8
Dr. Aderbal de Castro Vieira Junior CRM-SP: 81.862 Topiramato no controle dos impulsos O conteúdo deste material é de responsabilidade exclusiva de seu(s) autor(es) e não reflete, necessariamente, o posicionamento do Aché, que apenas patrocina sua divulgação à classe médica.

Topiramato no controle dos impulsos - Cuidados Pela Vidaareamedica.cuidadospelavida.com.br/areamedica/wp-content/upload… · o posicionamento do Aché, que apenas patrocina sua divulgação

  • Upload
    others

  • View
    7

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

  • Dr. Aderbal de Castro Vieira Junior CRM-SP: 81.862

    Topiramato no controle

    dos impulsos

    O conteúdo deste material é de responsabilidade exclusiva de seu(s) autor(es) e não reflete, necessariamente, o posicionamento do Aché, que apenas patrocina sua divulgação à classe médica.

  • Topiramato no contro le dos impulsos

    “compulsão sexual”, que procura circunscrever esse quadro a um espectro obsessivo-compulsivo, “transtorno explosivo intermitente”, que ressalta o aspecto mais propriamente im-pulsivo desse quadro, “dependências químicas” ou “depen-dências de comportamentos”, que procuram aproximar esses comportamentos de modelos de compreensão de depen-dências, ou termos como tricotilomania, jogo patológico ou workaholism, que em si mesmos apenas indicam haver algo de disfuncional nessas práticas.

    O dissenso conceitual e a falta de unidade psicopatológica se refletem nos dois principais manuais de classificação diag-nóstica, que divergem não apenas entre cada uma de suas várias versões, mas também entre um e outro: a CID-101, em sua seção de transtornos de hábitos e dos impulsos, apresenta categorias diagnósticas para jogo patológico, piromania, trico-tilomania e cleptomania. Tem uma seção específica para as dependências químicas. Na seção das disfunções sexuais não orgânicas, abriga o diagnóstico de impulso sexual excessivo. Todos os demais comportamentos impulsivos restariam para uma categoria residual, de “outros transtornos de hábitos e im-pulsos”, e a compulsividade alimentar seria codificada como transtorno alimentar, sem outra especificação. Ou seja, esse grupo de transtornos se espalha por quatro seções diferen-tes do manual. Já no mais recente DSM-V2, a seção especí-fica dedicada aos transtornos do impulso engloba apenas a piromania, o transtorno explosivo intermitente e a cleptomania, devendo a compulsão sexual, a dependência de internet e a oniomania ser classificadas como transtornos do controle do impulso, sem outra especificação. Há igualmente uma seção dedicada às dependências, agora não apenas de substâncias químicas, mas englobando também o jogo patológico. A tri-cotilomania e a dermatotilexomania são citadas na seção de transtornos obsessivo-compulsivos e afins. A compulsividade alimentar recebe uma categoria diagnóstica própria, e não mais de exclusão.

    Em comum nessa vasta coleção de comportamentos, há al-guma medida de inadequação e prejuízo (ao próprio indivíduo ou a terceiros) decorrente de sua prática, algum grau de excesso, em termos de frequência, intensidade e inadequação, e a sen-sação de imperiosidade e de diminuição ou ausência de controle sobre eles. Ao contrário de outros transtornos psiquiátricos mais

    Dr. Aderbal de Castro Vieira Junior CRM-SP: 81.862Médico pela Universidade de São Paulo; psiquiatra pelo HC-FMUSP e pela Unifesp; mestre em Ciências pela FMUSP; psicoterapeuta psicodramatista pela Escola Paulista de Psicodrama; responsável pelo Ambulatório de Tratamento de Dependências de Comportamentos do Programa de Orientação e Atendimento a Dependentes da Unifesp (PROAD)

    Transtornos do controle de impulsos

    A literatura médica vem registrando amplo material a res-peito de uma série bastante heterogênea de quadros envol-vendo a exacerbação e a inadequação de comportamentos presentes em menor grau na vida psíquica saudável, ou mes-mo a adoção de comportamentos normalmente ausentes no psiquismo usual, mas que em condições patológicas se mos-tram desinibidos. O aspecto central de sua fenomenologia não é algum juízo delirante ou alteração de humor, mas um aumen-to de impulsividade ou a insuficiência de mecanismos para a supressão desta.

