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Semiótica de Peirce a Greimas
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Este livro de Winfried Noth 6 a comp!imi(inii*>ide sua outra obra publicada pela Annablurrm «tulada Panorama da semiotica de Plat/lo n l'nin 0
Neste volume, 0 renomado autor do Hirnii *olsemiotics apresenta os diversos paradigm*.semioticos do seculo XX, clareando ao leitor Mmas ramificagoes em que se desdobrou esta clflni in
tao antiga e ao mesmo tempo tao recentemenlnredescoberta.
A linguagem simples e de facil acesso tornnA semiotica no seculo XX urn guia fundamentaltambem para quern esta se iniciando nas ciAnclm.dos signos.
1$ANN/iDLUME
rWINFRIED NOTH
I illgflo
142 A SEMI6TICA NO SECULO XX
logia e cativada pelo signo e o recebe, trata-o e,
se necessario, imita-o como uma lente imagina-
ria. 0 semidlogo 6, resumindo, um artista(ibid.:474-5).
VI
GREIMAS E 0 PROJETODEUMASEMIOTICA
NARRATIVA DO DISCURSO
Um dos semioticistas que permaneeeu mais fiel aosprinclpios da andlise estrutural 6 Algirdas Julien Greimas (1917-1992). Com sua Semantica estrutural(1966), ele introduziu umasemiotica altamente influente e produtiva, que se tornou o nucleode uma escola semidtica, a Escola de Paris.31Apesar de altamenteelaborada nas diversas tases de sua obra, Greimas continuavachamando sua teoria de "um projeto semiotico".32 A influenciadas ideias de Greimas 6 notavel em varias dreas do camposemiotico, indo da semiotica do espago e da arquitetura a pintura,teologia, direito e ciencias sociais ate & cidncia da documenta-gao.33 0 objetivo central da pesquisa deste programa semidtico,contudo, e o estudo do discurso com base na ideia de que umaestrutura narrativa se manifesta em qualquer tipo de texto.
31. Coquet etal. (1982), Parret & Ruprecht,eds, (1985),Airwe &Coquet,eds. (1987), Perron& Collins,eds. (1989).
32. Cf. Greimas (1970; 1976a:b;1983), Coquet (1985)e Greimas &Coquet(1979:291).
33. Cf. Parret& Ruprecht,eds. (1985),Perron & Collins,eds (1989),
Greimas(1976 b), Lagrange(1973).
146 asemioticanoseculoxx
0 projeto semiotico de Greimas
Somente um esbogo grosseiro do projeto semiotico de
Greimas pode ser dado aqui. Um acesso a suas ideias bbsicas
requer o estudo de uma terminologia aigumas vezes idiossin-
cratica, elaborada ate em dois dicionbrios proprios (Greimas &
Courtes 1979; 1986).340estruturalismo linguistico de Hjelmslev, a antropologia
estruturai de Levi-Strauss, a teoria formalista do conto de Proppe
a teoria das situagoes drambticas de Etienne Souriau sao asfont.es da semiotica de Greimas. Seu pontode partidae a tentativa
deaplicar mbtodos de pesquisa da linguistica estruturai a analise
de textos, que Greimas define como discurso. A linguistica
greimasiana tem as suas raizes no conceito saussureano de
estrutura como diferenga, nos principios de oposigoes binbrias eda pertinencia e no modelo signico glossembtico de Hjeimslev,
alem de ter influbncias da sintaxe de dependbncia de Lucien
Tesniere (cf. Greimas, 1974a:58).
Para a Escolade Paris,a Semantiquestructuralde Grei¬mas (1966) foi a primeiraelaboragao de uma semibtica iiriguistica(Coquet etal., 1982:15) . Baseadona iexicologia estruturai,o obje-tivo desse estudo e a analise semantics de estruturas textuais. ASemdntica estruturaib, assim, mais do que uma semantics lin¬guistica como aquela de Pottier ou Katz & Fodor.Tendo um obje-tivo alem da semantics da palavra, ela e uma semantics do texto.
Depois da sua Semantica estruturai, Greimas continuou
34. Borisresumosdo desenvolvirnento deste projetosSo dados porCoquet etal. (1982), Schleifer (1987) e Perron (1989). ParaintrodugSes, estudos e aplicagoes da semibtica textual de
Greimas ver Culler (1975:75-95), Gumbrecht (1975), Stierle(1975:186-219),Courtes(1976),Nef(1977),Kritzman(1978),Groupe
rt'Entrevemes (1979), H6nauit (1979; 1983), Hafner (1982),
Stockinger (1983)e Parret& Ruprecht,eds. (1985),Budniakiewcz
(1992)e Perron(1992).
