14
TROCANDO EM MIÚDOS: O QUE DIZ O USUÁRIO (*) I. Visões e representações da metrópole A importância de se levantar as representações sociais que os usuários de transporte coletivo têm da metrópole reside no fato de que essas representações interagem também com as dos serviços de transporte coletivo. Segundo a visão de Georg Simmel, a metrópole pode ser considerada como a sede da economia monetária. É a circulação do dinheiro que permite entender as transformações econômicas, sociais e políticas que mudaram o homem de maneira decisiva, processo que passou pela intensificação dos fluxos de mercado, pela industrialização e pela modernidade. A circulação da economia monetária possibilita as trocas de mercadorias e estas, os deslocamentos de pessoas no espaço. A circulação, assim se coloca no centro das formas como os contatos se realizam pelos habitantes da metrópole. Outra leitura da cidade se insere na perspectiva de Michel Foucault, que a vê como um “circuito integrado normalizador”. Este circuito, do qual fazem parte as instituições sociais de caráter coletivo, tem por finalidade criar regras e disciplinar os indivíduos na utilização do espaço coletivo e na circulação de pessoas. Os equipamentos coletivos existentes na cidade exercem papel de “contenção” os quais o próprio autor denominou de “equipamentos de normalização”. A normalização do Estado, de um lado, e a resistência da sociedade a essa normalização, de outro, abrem um campo de contendas, de natureza política no qual Estado e cidadãos e cidadãos entre si disputam a oportunidade do exercício de seus poderes no uso cotidiano da cidade. Essas duas ideias centrais de cidade como espaço de circulação de dinheiro, de comunicação, de trocas e de relações de poder nos auxiliam a compreender o discurso dos usuários de transporte coletivo que participaram da fase qualitativa da última pesquisa “Imagem dos Transportes na Região Metropolitana de São Paulo”, executada pela Toledo & Associados, sob a coordenação da ANTP e com o patrocínio da CPTM, EMTU, Metrô, Setpesp, SPTrans e SPUrbanuss, entidades responsáveis pelo transporte coletivo na metrópole de São Paulo. Os resultados das discussões em grupo realizadas em agosto e setembro de 2010, com 3 grupos femininos e 3 grupos masculinos de usuários habituais de: a) trem e ônibus municipais; b) metrô e ônibus municipais; e c) ônibus metropolitanos e ônibus municipais, forneceram a base para o presente trabalho. A primeira perspectiva para a qual as verbalizações dos pesquisados apontam é a visão da metrópole como “terra das oportunidades e da variedade”. Relatam a grande oferta de empregos, bons salários, educação, cultura, acesso a bens e serviços, facilidades de deslocamento por meio do transporte coletivo e também opções de lazer, especialmente na noite paulistana. __________ (*) Texto elaborado por Christina Maria De Marchiori Borges (SPTrans), Cristina Freitas (Metrô) e Denise Daud (Metrô) com a colaboração dos demais membros da Comissão Técnica Pesquisa de Opinião e do GT Pesquisa de Imagem dos Transportes da ANTP - Carlos Alberto Panella (EMTU), Emilia Hiroi (Metrô), Hélcio Raymundo (Setpesp), João Carlos de Campos Leme (CPTM), Rogerio Belda (ANTP) e Wagner Palma (SPUrbanuss). 1

TROCANDO EM MIÚDOS: O QUE DIZ O USUÁRIO

Embed Size (px)

DESCRIPTION

COMISSÃO TÉCNICA DE PESQUISA DE Comissão Técnica de Pesquisa de Opinião Estudo analisa discurso de usuários de transportes na fase qualitativa da pesquisa Imagem dos Transportes na RMSP de 2010

Citation preview

TROCANDO EM MIÚDOS: O QUE DIZ O USUÁRIO(*)

I. Visões e representações da metrópole

A importância de se levantar as representações sociais que os usuários de transporte coletivo têm da metrópole reside no fato de que essas representações interagem também com as dos serviços de transporte coletivo.

Segundo a visão de Georg Simmel, a metrópole pode ser considerada como a sede da economia monetária. É a circulação do dinheiro que permite entender as transformações econômicas, sociais e políticas que mudaram o homem de maneira decisiva, processo que passou pela intensificação dos fluxos de mercado, pela industrialização e pela modernidade. A circulação da economia monetária possibilita as trocas de mercadorias e estas, os deslocamentos de pessoas no espaço. A circulação, assim se coloca no centro das formas como os contatos se realizam pelos habitantes da metrópole.

Outra leitura da cidade se insere na perspectiva de Michel Foucault, que a vê como um “circuito integrado normalizador”. Este circuito, do qual fazem parte as instituições sociais de caráter coletivo, tem por finalidade criar regras e disciplinar os indivíduos na utilização do espaço coletivo e na circulação de pessoas. Os equipamentos coletivos existentes na cidade exercem papel de “contenção” os quais o próprio autor denominou de “equipamentos de normalização”. A normalização do Estado, de um lado, e a resistência da sociedade a essa normalização, de outro, abrem um campo de contendas, de natureza política no qual Estado e cidadãos e cidadãos entre si disputam a oportunidade do exercício de seus poderes no uso cotidiano da cidade.