    Tais descrições diferem muito em termos temporais, desde relatos de psicopatologistas clássicos como Bleuler e Kraepelin sobre a cleptomania no início do século passado até quadros propostos bastante recentemente, como uma alegada dependência de telefones celulares. Também variam quanto à compreensão psicopatológica, com termos como

    Topiramato no contro le dos impulsos

  • Topiramato no contro le dos impulsos

    clássicos, em que alterações formais qualitativas do psiquis-mo estão presentes, neste caso as alterações são basicamente quantitativas, já que vários desses comportamentos estão pre-sentes, de modo perfeitamente adequado, na vida psíquica nor-mal, ou ao menos se pode supor uma raiz etológica em práticas normalmente ausentes em nosso cotidiano, como no caso da dermatotilexomania ou tricotilomania.

    Alguns estudos apontam certo grau de determinação gené-tica na gênese destes quadros: 20% de jogadores patológicos de uma amostra eram parentes em primeiro grau de outros in-divíduos com o mesmo transtorno.3 Gêmeos de outra amostra apresentaram concordância quanto a uma mesma tendência a desenvolver quadros de jogo patológico e dependência de álcool.4 Estudos em animais e em humanos associam a defi-ciência de monoamino-oxidase plaquetária e no sistema ner-voso central a maior impulsividade expressa.5,6 Outros relatos associam lesões de porções de lobos frontais em humanos a conduta mais impulsiva em uma série de tarefas propostas.7,8 Todos esses achados são mais bem-sucedidos em apontar os mecanismos fisiológicos envolvidos na impulsividade do que em estabelecer, por si sós, um modelo de compreensão de pro-cesso patológico, uma vez que a distinção entre um impulso saudável e bem adaptativo e um transtorno de controle do im-pulso permanece muito contingente a fatores extrafisiológicos, como valores morais, convenções sociais, padrões culturais e sua variabilidade histórica.

    Entre a absoluta fragmentação de abordar cada um des-ses quadros como uma entidade estanque e a inclusivida-de excessiva de abarcar todos eles sob a ampla rubrica de transtornos de controle dos impulsos, ainda parece muito útil recorrer à categorização proposta por Jaspers9 para os as-pectos envolvidos na produção de comportamentos:

    1. impulso: inquietação ou tensão primária, acúmulo de energia que busca uma descarga, sem conteúdo em si mesmo e que não se direciona em origem a um objeto específico. Procura se conectar a algum conteúdo a partir da situação ou oportunidade apre-sentada, de modo a ter vazão, na forma de uma ação. Distúrbios propriamente do impulso seriam, então, quadros como o transtorno explosivo intermitente, a cleptomania ou a automutilação;

    2. instintos: tendências inconscientes, involuntárias, naturais, atávicas, evolutivamente determinadas a desempenhar determinadas ações. Têm conteúdo e objeto em sua origem, são comuns a membros de uma mesma espécie e têm intensidade também re-lativamente comparável entre os indivíduos. Entre os transtornos dos instintos, caberiam quadros como o impulso sexual excessivo, a compulsividade alimentar, dermatotilexomania ou tricotilomania;

    3. vontade: opção consciente e deliberada por concreti-zar determinada representação mental, com conheci-mento dos meios para tal e de suas possíveis conse-quências. Caberiam aqui as dependências químicas, o jogo patológico, workaholism, vigorexia ou dependên-cia de internet.

    TopiramatoO topiramato foi sintetizado em 1979 e aprovado ini-

    cialmente para tratamento da epilepsia e de quadros con-vulsivos e para a profilaxia de enxaquecas, nos Estados Unidos, em 1996. Em 2012, também nos Estados Unidos, após vários anos de estudo e vários anos de uso extrabula, também foi aprovado como tratamento para perda de peso, em síndromes como a obesidade e o ganho de peso indu-zido por antipsicóticos. Seu mecanismo de ação primário envolve a inibição da transmissão glutamatérgica e o au-mento da transmissão GABAérgica, o que responderia por suas propriedades anticonvulsivantes, e há hipótese de que promova também neuroestabilização e redução da liberação de dopamina no sistema corticomesolímbico descendente, envolvido no mecanismo de recompensa e reforço de com-portamentos.10 A inibição da liberação de glutamato se mos-trou capaz de prevenir a busca por drogas em experimentos com animais e humanos.11 No campo do tratamento das de-pendências e dos transtornos relacionados ao impulso, já há razoável literatura sugerindo sua eficácia no tratamento do alcoolismo e da dependência de cocaína e da compul-são alimentar periódica, e mais recentemente começam a aparecer estudos sobre sua aplicabilidade a outros quadros, como cleptomania12,13, tricotilomania14, jogo patológico15,16 e impulso sexual excessivo.17,18

