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Theresa Cheung Um Anjo Chamou por Mim Testemunhos incríveis sobre o outro mundo Tradução Jorge Colaço

Theresa Cheung Um Anjo Chamou por Mim

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Theresa CheungUm Anjo Chamou por Mim

Testemunhos incríveissobre o outro mundo

TraduçãoJorge Colaço

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INTRODUÇÃO

A voz de um anjo

Os anjos ‑da ‑guarda da vida por vezes voam tão alto que ficam para além da nossa vista, mas estão sempre

a ver ‑nos cá em baixo.

Jean Paul Richter

Sempre acreditei na vida depois da morte. Acredito que os seres amados velam por nós, lá no outro mundo, e que os anjos ‑da ‑guarda, ou guias espirituais, caminham ao nosso lado ao longo da viagem que é a nossa vida. Acredito tam‑bém que os anjos ‑da ‑guarda podem manifestar a sua pre‑sença de inúmeras e miraculosas maneiras. Podem aparecer como um pássaro, uma pena, uma criança, uma brisa, um toque gentil, uma canção na rádio, uma coincidência, um sonho, um perfume misterioso, um clarão de discernimento, ou em pessoas que sejam, consciente ou inconscientemente, guiadas pelos que pertencem a uma dimensão espiritual.

A minha recordação mais antiga da formação de uma ligação intensa com a vida depois da morte data dos meus quatro ou cinco anos, quando a minha tia ‑avó Rose me disse para guardar sempre uma parte do meu lugar para o meu anjo ‑da ‑guarda. Ainda agora sorrio quando me lembro de me arrastar para a frente da cadeira, sem qualquer hesitação ou dúvida, de modo a fazer espaço para um invisível visitante.

Nos anos que se seguiram – embora tenha parado de me arrastar para a borda da cadeira sempre que me sentava – nunca deixei de acreditar que estava sempre um anjo perto de mim. A minha família estava constantemente a mudar ‑se e nunca tive oportunidade de construir amizades duradouras

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nas várias escolas por onde passei, mas nunca me senti só. Porque haveria de me sentir? Os meus anjos estavam sempre comigo.

Ao olhar para trás, não me surpreende o facto de as pala‑vras da minha tia ‑avó Rose me terem causado uma impres‑são duradoura. Apesar de ela ter morrido muito pouco tempo antes do meu décimo aniversário, recordo ‑me dela vividamente como uma senhora independente e impres‑sionante, a piscar os olhos azuis muito brilhantes. Tendo crescido na viragem do século, a decisão de Rose de votar a sua vida ao trabalho como médium profissional fez com que muitos franzissem o nariz – apesar de o espiritismo estar em grande voga na época. Era comum as sessões terem lugar nos átrios das igrejas e em casas particulares, e as capacida‑des mediúnicas de Rose tinham muita procura. Ao longo das duas Guerras Mundiais ela foi fonte de esperança, de consolo e de cura para todos os que tinham perdido entes queridos.

Eu tive o privilégio de observar a minha tia ‑avó em acção apenas numa ocasião, numa das raras vezes que acedera a fazer uma demonstração pública. Eu era muito jovem na altura e a maior parte dos pormenores do que se passou naquela reunião desvaneceu ‑se da minha memória, mas recordo ‑me de que como a atmosfera estava carregada de electricidade.

Uma das minhas recordações remanescentes dessa demonstração é a de Rose a dizer a um homem do público, que enviuvara recentemente, que o espírito da sua mulher estava de pé mesmo atrás dele, com a mão pousada no seu ombro esquerdo. O homem abanou a cabeça com cepti‑cismo. Rose disse ‑lhe que a sua mulher sempre tinha que‑rido estar de mãos dadas com ele em público, mas ele nunca a deixara, e que seria reconfortante para ambos que dessem as mãos naquele momento. O homem acenou, surpreso, em concordância, reconhecendo que estar de mãos dadas em público não tinha feito o seu género, ao longo dos vinte

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anos de casamento. Encorajado por Rose, levou suavemente a mão esquerda ao seu ombro esquerdo e acariciou os dedos invisíveis. Lembro ‑me de olhar para ele e de me espantar, como só uma criança é capaz, como era possível ter lágrimas nos olhos e, ao mesmo tempo, um sorriso nos lábios.

Rose não era o único médium da família. A minha avó, a minha mãe e o meu irmão nasceram todos com esse dom. A minha avó podia não só ver espíritos, mas também tinha a misteriosa capacidade de saber exactamente o que as pessoas estavam a pensar e sentir; um dom herdado pela minha mãe, que ganhou a vida como conselheira psíquica, e pelo meu irmão, que também trabalhava nessa área.

Obviamente, falar de pressentir, sentir e comunicar com espíritos era uma coisa comum numa família como a minha. Houve, claro, momentos embaraçosos – como aquele em que a minha mãe disse ao meu primeiro namorado para dei‑xar de ver a minha melhor amiga, sem eu saber, porque os espíritos estavam a ver (ela tinha razão, como normalmente as mães têm) –, mas houve também momentos de magia – como aquela vez em que o meu irmão disse aos nossos vizi‑nhos o sítio exacto onde se encontrava o cão ao qual tanto queriam, e que desaparecera.

Quando se tem em conta que nasci numa família de pes‑soas com capacidades psíquicas, a minha convicção inabalá‑vel de que existe algo para além da vida não é surpreendente. É, todavia, surpreendente, se se tiver em conta que, até aos meus trinta e tal anos, não tive, pessoalmente, qualquer prova da existência de anjos ou espíritos.

Não levitei no berço, nem vi mortos no campo de jogos da escola. No secundário, não lia a mente do meu tutor e, mais tarde, muitas vezes não consegui diferenciar intuição e medo. Não era capaz de falar com anjos ou pressentir a presença de espíritos, e os meus sonhos, embora surreais e coloridos, nunca foram proféticos ou particularmente ilu‑minadores. De facto, eu era completamente normal – se tal

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coisa existe. Tinha um manancial de histórias de evidência contadas por pessoas queridas e em quem confiava, mas por certo eu não tinha herdado aquele dom. Na verdade, eu era muitas vezes alvo de piadas da família e dos amigos pela minha falta de capacidade de estabelecer contacto; o meu irmão divertia ‑se imenso a dizer que eu era «quadrada».

Apesar das implicações bem ‑humoradas, nunca senti inveja ou ansiedade por não ser capaz de pressentir, ouvir ou ver espíritos e anjos como o resto da minha família. Aceitei simplesmente que encontrar um anjo é extremamente raro e que, embora os anjos não estabelecessem contacto comigo, nem me falassem ou me aparecessem, eles continuavam a olhar por mim e a guiar ‑me. E, para dizer a verdade, eu ficava secretamente aliviada por eles não se me revelarem directamente, como eu reconhecia quando tinha medo. Tal como muitas pessoas que partilham o interesse pela dimen‑são espiritual da vida, eu não precisava nem queria provar que os anjos e os espíritos existem, nem mesmo conside‑rava que eram necessárias provas. Contentava ‑me mais em observar e acreditar no mundo psíquico, que me mantinha encantada, do que ter experiências em primeira mão.

