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TÍTULO: DISPENSA POR EMERGÊNCIA/CALAMIDADE PÚBLICA: NOVOS RUMOS MARISA MIDORI ISHII [email protected] [email protected]

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TÍTULO: DISPENSA POR EMERGÊNCIA/CALAMIDADE PÚBLICA: NOVOS

RUMOS

MARISA MIDORI ISHII

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DA DISPENSA POR EMERGÊNCIA E CALAMIDADA PÚBLICA:

Iniciemos o trabalho com o ensinamento de Marçal Justen Filho:

“No caso específico de contratações diretas, emergência significa necessidade de atendimento

imediato a certos interesses. Demora em realizar a prestação produziria risco de sacrifício de

valores tutelados pelo ordenamento jurídico. Como a licitação pressupõe certa demora para

seu trâmite, submeter a contratação ao processo licitatório propiciaria a concretização do

sacrifício a esses valores.” (Comentários À Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 11ª

ed., São Paulo: Dialética, 2005, p. 238).

DA “EMERGÊNCIA FABRICADA”:

Quando nos deparamos com a idéia de contratação direta em caso de emergência, logo

associamos o conceito à emergência/calamidade pública decorrente de desastres naturais.

No entanto, no outro extremo do conceito, encontramos hoje o que a doutrina denomina

“emergência ou urgência fabricada”.

Trata a “emergência fabricada” da situação na qual a Administração, por desídia ou intenção

deliberada do agente público, não adota providências cabíveis para a realização de

procedimento licitatório com a devida antecedência, gerando a extrema necessidade para a

contratação, o que autorizaria, com fulcro no art. 24, IV, da Lei nº 8.666/93, a dispensa de

licitação.

Ou seja, a Administração deixa de tomar tempestivamente as providências necessárias à

realização da licitação previsível, mas é autorizada a contratar diretamente.

Assim, por exemplo, se chega a termo um contrato sem nova licitação para nova contratação

por desídia do administrador, desde que preenchidos os requisitos abaixo mencionados,

poderia o administrador contratar diretamente, nos mesmos termos da dispensa concedida em

razão de situação de calamidade pública, mas não sem a devida apuração de

responsabilidades.

Qual seria então o ponto comum entre duas situações tão díspares que permitem a dispensa da

licitação nos termos do mesmo artigo 24, inciso IV, da lei 8666/93? Qual a conseqüência

desta inovação no universo limitado da contratação direta?

O Tribunal de Contas da União vem admitindo a possibilidade de contratação direta nos casos

de “emergência fabricada”, tendo em vista o interesse público. No entanto, uma vez detectada

a negligência, desídia ou má-fé do agente público, ele deverá ser responsabilizado.

Nestes termos, o Acórdão n.º 3521/2010-2ª Câmara, TC-029.596/2008-2, do Tribunal de

Contas da União, da lavra do relator Ministro Benjamin Zymler, (06.07.2010), demonstrou

seu novo posicionamento.

“(...) em antiga jurisprudência deste Tribunal, Decisão n.º 347/94 – Plenário, segundo a qual a

dispensa de licitação é cabível desde que a situação adversa, dada como de emergência ou de

calamidade pública, não se tenha originado, total ou parcialmente, da falta de planejamento,

da desídia administrativa ou da má gestão dos recursos disponíveis”. No entanto, o relator

chamou a atenção para o fato de que “a jurisprudência desta Corte de Contas evoluiu,

mediante Acórdão n.º 46/2002 – Plenário”, no sentido de que também é possível a contratação

direta quando a situação de emergência decorre da falta de planejamento, da desídia

administrativa ou da má gestão dos recursos públicos, devendo-se analisar, para fim de

responsabilização, a conduta do agente público que não adotou tempestivamente as

providências cabíveis”. (gn)

A doutrina, por sua vez, tende a ser um pouco mais restritiva, estabelecendo limitações à

contratação direta nos casos de “emergência fabricada”. Em suma, entende a doutrina que

caso o administrador decida contratar diretamente, deve verificar se é de fato caso de

emergência e se a contratação direta é a melhor possível nas circunstâncias. E só a partir daí,

deve-se fazer a contratação pelo menor prazo e com objeto mais limitado possível, visando

afastar o risco de dano irreparável. Simultaneamente, deve desencadear a licitação

indispensável.

Um dos objetivos do presente trabalho é demonstrar que, uma vez aceita a “emergência

fabricada” como causa de dispensa do inciso IV, do artigo 24, da lei 8666/93, criou-se um

critério seguro para as dispensas de licitação em caso de emergência e calamidade pública.

