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CAPA

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I. APRESENTAÇÃO ..................................................................................3

1. OBJECTIVOS GERAIS DO PROGRAMA .............................................................3 2. ESTRUTURA DO CADERNO ............................................................................4 3. PROGRAMA DA CADEIRA ..............................................................................5

II. PROGRAMA TEÓRICO....................................................................7

PARTE I - EMERGÊNCIA DO PENSAMENTO SOCIOLÓGICO...........................................................................................8

INTRODUÇÃO....................................................................................................8 CAPÍTULO 1 - TEORIA SOCIAL CLÁSSICA .......................................................15

1. Competências a adquirir.......................................................................15 2. Conceitos prévios ..................................................................................15 3. As ideias ................................................................................................16 4. Autores e obras......................................................................................22 5. Exercícios de controlo...........................................................................34

CAPÍTULO 2 - A FILOSOFIA DA CIÊNCIA SOCIAL ............................................35 1. Competências a adquirir.......................................................................35 2. Conceitos prévios ..................................................................................36 3. As ideias ...............................................................................................37 4. Autores e obras......................................................................................43 5. Exercícios de controlo...........................................................................48

PARTE II - A PLURALIDADE PARADIGMÁTICA .................50

INTRODUÇÃO..................................................................................................50 CAPÍTULO 3 – TEORIA CRÍTICA, MARXISMO E NEO-MARXISMO.....................61

1. Competências a adquirir.......................................................................61 2. Conceitos prévios ..................................................................................63 3. As ideias ................................................................................................64 4. Autores e obras......................................................................................72 5. Exercícios de controlo...........................................................................72

CAPÍTULO 4 -TEORIAS DA ACÇÃO E DA PRAXIS .............................................73 1. Competências a adquirir.......................................................................73 2. Conceitos prévios ..................................................................................74 3. As ideias ................................................................................................74 4. Autores e obras......................................................................................82 5. Exercícios de controlo...........................................................................82

CAPÍTULO 5 – TEORIA DOS SISTEMAS ............................................................83 1. Competências a adquirir.......................................................................83 2. Conceitos prévios ..................................................................................85 3. As ideias apresentadas no manual .......................................................85 4. Autores e obras....................................................................................101 5. Exercícios de controlo.........................................................................103

CAPÍTULO 6- INTERACCIONISMO SIMBÓLICO................................................104 1. Competências a adquirir.....................................................................104 2. Conceitos prévios ................................................................................104 3. As ideias ..............................................................................................105

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4. Autores e obras....................................................................................116 5. Exercícios de controlo.........................................................................116

CAPÍTULO 7 - TEORIA DA ESCOLHA RACIONAL "TER"................................117 1. Competências a adquirir.....................................................................117 2. Conceitos prévios ................................................................................118 3. As ideias ..............................................................................................118 4. Autores e obras....................................................................................124 5. Exercícios de controlo.........................................................................124

CAPÍTULO 8- SOCIOLOGIA DO TEMPO E DO ESPAÇO.....................................125 1. Competências a adquirir.....................................................................125 2. Conceitos prévios ................................................................................126 3. As ideias ..............................................................................................127 4. Autores e obras....................................................................................133 5. Exercícios de controlo.........................................................................134

V. BIBLIOGRAFIA ................................................................................135

A. Bibliografia complementar .................................................................135 B. Bibliografia para o estudo do pensamento dos fundadores da sociologia:...............................................................................................135 C. Outra bibliografia em português........................................................135 D. Bibliografia em língua inglesa ...........................................................136 E. Dicionários e obras de consulta geral................................................136 F. Bibliografia técnica de estudo ............................................................137

VI. TESTES FORMATIVOS ..............................................................138

TESTE FORMATIVO N .º1...............................................................................138 TESTE FORMATIVO N .º2...............................................................................144 SOLUÇÕES ....................................................................................................151

Teste n.º 1 ................................................................................................151 Teste 2 .....................................................................................................152

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I. APRESENTAÇÃO

Nota de abertura Este caderno de apoio foi criado para dar apoio à disciplina de Teorias Sociológicas Contemporâneas da Universidade Aberta. Nesta cadeira foi adoptado como manual obrigatório: TURNER, S. Bryan, ed. - Teoria social, Algés, Difel Difusão Editorial, S.A., 2002, 534pp. O presente Caderno é constituído por um conjunto de textos que, se destinam a apoiar o aluno de ensino a distância no seu estudo individual do programa de TSC. Não substitui, em caso algum, o referido manual cuja leitura é indispensável. Dado ser um caderno de apoio não incide sobre a totalidade do manual, mas apenas sobre os capítulos que integram o programa da cadeira. Estes correspondem aos capítulos 1,2,3,4,5,8,9,e13 do referido manual. Assim, Para comodidade de identificação das matérias, os títulos dos capítulos deste Caderno são os mesmos dos capítulos mencionados do manual, e correspondem à totalidade do programa da cadeira. Os capítulos apresentados no manual adoptado que não são mencionados no caderno não serão objecto de avaliação, pelo que o aluno deve dar-lhes a importância que entender.