Essas duas ideias centrais de cidade como espaço de circulação de dinheiro, de comunicação, de trocas e de relações de poder nos auxiliam a compreender o discurso dos usuários de transporte coletivo que participaram da fase qualitativa da última pesquisa “Imagem dos Transportes na Região Metropolitana de São Paulo”, executada pela Toledo & Associados, sob a coordenação da ANTP e com o patrocínio da CPTM, EMTU, Metrô, Setpesp, SPTrans e SPUrbanuss, entidades responsáveis pelo transporte coletivo na metrópole de São Paulo.

Os resultados das discussões em grupo realizadas em agosto e setembro de 2010, com 3 grupos femininos e 3 grupos masculinos de usuários habituais de: a) trem e ônibus municipais; b) metrô e ônibus municipais; e c) ônibus metropolitanos e ônibus municipais, forneceram a base para o presente trabalho.

A primeira perspectiva para a qual as verbalizações dos pesquisados apontam é a visão da metrópole como “terra das oportunidades e da variedade”. Relatam a grande oferta de empregos, bons salários, educação, cultura, acesso a bens e serviços, facilidades de deslocamento por meio do transporte coletivo e também opções de lazer, especialmente na noite paulistana. __________

(*) Texto elaborado por Christina Maria De Marchiori Borges (SPTrans), Cristina Freitas (Metrô) e Denise Daud (Metrô) com a colaboração dos demais membros da Comissão Técnica Pesquisa de Opinião e do GT Pesquisa de Imagem dos Transportes da ANTP - Carlos Alberto Panella (EMTU), Emilia Hiroi (Metrô), Hélcio Raymundo (Setpesp), João Carlos de Campos Leme (CPTM), Rogerio Belda (ANTP) e Wagner Palma (SPUrbanuss).

1

“...ter à mão tudo que você precisa sempre...” (usuário de ônibus metropolitano, feminino)

“...qualquer coisa que você queira fazer em São Paulo a qualquer horário existe em algum lugar...” (usuário de metrô, feminino)

A característica cosmopolita de São Paulo, possibilitando a convivência de muitas culturas com pessoas de vários lugares do mundo é também bastante valorizada.

“...isso é favorável, amplia o nosso conhecimento, você passa a ter uma visão mais ampla das coisas...” (usuário de trem, masculino)

Muitos dos “bens” ofertados pela cidade, embora vistos como positivos, não são apropriados pelos pesquisados. Embora nem sempre acessíveis, o simples fato de existirem já é por si só valorizado. Esses bens encontram-se “lá” bem guardados em um lugar de importância e de destaque no imaginário coletivo.

Esse conceito da cidade e da metrópole de São Paulo como terra de oportunidades deve ter por fundamento uma imagem recorrente em que, por muitos anos, a cidade ofereceu oportunidades de trabalho e melhores condições de vida para indivíduos de todas as partes do Brasil. Durante quatro décadas acorreram a São Paulo populações, sobretudo do nordeste, em busca de melhores condições de sobrevivência. Somente nas últimas duas décadas, esse movimento deixou de acontecer com tanta intensidade.

A segunda perspectiva, que aglutina outro conjunto de ideias dos pesquisados, são manifestações de relações de poder, disputa, força e suas extensões que permeiam a vida na metrópole. Em torno desse outro núcleo, os pesquisados descrevem a metrópole como um campo de desigualdades sociais profundas, de violência urbana, de excesso de gente e de competição em muitos aspectos e, mais recentemente, também por espaço. São destacados também os impactos nefastos de tudo isso, principalmente a poluição sonora e atmosférica, e o excesso de tempo de vida perdido nos deslocamentos.

“...trabalho seis horas e percebo que fico quatro horas no trânsito para chegar lá...” (usuário de trem, feminino)

No dia a dia, o excesso de gente e a proximidade física parecem causar desconforto.

“...sempre tem espertinho que está se aproveitando das meninas...” (usuário de ônibus metropolitano, masculino)

Esse contato, de alguma maneira, é entendido pelos pesquisados como uma destituição simbólica do seu status de indivíduo e de cidadão, colocando muito próximos “remediados” e pobres, que operariam como espelhos indesejados de si mesmos. Nesse tocante, além de um desconforto psicológico, as situações de aglomeração desencadeiam o mecanismo de recusa de identificação com esse “outro”. Em certas narrativas, que perpassam a pesquisa, estão presentes referências a alguns “outros” como: “pessoas sem educação”, que “moram longe” e que “não sabem se comportar adequadamente”.

“...no transporte coletivo falta respeito entre as pessoas. Tem falta de paciência; todo mundo fica

2

num estresse danado...” (usuário de ônibus metropolitano, masculino)

Estas hipóteses apontam questões passíveis de serem analisadas sob a ótica do preconceito, formação de estigmas e estereótipos de moradores de áreas mais valorizadas socialmente em relação a alguns segmentos de moradores de regiões mais periféricas da metrópole.

“...você tem que prestar atenção na viagem e também se alguém vem te roubar...” (usuário de metrô, masculino)

Para a totalidade dos pesquisados, a concentração de pessoas e a dificuldade dos seus deslocamentos na cidade é resultado da falta de um planejamento adequado por parte do Estado, que não construiu vias suficientes para o escoamento do fluxo de veículos e também não implantou serviços de transporte coletivo na quantidade necessária.

