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1 TRABALHADORES SEM-TERRA EM CAMPO DO MEIO (MG): A GEOGRAFIA VAI AO ACAMPAMENTO Rodolfo Schiavon Franzin Universidade Federal de Alfenas-UNIFAL [email protected] Resumo Este trabalho tem por objetivo compreender os atores da luta pela terra no município de Campo do Meio (MG), isto é, as pessoas que no campo, permanecem em ocupações de terras denominadas acampamentos, onde reivindicando reforma agrária, acabam disputando a construção do espaço. A questão colocada são os trabalhadores urbanos que migram da cidade para o campo buscando perspectivas de trabalho, renda e melhores condições de vida, garantindo com segurança a subsistência e autonomia necessárias para suas famílias. Palavras-chave: Acampamento. Reforma Agrária. Campo – Cidade. Introdução Ainda marcada pela concentração fundiária, a estrutura agrária brasileira continua a percorrer caminhos obscuros nas particularidades que concernem a resolução de seus problemas; não apenas de seus elementos de produção, questão única que incrementa o modo como ela se organiza, mas também dos conflitos que se instalam no campo, decorrentes, tanto da conjuntura histórica como se modelou a propriedade da terra, como também do dinamismo como a agricultura vem sendo praticada no território nacional, apoiada e incentivada pelo modelo capitalista de produção. Nesse sentido, do século XX aos dias de hoje, um fenômeno reivindicativo, decorrente de uma estrutura agrária desigual, cujo punho político sustenta-se na reforma agrária, vem colocando em cheque a disputa de atores sociais cujo interesse se circunscreve na posse da terra e pelo desenvolvimento econômico que abarque um modelo socialmente amplo; que fixe o lavrador a terra, permita o fortalecimento da uma economia interna e consiga erradicar a miséria e a fome suplantada ao povo brasileiro. Tal fenômeno trata-se das ocupações de terra, ou acampamentos de reforma agrária, como também será utilizado de forma conceitual neste trabalho. Espalhados por todo o país, sejam em latifúndios ou nas beiras de estradas, os acampamentos de reforma agrária vem demonstrando um método que resulta de uma falta de diálogo e de interesse político dos governos para tratarem da questão agrária no

TRABALHADORES SEM-TERRA EM CAMPO DO MEIO (MG): A … · garantindo com segurança a subsistência e autonomia necessárias para suas famílias. Palavras-chave: Acampamento. Reforma

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TRABALHADORES SEM-TERRA EM CAMPO DO MEIO (MG): A GEOGRAFIA VAI AO ACAMPAMENTO

Rodolfo Schiavon Franzin Universidade Federal de Alfenas-UNIFAL

[email protected]

Resumo Este trabalho tem por objetivo compreender os atores da luta pela terra no município de Campo do Meio (MG), isto é, as pessoas que no campo, permanecem em ocupações de terras denominadas acampamentos, onde reivindicando reforma agrária, acabam disputando a construção do espaço. A questão colocada são os trabalhadores urbanos que migram da cidade para o campo buscando perspectivas de trabalho, renda e melhores condições de vida, garantindo com segurança a subsistência e autonomia necessárias para suas famílias. Palavras-chave: Acampamento. Reforma Agrária. Campo – Cidade. Introdução Ainda marcada pela concentração fundiária, a estrutura agrária brasileira continua a

percorrer caminhos obscuros nas particularidades que concernem a resolução de seus

problemas; não apenas de seus elementos de produção, questão única que incrementa o

modo como ela se organiza, mas também dos conflitos que se instalam no campo,

decorrentes, tanto da conjuntura histórica como se modelou a propriedade da terra,

como também do dinamismo como a agricultura vem sendo praticada no território

nacional, apoiada e incentivada pelo modelo capitalista de produção. Nesse sentido, do

século XX aos dias de hoje, um fenômeno reivindicativo, decorrente de uma estrutura

agrária desigual, cujo punho político sustenta-se na reforma agrária, vem colocando em

cheque a disputa de atores sociais cujo interesse se circunscreve na posse da terra e pelo

desenvolvimento econômico que abarque um modelo socialmente amplo; que fixe o

lavrador a terra, permita o fortalecimento da uma economia interna e consiga erradicar a

miséria e a fome suplantada ao povo brasileiro. Tal fenômeno trata-se das ocupações de

terra, ou acampamentos de reforma agrária, como também será utilizado de forma

conceitual neste trabalho.

