E com a Abolição confirmaram o papel de provedoras material e espiritual da comunidade afro-descendente, quando o homem negro ficou mais vulnerável às transformações sociais da época(Evaristo. 2003, p4).

Segundo o trem da história, é preciso seguir, ainda que revisando ou revisitado a

historia. Mas, fluído depois de compreender na escrita de Bouvoir que “não se nasce

mulher, torna-se”, somando ao desconstrucionismo de Derrida, continuemos consolidar

o nosso alicerces epistêmico com Neuza Santos na sua investigação em tornar-se negro,

e prioritariamente apropriando-me do que Conceição Evaristo postulou como

escrevivecia1, “Assim, a literatura, como uma agulha mágica nas mãos dos povos

colonizados, surge, retecendo fios esgarçados de um tecido antigo e roto, pano de fundo de

um passado”(EVARISTO, 2011, p54).

Ações individuais e coletivas, traçam com precisão a reconstituição das linhas de uma

velha historia, até então silenciada em vozes de corpos que gritam marcados pelo

silenciamento de um quase não dever ou poder existir. Rompendo o silencio, os grupos

anunciam em alto e bom som, o nosso silencio não foi de ausência ou covardia, mas de

resistência,

Somos uma coletiva de feministas Negras que estiveram se juntando desde 1974. Durante este tempo estivemos nos envolvendo no processo de definir e clarificar nossa política, e ao mesmo tempo estivemos fazendo trabalho político em nosso próprio grupo e em coalizão com outras organizações e movimentos progressistas”( BUNCH,1972, p.1)

Desde muito cedo eu entendi que sou negra e por isso precisava fazer algo para

combater a crueldade e perversidade social que acomete os negros e negras nas 1

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sociedades, e que isso é parte do que denomina-se racismo. Mas não sabia o que

responder e nem compreendia o motivo da pergunta para a mim recorrente desde

menina. Ainda na infância perguntavam para minha mãe, se eu era menina ou menino, e

eu fui crescendo e esse questionamento externo acompanhou-me por todas as minhas

fases de desenvolvimento físico, psicológico, social e intelectual, até o tornar-me

“mulher” e ou ouvir vez por outra, é mulher ou homem?. Muito embora, jamais tenha

mim incomodado de fato essa pergunta, porque nunca compreendi o motivo dela ser

feita, já que eu sempre me senti absolutamente confortável no meu corpo, com as

minhas ações e sempre me senti orgulhosa e prazerosa por ser do sexo feminino.

No caso de “Conceição Evaristo, a autora demonstra seu testemunho de resistência,

individual, a princípio, e coletiva, contra, pelo menos, uma tripla exclusão: a racial, a de

gênero e a de classe”(ARRUDA, 2007, p. 1).

Se muito cedo compreendi que sou negra e por isso precisava fazer algo para combater

um fenômeno social que insistia em tornar desconfortável o meu caminho da escola,

assim como a minha permanecia e o progresso nela, percebi também que ninguém

estava fazendo necessariamente algo contra mim e sim co contra uma coletividade

histórica e que as vezes quem o fazia, fazia contra si mesmo. Nem sempre compreender

o fato muda o impacto, mas o modo como lidamos com ele.

Conceição Evaristo nos diz das suas escritas, as quais ela postula de escrevivência, algo

que fala de si, por si para além do self, dos outros, para os outros e com os outros, em

uma perspectiva que vai da narrativa realista ao existencialismo da ficção. Ela entra e

sai de si como quem tem a certeza de que os caminhos dos labiritos são para serem

apreedidos. Desse modo ela nos fala da “condutas de mulheres negras brasileiras se

inscrevem também desde a escravidão, como suportes psicológicos para elas próprias,

garantindo o equilíbrio de seus companheiros, de seus filhos e de toda uma família extensiva.

As mulheres da África tornadas escravas no Brasil, assim como as suas descendentes, foram

responsáveis por muito das reinvenções das tradições africanas nas terras brasileiras.

(EVARISTO, 2009, p.4).

Após ficar longas horas imaginando estratégias para me tornar imperceptível ao sair de

casa para não ouvir, “nega do cabelo duro que não gosta de pentear”, minha cabeça

ficava dando voltas porque as pessoas cantavam para mim, mas , não fazia sentido,

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porque eu adorava estar sentada entre as pernas da minha mãe sentada no banquinho ou

na almofada confortavelmente para pentear os cabelos.

