Transformações Da Forma Urbana de Mooca

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    Transformaes da forma urbana no distrito da Mooca1 *; **; ***

    Resumo Este trabalho apresenta um processo emprico de anlise morfolgica de um setor urbano.

    atribuda ateno especial transformao de sua forma ao longo do tempo. Foi escolhido um setor bemdelimitado como exemplo da identificao do processo de mudana. No entanto, trabalha-se com uma

    situao que pode ser tpica do setor escolhido, mas sabidamente se repete em outros locais da cidade eem outras cidades. Isto porque a transformao da forma urbana aparece como reflexo de modificaesna estrutura social, econmica e cultural da cidade. Para ser objeto deste trabalho foi selecionada uma

    rea que os cidados de So Paulo chamam de Bairro da Mooca. Depois, dentro da Mooca delimitou-se um trecho menor, coincidindo com o que a diviso administrativa da cidade denomina subdistrito

    Hipdromo. Como parte da anlise morfolgica, discute-se a situao atual da implantao acelerada degrandes condomnios de carter monofuncional. As transformaes urbanas so registradas pelo texto e

    ilustradas por desenhos esquemticos e fotos.

    Palavras-chave Morfologia urbana. Novo urbanismo. Arquitetura da cidade

    Title Changes in the Urban Form of the Neighborhood of MoocaAbstractThis paper presents an empirical process of morphological analysis of an urban section. Specialattention is paid to changes in its form through time. A very well defined section has been selected as an

    example of identification in the changing process. Nonetheless, we deal with a situation that might betypical of the selected section, but is wisely repeated in other section of ours and other towns. This is due

    to the fact that changes in the urban form occur as a reflection of changes in the social, economic andcultural structure of a town. The target of this paper was an area the citizens of So Paulo call Bairro

    da Mooca. Then, inside Mooca, a smaller area as determined, coinciding with what the administrativedivision of the city calls subdistrito Hipdromo. As a part of the morphologic analysis, we discuss the

    present quick implantation of large mono-functional condominiums. The text registers the urban changes,and they are illustrated by drawings and photos

    Keywords Urban morphology. New city planning. City architecture.

    Data de recebimento: 12/12/2007.Data de aceitao: 20/12/2007.* Doutor pela FAU-USP em 1987, professor dos cursos degraduao e de Ps-Graduao da FAU-USP e da USJT, coordena oGrupo de Pesquisa (GP) Arquitetura Urbana da USJT.E-mail: [email protected]** Doutora em Histria da Arquitetura e do Urbanismo pela FAU-USP (2005), participa de pesquisa na FAU-USP.*** Formado em Arquitetura e Urbanismo pelo Centro UniversitrioBelas-Artes (1998), aluno do curso de Mestrado em Arquitetura eUrbanismo da USJT, participa do GP Arquitetura Urbana da USJT.

    No distrito da Mooca pode-se observar a transfor-

    mao do tecido urbano de um tipo de ocupao

    tradicional, em que as residncias convivem com

    as indstrias, para uma situao em que os terrenos

    deixados por estas so ocupados por grandes con-

    juntos residenciais. Atualmente este tipo de trans-formao deve ser estudado devido ao boom

    imobilirio que se acelera no apenas na Mooca,

    mas em diversos bairros da cidade. Neste texto

    vamos mostrar como se transforma o espao, sob

    o aspecto fsico. A Mooca foi o local de estudo

    escolhido devido sua importncia na cidade de

    So Paulo e ao compromisso da Universidade So

    Judas Tadeu, da qual faz parte a nossa escola deArquitetura, com a vizinhana ao seu redor. Fomos

    impulsionados do ponto de vista acadmico pela

    necessidade de compreender como se estruturam

    os lotes e as edificaes que formam as quadras, e

    qual o impacto das alteraes de uso do espao nas

    transformaes que esto ocorrendo em funo

    da nova explorao imobiliria.