    Topiramato no contro le dos impulsos

  • Topiramato no tratamento dos transtornos do impulso

    AlcoolismoDois ensaios clínicos duplo-cegos randomizados, com

    topiramato versus placebo, incluindo 150 e 371 pacientes alcoolistas, com exclusão de indivíduos portadores de ou-tros quadros psiquiátricos que não a dependência alcoólica, com a administração de doses crescentes de topiramato até 300 mg/dia, ao longo de um período de 12 semanas, apontam diminuição significativa do número de dias de uso de bebi-da por semana e, consequentemente, aumento do número de dias de abstinência; diminuição da quantidade de episódios de uso e da quantidade de álcool nos dias em que este foi usado, e, portanto, maior manutenção em uma faixa de uso mais “se-guro” da bebida.19,20 Outros estudos consistindo em descrições de casos clínicos ou pequenas séries de casos ou ensaios clíni-cos abertos apontam melhora do padrão de consumo de álcool com o uso do topiramato, levados em conta não apenas as limitações dos desenhos dos estudos e relatos, mas também o fato de o medicamento ter sido usado como coadjuvante no processo de tratamento, ao lado de vários outros, e o fato de os pacientes apresentarem diversas comorbidades psiquiátricas ao lado da dependência alcoólica.21-23

    Dois outros ensaios clínicos, um deles aberto24 e o outro duplo-cego25, apontam eficácia semelhante entre o topiramato e a naltrexona na melhora de uma série de parâmetros re-lacionados ao uso de álcool, como tempo de abstinência de uso ou número de semanas de uso menos severo, e alguma superioridade do topiramato em medidas secundárias, como qualidade de vida, fissura pelo álcool e, entre os fumantes, pela nicotina. No segundo estudo, que incluiu um grupo placebo, o topiramato se mostrou superior a esse em vários parâmetros.

    CocaínaUm ensaio duplo-cego com topiramato versus placebo26,

    conduzido com dependentes moderados de cocaína, subme-tidos também a terapia cognitivo-comportamental voltada à prevenção de recaída, não encontrou diferença significativa inicial entre os dois, mas identificou tendência à superio-

    ridade do topiramato após a chegada à dose plena deste, de 200 mg/dia.

    Outras drogasOs relatos a respeito do tratamento com topiramato de abu-

    sadores ou dependentes de outras substâncias, como opiáceos e benzodiazepínicos, ainda são incipientes e de pouco peso. Por outro lado, estudos com animais e amostras pequenas de humanos apontaram tendência à potencialização do efeito prazeroso produzido por outros estimulantes, como metanfe-tamina e nicotina, e, portanto, risco de, paradoxalmente, au-mento de seu uso. Efeitos colaterais da substância, principal-mente parestesias e disfunção cognitiva, na forma de prejuízo de memória, foram responsáveis por altas taxas de abandono em vários ensaios, inclusive alguns dos aqui citados.10 Assim, no campo das dependências químicas, há evidências mais robustas da eficácia do topiramato na abordagem do alcoo-lismo, sendo ainda cedo para asseverar sua utilidade para o tratamento da dependência de outras substâncias e seu perfil de efeitos colaterais oferece algum desafio à manutenção de adesão adequada.

    Compulsividade alimentarO topiramato tem sido investigado também no tratamento

    de transtornos alimentares como a bulimia. Mais especifica-mente a respeito da compulsão alimentar periódica, alguns estudos sugerem eficácia da substância na diminuição do nú-mero e da severidade de episódios de descontrole alimentar, com tolerabilidade bastante razoável a efeitos colaterais.27,28

    CleptomaniaUm relato de caso descreve uma paciente com com-

    portamento cleptomaníaco clássico, iniciado na mesma época em que começou a apresentar quadro de epilep-sia parcial complexa com foco em lobo temporal. Com o tratamento de seu quadro neurológico com 300 mg/dia de topiramato, o comportamento cleptomaníaco cessou completamente, sugerindo que se tratasse de sintoma in-terictal de sua epilepsia.12