Mas antes, analisemos os requisitos da dispensa no caso de emergência e calamidade pública,

incluindo a situação de “emergência fabricada”.

REQUISITOS DA DISPENSA DA LICITAÇÃO:

Art. 24. É dispensável a licitação:

...

IV - nos casos de emergência ou de calamidade pública, quando caracterizada urgência de

atendimento de situação que possa ocasionar prejuízo ou comprometer a segurança de

pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens, públicos ou particulares, e somente para

os bens necessários ao atendimento da situação emergencial ou calamitosa e para as parcelas

de obras e serviços que possam ser concluídas no prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias

consecutivos e ininterruptos, contados da ocorrência da emergência ou calamidade, vedada a

prorrogação dos respectivos contratos;

Art. 26. As dispensas previstas nos §§ 2o e 4o do art. 17 e no inciso III e seguintes do art. 24,

as situações de inexigibilidade referidas no art. 25, necessariamente justificadas, e o

retardamento previsto no final do parágrafo único do art. 8o desta Lei deverão ser

comunicados, dentro de 3 (três) dias, à autoridade superior, para ratificação e publicação na

imprensa oficial, no prazo de 5 (cinco) dias, como condição para a eficácia dos atos. (Redação

dada pela Lei nº 11.107, de 2005)

Parágrafo único. O processo de dispensa, de inexigibilidade ou de retardamento, previsto

neste artigo, será instruído, no que couber, com os seguintes elementos:

I - caracterização da situação emergencial ou calamitosa que justifique a dispensa,

quando for o caso;

II - razão da escolha do fornecedor ou executante;

III - justificativa do preço.

IV - documento de aprovação dos projetos de pesquisa aos quais os bens serão

alocados. (Incluído pela Lei nº 9.648, de 1998)

Com a possibilidade de contratação direta em caso de “emergência fabricada” os requisitos

dos artigos 24, inciso IV e 26 da lei 8666/93, deverão ser analisados com maior rigor,

vejamos.

Para a melhor compreensão, dividiremos os requisitos em três partes.

1. UM PARA CARACTERIZAR A SITUAÇÃO EMERGENCIAL E

CALAMIDADE PÚBLICA

POSIÇÃO DO TCU:

- Antiga posição, mas na mesma linha de entendimento acerca dos pressupostos necessários à

contratação direta por emergência, o Tribunal de Contas da União tinha o entendimento

exarado conforme decisão do Plenário nº 347/94, de relatoria do Ministro Carlos Átila, abaixo

transcrito:

“Calamidade pública. Emergência. Dispensa de licitação. Lei nº 8.666/93, art. 24, IV.

Pressupostos para aplicação.

1 – que a situação adversa, dada como de emergência ou de calamidade pública, não se tenha

originado, total ou parcialmente, da falta de planejamento, da desídia administrativa ou

da má gestão dos recursos disponíveis, ou seja, que ela não possa, em alguma medida,

ser atribuída a culpa ou dolo do agente público que tinha o dever de agir para prevenir

a ocorrência de tal situação;

2 – que exista urgência concreta e efetiva do atendimento a situação decorrente do estado

emergencial ou calamitoso, visando afastar risco de danos a bens ou à saúde ou vida de

pessoas;

3 – que o risco, além de concreto e efetivamente provável, se mostre iminente e especialmente

gravoso;

4 – que a imediata efetivação, por meio de contratação com terceiro, de determinadas obras,

serviços ou compras, segundo as especificações e quantitativos tecnicamente apurados, seja o

meio adequado, efetivo e eficiente de afastar o risco iminente detectado.” (gn)

- Decisão mais recente do TCU admitindo a denominada “emergência fabricada”:

“(...) Representação oferecida ao TCU apontou possíveis irregularidades na “contratação

emergencial de empresa para prestação de serviços de gestão de sistemas de informação

pelo Departamento Nacional de Produção Mineral – DNPM”. O Diretor-Geral e o Diretor

de Administração foram chamados em audiência em razão da suposta “não adoção de

providências cabíveis para que fosse promovido o procedimento licitatório com a devida

antecedência, o que teria evitado duas contratações emergenciais consecutivas da empresa