Mal sabia eu então que, aos trinta e três anos, tudo isto iria mudar!

Tomar o caminho certo

Há cerca de dez anos, quando vivia e trabalhava como jornalista em Dallas, no Texas, tive um sonho vívido. Nesse sonho, a minha mãe chamava por mim e dizia ‑me – tal como sempre fazia quando eu me sentia ansiosa ou com medo – para seguir a minha intuição e ela levar ‑me ‑ia ao caminho certo na vida. Quando acordei, fiquei a preguiçar na cama mais tempo do que o usual, revivendo mentalmente o sonho. A minha mãe tinha desaparecido havia uma década e eu tinha uma enorme saudade da sua sabedoria e do seu

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calor. Ela sempre me dissera para seguir o coração, e eu, em silêncio, prometera ‑lhe que, apesar de nessa altura estar a trabalhar em jornalismo, não desistiria do sonho de um dia seguir a carreira de autora de livros.

Nessa tarde, tinha uma entrevista programada na rádio, na qual falaria sobre uma série de artigos que estava a escre‑ver para o jornal local sobre pessoas comuns cujas vidas tinham sido tocadas pelo extraordinário. Estava atrasada e, quando saltei para o carro que iria conduzir até ao estú‑dio, logo percebi que, se queria lá chegar a horas, tinha de carregar no acelerador. O trânsito estava a fluir bem pelas estradas, até que fiquei empastelada atrás de dois camiões que rodavam, ao que parecia, a menos de 50 quilómetros à hora. Provavelmente, seguiam mais depressa do que isso, mas quando se está com pressa todos os carros à nossa frente parecem avançar lentamente. Tentei ultrapassar, mas não conseguia ter uma visão clara do trânsito que circulava em sentido contrário, pelo que tive de me resignar a uma frus‑trante marcha lenta.

Por fim, chegámos a um cruzamento e eu fiquei perante uma escolha clara. Podia virar à esquerda, ir atrás dos camiões ao longo de um caminho mais curto e chegar ao estúdio a tempo, ou podia virar à direita, livrar ‑me dos camiões, seguir por um caminho mais longo e, provavelmente, chegar demasiado tarde. Estava quase a virar à esquerda e seguir, em esforço e lentamente, atrás dos camiões, até chegar ao meu destino, quando, do nada, o sonho lampejou na minha mente. De novo, vi a minha mãe a chamar por mim e, suave‑mente, dizer ‑me para tomar o caminho certo1. Sem hesitar, e sem na verdade perceber muito bem porquê, virei à direita, e, como era de prever, cheguei tarde ao estúdio. Perdi a

1 Na língua inglesa, a palavra right pode significar certo e direito, depen‑dendo do contexto. Em português, esta duplicidade é irrecuperável. (N. do T.)

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minha entrevista na rádio. A estação não dispunha de outro espaço para o qual me pudesse marcar.

Nesse dia, enquanto regressava, senti ‑me frustrada e zangada pela oportunidade falhada e pelo tempo desperdi‑çado. Fiquei ainda mais irritada quando o trânsito abrandou, arrastando ‑se, até que parou mesmo. A irritação depressa se transformou em horror quando gradualmente me fui aproxi‑mando da cena do que, claramente, era um terrível acidente. Perto do cruzamento onde eu tinha voltado à direita, o camião atrás do qual eu tinha seguido guinara nitidamente para fora da estrada. Três ou mais carros – era difícil dizer no meio daquele caos – tinham ‑se enfeixado de encontro ao camião e uns nos outros. O carro imediatamente atrás do camião – que poderia ter sido o meu – era uma amálgama de lata, e os dois atrás desse também estavam amolgados e partidos.

Mais tarde, nesse mesmo dia, liguei a televisão para ouvir o noticiário local. Imagens do acidente passaram pelo ecrã. Um cão vadio tinha ‑se escapado para a estrada e metido entre o primeiro e o segundo camião. O condutor do segundo camião tinha travado a fundo e causado o choque em cadeia. Embora o camionista e o cão tivessem ficado ilesos, havia dois passageiros do carro que ia imediatamente atrás, um casal recém ‑casado, chamados Harry e Jane, e  um outro no carro mais atrás, um carteiro reformado chamado Sam. Todos eles tinham morrido no choque.

Ao dizer ‑me para tomar o caminho certo, a voz da minha mãe salvou ‑me a vida nesse dia. Não esperava algum dia ter provas da existência da vida depois da morte, mas, ainda assim, ela tinha ‑me sido dada, através de um sonho e de um súbito lampejo de intuição. Mas, em vez de me sentir enle‑vada pela minha experiência, nada para mim parecia fazer sentido. Tudo o que conseguia pensar era: Por que razão sou eu que estou viva e não aquelas pobres pessoas?

Emocionalmente esgotada, nessa noite caí na cama e acor‑dei às primeiras horas da manhã, após um sono inquieto.

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A minha almofada estava no chão e tinha empurrado os len‑çóis e a colcha até à beira da cama. «Que significado tem tudo isto?», dizia, a rezar. Várias emoções entrechocavam ‑se den‑tro de mim – a gratidão por estar viva, o sofrimento de saber que tinham morrido pessoas e a culpa de ainda viver e elas não. Porque tiveram elas de morrer? Porque não fui eu em vez delas? Onde estavam agora aquelas pessoas? Estariam bem? Enquanto pedia resposta a estas perguntas, voltei a adormecer.

Foi uma voz que me acordou. Ouvi uma voz, na verdade um murmúrio, a chamar por mim. A princípio pensei que era a voz da minha mãe. Sentei ‑me e olhei em redor do quarto, mas não havia ninguém. Então, ouvi a voz de novo. Não tenhas medo. O meu nome é Jane e estou bem. Está tudo bem connosco e contigo também tudo irá ficar bem.

E foi tudo. A voz desapareceu. Só a ouvi por uns segun‑dos, mas foi o tempo suficiente para afectar o resto da minha vida. Fui tomada por uma sensação de paz e conforto, uma sensação que nunca tinha sentido antes, como um cobertor quente, macio e voluptuoso, enrolado por todo o corpo.

Belisquei ‑me e doeu. Estava acordada. Tinha ouvido a voz. Tinha sido real. Levantei ‑me e acendi a luz, e uma sensação de paz, de consolo por saber que tudo ficaria bem, continuou a envolver ‑me. A minha oração tinha sido atendida. Conti‑nuava a não saber por que razão, no dia anterior, a minha vida tinha sido miraculosamente poupada, mas sabia com certeza que Jane e as outras duas pessoas que tinham morrido esta‑vam bem. E tomei a decisão de viver uma vida de que aqueles que tinham morrido em meu lugar se orgulhassem.