    O presente estudo poder servir para subsidiar

    uma posterior indicao de padres de espaos

    para a formulao de diretrizes de ocupao do solopelo poder pblico.

    O distrito da Mooca, nossa primeira rea de

    estudo, localiza-se na Regio Administrativa da

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    14 et al.Distrito da Mooca

    Mooca, e para a seleo desta rea foi necessrio,

    primeiramente:

    Identificar o setor em que esto ocorrendo

    as maiores modificaes na forma urbanapreexistente,

    Investigar como ocorrem as mudanas da

    ocupao do espao fsico devido a modifi-

    caes de uso impostas pela nova realidade, Identificar os tipos de espao resultantes da

    alterao da predominncia de uso indus-

    trial para residencial, comercial e de servios.

    Portanto, identificar e analisar as novas relaes

    que se estabelecem entre rua, quadra, lote e edifcio.A Mooca foi um importante local de passagem

    para pessoas e mercadorias em direo ao litoral sul

    do estado. Hoje se tornou um distrito central da

    cidade de So Paulo, cuja populao atinge 10 mi-

    lhes de pessoas, e centro de uma rea metropo-

    litana de 18 milhes de habitantes. Em So Paulo,

    desde 1960, alm da Mooca, outros locais j pas-

    saram ou vm passando por transformaes fsicas

    semelhantes. Isto devido intensa mudana dos

    padres de acessibilidade, relacionada s transfor-

    maes do uso do solo e aos valores da terra.

    Segundo a diviso administrativa da cidade, a

    Regio Administrativa da Subprefeitura da Mooca

    compreende seis distritos: Mooca, Belm, gua

    Rasa, Tatuap, Brs e Pari. Dentro do distrito da

    Mooca, elegemos o subdistrito Hipdromo como

    setor especfico de estudo devido clareza e diver-

    sidade de tipos fsicos associados dimenso dos

    lotes e ao padro de uso e ocupao do solo, o quepermite revelar a histria do local para alm dos

    limites de sua situao atual. Portanto, um lugar

    estimulante para o estudo das relaes entre a rua,

    a quadra, o lote e o edifcio. Na Figura 1 pode-se

    observar a dimenso da rea abrangida pela Admi-

    nistrao Regional da Mooca em relao subdi-

    viso regional que leva seu nome. Decidimos

    utilizar a nomenclatura oficial que se refere ao

    distrito da Mooca, no lugar de Bairro da Mooca,

    modo pelo qual tradicionalmente as pessoas se refe-rem ao lugar, para acompanhar a nomenclatura

    oficial em que comparece a palavra Mooca em

    diversas situaes. O termo distrito, em linguagem

    internacionalmente reconhecida, aplicado a seto-

    res bem delimitados que se formam em torno do

    espao destinado atividade principal que deu

    origem aglomerao humana em seu entorno.

    Por exemplo, o distrito da universidade, o distritodo aeroporto, o distrito da represa ou o distrito do

    hipdromo. Por esta classificao o distrito Mooca

    corresponde ao Bairro da Mooca, como popular-

    mente chamado (Lynch, 1960). Vamos ainda fazer

    mais um recorte, dentro do distrito da Mooca, que

    nos levar a estudar o subdistrito Hipdromo

    (Macedo, 2002). O Hipdromo, se fosse para usar

    a classificao internacional, seria reconhecido

    como distrito Hipdromo situado no bairro da

    Mooca. Esta questo de nomenclatura relevantedevido literatura internacional sobre morfologia

    urbana, para que se entenda a que os autores real-

    mente se referem. Um caso interessante a tradu-

    o para a lngua portuguesa do livro A imagem da

    cidade,de Kevin Lynch (1990), em que a traduo

    dedistrictfoi feita como bairro, o que certamen-

    te confunde o leitor mais habituado com o vocabu-

    lrio especfico da morfologia urbana.

    O subdistrito Hipdromo, somado ao subdis-

    trito Mooca e ao subdistrito Parque da Mooca,

    Figura 1. Regio Administrativa da Mooca.