    Em uma série de três casos, um paciente de 18 anos, com diagnóstico prévio de déficit de atenção, apresentou remissão

    Topiramato no contro le dos impulsos

  • completa de seu comportamento cleptomaníaco com o uso de 150 mg/dia de topiramato, após tentativas fracassadas de uso de inibidores seletivos de recaptação de serotonina devi-do a efeitos colaterais. Outra paciente, de 32 anos, com diag-nósticos de transtorno obsessivo-compulsivo e cleptomania, apresentou cessação total desta última com a associação de paroxetina 60 mg/dia e topiramato 100 mg/dia. A terceira pa-ciente, de 28 anos, com diagnóstico primário de síndrome do pânico, também atingiu remissão completa de sua cleptomania com o uso de citalopram 30 mg/dia e topiramato 100 mg/dia.13

    TricotilomaniaEm um estudo iniciado com 14 indivíduos, 35% da amostra,

    uma quantidade relevante, interrompeu o tratamento devido a efeitos colaterais. Dos nove que chegaram ao final de 16 se-manas recebendo entre 50 mg/dia e 250 mg/dia de topirama-to, dois terços apresentaram redução importante na severida-de do comportamento tricotilomaníaco.14

    Impulso sexual excessivoA evidência publicada ainda se resume a poucos re-

    latos de caso. Em um deles, um dependente de sexo não parafílico, submetido a psicoterapia comportamental com resultado insuficiente e tentativas ineficazes de uso de fluoxetina e naltrexona, apresentou remissão completa do seu comportamento sexual inadequado com o uso de 200 mg/dia de topiramato, recidiva deste por ocasião da interrupção do uso e nova remissão plena quando voltou a tomá-lo na mesma dose.17 Em outro caso, um paciente em tratamento para obesidade com apenas 50 mg/dia de topiramato relatou diminuição drástica de comportamento sexual disfuncional não parafílico, com o mesmo padrão de recidiva e nova melhora após descontinuação e reintro-dução da substância.18

    AutomutilaçãoA associação de topiramato 200 mg/dia aos estabilizadores

    de humor (e, posteriormente, eletroconvulsoterapia) de uma paciente de 24 anos, bipolar e portadora de transtorno de per-sonalidade bordeline levou à cessação completa do comporta-mento automutilatório que apresentava. Sua descontinuação,

    mantidos apenas os estabilizadores de humor, levou à recidiva da automutilação, que novamente cessou com a reintrodução do topiramato na mesma dose.29

    Compulsividade por comprasA descrição de caso de uma portadora de depressão maior

    e impulsividade por compras de 37 anos aponta melhora par-cial do quadro depressivo com a administração de venlafaxina até 225 mg/dia e remissão completa deste e do comportamen-to de comprar compulsivamente após a associação de topira-mato até 150 mg/dia.30

    Jogo patológicoEnsaio clínico duplo-cego randomizado comparou a eficá-

    cia de topiramato versus placebo entre pacientes submetidos concomitantemente a quatro sessões de intervenção psicoe-ducacional. Os 15 pacientes que receberam até 300 mg/dia de topiramato, por 12 semanas, apresentaram redução sig-nificativamente maior da fissura por jogar, de comportamen-tos e ideação prevalente relacionados ao jogo, de cognições errôneas e supersticiosas a respeito dos jogos de azar e da quantidade de tempo e de dinheiro gasta nessa atividade, além de melhora significativamente maior da qualidade de vida, em relação ao mesmo número de indivíduos que toma-ram placebo.31

    Outro ensaio clínico, aberto e randomizado, comparou a eficácia do topiramato versus fluvoxamina após 12 se-manas de administração: dos 15 pacientes que receberam 200 mg/dia de topiramato, nove apresentaram remissão completa do comportamento de jogar, três apresentaram grande melhora e três interromperam o tratamento antes do fim do estudo. Dos 16 indivíduos que receberam 200 mg/dia de fluvoxamina, apenas metade chegou ao fim do estudo: seis deles com remissão total e dois com remissão parcial. Da análise dos dados, os autores concluíram serem ambas as drogas igual e consideravelmente eficazes no tratamento do jogo patológico, em monoterapia.16 Essa mesma amos-tra integrou outro estudo, aberto e naturalístico, no qual fo-ram acompanhados pacientes que apresentaram remissão completa do comportamento de jogar e aumento na pon-tuação em uma escala de melhora clínica global com o uso