“...muitas pessoas andam com veículo próprio porque não encontram no transporte público uma saída tranquila para chegar no trabalho. Conheço pessoas que optariam por metrô e ônibus porque é mais rápido, se não houvesse tanto tumulto e tanta falta de educação...” (usuário de metrô, feminino)

“...não fizeram um planejamento com a visão no futuro...” (usuário de trem, masculino)

É nesse contexto de ambiguidades, disputas, dificuldades, realidades e idealizações que emergem as representações dos usuários sobre o transporte coletivo.

II. Representações sobre o transporte coletivo

A maneira como os usuários representam o transporte coletivo mescla-se com a sua visão da metrópole, ou seja, percebem que se, de um lado, o transporte facilita a vida das pessoas possibilitando o acesso à cidade, por outro, gera também estresse e desgaste. A longa espera pela condução, o tempo gasto nos deslocamentos devido ao trânsito intenso, a superlotação, conjugados a situações de disputa por espaços e a alegada falta de respeito entre as pessoas fazem com que as viagens se tornem muito tensas e carregadas de sensações e sentimentos negativos.

“...transporte público é demorado, cheio... É mais econômico, mas provoca estresse e desgaste físico...” (usuário de ônibus metropolitano, masculino)

“...o ruim é o tempo que você leva para chegar onde quer ir; e você já chega estressada...” (usuário de metrô, feminino)

Entre as menções dos usuários relativas aos transtornos no uso dos diversos meios de transporte coletivo, o metrô distingue-se por impor certa “civilidade” traduzida por um ambiente limpo e seguro e funcionários bem treinados. Da mesma forma, alguns ônibus urbanos também apresentam essa característica por serem acessíveis para pessoas com deficiência e serem mais confortáveis. Ainda no metrô, o automatismo associado ao emprego de tecnologia avançada é visto como algo que confere status aos usuários, transportando-os para uma esfera de “primeiro mundo”. Nesse caso, a auto-estima daqueles que o usam é um pouco maior, pois entendem que ele foge ao padrão dos demais serviços públicos, inclusive dos outros modos de transporte.

3

É importante assinalar que os serviços públicos, em geral, são encarados pelos usuários como sinônimos de descaso, de má qualidade e destinados aos segmentos menos privilegiados da população. Essa ideia reproduz o pensamento dominante de parte da elite econômica que não considera prioritário investir nesses setores, pois seus usuários não são vistos como cidadãos com direitos iguais aos dos segmentos mais privilegiados. Isso, em parte, pode dever-se ao fato de os usuários dos serviços públicos subordinarem-se a um serviço que não cumpre sua função pública e social e por não terem outras alternativas de deslocamento. Os sentimentos de humilhação e raiva expressos em relação a esses serviços restringem-se mais ao âmbito individual, confirmando, assim, essa sujeição.

Diferentemente, o metrô surge nesse cenário como uma possibilidade de escolha, enquanto o uso dos ônibus, ou mesmo do trem, para muitas pessoas, é compulsório. Nas manifestações mais concretas, os usuários afirmam que a opção pelo metrô, para parte ou todo o deslocamento na cidade, deve-se a alguns de seus atributos como: rapidez, segurança e confiabilidade, que deveriam caracterizar a mobilidade nas grandes metrópoles.

De qualquer forma, a economia proporcionada pelo Bilhete Único e a transferência livre entre alguns modos, juntamente com a possibilidade de reduzir o trânsito e a poluição na cidade são aspectos do transporte coletivo, reconhecidos e valorizados pelos usuários.

Mesmo percebendo essas vantagens associadas ao transporte coletivo, o automóvel ainda mantém uma posição de destaque no imaginário dos usuários, menos como objeto de desejo de outrora e mais como uma necessidade para garantir as viagens.

“...hoje tem que ter carro para se obter mais conforto, mais rapidez e independência...” (usuário de trem, masculino)

“...dá um sentimento de liberdade, evita contato com o estranho...”. (usuário de trem, masculino)

“...o trânsito fica melhor com você no seu carro, ouvindo som...” (usuário de metrô, masculino)

No entanto, para esses usuários o uso cotidiano desse meio apresenta um custo muito elevado de manutenção: combustível, estacionamento, etc. Além disso, o fato de não diminuir de forma significativa o tempo de viagem, hoje, torna-o menos atrativo.

“...como advogado vou para diversos locais. Uso muito metrô, trem e ônibus. De dia é muito mais fácil metrô do que carro. Metrô é mais rápido. Carro tem a gasolina e o estacionamento; sai muito caro...”. (usuário de trem, masculino)

Subjacente a essas afirmações, pode-se entrever a questão da vivência em espaços públicos contraposta à esfera privada, locus da família e do semelhante. Considerando que, na sociedade moderna as relações naturais de sociabilidade parecem perder espaço e ceder lugar ao individualismo ou a soluções individuais, compartilhar e conviver em espaços públicos passa a causar até mesmo mal-estar às pessoas.

Lidar com a alteridade torna-se uma experiência carregada de ameaça. Nas palavras do filósofo esloveno Slavoj Zizek, “cada vez mais, nosso próximo é percebido como ameaça em potencial”. Isso fica evidente quando se observa o processo de ocupação urbana, cuja tendência é a da

4

segregação espacial, distanciando ricos e pobres, iguais e desiguais em enclaves específicos. Nessa direção, seguem também as expectativas relativas à vida na metrópole, expressas pelos indivíduos que participaram da pesquisa. Os principais desejos declarados é o sucesso profissional, viver bem consigo mesmo e com a família e ter tempo para si. Para os outros, apregoam principalmente mais educação para melhorar a convivência social nos locais públicos.

