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Três propostas para uma estética ecológica na América Central Nascido no Chile e radicado desde 1973 na Costa Rica, Bruno Stagno tem projetado, desde os anos 1970, um número significativo de obras originais, procurando, segundo o arquiteto Roberto Segre, “uma resposta regional às condicionantes culturais, sociais, geográficas e ecológicas daquela área da América Central”. No texto a seguir, Segre, que 15 anos atrás já havia analisado o trabalho de Stagno (leia PROJETO 147, novembro de 1991), faz uma retrospectiva de suas idéias e apresenta três de seus projetos recentes, para o setor empresarial. Ao adotar as tradições locais, tanto as da arquitetura colonial como as das edificações agrícolas construídas nos bananais da United Fruit, Bruno Stagno elaborou uma expressão estética como alternativa formal àquela obtida em outras áreas da América Latina - o que chamou a atenção de críticos e profissionais do continente. É a partir daí que se explicam sua participação no grupo gestor dos Seminários de Arquitetura Latino- Americana (SAL) e sua associação teórica com os professores da Universidade de Delft (Holanda) Alexander Tzonis e Liane Lefaivre, responsáveis pela categoria conceitual do regionalismo crítico, difundido posteriormente pelo inglês Kenneth Frampton. Essa colaboração amadureceu a tese do sincretismo ambiental caribenho, identificado pela mistura de influências de diferentes países e raças, pelas superposições entre tradição e modernidade e pela interação entre os saberes cultos e populares da América Central e das Antilhas. No Banco San José, solução sustentável e ecológica permite poupar energia elétrica... ... e reduzir ao mínimo o uso do ar-condicionado O projeto da agência se baseia nas formas herdadas da arquitetura de instalações agrícolas dos bananais 1/3/2011 ARCOWEB - Bruno Stagno www.arcoweb.com.br/index2.php?opti… 1/7

Três propostas para uma estéticaacademico.riogrande.ifrs.edu.br/~elena.oliveira/... · conceitual do regionalismo crítico, difundido posteriormente pelo inglês Kenneth Frampton

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Três propostas para uma estéticaecológica na América Central

Nascido no Chile e radicado desde 1973 na CostaRica, Bruno Stagno tem projetado, desde os anos1970, um número significativo de obras originais,procurando, segundo o arquiteto Roberto Segre,“uma resposta regional às condicionantes culturais,sociais, geográficas e ecológicas daquela área daAmérica Central”. No texto a seguir, Segre, que 15anos atrás já havia analisado o trabalho de Stagno(leia PROJETO 147, novembro de 1991), faz umaretrospectiva de suas idéias e apresenta três deseus projetos recentes, para o setor empresarial.Ao adotar as tradições locais, tanto as daarquitetura colonial como as das edificaçõesagrícolas construídas nos bananais da United Fruit,Bruno Stagno elaborou uma expressão estéticacomo alternativa formal àquela obtida em outrasáreas da América Latina - o que chamou a atençãode críticos e profissionais do continente. É a partirdaí que se explicam sua participação no grupo gestordos Seminários de Arquitetura Latino- Americana(SAL) e sua associação teórica com os professoresda Universidade de Delft (Holanda) Alexander Tzonise Liane Lefaivre, responsáveis pela categoriaconceitual do regionalismo crítico, difundidoposteriormente pelo inglês Kenneth Frampton. Essacolaboração amadureceu a tese do sincretismoambiental caribenho, identificado pela mistura deinfluências de diferentes países e raças, pelassuperposições entre tradição e modernidade e pelainteração entre os saberes cultos e populares daAmérica Central e das Antilhas.

No Banco San José, s olução sustentável e ecológica permite poupar energia elétrica...

... e reduzir ao mínimo o uso do ar-condic ionado

O projeto da agênc ia se baseia nas formas herdadas da arquitetura de ins talações agrícolas dos bananais

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Nos anos 1990, Stagno dedicou-se aodesenvolvimento de estudos científicos sobre ainfluência do clima e das condições ecológicas naarquitetura dos trópicos. Seu objetivo era superaras limitações de uma aproximação superficial eintuitiva baseada principalmente nos atributosformais e na reinterpretação da herança histórica.Com a criação do Instituto de Arquitetura Tropical,em San José, capital da Costa Rica, estabeleceu umarede de contatos internacionais a partir daorganização de seminários que contaram com aparticipação de críticos e especialistas de diferentesregiões: Hugo Segawa, Roberto Segre e SeverianoPorto, do Brasil; Gerardo Mosquera, de Cuba; KenYeang, da Malásia; Rahul Mehrotra, da Índia;Geoffrey Bawa, de Sri Lanka; Tang Hok Beng, deCingapura.

