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PROCURADORIA-GERAL DO TRABALHO
Gabinete do Procurador-Geral do Trabalho
NOTA TCNICA N 07, DE 09 DE MAIO DE 2017, DA SECRETARIA DE RELAES INSTITUCIONAIS DO MINISTRIO PBLICO DO TRABALHO
(MPT)
Proposio: PROJETO DE LEI DA CMARA N 38, de 2017. Ementa: Altera a Consolidao das Leis do Trabalho CLT, aprovada pelo Decreto-lei n 5.452, de 1 de maio de 1943, e as Leis ns 6.019, de 3 de janeiro de 1974, 8.036, de 11 de maio de 1990, e 8.212, de 24 de julho de 1991, a fim de adequar a legislao s novas relaes de trabalho.
O MINISTRIO PBLICO DO TRABALHO (MPT), no exerccio das
atribuies constitucionais de defesa da ordem jurdica justa, do regime
democrtico e dos interesses sociais e individuais indisponveis, bem como de
promoo da dignidade da pessoa humana, da valorizao social do trabalho e da
justia social, apresenta esta Nota Tcnica, produzida e aprovada pelo Grupo de
Trabalho institudo pela Portaria PGT n 2, de 9 de janeiro de 2017, para expor
seu posicionamento acerca do Projeto de Lei da Cmara n 38/2017, com a
finalidade de apontar violaes ordem constitucional, demonstrar o profundo
prejuzo ao equilbrio da relao capital-trabalho, bem como a facilitao das
fraudes trabalhistas e da corrupo nas relaes coletivas de trabalho, acrescido
do aprofundamento da insegurana jurdica.
Documento assinado eletronicamente por RONALDO CURADO FLEURY em 09/05/2017, s 19h14min37s (horrio de Braslia).
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1. NECESSIDADE DE AMPLO DEBATE COM A SOCIEDADE E DA
PROMOO DO DILOGO SOCIAL
O PLC n. 30/2017, oriundo da Cmara dos Deputados, no foi objeto
de um amplo debate social com todos os setores interessados. O PL 6.787/2016,
enviado pelo Governo Federal Cmara em dezembro de 2016 alterava 7 artigos
da CLT e 8 artigos da Lei n. 6.019/73. Durante dois meses, foram realizadas
audincias pblicas e reunies para debater essa proposta. Contudo, o relatrio
apresentado, em 12 de abril de 2017, pelo Deputado Rogrio Marinho modifica 97
artigos da CLT, 3 artigos da Lei n. 6.019/74, 1 artigo da Lei n. 8.036/90, 1 artigo da
Lei n. 8.213/91 e 1 artigo da MP n. 2.226/01. Entre a divulgao do relatrio e a
aprovao do PL na Cmara (o que ocorreu com modificaes pontuais), houve,
de acordo com levantamento feito pelo Nexo 1 , meras 26 horas de debate
parlamentar.
Naturalmente, a legitimidade de uma reforma de tal amplitude est
vinculada a um amplo debate prvio com a sociedade e, especialmente, com as
categorias atingidas, o que no se verificou na Cmara dos Deputados, tendo em
vista que a proposta tramitou com invulgar celeridade, no permitindo que a
populao sequer compreendesse todas as repercusses que sero geradas nas
relaes de trabalho. A proposta atualmente em trmite no Senado em nenhum
momento foi submetida a debate, seja no parlamento, seja com a sociedade. A
grande maioria das propostas, apresentada apenas no Substitutivo, foi
apresentada de forma surpresa.
Promover uma ampla reforma da legislao trabalhista, construda e
continuamente alterada durante mais de 70 anos, sem permitir a completa
compreenso e a participao popular, implica dficit democrtico que
compromete a legitimidade da nova legislao, em muitos pontos claramente
prejudicial aos trabalhadores.
1 NEXO. Como a Cmara aprovou mudanas em 90 artigos da CLT com 26 horas de debate. Disponvel em: https://www.nexojornal.com.br/expresso/2017/04/27/Como-a-C%C3%A2mara-aprovou-mudan%C3%A7as-em-90-artigos-da-CLT-com-26-horas-de-debate. Acesso em 02 maio 2017.
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https://www.nexojornal.com.br/expresso/2017/04/27/Como-a-C%C3%A2mara-aprovou-mudan%C3%A7as-em-90-artigos-da-CLT-com-26-horas-de-debatehttps://www.nexojornal.com.br/expresso/2017/04/27/Como-a-C%C3%A2mara-aprovou-mudan%C3%A7as-em-90-artigos-da-CLT-com-26-horas-de-debate
Ademais, importante destacar que, no obstante as audincias
pblicas realizadas, tanto na Cmara dos Deputados, como nos Estados da
Federao, percebe-se de forma clara que as inmeras ponderaes feitas por
parcela considervel dos atores sociais do mundo do trabalho no foram ao
menos levadas em considerao, tendo em vista que, no atual texto do PLC
30/2017, no h pontos de consenso ou possveis de aproximao externados
pelos participantes desses eventos. Entretanto, foram incorporadas somente
novas propostas que unicamente avanam no atendimento das demandas de um
setor da relao de trabalho no caso especfico, os empregadores, conforme
demonstrado em reportagem veiculada pelo The Intercept2.
A promoo de consultas a toda a sociedade em matrias
legislativas referentes ao mundo do trabalho que alm de ser um pressuposto do
Estado Democrtico de Direito, expresso nos arts. 1o e 3o da Constituio Federal,
um compromisso internacional assumido pelo Brasil, nos termos da Conveno
n. 144 da OIT, ratificada pelo Brasil em 1994 relevante para que as leis que
regulamentem o mercado de trabalho sejam fruto de amplo dilogo social,
realizado de maneira concreta, e no meramente formal.
A aprovao de medidas que alteram substancialmente a legislao
trabalhista sem que outras perspectivas sejam materialmente levadas em
considerao em nada contribui para a construo de um ambiente de pacificao
social no pas. Nesse sentido, importante recordar do prembulo da Constituio
da OIT, quando se afirma que a paz para ser universal e duradoura deve assentar
sobre a justia social.
2. SOBRE A TERCEIRIZAO SEM LIMITES E O DESVIRTUAMENTO DO
TRABALHO AUTNOMO.
O projeto tem o inequvoco propsito de liberar a terceirizao de
2 THE INTERCEPT. Lobistas de bancos, indstrias e transportes esto por trs de emendas da reforma trabalhista. Disponvel em: https://theintercept.com/2017/04/26/lobistas-de-bancos-industrias-e-transportes-quem-esta-por-tras-das-emendas-da-reforma-trabalhista/. Acesso em 02 maio 2017.
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forma ilimitada, inclusive nas atividades finalsticas da empresa.
Conforme j se apontou na Nota Tcnica n 04, de 23.01.2017, ao
permitir a transferncia das atividades inerentes empresa, de forma ampla e
permanente, a proposta subverte a prpria finalidade conceitual da terceirizao
oferecida pela Cincia da Administrao, que reside na subcontratao de
atividades acessrias para permitir a priorizao da empresa em sua atividade
principal. Com isso, desvirtua-se a figura da terceirizao, que passa a ser
utilizada como mera locao de mo de obra, acarretando precarizao do
emprego, bem como reduo e sonegao de direitos trabalhistas e fiscais.
Ademais, a terceirizao da atividade-fim inconstitucional, pois
a norma do artigo 7, I, da CF/88 pressupe a relao direta entre o trabalhador e
o tomador dos seus servios, que se apropria do fruto do trabalho. A terceirizao
da atividade-fim caracteriza intermediao ou locao de mo de obra, a partir da
interposio de terceiro entre os sujeitos da prestao de trabalho, reduzindo o
trabalhador condio de objeto, de coisa. E isto a coisificao do ser humano -
ofende, frontalmente, os princpios constitucionais da dignidade da pessoa
humana e do valor social do trabalho.
Alm disso, a proposta pretende criar a figura do autnomo que
presta servios contnuos e com exclusividade para uma empresa (art. 442-B),
instrumentalizando e incentivando a fraude relao de emprego pelo
desvirtuamento do trabalho autnomo, com severos prejuzos aos
trabalhadores, que sero excludos de todo o sistema de proteo
trabalhista, e Previdncia Social, em razo da ausncia de recolhimento
das contribuies devidas.
As medidas supostamente compensatrias terceirizao,
constantes da proposta, revelam-se meramente ilusrias, pois limitam-se ao uso
de refeitrio e atendimento em ambulatrio mantidos pela empresa contratante,
situaes raras, encontradas em um nmero insignificante de estabelecimentos. A
norma no assegura a extenso do fornecimento de vales refeio ou o seu
equivalente em dinheiro, bem como o fornecimento de plano de sade formas
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atualmente utilizadas para a concesso de benefcios indiretos pela imensa
maioria das empresas.
Por outro lado, a restrio para recontratao dos empregados
dispensados, por um perodo de 18 meses (arts. 5-C e 5-D da Lei 6019/74),
logicamente, no impede que a empresa dispense seus empregados e os
substitua por outros, contratados como pessoa jurdica, ou, ainda, como
empregados de empresa terceirizada e com salrios menores e sem as vantagens
indiretas concedidas aos empregados da contratante.
Assim, a limitao apenas para a contratao do mesmo
trabalhador, da mesma pessoa, mas no impede a transformao da vaga de
trabalho em um posto pejotizado ou terceirizado.