A educação e respeito entre as pessoas no transporte coletivo é uma questão recorrente entre os usuários. O fato de ser um espaço onde as relações são transitórias, fugazes e fortuitas permite às pessoas colocarem em primeiro plano seus interesses e necessidades, sem levar em consideração o outro. O anonimato serve de escudo para atitudes desrespeitosas e pouco solidárias.

Outro aspecto importante a ser destacado é que, à medida que os serviços tornam-se insatisfatórios e não condizentes com as necessidades de seus usuários, parecem abrir caminho para o descumprimento das regras básicas de uso, de sociabilidade e de ética. Comportamentos como empurrar o outro, passar à frente, correr para pegar assento tornam-se transgressões usuais. O mesmo observa-se no trânsito, com o aumento dos congestionamentos os motoristas desrespeitam cada vez mais as regras e procuram tirar mais vantagens em detrimento dos direitos e, até mesmo, da segurança dos outros.

De todas essas questões decorrem as insatisfações expressas em relação ao transporte coletivo. Na verdade, muitas das impressões negativas da vida na metrópole resultam das experiências coletivas empobrecidas.

Estas representações sobre o transporte coletivo estão calcadas em um conjunto de sensações e sentimentos despertados nos usuários pela vivência cotidiana com os serviços de metrô, trem e ônibus na metrópole de São Paulo.

III. Sensações e sentimentos em relação ao transporte coletivo

Entende-se aqui que sensação é a reação do corpo ao mundo físico, sendo, em geral, regida pelas leis da física, química e biologia, resultando na ativação das áreas primárias do córtex cerebral. A sensação proporciona ao homem o conhecimento do mundo exterior e advém da ação de um estímulo externo ou interno sobre um órgão sensorial, que é transmitida ao cérebro por meio do sistema nervoso.

Assim, ao falar de sensação, estamos nos referindo a uma impressão física decorrente de um processo sensorial consciente correlacionado a um processo fisiológico, como, por exemplo: sensação de dor, sensação de mal-estar. Já sentimento é o ato ou efeito de sentir, representando uma disposição afetiva em relação a coisas de ordem moral ou intelectual.

Atualmente, o termo sentimento é também muito usado para designar uma disposição mental, ou a um propósito, de uma pessoa para outra ou para algo. Assim, um problema que pode confundir o entendimento nesta concepção do que é sentimento, é o fato de que, geralmente, os termos usados para se referir a um sentimento, também são os mesmos usados para se referir às emoções ou sensações mais características destes mesmos sentimentos.

Sensações e sentimentos em relação aos modos de transporte coletivo foram um dos temas abordados na fase qualitativa da última pesquisa “Imagem dos Transportes na Região Metropolitana de São Paulo”, realizada em 2010.

5

Também nesse estudo, os conceitos e definições acabaram se misturando no entendimento dos pesquisados. Nas discussões em grupo, muitas vezes, sentimentos foram verbalizados como sensações e vice-versa. Ainda assim, os resultados obtidos nessa pesquisa qualitativa mostraram aspectos bastante reveladores a respeito do que sentem aqueles que usam transporte coletivo na metrópole de São Paulo.

Nas discussões em grupo, os participantes expressaram, além de visões e representações, suas sensações e sentimentos em relação aos diversos modos de transporte coletivo no passado, no presente e no futuro.

Considerando as visões e representações tanto da metrópole quanto do transporte coletivo, fica evidente que o estresse permeia todo o rol de sensações e sentimentos manifestados pelos diversos grupos de usuários. Isso porque, de imediato, esse serviço evoca, invariavelmente, na mente dos participantes da pesquisa, imagens de tumulto, multidão, “um monte de gente empurrando”, veículos lotados e demora, além de estresse, calor, sufoco, “cê-cê”, odores agressivos por excesso de perfume ou por falta de asseio.

“...tem poucos ônibus e demora demais para passar: demora meia hora, quarenta minutos e, quando vem, já vem lotado. As reclamações nem chegam aos donos...” (usuário de metrô, feminino)

“...porque demora, tenho preocupação com o chefe que vai brigar...” (usuário de metrô, feminino)

“...fico meia hora esperando e já chego cansado no serviço...” (usuário de metrô, masculino)

A reclamação frequente de falta de civilidade e de respeito entre as pessoas só faz aumentar o nervosismo e o desgaste físico que os usuários do transporte coletivo declaram sofrer no seu dia-a-dia. Do estresse, que se repete em cada jornada diária, decorrem as sensações de desgaste físico, cansaço e desânimo constantemente verbalizadas nas discussões em grupo.