Espalhados por todo o país, sejam em latifúndios ou nas beiras de estradas, os

acampamentos de reforma agrária vem demonstrando um método que resulta de uma

falta de diálogo e de interesse político dos governos para tratarem da questão agrária no

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Brasil. Não é surpresa que eles venham a existir, sendo que ainda hoje a forte

concentração fundiária vem sendo acompanhada de estreitos laços entre burguesia

industrial e oligarquia agrária, na qual se incubem na tarefa histórica, dentro da luta de

classes, de impedir os desenrolar da reforma agrária como viés principal de projeto

democrático de fato, como fizeram os países centrais - ainda que voltados para o

desenvolvimento do capitalismo; mas garantir a perpetuação de seus interesses

hegemônicos canalizados na reprodução ampliada do capital na agricultura.

Além do modelo de propriedade fundiária, a agricultura capitalista, que incorpora um

modelo produtivo articulado com a indústria, promoveu um extenso êxodo rural

mediante a incorporação de novas áreas e a mecanização da atividade agrícola.

Expulsos de suas terras, ou pressionados a vendê-las por falta de recursos mediante a

competitividade com os grandes produtores, trabalhadores rurais deixaram para trás não

apenas um elemento comum de produção, isto é, a terra; mas também tiveram que

abdicar as raízes e seu modo de vida intrínsecos a vida no campo. Assim, aos montes,

foram em poucas décadas amontoar-se nas periferias das cidades e centros urbanos,

subordinando-se ao trabalho na indústria e ao gigantesco exercito de mão de obra

reserva. De forma imperativa, na cidade, mutaram-se de pobres para condições análogas

de miséria; conheceram culturas estranhas as suas, foram violentados pelos limites

materiais decorrente do uso de dinheiro para subsistência, e temendo o abismo da

subvida urbana, cobiçaram seu retorno para o campo.

Em Campo do Meio, pequeno município situado no sul de Minas Gerais, as ocupações

de terra em áreas improdutivas de uma usina falida, a Ariadnóploes, cujo qual perdura a

15 anos, demonstram o retorno de famílias que, sob organização de um movimento

social camponês, vêem nos acampamento de reforma agrária o caminho mais sensato de

conquistar terra para quem não tem nada.

Partindo da situação de como se materializa o conflito no município, e levando em

consideração o sujeito que ocupa as terras, ou seja, o trabalhador sem-terra; este trabalho

tem por objetivo entender quem são as pessoas que, negando a vida decadente na cidade e

desafiando o caminho de sofrimento e de incertezas no acampamento, erguem lonas e

passam a viver de maneira rudimentar irrigada pelos anseios da vitória. Surge deste modo,

a oportunidade de uma revisão teórica que congregue o significado das ocupações de terra

acerca das teorias da Geografia, contribuído para sua análise no que toca a produção do

espaço. Para isso, foi utilizado de uma revisão bibliográfica sobre o êxodo rural e urbano

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para compreender sobre o movimento da população no sentido campo e cidade, assim

como literaturas que colaboram para desvendar o significado das ocupações de terra, além

de trabalho de campo nas áreas nos acampamentos.

Desenvolvimento No Brasil, a grave questão agrária se constituiu em seu período de colônia, quando a

coroa portuguesa ao tomar para si os territórios da população originária, e os escravizar,

estabeleceu imensas quantidades de terra chamadas de capitanias hereditárias, que teria

como função produzir e extrair riquezas para a metrópole (MORISSAWA, 2001). Em

seguida, surgiu o período escravocrata, através dos negros africanos que vinham para o

continente americano trabalhar intensivamente na agricultura e pecuária,

impossibilitados de liberdade para poderem construir seu futuro, rigorosamente

cristalizados pela produção com base na escravidão. Estaria aí um dos primeiro

equívocos para a construção de um mercado interno no país, condição preliminar no

