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 TREINAMENTO AUTÓGENO SIMPLIFICADO: UM MÉTODO DE TERAPIA INTEGRAL  Fernando Portela Câmara "  Isole-se de todos os objet os externos,   fixe a visão entre as sobrancelhas, sinta o ar entrar e sair entre as narinas, o sábio que controla suas sensações, sua mente e compreende..." (  Bhagavad Gita, V: 27-28 ) Resumo O presente trabalho apresenta uma modificação simplificada do TA objetivando uma melhor  adesividade por parte do indivíduo para esta método, que tem a vantagem de minimizar os efeitos  transferenciais da relação médico-paciente e abreviar o curso de uma psicoterapia profunda. Summary A simple modification of the Schultz’s Autogenic Tranining is presented in this paper. It was devised to improve the individual’s adhesiveness for this method, that minimizes the transfer effect in the therapeut-patient relati onship and abridge the course of a difficult psychotherapy. Introdução O Treinamento Autógeno (TA) é um método de relaxamento concentrativo desenvolvido por  Johannes Heinrich Schultz em 1908-1912, na Alemanha (Schultz, 1969). Trata-se de um método de aprendizagem progressiva destinado a indivíduos suficientemente independentes e inteligentes para  usa-lo por si mesmo segundo as necessidades para as quais o método é proposto. O objetivo do  método é a tranquilização interna e o autocontrole, visando a profilaxia do estresse, a absorção de  golpes afetivos inesperados, melhoria dos rendimentos físicos e cognitivos, e melhor disposição e  resistência às fadigas física e intelectual. O método é dominado através da prática diária de exercícios  concentrativos num período médio de três a quatro meses, sendo o indivíduo monitorado nos seus  rendimentos e objetivos durante este tempo. O método pode ser administrado individualmente ou em  pequenos grupos. Embora o TA seja originalmente um método profilático, ele é também incluído ao grupo das psicoterapias não-verbais, podendo ser usada como terapia principal ou, como terapia auxiliar nos  casos mais complicados. Os psiquiatras de orientação Pavloviana, têm neste métod o uma ferramenta

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TREINAMENTO AUTÓGENO SIMPLIFICADO: UM MÉTODO DE TERAPIA INTEGRAL 

Fernando Portela Câmara

" Isole-se de todos os objetos externos, 

 fixe a visão entre as sobrancelhas,

sinta o ar entrar e sair entre as narinas,

o sábio que controla suas sensações,

sua mente e compreende..."

( Bhagavad Gita, V: 27-28)

Resumo

O presente trabalho apresenta uma modificação simplificada do TA objetivando uma melhor

 

adesividade por parte do indivíduo para esta método, que tem a vantagem de minimizar os efeitos

 

transferenciais da relação médico-paciente e abreviar o curso de uma psicoterapia profunda.

Summary

A simple modification of the Schultz’s Autogenic Tranining is presented in this paper. It was devised

to improve the individual’s adhesiveness for this method, that minimizes the transfer effect in thetherapeut-patient relationship and abridge the course of a difficult psychotherapy.

Introdução

O Treinamento Autógeno (TA) é um método de relaxamento concentrativo desenvolvido por

 

Johannes Heinrich Schultz em 1908-1912, na Alemanha (Schultz, 1969). Trata-se de um método deaprendizagem progressiva destinado a indivíduos suficientemente independentes e inteligentes para

 

usa-lo por si mesmo segundo as necessidades para as quais o método é proposto. O objetivo do

 

método é a tranquilização interna e o autocontrole, visando a profilaxia do estresse, a absorção de

 

golpes afetivos inesperados, melhoria dos rendimentos físicos e cognitivos, e melhor disposição e

 

resistência às fadigas física e intelectual. O método é dominado através da prática diária de exercícios

 

concentrativos num período médio de três a quatro meses, sendo o indivíduo monitorado nos seus

 

rendimentos e objetivos durante este tempo. O método pode ser administrado individualmente ou em

 

pequenos grupos.

