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Torcedor brasileiro Por Marianna Antunes Caras pintadas, bandeiras nas ruas, olhares atentos, todos na mesma direção. É Copa do Mundo e somos brasileiros, não há como ser diferente. O país para, a torcida se prepara, amigos reunidos, família na sala, é a seleção que vai jogar. No continente africano os jogos da copa trazem alegria e esperança para uma população castigada pela história. Aqui no Brasil, um povo bem parecido e que, assim como os torcedores dos Bafana Bafana, também só quer ser feliz. Assim que o árbitro apita o início da partida, me torno apenas mais uma torcedora. Assisti aos quatro primeiros jogos sozinha, mas o mais curioso é que não me senti assim em nenhum momento. A cada vibração dos vizinhos, ou entonações diferentes do narrador, parecia que a casa estava cheia. As janelas dos prédios tornam-se as arquibancadas do estádio e, na hora da comemoração, as sacadas se transformam em animados camarotes, pontos de encontro dos torcedores que enxergam uns nos outros a alegria depois de cada vitória conquistada. Assim como outros 190 milhões de brasileiros, me sinto no direito de também “comandar” a seleção. Dou pitaco no esquema tático, critico jogadores e queria poder convocar e escalar o time. No entanto, preciso me contentar com o simples domínio do controle remoto, escolhendo em qual canal assisto às partidas. E ainda assim, como grande parte da população, fico limitada apenas às duas emissoras de TV aberta que transmitem a competição. Depois do surgimento de diversas novas tecnologias como a transmissão em HD e 3D, que nos aproximam cada vez mais do conteúdo transmitido, será que um dia poderemos também interferir no jogo, substituindo jogadores ou até mesmo reclamando com o juiz? Parece-me que, se pudéssemos participar de verdade da partida, ela se tornaria com certeza bem menos emocionante e surpreendente. Diferente de assistir reprise de jogos em que já sabemos o resultado, sermos apenas espectadores de uma partida imprevisível é muito mais divertido e interessante. Torcida também dá espetáculo, vestindo as cores da seleção, se fantasiando, pintando o rosto e vibrando, às vezes até muito mais que o próprio time. O Brasil foi eliminado pela Holanda nas quartas-de-final e deixou a Copa do Mundo adiando, pelo menos até 2014, o sonho do hexa. É triste saber que a alegria que estava no coração dos torcedores transformou-se em desgosto e decepção, porém, como todo bom brasileiro, lutar e recomeçar faz parte do dia-a-dia. E é em momentos de tristeza que estar junto de quem a gente gosta alivia o sofrimento. Que bom que pude assistir à última partida do Brasil junto com a minha família. Os vizinhos e o narrador eram os mesmos, compartilhando comigo mais uma vez o mesmo sentimento, porém, desta vez, o objetivo ao fim do jogo não era comemorar, mas apenas esquecer e se conformar.

Torcedor Brasileiro

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Crônica produzida para a disciplina de Redação Jornalística III.

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Page 1: Torcedor Brasileiro

Torcedor brasileiro

Por Marianna Antunes

Caras pintadas, bandeiras nas ruas, olhares atentos, todos na mesma direção. É Copa

do Mundo e somos brasileiros, não há como ser diferente. O país para, a torcida se prepara,

amigos reunidos, família na sala, é a seleção que vai jogar. No continente africano os jogos

da copa trazem alegria e esperança para uma população castigada pela história. Aqui no

Brasil, um povo bem parecido e que, assim como os torcedores dos Bafana Bafana, também

só quer ser feliz.

Assim que o árbitro apita o início da partida, me torno apenas mais uma torcedora.

Assisti aos quatro primeiros jogos sozinha, mas o mais curioso é que não me senti assim em

nenhum momento. A cada vibração dos vizinhos, ou entonações diferentes do narrador,

parecia que a casa estava cheia. As janelas dos prédios tornam-se as arquibancadas do

estádio e, na hora da comemoração, as sacadas se transformam em animados camarotes,

pontos de encontro dos torcedores que enxergam uns nos outros a alegria depois de cada

vitória conquistada.

Assim como outros 190 milhões de brasileiros, me sinto no direito de também

“comandar” a seleção. Dou pitaco no esquema tático, critico jogadores e queria poder

convocar e escalar o time. No entanto, preciso me contentar com o simples domínio do

controle remoto, escolhendo em qual canal assisto às partidas. E ainda assim, como grande

parte da população, fico limitada apenas às duas emissoras de TV aberta que transmitem a

competição.

Depois do surgimento de diversas novas tecnologias como a transmissão em HD e

3D, que nos aproximam cada vez mais do conteúdo transmitido, será que um dia

poderemos também interferir no jogo, substituindo jogadores ou até mesmo reclamando

com o juiz? Parece-me que, se pudéssemos participar de verdade da partida, ela se tornaria

com certeza bem menos emocionante e surpreendente. Diferente de assistir reprise de jogos

em que já sabemos o resultado, sermos apenas espectadores de uma partida imprevisível é

muito mais divertido e interessante. Torcida também dá espetáculo, vestindo as cores da

seleção, se fantasiando, pintando o rosto e vibrando, às vezes até muito mais que o próprio

time.

O Brasil foi eliminado pela Holanda nas quartas-de-final e deixou a Copa do Mundo

adiando, pelo menos até 2014, o sonho do hexa. É triste saber que a alegria que estava no

coração dos torcedores transformou-se em desgosto e decepção, porém, como todo bom

brasileiro, lutar e recomeçar faz parte do dia-a-dia. E é em momentos de tristeza que estar

junto de quem a gente gosta alivia o sofrimento. Que bom que pude assistir à última partida

do Brasil junto com a minha família. Os vizinhos e o narrador eram os mesmos,

compartilhando comigo mais uma vez o mesmo sentimento, porém, desta vez, o objetivo ao

fim do jogo não era comemorar, mas apenas esquecer e se conformar.