Acresce que a alterao promovida no texto do artigo 461 da CLT
possui o inequvoco propsito de impedir ou dificultar a isonomia de direitos entre
os empregados diretos e os contratados por interposta pessoa, tornando ainda
mais claro o intuito precarizante da terceirizao sem limites.
A despeito disso tudo, encontra-se em tramite no Senado, o PL
30/2015, que foi construdo aps amplo debate em grande parte dos Estados
da Federao, e que, simplesmente, foi desconsiderando na proposta
aprovada na Cmara dos Deputados
3. REPRESENTAO DE TRABALHADORES POR LOCAL DE TRABALHO
O art. 11 da Constituio Federal prev que nas empresas com mais
de duzentos empregados, assegurada a eleio de um representante destes
com a finalidade exclusiva de promover-lhes o entendimento direto com os
empregadores. A proposta apresentada no PLC 38/2017 prev a introduo
dessa figura nos arts. 510-A, 510-B, 510-C e 510-D na CLT.
Em que pese a louvvel iniciativa em se regulamentar a figura do
representante dos trabalhadores no local de trabalho, a proposta apresentada
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insuficiente e gera dvidas a respeito da sua execuo.
De acordo com a doutrina trabalhista3 e com a experincia de outros
pases que implementaram o referido instituto, os poderes de representao dos
trabalhadores no local de trabalho so variados: podem ser restritos (como o
direito de informao e consulta) ou amplos (como a co-gesto da empresa). Ou
seja, a dimenso dos poderes da representao dos trabalhadores no local de
trabalho est diretamente vinculada ao espao existente para a participao dos
trabalhadores na empresa.
No tocante extenso da participao dos trabalhadores na
empresa, tambm conforme a doutrina trabalhista e a experincia de outros
pases, pode haver: (a) direito de informao, no qual o empregador deve
apresentar informaes a respeito do desempenho empresarial aos trabalhadores;
(b) direito de consulta, em que h previso dos trabalhadores serem consultados a
respeito de determinadas matrias; (c) direito de controle, no qual h fiscalizao
do representante em face de decises empresariais e acompanhamento da
observncia dos instrumentos coletivos de trabalho; e (d) co-gesto, em que os
trabalhadores participam da administrao empresarial.
Da leitura da proposta apresentada no PLC 38/2017, percebe-se
que nem o mais reduzido grau de representao e de participao dos
trabalhadores no local de trabalho assegurado. H previso de sete
atribuies aos representantes no local de trabalho (incisos de I a VII do art.
510-B), mas no h o reconhecimento dos meios necessrios para o
adequado desempenho dessas funes.
Percebe-se que a tnica do papel conferido aos representantes no
local de trabalho a promoo de conciliao clere e eficaz dos conflitos
coletivos de trabalho. Contudo, considerando que nem o mais reduzido direito
de participao dos trabalhadores na empresa, que o direito de
informao, atribudo aos representantes, nota-se que no h instrumentos
para que possam desenvolver de forma adequada o dever que lhe imposto.
3 SILVA, Walkure Lopes Ribeiro da. Representao e participao dos trabalhadores na gesto da empresa. So Paulo: LTr, 1988.
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Nesse sentido, temos que a ausncia de poderes que tenham o
condo de permitir os representantes no local de trabalho a efetivamente serem a
voz dos trabalhadores dentro da empresa, acaba por esvaziar essa figura e abre
espao para que se transforme em um fantoche do empregador.
Ainda, importante frisar que, a despeito da meno a diversas
experincias europeias exitosas em relao representao dos trabalhadores no
local de trabalho, a proposta contida no PLC 30/2017 fica muito aqum do que
existe naqueles pases, no lhe sendo assegurado um conjunto mnimo de direitos
para que o seu papel seja desempenhado de forma efetiva no mbito da empresa.
No tocante s decises tomadas pelos representantes no local de
trabalho, o pargrafo 2 do art. 510-B somente prev a deliberao por meio de
colegiado, no indicando qualquer hiptese em que haver a necessidade de ouvir
todos os trabalhadores de uma determinada empresa ou estabelecimento. Isso
pode tanto gerar um dficit democrtico dessas representaes, como exp-las a
uma maior presso dos empregadores.
Finalmente, apontamos algumas omisses na proposta apresentada
e que podem gerar insegurana jurdica na implementao do instituto. No caput
do art. 510-C, h disposio a respeito da convocao da eleio, mas no se
aponta quem ser responsvel por faz-la. A falta de clareza nesse aspecto um
potencial gerador de conflitos entre empresa, sindicato e trabalhadores. No
pargrafo 1, h referncia formao de comisso eleitoral para organizao e
acompanhamento do processo eleitoral, mas sem indicao de quem ir form-la.
Em que pese se destacar a vedao da interferncia da empresa ou do sindicato
nesse pargrafo, a falta de clareza sobre a responsabilidade na formao da
comisso eleitoral tambm tende a gerar conflitos entre empresa, sindicato e
trabalhadores.
Tambm, no h qualquer meno a respeito da forma pela qual
haver a coexistncia entre representantes dos trabalhadores no local de trabalho
e representantes sindicais, o que pode gerar disputas prejudiciais defesa dos
interesses dos trabalhadores, alm de violar a Conveno n. 135 da OIT, ratificada
pelo Brasil.
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Portanto, a falta de poderes atribudos aos representantes dos
trabalhadores no local de trabalho far com que no se realize de forma eficaz o
papel que deveria desempenhar, sem falar nas omisses sobre o responsvel
para convocar as eleies, o que gerar insegurana jurdica.
4. PREVALNCIA DO NEGOCIADO SOBRE O LEGISLADO
A proposta contida no PLC 30/2017 introduz dois novos artigos na
CLT, e permite que ocorra a prevalncia do negociado sobre o legislado para o
rebaixamento dos patamares legais em relao a toda e qualquer matria, com
exceo dos temas elencados no art. 611-B da CLT, o qual praticamente reproduz
os incisos do art. 7o da Constituio Federal. O art. 611-A exemplificativo do
que pode vir a ser negociado.
A proposta prev ainda que a Justia do Trabalho deve analisar os
elementos formais do acordo ou da conveno coletiva de trabalho quando houver
o exame pelo Poder Judicirio, indicando que a baliza deve ser o princpio da
interveno mnima na autonomia da vontade coletiva (art. 8, 3).
Os defensores do PLC 30/2017 apontam que h evoluo desde a
redemocratizao no dilogo social entre trabalhadores e empregadores, que o
art. 7, XXVI da Constituio Federal um marco nesse aspecto e que h um
amadurecimento na relao capital-trabalho no pas. Ainda, mencionam o julgado
do RE 590415/SC para tratar da hipossuficincia nas relaes coletivas de
trabalho e que a medida proposta tem o objetivo de valorizar a negociao
coletiva, assegurando o seu alcance e conferindo segurana ao resultado
pretendido nas tratativas entre trabalhadores e empregadores.
Merece ser lembrado, inicialmente, que o art. 7, XXVI da
Constituio Federal, ao prever que so direitos dos trabalhadores urbanos e
rurais, alm de outros que visem melhoria de sua condio social: XXVI
reconhecimento das convenes e acordos coletivos de trabalho, j estabelece
que a conveno ou o acordo coletivo de trabalho possuem fora de lei.
Contudo, isso se d em das situaes nas quais o contedo do
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instrumento coletivo de trabalho prev situaes mais benficas aos
trabalhadores do que o disposto na legislao. Trata-se da concluso lgica
da leitura do caput do art. 7 da Constituio, que prev a necessidade de se
observar que os direitos dos trabalhadores devem melhorar a sua condio
social e da aplicao de um princpio fundante do direito do trabalho: o da
proteo (e, para o caso concreto, o subprincpio da norma mais favorvel). A lei
o piso e os instrumentos coletivos podem dispor de situaes que se
configurem alm do mnimo previsto aos trabalhadores.
Ou seja, certo que no Brasil j ocorre a prevalncia do
negociado sobre o legislado. Desde que o negociado seja mais favorvel que
o legislado.
Porm, o objetivo da proposta contida no PLC 30/2017 viabilizar a
prevalncia do negociado sobre o legislado, em toda e qualquer situao,
inclusive para minorar ou extinguir direitos, com exceo dos temas previstos
nos incisos do art. 611-B.
Dado que o ordenamento brasileiro j prev, incontroversamente, a
prevalncia do negociado sobre a lei sempre que a negociao significar a criao
de novo benefcio ou a ampliao de benefcio j previsto em lei, conclui-se que
o nico propsito do PLC 30/2017 permitir a excluso de direitos
trabalhistas pela via negocial.
De fato, h de se concluir que a exclusiva razo de ser da proposta
garantir que se possa reduzir direitos dos trabalhadores atravs de acordos e
convenes. Se a inteno com o PLC 30/2017 fosse beneficiar os
trabalhadores com novos direitos e melhores condies de trabalho, a
proposta seria completamente desnecessria, eis que j prevista na
Constituio Federal.
Outra premissa bsica a respeito da proposta reside na suposio de
que os sindicatos no Brasil possuem todos os instrumentos para realizar a
contento a tarefa de defender os interesses da categoria profissional que
representam.
A realidade brasileira, no entanto, mostra-se muito distante disso.