Simplesmente acreditar

Tal como os anjos podem aparecer sob diversas formas, cada um estabelece ligação com eles de uma forma única. Algumas pessoas são dotadas da capacidade rara de ouvir ou ver anjos, ou o espírito daqueles que se foram, mas é mais

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comum sentir um perfume, ouvir um som familiar ou sim‑plesmente sentir uma alteração de energia ou do modo de sentir. Mais comum ainda – e a minha experiência de há sete anos pode ser integrada nesta categoria – são os sonhos reveladores, as coincidências significantes, os sinais subtis, os lampejos de percepção e aqueles pequenos murmúrios, vozes, inspirações e discernimentos que ouvimos e que encorajam, consolam, guiam e nos apoiam ao longo da vida.

É difícil provar a alguém a existência de anjos, dado que a maior parte de nós não pode tocar ‑lhes ou mesmo vê ‑los, mas esta falta de provas parece ser apenas um problema para aqueles que não acreditam. Para os que, de facto, crêem, não há qualquer necessidade de provar uma coisa que eles já sabem com absoluta certeza.

Os anjos podem, por vezes, aparecer inesperadamente, em momentos de dor ou de perigo, a crentes e não ‑crentes, mas na maior parte dos casos é preciso que os anjos sai‑bam que estamos abertos ao seu auxílio, antes de falarem connosco. Simplesmente acreditar neles é, de facto, a única coisa necessária para pedir o seu amor e que guiem os nos‑sos corações e as nossas vidas. A nossa crença faz com que eles saibam a nossa vontade de que nos guiem e que façam parte das nossas vidas. A nossa crença é o que levanta o véu entre esta vida e a outra.

Guardar um lugar para o nosso anjo

Neste livro vou partilhar convosco apenas algumas das milhares de histórias verdadeiras e comoventes que recolhi, de pessoas cujas vidas tinham sido tocadas e transforma‑das por anjos, ao longo dos vinte e cinco anos em que tenho investigado e escrito artigos, livros e enciclopédias sobre espíritos, fantasmas e sobre o mundo psíquico. As histórias variam entre as que nos inspiram e as que nos confortam, pas‑sando por aquelas que nos arrepiam, mas, apesar de variarem

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imenso no conteúdo, todas elas têm uma coisa em comum: são histórias reais, baseadas em factos e não em fantasias.

De qualquer modo, gostaria de iniciar a nossa viagem conjunta pelo psiquismo por mais algumas das minhas pró‑prias experiências. Espero que, compreendendo um pouco mais sobre mim e sobre as experiências por que passei e con‑tinuo a passar todos os dias, isso vos ajude a conhecer ‑me um pouco melhor.

Sou uma mãe, casada, na casa dos quarenta, e tenho dois filhos; o meu filho tem dez anos e a minha filha oito. Embora tenham acontecido coisas espantosas na minha vida – e espero que continuem a acontecer, pois nada me fascina e encanta mais – não tenho poderes psíquicos, não sou médium nem guru espiritual. Acredito, sim, que todos nascemos, de uma forma ou de outra, com capacidades psíquicas, e que há alturas na nossa vida em que consegui‑mos usá ‑las. Muitas coisas fora do normal por que passei estiveram ligadas ao meu trabalho como escritora de temas paranormais, o que me encorajou a conhecer e a explorar o mundo do espírito, mas outras coisas simplesmente «acon‑teceram». Ao partilhar convosco, no primeiro capítulo, a minha própria viagem pelo psiquismo, espero que compreen‑ dam que qualquer pessoa, independentemente da idade ou do contexto, pode ouvir a voz de um anjo.

O resto do livro explora algumas das incríveis «histórias de anjos» com que deparei ao longo dos anos. Estou imensamente grata a todas aquelas pessoas que permitiram que as entrevis‑tasse e me deram autorização para partilhar as suas experiên‑cias na íntegra. Algumas enviaram ‑me as suas próprias versões das experiências, mas, na maior parte dos casos, fui eu que escrevi as histórias a partir do que me contaram ou escreve‑ram. Todos os que deram o seu contributo sensibilizaram ‑me profundamente pela sua verdade e honestidade.

Algumas das pessoas com quem falei ficaram extremamente aliviadas por me contar as suas histórias, algumas fizeram ‑no

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pela primeira vez. Queriam que as incluísse para mostrar a outras pessoas que os anjos estão sempre connosco, mesmo que não os possamos ver. Apesar de os nomes, datas e deta‑lhes pessoais terem sido alterados, a pedido de quantos assim o quiseram, estes relatos verdadeiros de pessoas comuns ape‑nas mostram algumas das muito diferentes maneiras de como aqueles que morreram podem regressar ao nosso mundo. No final, todas são histórias celestiais com mensagens simples de apoio, esperança, consolo e amor, transmitidas através de encontros angélicos e palavras angélicas que transformam esta vida e nos dão uma visão promissora da próxima.

Na medida em que os encontros com anjos e espíritos podem ser momentaneamente inquietantes, particular‑mente para aqueles que não tinham consciência prévia da sua existência ou não estavam convencidos dela, posso assegurar ‑vos que, quanto mais fui aprendendo, e continuo a aprender, sobre o mundo do espírito, mais reconfortantes, maravilhosos e fascinantes eles se tornam – e hão ‑de perce‑ber que o mesmo é também verdade para vós.

Guardem, então, um lugar para o vosso anjo e preparem‑‑se para se sentir inspirados e espantados – como não pode deixar de ser – por histórias reais de gente que leva, aparen‑temente, uma vida normal, mas que foi reconfortada, inspi‑rada e transformada pela voz de um anjo. Trabalhar neste livro abriu ‑me os olhos para novos caminhos e novas pos‑sibilidades e estabeleceu uma renovada ligação ao reino do espírito. Faço votos sinceros para que a sua leitura sirva de catalisador da vossa própria crença, ao demonstrar que os milagres acontecem e que pessoas comuns, como eu e vós, podem acordar um dia e ouvirem um anjo chamá ‑las.

Que os anjos descansem à vossa porta,Que vós ouçais as suas vozes a cantar.Que vós possais sentir os cuidados do seu amor por vós,Que vós ouçais os seus sinos de paz tocar.

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Que os anjos sempre cuidem de vós,E não vos deixem tropeçar e cair.Que eles vos sustenham em suas asas de anjos,Que vos mantenham bem erguidos.Que eles vos sussurrem ao ouvido palavras sábias,Que eles vos alcancem quando vós precisardes,Que eles retirem de vós qualquer sombra de medo,Que vos guardem de sentir ganância.Que eles vos encham com a sua presença,Que eles vos mostrem o amor oculto,Que eles estejam sempre ao vosso ladoE vos tornem sempre mais corajosos.Que eles vos ensinem o que vós precisardes de saberSobre esta vida e a outra vida.Que vos encham sempre com o seu amorE vos dêem o dom do riso.