estágio de desenvolvimento capitalista, que possibilitaria o desenvolvimento regional

para atender a própria região. Contudo, quando libertados pela abolição, a Lei de Terras

de 1850 já avia consolidado o monopólio das terras, e ainda, atraia emigrantes europeus

para trabalhar nas lavouras, fazendo com que os negros se tornassem os segundos

despossuídos de terra no Brasil. Assim, foram para as cidades habitar as moradias

daqueles que pouco tem do básico; os cortiços que mais tarde se transformarão em

imensos complexos de vida precária, as chamadas favelas (DAVIS, 2006).

O problema desse êxodo, ou seja, o trabalhador que migra do campo para a cidade, se

agrava a partir de meados dos anos 60, quando o meio técnico-científico passa a

revolucionar as relações tanto sociais como de trabalho, no campo e na cidade

(RANGEL, 2004). Tem haver em tomar a ciência como força motriz produtiva e usar da

tecnologia para desenvolver automação, que irá, em longo prazo, desvincular o processo

físico-humano do processo produtivo, criando o desemprego estrutural. Se para o negro,

ou qualquer pobre, pouco lhe sobrava para poder existir, agora as situações agravam-se,

na medida em que, alem de competirem entre si pelos menores salários, estarão

concorrendo também com as maquinas, que alem de energia e manutenção, pouco

exigem do capitalista para poder produzir (MARX, 1986).

Com a quantidade de maquinas agrícolas que disputam com o trabalho humano e a

monopolização das terras, vão surgir os primeiros movimentos contestatórios do sistema

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que produz o espaço de maneira desigual e arbitrária (BRAY, 2007). Surgem assim no

Nordeste as Ligas Camponesas, que vão dar uma reviravolta na luta pela reforma

agrária no Brasil. Em seu primeiro congresso, tiram como bandeira a “reforma agrária

na lei ou na marra” (AUED, 1986), ou seja, a ocupação de terras como medida extrema

para desapropriação, já que os instrumentos jurídicos não resolviam o problema.

Constituía aí os primeiro acampamentos por reforma agrária.

Com o golpe militar de 1964, os movimentos sociais são brutalmente reprimidos e

instalam-se no país governos neoliberais, pouco eficientes em questões sociais, mas

extremamente afinados na regulamentação em benefício do capital (ALANTEJANO,

2007). Desse modo, para dar resposta a pressão política dos movimentos, o governo

promulga o Estatuto de Terras, que tem como fim o aperfeiçoamento do capitalismo no

campo, o que nesse sentido era progressista.

Após anos de políticas fracassadas de para tentar conter a população insatisfeita, pobre e

oprimida, e o esgotamento do que se chama de milagre econômico brasileiro, a

superpopulação aglomerada nas favelas não encontra ali mais condições de poderem

reproduzir dignamente sua vida. E nem por isso a migração deixa de existir. Passa a

ocorrer então o processo de desruralização, o que significa dizer que o campo expulsa,

mas a cidade não absorve. Desruralização, [...], é simbiótico com a marginalização, o que significa violência urbana, miséria, insegurança, prostituição, neurose, stress, enfim, todas as maldições do capitalismo que o nosso povo tem de suportar, sobretudo os de baixo, mas também os de cima (BAMBIRRA -2002, pg. 9).

Com a redemocratização do Brasil em 1988, se territorializa por todo o país o MST

(FERNANDES, 2005); movimento popular camponês que fará a coalizão de força com

o Estado na busca pela democratização da estrutura agrária brasileira. O movimento

consolida a luta dos trabalhadores que conhecem bem as péssimas condições de vida na

cidade e que para não caírem na vida social decadente, de pobreza e agonia, preferem

resistir no campo em busca de conquistarem seus territórios, que nada tem haver a

lógica tecnocrática e economicista sobre qual esta assentada à agricultura praticada em

território nacional (OLIVEIRA, 2001).

No município mineiro de Campo do Meio, na Bacia Hidrográfica do Rio Grande, há 15

anos estende-se um conflito de trabalhadores sem terras contra o latifúndio improdutivo

que não cumpre obrigações com sua função social.