    Topiramato no contro le dos impulsos

  • de fluvoxamina, naltrexona, bupropiona ou topiramato por 12 semanas. Os indivíduos foram então submetidos a mais 12 semanas de manutenção das mesmas medicações e, em seguida, a um período de seis meses sem elas. Observou-se que a maioria dos tomadores de qualquer uma das quatro drogas não apresentou recaída do comportamento de jogar ao longo do semestre, sem uso dos medicamentos. No caso específico dos indivíduos que receberam topiramato, dois terços dos nove pacientes desse subgrupo mantiveram abs-tinência total da prática do jogo.15

    Outro estudo semelhante, mais prolongado, com períodos de tratamento e de suspensão dos medicamentos de dois anos cada, encontrou resultados semelhantes: 78 pacientes recebe-ram naltrexona, bupropiona, escitalopram ou topiramato (aqui, em doses variando entre 100 mg/dia e 300 mg/dia de acordo com cada indivíduo). Aqueles que receberam naltrexona ti-veram melhora significativamente maior do que os alocados para os outros três grupos, e com menor taxa de abandono do tratamento. Ainda assim, os quatro grupos apresentaram melhora significativa e semelhante de pontuações em escalas de avaliação de severidade de depressão, ansiedade e funcio-namento global, com exceção feita aos pacientes que tomaram topiramato, que não apresentaram melhora relevante na esca-la de Hamilton para depressão.32

    Em uma descrição de caso, uma paciente de 57 anos, por-tadora de transtorno afetivo bipolar e jogadora patológica, ob-teve melhora do primeiro quadro com a introdução de lítio em dose efetiva, mas só foi alcançada a remissão da prática de jogar com a associação de 200 mg/dia de topiramato.33

    DiscussãoSob a mesma rubrica de transtornos do controle do im-

    pulso, vêm sendo agrupados quadros de prevalência relati-vamente pequena, desde a quase inexistência da piromania até aqueles mais frequentes em nosso cotidiano, como o jogo patológico ou a dependência de internet. Todos compartilham alguns elementos comuns em sua fenomenologia, mas prova-velmente têm determinantes socioculturais e históricos pes-soais bastante diversos, assim como bases neurobiológicas distintas.34 Uma hipótese razoável, mas que ainda carece de comprovação empírica, seria a de que quadros compreensíveis

    como mais primários, ou de base mais eminentemente orgâ-nica, como aqueles definíveis como transtornos do impulso ou dos instintos, de acordo com a nosologia jasperiana, respon-deriam melhor à farmacoterapia. Por outro lado, os transtor-nos da vontade, como as dependências de comportamentos, que, além do componente neurofisiológico, são condicionadas por uma série de elementos simbólicos e históricos pessoais e socioculturais, demandariam, também ou principalmente, in-tervenções psicoterapêuticas de naturezas distintas. É assim auspicioso verificar que um número ainda pequeno de casos e ensaios clínicos aponta a cessação às vezes completa de comportamentos, como o de jogar, em decorrência apenas da abordagem estritamente farmacológica.

    Uma flagrante vantagem do topiramato é ser a única droga com aplicabilidade no controle da impulsividade, e das pou-quíssimas disponíveis no repertório psiquiátrico associadas à perda de peso, enquanto todas as outras, como outros anticon-vulsivantes, antidepressivos, antipsicóticos e estabilizadores de humor, ocasionam ganho de peso, muito severo em alguns casos. Os efeitos colaterais, principalmente tontura, prejuízo de memória e, em um número menor de casos, cefaleia, são rele-vantes e sustentados, e em um número considerável de casos levam ao abandono de seu uso. Contudo, não são, grosso modo e tanto quanto é possível comparar diferentes classes de me-dicamentos, mais incapacitantes do que os de vários anticon-vulsivantes ou neurolépticos usados com a mesma finalidade. São também dose-dependentes, e tanto a literatura quanto a experiência clínica pessoal demonstram que a dose eficaz para obter diminuição satisfatória do comportamento impulsivo ra-ramente ultrapassa algo como 200 mg/dia, enquanto para o tratamento da epilepsia pode-se chegar a doses cinco vezes maiores. A literatura relativa à abordagem dos transtornos do impulso com topiramato ainda não é extensa e é em boa parte limitada à descrição de casos clínicos ou de ensaios clínicos abertos e naturalísticos, envolvendo pacientes portadores de várias outras comorbidades concomitantes e em uso de vá-rias outras medicações, o que dificulta estabelecer quanto do efeito desejado decorreu, na verdade, do tratamento de outro transtorno psiquiátrico de base, quanto se deveu ao efeito das outras substâncias sobre a impulsividade ou quanto foi devi-do à ação combinada do topiramato com os outros fármacos.