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impossvel discutir-se a prevalncia do negociado sobre o legislado sem
antes de proceder reforma da estrutura sindical brasileira, que apresenta
gritantes e notrios problemas.
Concebida no Estado Novo varguista sob os auspcios do
corporativismo, a legislao brasileira pretendeu atrelar os sindicatos ao Estado, o
que criou uma srie de dificuldades para formao de um movimento sindical
autnomo. Entre fins da dcada de 1970 e incio da dcada de 1980, houve um
renascimento do movimento sindical brasileiro, cuja maior expresso (mas no
nica) foram as mobilizaes e greves que ocorreram na regio do ABC paulista.
O debate sobre o modelo sindical brasileiro ocorreu na Constituinte e o consenso
a que se chegou poca consubstanciou-se no art. 8 do texto constitucional, que
apesar de garantir a liberdade sindical, manteve a unicidade sindical e a
contribuio sindical obrigatria. De acordo com a Organizao Internacional do
Trabalho, ambos os institutos violam a liberdade sindical e comprometem a livre
negociao.
A forma pela qual se estrutura a organizao sindical brasileira
prejudicial efetiva representao de empregadores e trabalhadores. A
impossibilidade da criao de mais de um sindicato que representa um mesmo
grupo em uma dada base territorial cria obstculos para que trabalhadores e
empregadores tenham condies de construir entidades da maneira que
entenderem mais convenientes.
A consagrao do monoplio da representao sindical na legislao
brasileira to conhecida internacionalmente por criar obstculos liberdade
sindical que o verbete n. 314 do Comit de Liberdade Sindical do Conselho de
Administrao da OIT trata expressamente do caso nacional: disposies de uma
constituio nacional relativas proibio de se criarem mais de um sindicato por
categoria profissional ou econmica, qualquer que seja o grau de organizao,
numa determinada base territorial, que no poder ser inferior rea de um
municpio, no esto em conformidade com os princpios da liberdade sindical.
O imposto sindical mecanismo compulsrio de custeio dos
sindicatos, concebido com a finalidade de control-los. Para que uma entidade
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tenha direito a receber os valores oriundos do imposto sindical, basta a realizao
do registro no Ministrio do Trabalho, no havendo necessidade de promover
qualquer atividade ou de atuar em prol dos representados pelo sindicato. A
arrecadao desse imposto sindical chegou, em 2015, a R$ 3,18 bilhes.
Uma das consequncias negativas da permanncia do imposto
sindical a perpetuao de um ambiente que estimula a fragmentao da
representao sindical, sem qualquer benefcio ao empregado ou ao empregador,
fator que compromete a legitimidade das entidades.
Segundo o Ministrio do Trabalho, no Brasil h mais de 16.000
sindicatos, sendo que 11.000 representam trabalhadores e 5.000, empresas.
Outros 2.000 sindicatos buscam seu registro perante o Ministrio.
Lamentavelmente, como direta consequncia dos problemas antes
mencionados, a realidade sindical brasileira marcada pela presena, de um lado,
de sindicatos srios, combativos e dotados de grande representatividade, de outro
lado, de sindicatos com pouca ou nenhuma legitimidade perante a categoria, que
existem apenas de modo formal, nos quais no prevalece a democracia sindical, e
que so geridos por um pequeno grupo de pessoas que os exploram como se a
entidade fosse seu patrimnio pessoal.
Muitos exemplos poderiam ser listados, relacionados a entidades
sindicais que, na verdade, so controladas por verdadeiros grupos criminosos,
mostrando-se impotentes os trabalhadores para afast-los do controle, pois
sequer so admitidos como filiados, ou apela-se para estratagemas de modo a
garantir que as eleies ocorram sempre com uma nica chapa.
No por acaso, h sindicatos que representam categorias com
milhares ou mesmo dezenas de milhares de trabalhadores, mas que possuem
menos de 100 trabalhadores filiados, com direito de voto nas eleies. As
assembleias em tais sindicatos, nas quais so decididas as principais
providncias, inclusive a aceitao ou no dos termos de um acordo ou
conveno, so tomadas com a presena de nmero irrisrio de filiados, com
frequncia apenas dos membros da prpria diretoria.
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Tambm preocupante se mostra a ausncia de democracia interna, e
a eternizao dos mesmos grupos no controle de boa parte dos sindicatos. De
acordo com reportagem do jornal O Globo4, com base em dados repassados pelo
Ministrio do Trabalho e Emprego, 8,5 mil dirigentes de sindicatos encontram-se
h mais de dez anos ininterruptos no poder.
Nessas condies, mostra-se evidente que fazer prevalecer o
negociado sobre o legislado, para permitir a fixao de condies de trabalho e
remunerao inferiores s asseguradas por lei, sem realizar previamente uma
ampla reforma sindical, significar enorme incentivo ao avano da corrupo nas
relaes coletivas de trabalho, inclusive compra de acordos e convenes,
particularmente nos setores econmicos em que no se fazem presente sindicatos
srios e representativos.
E simplesmente acabar com o imposto sindical, sem alterar as
demais bases do sistema sindical, no resolve o problema. Pelo contrrio, agrava-
o ainda mais, atingido entidades sindicais srias e comprometidas.
Hoje, dado que clusulas que retiram direitos previstos em normas
cogentes so ilegais perante o ordenamento brasileiro, a atuao do Ministrio
Pblico diante de tais casos tem sido, basicamente, a de buscar a anulao das
clusulas lesivas e a condenao dos sindicatos ou empresas envolvidas a no
repetir na mesma espcie de pactuao.
Em um contexto normativo em que se admita a prevalncia do
negociado sobre a lei para retirada de direitos, combinado com a
manuteno de milhares de sindicatos desprovidos de qualquer
legitimidade, controlados por indivduos que veem na direo da entidade
uma forma de enriquecimento pessoal, os incentivos corrupo na
negociao coletiva se tornaro muito elevados. A frmula, pois,
devastadora dos direitos do trabalhador.
Um sindicato com nmero nfimo de filiados, menos de 1% dos
membros da categoria, gerido com propriedade particular de seus dirigentes, que
4 Em
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http://oglobo.globo.com/brasil/dirigentes-sindicais-se-eternizam-no-poder-16841357
se perpetua h dcadas no poder, ganhar, de sbito, o poder de vida e de morte
sobre direitos fundamentais dos trabalhadores, encontrando-se tambm na
posio de proporcionar ganhos financeiros substanciais s empresas sob a forma
de reduo arbitrria de custos.
Trata-se do ambiente perfeito para negociatas esprias, contra as
quais os membros da categoria profissional quase nada podero fazer, pois no
so admitidos no sindicato, no conseguem concorrer nas eleies, no possuem
a liberdade de constituir outro sindicato, e jamais so consultados.
A extino do imposto sindical e da unicidade, bem como a
regulamentao de uma contribuio negocial, teriam o mrito de adequar a
legislao brasileira s normas internacionais e lei das centrais sindicais.
No por acaso, a Organizao Internacional do Trabalho entende
que contribuies como o imposto sindical contrariam o princpio da liberdade
sindical, mas outras, como a contribuio negocial, esto em conformidade com o
referido princpio (vide verbete n. 363 do Comit de Liberdade Sindical do
Conselho de Administrao da OIT). Ainda, deve-se destacar a lei que
regulamentou as centrais sindicais (Lei n. 11.648/2008), elaborada em consenso
com as entidades, que, em seu art. 7, prev que a regulamentao da
contribuio negocial levar extino da contribuio sindical.
Contudo no isso o que ocorre no PLC 38/2017. A unicidade
sindical mantida. Em que pese ocorra a extino da contribuio sindical,
ataca-se a contribuio assistencial. Afinal, dentre os pontos elencados como
inviveis de se fixar por meio de negociao coletiva est a liberdade de
associao profissional ou sindical do trabalhador, inclusive o direito de no sofrer,
sem sua expressa e prvia anuncia, qualquer cobrana ou desconto salarial
estabelecidos em conveno coletiva ou acordo coletivo de trabalho (art. 611-B,
XXVI). Percebe-se, de forma cristalina, que se faz referncia contribuio
assistencial, normalmente criada pelas entidades sindicais em acordos ou
convenes coletivas para o financiamento das atividades sindicais no curso das
negociaes coletivas. Aqui, chama ateno a diferena de tratamento dispensada
a trabalhadores e empregadores nesse ponto, tendo em vista que no h qualquer
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meno aos empresrios nesse inciso.
Tambm, destaca-se que, ao mesmo tempo em que se retira a
obrigatoriedade da contribuio sindical sem qualquer fase de transio,
veda-se que as entidades criem mecanismos de financiamento quando
promovem atividades em benefcio de todos os seus representados,
independentemente desses serem filiados ou no ao sindicato. Afinal, os
acordos e convenes coletivas de trabalho continuaro tendo efeito erga
omnes, ou seja, sero aplicados para todos os representados pela entidade,
sendo filiados ou no.
Nota-se claramente os efeitos perniciosos da proposta contida
no substitutivo: restringe-se de forma contundente o financiamento das
entidades representantes de trabalhadores, o que invariavelmente levar ao
seu enfraquecimento, e, simultaneamente, concede-se o poder a essas
mesmas entidades de rebaixar os padres trabalhistas de seus
representados.