1. Objectivos gerais do programa A. Do ponto de vista atitudinal - Aquisição de uma atitude que entenda que a natureza do social se exprime pela diferença e pela diversidade. - Aquisição de uma atitude que encare a Sociologia no âmbito de outras ciências com as quais deve colaborar em diálogo interdisciplinar. - Aquisição de uma atitude indagadora e crítica face ao objecto de estudo da Sociologia. - Aquisição de uma atitude que privilegie o diálogo, discussão, cooperação e trabalho de equipa na produção de conhecimentos científicos. - Aquisição de uma atitude que permita o respeito pela diferença de opiniões mas promova a afirmação desinibida das ideias próprias e sua fundamentação.

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- Aquisição de uma vontade de fazer sempre melhor. Desenvolvimento do interesse e gosto pela qualidade. B. Do ponto de vista dos conteúdos - Aquisição de um conhecimento global sobre o pensamento sociológico, nomeadamente: grandes propostas teóricas, principais conceitos, clivagens e debates. - Aquisição de conhecimentos gerais acerca das principais correntes de pensamento sociológico, confrontos e semelhanças. - Aquisição de um conhecimento geral acerca dos principais autores da sociologia sua biografia e principal bibliografia.

2. Estrutura do caderno Cada um dos capítulos do programa de Teorias Sociológicas Contemporâneas é tratado neste caderno através de 5 items com a seguinte ordem: 1. Competências a adquirir Onde, se indica ao aluno o que se espera dele e o que se entende legítimo perguntar-lhe para fins de avaliação, relativamente a cada capítulo. Os objectivos são enunciados exaustivamente e em forma de tópico. Em situação de avaliação, não cabe perguntar quaisquer outros assuntos que não tenham sido referidos nesta secção. 2. Conceitos prévios Nesta secção referem-se os conceitos das ciências sociais, que o aluno necessita conhecer previamente para compreender este capítulo. Deve começar por fazer uma identificação desses conceitos, e certificar-se de que já os conhece e se recorda com clareza dos conteúdos a que se referem. Em caso de dúvida, não leia o texto sem esclarecer o conteúdo dos mesmos conceitos. (Por exemplo socorrendo-se de um dicionário de ciências sociais ou de um manual de sociologia). 3. As ideias Aqui são apresentados os conteúdos teóricos da cadeira. Geralmente esta secção inicia-se com uma introdução e tem uma segunda parte com uma síntese das

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ideias apresentadas no manual. Esta síntese não é um resumo do manual nem dispensa a sua leitura. 4. Autores e obras. Sempre que a informação for considerada de relevãncia para o programa em estudo, são aqui apresentados dados biográficos e bibliográficos dos principais autores estudados no capítulo. 5. Exercícios de controlo Para ter a certeza de que realiza bem as suas leituras deverá acompanhar o seu estudo de exercícios sobre os textos que lê. Os exercícios que aqui são apresentados embora não se destinam a avaliação devem ser realizados pelo aluno, individualmente ou em grupo. O assistente responderá a quaisquer dúvidas que possam surgir na sua realização. As respostas correctas às questões formuladas estão todas contidas no texto do manual da cadeira ou no texto aqui apresentado e, constituem o nível mínimo exigido para obter aprovação na disciplina de Teorias Sociológicas Contemporâneas. Se o aluno após leitura do respectivo texto tiver dificuldade em realizar os exercícios, deve reler o texto, trabalhá-lo melhor e, eventualmente, pedir ajuda, pois essa situação indica-lhe que não está suficientemente preparado na matéria.

3. Programa da cadeira Estabelecer um programa de teoria sociológicas contemporâneas pressupõe que se estabeleça à partida um critério de delimitação da época contemporânea o que por si não é tarefa simples. Por Época Contemporânea entendo, neste caso, o período que se inicia na década de 20 do século XX e vem até aos nossos dias. Dada a provável discordância que pode ser suscitada em torno desta periodização apresento os critérios que considero pertinentes para a delimitação temporal que escolhi: Em primeiro lugar utilizo o termo “contemporâneo” para estabelecer a diferença com “clássico”. Entende-se por pensamento clássico aquele que se refere à fundação da sociologia. Geralmente designam-se os autores que empreenderam a tarefa de estabelecer o estatuto científico da sociologia como “pais fundadores”. Nesta categoria é comum incluir Augusto Comte, Herbert Spencer, Emile Durkheim,