Em lugar da identidade fixa passamos a possuir uma multiplicidade transitória de

identidades, com as quais nos identificamos temporariamente, até que haja uma

necessidade de atender a mais um apelo social para que o individuo tenha a sensação de

fazer parte dessa estrutura que se compõe de aparências que se estruturam no vazio

existencial humano. Trata-se, portanto, de um processo ambíguo. A autonomia é

monitorada pela pelos dispositivos.

Bell hooks

Mas, as pessoas na rua cantavam estupidamente eu não entendia e sentia vontade chorar

porque as pensava estúpidas, pouco inteligentes e mentirosas de falar sobre o que não

sabiam, de mim e sobre mim. Muito menos imaginava o significado daquela rima que

outros gritavam “pega ela ai prá passar batom, que cor violeta, na boca e na boceta”. Eu

era apenas uma criança, com sete anos e nunca em casa eram permitidos palavrões ou

ato qualquer de desrespeito entre irmãos, irmãs e familiares em geral. Eu fui crescendo

e as sensações de desconforto social e situações de incompreensão se ampliavam

também. Eram dois mundos, onde casa cheio de amor, boas maneiras, potencialização

da intelectualidade e incentivo a projetos de vida promissores.

Enquanto minha mãe, sempre me apresentava para as pessoas, como a caçulinha sabida

mais uma professora. Na escola, professoras e professores ficavam inquietos com meu

bom desempenho escolar. Aconteciam situações tão agressivas que eu ficava apenas

com nó na garganta, mas, se quer conseguia elaborar o fato para contar em casa, como

era a orientação de praxe.

Quando a pergunta se eu era menina ou menino era feita na presença da minha mãe, ela

não marcava tempo, respondia no ato da interrogação; “é a minha caçulinha, minha

professora, não está vendo não?”, fazendo menção a aparência do sexo feminino, Óbvio

é que a essa altura, eu esta de cabeça baixa, cheia de vergonha, já que era extremamente

tímida e introspectiva.

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Na minha trajetória de vida, demorou muito mais para que eu pudesse compreender o

que as pessoas queriam de fato saber, muito embora não soubessem perguntar. Mesmo

porque, compreendo que demorou ainda mais para que se elaborasse uma resposta para

muito além de mim. O que seria em verdade uma elaboração que vejo ainda em

construção, assim como o próprio conceito de identidade, que permanecerá em

constante evolução.

Ser lésbica é uma escolhe ou uma conseqüência do não ser mulher?

Será que o deslocamento está em torno da identidade de gênero, já, que eu jamais

desejei outra coisa que nascer com o sexo feminino?

Atualmente tenho certeza da necessidade de afirmação de outras definições de gênero

para além de homem e mulher, já que atuando como arte educadora, ouvi mais de uma

vez crianças, adolescentes perguntarem, você é mulher ou homem? Mas chamou minha

atenção a idade dessas crianças, ao entrar em uma sala, onde estava a professora regente

com sua classe, na faixa etária entre quatro e cinco anos de idade, me perguntaram

depois do sonoro, booom diiiaaa! Você é homem ou mulher?. Ao ouvir tal

questionamento, achei bastante inusitado para o tamanho das crianças e

automaticamente, lhe retornei a pergunta, o que vocês acham? Lógico, que a professora

da classe percebeu o motivo da previa comunicação mostrou-se constrangida com o

questionamento das crianças, tentava silenciar a inquietação das mesmas. Mas, mostrei-

lhe que não me importunavam e chegava-me de modo natural e tranqüilo aquela

inquietação das crianças e de forma descontraída, pedi a professora que nos permitisse a

continuidade do diálogo.

Justificativa:

Eu tinha quase certeza que aquelas crianças sabiam que sou um ser do sexo feminino e

por isso aguardei suas respostas, era um menino e uma menina, elas sorriram eu com

elas insistia em perguntar, o que vocês acham crianças, que sou mulher ou homem? Eu

também vou tentar descobrir o que vocês são, se menino ou menina. As crianças me

olharam com ar de obviedade e antes que eu corresse o risco de tropeçar na definição do

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gênero delas, deram a resposta óbvia, “Acho que é mulher”, eu disse: acertou!!!... e

também disse o que elas esperavam ouvir, menino para o menino e menina para a

menina. Mas, identificamos o despreparo dos profissionais de educação, falta de

materiais didáticos para uma educação voltada para o respeito as diferenças e a

diversidade, abordando a questão da orientação sexual, por isso compreendo que a

Linha 2 de pesquisa: Letramento, Identidades e Formação de Professores é o contexto

adequado para devolvermos as educadoras a possibilidade de não se tornarem nem

assexuadas, nem objeto sexual da sociedade e por conseqüência do alunado.