Embora o TA seja originalmente um método profilático, ele é também incluído ao grupo daspsicoterapias não-verbais, podendo ser usada como terapia principal ou, como terapia auxiliar nos

 

casos mais complicados. Os psiquiatras de orientação Pavloviana, têm neste método uma ferramenta

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terapêutica importante. Em psicanálise, pode ser usado com proveito, especialmente nas fases em queo aparecimento de resistências tende a estagnar a análise, pois, o relaxamento global do TA dissolve o

 

ciclo tensão-ansiedade que mantém a resistência, ao mesmo tempo que a tranqüilizarão interna leva o

 

paciente a sentir-se seguro em enfrentar os conteúdos ameaçadores de sua psique (Luthe, 1970). Isto

 

ilustra o que Ajuriaguerra denominou de diálogo tônico-emocional, apoiando-se nos trabalhos de

 

Wallon que defendia haver uma relação muito estreita entre a vida tônica e a vida emocional. Ele

 

adaptou sua prática psicanalítica à análise das resistências tônicas, interpretando as cenestesias que

 

aparecem durante o relaxamento numa relação regressiva com o terapeuta (v. Masson, 1986). Seu

 

método tem como fundamento a observação de Freud sobre o eu corporal: "O Eu é antes de tudo um

 

Eu corporal; não é uma entidade de superfície, é a projeção dessa superfície".

Schultz partiu das observações de Oskar Vogt, o qual percebera que pacientes inteligentes e

 

suficientemente independentes quando se submetiam a sessões de hipnoterapia, aprendiam aautohipnotizar-se após várias sessões de hipnose com o seu médico. Vogt concluiu que as sessões

 

serviam também como treinamento, e seus pacientes tornavam-se capazes de aliviar suas tensões e

 

somatizações por si mesmos, relaxando, desconectando-se do entorno, e administrando sugestões a si

 

mesmos. Em outras palavras: imaginando as sensações que Vogt sugeria durante a indução hipnótica,

seus pacientes entravam voluntariamente em hipnose e administravam a si mesmos sugestões

 

tranqüilizadoras e afirmativas.

Schultz sistematizou estas observações em um método baseado em seis exercícios progressivos: dois

 

para relaxamento geral (através de vivências imaginativas de peso e calor), completados por quatro

 

exercícios para tranquilização das principais funções orgânicas psiquicamente sensíveis e sede damaioria das psicossomatoses: o tônus gastrintestinal, o tônus diafragmático, o ritmo cardíaco e a

 

irrigação cerebral.

O método baseia-se na aprendizagem progressiva através de exercícios que levam em média duas

 

semanas para serem dominados. O paciente é orientado a fazer os exercícios diariamente uma, duas

 

ou três vezes por dia, cerca de 10 minutos por vez. O objetivo é repetido a cada sessão detreinamento: a obtenção de tranquilidade interna, que se aprofunda à medida que o treinamento

 

progride. Através deste método o paciente aprenderá a modificar voluntariamente suas vivências

 

somáticas e psíquicas e, se for o caso, controlar um dor ou modificar uma função vegetativa.

Sabemos da experiência que tais métodos só tem sucesso quando o sujeito é adulto e estásuficientemente motivado para aprende-lo, tem um nível adequado de compreensão e iniciativa

 

suficiente para conduzir-se numa prática regular pessoal. Isto é importante para evitar que o

 

rendimento do método seja enviesado por uma transferência. Por outro lado, quanto mais simples for

 

o método, maior sua aceitabilidade, e mais fácil será manter o sujeito motivado.

Bases do TA

A teoria do TA é bastante simples, e seus substrato neurofisiológico não será discutido neste artigo. A

 

base terapêutica do TA consiste no gradual amortecimento do ciclo ansiedade-tensão. A ansiedade

 

gerada pelo enfrentamento crônico de afetos indesejados ou reprimidos difunde-se pelo organismo

 

através do sistema límbico-hipotalâmico-vegetativo (MacLean, 1949; Luthe, 1970), afetando o

 

sistema imunoneurohormonal, e, pela via reticular descendente, provocando tensão periférica, ou seja,

 

tensão nos vasos menores e na musculatura antigravitária. A tensão periférica, por sua vez, retroage

 

sobre o sistema límbico-hipotalâmico mantendo o estado ansioso. O relaxamento concentrativo relaxa

 

a tensão periférica e, conseqüentemente, diminui sua retroação sobre o sistema límbico-hipotalâmico.