    Fonte: Ilustrao dos autores sobre o mapa da cidade.

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    encerra o polgono que define o distrito da Mooca

    na Regio Administrativa da Mooca. Esta regio,

    com a caracterstica original da predominncia de

    indstrias, partilhada por moradias e edificaes

    complementares para servios, tem seu lado resi-dencial acentuado pela construo de mais habi-

    taes entre 1940 e 1950. Nesta dcada foram

    entregues os primeiros edifcios dos conjuntos cuja

    construo foi promovida pelo Instituto de Apo-

    sentadoria e Previdncia dos Industririos (IPAI)

    e o dos Empregados em Transportes e Carga (IA-

    PETC), situados entre as ruas da Mooca, Fernando

    Falco, Cassandoca e Itaqueri, para os taxistas, e entre

    as ruas dos Trilhos, Tobias Barreto, Donatrios e Cas-

    sandoca, para os industririos, ambos compostospor blocos de residncias unifamiliares e toda a

    infra-estrutura viria e de equipamentos institucio-

    nais. Este clima contaminou toda a regio, levando

    empreiteiros particulares a construir conjuntos de

    residncias ao longo de ruas inteiras, bem como

    vilas de acesso ao interior das quadras, ladeados por

    depsitos e galpes industriais de pequeno, mdio

    e grande porte, possibilitando a moradia prxima

    ao local de trabalho, sonho de todo morador das

    regies metropolitanas de alta densidade. Numa

    prxima etapa de desenvolvimento urbano as inds-

    trias comeam lentamente a esvaziar seus galpes

    e depsitos, dando lugar aos primeiros empreendi-

    mentos residenciais verticais da rea, concentrados

    entre as ruas Sapucaia, Tobias Barreto e Cassando-

    ca, o que pode ser observado na foto area que

    delimita o subdistrito Hipdromo (Figura 2).

    Na rea de estudo ocorrem transformaes

    assim observadas:

    o sistema virio original foi rasgado pelos

    corredores que ligam o bairro ao Centro da

    cidade, s marginais e s zonas Leste e Oes-

    te, bem como ao corredor nortesul; as grandes glebas antes ocupadas por inds-

    trias so transformadas em condomnios

    residenciais, em sua maioria de carter mo-

    nofuncional, ou seja, apenas edifcios resi-

    denciais, que no prevem a instalao dereas destinadas ao comrcio e prestao

    de servios (muito menos, destinam espaos

    para fins institucionais, como ensino, sade,

    cultura); lotes pequenos, originalmente ocupados por

    residncias, depsitos de mercadorias, servi-

    os complementares s indstrias e servios

    destinados aos moradores, so reincorpo-

    rados e neles tambm construdo o mesmo

    tipo de condomnios residenciais.

    Na Figura 3 ressaltam-se as reas recentemente

    ocupadas por grandes empreendimentos residen-

    ciais.

    Figura 2. Subdistrito Hipdromo.

    Fonte: Base aerofotogrametria voo ES 11061 linha 14 foto 6379.

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    16 et al.Distrito da Mooca

    Os empreendedores imobilirios em relao ao

    projeto urbano e de arquitetura tendem repetio

    exagerada de padres que deram certo, com ino-

    vaes apenas superficiais no invlucro da cons-

    truo. No que inexista a inovao tipolgica,ela existe, porm lenta, dada falta de iniciativa

    em arriscar, por parte dos empreendedores. Na

    verdade, o grande construtor aquele que melhor

    compreende e fornece respostas ao mercado, as

    quais so absorvidas imediatamente pela socieda-

    de. Estabeleceu-se nas grandes cidades uma supre-

    macia do agente imobilirio em relao ao

    arquiteto. Os escritrios de projeto que trabalham

    para os empreendedores, por razes diversas, cuja

    interessante discusso foge do escopo deste traba-lho, proclamam que ficam de mos atadas no s

