TRABALHO MISÉRIAS DO PROCESSO PENAL

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    E NS IN O S UP ER IO R . MU lTOT R A B A lH O D E D IR E IT O P R O C E S S U A l P E N A L IP R O F E S S O A R S ilV IA - A lU NA : L IV IA A M O R IM

    AS M ISER IAS DO PROCESSO PENALFrancesco Cornelutti

    Brasilia, 05 de junho de 2011.

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    INTRODU~AOEste trabalho trata-se de uma dissertacao acerca da obra de Carnelutti: "As

    Miserlas do Proce sso Penal". Minha lntencao e retratar todo 0 conhecimento que pudeextrair dos ensinamentos do autor, e fazer uma comparacao com a realidadeconternporanea vivida ao longo do processo, na fase de execucao, e ainda, darealidade do preso ao cumprir sua pena e tentar se inserir novamente a sociedade.

    Tive a oportunidade de sentir a realidade do preso em uma visita recente aopresidio do Distrito Federal, e tentarei repassar aqui um pouco dessa experiencia,assim como os ensinamentos do grande criminalista RAUL EUGENIO ZAFFARONI, 0qual deu-nos a honra de ouvi-lo em palestra ministrada na OAB-DF.

    AS M ISERIAS DO PROCESSO PENAL

    o Direito e necessario, mas nao e suficiente. Carnelutti considera artificial 0 atede julgar com base em normas jurldicas prontas, incapazes de regular situacoesimprevisiveis, ou que nunca ocorreram. Para julgar com coerencia um processo penalseria necessario conhecer toda a vida do acusado, tudo aquilo que 0 levou a cometertal crime. Como nao acontece dessa forma, todo julgamento estaria fadado aofracasso, a injustica de uma analise limitada a um pequeno espaco de tempo queocasionou tal crime, sem levar em conta todo 0 contexte de uma vida, que na verdadee a hist6ria do desenrolar dos fatos, e tudo 0 que ocasionou aquele fato. 0 julgamentoe a revelacao da rniseravel condicao humana do acusado submetido ao julgamento deseu semelhante, tao sujo e sujeito ao crime como 0 reu, influenciado pela pr6priaconsciencia, a qual nem se sabe de quais valores e formada. Por isso, diz-se que 0processo morre sem alcancar a verdade. 0 processo penal e 0 drama da inimizade e dadisc6rdia entre quem comete 0 delito, ou supostamente comete, e aqueles queassistem a sua perpetracao.

    "Coisificar" 0 homem. Encarcerados em jaulas como animais no zool6gico, eassim que sao tratados os presos. E aqui abro um parentese para dividir minhaexperiencia em visita a um presidio. Nada em minha vida foi tao humilhante do queobservar os detentos no patio da penitenclarla, me senti como se estivesse ali paraacusar ta rnbem, mesmo nao sendo verdade. Vi 0 quae acuado fica 0 ser humaneenjaulado. Epor mais que se tente falar em dar dignidade ao preso na cadeia, nenhumluxe e capaz de devolver a vida aqueles seres humanos, pois e isso que ocorre ao presoquando e condenado, ele morre, torna-se um nada para a sociedade.

    Um sfmbolo de uniao e desunlao, a Toga. Unem-se os magistrados, advogadose promotores, doutores entendedores do Direito, donos da verdade absoluta, os quedao a ultima palavra, mesmo no tribunal do juri, pois 0 juri popular sempre seguira umdos lados, defesa ou acusacao, influenciados e persuadidos pelos argumentos. E osleigos ficam separados dos toga dos, e como se estivessem desnudos de conhecimento.A Toga do conhecimento e de todo 0 poder. Uma guerra e formada, de um lade dabarricada os magistrados, e do outro, acusador e defensor. No processo e necessariofazer guerra para se chegar a paz. E como se defesa e acusacao guerreassem entre si eo juiz diz quem venceu a guerra.