Anónimo

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CAPÍTULO 1

O nascimento de um anjo

A morte não é mais do que passar de uma sala para outra sala.

Mas, sabe, para mim existe uma diferença.É que nessa outra sala eu serei capaz de ver.

Helen Keller (cega e surda desde a infância)

– Quero epidural! – gritei asperamente. – Preciso de epi‑dural e preciso dela agora.

Estava a ser empurrada para a sala de partos e a única coisa em que conseguia pensar era que me dessem a epi‑dural. Tinham ‑ma dado quando o meu filho nasceu. A sua entrada neste mundo tinha sido abençoadamente calma e pacífica. Enquanto estive em «trabalho de parto» dele, tinha até conseguido dormir algumas horas. Depois, tivera cerca de uma hora de tranquilidade para me preparar mental‑mente, antes que ele estivesse pronto para nascer. Não houve dor, nem gritos; tinha sido um parto perfeito.

As coisas não poderiam ter sido mais diferentes da segunda vez! A minha filha decidira fazer a sua entrada em grande neste mundo uns bons dez dias antes do tempo. Estava cheia de pressa. Quando cheguei ao hospital não houve tempo para a epidural, nem para qualquer outra coisa. Isso não me impediu de a pedir aos gritos, até a voz ficar rouca. A dor não era deste mundo.

– Inspire profundamente. Tente ficar calma – ordenou o médico. Quis matá ‑lo! O meu marido segurou na minha mão. Disse ‑me para respirar profundamente. Quis matá‑‑lo também! O meu limite de dor sempre tinha sido muito,

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muito baixo. Os dentistas e as injecções aterrorizam ‑me, e desmaio à vista do meu próprio sangue. Dar à luz sem nada para as dores era transformar os meus pesadelos em reali‑dade. Quanto mais tentava manter ‑me calma e respirar pro‑fundamente mais em pânico e tensa ficava.

– Está a tornar as coisas mais difíceis do que o necessário – ouvi o meu médico dizer. Ou foi a minha mãe?

Subitamente, tinha de novo cinco anos. A minha mãe aconchegava ‑me na cama. Acordara a gritar a meio da noite. Estava convencida de que havia alguém no meu quarto. Apontei para o escuro para fazer com que ela olhasse. Ela sorriu e afastou os cabelos da minha cara. Disse ‑me que a presença que eu sentira no quarto era o meu anjo ‑da‑‑guarda a olhar por mim. Não havia nada de que ter medo. Deu ‑me um beijo e eu deixei de ter medo.

Abri os olhos. Estava de novo na sala de parto. A minha mãe tinha morrido há anos, mas agora, com os olhos aber‑tos, ainda podia ouvir a sua voz calma e reconfortante a falar com clareza. Podia sentir o calor da sua respiração. Disse ‑me para parar de lutar e enfrentar a situação serena‑mente. Podia senti ‑la a segurar a minha mão. Dei atenção ao que ela estava a sussurrar e passei a respirar profunda‑mente. Comecei a acalmar ‑me e, em vez de lutar com a dor, distanciei ‑me dela. Em breve, a dor desvaneceu ‑se gradual‑mente até desaparecer. Senti ‑me leve e liberta. A minha linda filha nasceu cerca de dois minutos depois. Não senti qualquer dor. O seu nascimento tinha sido tão feliz e calmo como o do meu lindo filho – mas desta vez tinha sido a voz da minha mãe em espírito, e não drogas, o que me ajudara a suportar a dor.

Em retrospectiva, vejo que ao longo da minha vida tinha tido muitas experiências semelhantes, que podem ser descri‑tas como fora do normal; ou mesmo espantosas. Porém, ape‑nas recentemente fui capaz de olhar para trás e reconhecê ‑las por aquilo que foram.

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Apesar de a minha mãe ser conselheira psíquica e a minha avó médium, não passei o tempo todo, durante a infância, a ir a sessões ou a ler cartas de tarô. Passei uma grande parte dele a fazer coisas comuns, que todas as crianças fazem. O meu pai não podia trabalhar porque era incapacitado, e nós dependía‑mos do que a minha mãe ganhava, que era muito pouco e irregular. O dinheiro era sempre à justa, mas de algum modo isso parecia não ter importância. Nunca demos grande valor às coisas materiais e sempre arranjámos maneira de ter o sufi‑ciente para comer e um tecto sobre as nossas cabeças. Não nos podíamos dar ao luxo de ter férias, mas as viagens à praia e ao parque sempre fizeram parte da nossa rotina.

Há uma visita ao parque de que me lembro muito nitida‑mente. Eu tinha cerca de seis anos nessa altura. Vejo ‑me a brincar alegremente com o meu irmão na prancha de arre‑‑burrinho, enquanto a minha mãe lia um livro sentada num banco ali perto. Estava um dia lindo, o primeiro das férias de Verão. De repente, comecei a sentir ‑me muito maldisposta. Saí da prancha e a má disposição passou, mas quando para lá voltei comecei a sentir ‑me mal outra vez. Eu adorava aquela prancha a subir e a descer e nunca antes me tinha sentido mal ao andar nela. Teimosamente, tentei continuar a andar. A sensação piorou. Quase podia sentir o vómito na garganta e o seu sabor na boca. Tive de admitir que não conseguia mais e decidi sair e ir para os baloiços.

Uma miúda e a sua irmã mais velha guincharam de con‑tentamento quando eu e o meu irmão saímos. Olhei ‑as com inveja, do baloiço, enquanto subiam e desciam. Balancei ‑me cada vez mais alto, tentando convencer ‑me a mim própria de que estava a divertir ‑me mais. Não estava. Não voltei a sentir ‑me mal e simpatizei com a ideia de pedir para regres‑sar à prancha. Era a minha brincadeira favorita no parque infantil.

Parei de me balançar tão energicamente para que facil‑mente pudesse sair, mas à medida que o fazia percebi que a

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miúda mais pequena que andava na prancha já não estava a rir, mas sim a chorar. A irmã não deu por isso e subia cada vez mais alto. Quanto mais a miúda pequena chorava, com mais força a irmã saltava. Só parou quando a irmã mais nova começou a vomitar. O pai das duas raparigas aproximou ‑se a correr para ajudar a filha que vomitava, mas ela estava agora engasgada no seu próprio vómito. Gritou a pedir ajuda, e a sua mulher ou namorada correu para uma cabina telefó‑nica (lembrem ‑se de que isto era no tempo em que não havia telemóveis). A miúda perdeu os sentidos quando a ambulân‑cia chegou, e foi levada de emergência para o hospital.