    quanto configurao das edificaes, mas tambm

    quanto ao estilo que lhes imposto pelos empre-

    endedores que os contratam2. O ponto de vista que

    adotamos sobre esta questo que, se, por um lado,

    h o esforo do empreendedor, que por estar inves-

    tindo seu dinheiro no pode errar e assim se torna

    um conservador, do outro, no h vozes da comu-

    nidade para discutir esta questo. As formulaes

    que apresentamos neste artigo partem do ponto

    de vista acadmico, profissional, e do cidado

    preocupado com o destino dos espaos de sua

    cidade.

    Nossa experincia referenciada no planeja-

    mento urbano centralizado, organizado por leis dezoneamento inspiradas nos princpios de higiene

    das edificaes e de separao das atividades das

    pessoas ditados em 1935 pela Carta de Atenas3.

    No s em So Paulo que se observa o efeito da

    falta de urbanidade que estas regras impem ao

    desenho das cidades, isto tem sido discutido j h

    algum tempo nos EUA e na Europa4. interessante

    que apenas iniciados nos assuntos de arquitetura

    e urbanismo alimentem esta discusso sobre ques-

    tes que remetem reviso do urbanismo moderno,uma vez que profissionais de outras reas tm feito

    apelos veementes para estimul-la, sempre que h

    oportunidade. Apontamos para as respostas do

    jornalista Gilberto Dimenstein em uma entrevista

    a Associao Brasileira de Escritrios de Arquitetu-

    ra, que diz: [...] So Paulo uma terra de ningum.

    S em uma cidade sem tica urbana pode acontecer

    de um prdio de altssimo padro desconsiderar

    totalmente a existncia de uma praa degradada em

    frente. Os espaos pblicos no existem, o cidado

    Figura 3. Subdistrito Hipdromo: Principal localizao dos

    conjuntos residenciais.

    Fonte: Croqui de Adilson C. Macedo, 2007.

    O croqui mostra a implantao dosconjuntos de habitao social e dosnovos condomnios de classe mdiaao longo das vias de circulaoprincipal da regio.

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    vive dentro do carro, da casa, do escritrio. A ci-

    dade tem que se integrar e ensinar por seus espaos,

    que devem interagir com o cidado, que a passa a

    se sentir responsvel por seu ambiente [...]. Con-

    clui dizendo que os arquitetos poderiam mostraraos gestores pblicos exemplos de cidades que

    apresentem espaos integrados com a vida pblica

    (Asbea, 2007).

    Em So Paulo, dado o alto custo da terra, a fr-

    mula do sucesso est nos projetos que aproveitam

    o mximo do potencial construtivo do lote, gerando

    uma construo vertical que possa deixar a maior

    rea livre de terreno possvel. Neste aspecto, veri-

    ficam-se ndices de projeo abaixo do permitido

    pela legislao urbanstica. Para a venda destesempreendimentos, o marketing baseado na ofer-

    ta de grandes espaos livres, reas verdes e seguras,

    de uso privativo dos moradores. Para a cidade isto

    tem o efeito benfico de contribuir para a melhoria

    da relao entre reas construdas e espaos livres.

    Por outro lado, tm o efeito extremamente preju-

    dicial de desvalorizar ainda mais o espao pblico,

    caracterstica de nossa desarticulada classe mdia.

    Defendem apenas os espaos privados, de seu

    condomnio, cuja rea, se no engloba toda a quadra,somada a um ou dois condomnios, e uma ou outra

    pequena construo que restou, ocupam toda a

    quadra, como mostra as configuraes de quadra

    na Figura 4.

    Estamos caminhando para um tipo de cidade com

    muros altos, guaritas e portais de acesso grandio-

    sos que controlam a segurana (necessria, sem

    dvida) de grupos familiares restritos. Construo

    humana para estar em um livro futuro sobre a cida-

    de real que So Paulo, descrito por um observadorque no precisa ser to perspicaz quanto o viajante

    Marco Plo, em Cidades invisveis,de Italo Calvino.