GREIMAS E0PROJETO DE UMA SEMIOTICA... 147
o seu projeto semibtico, sobretudo, numa serie de ensaiospublicados em livros sob os tftulos Dusens (1970), Semiotiqueet sciences sociates (1976b), Dusens II(1983), no seu estudoexemplar de semiotica discursive Maupassant:La semiotique dutexte (1976a), nos dois dicionbrios da semibtica greimasianaescritos com J. Courtbs (1979; 1986) e nos seus ultimos estudossobre a imperfeigao (Greimas, 1987) e a Semiotica das paixdes(Greimas & Fontanille, 1991).
Contrario b definigao comum de ciencia dos signos, Grei¬mas se opoe a um conceito de semiotica como uma teoria designos. Na sua definigao, a semibtica deveria ser uma "teoria dasignificagao", que "somente se torna operacional quando situasua analise em niveis tanto acima como abaixo do signo" (Grei¬mas & Courtbs, 1979:339, 177). Duas linhas de pesquisa saoindicadas nesta definigao. No "nivel inferior", analogamente bdecomposigao do fonema nos seus tragos distintivos, a "ato-mizagao" estruturai dos signos (mais precisamente das "sig-nificagoes") em seus componentes semanticos, chamados desemas, produz elementos analiticos que ainda nao sao signos,No "nfvel superior", a descoberta de unidades textuais produzeritidades semanticas, que sao mais que signos.
0 modelo gerativo da analise do discurso
A continuagao do desenvolvirnento da sua semantica es¬truturai levou Greimas a um novo modelo semiotico da consti-luigao do texto, que ele definiu como trajetdria gerativa,35
0 modelo gerativo de semibtica textual tem como objetivonxplicar a geragao de discursos de qualquer sistema semiotico.
35. Greimas & Courtbs(1979:132-4).Sobrediscuss6eseaplicagoes,vertambbm Courtes(1976), Greimas& Nef(1977), Stockinger(1983),Patte(1984),Schleifer(1987).
148 A SEMI6TICA NO SECULOXX
Greimas distinguiu tres "Sreas gerais autonomas" de analise
semiotica textual: estruturas semio-narrativas, estruturasdiscursivas e estruturas textuais (Greimas & Courtes, 1979:157-
60). Na definigao de Greimas e Courtes, as estruturas textuais
sao estruturas da substancia de expressao, no sentido de
Hjelmslev. Notextofalado, elas aparecem na linearidade fonbtica;
no texto escrito, no espago visual da escritura (cf. Courtes,
1976:39-43). A trajetoria gerativa estuda 0 discurso no piano doconteudo, com as estruturas semio-narrativas e as estruturas
discursivas. As estruturas textuais, porlanto, nao fazem parte
dessa trajetoria, pois a trajetoria gerativa descreve a produgao
discursiva como um processo que se desenvolve em varios niveis
de profundidade, cada um contendo uma subcomponente sintdtica
e uma sembntica, 0 processo gerativo cornega rium nlvel
profundo com estruturas elementares e se estende a estruturas
mais complexas em niveis mais eievados. Toda a trajetoria
descreve estruturas "que governam a organizagao do discurso
anterior k sua manifestagao numa lingua natural dada (ou em umsistema semiotico nao-linguistico)" (Greimas & Courtds,
1979:107).As estruturas sbmio-narrativas descrevem uma compe-
tencia semiotica de combinar estruturas semanticas e sintdticas
k base de uma gramatica fundamentaldo discurso, comparavel
a lingua de Saussure ou a competencia na sintaxe de Chomsky,
mas ambas ampliadas pelas dimensoes da semantics e do texto
(cf, Greimas & Courtbs, 1979:103),No nivel profundo (cf. /Mf.:330, 380), aparecem a se¬
mantics e a sintaxe fundamentais. Na sua elaboragao desta se¬mantics fundamental, Greimas foi influenciado pelo modelo da
estrutura binaria de mito de Lbvi-Strauss. A semantics funda¬mental contbm categorias elementares que se articulam em
oposigbes semanticas e constituem relagoes Ibgicas elementa¬
res analisadas em forma de quadrados semioticos (ver p. 173).