 

Com a repetição dos exercícios, a tensão vai amortecendo gradualmente e, com ela, a ansiedade,

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restaurando-se a tranqüilidade e o auto-controle. As chamadas "doenças psicossomáticas" decorremda espasmodização crônica das vasculatura que irrigam as vísceras e cérebro, espasmodização crônica

 

das vísceras ocas, e espasmodização crônica da musculatura periférica, que ocasionam dores e fadigacrônica.

Portanto, é o amortecimento da ressonância dos afetos que dá ao TA seu status terapêutico, mas ele

 

não será afetivo naqueles casos em que o transtorno afeta a personalidade ou o ajustamento doindivíduo. O TA está mais indicado naqueles transtornos outrora classificados como "neuroses

 

periféricas" (Schultz, 1969) e que fazem parte da chamada "psiquiatria menor".

As principais indicações do TA está no tratamento dos distúrbios psicossomáticos (uma ampla classe

 

de sintomas funcionais distribuídas em várias classes de transtornos mentais e do comportamento),

 

via de regra incidentes em indivíduos alexitímicos, habitualmente resistentes à psicoterapia

 

convencional (Sifneos, 1977), nos transtornos de ansiedade, associado ou não a psicofármacos, e

 

outras transtornos menores accessíveis a esta forma de condicionamento. O TA também pode ajudar

 

na recuperação de dependentes químicos. Primariamente, o método é usado na prevenção dos efeitos

 

indesejáveis do estresse, na melhoria de rendimentos físicos (em atletas) e cognitivos (intelectuais)

 

tanto no desempenho quanto na aprendizagem, e no auto-condicionamento de propósitos e metas.Treinamento Autógeno Simplificado (TAS)

Desde que introduzi o TA em prática de grupos há bastante tempo, notei que o método de Schultz não

 

tinha boa adesão por parte dos praticantes, levando a maioria dos participantes a abandonarem a

 

prática pouco tempo depois. Sabe-se, contudo, que a simples vivência de peso e calor é suficiente

 

para produzir um bom relaxamento global. Quando um indivíduo relaxa, ele vivencia cenestesias

 

agradáveis tais como o corpo pesado ou flutuando, e/ou as extremidades aquecidas. Tais sensaçõessão epifenomênicas, e, portanto, podem ser usadas como sugestões para o paciente relaxar, sendo o

 

bastante concentrar-se imaginando estas sensações. A vivência de peso nos braços prolongando-separa todo o corpo é uma via simples e segura para induzir o relaxamento. A vivência de calor também

 

é importante, e geralmente sucede à vivência de corpo (relaxamento das extremidades favorecendomaior aporte da circulação). Os exercícios auxiliares podem ser dispensados, uma vez que a

 

tranquilização do coração e da respiração, a normalização da função digestiva e a redução do fluxo

 

sangüíneo cerebral acompanharão cedo ou tarde o relaxamento. Há, também, uma razão para se

 

dispensar estes quatro exercícios: a focalização de uma região neuroticamente perturbadafrequentemente intensifica a ansiedade sobre aquela área, e o desconforto pode levar o paciente a

 

abandonar a terapia. Por outro lado, o paciente nesta situação, irá igualmente melhorar com o

 

relaxamento global induzido pelas vivências controladas de peso e calor, que aos poucos irá

 

dissolvendo o fantasma corporal que organiza o seu distúrbio.

Em nosso método, usamos apenas as vivências de peso e calor para indução do relaxamentoconcluindo com a vivência de flutuação da cabeça que pode ser generalizada para todo o organismo.

 

A seqüência se inicia com a respiração de Aiginger, e chamei este método de Treinamento AutógenoSimplificado (TAS).

Elementos do método

O indivíduo só iniciará os exercícios depois que estiver bem informado sobre a natureza e propósitodo mesmo, estiver disposto a segui-lo e cumprir as metas designadas pelo orientador. Adicionamos ao

 

método original uma introdução que consiste em estimular o relaxamento pela técnica de Aiginger,que consiste em uma inspiração profunda, seguida de uma expiração completa, calma e controlada,

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procurando relaxar o corpo nesta fase. Partindo da observação de que a respiração dos neuróticos ésempre perturbada, e supondo ser a origem desta perturbação os centros subcorticais, Aiginger

 

utilizava este exercício como meio de dissipar a irritabilidade destes centros (Masson, 1986). Este

 

exercício é excelente para pacientes ansiosos, podendo ser realizado duas ou três vezes por dia,

 

completando-se com uma sesta após o almoço.