    Esta caracterstica, que h duas dcadas seria privi-

    lgio dos conjuntos de classe mdia e alta, hoje se

    faz presente tambm nos condomnios destinados

    Figura 4. As transformaes da quadra.

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    18 et al.Distrito da Mooca

    populao de renda menor. O conjunto do IAPI,

    lindeiro Avenida Cassandoca, no subdistrito Hip-

    dromo, nosso setor de observao, antes totalmen-

    te aberto, permeado pelo traado virio e recortado

    por vielas de pedestres, hoje est completamentesegmentado, as quadras foram cercadas e cada con-

    junto de blocos tornou-se um condomnio inde-

    pendente. As reas comuns, para serem preservadas,

    tiveram que ser muradas ou cercadas, restringindo-

    se seu uso apenas aos moradores do conjunto. Isto

    caracteriza a necessidade de organizar a comuni-

    dade em ncleos de administrao simplificada,

    alm de ser inevitvel tomar medidas de seguran-

    a. Tal fato aponta-nos a possibilidade de um dia

    vermos surgir o sentido de organizao da comu-nidade em torno de 15.000 a 20.000 pessoas que

    representem um grupo fortalecido para outros n-

    veis de reivindicao (Lynch, 1981).

    As modificaes da quadra interferindo no te-

    cido urbano tradicional, conforme os desenhos da

    Figura 4, aconteceram a partir de 1950 em diferen-

    tes bairros da cidade de So Paulo, chegando a pa-

    tamares de ocupao do solo de alta densidade, at

    maiores que os atuais, uma vez que a legislao

    urbanstica vigente era mais permissiva.

    No entanto, observamos uma diferena: os em-

    preendimentos eram erguidos em lotes menores,

    permitindo uma srie de acessos consecutivos nas

    quadras e possibilitando a chegada do pedestre s

    caladas, o que estimula muito os percursos a p,

    principalmente se os moradores tiverem a cerca de

    800 metros de seus prdios oferta de comrcio de

    convenincia e servios de primeira necessidade

    (Campos Filho

    , 2003).Complementando este quadro, observa-se que

    desde o incio do sculo XX a Mooca considerada

    um bairro industrial, entremeado por habitaes,

    com alguma rea verde, e equipamentos culturais e

    sociais suficientes para suprir as necessidades da

    poca.

    O aumento da demanda por comrcio e servios

    se fez sentir no distrito, tendo crescido muito, na

    medida em que a populao residente aumentou.

    Da mesma forma cresceu o comrcio de ampli-tude regional, localizado quase sempre nas princi-

    pais vias de ligao.

    As transformaes acarretaram:

    sobrecarga no sistema virio original do

    bairro; sobrecarga na j deficitria oferta de espaos

    para comrcio, servios e instituies; isolamento das moradias e supresso de uma

    dinmica urbana complexa composta pelas

    atividades variadas de ocupao e moradia

    no bairro (Santos, 1988); transformao na identidade do bairro,

    diferenciado na composio das diversida-

    des regionais na cidade de So Paulo.

    No subdistrito Hipdromo os novos projetos

    tm ocupado os espaos deixados pelas indstrias,

    e, em conseqncia, os maiores empreendimentosesto voltados para as vias principais. Como existem