Neste nfvel profundo aparece 0 tema global, a significagao
GREiMAS E0PROJETO DE UMA SEMIOTICA... 149
simbolica, de uma narrativa, por exemplo, 0 tema da vida emrelagao k morte, k falta de vida ("nao-vida") ou da morte ("nao-morte").
A sintaxe fundamental e inspirada pelo modelo dassequbncias narrativas 0 consiste de constelagoes actanciaisbbsicas e ainda abstratas da narrativa (ver p. 177).
No nivel superficial, a sintaxe narrativa analisa a estru¬
tura de sintagmas narrativos elementares (chamados de pro-gramas narrativos). As categorias profundas aparecem agora em
categorias antropomorficas como ag5es de sujeitos humanos(Greimas & Courtes, 1979:4, 242, 331, 381),
As unidades da andlise neste nivel sao proposigoes nar¬rativas sobre as agoes (0 "fazer") de actantes. Elas t§m a formade F(A), quer dizer, descrevem fungoes (F) de actantes (A). Atrama da narrativa se desenvolve na sequOncia de tais pro¬posigoes. Os actantes principais sao 0 sujeito e 0 objeto, do qualfile ou ela 6 separado (numa relagao de disjungao) ou com 0 qualele ou ela 6 unido (numa relagao de conjungao). Disjungao,transformagao e conjungao de actantes sao, portanto, as fontesbbsicas de qualquer desenvolvimento narrativo.
A semSntica narrativa do nivel superficial e 0 dorninioda atualizagao de valores semanticos selecionados da estruturaprofunda e conferidos aos actantes da narrativa superficial.Greimas & Courtes (1979:414) distinguem entre valores cfes-critivos e modais. Valores descritivos ou sao valores essenciaisou acidentais. Valores modais se referem a categorias como"desejo", "obrigagao" ou "conhecimento". Com base nestas
categorias, Greimas desenvolveu uma gramatica das modalidades(ver p. 180).
As estruturas da dimerisao discursiva do texto tern a fun-gSo de "trazer as estruturas superficiais ao discurso" (Greimas &Courtes, 1979:160). A sintaxe discursiva tem 0 efeito de produzirum grupo organizado de atores e uma estrutura temporal eospacial {ibid.:107, 330). Assim, ela e 0 processo de localizar
150 asemiOticanosEculoxx
atores narrativos no tempo e no espago. A semantica discursiva(ibid.:379, 394) d urn carripo ainda relativamente pouco estudado.Seus componentes de tematizagac e figurativizagaodescrevemas concatenagoes isotopicas de temas abstratos que podem serligadas a figuras concretas. Este nivel de andlise 6 mencionadoso para proporcionar urna visao de conjunto do rnodelo, mas sempoder entrar em rriais pormenores. S6 a dimensao semidtica enarrativa do rnodelo pode ser introduzida brevemente no que sesegue.
0 rnodelo da trajetdria gerativa, em resumo, tern asseguintesdimensoes:
Figura G.10 rnodelo da trajetdria gerativa de Greimas (Greimas &
Courtes, 1979:160)
Componente sintdtico Componente semantico
Estruturassemioticase narrativas
Nivel Isintaxeprofundo j fundamental
Semanticafundamental
Nivel |Sintaxesuperficial |narrativa de
jsuperficie
Semanticanarrativa
Estruturasdiscursivas
Sintaxe discursiva Semdntica discursiva
Significagao e o universe semantico
Para Greimas, significagao e o conceito-chave da se-miotica. A totalidade de significagoes forma o universo semSn-tico. Terminologicamente, Greimas opde significagao a seritido(sense), ao definir este ultimo como "aquiio que d anterior a
GREIMAS E0PROJETODE UMASEMlOTICA... 151
produgao semidtica", enquanto significagao d sentido articuiado(Greimas & Courtes, 1979:352). Greimas elaborou seu rnodeloda estrutura elementar da significagao e da andlise semica emseu Semantics estruturai (1966).36 No seu rnodelo da trajetdriagerativa do texto, as estruturas de significagao elementares sdolocalizadas no nivel das estruturas profundas.
A estrutura elementar da significagao
0 ponto de partida da teoria semantica de Greimas(1966:19) e sua definigaode estrutura, naqual se da prioridadeds relagoes em vez dos elementos, jd que somente as diferengas
(que sao relagoes) entre elementos constituem uma estrutura.