Importante registrar tambm que o fim da contribuio sindical no
implicar igual enfraquecimento financeiro s entidades patronais, pois estas
possuem outras fontes de receitas que no sero atingidas. Segundo divulgado na
imprensa 5 , a contribuio sindical representa apenas 10% do oramento da
FIESP, por exemplo, enquanto as taxas recebidas pela gesto dos recursos do
sistema S (arrecada cerca de 16 bilhes por ano) correspondem a mais de 60%
da receita da entidade.
Desse modo, as principais receitas das entidades patronais
sero mantidas, pois o projeto no prev qualquer alterao nesse sentido,
enquanto aquelas das entidades dos trabalhadores sero excludas, gerando
claro desequilbrio de foras.
5 VALOR ECONMICO. O desmonte parcial do corporativismo. Disponvel em: http://www.valor.com.br//politica/4950364/o-desmonte-parcial-do-corporativismo?utm_medium=Social&utm_campaign=Compartilhar&utm_source=Twitter#. Acesso em 02 maio 2017; FOLHA DE SO PAULO. Sistema S ajuda sindicato patronal a viver sem imposto sindical. Disponvel em: http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2017/05/1880554-sistema-s-ajuda-sindicato-patronal-a-viver-sem-imposto-sindical.shtml. Acesso em 09 maio 2017.
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http://www.valor.com.br/politica/4950364/o-desmonte-parcial-do-corporativismo?utm_medium=Social&utm_campaign=Compartilhar&utm_source=Twitterhttp://www.valor.com.br/politica/4950364/o-desmonte-parcial-do-corporativismo?utm_medium=Social&utm_campaign=Compartilhar&utm_source=Twitterhttp://www1.folha.uol.com.br/mercado/2017/05/1880554-sistema-s-ajuda-sindicato-patronal-a-viver-sem-imposto-sindical.shtmlhttp://www1.folha.uol.com.br/mercado/2017/05/1880554-sistema-s-ajuda-sindicato-patronal-a-viver-sem-imposto-sindical.shtml
Portanto, para que seja levada a cabo a valorizao da
negociao coletiva, as medidas iniciais ho de ser a construo de uma
legislao de combate s prticas antissindicais e a adequao do
ordenamento jurdico aos princpios da liberdade sindical, com a extino da
contribuio sindical compulsria, a criao da contribuio negocial e o fim
do monoplio de representao sindical. E nisto o PLC no avanou.
Outro aspecto que merece destaque a previso, no projeto, de que
a Justia do Trabalho analisar apenas os aspectos formais dos acordos e das
convenes coletivas de trabalho, abstendo-se de averiguar os termos em que
foram avenados os entendimentos entre trabalhadores e empregadores, sob a
alegao do princpio da interveno mnima da autonomia da vontade coletiva.
O exerccio da autonomia privada coletiva no uma
autorizao para que trabalhadores e empregadores estabeleam pactos que
violem o ordenamento jurdico. Nesse sentido, relevante invocar o art. 8.1 da
Conveno n. 87 da Organizao Internacional do Trabalho (OIT), que trata da
liberdade sindical e da proteo ao direito de sindicalizao. De acordo com o
referido dispositivo, no exerccio dos direitos que lhe so reconhecidos pela
presente conveno, os trabalhadores, os empregadores e suas respectivas
organizaes devero, da mesma forma que outras pessoas ou coletividades
organizadas, respeitar a lei.
Ademais, preconizar que a Justia do Trabalho no deve analisar
o contedo dos instrumentos coletivos de trabalho afastar o direito de
acesso jurisdio, previsto no art. 5, XXXV da Constituio Federal.
No tocante vedao de alterao de normas de sade e segurana
do trabalho por meio de acordo ou conveno coletiva de trabalho, embora seja
importante a previso, deve-se destacar a concepo restrita estabelecida pelo
dispositivo do que seriam normas de sade e segurana: apenas e to somente
as Normas Regulamentadoras do Ministrio do Trabalho. Trata-se de uma
concepo formalista sobre o tema, distante do que prev a doutrina e a
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jurisprudncia trabalhista6 . Outros dispositivos legais igualmente importantes e
que tratam de sade e segurana, previstos na CLT, como o previsto no Captulo
V do texto consolidado e as normas sobre jornada de trabalho, podero ser
modificados e causar danos irreparveis integridade fsica dos trabalhadores.
Cabe mencionar, tambm, a previso sobre a necessidade de
explicitao da vantagem compensatria nos casos de reduo de direitos que
tratem de salrio e jornada de trabalho, nos termos do art. 7, VI, XIII e XIV (e que
no se relacionam com as hipteses acima analisadas). evidente que a
existncia de compensao nos casos de reduo de direitos ameniza a piora nas
condies de trabalho. Contudo, quando o referido dispositivo menciona a
necessidade de retribuio apenas nos casos de flexibilizao nos termos do art.
7, VI, XIII e XIV da Constituio Federal, a contrario sensu, tem-se que no h
necessidade de qualquer compensao para os demais casos em que se
pretende autorizar a alterao abaixo do piso legal. Trata-se, novamente, de mais
um caso de precarizao dos direitos trabalhistas.
importante destacar a necessidade de que, no curso da
negociao coletiva que obrigatria, conforme o art. 616 da CLT c/c o art. 8,
VI da Constituio Federal as partes atuem segundo os princpios da probidade
e boa-f, conforme o art. 422 do Cdigo Civil. O projeto omisso em estabelecer
tais princpios na negociao coletiva e em dispor sobre procedimentos que
assegurem o direito dos trabalhadores ao acesso s informaes e dados
relevantes para a negociao coletiva, conforme preconiza o art. 5 da Conveno
154 da OIT.
Por fim, cabe tecer alguns comentrios sobre a suposta valorizao
da negociao coletiva para se fixar parmetros para as condies de trabalho
abaixo do piso legal.
Para alm de todos os problemas j mencionados na Nota Tcnica n.
2 como a sua evidente inconstitucionalidade e do enfraquecimento de um dos
princpios basilares do direito do trabalho, que o princpio da norma mais
6 A ttulo de exemplo, mencionam-se os seguintes julgados do Tribunal Superior do Trabalho: AIRR 24194-06.2014.5.24.0091 e RR 578300-75.2006.5.09.0892, assim como a Smula n. 437, II do TST.
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favorvel, h flagrante violao das Convenes n. 98 e 154 da OIT.
A OIT, no incio do ms de fevereiro, divulgou o relatrio do Comit
de Peritos da Comisso de Aplicao de Normas. O documento apresenta
diversos comentrios sobre o cumprimento das Convenes da OIT nos pases-
membros e utilizado como base nas discusses realizadas na Conferncia
Internacional do Trabalho.
O Comit de Peritos analisou a aplicao da Conveno n. 98 da OIT
que uma das Convenes mais importantes da Organizao - no Brasil e
comentou a proposta de introduzir no ordenamento jurdico brasileiro a prevalncia
do negociado sobre o legislado para estabelecer condies abaixo das previstas
em lei.
Os comentrios no deixam dvidas sobre o que significa a
valorizao da negociao coletiva, no mbito das Convenes n. 98 e 154 da
OIT, e dos efeitos negativos da Reforma Trabalhista.
De acordo com o relatrio, o Comit lembra que o objetivo geral
das Convenes n. 98, 151 e 154 de promover a negociao coletiva sob a
perspectiva de tratativas de condies de trabalho mais favorveis que as
fixadas em lei, assim como o Comit enfatiza que a definio de negociao
coletiva como um processo que pretende melhorar a proteo dos
trabalhadores garantida em lei foi reconhecida nos trabalhos preparatrios
para a Conveno n. 154.
Como consequncia do negociado sobre o legislado, coloca que do
ponto de vista prtico, o Comit considera que a introduo de medida para
permitir a reduo do piso legal por meio de negociao coletiva possui o
efeito de afastar o exerccio da negociao coletiva e pode enfraquecer a sua
legitimidade no longo prazo.
Finalmente, o relatrio aponta que medidas dessa natureza seriam
contrrias ao objetivo de promover negociao coletiva livre e voluntria, nos
termos da Conveno.
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Desta forma, fica evidente que autorizar o rebaixamento de
direitos por meio da negociao coletiva no fortalece as tratativas entre
trabalhadores e empregadores, mas enfraquece e coloca em descrdito
diante da sociedade esse importante instrumento de pacificao dos
conflitos coletivos de trabalho. Alm disso, caso aprovada a Reforma
Trabalhista, o Brasil poder ser acionado perante o Comit de Aplicao de
Normas e o Comit de Liberdade Sindical da OIT por desrespeitar as
Convenes n. 98 e 154, expondo internacionalmente o pas pela falta de
compromisso em promover direitos trabalhistas fundamentais7
Cumpre ainda destacar contradies crassas presentes no PLC
30/2017. A ttulo de exemplo, aponta-se que, apesar de no permitir a
prevalncia do negociado sobre o legislado para reduzir ou suprimir direitos
relacionados segurana e sade do trabalhador, admite que o
enquadramento da insalubridade e que a prorrogao de jornada em
ambientes insalubres, atividades eminentemente tcnicas, sejam fixadas por
meio de negociao coletiva.