Nesse mesmo dia, no turno oposto eu estaria desenvolvendo uma formação em arte

educação para as educadoras e educadores daquela instituição e falamos sobre o

ocorrido. Para a partir dali refletirmos sobre relações de gênero e diversidades nas

relações sócio culturais e construção de identidades, que inclusive fazia parte do nosso

cronograma, que apenas incrementei com a contextualização daquela comunidade. Nos

questionamos inclusive, porque tal fato que geralmente chama atenção das crianças um

pouco mais tarde, já inquietava aquelas crianças em tenrra idade. Porque aquele fato,

que houve a tentativa de ser silenciado pela professora? Será que estava relacionado

com o que constatamos com as/os educadoras\res presentes, de uma sexualidade

precocemente aflorada? Ou com uma auto repressão sexual dos adultos? O fato é que

são todos alunos em idade pré escolar, porém com a sexualidade consideravelmente

aflorada, a ponto de algumas educadoras serem de certo modo assediadas pelos

pequenos alunos.

Muito embora eu não estivesse certa de que eles tivessem acertado, porque eu também

compreendia perfeitamente o questionamento delas, não necessariamente porque eu

estivesse ou fosse masculinizada de acordo com as normas de dos padrões de

masculinidade ou feminilidade, pré-estabelecidos, mesmo porque de acordo com esses

padrões um homem jamais se vestiria do modo como eu estava vestida naquele dia.

Mas, certamente não atendia aos padrões do que aquelas crianças da periferia de

Salvador do Bairro do Rio Sena, Terezinha conhecem por padrão de mulher, ainda mais

distante estaria dos padrões pré-estabelecidos para os conceitos de homem.

Que identidade então me é reservada? Algumas professoras me chamavam de moleque

macho eu nem sabia que ela estavam me descrevendo como masculinizada. Certa vez,

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em uma oficina montagem, de teatro, em um projeto da Fundação Cultural do Estado da

Bahia, a diretora, que ministrava a oficina, ao fazer a direção da cena disse “ mas a

repórter não é pra parecer um moleque assim como você”, referindo-se ao personagem

que fiz. Aquilo me soou tão forte que ainda lembro, eu nunca tinha me pensado ou

percebido masculinizada.

Aos traze anos eu já escrevia poesias falando sobre questões raciais exaltando a estética

negra. Mas, muito embora, já aos treze anos compreendesse que o meu olhar sobre as

relações de gênero não era o mesmo olhar das outras pessoas do sexo feminino com as

quais eu convivia na época. Mais ou menos, aos vinte um, vinte e dois anos já assumia

para mim e para um pequeno grupo social de poucos amigos, o meu desejo, amor,

paixão e atração pelas mulheres, já se tornara fato concreto na minha vida social.

Muito embora nem compreendesse o significado de feminismo, a partir das minhas

atitudes sempre as pessoas me diziam, que era feminista, de tanto ser identificada com

esses termo fui buscar entende-lo, e então entendi que não estava totalmente sozinha nos

meus pensamentos e que meu modo de pensar não era nada novo.

Audre Lorde- Mas a verdadeira feminista lida a partir de uma consciência

lésbicas ou não, ela nunca dorme com mulheres? Eu realmente não posso defini-

lo em termos sexuais, embora por si só a nossa sexualidade é tão energizante

porque não apreciá-la também?.

Aos quinze anos já mim tornara liderança do movimento negro em Cruz das Almas,

interior da Bahia Por conseqüência das violências institucionalizadas e historicamente

naturalizadas. Porém, só depois dos trinta anos é que compreendi a necessidade de

interferir politicamente e socialmente em torno das questões relacionadas a orientação

sexual e identidade de gênero, muito embora, muito a questão tenha além de me

incomodado, violentado ao longo da vida escolar social mais ampla e até de certo modo,

familiar.