O sucesso da iniciativa culminou com a publicaçãode dois livros: Bruno Stagno. An architect in thetropics, de Alexander Tzonis, Liane Lefaivre e KenYeang, 1999; e Tropical architecture. Globalregionalism in the age of globalization, de Stagno,Tzonis e Lefaivre, 2001. Trouxe também oreconhecimento, por parte de instituiçõesimportantes, das pesquisas desenvolvidas peloinstituto, com a concessão do Prêmio Príncipe Claus,da Holanda, e a bolsa da Fundação John SimonGuggenheim, dos Estados Unidos.

Nas obras do início dos anos 1990, percebe-sesignificativa mudança na linguagem arquitetônica deStagno. Na primeira etapa, ele se ancorou nasmetáforas formais da arquitetura popular da CostaRica e numa transcrição moderna das estruturas deferro e vidro utilizadas nas plantações da UnitedFruit no começo do século. Essa postura foi assumida

P lacas protegem as aberturas de vidro na agênc ia bancária

V is ta da lateral da agênc ia

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não só como resposta à adequação climática, mascomo rejeição ao modismo invasor do pós-modernismo e aos excessos formais do brutalismolocal. O tijolo, a madeira e as estruturas metálicascaracterizam as obras daquele período, seguindo aherança corbusieriana presente na utilização dosmateriais naturais nas casas Jaoul - lembre-se queStagno trabalhou no escritório da rue de Sévres como herdeiro do Mestre, José Oubrerie, no projeto daigreja de Firminy-Vert, que está prestes a serconcluída.

Na parte c entral do espaço interno fica a área de atendimentoda agênc ia bancária

A superação da antítese artificial entre regionalismoe cosmopolitismo, além da crítica ao nacionalismorestrito que alguns teóricos e arquitetos da AméricaLatina defenderam, levou Stagno a acatar o discursodo novo sistema formal e conceitual criado pelominimalismo e pelo high tech, adaptado às condiçõeseconômicas e técnicas locais, sem abandonar oimaginário estético e cultural da América Central.Essa abertura criativa permitiu-lhe participar deeventos internacionais com soluções imaginativas,expressando a universalidade de seus princípios. Em1995, foi um dos dez selecionados - de um total de225 - em um “anticoncurso” para elaboraralternativas à proposta esquemática dereconstrução, em Berlim, do prédio da Bauakademie,

No edifíc io de es critórios P érgola, Stagno as sume a importânc ia dos componentes ecológic os na imagem formal

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de Friedrich Schinkel. Stagno apresentaria ummonumental e transparente volume de tijolosinserido em um manguezal com árvores latinas,introduzindo o trópico na cidade. Em 2004, na 9ªMostra Internacional de Arquitetura de Veneza, cujotema era Metamorfose, dividiu com Frank Gehry oespaço Identidade Tropical, explícita na sua obra eno Museu da Biodiversidade, projeto de Gehry para aentrada do Pacífico, no canal do Panamá. As trêsobras aqui apresentadas demonstram com clarezaas mudanças nas concepções estéticas de Stagno.

A agência La Bandera do Banco San José(2004/2005) fecha o ciclo regionalista, baseado nasformas herdadas da arquitetura das instalaçõesagrícolas dos bananais, identificadas na paisagemrural pelo predomínio das grandes coberturasmetálicas de chapa corrugada em balanço. Comaberturas zenitais para a iluminação e a ventilação,a edificação propõe uma solução sustentável eecológica que permite poupar energia elétrica ereduzir ao mínimo o uso do ar-condicionado. Apersistência desses elementos justificava-se pelaconstância da imagem corporativa do banco, iniciadaem 1994 e mantida nas cinco unidades espalhadaspor San José. A procura da identificação formalbaseada em componentes arquitetônicos adotadosda memória ambiental regional advém danecessidade de se contrapor às agências bancáriasestrangeiras e ao anonimato das construçõesconvencionais voltadas para essa atividade.

No edifício de escritórios Pérgola (2003/2004), oarquiteto se liberta das referências históricas evernaculares. Ele assume plenamente a importânciados componentes ecológicos como determinantesda imagem formal, cuja qualificação estética sebaseia nas proporções e na utilização ascética dosmateriais. Os recursos econômicos limitados daempresa o obrigaram a reduzir a solução a umasimples caixa retangular, com estrutura pré-fabricadade concreto e fachada de vidro.