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Figura 1 – Distribuição dos acampamentos

Fonte: Leitura Técnica do Plano Diretor de Campo do Meio, 2006

Desse modo, a longos anos, famílias provenientes de diversas regiões do país, porém

em suma maioria da região metropolitana de Campinas, lutam para que as terras

concentradas sejam desapropriadas para reforma agrária, de modo que não signifique

apenas justiça social, mas também o desenvolvimento de economias que consigam gerar

uma quantidade de renda e excedentes próprios para a mercado regional.

Pela questão da mobilidade das famílias acampadas, em acordo como os motivos da

migração, salientada pelo avanço do modelo agrícola no campo e o empobrecimento na

cidade, constatou-se que, dos entrevistados, 41% deles eram naturais do Sudeste, sendo

São Paulo e Minas Gerais os estados predominantes dessas pessoas; 19% eram do Sul,

todos do Paraná; 15% pessoas eram do Nordeste, sendo Bahia e Alagoas; 11% do

Centro-Oeste, Mato Grosso do Sul; outras 8% do Note, do Pará e outras 4%, isto é, duas

pessoas, que construíam uma família de colombianos. O gráfico abaixo indica os dados

coletados:

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Figura 2- Naturalidade dos Acampados/por pessoa

SudesteSulNorteNordesteCentro-OesteOutro país

Fonte: Trabalho de Campo – Outubro de 2011

Das 25 famílias entrevistadas que se encontram acampadas nos 11 acampamentos, que

segundo a concepção de Fernandes (2007), se encontram espacializados na área da ex-

usina, que corresponde a 3.000 hectares ocupados, todas elas relataram as

impossibilidades da vida na cidade. No meio urbano, sentiam a dificuldade de

sobrevivência, pois pelos limites financeiros que estavam expostos pela falta de

emprego; não conseguiam garantir suas necessidades cujo quais, para satisfação,

estavam subordinadas ao dinheiro como único elemento de troca. Assim, sem recursos

monetários e sem terra, estavam a sentir a cidade como um fator de depreciação da vida.

Ainda, entre as famílias entrevistadas, nove delas viviam no campo e foram deslocadas

para a cidade, e as outras 16 eram da cidade, porém se entregaram a negação da

realidade pelo meio urbano e abarcaram a luta pela terra. Aqui, quanto ao primeiro

grupo, àqueles que já eram do campo, cabe salientar a afirmação de Oliveira (pg 3,

2001), sobre o processo de exclusão que também ocorre no campo: “Certamente, a maioria dos filhos dos camponeses, cujas propriedades tenham superfície inferior a 10 hectares, jamais terão condição de se tornar camponeses nas terras dos pais. A eles caberá apenas um caminho: a estrada. A estrada que os levará à cidade, ou a estrada que os levará à luta pela reconquista da terra.”

A isto, a realidade do empobrecimento da população tanto na cidade, em que a vida assume estágios difíceis de reprodução pelo modelo de subordinação do trabalho aos serviços informais e insuficiência financeira, mas também no campo, em que o desenvolvimento e a expansão da agricultura capitalista excomunga o trabalhador da terra; os acampamentos em Campo do Meio tornam-se povoado por pessoas que migram da cidade para o campo como também por trabalhadores do que resistem para

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permanecer no campo. Assim, o gráfico 3 apresenta a referencia deste fator entre a relação de vezes em que a família esteve acampada. Figura 3 - Numero de vezes acampado

02468

1012141618

Primeira vezacampadoJá foi acampadooutras vezes

Fonte: Trabalho de Campo – Outubro de 2011

Sabe-se que a ocupação de terra é uma marcha árdua e dolorosa para aqueles que

desejam conquistar a terra através da luta diária nos acampamentos (OLIVEIRA,2001).

O trabalho de campo, pela experiência empírica de sentir o choque de realidade que se

trata o acampamento, demonstrou o pesado cotidiano das famílias acampadas. Sobre

lonas, os acampamentos são erguidos e a partir do momento em que as famílias ocupam

as terras e, então, a área ocupada passa a se tornar seu território (FERNANDES, 2007).