Após uma ou duas respirações de Aiginger, inicia-se o TAS assumindo-se uma postura para oexercício, que é essencial para o relaxamento. O indivíduo senta-se de modo relaxado e confortável,

 

com as costas eretas porém sem tensão, braços apoiados sobre as coxas e as pernas livres com os pésbem apoiados sobre o chão. Alguns pacientes preferem um banco, e então lhes ensinamos a postura

 

do cocheiro. O exercício pode ser feito deitado, assumindo-se a postura do morto, bem conhecida dospraticantes de yoga. Começam, então, os exercícios

Primeiro exercício:

Pedimos ao indivíduo para deixar os ombros soltos, manter a respiração calma e, me seguida, colocarsua atenção no braço direito. Em seguida, sugerimos que o imagine pesado (algumas pessoas poderão

 

requerer um reforço, e então sugerimos adicionalmente uma imagem), repetindo para si mesmo,mentalmente as palavras "pesado, pesado, agradavelmente pesado...", como reforço sugestivo. A

 

vivência mental de peso induz o relaxamento do braço, e esta experiência será vivenciadainternamente como uma sensação de tranqüilidade, calma, paz. Instruímos ao indivíduo que, ao

 

perceber objetivamente esta sensação, constate-a dizendo mentalmente para si mesmo: "estou

 

tranqüilo agora, tranqüilo...".(O leitor deve estar percebendo tratar-se de uma aprendizagem por

 

condicionamento).

O indivíduo é instruído a fazer este exercício em casa, duas vezes por dia, durante uns dez minutos,deixando-se absorver na sensação de tranqüilidade, desconectando-se do seu entorno. Em uma

 

semana o indivíduo progredirá no aprofundamento, e se alguma dificuldade o impedir de relaxar, elecomunicará isto ao orientador a segunda semana e o exercício será revisto. Mais adiante falaremossobre este tipo de problema.

Os praticantes terão um novo encontro com o orientador na segunda semana (os encontros são

 

semanais, durando uma hora como o grupo). Agora, depois da vivência de braço pesado, introduz-se a

 

fórmula: "todo meu corpo pesado, pesado, agradavelmente pesado,..." vivenciando-se o corpo

 

repousando pesadamente. Este exercício baseia-se na propriedade do cérebro em generalizar suas

 

vivências, que Schultz denominou "comutação organísmica". Em seguida, completa-se o exercíciopela constatação de tranqüilizarão interna, objeto último do TAS. O indivíduo fará o exercício duas

 

vezes por dia até a próxima semana para firmar o condicionamento.

Segundo exercício:

Completado o exercício de vivência de peso, já com um bom grau de tranqüilizarão e de desconexão

 

com seu entorno, passa-se ao exercício seguinte que é a vivência de calor. Repete-se a vivência decorpo pesado e, então, acrescenta-se a de calor através da fórmula sugestiva: "mãos quentes, quentes,

 

agradavelmente quentes..." adicionando-se um recurso imaginativo como, p. ex., o ato de mergulharas mãos em água agradavelmente morna. O indivíduo deve sentir-se mais tranqüilo durante o

 

exercício, e então, constata o seu estado repetindo para si mesmo: "estou tranqüilo agora, tranqüilo...".o indivíduo fará este exercício em casa, como indicado, até o próximo encontro.

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Na semana seguinte, repete-se a vivência global de peso seguindo-se a de calor e, então, a comutaçãode calor: "mãos, pés e ventre quentes, quentes, agradavelmente quentes...", concluindo-se pela

 

constatação de tranqüilizarão interna.

Terceiro exercício:

Adiciona-se aos exercícios anteriores a vivência da cabeça leve, flutuando acima do corpo, "como um

 

balão de gás". O procedimento será o mesmo dos exercícios anteriores, e a comutação será a de todo

o corpo flutuando, usando-se recursos tais como boiar numa piscina com água agradavelmente tépida,

 

ou flutuar sobre uma nuvem, etc.