As relagoes elementares do mundo semantico de Greimas saorelagoes de oposigao: o mundo se estrutura para nos na formade diferengas e oposigoes (ver p. 46). Significagoes, portanto,nao existem como elementos autonomos mas somente por rela¬goes opositivas. Assim, a origem da significagao 6 definida comouma relagao elementar constitulda pela diferenga entre dois ter-
mos semanticos. Por exemplo, a diferenga entre os itens lexicais"filho" e "filha" d devida a uma oposigao semantica que pode serdescrita pelos tragos "masculino" e "feminino". Mas, para Greimas,
esta estrutura semantica bindria jd possui urn aspecto duplo (cf.Greimas & Courtes, 1979:362): a diferenga entre "masculino" e
"feminino", que 6 uma relagao de disjungao, pressupde oreconhecimento de alguma "semelhanga" semantica, neste caso,
a chamada categoria sdmica de "sexo", que e comum tanto a"masculino" como a "feminino". Esta categoria comum constituiuma relagao de conjungao. Tal constelagao semantica dupla edefinida como uma estrutura elementar de significagao. Seu
36 , Sobre introdugoes ediscussoes ver Grosse (1971), Dierkes &Kiesel(1973), Culler(1975:75-95),Courtes(1976),Nef,ed. (1976),
Schleifer (1983;1987).
152 ASEMI6TICA NOSECULOXX
modelo 6 um eixosemantico linear com dois elementos em seus
extremos. 0 eixo representa o trago semPntico comum (a ca-
tegoria sbmica). Nos pontos extremos estao os termos diferen-
ciais ("masculine", "feminino"). Estes sao definidos como semas.
Analise semica: sema, semema e lexema
Semas e eixos semanticos sao entidades abstratas da
substbneia de conteudo no sentido de Hjelmslev (Greimas, 1966:
27). Como Hjelmslev mostrou, urneixo semantico, como aquele
designando urn espectro de cores, pode ter diferentes "articula-
goes", quer dizer, formar diferentes campos lexicais em diferentes
linguas. A articulagao sbmica especlfica numa dada lingua se
torna sua forma de conteudo.Na semSntica lexical, os semas de Greimas possuem
urn status e uma fungao similar Pquelas dos componentes se¬
manticos em oulros modelos de semPnlica estrutural. 0 sema e
a unidade minima da semantics, cuja fungao 6 a de diferenciar
significagoes. No universo semantico, os semas formam hie-
rarquias de sistemas sdmicos (Greimas, 1966:33). Quaisquer dois
semas agrupados sob uma categoria semica comum constituem
urn eiemento de uma hierarquia sbmica.Semas sao concebidos como entidades de estrutura abs-
trata, profunda, de descrigao metalingiiistica. 0 universo dos
semas representa a totalidade de categorias conceituais da mente
humana. Neste nfvel, que Greimas chama o nivel da imanencia,
as unidades de significagao ainda sao independentes da forma
que elas tomam em qualquer lingua particular.A combinagao real
de semas em significagoes, corno eles aparecem em lexemas,
ocorre no nivel da manifestafao. Porem, lexemas, as unidades
da estrutura superficial do lexico, nao sao unidades da sembntica
em si. Somente suas significagoes pertencem ao nivel semantico
da manifestagao. Estas significagoes, combinagoes de semas,
sao definidas como sememas. JP que lexemas podem ser
GREIMAS E0PROJETO DE UMASEMlCTICA... 153
polissemicos, urn lexema pode possuir diversos sememas. Porexemplo, diferentes sememas do lexema "manga" sao "parte dovestuPrio", "fruta" etc.
Em urn semema, Greimas distingue dois tipos de semas,semas nucleares, que caracterizam urn semema na sua especi-ficidade e constituem urn minimo permanente, independentementede contexto semico, e semas contextuais, tambem chamadosde classemas, que os sememas possuem em comum com outroselementos de urn sintagma (Greimas, 1966: 46-60). A delimitagaodos semas nucleares dos classemas, contudo, apresentaproblemas metodologicos consideraveis. Os problemas em reia-gao a teritativa de estabelecer dois tipos basicos de elementossemanticos minimos sao semelhantes Ps dificuldades que Katz& Fodor encontraram com sua proposta de distingao entre mar-cadorese diferenciadores semanticos (cf. Bolinger, 1965). En-quanto sememas sao sempre compostos por semas nucleares econtextuais, tambem hp sememas que s6 possuem semas con¬textuais e nenhum sema nuclear, p.ex., conjungoes e proverbiosrelativos. Tais combinagoes de semas sao definidas comometassememas (Greimas, 1966:122).