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    Cada um e prlsloneiro de si mesmo, em seu egofsmo e solidao, Somentequando se abre para entender 0 outro e que 0 homem sai da prisao e deixa a graca deDeus penetrar em sua alma e liberta-la. 0 preso encarcerado e a mais pobre dascriaturas, desnuda pelas algemas, 0 mais nftido emblema jurfdico. As algemas despemo homem de todos os valores, tudo 0 que esta oculto e revelado, esta e a funcao dodireito.

    o unico "amigo" do preso. Sim, pois e isso que 0 enjaulado quer, a esmola daamizade. Para 0 preso nenhum luxo, ou ate mesmo a comida, e mais importante queser ouvido, que poder compartilhar seus pensamentos. 0 advogado e 0 unlco capaz deoferecer-Ihe isso, mesmo que em troca do interesse profissional, As causas civis epenais sao sin6nimas da inimizade, todos contra 0 acusado, eo advogado e 0 amigo, 0grito de ajuda do reu. A nobreza do advogado e 0 fato de ele estar no ultimo degrau daescada para dar a mao ao seu cliente, enquanto todo 0 mundo esta contra ele. 0advogado precisa sentir 0 que sente 0 acusado, toda sua solidao, 0 abandono dasociedade e sua necessidade de companhia. A vida do advogado e poesia, a primeiravez com a toga, alvorada, defender a inocencia, e pouco a pouco vern as desilus5es,crepusculo, e finalmente 0 azul do ceu sorri, e chegada a hora de aposentar a toga.

    o homem e parte, assim como todos aqueles diante do juiz, e este por sua vez,se nao e parte, e super partes, esta acima, como se fosse um deus terrestre. Mas 0 juiztambern e homem, e sendo homem tarnbern seria parte. Este e 0 drama do juiz, serhomem e dever ser mais que um homem, simultaneamente. Ninguern em saconsciencia seria juiz se tivesse ideia do que e julgar 0 outro. Ninguern e digno 0bastante para julgar 0 outro, e 0 que faz 0 juiz ser menos indigno e ter consciencia desua indignidade, de que a alma humana nao e um corpo sobre a mesa sendo estudadopela anatomia, e de que ele nao esta acima da alma humana.

    Todo ser humane e parte, ninguem tem a verdade nas maos, 0 que cada umtem e a sua vlsao da verdade, apenas um lade do prisma. Isso e 0 que faz cada um serparcial de acordo com suas proprias raz5es. Quanto mais raz5es expostas, maisproximo se chegara da verdade. Acusador e defensor sao argumentadores tentandoconstruir e expor suas raz5es, 0 objetivo de seu offcio e argumentar para alcancar umaconclusao pre-concebida. Se 0 advogado fosse imparcial trairia seu proprio dever noprocesso, a sua razao de ser, que e carregar a cruz pelos outros. 0 dever do advogadoe buscar 0 mais alto nfvel de satisfacao de seu cllente. assim como 0 acusador, quebusca 0 maior nfvel de satisfacao da sociedade naquele caso, para exaltar a forcacoercitiva do estado.

    As provas servem para se chegar a verdade dos fates, para reconstruir ahistoria, voltar ao passado. E 0 fato e apenas um pedaco da historia, do caminhotrilhado. A testemunha, a prova mais tendente a falhas de todas, e um mal necessarioclassiflcado junto aos documentos, influenciada pelas partes fica acuada, podendoviciar 0 processo.

    o homicfdio nao e apenas 0 matar, e 0 querer matar. Contudo, nao se podejulgar a intencao isolada da acao. Porern, quando se sabe que 0 acusado matou umhomem com um tiro de pistola, ainda nao se conhece 0 necessario para se proferir acondenacao. Temos de levar em conta toda a acao e nao apenas um fato isolado, aacao humana nao e fato isolado, mas todos os atos em conjunto. Apes reconstruir um

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    fato 0 juiz percorrera ainda toda a vida do acusado. Sera um historiador vencendo adesconfianca natural para acreditar no relato sincero do acusado, se e que isso eposslvel, pois a desconfianca e vencida pela amizade, e amizade entre juiz e acusado eutopia. 0 processo penal e pequeno diante de sua rnissao, que e a de chegar a verdadedos fatos e condenar alguem, porern dele nao se pode prescindir, ao mesmo tempoque e necessario, e tambern insuficiente.

    Nao ha como resolver 0 problema do futuro sem olhar para 0 passado. 0passado do preso e reconstrufdo para servir de base para seu futuro. A razao dacerteza do delito para nada serve senao para aplicar a pena. 0 delito esta no passado,a pena no futuro. E preciso de algo que assuste 0 homem para livra-lo da tentacao, eledeve saber das consequencias de seus atos para poder se conduzir. E necessarioprevenir os delitos antes de reprimi-Ios. As vezes, parece que 0 unico momenta usadopara a reflexao do preso sobre seus atos e 0momento da reconstrucao de sua hlstoria,quando se confronta com os sofrimentos, angustias, e vergonhas, e isso e apenasrepressao. Esquecem-se do momento da prevencao efetiva, que de maneira algumadeve estar ligada ao momenta do processo, e 0 momenta do passado que deveriafazer parte daquela hlstoria, e se tivesse feito, nao haveria processo. A lei e umanecessidade, e quanto a necessidade nao cabem protestos, mas nao se deve esquecerda pobreza do processo e do Direito para avancarrnos como civilizacao.