Finalmente, dentre as inovaes propostas no substitutivo em
relao ao art. 611-A da CLT, cumpre ressaltar a inviabilidade da previso de
participao dos sindicatos como litisconsortes necessrios em todos os
processos em que discutida a nulidade de norma coletiva, pois, considerando o
efeito erga omnes dos acordos e convenes coletivas, torna-se impraticvel que
as entidades tenham de participar de inmeras aes individuais (611-A, 5), o
que sem dvidas ir causar embarao ao desenvolvimento normal de suas
atividades.
Desse modo, a prevalncia do negociado sobre o legislado, nos
termos propostos no PL 6787/2016, no valoriza a negociao coletiva, mas
cria espaos para a precarizao das condies de trabalho ao permitir que
sejam pactuados parmetros laborais abaixo do que prev a lei, gerando
7 KALIL, Renan Bernardi. A reforma trabalhista, o Brasil e a comunidade internacional. Disponvel em: http://justificando.cartacapital.com.br/2017/02/23/reforma-trabalhista-o-brasil-e-comunidade-internacional/. Acesso em 15.04.2017.
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http://justificando.cartacapital.com.br/2017/02/23/reforma-trabalhista-o-brasil-e-comunidade-internacional/http://justificando.cartacapital.com.br/2017/02/23/reforma-trabalhista-o-brasil-e-comunidade-internacional/
insegurana jurdica. A discusso em torno da proposta precisa ser,
necessariamente, precedida pela reforma do sistema sindical e pela criao de
instrumentos para punio de atos antissindicais, sob pena de esvaziamento das
negociaes e fomento extraordinrio corrupo nas relaes coletivas de
trabalho.
5. VIOLAO DO PRINCPIO DA LIVRE CONCORRNCIA
O substitutivo prope a alterao do art. 620 da CLT, subvertendo o
princpio da norma mais favorvel que informe e impera no Direito do Trabalho, ao
estabelecer que as condies definidas em acordo coletivo sempre prevalecero
sobre as estipuladas em conveno coletiva de trabalho.
A norma contraria a prpria noo de valorizao da negociao
coletiva, na medida em que a negociao coletiva empreendida entre
entidades sindicais de trabalhadores e de empregadores tem abrangncia e
amplitude maior do que a entabulada entre uma ou mais empresas e uma
entidade sindical de trabalhadores. Ao se possibilitar que o acordo coletivo, com
menos direitos e benefcios do que os estabelecidos em conveno coletiva
prevalea, estar-se- inexoravelmente fomentando a concorrncia desleal
entre as empresas que atuam na mesma atividade econmica,
principalmente em um contexto de ampla terceirizao de servios.
A norma viola o princpio da igualdade de oportunidade entre as
empresas que eventualmente participem de um procedimento de licitao pblica
ou privada para contratao de servios.
6. OMISSO EM RELAO S CONDUTAS ANTISSINDICAIS
Como foi apontado na Nota Tcnica n. 2, a estrutura sindical
brasileira fonte de diversos problemas que criam inmeros entraves ao exerccio
da liberdade sindical em nosso pas. Os exemplos de desvios mencionados na
Nota Tcnica n. 2 so consequncias das distores existentes no sistema
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sindical. Ademais, importante destacar que a prtica de crimes e fraudes no
constitui a regra do movimento sindical brasileiro.
A liberdade sindical uma liberdade complexa, envolvendo cinco
dimenses: liberdade de associao, liberdade de organizao, liberdade de
administrao, liberdade de exerccio de funes e liberdade de filiao,
desfiliao e no filiao. Trata-se de um direito fundamental e um direito humano,
previsto em diversos tratados internacionais j ratificados pelo Brasil. Para que
seja possvel o seu pleno exerccio, h necessidade de se estabelecer meios para
garanti-lo.
O constrangimento liberdade sindical constitui conduta
antissindical. De acordo com Oscar Ermida Uriarte, atos antissindicais so aqueles
que prejudicam indevidamente um titular de direitos sindicais no exerccio da
atividade sindical ou por causa desta, ou aqueles atos mediante os quais lhe so
negadas, injustificadamente, as facilidades ou prerrogativas necessrias ao
normal desempenho da ao coletiva8.
As condutas antissindicais so classificadas em atos de
discriminao, atos de ingerncia e prticas desleais. Os dois primeiros se
relacionam com a tradio romano-germnica e esto descritos na Conveno n.
98 da Organizao Internacional do Trabalho (OIT), ratificada pelo Brasil. O
combate aos atos de discriminao tem o objetivo de proteger os trabalhadores
individualmente em face de condutas praticadas por empregadores e sindicatos. O
combate aos atos de ingerncia tem o intuito de proteger as entidades sindicais
em face de intervenes de umas sobre as outras, direta ou indiretamente. As
prticas desleais so oriundas da tradio anglo-sax.
O Brasil, apesar de diversos compromissos internacionais
assumidos, no possui uma legislao de combate s prticas
antissindicais. Isso acaba por fragilizar o exerccio da liberdade sindical e
no oferece um ambiente propcio ao livre desenvolvimento das
negociaes coletivas entre representantes dos trabalhadores e dos
8 URIARTE, Oscar Ermida. A proteo contra os atos anti-sindicais. So Paulo: LTr, 1989, p. 35
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empregadores.
O cotidiano das relaes coletivas de trabalho no Brasil aponta uma
srie de exemplos que demonstram as dificuldades para que as categorias
econmicas e profissionais tenham condies de tratar das condies de trabalho
entre si.
Como exemplo, podemos apontar: a) o ajuizamento de interditos
proibitrios com o objetivo de cercear o exerccio do direito de greve; b) a fixao
pelo Judicirio de elevadssimos percentuais de fora de trabalho ativa para a
continuidade da prestao de servios e atividades essenciais em paralisaes de
categorias que atuam nessas reas (o que acaba por desestimular o comum
acordo); c) a recusa em negociar coletivamente com a sua contraparte e,
consequentemente, a ausncia de concordncia na suscitao de dissdios
coletivos; d) o financiamento de entidades representantes de trabalhadores por
entidades representantes de empregadores; e) ameaa e coao de trabalhadores
em greve; f) o desestmulo a empregados se filiarem entidade sindical que os
representa; g) confeco de lista de trabalhadores filiados entidade sindical para
que no sejam contratados pelas empresas; h) veiculao de propagandas em
meios de comunicao com o objetivo de prejudicar a imagem das entidades
sindicais e de movimentos legtimos conduzidos por essas entidades; i) o estmulo
a trabalhadores exercerem o direito de oposio contribuio
assistencial/negocial; j) entidades sindicais e patronais que simulam paralisao
com o objetivo de elevar preos em concesses de servios pblicos; l) a
dispensa de dirigentes sindicais com garantia de emprego; m) a restrio de
representante dos trabalhadores s empresas e locais de trabalho, dentre outros.
Como se v, os agentes das condutas antissindicais podem ser
sindicatos, trabalhadores, empregadores ou o Estado. E os prejudicados tambm
podem ser trabalhadores, empregadores, sindicatos e o Estado.
Em que pese o Brasil ter ratificado a Conveno n. 98 da OIT em
1952, at o presente momento no foi editada qualquer lei com o objetivo de
disciplinar o combate s prticas antissindicais no pas, sendo que o referido
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tratado internacional o principal instrumento normativo que apoia as pretenses
que tem o objetivo de sancionar os atos antissindicais. Sem diminuir a importncia
da Conveno n. 98 da OIT que inclusive considerada pela Organizao
Internacional do Trabalho como uma de suas convenes fundamentais ,
importante destacar que a ausncia de uma legislao interna que reprima os
atentados liberdade sindical prejudica todos os interessados no
desenvolvimento de negociaes coletivas justas, em que o resultado tenha
condies de exprimir a vontade das categorias econmicas e profissionais em um
determinado contexto negocial. Das possveis formas de se utilizar o direito para
sancionar as condutas antissindicais pelo vis administrativo, civil-trabalhista ou
penal o Brasil no adotou minimamente nenhuma delas.
Por todo o exposto, possvel afirmar categoricamente que o
ambiente para a realizao de negociaes coletivas extremamente
prejudicado em face da ausncia de previses legais que promovam a
liberdade sindical e repudiem as condutas antissindicais. Sem a construo
de uma legislao interna que oferea garantias mnimas aos titulares de direitos
sindicais para o exerccio adequado da negociao coletiva, qualquer medida que
pretenda modernizar as relaes de trabalho ou valorizar as relaes coletivas
ser incua, tendo em vista que os meios mnimos para a sua concretizao no
estaro presentes no ordenamento jurdico brasileiro. Nesse aspecto,
importante relembrar que o Ministrio Pblico do Trabalho, assim como
diversas entidades sindicais, apontaram os problemas advindos da prtica
de atos antissindicais no pas, bem como a necessidade de se tomarem
providncias legislativas para coibir essas condutas. Contudo, como se v
pela leitura do relatrio, nenhuma palavra foi levada em considerao.
Finalmente, relevante destacar que, no incio de fevereiro, foi
divulgado o relatrio do Comit de Peritos da Comisso de Aplicao de Normas
da Organizao Internacional do Trabalho (OIT). No documento, h anlises sobre
a aplicao de Convenes da OIT nos pases-membros.
Em relao falta de normas aptas a reprimir as condutas
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antissindicais o relatrio apontou o seguinte: O Comit mais uma vez requer que
o Governo tome as medidas necessrias para garantir que a legislao estabelea
remdios e sanes suficientemente dissuasivas contra atos antissindicais.