0nivelsemantico e o nivel semiologico
A diferenciagao entre semas nucleares e semas contex¬tuais esta relacionada a dois outros nlveis de anaiise no universosignificativo (Greimas, 1966:53-68, Greimas & Courtes,1979:338). Semas que constituem o nbcleo dos sememasoncontram-se nochamado nivel semiolbgico (ou figurativo). Elesse referem a uma esfera de percepgao universal, extra-linguistica("o mundo sensivel") e constituem o nivel mais profundo deanPlise. Os sistemas de sememas contextuais formam o nivelsemantico (ou nao-figurativo, tambbm abstrato) do universosignificativo. Em oposigao aos semas nucleares ao nivelsemiolbgico, semas contextuaisse referema categorias da mente
154 asemiOticanosEculoxx
humana. Greimas tambdm se refere d dicotomia semiologicoversus semdntico em termos das categorias exteroceptividade(referente as propriedades do mundo exterior) e interoceptividade(referente aos dados que ndo possuem corresponddnciaperceptual) (1966:120).
0quadrado semidtico
As oposigdes que constituent eixos semanticos podemrepresentar dois tipos diferentes de relagao Idgica. 0 primeirotipo, contradigao, 6 a relagao que existe entre dois termos dacategoria binaria assergao/negagao (cf. Greimas & Courtes,1979:67). Esta relagao d descrita como a oposigao entre apresenga e a ausdncia de urn serria. Desta forma, urn sema si,
"vida", e oposto a seu nao-si contraditorio (§1), "nao-vida" (noqual o sema "vida" estd ausente). 0 segundo tipo d o dacontrariedade (cf. ibid.). Dois semas de urn eixo semdntico saocontrdrios se urn deles impiica o contrdrio do outro. 0 contrdriode si, "vida", d S2, "morte". Os dois semas pressupoem urn aooutro. A constelagao semdntica de trds termos nos dois eixos,si -§i e si -S2, pode agora ser expandida pelo contrdrio de S2, quee §2 ("nao-morte"). 0 resuitado d uma constelagao de quatrotermos, na qual urn novo tipo de relagao, implicagao oucomplementaridadesurge entre os termos si e §2 ou S2 e §1.("Vida"impiica "nao-morte". "Morte" impiica "nao-vida".) Esta constelagaod visualizada como urn quadrado semidtico (Figura G 2).37 Estamaneira diagramatica de representar as quatro relagoes e umaversao modificada de uma formalizagao conhecida da Idgicaaristotdlica e medieval.380carater de estrutura profunda deste
37. Ver Greimas(1970:160),Greimas& Courtes(1979:31)e0numeroespecial intitulado Lecarre semiotique do Bulletindugroupe derecheivhessemio-linguistiquesW (1981).
38. Ver Reichenbach (1947:95): Liberia (1976)e Hendricks(1989).
GREIMAS E0PROJETO DE UMA SEMI6TICA... 155
quadrado semidtico 6 evidente pelo fato de que seus quatro
valores semdnticos nao possuem sempre urn equivalente lexical
correspondente na estrutura superficial. Nao ha, por exemplo,
itens lexicais que expressem as ideias de "nao-morte" ou "nao-
vida".
Figura G 20 quadrado semidtico de Greimas
Assergao(VIDA)
%contrariedade
Nao-asserg§o(NAO-MORTE)
Negagao(MORTE)
S2
contra
Nao-negagao(NAO-VIDA)
Isotopia
Greimas (1966) tomou 0 termo isotopiaemprestado (Gr.
/so"0 mesmo", fopos'lugar") da fisica nuclear. Na semdntica
estrutural, isotopia descreve a coerencia e homogeneidade de
textos.390 conceito foi aceito amplamente como urn princtpio deconstituigaode textos na semidtica textual (cf. Eco 1984:189-
201).
39. Ver Rastier(1972b; 1981),Arrtvd(1973),Klinkenberg(1973),Kerbrat-
Orecchioni (1976),Greimas& Courtes(11979:197-9).