Soubemos mais tarde que se tinha recomposto por com‑pleto. Eu estava excitada não apenas por ela, mas, de uma forma bastante egoísta, também por mim. Nada tinha con‑tado à minha mãe ou ao meu irmão sobre a minha má disposição na prancha. Estava com receio de que ficassem zangados comigo por não ter avisado a miúda, se alguma coisa terrível lhe tivesse acontecido.

Alertar e aconselhar pessoas era algo para que a minha mãe era particularmente dotada. Ela herdara o dom da aten‑ção psíquica e era uma conselheira/astróloga muito rigorosa. Lia o futuro das pessoas e não tinha receio de lhes dar conse‑lhos, mesmo que não fossem os conselhos que elas queriam ouvir. Uma vez disse a uma quase noiva que talvez fosse boa ideia adiar o casamento. Quando ela perguntou a razão, a minha mãe não foi capaz de lhe dar pormenores, mas estava convencida de que seria uma má opção. A mulher ficou furiosa e disse que não mais iria consultar a minha mãe. O casamento foi para a frente, tal como planeado. Infeliz‑mente, foi denunciado como fraude, quatro meses depois, quando a noiva descobriu que o marido já era casado.

Desejei ser capaz de saber e dizer coisas inteligentes, como a minha mãe. Queria ser capaz de ajudar ou de avisar as pes‑soas como ela fazia. Houve situações estranhas e difíceis, como a da infeliz noiva acima referida, mas a maioria das pessoas

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que ia consultar a minha mãe ficava extremamente agradecida pela sua visão e orientação. Tentando imitar a mãe, li todos os livros a que pude deitar a mão, de Dion Fortune a Colin Wilson. Aos catorze anos era quase uma especialista nas artes mentais. As cartas de tarô e a numerologia eram as minhas áreas de especialidade. Fiquei tão boa a fazer leituras imedia‑tas, apenas com o nome da pessoa como referência e um bara‑lho de cartas de tarô, que a minha mãe conseguiu arranjar ‑me um lugar para o fazer numa feira local. Li cartas a umas vinte pessoas nesse dia, mas depois disso senti ‑me sem préstimo. Recusei ‑me a ficar com o dinheiro que tinha ganho. O que eu tinha era boa memória e conhecimentos adquiridos em livros. As leituras que fizera nesse dia foram baseadas no meu bom conhecimento da teoria da numerologia e da forma de deitar cartas. Não tivera quaisquer lampejos de intuição que fossem apenas meus. Não tinha herdado o dom. Não tinha capaci‑dades psíquicas… ainda!

Falei à minha mãe das minhas preocupações e ela não se importou que eu parasse de ler cartas profissionalmente. Disse ‑me que eu precisava de tempo para crescer e descobrir os meus verdadeiros talentos. Senti vivamente que a tinha desapontado e deixado ficar mal por não conseguir ver espí‑ritos e o meu irmão conseguir. Estava determinada a alterar isso.

Inscrevi ‑me numa porção de cursos de desenvolvimento psíquico. Em breve, tornei ‑me uma especialista nas técnicas de como alimentar a intuição e em exercícios para desen‑volver poderes psíquicos. A minha mãe ofereceu ‑se repeti‑damente para me ajudar, mas disse ‑lhe que aquilo era uma coisa que tinha de fazer sozinha. Fiz progressos, mas não tantos como gostaria. O meu tutor no Colégio de Estudos Psíquicos disse ‑me uma vez que pensava que eu estava a for‑çar as coisas. O que eu precisava de fazer era relaxar. Não concordei com ele. A minha avó sempre me dissera que qualquer coisa era possível se se trabalhasse arduamente e

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se quisesse essa coisa mesmo muito. Além disso, eu era uma adolescente rígida e teimosa; relaxar era uma coisa que não conseguia realmente fazer.

Eu queria desesperadamente ver, ouvir e sentir anjos, mas, após alguns anos, era como se batesse com a cabeça numa parede. Assim, não ia a lado nenhum. Frustrada pela falta de progressos e desiludida comigo própria, decidi que talvez fosse tempo de concentrar energias noutra coisa. Era tempo de assentar os pés na terra, arranjar alguma qualifi‑cação e uma carreira.

Tinha agora dezassete anos. Voltar ao ensino básico estava fora de questão, dado que os resultados do exame tinham sido desanimadores, e matriculei ‑me num curso por correspon‑dência para fazer os exames do nível mais avançado. Durante os dois anos seguintes estudei sozinha, em casa. Muita gente, em particular os professores da escola onde tinha andado e a respectiva directora, julgou que era uma ideia maluca. Mas o que eles não tiveram em conta foi a minha disciplina e força de vontade. Ia provar ‑lhes que estavam todos errados. E foi o que fiz.

As pessoas têm o costume de dizer que a escola foi o melhor tempo da vida delas, mas decerto para mim não foi. Odiava a escola. Só quando comecei a estudar por minha conta, livre da distracção dos apontamentos, da política a seguir no recreio e de uma abordagem educativa cujo modelo único deveria servir a todos por igual, é que despertou em mim a paixão de aprender. Não recomendaria este percurso a toda a gente, mas para mim funcionou na perfeição.

Para contribuir para as despesas da casa enquanto estu‑dava, o único trabalho que consegui arranjar foi um lugar a meio tempo como auxiliar do lar de terceira ‑idade local, à noite e aos fins ‑de ‑semana. Pode pensar ‑se que é uma opção estranha para uma adolescente, mas não me importei nada. Por mais doentes, frágeis, confusos ou inseguros que os ido‑sos fossem, sempre vi luz nos seus olhos. Na minha mente,

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conseguia ver as crianças que já tinham sido, cheios de ener‑gia e de risos.

Qualquer pessoa que já tenha trabalhado num lar de terceira ‑idade saberá que a morte faz parte da rotina. Isso não me perturbava. A primeira vez que vi um corpo morto senti uma profunda sensação de paz. Também me senti estranhamente alheia ao corpo, na medida em que se via claramente que o espírito há muito partira. O corpo, aban‑donado, fez ‑me lembrar a roupa que já não se usa. Descobri também que, normalmente, conseguia dizer qual o residente que estava perto do passamento. Não tinha nada que ver com a sua saúde física. Um dia ou dois antes de morrerem, a luz dos seus olhos começava a desvanecer ‑se. A criança que eu, mentalmente, imaginava terem sido estava a dizer adeus.