“...eu vou do Jaraguá até a Barra Funda. É sempre muito difícil; já sofri dois acidentes no trem. Em um me empurraram para fora, prendi e cortei meu dedo. No outro, desloquei o ombro por conta de excesso de pessoas. E eu espero quarenta minutos para entrar num trem, mas não para ir tranquilo; para ir apertado; poder entrar e ir apertado...” (usuário de trem, masculino)

“... de manhã eu espero meia hora ou quarenta minutos para entrar no trem; é muita gente num espaço pequeno. Na parte em que eu pego trem não tem investimento, não tem verba...” (usuário de trem, masculino)

“...você tem que esperar três ou quatro trens passar para conseguir entrar...” (usuário de trem, masculino)

Embora a sensação de estresse seja uma constante no uso dos meios de transporte coletivo, a comparação entre passado e presente mostra que, principalmente em relação ao trem e aos ônibus metropolitanos e os da Capital, o usuário identifica condições melhores, senão em todo sistema, pelo menos em parte dele ou em algumas linhas.

6

“...antigamente quem usava o transporte público se sentia um lixo. Às vezes as pessoas nem falavam que usavam ônibus. Hoje, todo mundo toma ônibus e metrô...” (usuário de trem, masculino)

“...ônibus novos; melhorou a qualidade...” (usuário de metrô, feminino)

“...os ônibus melhoraram bastante, antes eram mais cheios. E o trem, também. Eu moro em Guaianazes...” (usuário de trem, feminino)

“...tenho uma lembrança péssima. O trem não tinha essa modernidade de agora; não tinha toda essa melhoria que teve...” (usuário de trem, masculino)

“...parece que estão pensando um pouco mais na gente. Fico satisfeita...” (usuário de ônibus metropolitano, feminino)

Na perspectiva dos pesquisados, a qualidade dos ônibus evoluiu e o maior acesso ao metrô, devido à integração pelo Bilhete Único, contribuíram para a elevação da auto-estima dos usuários de transporte coletivo e para a adesão de diferentes segmentos da população, apesar de apontarem, atualmente, problemas de lotação nas diversas linhas do metrô.

“...a gente percebe que lotou mais depois do Bilhete Único porque antes tinha uns horários que eram mais calmos e depois do Bilhete Único isso acabou...” (usuário de trem, feminino)

“...hoje todo mundo toma ônibus e metrô; meus chefes hoje usam trem e ônibus...” (usuário de trem, masculino)

“...na Linha Verde é todo mundo bonitinho. As pessoas se comportam todas certinhas, com educação...” (usuário de metrô, feminino)

“...teve um bom investimento no metrô, mas ele não comporta a quantidade de pessoas que o usam...” (usuário de metrô, feminino)

A sensação de estresse deriva, em grande parte, dos níveis de extremo desconforto relatado pelos usuários principalmente nos horários de pico. Assim, outro conjunto de sensações que aparece com destaque nas discussões em grupo está relacionado à falta de conforto.

Níveis cada vez maiores de lotação é, hoje, a marca mais forte de toda rede de transporte da metrópole, extravasando inclusive os horários de pico e reduzindo, gradualmente, a diferença antigamente observada em relação aos horários de vale. Naturalmente, com a superlotação as sensações são de aperto, calor, falta de ventilação, sufoco e, inclusive, reclamações quanto a odores desagradáveis devido ao contato demasiado próximo entre passageiros.

“...o ônibus (municipal da Capital) no horário de pico é horrível, você não respira direito, fica muito abafado...” (usuário de ônibus metropolitano, masculino)

“... (Nos ônibus metropolitanos) era péssimo, todo mundo suando. E tinha um povo que não tomava banho, não gosto nem de lembrar...” (usuário de metrô, feminino)

7

“... (No passado) dava medo e era muito apertado. Eu já chegava cansado no trabalho...” (usuário de trem, masculino)

O desconforto é também a tônica do que sentiam os que usavam o trem, os ônibus metropolitanos e os ônibus municipais da Capital há sete ou oito anos atrás. Hoje, o usuário diz sentir mais conforto, embora isso fique restrito a determinadas linhas e horários. Mesmo percebendo melhoras nas condições do trem, o usuário ainda sente desconforto por viajar espremido e apertado.

“...na Zona Leste eram os piores: andavam de porta aberta e hoje as portas são fechadas. Os novos têm mais conforto...” (usuário de metrô, feminino)

“...trem melhorou: ampliaram a estação, não tem mais ambulantes .” (usuário de ônibus metropolitano, feminino)

“...eu me sinto confortável; é o Expresso Leste: tem banco de qualidade, ele encaixa muito bem, é anatômico, e o ar condicionado funciona...” (usuário de trem, masculino)

“... tenho aquela satisfação de estar conseguindo atravessar a Marginal, porque olho, está toda parada, e eu estou andando, dá satisfação...” (usuário de trem, feminino)

Já o usuário do metrô declara sentir mais desconforto hoje do que no passado, reclamando constantemente de aperto, calor e sufoco, sensações cada vez mais frequentes devido ao crescente aumento da demanda atendida. Essas sensações, no entanto, acabam sendo minimizadas em troca da rapidez, que é, em geral, a prioridade dos usuários e a característica marcante desse modo de transporte.

“...(O metrô) está atendendo todo mundo de forma boa, mas ainda é superlotado; a gente dá preferência porque é rápido...” (usuário de metrô, feminino)

“(O problema do metrô hoje) ...lotação. Muito mais cheio do que antes, por causa da integração. As pessoas que pegavam dois ônibus, preferem pegar o metrô...” (usuário de metrô, masculino)

“...metrô na Praça da República às seis da tarde é um caos. As pessoas me empurraram, até me machucaram. O ônibus não funciona direito e todo mundo quer usar o metrô; aí vira esse caos...” (usuário de metrô, feminino)

Apesar dessas manifestações, os usuários do metrô reconhecem melhorias significativas com a implantação do Bilhete Único integrado e a expansão das linhas 1-Azul e 2-Verde.