Portanto, a aprovao do substitutivo do PLC 30/2017 significar a
violao da Constituio Federal e a quebra de compromissos internacionais
assumidos pelo Brasil, o que poder levar a que o pas seja acionado perante a
Comisso de Aplicao de Normas e o Comit de Liberdade Sindical da OIT.
7. SOBRE AS RESTRIES AO ACESSO JUSTIA DO TRABALHO.
A Constituio Federal, em seu art. 5o, XXXV, prev que a lei no
excluir da apreciao do Poder Judicirio leso ou ameaa de direito e, no inciso
LXXVIII, a todos, no mbito judicial e administrativo, so assegurados a razovel
durao do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitao.
A despeito disso, nenhum desses dispositivos constitucionais
foram observados em diversas inovaes apresentadas no PLC 38/2017, o
que os inquina de inconstitucionalidade. Em verdade, nota-se, claramente, que
um dos objetivos contidos em diversas normas do projeto dificultar o
acesso dos trabalhadores Justia do Trabalho, trilhando caminho oposto
ao indicado pela Constituio Federal.
Inicialmente, deve-se pontuar que o processo do trabalho possui
autonomia cientfica e tem como objetivo precpuo permitir que o trabalhador, o
qual no recebeu os valores devidos em virtude do contrato de trabalho, tenha
meios de receber o que lhe de direito.
Ao invs de criar instrumentos para reduzir o nvel de
descumprimento das normas trabalhistas e as leses que geram aos direitos
dos trabalhadores, como medida para reduzir a inflao de processos
trabalhistas, alegada no Relatrio da Cmara dos Deputados, o projeto
dificulta o acesso Justia do Trabalho para postular a reparao das
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violaes basilares diga-se, posto que referentes, em sua grande parte, ao
pagamento de verbas rescisrias consagrando uma clara inverso de valores,
pois no se preocupa em impedir a prpria ocorrncia do dano, mas, to-s, a sua
reparao.
Nessa linha, as modificaes que se pretende introduzir no 3 e 4
do art. 790 da CLT objetivam dificultar a obteno da justia gratuita, pois,
atualmente, a concesso pode ser de ofcio para o trabalhador que ganha at dois
salrios mnimos e, para os demais, basta que a parte faa uma declarao de
que no possui condies de suportar os custos do processo. Com a nova
redao proposta, a concesso de ofcio para os que recebem salrio
inferior a 40% do teto da previdncia, sendo que dos demais passa a ser
exigida comprovao da insuficincia de recursos.
Isto destoa, at mesmo, das normas do Cdigo de Processo
Civil, que visa a regular as relaes processuais entre pessoas que estejam
no mesmo grau de suficincia. Imagine-se, ento, criar maiores restries
processuais para o regramento de relaes de conflito entre capital e
trabalho, naturalmente desiguais entre si.
Com efeito, , no mnimo, inconcebvel que a sistemtica que se
pretende introduzir na Justia do Trabalho crie maiores obstculos do que
aquela prevista no CPC para as causas da Justia Comum, onde Presume-
se verdadeira a alegao de insuficincia deduzida exclusivamente por
pessoa natural. (art. 99, 3).
No mesmo sentido, h diversas proposies que dificultam e
encarecem a tutela jurisdicional ao trabalhador, dificultando-lhe o acesso
Justia. Como exemplo, apontamos a possibilidade do trabalhador ser
responsabilizado pelo pagamento de honorrios periciais se for sucumbente
no objeto da percia, mesmo se beneficirio da justia gratuita (art. 790-B da
CLT). Da mesma forma, h previso de responsabilizao do trabalhador em
honorrios de sucumbncia, novamente mesmo se beneficirio da justia
gratuita (art. 791-A da CLT). Igualmente, as modificaes que se pretende
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introduzir no artigo 844 da CLT, condicionando o ajuizamento de nova ao
pelo empregado que tenha faltado audincia, ao prvio pagamento das
custas do processo arquivado, ainda que seja beneficirio de justia
gratuita.
Tais regras se mostram desproporcionais e excessivamente
rigorosas com trabalhadores humildes e que muitas vezes enfrentam todas as
dificuldades de transporte para chegar ao frum, notadamente os que residem em
reas rurais, na periferia das grandes cidades ou que precisam se deslocar para
outro Municpio onde situada a Justia do Trabalho e mesmo chegando ao
endereo precisam localizar a sala de audincias.
Com efeito, se o trabalhador perder a audincia, dificilmente ter
condies financeiras de pagar as custas previamente ao ajuizamento de
nova ao, resultando inviabilizado seu acesso justia.
Por outro lado, e o desiquilbrio da proposta tanto e to visvel
neste passar , em relao ao reclamado empregador o qual no comparece
na audincia inaugural, pretende-se alterar a norma para lhe facilitar a
defesa, ao se propor a possiblidade de juntada de contestao e de
documentos, desde que esteja representado por advogado. Vale dizer:
dificulta-se o acesso a Justia por parte do trabalhador, mas facilita-se a
defesa do empregador ausente na audincia inaugural.
Ademais, a previso de homologao de acordo extrajudicial
apresentado em petio conjunta (855-B e seguintes), em sede de jurisdio
voluntria, resultar na institucionalizao de uma prtica ilcita j utilizada
por algumas empresas, com a simulao de lides para obter a ampla
quitao do contrato de trabalho mediante o pagamento das verbas
rescisrias.
Considerando, ainda, que fica extinta a assistncia e
homologao do sindicato no momento do pagamento das verbas
rescisrias, com a revogao do 1 do art. 477 da CLT, a Justia do
Trabalho acabar convertida em rgo homologador de rescises
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contratuais.
E, nisto, no se alcanar, por certo, a reduo do nmero de
processos trabalhistas, objetivo este to destacado no Relatrio da Cmara, mas,
ao contrrio, gerar ampliao do nmero de processos, que tero por nica
finalidade quitar os contratos de trabalho sem a indenizao aos
trabalhadores lesados.
Note-se que bastar empresa no pagar as verbas rescisrias no
momento da resciso para colocar o trabalhador em situao de extrema
dificuldade financeira, pois este necessita de recursos para a subsistncia da
famlia, de modo que se ver compelido a aceitar receber o valor oferecido,
mesmo que corresponda apenas s verbas rescisrias, mediante quitao do
contrato.
um sistema perverso que tende a inviabilizar o ajuizamento de
aes trabalhistas, mesmo quando o trabalhador tenha sido lesado no curso
do contrato de trabalho.
Outra norma que gera desequilbrio no contrato de trabalho a que
prev a quitao anual de obrigaes trabalhistas, com eficcia liberatria
das parcelas, perante o sindicato dos empregados da categoria. Embora
conste como uma faculdade, preciso lembrar que o empregado estar no
curso do contrato, sob dependncia econmica e subordinao, o que
obviamente afeta a sua liberdade de recusar o procedimento.
Alm disso, preciso ter presente que grande parte dos sindicatos
no possui estrutura adequada para dar assistncia ao empregado em tal ato,
ficando o trabalhador sujeito a acolher o que o empregador alegar como correto.
Observe-se, ainda, que, na rea rural, muitas vezes o mesmo sindicato congrega
produtores e trabalhadores rurais, o que torna apenas formal a ideia de
assistncia. De qualquer sorte, a quitao fornecida no curso do contrato e
fora do controle jurisdicional no deve ter eficcia liberatria, sob pena de
consolidar leso aos direitos sociais.
Cumpre mencionar que, apesar dos obstculos para que o
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trabalhador tenha acesso ao Poder Judicirio Trabalhista, h previses que
facilitam a adjudicao do empregador, como a ampliao do leque de
opes para o oferecimento do depsito recursal pelo empregador (art. 899
da CLT), a ampliao desmensurada do tempo entre a citao do executado
e a ausncia de garantia do juzo, para 60 dias (art. 883-A da CLT) bem como
o engessamento da atividade jurisdicional, ao no permitir que o juiz
promova de ofcio a execuo quando o trabalhador estiver representado
por advogado (art. 878 da CLT). Sem dvida, so dispositivos que contrariam
o princpio constitucional da razovel durao do processo e os meios que
garantam a celeridade de sua tramitao (inciso LXXVIII do art. 5 da
CRFB/88).
8. SOBRE AS LIMITAES S DECISES DA JUSTIA DO TRABALHO, EM
ESPECIAL QUANTO S RESTRIES DA REPARAO DO DANO MORAL.
Aparentemente, o projeto adere a uma viso preconceituosa e alheia
realidade da Justia do Trabalho, difundida em alguns meios empresariais, no
sentido de que decidiria sempre em favor dos trabalhadores. Todavia, tal viso
no subsiste a qualquer anlise isenta e embasada em fatos e nmeros.
De forma indita, o projeto prev limitaes s decises da
Justia do Trabalho que no encontram paralelo nos outros ramos do
Judicirio, o que se mostra preocupante tanto do ponto de vista do direito dos
trabalhadores integral reparao dos danos sofridos, quanto da integral
prestao jurisdicional, expressamente assegurada no artigo 5 da CF/88.