Ver pessoas tão perto do fim das suas vidas encorajou ‑me a tirar partido da minha própria vida. Estudei arduamente e surpreendi toda a gente, incluindo eu própria, quando aca‑bei por entrar na Universidade de Cambridge para cursar Inglês e Teologia. Julgo que agradou à universidade o facto de eu não ter seguido o mesmo percurso certinho de toda a gente. (Oh, o prazer de escrever para a minha velha escola e mostrar que os cépticos se tinham enganado!) O que eu não previra, quando por fim lá cheguei, foi quão difícil era encaixar num lugar de tanta tradição, quando se vem de uma família de rendimentos baixos – e de uma família alternativa quanto aos meios da sua obtenção.

Passadas duas semanas do primeiro período já tinha feito as malas, pronta para ir para casa. Ia dizer à minha família que não regressaria. Não estava para isso. Simplesmente não encaixava. Aquele não era o meu campeonato. Não tinha nem a roupa, nem a confiança, nem o dinheiro. Nessa época, tive até a sorte de me ser atribuída uma bolsa, mas nem esse alívio financeiro foi suficiente para fazer com que quisesse ficar. Foi nesse período da minha vida que os sonhos come‑çaram a falar comigo, em alto e bom som. Na noite anterior a

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ter voltado para casa tive um sonho, no qual ouvi um coro de anjos a cantar. As suas vozes, e a canção que cantavam, eram tão penetrantes e encantadoras que permaneceram comigo até acordar, na manhã seguinte. Ainda conseguia ouvir cada uma das notas na minha cabeça.

Depois do pequeno ‑almoço fui à caixa do correio reco‑lher a correspondência. Tinha um comboio para apanhar e estava a fazer ‑se tarde, pelo que atafulhei tudo dentro da mala e tomei um autocarro para a estação. Não estava nin‑guém quando cheguei a casa. Por razões que não sei expli‑car, não tinha querido telefonar com antecedência a avisar a minha mãe que ia. Fui para o quarto desfazer as malas.

Um envelope castanho caiu da mala, juntamente com o resto da correspondência. Abri o envelope e encontrei uma gravação lá dentro. Era uma colectânea de clássicos de música coral pelo coro do King’s College, Cambridge. Não havia qualquer nota ou explicação, apenas a fita gravada. Intrigada, decidi pô ‑la a tocar e, assim que a primeira faixa começou, reconheci a canção que tinha ouvido no sonho. O canto soou ‑me mais terreno do que a versão que ouvira no sonho, mas a peça era praticamente igual. Chamava ‑se Miserere Mei, Deus. (Quem nunca ouviu esta peça coral, está a perder uma coisa muito especial. É incrivelmente inspira‑dora e exaltante.)

Compreendi então que os anjos tinham enviado aquele sonho para me recordar de que me fora proporcionada uma magnífica oportunidade para estudar. Não devia deixar que a baixa auto ‑estima ou o medo de fracassar destruíssem as minhas oportunidades. Voltei a fazer as malas e fiz a viagem de regresso nesse mesmo dia.

Levou ‑me um período inteiro, ou mesmo dois, a encon‑trar terreno firme onde pisar, mas aguentei ‑me, mesmo quando a minha crença na vida depois da morte foi seria‑mente posta em causa por académicos e homens e mulheres de saber. Apesar de tudo, acabei por começar a sentir ‑me

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como se pertencesse ali, e os anos seguintes da minha vida formam uma mancha indistinta de estudo e mais estudo – mais umas festas excêntricas, debates, brincadeiras e uns copos. Mas acabei a minha licenciatura e ela ajudou a que me visse no meu primeiro emprego como assistente editorial na Mandala, uma chancela dos livros Unwin Hyman, hoje propriedade da HarperCollins; por feliz coincidência os edi‑tores deste livro! Estava no paraíso. O meu trabalho consistia em trabalhar em livros sobre todas as coisas que me fasci‑navam: new age, astrologia e espiritualidade. Conheci um punhado de autores fascinantes, fui a inúmeros workshops, seminários e conferências, e aprendi bastante. Porém, estive quase a não conseguir este emprego, mas isso foi uma outra coincidência enviada pelos céus.

Quando deixei a universidade concorri a diversos empre‑gos, mas não consegui nenhum deles. Cada uma das rejei‑ções abalou ‑me imensamente. Eu adorava livros e sabia que queria trabalhar na indústria da edição, mas as portas pareciam não estar a abrir ‑se. Ficava muda nas entrevistas; a minha falta de confiança estava realmente a virar ‑se con‑tra mim. Também não era lá muito boa em pormenores e não tinha alguns requisitos editoriais básicos. Isso hoje faz‑‑me rir, quando passo dias a teclar a toda a velocidade, mas na altura era uma verdadeira tristeza; ficava perturbada até quando me pediam para dactilografar uma carta elementar.

Uma segunda ‑feira à tarde, estava eu a regressar a casa vinda de Londres, após mais uma entrevista infrutífera. Havia grande atraso nos comboios – nada se alterou muito, nada! De qualquer modo, o meu comboio foi cancelado e durante uma hora não haveria outro. Vagueei durante algum tempo pela estação de Waterloo, sentindo ‑me um pouco perdida. Nessa época, as estações não eram o sítio ideal para se ficar à espera, mas descobri um banco frio onde me sentar.

Em breve, dois homens vieram sentar ‑se junto de mim com uma dose de fish and chips que cheirava deliciosamente.

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Cheguei ‑me para a ponta do banco, tentando ignorar o meu estômago às voltas, e comecei a ler o jornal. Os homens eram conversadores bastante barulhentos, e não tive outro remé‑dio senão ficar a saber que eram alunos do London College of Publishing and Printing. Pareceu ‑me que eles estavam, tal como eu, no processo de concorrer a um emprego na indús‑tria editorial. Um deles estava entusiasmado com uma entre‑vista, que o seu tutor lhe arranjara para a semana seguinte, na casa Unwin Hyman. Afirmou que o único senão era que tinha de fingir que estava a par dessas coisas psíquicas, mas que ia ler alguns livros nos próximos dias para ficar com algumas pistas. Fiquei de ouvidos alerta e, mentalmente, tomei nota daquilo. No dia seguinte, telefonei para a editora e pedi os papéis para concorrer. Não é preciso dizer que con‑segui o emprego porque não precisava de fingir que estava a par «dessas coisas psíquicas».

Se o comboio não estivesse atrasado nesse dia, poderia nunca ter conseguido este emprego ideal para mim. Não se esqueçam de que isto foi nos anos oitenta e que os livros sobre o mundo psíquico e as profissões à sua volta eram de longe mais raros do que hoje são. Se eu tivesse conseguido qualquer dos outros empregos a que concorri no mundo da edição, a coisa não teria funcionado porque os temas não me teriam entusiasmado. Na altura, tomei tudo apenas como coincidência, mas, retrospectivamente, sinto que estava a ser guiada na direcção certa.