Em Campo do Meio, os acampamentos não possuem a disponibilidade de energia

elétrica e a captação de água é muito difícil e depende da colaboração de muitos. As

famílias, nos dias quentes, tem de suportar o calor excessivo no interior de seus

barracos, já que a lona absorve o calor e cria um interior parecido com uma estufa; e

também se acostumarem com fossas e improvisos para contemplarem suas necessidades

de higiene, alimentação e repouso. Assim, todas elas relataram que a decisão de ir para

o acampamento é difícil, e a família que se tornar acampada deverá saber lidar com a

“fase ardida” da luta pela terra, que é o acampamento.

Além das dificuldades colocadas pela vida no acampamento, os sem-terras também

relataram a discriminação que é atribuída por serem acampados. A ideologia

impregnada na sociedade contra aqueles que lutam por direitos no Brasil é forte e

polariza a visão da cidade sobre sua questão agrária. Deste modo, não apenas adjetivos

como arruaceiros e vagabundos, mas também a idéia que se instala na opinião pública

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sobre o conflito, torna-se mais um desafio colocado ao acampamento. Nesse sentido,

nota-se com clareza que a maioria das pessoas na cidade não conhecem as contradições

do modelo agrícola que o município adotou como desenvolvimento e tão pouco

procuram uma análise crítica para desvendar o diversos motivos que produzem os

acampamentos e os acampados. Adotam, portanto, o senso comum para interpretarem a

situação agrária em Campo do Meio e reproduzem com facilidade a idéia

desconcertante sobre o movimento sem-terra.

O acampamento é o processo pelo qual, dada a falta de vontade política dos governos

para resolverem os impasses colocados para a reforma agrária, seu resultado é inserto,

havendo dois caminhos: ou eles triunfarão e serão transformados no território final da

luta pela terra, isto é, o assentamento (FERNADES, 2007), ou então serão vencidos pelo

poder político que o quer destruir, e serão despejados. Assim, das famílias acampadas

nas terras da ex-usina, aquelas que já foram acampadas em outras áreas do país, todas

elas relataram o modo truculento como são expulsas da terra ocupada. Quando

despejadas, os trabalhadores preferiram na insistência pela conquista da terra e partiram

para Campo do Meio, onde o conflito demonstrava sinal positivo para desapropriação

das terras que a anos estavam ocupadas.

Considerações finais O trabalho mostrou que as famílias se encontram na situação de acampadas nas terras da

ex-usina Ariadnópolis por uma questão estrutural no espaço agrário brasileiro e de

decadência no espaço urbano. Migram da cidade para esses espaços de luta na terra por

não haverem condições de sobrevivência nas cidades e disputam a posse da terra, pelo

fato de está estar concentrada nas mãos de poucos no país. Os resultados alcançados

demonstram não apenas a fragilidade econômica das famílias, mas também a questão

de, no campo, haverem melhores possibilidades de sobrevivência para elas, com mais

autonomia em relação a liberdade, de não terem que vender sua força de trabalho por

salários irrisórios, mas a possibilidade de tirar seu sustento da terra, e também de auto-

suficiência, de poderem plantar ao invés de comprar. Evidencia-se, também, que a

cidade se encontra saturada de vícios e stress, onde no campo, conseguem a paz, o

natural e os velhos costumes de suas tradições, que tendem mais ao histórico e popular,

mas que se encontram ameaçadas pela modernidade.

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O acampamento é, então, um local onde se disputa o espaço, isto é; seus sujeitos, os

sem-terras, dominam o território onde montam os acampamentos de forma a ter o

domínio daquele espaço. Porém, trata-se de um tipo de poder temporário, indefinido;

pois por ser considerado como um ataque a propriedade privada, vigente nas leis que

flexibilizam a reprodução do capital, o acampamento é considerado um enigma, o que

quer dizer que está a qualquer momento a mercê dos despejos e reintegrações de posse,

como também pode levar ao triunfo da terra conquistada, resultado da luta e resistência

que se estendeu pelo tempo e pelo espaço, constituindo o território final da luta pela

terra, isto é, o assentamento. Isso faz do acampamento seu difícil estudo, pois ao mesmo

tempo em que pode ser o caminho da vitória dos trabalhadores, amanha podem não

existir.