    pequenos prdios ocupados no trreo por atividades

    de comrcio, em geral com residncias no pavi-

    mento superior, as vias principais que poderiam

    organizar-se por um padro de comrcio em linha

    esto ficando interrompidas pelos extensos muros

    dos condomnios. Em vias locais, com predomi-

    nncia de residncias unifamiliares j se faz bem

    visvel a dualidade com os muros dos condomnios

    (Figuras 5 e 6 e Figuras 7 e 8). Em um artigo de-

    dicado aos 450 anos da cidade de So Paulo, o

    jornalista Tim Teixeira discute a situao das trans-

    formaes atuais: [] s na Rua Cassandoca so

    trs grandes empreendimentos. A Tricury, por

    exemplo, ergue o Spazio Vivere, com trs torres e

    204 apartamentos. A Setin comprou uma rea de

    31,6 mil m2, para construir 324 unidades, em seis

    edifcios. A Cyrela faz um empreendimento maior

    ainda: num terreno de 47,4 mil m2

    , constri novetorres, com um total de 564 apartamentos. O em-

    preendimento ter lago artificial, pista de Cooper,

    cascata e at um anfiteatro entre os mais de 50 itens

    de lazer. Na Rua Marina Crespi a Tecnisa levanta

    quatro torres de 22 andares, com 340 unidades,

    enquanto a Schahin lana o empreendimento Stu-

    pendo, na Rua Borges de Figueiredo, espao antes

    ocupado pela Mquinas Piratininga: trs edifcios,

    204 apartamentos (Teixeira, 2007).

    Essa preocupao do jornalista, que como oarquiteto est envolvido no dia-a-dia dos problemas

    da cidade, demonstra a importncia de discutir-se

    a questo das mudanas na forma da cidade.

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    As observaes do que ocorre no Hipdromo,

    da mesma maneira que em outros locais da cidade,

    permitem a seguinte afirmao: no h inovao nos

    projetos, todos aprovados pela legislao urbans-

    tica em vigor at 20055. Pela lgica do empreende-

    dor, no h por que alterar o projeto que d certo.

    No entanto, em parcelas que atingem s vezes mais

    que 6 hectares, com pelo menos uma lateral para

    uma via principal, no seria possvel tentar-se uma

    ocupao de uso misto? Dar abertura para o espa-

    o urbano, respeitados os requisitos de segurana

    impostos pela megacidade? Edifcios de uso misto,

    alinhados com a rua ou com o recuo frontal im-

    posto pela legislao j foram muito utilizados em

    So Paulo. Nem preciso citar as cidades europias.

    Outra questo relativa posio que assumimos

    sobre a urgncia de repensar-se a forma da cidade

    a de que existe um enorme estoque de reas boas

    para construo de residncias e seus complemen-

    tos em So Paulo. Por isso necessrio reconside-

    rar a adoo de taxas de ocupao relativamente

    altas utilizando construes baixas. Mesmo entre

    os planejadores comum empregar-se a palavra

    verticalizar, pensando em torres circundadas por

    reas verdes, e quase nunca adensar, o que concer-

    ne a permitir em princpio abertura para uma

    volumetria mais variada das construes. Nas Figu-

    ras 9 e 10 procura-se ilustrar diferentes tipos de

    ocupao do espao. A Figura 9 mostra a ocupao

    de uma quadra inteira por prdios que respeitam um

    Coeficiente de Aproveitamento (CA) igual a 2,5 e

    uma Taxa de Ocupao (TO) igual a 0,15. A Figura

    10 mostra a mesma quadra com prdios com o

    mesmo CA igual a 2,5 e a TO igual a 0,45. Esta

    variao demonstra a possibilidade de repensarem-

    se alternativas de projeto que j foram utilizadas

    Figura 5. O desenvolvimento por partes: exemplo de uma rua com

    residncias sem recuos.

    Fonte: Fotos de Paulo Gonalves, 2007.

    Figura 6. O desenvolvimento por partes: exemplo de uma rua com

    lotes residenciais e industriais.

    Fonte: Fotos de Paulo Gonalves, 2007.

    Figura 7. O desenvolvimento por grandes empreendedores: muros

    de garagem ocupando o alinhamento das antigas residenciais.

    Fonte: Fotos de Paulo Gonalves, 2007.

    Figura 8. O desenvolvimento por grandes empreendedores: os

    novos condomnios e o conjunto do Instituto de Aposentadoria e

    Penso dos Industririos.