Montana Soluções Corporativas Ltda. e, posteriormente, da empresa CPM Braxis, para

a prestação de serviços técnicos especializados em informática”. A unidade técnica propôs

a rejeição das justificativas apresentadas pelos responsáveis, com a consequente aplicação de

multa, por entender que a situação de emergência teria resultado, na verdade, da morosidade

na condução do certame, o que acarretara as contratações emergenciais. Em seu voto, o

relator frisou que a proposta da unidade instrutiva baseava-se “em antiga

jurisprudência deste Tribunal, Decisão n.º 347/94 – Plenário, segundo a qual a dispensa

de licitação é cabível desde que a situação adversa, dada como de emergência ou de

calamidade pública, não se tenha originado, total ou parcialmente, da falta de

planejamento, da desídia administrativa ou da má gestão dos recursos disponíveis”. No

entanto, o relator chamou a atenção para o fato de que “a jurisprudência desta Corte de

Contas evoluiu, mediante Acórdão n.º 46/2002 – Plenário”, no sentido de que também é

possível a contratação direta quando a situação de emergência decorre da falta de

planejamento, da desídia administrativa ou da má gestão dos recursos públicos,

devendo-se analisar, para fim de responsabilização, a conduta do agente público que não

adotou tempestivamente as providências cabíveis. No caso concreto, acerca da

responsabilidade dos gestores, o relator entendeu que não se deveria atribuir-lhes culpa por

eventual demora, uma vez que os processos de licitação abertos com vistas a contratar os

referidos serviços não lograram êxito por motivos alheios às atribuições funcionais dos

responsáveis. Na verdade, o DNPM se viu obrigado a anular tais certames em virtude de

decisões proferidas ou pelo Poder Judiciário ou pelo TCU ou por decisão do próprio órgão,

em razão de vícios insanáveis. Também com base nas informações prestadas pelos gestores e

nos documentos constantes dos autos, o relator não vislumbrou qualquer intenção do DNPM,

ao realizar os contratos emergenciais em comento, de privilegiar determinada empresa, haja

vista a alternância das contratações. Ao final, divergindo do entendimento da unidade técnica

no sentido de sancionar os gestores chamados em audiência, o relator propôs e a Segunda

Câmara decidiu considerar improcedente a representação”. (Acórdão n.º 3521/2010-2ª

Câmara, TC-029.596/2008-2, rel. Min. Benjamin Zymler, 06.07.2010). (gn)

(a ementa do Acórdão TCU n.º 3521/2010 - 2ª Câmara disponibilizada no Informativo de

Jurisprudência sobre Licitações e Contratos do TCU, edição nº 24, referente às sessões

realizadas em 06 e 07 de julho de 2010).

Posto isso, os argumentos e teses ora esposados conduzem a conclusão de que a contratação

direta com base na dispensa de licitação por emergência, ainda que em caso de “emergência

fabricada”, terá assegurada sua legalidade e licitude, uma vez cabalmente demonstrados a

potencialidade do dano o qual pretende combater, bem como a comprovação técnica de que o

objeto a ser adquirido por meio da dispensa é essencial para a diminuição ou inocorrência do

prejuízo.

Concluimos com o doutrinador Antônio Carlos Cintra do Amaral (em “Licitações nas

empresas estatais” – São Paulo, McGraw Hill, 1979, pg. 54):

“a emergência é caracterizada pela inadequação do procedimento formal licitatório ao caso

concreto. Em outras palavras, um caso é emergência quando reclama solução imediata, de tal

modo que a realização de licitação, com os prazos e formalidades que exige, pode causar

prejuízo relevante ou comprometer a segurança de pessoas, obras, serviços ou bens, ou ainda

provocar a paralisação ou prejudicar a regularidade de suas atividades específicas”.

2. PRAZO E OBJETO:

Art. 24. É dispensável a licitação:

IV - nos casos de emergência ou de calamidade pública, quando caracterizada urgência

de atendimento de situação que possa ocasionar prejuízo ou comprometer a segurança de

pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens, públicos ou particulares, e somente

para os bens necessários ao atendimento da situação emergencial ou calamitosa e para

as parcelas de obras e serviços que possam ser concluídas no prazo máximo de 180

(cento e oitenta) dias consecutivos e ininterruptos, contados da ocorrência da

emergência ou calamidade, vedada a prorrogação dos respectivos contratos;

A contratação direta deverá objetivar apenas a eliminação do risco de prejuízo, não podendo a

execução do contrato superar o prazo de 180 dias (vedada a prorrogação).

Isso porque a contratação direta, neste caso, é uma espécie de atividade acautelatória de

interesses relevantes. O objeto do contrato restringe-se ao mínimo necessário para afastar a

concretização do dano.