A questão do impasse de não se realizar a reforma agrária, não só no município de

Campo do Meio, mas também em todo o Brasil, é de que, além de ser a terra um meio

de produção que foi apropriada para a produção capitalista, que estipula como

necessidades o lucro, e isso ser a raiz dos problemas que este estudo se propôs a

realizar, a pauta política sobre a importância e estratégia da democratização da estrutura

agrária para um tipo de desenvolvimento econômico que coloque um novo modelo

agrícola sustentável na produção e organização social, não está colocada na sociedade.

Isso dificulta a clareza das pessoas sobre o significado do acampamento e do modo

sobre qual a agricultura praticada em território nacional está assentada.

O estudo apontou que as pessoas que foram entrevistadas nos 11 acampamentos em

Campo do Meio são famílias pobres, humildes e que levam consigo, tão forte quanto à

brava labuta na terra, a vontade inescapável de serem assentados e permanecerem no

campo. Vencem facilmente o preconceito atribuído a sua condição de sem-terra e os

estereótipos que a mídia cria, como terroristas e vagabundos, e dão um exemplo

imbatível de dignidade e coerência. Realmente merecem a terra que lutam para ter, e tão

pouco se comenta sobre sua situação, a fim de compreender sua existência e questionar

os ataques ideológicos colocados. Sua sobrevivência depende da vontade política dos

governos para resolverem a grave questão agrária em Campo do Meio e no país.

Referências AUED, Bernade Wrubleski. A vitória dos vencidos: Partido Comunista Brasileiro e Ligas Camponesas 1955-64. – Florianópolis: Ed. UFSC, 1986

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ALANTEJANO, Paulo Roberto R. Os movimentos sociais rurais e a teoria geográfica. – Abordagens teórico-metodológicas em Geografia Agrária – Rio de Janeiro: EdUERJ, 2007 BAMBIRRA, Vânia. Êxodo Rural e Êxodo Urbano: A luta pela reforma agrária no Brasil – Disponível em: http://www.reggen.org.br/midia/documentos/exodorural.pdf BRAY, Silvio Carlo. Perspectivas teórico-mtedológicas em geografia agrária. - Abordagens teórico-metodológicas em Geografia Agrária – Rio de Janeiro: EdUERJ, 2007. DAVES, Mike. Planeta Favela. São Paulo: Boitempo, 2006. FERNANDES, Bernardo Monçano. Formação e Territorialização do MST no Brasil. In: MARAFON, G. J.; RUA, J.; RIBEIRO, M. A. (Org.) Abordagens teórico-metodológicas em Geografia Agrária. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2007. LOURENÇO, A.R.; SOUZA, A.C.; VALE, A. R. A luta pela terra no Sul/Sudeste de Minas Gerais. O espaço da resistência e território conquistado. I Congresso Brasileiro de Organização do Espaço – Rio Claro, 2010. MARX, K. A Assim Chamada Acumulação Primitiva. In: O Capital, Livro I, vol. I, Cap. XXIV, 2ª ed.. S.Paulo, Nova Cultural, 1985. MORISSAWA, Mitsue. A história da luta pela terra e o MST – São Paulo: Expressão Popular, 2001. TURATTI, Maria Cecília Manzoli. Os filhos da lona preta: identidade e cotidiano em acampamentos do MST – São Paulo: Almeida, 2005. OLIVEIRA, Ariovaldo Umbelino de. A longa marcha do campesinato brasileiro: movimentos sociais, conflito e reformas agrária. São Paulo: Estudos avançados, 2001. RANGEL, Ignácio. Questão Agrária, Industrialização e Crise Urbana no Brasil - 2º Ed. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2004. WHITACKER, Arthur Magon. Cidade Imaginada, Cidade Concebida. In: SPOSITO, M. E. B.; WHITACKER, A. M. (Org.). Cidade e campo: relações e contradições entre o urbano e rural. São Paulo: Expressão Popular, 2006.