156 asemiOticanoseculoxx GREIMAS E0PROJETODEUMASEMIOTICA... 157
Greimas definiu isotopia como "o princfpio que permite aconcatenagbo semantica de declaragoes" (1974a:60; cf.1970:188). Em sua primeira abordagem, Greimas desenvolveu a
teoria da coerbncia textual com base em seu conceito de semascontextuais: a "iteratividade" (recorrbncia) de semas contextuais,
que ligam os elementos semanticos do discurso (sememas),garante sua homogeneidade e coerbncia textual (1966:69-101).
Greimas (cf. 1974a:60) relacionou este principio a teoria de Katz& Fodor da desambigijidadesembntica. Numtexto, urn substantivo
polissbmico como manga ("parte do vestuario" e "fruta") deixa deser ambiguo atraves de urn sema contextual como "carnisa". A
condigao minima da isotopia discursiva e, portanto, urn sintagmade dois semas contextuais. Greimas & Courtes tamberninterpretaram o quadrado semibtico em termos da isotopiadiscursiva (1979:197).
Na sua extensao sintagmbtica, uma isotopia e consfi-
tufda por todos aqueles segmentos textuais que estao relaciona-dos por urn sema contextual. Jb que textos normalmente naosao unilineares ou univocos, Greimas descreveu a superposigaode isotopias em diversos estratos isotbpicos (1966: 109-15).Quan-
do o discurso possui somente uma interpretagao, sua estruturasemantica e uma isotopia simples. A simultaneidade de duas lei-turas, como em ambiguidades e metaforas, e chamada bi-isotopia.A superposigao de varios niveis semanticos num texto e chamadapluriou poli-isotopia (cf. Arrivb, 1973).
A partir do primeiro modelo de concatenagao sbmica con¬textual, a teoria da isotopia foi expandida progressivamente paraenglobar recorrencias em outros nfveis textuais. Alern da isotopiasembntica, Greimas & Courtes (1979:198) distinguiram isotopiasgramaticais, actanciais, parciaise giobais. (0 ultimo dos doistern urn importante papel nas condensagoes ou expansbesdiscursivas, como em resumos). Numa outra expansao (cf. ibid.e Rastier, 1972b:84), a tipologia de isotopias e estendida porisotopias semiologicas (ver p. 171)a fim de englobar iteratividades
cm termos de conhecimento de mundo "exteroceptive". Estassao ainda subdivididas em isotopias tematicas e figurativas (cf.FiguraG 1). Uma outra expansao do conceito de isotopia foi aindaproposta por Rastier (1972b), que estendeu sua tipologia deIsotopias do nfvel do conteudo para o da expressao e, assim,descreveu recorrbncias morfoldgicas e fonbticas (e. g. rima eassonancia) como casos de isotopia. Uma tipologia de isotopiasdiferente e proposta por Eco (1984).
Elementos da sintaxe narrativa
As oposigoes da semantica fundamental na forma dos
quadrados semioticos sao ainda atemporais e tbm que serdesenvoividas na sequencia sintagmatica do discurso. Tambbmno nivei sintatico profundo, na sintaxe fundamental, Greimaspostula uma estrutura alemporai antes da temporalizagao delanas proposigoes de programas narrativos. A estrutura do niveislntbtico profundo tern a forma do modelo actaricial. ErnboraGreimas tenha derivado idbias bbsicas desta sintaxe da teoriadas fungoes narrativas do conto de Propp, a sintaxe narrativan&o e, de maneira nenhuma, restrita a textos narrativos. Mesmolextos filosbficos, politicos ou cientfficos e ate qualquer fraseda sintaxe cotidiana tern uma estrutura narrativa, conformenntendeu Greimas. As unidades desta sintaxe sao chamadasactantes ou categorias actanciais.