Audre Lorde: mulher fortemente identificada com mulheres onde o amor entre

mulheres é aberto e possível, além do físico em todos os sentidos. Há lésbicas,

Deus sabe. se você veio através de círculos de lésbicas nos anos quarenta e

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cinqüenta, em Nova York. . . que não eram feministas e não chamam a si

mesmas feministas.. .Mas que volta para a questão do que o erótico é." Há

muitas maneiras de descrever "lésbica". Parte da consciência lésbica é um

reconhecimento absoluto do erótico dentro de nossas vidas e, tomando um passo

adiante, lidando com o erótico não só em termos sexuais. . . .

Considerações teórico-metodológicas

Pesquisas que trazem o caráter de formação de proessoras/res com intersecção em raça,

gênero e sexualidade, ou apenas raça com o faz a doutora e Antropologia Social Nilma

Lino Gomes, Ultimamente, alguns pesquisadores que trabalham com formação de

professores, currículo e história da educação, (Veiga, 2000; Canen; Moreira, 2001;

Apple, 2001, entre outros) têm se aproximado mais dos estudos sobre negro e educação,

desenvolvendo pesquisas que articulam educação dos negros e memória; currículo e

multiculturalismo, formação de professores e diversidade cultural. Tal aproximação faz

parte de um movimento interessante que vem ocorrendo na produção teórica

educacional sobre relações raciais no Brasil.2 Aqueles que já estão realizando esse

movimento, aos poucos, vão descobrindo como esse campo ainda é incipiente e que,

apesar do aumento da produção teórica sobre negro e educação, nos últimos anos no

Brasil, ainda há muito trabalho a fazer.

Muito embora sem compreender que o que eu dizia desde menina, já estava posto por

tantas outras “mulheres”.

Ate que ponto os estereótipos estão ligados a internalização de valores de uma

construção social para atender as expectativas de uma classe social dominante em

relação a um individuo estigmatizado? Quando os rótulos antecedem a consciência,

corre-se grande risco que esses seres rotulados sejam afetados na sua constituição e

construção humana identitária pelos valores que lhe são atribuídos. Como demonstram

as Ana Célia da Silva, Juarez Dayrell.

Às vezes, as generalizações que ocorrem como resultado de trabalho contra o seu

reconhecimento declarado da diversidade entre lésbicas individual, mas essas

generalizações também servem para mostrar as varreduras mais ampla e confrontos no

que tem sido uma história mudando rapidamente e, muitas vezes tumultuado.

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As feministas lésbicas declararam que lésbica era qualquer mulher que dedicava todas

as suas energias a outras mulheres. O lesbianismo passou a ser considerado a quinta

essência do feminismo, porque o feminismo lésbico significava pôr as mulheres

primeiro no afetivo, no social, no político e no sexual, ação que altera até à raiz a

concepção patriarcal das relações humanas, nas quais o homem ocupa sempre o lugar

central; significava materializar um tipo de relação revolucionária que tinha como

norma a sororidade e o ginoafecto; a lésbica era também a mulher independente dos

homens, a demonstração viva de que uma mulher sem homem é um ser humano

completo (… ) ”. (p.263, itálico da autora)

A prioiori, essa necessidade premente de articular o racismo às questões

mais amplas das mulheres encontra guarida histórica, pois a “variável”

racial produziu gêneros subalternizados, tanto no que toca a uma

identidade feminina estigmatizada (das mulheres negras), como a

masculinidades subalternizadas (dos homens negros) com prestígio

inferior ao do gênero feminino do grupo racialmente dominante (das

mulheres brancas). Sueli Carneiro

Segundo o geógrafo Milton Santos, no caso brasileiro, o corpo da pessoa também se

impõe como uma marca visível e é freqüente privilegiar a aparência como condição

primeira de objetivação e de julgamento, criando uma linha demarcatória, que identifica

e separa, a despeito das pretensões de individualidade e de cidadania do outro. Então, a

própria subjetividade e a dos demais esbarram no dado ostensivo da corporeidade cuja

avaliação, no entanto, é preconceituosa.