Aqui, como em outros trabalhos - o escritório daCredomatic (2002/2003) e o Banco Centro-Americanode Integração Econômica (2002) -, Stagno abandonaa representatividade simbólica da cobertura econcentra a imagem dominante no tratamento dasfachadas, transformadas em sistemas dinâmicos deproteção solar. A caixa de concreto é envolvidaexternamente por uma leve estrutura metálicamodulada. Esta serve de suporte para o crescimentode plantas trepadeiras, que estabelecem um filtroclimático responsável por diminuir significativamentea temperatura interna. Essa experiência teve comoprecedentes o prédio Consórcio Vida, de EnriqueBrowne e Borja Huidobro, em Santiago (leia PROJETODESIGN 195, abril de 1996); os projetos para o Suldos Estados Unidos do designer argentino EmilioAmbasz; as fantasias naturalistas de Iñaki Ábalos eJuan Herreros; e, finalmente, as torres ecológicas deKen Yeang, na Malásia.

A caixa de concreto é envolvida externamente por uma levees trutura metálic a modulada, que s erve de suporte para ocres c imento de plantas trepadeiras

A limitada dis ponibilidade de recursos econômicos levou àopção por uma caixa retangular ...

... com estrutura pré-fabric ada de c onc reto e fachada de vidro

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A s plantas criam um filtro c limátic o ...

O escritório da fábrica de cimento Holcim(2003/2004), em San Rafael, é a obra mais original

... que diminui s ignificativamente a temperatura interior dos locais de trabalho

O projeto para a indústria de c imento é a obra mais original dentre as projetadas por Stagno desde o iníc io do s éculo 21

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dentre as projetadas por Stagno desde o início doséculo 21. A empresa desejava que o prédiodistinguisse a significação da função, o que motivouo cinza como cor dominante dos volumes emconcreto armado aparente que compõem o conjunto.Em um contexto paisagístico árido e com temáticaque tradicionalmente se manifesta em termosformais agressivos e anônimos, o arquiteto soubecriar um entorno natural que alternou a suavidadeda grama e a dureza das pedras ornamentais -estas colocadas no espaço interior de interligaçãodos três volumes principais, em uma composiçãotriangular aberta, definida pela continuidade dasgalerias e pontes de circulação.

Mas a expressão plástica mais intensa se concentrano sistema de proteção solar externo, formado porfinas colunas de concreto, suporte de uma malha decabos de aço tensionados e lonas de plásticocontínuas que envolve as fachadas. A sombraprotetora evita a entrada do sol no interior doslocais de trabalho. É genuinamente criativo ocontraste formal entre as superfícies rugosas deconcreto armado dos volumes principais, as linhashorizontais do sistema de circulação no pátio internoe a forma livre e sinuosa das lonas, cujas sombrasse projetam sobre a grama (lembrando as estruturastensionadas de Frei Otto), e dos painéis verticaisperfurados, que acompanham plasticamente o ritmomodulado das colunas.

Finalmente, a transcrição mimética dos elementosidentificadores da memória histórica ambiental foisublimada em formas contemporâneas, que,mantendo os princípios da tradição regional,manifestam uma criatividade renovada, pertinente àcultura e à estética do século 21.

Texto resumido a partir de reportagemde Roberto SegrePublicada originalmente em PROJETODESIGNEdição 323 Janeiro de 2007

Bruno Stagno estudou arquitetura na PontifíciaUniversidade Católica do Chile (1962/68) e na École desBeaux Arts UP6, em Paris (1969/72). De 1969 a 1971,participou do projeto da igreja Firminy-Vert, de LeCorbusier. É autor de projetos de bancos, edifícios deescritórios, escolas e residências, entre outros. Fundou(em 1996) e dirige o Instituto de Arquitetura Tropical, naCosta Rica. É um dos precursores da arquiteturabioclimática na América Latina

Es critório da Holc im é marcado por três volumes princ ipais ...

... em uma compos ição triangular aberta

O entorno natural c riado alterna a suavidade da grama e adureza das pedras ornamentais

Galerias e pontes de c irc ulação ...

... conec tam os volumes do conjunto

Fechar Janela

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A s lonas lembram as estruturas tens ionadasde Frei O tto

A s lonas lembram as estruturas tens ionadasde Frei O tto

Finas colunas de concreto suportam a malha de cabostens ionados e lonas de plástico contínuas

O predomínio da c or c inza nos volumes de c onc reto armado foiuma solic itação da empresa

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