Foi quando estava a trabalhar como assistente editorial que descobri o que realmente queria fazer da minha vida. Queria escrever o género de livros nos quais estava a traba‑lhar. Adorava escrever sínteses nas contracapas dos livros, e os autores ficavam sempre muito agradados com o que eu fazia. Matriculei ‑me num curso nocturno de escrita e jor‑nalismo e comecei a arranjar uma série regular de pequenas colaborações em revistas da mente, do corpo, do espírito e da vida saudável.

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Depois de diversas reviravoltas do destino, acabei por ir viver para Dallas, no Texas. Ainda não tinha começado a escrever livros, mas tinha iniciado o processo, trabalhando em jornalismo. Por essa altura, também já tinha um casa‑mento feliz e um bebé a complicar ‑me deliciosamente a vida.

Estava a viver e a trabalhar em Dallas quando se abriu uma passagem psíquica – ouvi a minha mãe a falar real‑mente comigo em sonhos. Como qualquer pessoa que tenha perdido um ente querido sabe, uma coisa é ajudar outras pessoas a lidar com a perda de um ser amado e outra coisa bem diferente quando se é essa pessoa. Tenho agora qua‑renta e três anos. Já tinha tido o coração dilacerado e partido ossos, já tinha perdido amigos muito chegados, mas nada se compara à dor que senti quando a minha mãe morreu, após um ano de luta com um cancro do cólon, que se estendera ao fígado.

Tinha vinte e cinco anos quando ela morreu, e a dor foi profunda, dilacerante e insuportável. Teria dado qualquer coisa por um sinal que me indicasse que ela continuava comigo, a tomar conta de mim, mas nada aconteceu. Amal‑diçoei a minha incapacidade de a ver, de a ouvir e de lhe tocar, ou de estabelecer um qualquer contacto com ela. Senti ‑me um fracasso. O meu irmão tentou minorar o meu sofrimento, dizendo ‑me que sentia a presença dela constan‑temente à nossa volta, mas isso não foi uma grande ajuda. Porque não estabeleceria ela contacto comigo? Porque não falariam os anjos comigo?

Fiquei muito desiludida. Pus em causa as minhas convic‑ções sobre a vida depois da morte. Desafiei a minha mãe a provar ‑me que não se tinha ido, mas apenas obtive silêncio como resposta. O que eu não percebi, nos anos que se segui‑ram, foi que ela estava, durante todo o tempo, a enviar ‑me dádivas da outra vida, só que eu não estava ainda preparada para as ver. O meu radar estava sintonizado para uma altura demasiado baixa, e pus em causa o que deveria ter sabido por

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instinto. A minha mãe estava constantemente a sussurrar‑‑me ao ouvido. Simplesmente, eu não estava a ouvir.

Ao longo de vários anos, após ela ter morrido, eu vas‑culhava a casa, sem nenhuma razão aparente, tentando desesperadamente encontrar uma fotografia dela. Ficava aterrada com a ideia de me ter esquecido de como ela era. Precisava de me lembrar. Então, à noite, ela visitava ‑me em sonhos. Parecia tão real. Andava, falava e ria. Não falava directamente comigo, mas tinha aquele jeito carinhoso que eu adorava. Também parecia de saúde, feliz e inteira. Nas últimas semanas de vida, quando lutava contra o cancro, per‑dera o brilho, mas nos meus sonhos estava de novo vibrante.

Mas sonhos não eram o suficiente para mim! Queria que a minha mãe falasse comigo, que me aparecesse, que me desse conselhos como sempre tinha feito. Queria que ela me mos‑trasse que existia vida depois da morte. Na altura, não reco‑nheci o impacte deles na minha vida, mas os sonhos que tinha com a minha mãe eram uma grande dádiva enviada da outra vida. Eram tão regulares e frequentes que, sem eu ter cons‑ciência disso, deram ‑me a força de que eu precisava para levar a vida para a frente. Os sonhos, juntamente com as coincidên‑cias, são talvez a forma mais fácil de os espíritos comunicarem com aqueles que estão ainda no mundo físico. Também consti‑tuem a forma de comunicação que provavelmente causa menos alarme ou medo no sonhador. O meu feitio nervoso deve ter sido o facto que levou a minha mãe a escolher os sonhos como primeira forma de permanecer em contacto comigo.

Não foi senão oito anos depois de ela ter morrido, quando já tinha crescido e acalmado mais um pouco, que ela entrou realmente em contacto comigo através de uma visão nocturna. Não foi como os sonhos que tivera com ela anteriormente, em que ela parecia não ter consciência de mim. Neste sonho eu não me limitava a testemunhar a sua presença, ela estava consciente da minha. Estava a interagir comigo. Estava a falar comigo. A história está toda na introdução, mas, recapitulando

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brevemente, ela disse ‑me para tomar a direcção certa e, por ter seguido o seu conselho no dia seguinte, a minha vida foi salva. Este sonho desbloqueou uma porta psíquica e, alguns meses depois, quando ouvi a voz da minha mãe durante o parto da minha filha, essa porta já estava escancarada. Desta vez ela não estava a falar comigo em sonhos, estava a falar comigo quando eu estava completamente consciente. Não a conseguia ver, mas podia senti ‑la e ouvi ‑la tão claramente como se ela estivesse ali ao meu lado.

«Estás a tornar as coisas piores do que elas precisam de ser», ouvi a minha mãe dizer, quando entrei em trabalho de parto. «Não deixes que o medo do desconhecido te dê ainda dores maiores. Tu consegues fazer isto. Eu sei que consegues.»

As palavras da minha mãe ficaram às voltas na minha cabeça, durante os primeiros dias de vida da minha filha. Tinha recebido um sinal claro da outra vida para que acor‑dasse. Tornou ‑se, subitamente, claro para mim que, no pas‑sado, fora inundada por dádivas vindas da outra vida através de sonhos, intuições e coincidências, mas não tinha sido capaz de as reconhecer como tal.

Durante todos esses anos em que tinha julgado que não possuía capacidades psíquicas, na verdade possuía ‑as – sim‑plesmente não as compreendera, nem aceitara. Tivera medo de não encaixar. Tivera medo de ser chamada esquisita. Tivera medo de não viver à altura da minha mãe. Tivera medo do que os meus sonhos, as minhas súbitas intuições e os meus sentimentos me diriam sobre mim própria e sobre os outros. Tivera medo do meu próprio poder. Até ao momento de reconhecer que o medo me estava a prender, não pudera compreender ou interpretar aqueles sentimen‑tos. Precisava de relaxar. Precisava de parar de tentar senti‑‑los tão à força. Precisava de dar ouvidos à minha intuição, mais do que tentar explicá ‑la.