A) OBJETO:

POSIÇÕES: DOUTRINA

FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby. Contratação direta sem licitação: modalidades,

dispensa e inexigibilidade de licitação. 5. ed. Brasília: Brasília Jurídica, 2000, p.324:

“Da análise atenta do dispositivo em comento, depreende-se que não é possível ao agente

público pretender utilizar uma situação emergencial para dispensar a licitação em aquisições

que transcendam o objeto do contrato, que, nesses casos emergenciais, deve ser feito tão-

somente no limite indispensável ao afastamento do risco. Ou seja, só é permitida a aquisição

dos bens necessários ao atendimento da situação emergencial. Deverá haver, portanto, íntima

correlação entre o objeto pretendido e o interesse público a ser atendido.

Exemplificando o que foi exposto, Fernandes afirma:

[...] Há correlação entre uma explosão acidental, envolvendo dutos de combustível, ferindo

pessoas e a contratação de serviços médicos sem licitação, com determinado hospital. Não

haverá correlação se, tendo por causa o mesmo evento, um município pretender comprar

caminhões-pipa, pois, embora estes sejam úteis em eventual combate a incêndio, não há a

menor correlação entre o fato que se presencia como emergente e a instrumentalização do

aparelho estatal para evitar a sua repetição. A correlação entre o objeto do futuro contrato e o

risco, limitado, cuja ocorrência se pretenda evitar, deve ser íntima, sob pena de incidir o

administrador em ilícita dispensa de licitação”.

B) PRAZO:

A contratação direta deverá objetivar apenas a eliminação do risco de dano ou prejuízo, não

podendo a execução do contrato superar a cento e oitenta dias.

Esse limite foi dado à Administração para que se pudesse resolver o problema que existe

temporariamente e, durante esse prazo, fosse iniciado um processo mais amplo, se necessário.

Isso acarretará em um fracionamento justificado, porque visa a resguardar o interesse maior

da contratação imediata, que evita a concretização de um dano irreparável ou de difícil

reparação.

Regra: O art. 24, IV, também prevê que somente as parcelas de obras e serviços que possam

ser concluídas no prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias consecutivos e ininterruptos,

contados da ocorrência da emergência, são passíveis de contratação emergencial. Assim,

mesmo que ocorram quaisquer fatos alheios à vontade das partes, o tempo do ajuste é contado

de forma contínua, a partir do fato e não da contratação, sem olvidar a impossibilidade de

prorrogação.

Por outro lado, se, durante o prazo da contratação emergencial, ocorrer outro caso de

emergência, poderá a Administração firmar outro (s) contrato (s) no mesmo prazo, desde que

atendidas, a cada nova contratação, as formalidades do art. 26. (FERNANDES, 2000)

Sobre o assunto, Ivan Barbosa Rigolin e Marco Túllio Bottino (1995 apud FERNANDES,

2000, p. 326) também entendem que caso outro estado emergencial ou calamitoso ocorra

dentro dos cento e oitenta dias do primeiro, outra aquisição, devidamente justificada, através

de outra contratação direta, sempre poderá ser realizada – e ainda que seja com a mesma

pessoa física ou jurídica; o que se veda é a prorrogação de um mesmo contrato para além de

cento e oitenta dias.

Logo, concluímos que pode haver nova contratação se outro estado emergencial ou

calamitoso, justificado, ocorrer dentro dos 180 dias. Nova contratação que deve preencher os

requisitos. O que se veda é a prorrogação.

Devemos, então, distinguir dois institutos que, geralmente, são tratados como sinônimos,

quais sejam a prorrogação e a renovação dos contratos administrativos. Esta pressupõe a

celebração de um novo contrato, desde que atendidos os requisitos exigidos pela lei, enquanto

a prorrogação consiste no alongamento do mesmo contrato (original).

Destarte, o TCU já se pronunciou sobre a questão:

O TCU entendeu que é admissível a celebração de contrato provisório para prestação de

serviços até a realização da nova licitação, quando ficar caracterizada a urgência de

atendimento à situação que poderá ocasionar prejuízo ou comprometer a segurança de

pessoas, serviços e instalações. [TCU. Processo n° 019.983/93-0. Decisão n° 585/1994 –

Plenário]. (FERNANDES, 2005, pg. 415).

No caso de “emergência fabricada”, no entanto, dada sua peculiaridade, não permitiria a

renovação, sob pena de caracterização de má fé. Isso porque a demonstração de boa fé do

administrador dependerá da abertura de processo licitatório no momento da contratação

direta.

Todavia, não podemos estipular regras que o caso concreto invalide. Logo, a renovação, neste

caso, parte de uma proibição como pressuposto de caracterização da boa fé do adminstrador.