“...não era integrado como hoje, que tem Linha Verde, CPTM, Luz e Brás. Metrô vai para qualquer lugar de São Paulo...” (usuário de metrô, masculino)

“...você pagava mais no metrô; pagava ônibus e metrô. Era sem integração...” (usuário de metrô, masculino)

“...os trens da Linha Verde são muito bons: mais confortáveis, espetaculares. São novos, maiores, têm ar condicionado, TV...” (usuário de metrô, masculino)

8

“...linha Amarela tem mais segurança, a porta não abre antes de chegar na plataforma...” (usuário de trem, feminino)

Também os que usam ônibus, tanto os da Capital, quanto os metropolitanos, declaram sentir, atualmente, mais conforto em suas viagens do que no passado.

“...de ônibus, apesar de demorar mais, vou sentada lendo, não é aquela muvuca, dá até pra respirar...” (usuário de ônibus metropolitano, feminino)

“... (Houve) Renovação da frota: ônibus bi-articulados, ar condicionado, TV, som, informações no próprio ônibus... até atrás sobre o itinerário, o trajeto...” (usuário de ônibus metropolitano, masculino)

Outro conjunto de sensações que aflora frequentemente nas discussões em grupo é a preocupação com a violência e a falta de segurança que os usuários experimentam quando usam os diversos modos de transporte coletivo na metrópole.

Embora, atualmente, os usuários considerem insatisfatórios os níveis de segurança no transporte coletivo, a situação no passado é lembrada como tendo sido ainda pior. A única exceção é o metrô, considerado relativamente seguro, tanto hoje quanto no passado.

“...você saía e não sabia se ia voltar para casa. Dava medo de receber um tiro...” (usuário de trem, feminino)

“...não era seguro; tinha muito vandalismo. Tacavam pedra dentro do trem...” (usuário de metrô, feminino)

“...investimento em segurança; o número de agentes cresceu muito, tem orientadores...” (usuário de trem, masculino)

“...não se vê mais drogas, ambulantes e os assaltos diminuíram muito...” (usuário de trem, feminino)

“...Bilhete Único é mais seguro: tem menos assaltos e você não precisa andar com dinheiro...” (usuário de trem, masculino)

“...segurança. Pode usar celular e notebook, tranquilamente...” (usuário de metrô, masculino)

No passado, assim como atualmente, os sentimentos que os meios de transporte coletivo acabam despertando em seus usuários são, em sua maioria, negativos, em decorrência das sensações de estresse, desconforto e insegurança, comumente, vivenciadas em suas viagens diárias.

Os usuários de trem declaram ainda sentir, hoje, raiva, revolta e humilhação, sentimentos que já vivenciavam no passado. Antigamente, também sentiam medo e vergonha. Hoje, alguns dizem sentir também tristeza e desesperança quando usam a ferrovia.

“...lesado. Estou pagando caro e parece que estou pedindo favor...” (usuário de trem, masculino)

9

“...humilhado porque você paga seus impostos, quer ter transporte de qualidade e não tem. Tem trem lotado todos os dias, todos ficam nervosos por espaço, fica briga dentro do trem...” (usuário de trem, masculino)

“... (No trem comum) sinto revolta, raiva; para mulher é pior, sempre tem um engraçadinho ...” (usuário de trem, feminino)

“...eu fico muito triste. Pra você chegar no trabalho confortável, tem que sair quase duas horas antes, pra pegar um trem ruim com banco duro, ar condicionado que não funciona; horário de pico superlotado , todo mundo respirando o mesmo ar...” (usuário de trem, masculino)

“...horário de domingo é cinquenta minutos de espera... Eu me sinto revoltado... (usuário de trem, masculino)

“...(Fico) satisfeito, quando não está lotado...” (usuário de trem, masculino)

Ao usarem os ônibus municipais da Capital, alguns usuários dizem se sentir, tanto hoje quanto no passado, abandonados, desrespeitados ou lesados. O medo e a frustração de alguns, manifestados em relação ao passado, dá lugar hoje também à raiva, revolta e ansiedade.

“... (As empresas de ônibus) não querem prejuízo; pensam no lucro deles e não nas pessoas. Querem ganhar dinheiro... ” (usuário de metrô, masculino)

“... (Ônibus municipal da Capital, hoje) dá ansiedade porque você não sabe se vai chegar onde precisa...” (usuário de metrô, masculino)

“... (Nos ônibus municipais da Capital) dá raiva por pagar tão caro e não conseguir nem um lugar pra sentar...” (usuário de trem, feminino)

Já nos ônibus metropolitanos, os sentimentos negativos, principalmente o desânimo, decorrem do descaso que os usuários identificam na prestação do serviço, tanto no passado, quanto nos dias de hoje. Alguns dizem sentir também tédio devido aos longos percursos característicos das linhas metropolitanas.