Ao estabelecer que, no exame de acordo ou conveno coletiva
de trabalho, a Justia do Trabalho analisar exclusivamente a conformidade
dos elementos essenciais do negcio jurdico (art. 8, 3 c/c 611, 1),
conforme o artigo 104 do CC, em virtude do que estaria impedida a Justia do
Trabalho de decidir sobre o contedo das normas coletivas, a proposta viola a
garantia prevista no artigo 5, inciso XXXV, no sentido de que a lei no
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excluir da apreciao do Poder Judicirio leso ou ameaa a direito, pois,
evidentemente, o teor das normas coletivas pode gerar leso a direitos, inclusive
aos constitucionalmente assegurados como deixa antever o prprio art. 611-B,
proposto no projeto cabendo ao Poder Judicirio decidir a esse respeito.
Assim, padece do vcio de inconstitucionalidade norma que
pretenda excluir leso a direito da apreciao do Poder Judicirio.
No fosse isso, a proposta caminha em sentido contrrio aos
mais recentes e modernos estudos da Cincia Jurdica do Processo. Com
efeito, considerando a sistemtica criada pelo Novo CPC, de estmulo edio
de smulas e precedentes que orientem os julgados nas instncias
inferiores, justamente para evitar a profuso de recursos e decises e a
prpria insegurana jurdica, causa espcie a srie de limitaes de
contedo e procedimentos para edio de smulas na Justia do Trabalho,
no se conhecendo similares restries nos outros ramos do Judicirio.
Os requisitos exigidos pelo artigo 702, I, f, da Proposta, tornam
praticamente invivel a edio de smulas pelos Tribunais do Trabalho, pois, alm
do enunciado ser aprovado por dois teros dos membros do Tribunal, j dever ter
sido decidida de forma idntica por unanimidade em pelo menos dois teros das
turmas em pelo menos dez sesses diferentes em cada uma delas.
Ademais, a norma do artigo 8, 2 mostra-se desarrazoada, pois a
smula consiste na sntese do entendimento do Tribunal na interpretao das
normas legais e constitucionais, no criando direitos que j no possam ser
extrados do ordenamento jurdico.
Por fim, a proposta no prima pelo equilbrio entre as partes ao vedar
a execuo de ofcio quando a parte estiver representada por advogado (art. 878)
- embora determine a execuo de ofcio das contribuies sociais e, ao mesmo
tempo, determinar que a prescrio intercorrente seja declarada de ofcio (art. 11-
A, 2), estabelecendo desse modo situao que tutela o ru, mas no o autor.
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8. TARIFAO DO DANO EXTRAPATRIMONIAL
O projeto cria a regulamentao da reparao de danos de natureza
extrapatrimonial decorrentes da relao de trabalho, estabelecendo uma tarifao
do valor que o juiz poder fixar, caso procedente o pedido.
A norma classifica os danos em quatro faixas, conforme a ofensa
seja de natureza leve, mdia, grave ou gravssima, para as quais a indenizao
estar limitada ao ltimo salrio contratual do empregado multiplicado por trs,
cinco, vinte ou cinqenta vezes, respectivamente, sendo vedada a acumulao
(art. 223-G, 1, da CLT).
A proposta revela-se preconceituosa e discriminatria em relao
aos trabalhadores, na medida em que nenhum cidado, em nenhuma das
relaes que mantm, de qualquer outra natureza, sofre limitao ao valor da
indenizao pelos danos extrapatrimonais que venha a sofrer.
No aceitvel que apenas e to somente o trabalhador, nas
leses que aconteam no mbito das relaes de trabalho, tenha limitada e
tarifada a indenizao pelos danos sofridos, pois tal exceo resulta
violadora do princpio da igualdade.
Para ilustrar o quanto essa proposta lesiva aos trabalhadores,
basta imaginar uma situao, por exemplo, em que um cliente de uma grande
construtora visite uma obra de edifcio, acompanhado de um operrio
empregado da empresa e ambos sofram um acidente. Nesse caso, a
indenizao devida ao empregado estar limitada ao teto previsto, porm,
para a indenizao do cliente, no haver qualquer limite, podendo ser
livremente fixada pelo juiz, consideradas as particularidades do caso. Assim,
mesmo que a leso sofrida pelo trabalhador seja grave e a do cliente leve, este
poder receber uma indenizao muito superior.
Alm disso, a tarifao do dano extrapatrimonial trabalhista mplica
limitao incompatvel com os direitos assegurados no artigo 5, incisos V e
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X, da CF/88, de resposta proporcional e indenizao integral pelos danos
materiais ou morais sofridos.
A fixao de limites rgidos para a indenizao no permite a
individualizao das situaes e impede a reparao integral do dano em
muitos casos, violando o direto do trabalhador justa e inteira reparao do
agravo sofrido.
Cabe lembrar que o STF j decidiu pela inconstitucionalidade da
tarifao de dano moral (RE 396.386-4) prevista na Lei de Imprensa,
afirmando que A Constituio de 1988 emprestou reparao decorrente do
dano moral tratamento especial - C.F., art. 5, V e X - desejando que a
indenizao decorrente desse dano fosse a mais ampla. Posta a questo nesses
termos, no seria possvel sujeit-la aos limites estreitos da lei de imprensa. ... .
No mesmo sentido a smula 281 do STJ.
Assim, a tarifao do dano extrapatrimonial trabalhista
discriminatria e viola a Constituio Federal.
9. EXCLUSO OU REDUO DA RESPONSABILIDADE DO
EMPREGADOR
O PLC 38/2017, ao reduzir substancialmente o conceito de
grupo econmico instrumento concebido para garantir o pagamento de crditos
trabalhistas pelas entidades beneficiadas pela prestao de trabalho dos
empregados transfere o nus da atividade econmica para os
trabalhadores. O risco do empreendimento, noo bsica da caracterizao
do empregador, passa a ser do empregado.
O afastamento da caracterizao pela mera identidade de scios,
ainda que administradores ou detentores da maioria do capital social, se no
comprovado o efetivo controle de uma empresa sobre as demais e interesse
integrado, a efetiva comunho de interesses e a atuao conjunta esvazia
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completamente o conceito de grupo econmico, uma vez que no ser
possvel responsabilizar todas as empresas que tenham identidade
societria e gerencial e que foram beneficiadas com os servios realizados
pelos trabalhadores. A exigncia de que o trabalhador, no processo do
trabalho, tenha o nus de provar o controle de uma empresa sobre outra ou
a efetiva comunho de interesses torna impossvel a garantia do crdito de
quem prestou servios a determinado empregador e no recebeu os devidos
valores oriundos do contrato de trabalho.
Ademais, o projeto prope que a empresa sucessora somente
responder, em relao s dvidas trabalhistas da sucedida, se houver
comprovao de fraude. No entanto, nem mesmo o Cdigo Civil, que regula
relaes entre iguais, chegou a tanto, em seu art. 1146.
Da mesma forma, ao atribuir carter subsidirio responsabilidade
do scio retirante e limitar s aes ajuizadas at dois anos depois de averbada a
modificao do contrato, dificulta o recebimento dos crditos trabalhistas e diminui
o suporte patrimonial para sua satisfao.
Observe-se que, com relao aos empregados que no rescindirem
os contratos nos dois anos seguintes ao afastamento, a excluso de
responsabilidade absoluta. A prova de fraude na alterao societria
extremamente difcil para o trabalhador produzir em uma ao individual.
Por fim, o projeto dispensa as entidades filantrpicas de penhora ou
garantia do juzo, permitindo que tais empregadores discutam a execuo sem
que o crdito esteja garantido, o que certamente estimula a interposio de
recursos e dificulta o pagamento dos trabalhadores, tornando os processos
excessivamente longos, comprometendo, uma vez mais, a segurana jurdica.
10. CRIAO DA CATEGORIA DO EMPREGADO HIPERSUFICIENTE
O projeto cria uma categoria de empregados com reduo de
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proteo legal, abrindo margem para contratao de direitos inferiores aos
assegurados pela CLT, bem como para subtrao do julgamento das leses
aos seus direitos pela Justia do Trabalho, sujeitando-se arbitragem
individual.
Assim e de acordo com a proposta, para que o trabalhador seja
enquadrado nessa categoria, basta que tenha formao de nvel superior e receba
salrio igual ou superior a duas vezes o teto da Previdncia Social, atualmente
equivalente R$ 10.379,00.
Tais empregados podero negociar individualmente com seus
patres todos os direitos indicados no art. 611-A da CLT, que, pela nova
redao da proposta, passaram a ser exemplificativos, o que, na prtica,
simplesmente lhes retira a proteo legal quanto aos itens expressamente
mencionados e muitos outros aspectos da relao de emprego.
Alm disso, o artigo 507-A prev a possibilidade de incluir nos
contratos clusula compromissria de arbitragem, partindo de premissa
equivocada, pois desconsidera que tambm este grupo de trabalhadores labora
sob dependncia econmica e no possuem condies plenas e livres de
determinar as clusulas do contrato de trabalho, sendo que, mesmo no momento
da contratao, cabe-lhe apenas aderir ao proposto pelo empregador ou desistir
da vaga. A prpria Lei 9307/96 condiciona a eficcia de tais clusulas nos
contratos de adeso, pois presumvel a sua imposio ao contratado.
11. SOBRE A REDUO DE DIREITOS RECONHECIDOS EM LEI OU PELA
JURISPRUDNCIA.