E, se realmente necessária, em situação excepcionalíssima, somente com autorização superior,

retirada qualquer discricionariedade do administrador tido como desidioso.

C) REQUISITOS DO ARTIGO 26:

Artigo 26:

...

Parágrafo único. O processo de dispensa, de inexigibilidade ou de retardamento, previsto

neste artigo, será instruído, no que couber, com os seguintes elementos:

I - caracterização da situação emergencial ou calamitosa que justifique a dispensa,

quando for o caso;

II - razão da escolha do fornecedor ou executante;

III - justificativa do preço.

IV - documento de aprovação dos projetos de pesquisa aos quais os bens serão alocados.

(Incluído pela Lei nº 9.648, de 1998)

Passemos aos requisitos ainda não analisados.

1. RAZÃO DA ESCOLHA DA EMPRESA CONTRATADA:

Segundo a doutrina, para a contratação direta é necessário que o ente possua dotação

orçamentária.

Depois, a contratante deve possuir capacidade jurídica e regularidade fiscal além de preencher

os requisitos de capacidade técnica e econômico-financeira compatíveis com as exigências do

objeto a executar.

Nos casos de emergência, o tempo passa a ser determinante. Outros fatores tornam-se

preponderantes como a confiabilidade. Sendo assim, na razão da escolha do contratado,

poderão alguns valores serem sacrificados em prol de outros (Antonio Carlos Cintra, 2006).

No entanto, no caso de “emergência fabricada, a confiabilidade não deve ser um fator

determinante da escolha, muito embora não possa ser afastada de todo. Dada a necessária

análise da conduta do administrador, a confiabilidade pode ser levada em conta,

especialmente quando o contratado já realizou eficazmente contratos anteriores e a capacidade

técnica o indiquem como escolha ideal.

Isso porque, ao dispensar a licitação para uma contratação com fundamento em emergência, a

Administração está arriscando-se a, se não cumprido o prazo determinado, ver frustrar-se seu

objetivo de atender ao interesse social subjacente, apesar da medida excepcional tomada.

2. JUSTIFICATIVA DO PREÇO:

É necessário que o contratante junte aos autos do processo as propostas comerciais das

empresas proponentes, bem como a consulta aos preços de mercado através de órgão oficial,

para efeito de comparação de preço, pois a necessidade da sociedade ou da Administração não

pode justificar preços abusivos, sob pena de ver frustrada a moralidade na seleção das

propostas.

Nessa esteira, o TCU já decidiu que é necessário rigor na análise dos valores dos contratos

emergenciais, para que se evite o superfaturamento, pois sempre haverá os que se aproveitam

da premência da situação para cobrar preços abusivos:

[...] é irregular compra com valor superfaturado por emergência. [TCU. Processo n°

550.790/91-8. Decisão n° 060/1997 – 2ª Câmara].. (FERNANDES, 2005, pg. 418).

No caso de “emergência fabricada” o requisito preço tem valor preponderante e deve

prevalecer sobre o fator confiabilidade por trata-se de critério objetivo e seguro.

3. PLANO DE TRABALHO E PROJETO BÁSICO:

Em se tratando de serviços ou obras emergenciais também deve ser juntado aos autos o Plano

de Trabalho e Projeto Básico, devidamente aprovados pela autoridade competente.

Assim entende o TCU:

“[...] ausência de projeto básico e outros motivos irregulares, ensejou multa de R$ 10.000,00

(fev/2003). [TCU. Processo n° 016.224/2001-2. Acórdão n° 100/2003 – Plenário].

(FERNANDES, 2005, pg. 427)”.

Trata-se de um documento onde a Administração explicita os motivos da contratação direta,

acompanhados da ocorrência de todos os requisitos determinados por lei para que o órgão

possa contratar diretamente.

Nestes casos, também deverão ser demonstradas as razões da escolha do fornecedor ou

executante e explicitar a justificativa do preço contratado. Para dar cumprimento ao que

determina a Lei nº 8.666/93, o processo deverá ser acompanhado dos respectivos pareceres

técnicos ou jurídicos emitidos para a contratação direta.

Dentro do permitido pelas limitações naturais da urgência, no caso de “emergência

fabricada”, é essencial o cumprimento deste requisito de forma mais detalhada possível,

podendo ainda, por sua objetividade, ser tido também como requisito preponderante.