“...sinto-me recebendo um serviço de péssima qualidade; sendo tratada com pouco caso...” (usuário de ônibus metropolitano, feminino)

“... todos queriam ter carro, se sentiam inferiorizados...” (usuário de ônibus metropolitano, feminino)

“... me sentia abandonado à própria sorte...” (usuário de ônibus metropolitano, masculino)

“...eu me sentia entediado; você pensa que vai pra muito longe...” (usuário de ônibus metropolitano, masculino) “... a gente paga e nos tratam muito mal...” (usuário de ônibus metropolitano, feminino)

10

No passado, ao usar o metrô, os usuários lembram que sentiam, predominantemente, segurança, tranquilidade e satisfação pelo conforto e modernidade identificadas nesse modo de transporte. Hoje, os sentimentos são, em geral, de angústia, desespero e tristeza.

“... (No passado) sentia alívio, segurança; era mais gostoso, mais fresquinho...” (usuário de metrô, feminino)

“...era tranquilo, a gente viajava sem suar, sem borrar a maquiagem...” (usuário de metrô, feminino)

“...me sinto numa lata de sardinha, principalmente quando o trem para entre as estações, dá claustrofobia... (usuário de metrô, feminino)

Entretanto, ao mesmo tempo em que expressam esses incômodos, racionalmente os usuários percebem que o transporte coletivo é a saída para as grandes metrópoles face às dificuldades cada vez maiores para circular na cidade e evitar condições que levem à imobilidade. Atualmente, o transporte coletivo na metrópole é visto como em processo de evolução e a percepção é a de que está melhorando seja no tocante à oferta, seja no que diz respeito a sua modernização. No entender dos usuários, há investimentos, principalmente, na modernização e ampliação do metrô e do trem e, em menor grau, nos ônibus urbanos e metropolitanos.

A visão é de que, em relação ao passado, a situação atual é muito melhor na maioria dos modos de transporte, embora a oferta ainda não atenda à demanda existente e o custo-benefício em relação ao serviço seja ainda insatisfatório. Para uma parcela dos usuários, esse movimento de evolução produzirá novas opções de transporte, menor tempo gasto nos deslocamentos e melhorias no trânsito. Mas alguns imaginam que, mesmo com tudo isso, a situação não irá melhorar, pois continuará a crescer o número de pessoas usando tanto o transporte coletivo, quanto o automóvel.

IV. Considerações Finais

A ideia da cidade como o local de trocas e circulação, por excelência, está presente na visão que os usuários de transporte têm da metrópole de São Paulo como a “terra das oportunidades”, “onde se encontra de tudo”, onde são maiores as possibilidades de emprego, o acesso à saúde e à educação, cultura, lazer e, até mesmo, a bens inacessíveis, mas que estão “lá”, à disposição.

A cidade entendida como espaço regulamentado de disputas e conflitos ou, na definição de Foucault, um circuito integrado normalizador está também subjacente, de certa forma, na visão dos usuários de transporte coletivo, ao representá-la como o local dos confrontos e disputas com o “outro”.

É justamente no transporte coletivo que essa competição e disputa, também por espaço, ocorre da maneira mais contundente atualmente, gerando estresse, desconforto e insegurança para grandes parcelas da população em seus deslocamentos diários. Os crescentes níveis de lotação nos serviços de transporte coletivo trazem à tona a questão da convivência com o “outro” que passa a ser visto como uma ameaça em potencial. Na verdade, a proximidade física, ao gerar sensações de grande desconforto e estresse, propicia a manifestação de preconceitos, estigmas e

11

discriminação em relação ao “outro”.

Escudados no anonimato da convivência num espaço de passagem e heterogêneo, em que as relações são fortuitas e sem vínculos, comportamentos desrespeitosos e pouco solidários em relação ao “outro” se tornam cada vez mais frequentes. Assim, a convivência nos meios de transporte coletivo passa a gerar níveis cada vez mais altos de inquietação, mal-estar e insegurança.

Além de sensações desagradáveis, os usuários que participaram da pesquisa manifestam também sentimentos negativos em relação aos serviços de transporte coletivo; eles dizem se sentir, hoje, abandonados, lesados, angustiados e também com raiva. A questão crucial a ser investigada é saber para onde estão apontando essas sensações e sentimentos, hoje tão à flor da pele, entre os que usam os serviços de transporte coletivo na metrópole de São Paulo. É preciso estar atento ao potencial que situações-limite têm de exacerbar comportamentos coletivos agressivos e violentos.

Na visão do Grupo Técnico responsável pela pesquisa “Imagem dos Transportes na Região Metropolitana de São Paulo”, realizada anualmente desde 1985, os resultados da pesquisa qualitativa de 2010 mostram a necessidade imperiosa de ações por parte das operadoras e gestoras, a partir de dois eixos básicos, a saber: melhoria da gestão operacional e melhoria dos processos de relacionamento com usuários.

No conjunto voltado para a melhoria da gestão operacional, além das medidas já adotadas, podem ser desenvolvidos projetos e ações específicos, visando melhor adequar a oferta de transporte aos fluxos de passageiros na cidade, construir corredores exclusivos de ônibus para melhorar a circulação e fluidez dos veículos, e melhorar a capacitação dos empregados para a prestação dos serviços.