Identificação e denuncia de práticas de invisibilidade e outras formas de violência que

neutralizam as pessoas do sexo feminino, assim com nos contempla com sua pesquisa –

CARNEIRO, Sueli, quando através das suas experiências busca identificar as formas, as

vozes silenciadas e os corpos estigmatizados de mulheres vítimas de outras formas de

opressão além do sexismo, continuaram no silêncio e na invisibilidade. As denúncias

sobre essa dimensão da problemática da mulher na sociedade brasileira, que é o silêncio

sobre outras formas de opressão que não somente o sexismo, vêm exigindo a

reelaboração do discurso e práticas políticas do feminismo. E o elemento determinante

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nessa alteração de perspectiva é o emergente movimento de mulheres negras sobre o

ideário e a prática política feminista no Brasil. CANEIRO, Sueli – 2003)

A maior violência que pode se cometer contra alguém é negar sua humanidade, sua

existência. A invisibilidade é a estratégia social amplamente utilizada para negar a

existência das pessoas que nascem com sexo feminino, transgridem as normas

preestabelecidas sócio e culturalmente, para pessoas que nascem com as genitálias de

fêmeas e não comungam com os valores socialmente construídos e atribuídos ao que

está definido com o ser mulher, de simplificar o ser mulher por aceita uma relação

sexual com o sexo oposto Ana Célia.

Judith Butler e algumas autoras vão afirmar que, mesmo ao ser mulher cabem infinitos

aspectos e formas quando considerarmos o contexto cultural, social, religioso, político,

intelectual, geográfico, étnico. Neste sentido vamos aqui pontuar o aspecto do ser

mulher para além de ser portadora de uma genitália feminina ou relacionar-se com o

sexo oposto. Cabe nesse contexto deixar de lado os infinitos aspectos das

especificidades e variações das definições de gênero, para ressaltarmos que, ao que

pretendemos averiguar, de acordo com os registros históricos, a grande afronta, ou que

causaria o despontamento social é o fato de duas pessoas do mesmo sexo estabelecerem

uma relação afetiva, permeada pelo prazer e desejo sexual

Apesar da companhia, a solidão pelo silenciamento sobre a lesbiandade pela família e

vida social é algo que tem grande possibilidade de ser equalizado com a interferência da

educação formal, mas para isso o corpo docente precisa está bem resolvido com sua

sexualidade, e livre de valores de culturais hegemônicos.

Objetivo:

O projeto de pesquisa intitulado Feminismo Lésbico Negro; Um Corpo Em Ação Sobre

a Ação Social tem como objetivo geral, compreender como se dão as relações sociais de

uma lésbica negra dentro de um espaço de educação formal. Ainda que essa

“identidade” esteja no universo da subjetividade, conhecida ou considerada dos demais

participantes desse espaço educativo, sejam esses pertencentes ao corpo docente ou

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discente. Que é justamente o que segundo, algumas autoras, pode vir a caracteriza-se

como invisibilidade que dissimula a violência sofrida pelas pessoas investigadas.

Objetivo especifico:

*Elevar a auto-estima e combater a violência de e entre lésbicas negras, que

considerando as implicações tríplices de constituição identitária de mulher, negra e

lésbica,

*Resignificar o na educação que difere dos valores da ideologia de uma sociedade com

base na heteronormatividade da cultura eurocêntrica classista, racista, sexista e

homofóbica (lesbofóbica),

*Neutralizar a naturaliza a violência que vitima esse seguimento social, prioritariamente

pela invisibilidade e desqualificação de suas potencialidades produtivas.

Metodologia:

Utilizar as nuances da arte na educação nos espaços de educação formal, para formação

e ou reflexão de educadores/ras, profissionais de educação em geral, para naturalizar o

sobre às diferenças, no que diz respeito a orientação sexual de educadoras da

instituição. Compreendendo como educadora não apenas as regentes de sala da aula,

mas todas as profissionais que atuem no espaço educativo, considerando ainda o recorte

racial para orientar a investigação.

Para desenvolver essa pesquisa metodologia explorada pela intelectual norte americana

Audre Lorde, que partindo dos fatos concretos por ela vivenciados, falando sempre do

seu lugar de lésbica negra, apesar do distanciamento necessário que cria possibilidades

de um olhar mais amplo e contraditoriamente impessoal para atender as demandas de

uma coletividade, onde segundo a antropóloga . “A insistência — na visão

antropológica — no aspecto social de comportamento leva à procura por sistemas que

vão sempre além do caso individual”. (Fonseca, Cláudia- Quando cada caso não é um

caso- 1999), podemos considerar quando “cada caso não é um caso”.