DA APURAÇÃO DE RESPONSABILIDADES:

Em princípio, deve haver a apuração de responsabilidades apenas em casos de “emergência

fabricada”. No entanto, como já dito anteriormente, não é possível estabelecer uma regra que

será invalidade posteriormente pelo caso concreto. Logo, não é prematuro afirmar que sempre

que necessário, haverá a apuração de responsabilidades. Mas em que medida?

No caso específico de “emergência fabricada”, o Tribunal de Contas da União já previu

(Acórdão n.º 3521/2010-2ª Câmara, TC-029.596/2008-2, rel. Min. Benjamin Zymler,

06.07.2010) a necessidade de analisar a conduta do agente público que não adotou

tempestivamente as providências cabíveis, para fins de responsabilização.

Mas que espécie de responsabilização?

Indubitavelmente a conduta do administrador que causa lesão ao erário, subsume-se ao artigo

10, inciso VIII, Lei 8429/92 que diz:

“Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação

ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação,

malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta

lei, e notadamente:

(...)

VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente; (...)”

E a pena aplicada:

Art. 12. Independentemente das sanções penais, civis e administrativas previstas na legislação

específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes cominações, que

podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade do fato:

(Redação dada pela Lei nº 12.120, de 2009).

II - na hipótese do art. 10, ressarcimento integral do dano, perda dos bens ou valores

acrescidos ilicitamente ao patrimônio, se concorrer esta circunstância, perda da função

pública, suspensão dos direitos políticos de cinco a oito anos, pagamento de multa civil de até

duas vezes o valor do dano e proibição de contratar com o Poder Público ou receber

benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por

intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos;

Ainda, tratando-se especificamente das sanções aos atos de improbidade administrativa, tem-se

também o disposto no art. 37, § 4º, da CF/88, que diz:

“Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda

da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e

gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível”.

Elucidativo o entendimento jurisprudencial do STJ:

“ADMINISTRATIVO - AGRAVO REGIMENTAL - IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

- ART. 10 DA LEI Nº 8.429/92 - SANÇÃO DO ART. 12, II, DA LEI DE IMPROBIDADE -

BOA-FÉ DO AGENTE - CRITÉRIOS DE ANÁLISE.

1. O contrato administrativo foi anulado porque deveria ter sido precedido de necessária

licitação. Reconheceu-se aí ato de improbidade capitaneado no art. 10, VIII, da Lei de

Improbidade Administrativa.

2. A jurisprudência desta Corte está no sentido de que, uma vez reconhecida a improbidade

administrativa, é imperativa a aplicação das sanções descritas no art. 12, II, da Lei de

Improbidade. A única ressalva que se faz é que não é imperiosa a aplicação de todas as

sanções descritas no art. 12 da Lei de Improbidade, podendo o magistrado dosá-las segunda a

natureza e extensão da infração.

3. Os atos de improbidade só são punidos a título de dolo, indagando-se da boa ou má fé

do agente, nas hipóteses dos artigos 9º e 11 da Lei 8.429/92. (REsp 842.428/ES, Rel. Min.

Eliana Calmon, DJ21.5.2007)

4. De todas as seis penalidades descritas no art. 12, II, da Lei de Improbidade, as únicas

aplicadas, e de forma razoável, foram as de ressarcimento do dano de forma solidária e de

multa civil, fixada, ainda por cima, em montante menor que o grau máximo, ou seja, em uma

vez o valor do dano. Agravo regimental improvido.” (gn)

(grifou-se – STJ, REsp 479812, Agr. Reg. no REsp. 2002/0130796-0, 2ª Turma, Relator

Humberto Martins, j. 2/8/2007, DJ 14/8/2007, p. 281)

No entanto, o que se pretende estudar aqui é a responsabilização do administrador desidioso

ainda que não tenha havido prejuízo ao erário.

Não olvidemos que, a doutrina pacífica, entende que o ato de improbidade não tem natureza

penal e sim civil. Desta forma, é possível afirmar que a mera contratação direta, neste caso, já

configuraria o dolo necessário para a responsabilização do administrador. Mas há nuances

nsta configuração.

A Lei 8429/92 estabelece três espécies de atos de improbidade:

• os que importam enriquecimento ilícito (art. 9º);

• os que causam lesão ao patrimônio público (art. 10); e

• os que atentam contra os princípios da Administração Pública (art.11).

De fato, a despeito da ausência de previsão específica de sua conduta, ao que parece, a atitude

do administrador desidioso subsume-se ao ato de improbidade previsto no caput, do artigo 11,

da lei 8429/92 que prevê:

“Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da

administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade,

imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente (...)”