A organização dos fluxos em áreas de acesso, bloqueios/catracas, plataformas, entrada e saída de veículos constitui aspecto crucial, seja para reduzir choques entre as massas que se movimentam em todas as direções, seja para evitar interferências no funcionamento do serviço. Incorporar novas tecnologias voltadas à informação e ao conforto da viagem, além de atender reivindicações dos usuários, pode atenuar as dificuldades enfrentadas nos percursos.

No conjunto de ações voltadas para a melhoria do relacionamento com usuários, podem ser desenvolvidos estudos com foco nos comportamentos coletivos, apoiados em referenciais teóricos da Psicologia Social, da Antropologia e da Comunicação, visando, prioritariamente, a:− estimular o exercício da ética;− reduzir situações de estresse;− reduzir situações de violência e competição;− promover a cidadania e relações de convívio social entre usuários, explicitando a igualdade e o

direito de todos ao uso dos serviços de transporte coletivo;− reduzir situações de conflito;− aumentar a atenção às pessoas com necessidades especiais.

A melhoria do relacionamento com os usuários deve se pautar na comunicação como um processo contínuo, a ser alimentado constantemente e jamais interrompido, mesmo quando implementado em ciclos ou campanhas. A interrupção do processo de comunicação reduz a eficácia dos esforços anteriores e anula os investimentos até então realizados, comprometendo drasticamente a

12

retenção da informação pelo usuário.

A comunicação deve utilizar todos os recursos e mídias concomitantemente para ser potencializada e poder, efetivamente, atingir o público-alvo e gerar mudanças de comportamento. Ela também precisa ser renovada, de tempos em tempos, mudando seus apelos, peças, cores e slogans para impactar e mobilizar emoções e sensações e, com isso, alavancar mudanças de comportamentos e atitudes.

Tendo em vista que muitos serviços de transporte coletivo operam no limite de sua capacidade, a probabilidade de ocorrências que fujam ao controle rotineiro é grande. Sendo assim, as operadoras precisam estar preparadas para a gestão de riscos dessa natureza. Com base em estudos de comportamento de massa, é necessário ter ações planejadas de acordo com os vários níveis de gravidade das situações de anormalidade. Tanto nesses casos, como nas situações de normalidade, a comunicação torna-se uma questão fundamental. A busca de inovações nessa área se faz necessária para conseguir sensibilizar os usuários no sentido de agirem de acordo com as orientações das operadoras dos serviços. Essa sensibilização é conseguida com a eficácia desejada pela comunicação publicitária, que conta com renovação constante de suas mensagens, além de mobilizar emoções e acionar sensações que geram mudanças de atitudes.

Em qualquer situação, deve ser perceptível para os usuários a existência de uma autoridade na operação do serviço para dar um significado de organização e confiança às ações implementadas. Isso é muito importante, hoje, diante da presença das redes sociais na vida cotidiana, pela sua capacidade de expor e disseminar qualquer tipo de ocorrência. Se existir um vácuo na comunicação por parte das operadoras de transporte coletivo, os canais virtuais de relacionamento ocuparão esse espaço com interpretações que podem distorcer a realidade.

Em síntese, seria muito oportuno, atualmente, que as empresas operadoras de transporte coletivo ampliassem significativamente seus programas de relacionamento, incorporando os mais variados meios de comunicação disponíveis, diante das novas atitudes e hábitos da sociedade contemporânea. Ao mesmo tempo, a capacitação dos empregados deve acompanhar essas mudanças para que eles possam atuar de forma eficiente e eficaz nas mais diversas situações. É importante lembrar que o empregado que atua diretamente na operação do serviço, pelo contato direto com os usuários, é o representante oficial da empresa e, por consequência, da sua imagem e da imagem do serviço público por ela prestado.

Vale salientar que os esforços das operadoras e gestoras devem sempre ser explicitados para seu público e toda ação, no atual momento, encontra um ambiente propício, já que, na visão dos usuários, o setor de transporte coletivo passa por um momento de dinamismo e evolução com a expansão e modernização de diversos sistemas.

Além do reconhecimento de que, mesmo com as dificuldades apontadas, a situação atual é melhor do que há sete ou oito anos, os resultados da pesquisa mostram que, na metrópole de São Paulo, os usuários estão otimistas e esperançosos de que terão melhores serviços de transporte coletivo no futuro. Poder atuar num momento tão favorável é uma oportunidade que não deve ser negligenciada pelas operadoras e gestoras de transporte coletivo da Região Metropolitana de São Paulo.

13

Fontes e apoio:

ALMEIDA, Ronaldo; D' ANDREA, Tiarajú ; DE LUCCA, Daniel. Situações periféricas: etnografia com-parada de pobrezas urbanas. Novos estudos - CEBRAP nº82 São Paulo Nov. 2008.

FOUCAULT, Michel. Segurança, Território e População (Curso no Collège de France- 1977-1978).

HIRATA, Daniel Veloso. Sobreviver na adversidade: entre o mercado e a vida –v. 1. - Universida-de de São Paulo, FFLCH- Departamento de Sociologia, Programa de Pós-graduação em Sociologia, São Paulo, 2010.

PESQUISA DE IMAGEM DOS TRANSPORTES NA RMSP. Relatório da Pesquisa Qualitativa de 2010. ANTP e Toledo Associados, setembro 2010.

SIMMEL, Georg. As grandes cidades e a vida do espírito. Mana, vol.11, n. 2, 2005.

14