A prática regular do TAS produzirá uma regulação global no organismo. A musculatura periférica

 

desespasmodiza-se e, com ela os vasos, regulando a circulação e aumentando a perfusão dos órgãos,

 

enquanto o aporte sanguíneo do cérebro se reduz, o diafragma se desespasmodiza, permitindo àrespiração ampliar-se facilitando as trocas gasosas, a peristalse normaliza-se e o ritmo cardíaco

 

tranqüiliza-se. O TAS não somente recupera a função perturbada nos transtornos psicossomáticos enervosos, como também é, acima de tudo, uma profilaxia contra o estresse e os golpes afetivos que

 

podem nos fazer adoecer, enfartar, deprimir, etc, em nosso dia a dia. Uma mente calma, alerta,perceptiva, imperturbável é sinônimo de autocontrole, discernimento e tranqüilidade.

O ciclo inteiro do treinamento levará cerca de seis semanas, e a repetição da seqüência de exercícios a

 

partir daí condicionará o organismo a relaxar preventivamente nas situações tensas, ou

 

voluntariamente quando se desejar. Isto será quase automático. Ao final de um ano de prática

 

individual, fecha-se o ciclo condicionando-se automaticamente a resposta relaxamento unicamente

 

olhando para o centro da testa, fechando as pálpebras e relaxando os ombros com uma ampla

 

respiração. Esta fase requer apeans duas a três sessões com o orientador. Neste estágio, o indivíduoconsegue desconectar-se do seu entorno entrando numa condição mental que Schultz denominou de

 

"estado autógeno", que considerava uma autêntica "desconexão organísmica".

O estado autógeno já é, por si só, auto-regulador. Entretanto, o indivíduo pode usar este estado para

 

dissolver algum sintoma incômodo, controlar uma dor física, produzir analgesia local e hemostasia,etc, ou simplesmente condicionar-se de propósitos.

Dificuldades e uso psicoterápico

Os participantes devem ser instruídos de que não devem esperar que tudo ocorra rápidamente. Cada

 

indivíduo tem um tempo próprio e características próprias, mas todos chegam ao mesmo resultado.

 

Em outras palavras, todos chegam ao resultado esperado mais ou menos no mesmo tempo, mas não

 

da mesma forma. Também é importante dizer que não é uma questão de vontade querer relaxar, mas

 

uma questão de deixar que o corpo relaxe por si mesmo.

Alguns indivíduos experimentam dificuldades nos exercícios iniciais. Sensações de prurido,

 

agulhadas, ansiedade e mesmo angústia e choro poderão ocorrer. Se o TAS está sendo realizado no

 

setting terapêutico, estas cenestesias serão o material a ser trabalhado juntamente com o paciente.Contudo, não é necessário partir para uma psicoterapia verbal aqui. Simplesmente explicamos ao

 

indivíduo que estas sensações desagradáveis são conteúdos reprimidos (impulsos agressivos,

 

principalmente) que estão sendo eliminados (abreagidos vegetativamente), e que ele deve deixar que

 

esta eliminação aconteça, e que isto se dará em uma ou duas sessões (Luthe, 1970). Esta experiência

 

tem um impacto positivo na adesão do indivíduo ao método.

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Estas descargas são a liberação de uma estase hipotalâmica decorrente de afetos longamentereprimidos (Luthe, 1970; Ikemi e Deshimaru, 1975). Isto desangustia o individuo e o faz sentir-se

 

renovado.

Transculturalidade dos relaxamentos concentrativos

Do ponto de vista transcultural, o TA é uma forma racional e científica de praticas antigas tais como a

 

yoga e o zen, resguardando os benefícios psicossomáticos das mesmas e disponibilizando-os ao ser

humano moderno carente de uma vida contemplativa. De fato, no Japão, os médicos que usam o TA

 

preferem esta prática à do zen , assim como os médicos da Índia (Ikemi e Deshimaru, 1985).

Darei aqui algumas citações de diferentes épocas e lugares para que o leitor possa fazer uma idéia da

 

universalidade destas práticas e do seu benefício para a integração do indivíduo:

"Escolha a palavra que preferir... e conserve-a no seu coração e não deixe de repeti-la aconteça o queacontecer... Esta palavra será o seu escudo e a sua espada... com ela você vencerá todo tipo de

 

pensamento... e, se algum pensamento o perturba... responda a ele unicamente com esta palavra e não

 

com outras... não se ocupe destes pensamentos com a mente ou com a imaginação"("A Nuvem do

 

 Desconhecido", anônimo cristão do século XIV ).