Isso porque ao não realizar o procedimento licitatório sem motivo justificável, ao que parece,

atentou-se contra os princípios da moralidade pública e o da legalidade.

No caso do artigo 11, ressalte-se que a Primeira Seção do STJ unificou a tese de que o

elemento subjetivo necessário para caracterizar a improbidade é o dolo genérico, ou seja, a

vontade de realizar ato que atente contra os princípios da administração pública. Assim, não é

necessária a presença de dolo específico, com a comprovação da intenção do agente (REsp

951.389).

No julgamento do REsp 980.706, o então ministro Luiz Fux (atualmente no Supremo

Tribunal Federal) lembrou que, de acordo com a jurisprudência do STJ, o elemento subjetivo

é essencial para a caracterização da improbidade administrativa, que está associada à noção de

desonestidade, de má-fé do agente público.

Permanece, todavia, o grande desafio de diferenciar o administrador ímprobo daquele que

comete mera irregularidade, tolerável aos olhos do Estado.

Necessário faz-se, portanto, apenas a demonstração de má fé do administrador para a

caracterização do dolo.

E, o que propõe o presente trabalho é a caracterização da má fé do administrador não apenas

pela sua conduta no ato da contratação direta mas sim durante todo o procedimento, ou seja,

até a regularização da situação com a efetiva contratação mediante licitação.

Desta forma, atuando com essa espécie de “presunção de dolo”, o administrador seria

obrigado a proceder de maneira “duplamente” diligente a fim de elidir a responsabilização.

O administrador que realiza a contratação direta de forma a comprovar que preencheu todos

os requisitos, inclusive as ressalvas dos casos de “emergência fabricada” bem como, que,

simultaneamente, iniciou procedimento licitatório, obviamente comprovará que sua conduta

anterior não passava de mera irregularidade, atestando sua boa fé.

Mas o administrador que realizou a contratação direta, mesmo que preenchidos todos os

requisitos da lei, mas que deixou de iniciar procedimento licitatório simultaneamente, não

comprovou sua boa fé, podendo a sua conduta ser caracterizada como ato de improbidade,

inclusive com a aplicação da sanção prevista no artigo 12, inciso III, da lei 8429/92, a saber:

“III - na hipótese do art. 11, ressarcimento integral do dano, se houver, perda da função

pública, suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos, pagamento de multa civil de até

cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente e proibição de contratar com o Poder

Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente,

ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três

anos”.

EMERGÊNCIA E CALAMIDADE PÚBLICA: O SURGIMENTO DE UM NOVO

CRITÉRIO DE DEFINIÇÃO

Como sabido, o conceito de emergência e calamidade pública é subjetivo. Necessário se faz,

portanto, cautela em sua determinação.

O juízo do administrador, neste caso, mostra-se temerário. A solução: adoção de um critério

objetivo de análise.

Para estabelecer este critério objetivo e seguro propomos estabelecer dois patamares extremos

da conceituação. De um lado, a definição de emergência e calamidade pública para fins de

transferência de recursos e de outro, a chamada “emergência fabricada”, hoje admitida pelo

Tribunal de Contas da União, como visto.

O Decreto nº 7257/2010 define emergência e calamidade pública para fins de transferência de

recursos da União para outros entes federativos.

Diz o artigo 2º, incisos III e IV, do referido decreto:

III - situação de emergência: situação anormal, provocada por desastres,

causando danos e prejuízos que impliquem o comprometimento parcial

da capacidade de resposta do poder público do ente atingido;

IV - estado de calamidade pública: situação anormal, provocada por

desastres, causando danos e prejuízos que impliquem o

comprometimento substancial da capacidade de resposta do poder

público do ente atingido;

Ainda, o decreto 5376/05, revogado pelo decreto 7257/10, esclarecia ainda que:

Situação de emergência: o reconhecimento pelo poder público de situação anormal,

provocada por desastres, causando danos superáveis pela comunidade afetada.

Estado de calamidade pública: o reconhecimento pelo poder público de situação anormal,

provocada por desastres, causando sérios danos à comunidade afetada, inclusive à

incolumidade ou à vida de seus integrantes.”

Ou seja, emergência é caracterizada pela necessidade imediata ou urgente de atendimento a

um evento já acontecido ou por acontecer de modo que se possa evitar ou reduzir as

consequências dessa ocorrência. Ao contrário da calamidade, que devido às suas proporções

afeta considerável extensão territorial e número de pessoas, a emergência é particularizada.

Reportemo-nos à “emergência fabricada” já analisada.