    Top i ramato no cont ro le dos impulsos Topiramato no contro le dos impulsos

  • É uma substância promissora, que já vem sendo usada com frequência e bons resultados por profissionais envolvidos no tratamento de transtornos impulsivos, mas que ainda deman-da mais pesquisa, na forma de ensaios clínicos duplo-cegos, com desenhos mais estritos e com critérios mais rigorosos de inclusão e exclusão dos indivíduos.

    Referências 1. Organização Mundial da Saúde. Classificação Estatística Interna-

    cional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde: CID-10 Dé-cima revisão, 3ª ed. São Paulo: EDUSP; 1996.

    2. American Psychiatric Association. Diagnostic and statistical ma-nual of mental disorders (5ª ed.). Washington, DC, 2013.

    3. Lesieur HR, in: Hollander E et al. Conceptualizing and Assessing Im-pulse-Control Disorders, in: Hollander E & Stein DJ, Clinical Manual of Impulse-Control Disorders, p. 12, Arlington, American Psychia-tric Publishing, 2006.

    4. Eisen SA,  Lyons MJ, Scherrer JF  et al. Familial influences on gambling behaviour: an analysis of 3359 twin pairs. Addiction 1998;93:1375-84.

    5. Brown CS, Kent TA, Bryant SG et al. Blood platelet uptake of seroto-nin in episodic aggression. Psychiatry Res 1989;27:5-12.

    6. Oquendo MA, Mann JJ. The biology of impulsivity and suicidality. Psychiatr Clin North Am 2000;23:11-25.

    7. Miller LA. Impulsivity, risk-taking, and the ability to synthesize frag-mented information after frontal lobectomy. Neuropsychologia 1992;30:69-79.

    8. Bechara A, Damasio AR, Damasio H, Anderson SW. Insentivity to fu-ture consequences following damage to human prefrontal cortex. Cognition 1994;50:7-15.

    9. Jaspers K. Psicopatologia Geral, 8ª edição. São Paulo, Atheneu, 2003.10. Shinn AK, Greenfield SF. Topiramate in the treatment of substance

    related disorders: a critical review of the literature. J Clin Psychiatry 2010;71(5):634-48.

    11. Pettorusso M, deRisio L, Martinotti G et al. Targeting the Glutama-tergic System to Treat Pathological Gambling: Current Evidence and Future Perspectives. BioMed Research International 2014.

    12. Kaplan Y. Epilepsy and kleptomania. Epilepsy Behav 2007;11(3):474-5.13. Dannon PN. Topiramate for the treatment of kleptomania: a

    case series and review of the literature. Clin Neuropharmacol 2003;6(1):1-4.

    14. Lochner C, Seedat S, Niehaus DJ, Stein DJ. Topiramate in the treat-ment of trichotillomania: an open-label pilot study. Int Clin Psycho-pharmacol 2006;21(5):255-9.

    15. Dannon PN, Lowengrub K et al. 12-month follow-up study of drug treatment in pathological gamblers: a primary outcome study. J Clin Psychopharmacol 27(6):620-4. 2007.

    16. Dannon PN, Lowengrub K, Musin E, Gonopolsky Y, Kotler M. Topi-ramate versus fluvoxamine in the treatment of pathological gam-bling: a randomized, blind-rater comparison study. Clin Neurophar-macol 2005;28(1):6-10.

    17. Fong TW, De La Garza R 2nd, Newton TF. A Case Report of Topi-ramate in the Treatment of Nonparaphilic Sexual Addiction. J Clin Psychopharmacol 2005;25(5):512-4.

    18. Khazaal Y, Zullino DF. Topiramate in the treatment of compulsive sexual behavior: case report. BMC Psychiatry 2006;6:22.

    19. Johnson BA, Ait-Daoud N,  Bowden CL et al. Oral topiramate for treatment of alcohol dependence: a randomised controlled trial. Lancet 2003;361(9370):1677-85.

