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FACULDADE APUCARANA CIDADE EDUCAÇÃODEPARTAMENTO DE LETRAS
LETRAS ESPANHOL/2010LITERATURA AFRO-BRASILEIRA
Eduardo Takahashi
BESOURO
ORIENTADORA: LUZIA FIOREZI
APUCARANA2011
A abolição da escravatura ocorreu em 13 de maio de 1888 através da lei nº
3.353 sancionada pela princesa Isabel, porém alguns historiadores como a
professora Célia Maria Marinho de Azevedo em seu artigo “Quem precisa de São
Nabuco?” faz uma crítica a respeito da abolição da escravatura no Brasil. Em suma
seu trabalho diz que o processo de abolição se deu porque a elite do Brasil tinha
receio que ocorresse aqui o mesmo que no Haiti onde os escravos se voltaram
contra os seus senhores matando a todos, gerando um medo chamado “haitianismo”
desmistificando assim a figura abolicionista de João Nabuco.
Sendo assim estes supostos abolicionistas chegaram à conclusão de que era
melhor dar a liberdade e controlar essa liberdade do que manter a escravidão
correndo o risco de morrerem, por isso não foi feito nenhum esforço no intuito de se
fazer uma legislação que garantisse aos libertos acesso à moradia, a terra e nem a
direitos básicos que lhes proporcionasse uma vida mais digna, desta forma ficando
ainda a mercê da exploração da elite.
A história do filme “Besouro” vem a denunciar que essa exploração mesmo
após o fim da escravidão teve continuidade, mostrando a luta de um negro pela
união do seu povo contra as injustiças e na busca por condições melhores de vida.
Teve origem no livro “Feijoada no Paraíso: A saga de Besouro, o capoeira”1, que
conta a história de Manoel Henrique, mais conhecido como “Besouro”, capoeirista
muito conhecido em Santo Amaro de Nossa Senhora da Purificação, na Bahia. As
histórias do livro são partes de casos, histórias e narrações da vida deste capoeira
(Carvalho, 2009).
O filme é narrado em 3ª pessoa, o narrador não participa da história, mas é
onisciente em relação a Besouro sabe seus pensamentos, tem um enredo não linear
que começa quando ele é criança e depois pula para a fase adulta e no
desenvolvimento da trama vai tendo “flash Backs” de sua infância onde aprendia
capoeira com o mestre Alípio. A história tem como personagens centrais: Besouro,
Dinorá, Quero Quero, coronel Venâncio e seu capanga Noca de Antonia. O clímax
da trama se dá no começo com a morte do mestre Alípio, depois há o
desenvolvimento onde a atenção do espectador se volta com o drama vivido pelo
personagem alcançando o ápice de novo somente com a volta do herói lutando
contra os exploradores. O único personagem que se altera na história é o seu amigo
1 Quem foi Besouro, afinal? <http://www.besouroofilme.com.br/blog/?p=158>
Quero Quero que no final briga com Besouro e o trai dizendo ao coronel como mata-
lo.
O ano do acontecimento é 1924, quase 40 anos após a assinatura da lei
Áurea, o filme assim como na literatura afro faz um resgate da cultura e do
conhecimento afro presente no Brasil, mas que foi negado a eles devido ao medo e
ao preconceito da elite e da igreja católica quanto ao culto do candomblé e a prática
da capoeira.
O enredo começa com o pequeno Manoel que ainda não era Besouro e
reclamava sobre a as humilhações que sofria, então, mestre Alípio passa uma
mensagem muito importante quando diz que não importa o que ele seja no futuro,
ninguém pode lhe tirar o orgulho de ser negro que também é o que se busca na
literatura.
Há um costume na capoeira de que cada praticante escolhe um nome que
define e o acompanha até depois da morte, Manoel escolhe “Besouro” por ser preto
igual a ele e porque podia voar, Besouro Mangangá ou Besouro Cordão de Ouro só
veio mais tarde por conta das suas proeza. O primeiro porque é um inseto cuja
picada é tão venenosa e mortal como seus golpes, o segundo por sua categoria na
luta não tinha cor de cordão que o definisse.
O filme dá uma boa ênfase aos orixás que fazem parte da vida do
personagem: Exu, Osayin, Oxum e Yansã, com isso pode-se ver que boa parte dos
conceitos conhecidos acerca deles são usados na contemporaneidade de modo
equivocado, como se vê abaixo:
Exu é um orixá que na cultura africana é o elo de ligação entre o ser humano
e os demais orixás, ele não é bom e nem mal, pratica somente a justiça, também
são mencionados no filme: Osayin, que faz parte das forças da natureza e detém o
segredo das folhas, os outros orixás dependem dele para ter saúde ou sucesso nas
suas lutas; Oxum, orixá das águas do rio, rainha da vaidade, maternal e
superprotetora atende as mães que querem ter filhos; Yansã, representa a força
feminina, senhora dos ventos, dos raios e das tempestades, de espírito guerreiro e
de liderança, também é senhora dos eguns, os espíritos dos mortos, por isso que
Besouro estava nos seus braços depois que morreu, mas não tem o espírito
maternal como Oxum, ela se relaciona com Ogum, senhor da guerra, daí o espírito
guerreiro de Besouro, porque ele é filho de Ogum, também encontramos costumes
como a oferenda a Exu feita na encruzilhada que para muitos está ligada a magia
negra, na realidade das oferendas ele retira a energia para se realizar os trabalhos.