0 modelo basico da estrutura actaricial e o seguinte: urnsujeito narrativo, prototipicamente o heroi do conto, deseja eprocura urn objeto, que pode ser uma pessoa, por exemplo, umaprincesa. 0 sujeito e o objeto fazem ainda parte de duas redessemSnticas mais desenvoividas: o sujeito, de urn lado, e assis-lido por urn coadjuvante, mas, do outro lado, tern de lutar contraum opositor, o vilao do conto. Ambos possuem o poder de ajudarou prejudicar o herbi. 0 objeto se encontra entre um destinador
158 asemiOticanoseculoxx GREIMAS E0PROJETODE UMASEMlCfiCA... 159
que dd o objeto (por exemplo, ao heroi) e um destinatario que o
recebe (p.ex. das maos do herdi). 0 destinador da princesa do
nosso conto seria, assim, o pai; o destinatario seria o futuromarido dela, que pode ser o herdi. 0 destinador e o destinatariopossuem um "saber" situacional e representam um eixo de co-municagdo. Entre o destinador e o destinatario, Greimas vd umarelagao de implicagao, entre o sujeito e o objeto, uma relagdo de
projegao e entre adjuvante e opositor, uma relagao de contradigao.
0 modelo completo d, portanto:
Figura G 30 modelo actancial e as modalidades actanciais (Greimas,1966:207)
Destinador (saber)ÿ Objeto (saber) ÿ Destinatario
A(desejo)
Adjuvante (poder)ÿ, Sujeito < (poder)_ Opositor
As categorias actanciais desta sintaxe profunda podernsemanifestar em atores na superficie da narrativa. E, portanto,necessariodistinguir entre os actantes da sintaxe fundamental eosatores que representam estes actantes nasuperficie. Ja mencio-
namos umexemplo desta distingao. 0herdi do nosso conto exem¬plar-que 6 um ator - represents duas categorias actanciais: o
sujeito e o destinatario que, no fim do conto, recebe a mao da
princesa. Vdrias combinagoes de fungoes actanciais sdo,
portanto, posslveis, na superficie. Numa novela trivial de amor,
por exemplo, o amante pode representar tanto o sujeito quanto o
destinatario e a namorada tanto o objeto quanto o destinador. Na
busca docdlice sagrado de Parsifal,por outro lado, esses quatro
papdis ficam bem distintos . Parsifal e osujeito, o calice sagrado e
nobjeto, Deuseo destinador e o homem em gerai (a humanidade)A o destinatario.
Como e que essas categorias derivadas do modelo doconto de fadas podem pretender uma generalizagao universal quepermits sua aplicagao a qualquer texto ou atd a qualquer frase?Para avaliar essas possibilidades de generalizagao 6 importanteconsiderar as possibilidades de reduzir as seis categoriasactanciais atd ao nucleo da constelagao sujeito—objeto. Ai parecenvidente que qualquer frase com um verbo transitivo pode serroduzida a uma estrutura actancial de sujeito-objeto. Em, porexemplo, "Carlos langa a bola", Carlos e, ao mesmo tempo, sujeitoa destinador do objeto "bola". Com a extensao adverbial da mesmafrase em "Carlos langa a bola para o gol", jd aparece mais umacategoria actancial, a do destinatario ("gol").
E evidente que em textos jurldicos ou ideologicos tam-
liftm se podem verificar categorias de uma tal generalidade. 0ÿiujeito de um texto filosofico seria certamente o fildsofo. Os seus•idjuvantes sao os fildsofos que ele ou ela cita com aprovagao,us opositores sao os autores que ele ou ela rejeita, o objeto seriaprovavelmente o conhecimento da verdade, o destinador dela seriauutra vez o fildsofo autor e o destinatario seriamos nds, osloltores,
0 mesmo padrao e aplicavel a uma propaganda de pastadental que mostra o sucesso que um consumidor do produto terncom as mulheres depois de compra-lo e usa-lo. 0 sujeito e oconsumidor. 0 objeto do seu desejo e uma namorada.0 produto,n pasta dental, e o adjuvante que dd ao nosso herdi da propaganda
0 poder riecessdrio. 0 opositor, que ele vence nesse drama, 6 omau halito que, ate o momenta da descoberta da pasta dental, oImpediu de procurar seu alvo. 0destinatdrio seria, mais uma vez,
0 nosso herdi e o destinador seria provavelmente desconhecido,podendo ser, talvez, ate a companhia da propria pasta dental.Afinal, foi ela que, ao menos, enviou a figura da namorada
Imaginaria por meio da publicidade para a casa do nosso herdi.