No passado, convenci ‑me de que a razão pela qual as pessoas, mesmo aquelas que eu não conhecia muito bem, se

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abriam frequentemente comigo, era devido ao meu ar amigá‑vel e nada ameaçador. Mas, agora, podia claramente ver que tenho o dom natural da empatia. Faltava ‑me, simplesmente, confiança nele. A empatia é o primeiro passo para o despertar psíquico. É a capacidade de imaginar como as coisas são ou parecem às outras pessoas. Já imaginaram como é que seria se fossem outra pessoa? Alguma vez sentiram sentimentos de alegria, perda, tristeza ou entusiasmo antes de a pessoa que os está a sentir vos falar sobre eles? Isso é a empatia em acção.

A empatia é um dom que toda a gente – toda a gente – tem. Até mesmo os cientistas concordam em que todos nascemos com a capacidade de ler a mente. Pensem nisto. Quer tenha‑mos consciência disso ou não, sem a capacidade de empatia com o pensamento e o sentimento dos outros, não consegui‑ríamos lidar com a mais simples das situações sociais – nem verdadeira intimidade com outros. Porém, para desbloquear o potencial de empatia oculto, precisamos de confiar nele. A minha falta de autoconfiança foi a barreira ou o bloqueio do meu desenvolvimento psíquico, durante todos estes anos. Como toda a gente, eu possuía o dom. Apenas precisava de acreditar nele e de continuar com ele.

Imagino, muitas vezes, quantas pessoas existem por aí como eu, que querem desesperadamente ver e ouvir um anjo, e se constrangem de o fazer. Mas, quando as pessoas tentam fazê ‑lo de forma forçada é porque se colocam num lugar de medo. Pode causar ansiedade pensar que talvez estejamos a fazer alguma coisa errada ou que os anjos não conseguem ouvir ‑nos, ou qualquer outra coisa centrada no nosso ego. O ego é inteiramente centrado no medo e, até conseguirmos vencê ‑lo, o desenvolvimento psíquico é bloqueado.

Após aquela brecha na consciência, nos meses e anos que se seguiram ao nascimento da minha filha, tudo mudou para melhor. Deixei de ter medo das minhas experiências. Em vez disso, comecei a relaxar e a aceitá ‑las plenamente. E, assim que deixei de duvidar das minhas capacidades e de

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me esforçar por estabelecer contacto com os anjos, na minha vida as coisas começaram a encaixar ‑se no lugar certo. Não tinha de lutar mais. Não tinha de andar atrás da carreira de autora com que sonhara; ela encontrou ‑me. Não tinha de andar atrás dos anjos; eles encontraram ‑me.

Havia regressado ao Reino Unido, nessa altura, e o meu sonho de transitar do jornalismo para a autoria de livros realizou ‑se. Escutei a minha voz íntima, procurei as minhas oportunidades e entrei em contacto com gente notável. Os meus primeiros livros foram sobre saúde, dietas e bem‑‑estar, e, quando alguns deles se tornaram best ‑sellers, eu estava finalmente em condições de me concentrar naquilo em que realmente queria trabalhar: livros sobre o mundo do espírito.

Durante os cerca de dez anos em que me tenho dedi‑cado à escrita, a tempo inteiro, tive o privilégio de escre‑ver a médiuns inspiradores, como Tony Stockwell e Derek Acorah, e a famosa caçadora de fantasmas Yvette Fielding. Escrevi uma colecção de livros para adolescentes sobre como desenvolver poderes psíquicos, bem como diversos livros e artigos sobre como desenvolver e utilizar o sexto sentido. Em resultado disso, a minha caixa de correio e do e ‑mail abarro‑taram, ao longo dos anos, com histórias incríveis, enviadas por gente de todas as idades e de todos os cantos do mundo, contando em pormenor as suas aventuras psíquicas e os seus encontros com anjos. Escrevi uma pesada Enciclopédia do Mundo Psíquico, seguida de uma Enciclopédia de 20 000 Sonhos – que acabou por se tornar um best ‑seller internacio‑nal. Pedirem ‑me para escrever este livro foi a mais extraordi‑nária dádiva dos anjos. Que dádiva! E que honra!

A maior parte das pessoas não acredita que não sou uma celebridade, e que, de algum modo, apenas fui publicando livro após livro. Dizem que tenho a sorte de escrever sobre aquilo que gosto. Tenho o maior gosto em dizer ‑lhes que a minha vida não tem sido fácil. Cresci na pobreza e deixei

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a escola aos dezasseis anos, sem quaisquer qualificações. A razão do meu sucesso actual reside no facto de ter final‑mente aprendido a escutar os anjos e a ouvir o que eles têm para me dizer. Não passa um dia em que não me sinta pro‑fundamente grata pela sua vigilante orientação.

Isto não quer dizer que tenha deixado de ter problemas e contrariedades. Tenho o meu justo quinhão de desaponta‑mentos, rejeições e sombras de dúvidas, como toda a gente. Há alturas em que olho a injustiça e a violência no mundo e esmurro o teclado, a cabeça e o coração, de frustração. Mas o que mudou foi o facto de ter aprendido a controlar o medo. Desejo aprender e crescer com os reveses e com as críticas, não ficar destroçada por eles. Desejo ver o lado positivo em tudo e em todos, incluindo em mim própria. Desejo acredi‑tar no impossível, pois sei por experiência própria que nada na vida é banal para sempre. Desejo aceitar o facto de que, por vezes, acontecem coisas más a gente boa por razões que nem sempre consigo compreender completamente. Desejo confiar no meu anjo ‑da ‑guarda e deixar que a sua voz me ajude a voar através desta vida e da outra.

Aconteceram outras coisas espantosas na minha vida, mas não há tempo para elas aqui. Espero apenas, antes de vos abrir os meus ficheiros, que a leitura de algumas das minhas experiências vos tenha dado uma ideia mais precisa de onde venho. Espero que, à medida que avancem na leitura, fiquem tão comovidos como eu fiquei com algumas destas histórias verdadeiras, que reuni ao longo dos anos e que neste livro vos relato.

Apenas mais uma coisa antes de passarem à frente: gos‑taria de vos encorajar a partilharem as vossas experiências angélicas com outras pessoas. Lembrem ‑se de que cada encontro com um anjo é um encontro único. Os anjos apare‑cem de diferentes modos a cada pessoa, e se tiverem dúvidas sobre se um anjo vos está a chamar, escutem o que vos diz o coração; ele saberá a resposta.

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Não tenham receio de partilhar. Lembrem ‑se de que o medo e a baixa auto ‑estima são predadores naturais dos anjos. Eles limitam a quantidade e a clareza das mensagens que os vossos anjos celestiais vos enviam. Assim, em vez de duvidarem do vosso anjo ‑da ‑guarda, tentem observar de que forma já vos chegaram mensagens dos céus, e quanta bon‑dade, humor e felicidade já existe nas vossas vidas em resul‑tado disso. E, quanto mais todos abrirmos os corações uns aos outros mais perto da terra os anjos voarão, recordando‑‑nos que nunca estamos sós.