"Aquiete o corpo, abstraia-se do mundo e fixe seu olhar no chão. Repita incessantemente uma brevefrase do Evangelho ou simplesmente diga "não" aos pensamentos que lhe sucedem. Os monges e

 

príncipes muito ocupados deveriam fazer esta meditaçãouma hora pela manhã e à noite" (Frei

Francisco de Osuna, "O Terceiro Alfabeto Espiritual", século X ).

"Sente-se sozinho e em silêncio, baixe a cabeça, feche os olhos, expire calmamente e imagine-se

 

olhando para o seu umbigo. Leve sua mente da cabeça para o seu umbigo, e cada vez que expirar,

 

diga "sacratíssimo coração de Jesus, tende piedade de mim, pecador", mentalmente ou somente por

 

movimentos labiais. Procure deixar todos os seus pensamentos fora, seja calmo, paciente e repita esteexercício frequentemente".( Meditação do Hesicasmo, monges cristãos do monte Athos, século XIV,

 

método denominado "oração do sagrado coração de Jesus" ou "oração de Jesus").

"Imerso em orações e meditações, pronunciando o divino nome com especiais modulações da voz

e com gestos especiais, Abulafia, o famoso rabino cabalista do século XIII, induzia-se em si mesmo

um estado de êxtase no qual acreditava que sua alma libertava-se dos seus laços materiais e, assim

 

desimpedida, retornava à sua fonte divina" ( Rabino Zion Bokser ).

"Os ensinamentos do cabalista Abulafia representam uma versão judaizada das antigas técnicas

 

espirituais... que os místicos indianos denominam yoga...um importante elemento no sistema deAbulafia eram as técnicas de respiração, também desenvolvidas na yoga...Abulafia ainda ensinava

 

certas posturas corporais, certas combinações de consoantes e vogais, e certas formas de orações"...Algumas passagens do livro de Abulafia dá a nítida impressão de ser um tratado de yoga judaizada".

 

(Gershon Sholem, The World of Cabbalah).

"Repousa o teu corpo e acalma as tuas paixões, e se te mantiveres assim, atrairás a ti mesmo, o ser

 

divino" ( Zózimo de Panoplis, século II ).

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"...e para expulsar esses pensamentos melancólicos, fazia-se passear por um jardim, e depois de umlongo passeio, havendo-me sentado sobre uma rocha, caí em profundo sono: eu dormia, porém, meu

 

coração velava" ( H. Madathan, O Renascimento do Século de Ouro, século XVIII )

"Sentado sob uma palmeira eu refletia longamente sobre as misérias humanas...me dirigi ao Criador...

um perfume suave se espalhou ao meu redor... não senti mais a palmeira, o chão, nada ao redor...".

 

( Anônimo do século XVIII, "Apocalipse Hermético")

"Existimos em relação com todos os pontos do Universo, tal com o futuro e o passado. É só dadireção e da duração da nossa atenção observadora que depende a questão de sabermos que relação

 

preferimos cultivar, que reação será para nós a mais importante e a mais ativa". ( Novalis)

Conclusão

A modificação aqui apresentada mostrou-se tão eficiente quanto o TA completo, com a vantagem de

 

ser uma técnica mais simplificada que proporciona uma maior índice de adesão. Os psiquiatras quehabitualmente são empáticos com seus pacientes e tem experiência em psicoterapia não terão

 

dificuldades em utilizar esta técnica como auxiliar em sua prática, e poderão constatar seus benefíciossignificativos.

Referências

Ikemi Y, Deshimaru T (1985). Zen et Self-Control, Paris: Editions Retz.

Luthe W (1970). Autogenic Therapy, New York: Grune & Stratton.

MacLean PD (1949). Psychosomatic Disease and the "Visceral Brain". Psychos. Medicine, 11:338-353.

Masson S (1986). Os Relaxamentos, São Paulo: Ed. Manole, p. 36.

Schultz JH (1967). O Treinamento Autógeno. São Paulo: Ed. Mestre Jou.

Sifneos PE (1977). Psychothérapie brève et crise emotionnelle. Bruxelas: Pierre Mardaga Ed.