160 ASEMlGflCANOSECULOXX
Na continuagao dos seus estudos das categorias actan-
ciais, Greimas (1970:191; Courtbs, 1976:68; Coquet et a!.,
1982:54) procurou reduzir o modelo actancial a categorias ainda
mais fundamentals e chegou b conclusao de que as duas relagbes
iogicas e fundamentals de conjungao e disjungao constituem a
base de qualquer processo narrativo. Disjungao entre os actantes
e os valores associados a eles gera separagbo e luta. Conjungao
gera reconciliagao e uniao. A sintaxe mais elaborada, na base da
qual a narrativa se desenvolve, contem, no inlcio, tipicamente
urn sintagma disjuntivo, que se manifests na separagao do heroi
do seu ambiente tradicionat por meio da partida. Em sintagmas
contratuais, ele estabelece ou rompe contratos ou promessas.
Em sintagmas performdticos, o herbi cumpre deveres (ou nao),
iuta ou vence. Uma estrutura contratual, por exemplo, tern a sua
sembntica fundamental na oposigao entre urn mandamento e a
sua aceitagao, que estabelecem urn contrato cuja oposigao esta
na quebra do contrato; essa quebra resulta de urn sintagma de
proibigaoeviolagao.A manifestagao das categorias binbrias de conjungao e
disjunpao em sintagmas narrativos 6, portanto, urn exemplo do
processo transformativo pelo qual estruturas fundamentals se
manifestam na sintese superficial da narrativa. Outros exemplos
da manifestagao dessas mesmas categorias sao os processos
de atribuigao ou privagSo de valores que o sujeito associa com o
objeto desejado. Atribuigao, para Greimas, b tambem a
manifestagao da categoria bbsica da assergao, como privagao
manifests as categorias basicas pela negagao.
Estruturas modais e aspectuais
A semibtica narrativa de Greimas nao se limita a uma
mera anblise descritiva de estruturas actanciais com base em
uma ibgica binaria de agoes. A partir de Dusens (1970), Greimas
GREIMAS E0PROJETODE UMASEMlCTICA... 161
comega a complementar a sua sintaxe das agoes por uma gra-mbtica modal e aspectual que permite uma extensao da semibticadas agoes narrativas para uma semibtica das emogoes e paixoesdos actantes.
Albrn das modalidades actanciais (do "fazer"), Greimastambem distingue modalidades descritivas (do "ser"). Assim, asagoes dos actantes ja nao sao meros produtos de urn "fazer",mas tambem o resultado de urn "querer" ou "desejar", urn "dever",urn "saber" ou urn "poder". Essas modalidades das agoes jb carac-terizam as relagbes entre os actantes na estrutura profunda domodelo actancial. 0 eixo sujeito-objeto, por exemplo, 6 ligadopela modalidade teleologica do "querer". 0 eixo adjuvante-opositorrepresents a modalidade do poder e o eixo destinador-destinatbriorepresents a modalidade etrolbgica do "saber". A grambtica modalde Greimas b uma gramatica de valorizagao das agoes, uma axio-logia narrativa em varlos niveis do universo narrativo. As moda¬lidades do "querer" e do "dever" pertencem ao nivel virtualdosvalores, as modalidades do "poder" e do "saber" pertencem aonivel da atualidade, e as modalidades do "fazer" e do "ser" perten¬cem ao nfvel da reaiizagao. No nivel da realizagao, as relagoessbo conjuntivas, no nivel da virtualidade, elas sao disjuntivas.
A aspectualizagao do discurso e uma outra dimensao di-nbmica da trajetoria gerativa. Greimas e Courtes (1979:21, 79)dlstinguem entre aspectualizagao actorial, espacial e temporalcomo tres modos de perspectivagao do sujeito, do espago e dotempo narrativo. A aspectividade temporal e bem conhecida nagramatica verbal, que distingue entre aspectos verbals durativos,perfectivos, imperfectivos, terminativos ou incoativos. A aspec-tualizagSo actorial descreve o modo de distanciagao do enunciadornarrativo do sujeito narrativo. Trata-se, portanto, das relagbesentre o heroi e o narrador. Nas perspectivas que o observadornarrativo tern das agoes do herbi, portanto na relagbo entre nar¬rativa e trama, Greimas tambem ve aspectualizagoes durativas(em representagbes da continuidade do evento), incoativas
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(focalizando o comego do processo) ou terminativas (focalizando
o fim de um processo). As aspectuaiizagoes, em surna,
descrevem continuidades, descontinuidades, estabilidades e
instabilidades na representagao narrativa dos eventos. Sao estas
categorias da aspectualidade que Greimas apiica sobretudo nosseus estudos das paixoes.
VII
0 CAMPO SEMIOTICODE UMBERTO ECO