Compreendendo que necessariamente a qualidade da investigação não deve ser pautada

apenas pela quantidade e distanciamento do objeto a ser investigado.

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Refletindo a partir de fatos recorrentes envolvendo o objeto de pesquisa realizaremos

interferências a partir de linguagens da arte educação para provocar reflexões e balizar

as reações do corpo docente do ambiente escolar em relação a orientação sexual de

profissionais do sexo feminino e que se reconheçam como afro descendentes ou negras.

As estratégias utilizadas pela intelectual feminista negra, Audre Lorde, foge do

convencional quando utilizando prioritariamente o estilo poético literário, faz

intervenções político sociais e alcança núcleos que, por ser arte são, digamos que

surpreendidos pelo teor político e denunciador que quase são produzidos por essa

intelectual orgânica, como considera Gramsci. Assim como as feministas negras,

brasileiras, a exemplo de Sueli carneiro, fizeram interferências no sentido do que essas

definiram como”enegrecer o feminismo”, já que ao que se constatava, o feminismo do

qual de falava pouco tinha que contemplasse as mulheres negras.

Pretendemos desse modo realizar entrevista com as pessoas envolvidas diretamente nas

pesquisas, assim como dar continuidade à algumas entrevistas com intelectuais

orgânicas negras, que falam do lugar de lésbicas negras e são como já mencionado,

referenciais positivas que compõem o grupo das intelectuais orgânicas, como é o caso

de Valdeci Nascimento, que vem colaborando com a pesquisa em andamento. A

exemplo de que foi realizada uma entrevista que deu origem ao artigo “Mulher, Negra

Viva e Ativa” do qual sou autora, tendo como Co autora a pesquisadora Barbara Alves.

Quando os rótulos antecedem a consciência

" Quando alguém perguntou-lhe depreciativamente em uma sala cheia de

pessoas porque ela usava o cabelo tão curto, ela retrucou: "Eu vou admitir

francamente que é uma marca de nascença. Eu nasci com cabelo curto."

Anna Howard Shaw.

Quando os rótulos antecedem a consciência, o individuo fica marcado pelos estigmas

dos estereótipos e dos preconceitos socialmente construídos. Fazem parte os grilhões

que asseguram aos que estão em espaço de poder permanecer nas posições que lhe

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foram garantidas. Prendendo os rotulados aos valores que lhe foram sugeridos,

impostos, a exemplo dos espaços de subalternidade destinado para as ditas minorias,

podemos compreender minorias como mais uma linguagem simbólica para a subjugação

de seguimentos socialmente desvalorizados.

Pelo fato de agir como acreditava ser bom para mim, sem qualquer elaboração de juízos

ou valores, desde a infância, brincar de gudes, parangolé, soltar pipas, tudo o que mim

fazia feliz, sempre fui comparada aos “moleques machos”. Muito embora na minha

identidade em constante construto, algo do qual jamais tive duvida é do quanto desejo e

gosto do meu ser fêmea, ser do sexo feminino

Qual o reflexo da relação familiar de silenciamento em relação as lésbicas e suas

respectivas companheiras conjugais (afetivas) e o que pode a educação, educadores e

educadoras interferir, como quebrar esse silencio “de morte”?

Quais são os espaços políticos sociais reservados para uma pessoa do sexo feminino,

negra e que não atende aos padrões da hetoronormatividade?

Problematização.

O podemos considerar como ação social sobre um corpo considerando a condição de

gênero e raça?

Até que ponto o conceito de mulher está ligado a categoria de gênero e depende do

momento histórico e do contexto sócio cultural?

O que é ser mulher? Quem define o conceito das identidades?

Até que ponto o termo lésbica política atenderia uma definição identitária?

Em que sentido identificamos a identidade lésbica?

Ser mulher, ser lésbica o que nos remete a condição de gênero ou de sexualidade?

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Qual impacto das ações sociais sobre a formação de identidade dos sujeitos políticos

sociais?

Em que está imbricada a questão de genro, raça e sexualidade?

Há diferença em ser mulher negra ou lésbica negra?

Qual a influencia do feminismo negro sobre a identidade da mulher brasileira?

O que está reservado como vida político social para lésbicas negras?

Ate que ponto o Feminismo lésbico negro, causa impacto na historia das sexualidades?

Quando os rótulos antecedem a consciência

BILIOGRAFIA

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