Agora podemos estabelecer um “teto” (“emergência fabricada”) e um “piso” (emergência e

calamidade pública para fins de repasse de verbas da União) para as chamadas situações de

emergência e calamidade pública.

E, uma vez estabelecido um patamar máximo e mínimo podemos verificar que, na verdade,

emergência, para fins de dispensa, significa necessidade de contratação que não pode

aguardar os trâmites habituais da licitação pública, sob pena de comprometimento do interesse

público aliado ao desatendimento de alguma demanda social ou pela continuidade de

atividade administrativa.

Logo, o que se conclui é que, para fins de dispensa de licitação por emergência, basta que haja

um motivo independente da vontade da Administração que esteja entre o primeiro e o

segundo conceito.

Isso porque o fator determinante é a necessidade e a urgência da contratação em vista das

consequências da espera do procedimento licitatório.

Diante disso, podemos vislumbrar um critério objetivo e seguro para a contratação direta, ou

seja, toda situação englobada entre o primeiro e o segundo conceito será certamente um caso

de dispensa do artigo 24, inciso IV, da lei 8666/93.

Vejamos.

Entre o primeiro e o segundo conceito encontramos o chamado obstáculo judicial à licitação,

exemplo claro de dispensa de licitação em caso de emergência.

Licitação tempestiva + decisão judicial vedando contratação ou exigindo providências

impeditivas de conclusão do certame = motivo independente da vontade da Administração

que pode ser considerada situação emergencial a depender da urgência da contratação.

Observe-se que a Lei não distingue a fonte causadora da situação emergencial. Por exemplo,

não condiciona a contratação à comprovação de que a emergência foi produzida por causas

naturais. Como visto, basta o risco de dano para autorizar-se a contratação direta. Outra é a

questão de apurar se o dano foi produzido voluntariamente ou não, por evento reprovável ou

não. Daí por que pode se aplicar também o inciso IV, do artigo 24, à hipótese de

impossibilidade de contratar por motivo independente da vontade da Administração.

Com se vê, uma situação peculiar instaura-se nas hipóteses de impossibilidade de contratar

por obstáculo judicial. Isso se passa especialmente nos casos de provimentos jurisdicionais

impeditivos da conclusão de licitação. A Administração instaurara a licitação

tempestivamente, mas, no curso do certame, recorreu-se ao Poder Judiciário e se obteve

decisão vedando a contratação ou impondo observância de certas providências impeditivas da

conclusão do certame. Logo, surge necessidade imperiosa a ser atendida e não há licitação

respaldando a contratação.

Estando este caso entre o “teto” e o “piso” estabelecidos, podemos afirmar que é o caso de

contratação direta, fundada no inciso IV, do artigo 24, lei 8666/93, presumindo-se, de início, a

boa fé do administrador.

CONCLUSÃO:

Diante de novas realidades, um novo desafio: o Estado passa a ter que harmonizar dois

fatores: a necessidade de regras moralizadoras e a satisfação do interesse público.

Esta é a exata situação que se apresenta: de um lado a necessidade da contratação e de outro a

aparente legitimação de conduta violadora da lei.

A solução: razoabilidade e proporcionalidade.

Mas uma nova perspectiva de análise do conceito amplo de emergência/calamidade pública

surge como solução de questões anteriormente obscurecidas pelo subjetivismo.

De um lado o critério dos dois patamares da emergência, de outro a forma de análise da

conduta do administrador desidioso, ímprobo para fins de responsabilização.

De tudo, ganha a sociedade que mantém suas necessidades providas com uma Administração

que presta contas de suas atividades.

BIBLIOGRAFIA

- Jorge Ulisses Jacoby Fernandes: Contratação direta sem licitação, 8ª edição, Editora EF

2009, BH

- Carlos Ary Sundfeld: Fundamentos do Direito Público, 2010, 4ª edição, Editora Malheiros

Marçal Justen Filho: Comentários à lei de licitações e contratos administrativos, 9ª edição,

2002, SP, Editora Dialética

Antônio Carlos Cintra do Amaral: Estudos, pareceres e comentários, 2006 (2010 – 3ª edição

revista e ampliada), Editora Fórum.

AMARAL, Antônio Carlos Cintra do, em Licitações nas Empresas Estatais, São Paulo, 1979,

AMARAL, Antônio Carlos Cintra do. Dispensa de Licitação por emergência. Revista

Diálogo Jurídico, Salvador, CAJ – Centro de Atualização Jurídica, v. I, n° 6, setembro, 2001.

Disponível em: <http://www.direitopublico.com.br>.