    Dada a hora da sentence 0 juiz absolve ou condena, ou ainda, absolve por faltade provas suficientes. Mas 0 que sera 0 acusado absolvido por falta de provas? Porquequando ele e inocente 0 juiz assim 0 declara, e declaracao inversa acontece quando econdenado, mas aquele de quem nada se pode provar, 0 juiz declara que nada podedeclarar, e logico, porem vago e torturante, para todos, e com esse estigma 0 acusadose encontra obrigado a conviver. Para Carnelutti, toda sentence de absolvicao e umerro judicial, e ele desconhece outro jurista que admita isso. Fazer 0 acusado passarpor todo aquele constrangimento, e muitas vezes ate ser condenado pela mfdiaantecipadamente, nada mais justo que pelo menos a justice admitisse com um pedidoformal de desculpas. Nao que seja errado levar alguern a julgamento que depois venhaa ser declarado inocente, pois nao tem outra forma de fazer, mas a retratacao do juizcomo representante do Estado seria plausivel.

    A coisa julgada nada mais e do que um substantivo da verdade, e um atributo enao a verdade absoluta, e considerada a verdade, e a verdade vista da forma que sechegou dentro das possibilidades do processo.

    A sentence condenatoria e um diagnostico de que 0 acusado padece de falta deamor, pois embora muitos insistam que 0 crime vem da mente, na verdade ele vem docoracao, e falta de amor se cura com amor. Eo castigo e incompativel com 0 amor.

    o processo term ina com a safda da prlsao, mas a pena e perpetua, 0 sofrimentoe 0 castigo continuam. Cristo perdoa, mas os hom ens nao. 0 preso jamais 0 deixa deser, apenas muda para ex-preso, e seu estigma para a vida inteira. As pessoas nao daoa mao a um ex-presidia rio e se acham no direito de condena-lo a uma prlsao social portoda a vida. A sociedade se encarrega de ser a mais cruel julgadora, com a pior dassentences, a de segregar uma vida e priva-ta do direito de conviver. 0 carcere e a maisdestrutiva arma contra a alma humana, pois causa feridas incapazes de cicatrizar, ecomo a peste mais contagiosa, que ninguem tem coragem de tratar. Porern

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    esquecemos que somos pobres humanos desprezfveis e passfveis dos mesmos erros, enao importa tudo de bom que fizemos ao mundo no passado, depois do crime e daprlsao, seremos iguais aos demais, e toda nossa ficha de coisas boas e apagada esubstitufda pela condenacao eterna. E esse e 0 trabalho da mfdia hoje em dia, comopodemos ver nos jornais. Antes mesmo de ser condenado pela justice 0 acusadorecebe a pena da mfdia, e muitas vezes ainda na fase do inquerito, na qual sabemosque nao ha espac;:opara 0 contradit6rio. E como condenas sem dar garantias? A mfdiae a mais cruel julgadora, escolhe 0 caso que Ihe dara mais ibope, sem se preocuparcom a vida humana que perecera, e condena. As pessoa compram a ideia sem sequeranalisar 0 caso ou dar a chance de defesa. Isso e justic;:a?A liberdade de imprensa evallda, todos precisam de inforrnacao, mas a dignidade da pessoa humana eo pilar detodos os princfpios constitucionais e isso precisa ser respeitado no processo. Hoje emdia 0 judicia rio perdeu 0 controle em relacao a mfdia, e 0 Estado nada tem feito comreceio de ser taxado como ditador. Os grandes ernpresarios dos meios de cornunicacaoencontram respaldo nas limitacoes da epoca da ditadura e 0 Estado tem se acovardadodiante disso, deixando com que a mfdia pratique a tutela judicial e condene as pessoasarbitrariamente. 0 que e mais nftido e que os condenados pela mfdia sao aqueles queconvern aos empresarios, seja quanto ao ibope, seja por interesses polfticos, e asociedade segue manipulada e alienada segregando vidas.