    20. Johnson BA, Ait-Daoud N, Akthar FZ, Ma JZ. Oral topiramate redu-ces the consequences of drinking and improves the quality of life of alcohol-dependent individuals: a randomized controlled trial. Arch Gen Psychiatry 2004;61:905-12.

    21. Huguelet P, Morand-Collomb S. Effect of topiramate augmentation on two patients suffering from schizophrenia or bipolar disorder with comorbid alcohol abuse. Pharmacol Res 2005;52(5):392-4.

    22. Chiu Y-H, Lee T-H, Shen WW. Use of low-dose topiramate in subs-tance use disorder and bodyweight control. Psychiatry Clin Neuros-ci 2007;61(6):630-3.

    23. Rubio G, Ponce G, Jiménez-Arriero M et al. Effects of topirama-te in the treatment of alcohol dependence. Pharmacopsychiatry 2004;37(1):37-40.

    24. Flórez G, García-Portilla P, Alvarez S et al. Using Topiramate or Nal-trexone for the Treatment of Alcohol-Dependent Patients. Alcohol Clin Exp Res 2008;32(7):1251-9.

    25. Baltieri DA, Dar FR, Ribeiro PL, Andrade AG. Comparing topiramate with naltrexone in the treatment of alcohol dependence. Addiction 2008;103(12):2035-44.

    26. Kampman KM, Pettinati H, Lynch KG et al. A pilot trial of topirama-te for the treatment of cocaine dependence. Drug Alcohol Depend 2004;75(3):233-40.

    27. McElroy SL, Arnold LM, Shapira AN et al. Topiramate in the treat-ment of binge eating disorder associated with obesity: a randomi-zed, placebo-controlled trial. Am J Psychiatry 2003;160:255-61.

    28. Shapira NA, Goldsmith T, McElroy SL. Treatment of binge disorder with topiramate: a clinical case series. J Clin Psychiatry 2000;61:368-72.

    29. Cassano P, Lattanzi L, Pini S et al. Topiramate for self-mutilation in a patient with borderline personality disorder. Bipolar Disord 2001;3:161.

    30. Guzman CS, Filomensky T, Tavares H. Compulsive buying treatment with topiramate, a case report. Rev Bras Psiquiatr 2007;29(4):383-4.

    31. Brito AMC. Ensaio duplo-cego controlado multicêntrico com topi-ramato para jogadores patológicos. São Paulo: Faculdade de Medi-cina, Universidade de São Paulo, 2011.

    32. Rosenberg O, Dinur LK, Dannon PN. Four-Year Follow-Up Study of Pharmacological Treatment in Pathological Gamblers. Clinical Neu-ropharmacology 2013;36:42-5.

    33. Nicolato R, Romano-Silva MA, Correa H, Salgado JV, Teixeira AL. Li-thium and topiramate association in the treatment of comorbid pathological gambling and bipolar disorder. The Australian and New Zealand journal of psychiatry 2007;41(7):628-9.

    34. Roncero C, Rodríguez-Urrutia A, Grau-López L, Casas Rodrigo M. Trastornos del control de impulsos y tratamiento con antiepilépti-cos. Actas Esp Psiquiatr 2009;37(4):205-12.

    Reimpressão Separata Topiramato no Controle dos Impulsos é uma publicação periódica da Amplitude Com. e Prod. Ed. Ltda. patrocinada por Aché. Rua João de Sousa Dias, 251 A – Campo Belo – São Paulo/SP. CEP 04618-001. Tel.: (11) 5096-0509. Fax: (11) 5096-0547. E-mail: [email protected]. O conteúdo é de responsabilidade do autor e não expressa, necessariamente, a opinião do laboratório. Jornalista responsável: Samantha Cosme de Lima (MTB: 36.561/SP). Tiragem: X.XXX exemplares. Todos os direitos reservados. Este material não pode ser publicado, transmitido, divulgado, reescrito ou redistribuído sem prévia autorização da editora. Material destinado exclusivamente à classe médica. Impresso em maio de 2017.www.amplitudeeditora.com.br

    Topiramato no contro le dos impulsos

  • C

    M

    Y

    CM

    MY

    CY

    CMY

    K

    Material científico de distribuição exclusiva à classe médica.

    Cód.: 7022114 – Julho/2017