    Fonte: Fotos de Paulo Gonalves, 2007.

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    20 et al.Distrito da Mooca

    em nosso passado recente e so comuns em outros

    lugares do mundo.

    Conclumos afirmando a questo central de ser

    urgente em So Paulo a integrao dos critrios de

    planejamento com aqueles de desenho da cidade.

    Repensar a cidade no apenas por manchas em que

    se atribui um zoneamento conservador ou com a

    modificao oriunda da presso exercida pelo

    empreendedor imobilirio. Presso esta em que

    comparecem os interesses de mercado mais ime-

    diatos. Repensar o desenho da cidade no sentido

    que se pretende neste texto, e em relao ao qual

    sero encaminhadas nossas pesquisas mais deta-

    lhadas sobre o assunto, inclui fundamentalmente

    o trabalho do arquiteto, ao lado da comunidade

    envolvida em cada parte da cidade e do poltico

    local; o empreendedor imobilirio, ao lado do

    especialista em mercado e do construtor, e o tc-

    nico do poder municipal responsvel pela poltica

    pblica, legislao e fiscalizao. De forma resu-

    mida, poderia dizer-se que a fora para a modifi-

    cao prospectiva no sentido da boa forma da

    cidade estaria centrada na interao de trs grupos:

    o arquiteto consultor/comunidade/poltico local,o empreendedor/agente imobilirio/construtor

    e os representantes do poder municipal.

    Referncias bibliogrficas

    ALEXANDER, C. A New Theory of Urban Design.Nova

    York: Oxford University Press, 1987.

    ASBEA Associao Brasileira de Escritrios de

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    BARNETT, J. Urban Design as Public Policy: Practical

    Methods for Improving Cities. Nova York: ArchitecturalRecord Books, 1974.

    CALTHORPE, P. The Next American Metropolis: Ecology,

    Community and the American Dream. Nova York:

    Princeton Architectural Press, 1993.

    Figura 9. O padro para prdios altos.

    Fonte: Croqui de Adilson C. Macedo, 2007. Foto publicitria www.cyrella.com.br.

    Figura 10. Padro de ocupao para prdios baixos.

    Fonte: Croqui de Adilson C. Macedo, 2007.

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    acessado em 12/12/2007.

    Notas

    1Este texto baseado no trabalho apresentado, com o

    ttulo de Street, Parcel, Block and Building: Moocas

    Urban Form Transformed, no International Seminar

    on Urban Form (ISUF), realizado em Ouro Preto, em

    agosto de 2007.

    2O arquiteto Jorge Abussamra tem estudado e

    documentado essas questes para sua dissertao de

    mestrado, na USJT, sob a orientao do professor

    Adilson C. Macedo.

    3Manifesto oriundo do IV Congresso Internacional de

    Arquitetura Moderna (Ciam), 1933, que prev aseparao funcional das atividades humanas e foi

    responsvel por uma linha de planejamento urbano

    macro-regional que influenciou o crescimento das

    cidades principalmente nas dcadas de 60 e 70.

    4Nos EUA, Jonathan Barnett afirma que enquanto o

    town meeting ainda existe em muitas localidades, nossas

    grandes cidades tm crescido de maneira muito distante

    desta forma de democracia. As pessoas raramente tm

    idia da importncia de como e quando as decises so

    tomadas, e menos ainda de quanto estas decises os

    influenciam, mesmo quando so de consenso imediato

    (Barnett, 1974). Na Europa, Bernardo Secchi,

    analisando a perda de prestgio do urbanismo desde

    1960, afirma que j na prxima dcada muitos

    urbanistas deixaram seu envolvimento com indicadores

    matemticos e voltaram a percorrer a cidade,

    procurando uma vivncia concreta dos lugares e das

    pessoas (Secchi, 2006).

    5Referncia ao Plano Diretor Estratgico da cidade de

    So Paulo, 2005.

  • 5/27/2018 Transformaes Da Forma Urbana de Mooca

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