Somam-se aos prejuzos mencionados nos demais tpicos, a
supresso ou reduo de direitos assegurados em Lei ou reconhecidos pela
jurisprudncia reiterada dos Tribunais, diversamente do que afirmam os
defensores do projeto, tais como:
a) acaba com as horas in itinere, previstas no artigo 58, 2, da
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CLT para as situaes em que a empresa est estabelecida em local de difcil
acesso ou no servido por transporte pblico, e o empregador fornecer a
conduo;
b) retira o direito incorporao salarial do valor da funo
gratificada, mesmo quando recebida por longos perodos (art. 468, 2, da
CLT), reconhecido pela smula n 372 do TST;
c) acaba com a exigncia de negociao coletiva para a
dispensa em massa (art. 477-A da CLT), reconhecida pela jurisprudncia como
condio para sua implementao;
d) cria modalidade de resciso do contrato de trabalho por
acordo, com pagamento da metade do aviso prvio e da multa do FGTS (484-
A);
e) atribui ao empregado as despesas pela higienizao do uniforme,
mesmo quando seu uso seja obrigatrio e condio para o desenvolvimento da
atividade econmica ou que seja utilizado para divulgao de produtos ou
logomarcas da empresa ( art. 456-A da CLT);
f) cria obstculos equiparao salarial, ampliando a
possibilidade de tratamento no isonmico dos empregados (art. 461 da
CLT).
A reduo de tais direitos configura retrocesso social, viola diversas
normas constitucionais e em nada contribui para qualificar as relaes de trabalho
ou gerar empregos.
12. SOBRE AS MODALIDADES DE CONTRATAO PARA SUBEMPREGO,
COM RENDA INFERIOR AO SALRIO MNIMO MENSAL.
O PLC 38/2017 cria, ainda, modalidades de contratao em
condies de subemprego, nas quais no assegura nem mesmo o
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recebimento de um salrio mnimo mensal pelo trabalhador, ferindo de morte
norma constitucional sobre este tema. (Art. 7, IV da CF/88)
Esta caracterstica bastante clara no proposto contrato
intermitente (art. 452-A), pois prev apenas o pagamento do salrio mnimo
por hora, sem que seja assegurado um nmero mnimo de horas trabalhadas
no ms. Assim, embora o trabalhador permanea disposio da empresa
durante todo o perodo, aguardando convocao, poder nada receber ao
final do ms, ou receber um valor nfimo, proporcional s horas que o
empregador lhe deu trabalho.
Cabe lembrar que as necessidades vitais dos trabalhadores so
fixas, havendo previso constitucional de um patamar mnimo que assegure
a manuteno de uma vida digna (art. 7, IV, da CF).
No bastasse, caso o trabalhador aceite a convocao e no
comparea, ter de pagar multa equivalente a 50% da remunerao que seria
devida, de modo que poder chegar ao final do ms sem nada receber ou
o que pior - com dvida junto ao empregador, assemelhando-se figura da
servido por dvidas.
Conforme exposto na Nota Tcnica n 01-2017, essa modalidade
perversa de contrato subverte a lgica do sistema de produo, pois transfere aos
empregados os riscos da atividade econmica, em flagrante coliso com os
termos do artigo 2 da Consolidao das Leis do Trabalho.
Ademais, a regulamentao proposta, quanto ao regime de
teletrabalho, exclui os trabalhadores das regras da CLT sobre jornada de
trabalho, fazendo com que, na prtica, no haja limites para sua jornada diria,
nem registro ou controle dos seus horrios de trabalho, embora sejam obviamente
possveis com os meios tecnolgicos atualmente disponveis.
Alm disso, a norma no define a responsabilidade do empregador
pelas despesas com a aquisio ou manuteno dos equipamentos e
infraestrutura necessria para o trabalho ou as despesas dele decorrentes, como
energia eltrica e internet, por exemplo, permitindo que sejam livremente
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estipuladas no contrato de trabalho.
Essa omisso quanto responsabilidade do empregador abre
espao para transferncia de custos e riscos da atividade econmica para o
trabalhador, em razo de sua conhecida hipossuficincia em uma livre negociao
sobre as condies de trabalho.
Acresce que, no tocante s condies de sade e segurana no
trabalho, a nica obrigao atribuda ao empregador de instruir os empregados,
de maneira expressa e ostensiva, quanto s precaues a tomar, o que
claramente insuficiente para prevenir doenas e acidentes de trabalho, pois no
h qualquer garantia de que o ambiente ser seguro e adequado ou que o
empregado possuir e dispender os recursos eventualmente necessrios sua
adaptao.
Por fim, a alterao pretendida no contrato de trabalho a tempo
parcial eleva a jornada mxima admitida nessa modalidade das atuais 25
horas semanais para at 32 horas semanais, consideradas as horas extras
que passa a autorizar.
Dessa forma, a jornada mxima admitida no regime em tempo
parcial passa dos atuais 57% para 73% do contrato a tempo integral,
considerando que a jornada de trabalho semanal estabelecida pelo artigo 7, XIII,
da Constituio Federal de 44 horas.
Essa proximidade da jornada a tempo parcial com a prevista
para o tempo integral descaracteriza a natureza do regime de tempo parcial.
Se, contratando por tempo parcial, o empregador puder contar com empregados
que trabalharo mais que 2/3 da jornada de empregados do regime integral, por
bvio haver enorme encorajamento substituio de empregados em
regime integral, com precarizao de direitos e mera substituio de
empregos de qualidade.
Em decorrncia, haver demisses de trabalhadores contratados
em regime integral e substituio destes por trabalhadores em regime
parcial, que trabalharo jornada considervel, mas recebendo salrio
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inferior. E isto, definitivamente, no gerar empregos nem crescimento
econmico.
Note-se que tambm nessa modalidade no h previso de
pagamento do salrio mnimo mensal, embora 30 horas semanais corresponda
jornada integral de algumas categorias, como a dos bancrios, por exemplo.
13. CONSIDERAES FINAIS.
As mudanas pretendidas na legislao trabalhista pelo PLC
38/2017 contrariam inmeras disposies constitucionais e legais, assim
como desrespeitam compromissos internacionais assumidos pelo Brasil por
meio de tratados de direitos humanos.
Em relao ao negociado sobre o legislado, importante apontar que
os direitos trabalhistas previstos no artigo 7 da Constituio, as normas de
tratados e convenes internacionais ratificados pelo pas (CF, artigo 5, 2) e as
normas legais infraconstitucionais que asseguram a cidadania aos trabalhadores
compem, na feliz expresso do Ministro Maurcio Godinho Delgado, o patamar
mnimo civilizatrio que a sociedade democrtica no concebe ver reduzido em
qualquer segmento econmico-profissional, sob pena de afrontarem a prpria
dignidade da pessoa humana e a valorizao mnima defervel ao trabalho (arts.
1, III e 170, caput, CF/88)9
Por outro lado, sendo possvel o estabelecimento de acordo coletivo
de trabalho com determinada empresa para rebaixar direitos trabalhistas em geral,
e no com as suas concorrentes, claro est o desequilbrio concorrencial para as
outras empresas, gerando a concorrncia desleal, vedada pelo artigo 170, IV, da
Constituio da Repblica e tambm evitada pela disposio do art. 620 da CLT,
mantida sem alterao em mais uma contradio jurdica do projeto de lei
apresentado.
9 DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. 13 ed. So Paulo: Ltr, 2014, p. 1465.
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Em relao s modificaes propostas quanto ao contrato de
trabalho a tempo parcial e ao contrato de trabalho temporrio, bem como na
introduo da prevalncia do negociado sobre o legislado para admitir a aplicao
de normas abaixo do prev o piso legal, percebe-se evidente violao do caput
do art. 7 da Constituio Federal, no qual se prev que novos direitos atribudos
aos trabalhadores devem melhorar e no piorar a sua condio social.
Reconhece-se no projeto violao, tambm, ao Pacto Internacional
dos Direitos Econmicos, Sociais e Culturais, ratificado pelo Brasil, que, em seu
art. 7, prev: Os Estados Partes do presente Pacto reconhecem o direito de toda
pessoa de gozar de condies de trabalho justas e favorveis, que assegurem
especialmente: b) a segurana e a higiene no trabalho; d) o descanso, o lazer, a
limitao razovel das horas de trabalho e frias peridicas remuneradas, assim
como a remunerao dos feriados.
Da mesma forma, h violao ao art. 7 do Protocolo de San
Salvador, tambm ratificado pelo Brasil: Os Estados Partes neste Protocolo
reconhecem que o direito ao trabalho, a que se refere o artigo anterior, pressupe
que toda pessoa goze do mesmo em condies justas, equitativas e satisfatrias,
para o que esses Estados garantiro em suas legislaes, de maneira particular:
e) segurana e higiene no trabalho; g) limitao razovel das horas de trabalho,
tanto dirias quanto semanais.
Ainda em relao durao do trabalho, cabe lembrar o art. 24 da
Declarao Universal dos Direitos humanos: toda pessoa tem direito a repouso e
lazer, inclusive a limitao razovel das horas de trabalho e a frias peridicas
remuneradas e tambm o art. 11 da Declarao Sociolaboral do Mercosul: Todo
trabalhador tem direito jornada no superior a oito horas dirias, em
conformidade com as legislaes nacionais vigentes nos Estados Partes e o
disposto em conveno ou acordo coletivo de trabalho, sem prejuzo de
disposies especficas para a proteo de trabalhos perigosos, insalubres ou
noturnos.