O filme mostra algumas superstições dos negros, como o homem que tem
“corpo fechado”, quer dizer que nada o atinge seja espiritual ou material, mas que
porém que poderia ser ferido com uma faça feita de uma madeira chamada ticum.
Ainda há mistérios sobre a morte de Besouro, uma vez que não há registros
históricos sobre a sua vida, sabe-se somente o que se canta em rodas de capoeira,
contos e poemas musicados. A única certeza que se tem é que ele morreu de
facada, ainda há pessoas vivas que testemunharam ele ser levado ao hospital,
ferido, Dona Cano mãe de Caetano Veloso que tem mais de 100 anos e que ainda
vive em Santo Amaro foi uma dessas pessoas2.
Em uma das cenas o falecido mestre ensina para os pequenos capoeiristas
que a força dos negros vem da união, que uma pessoa só não é capaz de vencer, já
que a maioria deles eram submissos e não queriam iniciar uma revolução. Besouro
mesmo sozinho na luta reacendeu nos negros a consciência de que juntos poderiam
lutar contra os senhores e ganhar a tão sonhada liberdade que na realidade nunca
tiveram.
No final vemos Dinorá sua paixão e seu filho Junior que também escolheu se
chamar “Besouro”, o menino representa a semente que o nosso herói plantou para
as futuras gerações que dariam continuidade a sua luta, uma geração que se
mantêm unida e tem orgulho de pertencer a uma raça que tanto deu para a
construção de uma nação.
Em suma tirando se o fato do autor ter utilizado de recursos tecnológicos dos
tradicionais filmes hollywoodianos como “Matrix” ou chineses como “O Tigre e o
Dragão” em cenas quando Besouro voa pelas bananeiras, dança literalmente por
entre as pedras ou voa entre galhos de árvores, pode-se dizer que real finalidade da
obra se mantém fiel ao seu propósito ou seja o resgate de uma cultura há muito
marginalizada e incompreendida pela sociedade até mesmo pelos afro-
descendentes que desconhecem o verdadeiro significado dos orixás e das práticas
africanas tradicionais devolvendo-lhes o orgulho de ser negro.
2 Um pouco de História: como, afinal, morreu Besouro? http://www.besouroofilme.com.br/blog/?
p=1378.
O filme assim como a literatura negra possibilita o conhecimento da realidade
pós abolição e quebrar conceitos equivocados sobre a cultura afro. Apesar do tema
central ter sido a capoeira, o autor se preocupou em focar outros aspectos da
cultura, passar algum ensinamento e conscientizar a sociedade em geral o quão
grandioso foi o esforço dos ex-escravos na busca de uma sociedade mais igualitária
e justa.
Deve-se reconhecer também que os dois trazem à tona questões como
injustiças sociais, discriminação, abusos, mas que acima de tudo resgata no
indivíduo o orgulho de ser negro, para que a geração atual tome conta de que
muitos lutaram e morreram para que a geração atual vivesse de forma mais justa e
democrática e para que a cor nunca seja usada como desculpa falta de
oportunidade , e sim como símbolo do esforço de um povo que apesar de muito
sofrimento se superou e conseguiu se impor na sociedade.
É importante frisar é que a literatura negra seja ela escrita ou em vídeo
cumprem a mesma finalidade, buscar sempre o reconhecimento e o orgulho negro
uma vez que por causa de preconceitos e proibições das classes dominantes e da
igreja católica acarretou numa aculturação tão grande que hoje em dia se torna difícil
separar o que realmente é afro ou não, aliás, o que se vê na atualidade é uma
cultura tipicamente afro-brasileira.
Talvez seja isso o que torna o Brasil tão heterogêneo, uma mistura de
diversos povos vindo das regiões mais distintas que formaram um só, aqui não
temos raças, mas sim um povo tipicamente brasileiro.
REFERÊNCIAS:
AZEVEDO, Célia Maria Marinha de. Quem precisa de São Nabuco?. Revista
Estudos Afro-asiát. [online], 2001, vol23, nº1. Disponível em <
http://www.scielo.br/pdf/eaa/v23n1/a04v23n1.pdf>. Acesso em 09 abr. de 2011.
Carvalho, Marco. Feijoada no paraíso: A saga de Besouro, o capoeira. 2ª ed. – Rio
de Janeiro: Record, 2009. Disponível em <http://catracalivre.folha.uol.com.br/wp-
content/uploads/2009/12/FEIJOADA-NO-PARA%C3%8DSO.pdf>. Acessado 01 abr.
de 2011.
TIKHOMIROFF, João Daniel. Besouro: nasce um herói. São Paulo: Globo filmes,
2009.