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Max Weber, Georg Simmel e Karl Marx, entre outros, todos pertencentes a gerações do século XIX e princípio do século XX. Estes autores, como facilmente se constata pela abundante bibliografia em língua portuguesa versando esse período, estabeleceram os fundamentos da disciplina enquanto domínio científico particular e, formularam as grandes questões que viriam a dominar o pensamento sociológico. Essas grandes questões prendem-se naturalmente com a época histórica em que viveram e as suas características particulares. Sendo assim, poderemos afirmar que o pensamento sociológico foi enformado pelas questões decorrentes do surgimento do capitalismo, da industrialização e do desenvolvimento da burocracia moderna no mundo ocidental. Em rigor, praticamente todas as abordagens teóricas da história da sociologia se desenvolvem em torno desses temas. As atitudes intelectuais dominantes são: Encontrar soluções para a manutenção do sistema e minoração dos seus problemas ou, criticar esse sistema atribuindo-lhe a responsabilidade pelas dificuldades e conflitos sociais entretanto criados. A sociedade capitalista inicial ou avançada, os problemas do industrialismo e da consequente urbanização do espaço, os conflitos de interesses em torno da produção e distribuição do rendimento, os problemas políticos de governo e harmonização de interesses numa sociedade capitalista, a emergência de fenómenos demográficos próprios da evolução do capitalismo ocidental, as transformações nas culturas e nas relações sociais próprias das sociedades em rápida transformação, etc., têm sido o objecto de estudo da sociologia. Esta é portanto uma ciência dedicada ao estudo da sociedade ocidental por excelência. Ora, quando passamos em revista a produção teórica sociológica devemos ter em mente a própria evolução da sociedade ocidental como critério de organização das produções teóricas. Foi precisamente tendo em conta o conjunto de fenómenos que, são considerados como marcando o final político e social do século XIX, (e portanto a época clássica sociológica ou época fundacional) que estabeleci o critério de definição da contemporaneidade em termos de produção teórica sociológica. Tendo em conta que a Primeira Guerra Mundial terminou em 1919, a Revolução Russa ocorreu em 1917, Max Weber faleceu em 1920 e A grande Depressão que constituiu um ponto de viragem na história do capitalismo se deu em 1929, estabeleço como época contemporânea aquela que se segue a estes acontecimentos. Assim estabeleço para referência de mudança entre o “longo século XIX” e o “ curto século XX”, (Hobsbowm) a década de vinte do século XX. Considero teorias clássicas as anteriores à morte de Max Weber e contemporâneas as posteriores. Sei que outros critérios podem ser adoptados mas este parece-me conter uma pertinência suficiente para justificar a escolha.

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II. PROGRAMA TEÓRICO I - Emergência do Pensamento Sociológico Capítulo 1 - Teoria Social Clássica Capítulo 2 - A Filosofia da Ciência Social II - A Pluralidade Paradigmática Capítulo 3 – Teoria Crítica, Marxismo e Neo-marxismo Capítulo 4 – Teorias da Acção e da Praxis Capítulo 5 – Teoria dos Sistemas Capítulo 6 – Interaccionismo simbólico Capítulo 7 – Teoria das Redes e Teoria da Escolha Racional Capítulo 8 – Sociologia do Tempo e do Espaço

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Parte I - EMERGÊNCIA DO PENSAMENTO SOCIOLÓGICO

Introdução O pensamento do social não teve origem na sociologia. Desde as mais remotas idades que o homem questionou o social. Pensamento sociológico não é o mesmo que pensamento do social. Aquele, constitui uma maneira nova e distinta de delimitar e questionar o social que já tinha sido interrogado por outras disciplinas. Trata-se de um olhar "específico", "particular", de uma maneira diferente de problematizar o social. Daí a importância de distinguir previamente os conceitos de social e de sociológico. O social reporta à esfera do real enquanto que, o sociológico reporta à esfera do conceptual. Estas esferas são distintas e não podem substituir-se mutuamente. Com o social estamos ao nível do homem e da vida, com o sociológico estamos ao nível de "pensar, perspectivar, questionar, discutir e conceptualizar" esses fenómenos "reais" da vida humana. Do ponto de vista epistemológico o social faz parte do objecto enquanto o sociológico faz parte da imagem e do sujeito. Se a sociologia é um modelo particular de problematizar o social, então podemos afirmar que ela não existiu antes do século XIX, pois antes de meados desse século ninguém pensou ou problematizou o social segundo esse ângulo particular. Não foi por acaso, que no século XIX, o homem começou a pensar o social mediante novos critérios. Esse período foi marcado por mudanças nos modos de vida e organização das sociedades. Toda a Europa parecia abalada nas suas mais sólidas e duradouras estruturas após o conjunto de revoluções políticas que se iniciaram em 1789 com a Revolução Francesa. Todos os períodos de transição causaram incomodo aos que neles viveram. Toda a perda de referências faz supor que se caminha para o caos. Por maioria de razão, assim deve ter acontecido com maior intensidade, aos homens que protagonizaram o maior conjunto de alterações dos modos de vida desde o Neolítico até essa data: a Revolução Francesa, que destruiu o equilíbrio político e social, a Revolução Industrial, que destruiu o equilíbrio económico e também social, a Revolução Científica que caminhava a passos largos, e que destruiu o equilíbrio mental e intelectual.

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A sociologia nasceu pois num contexto revolucionário e, mais como reacção de temor pelas consequências da mudança do que pelo fervor revolucionário. Face à "desordem" revolucionária, homens provenientes da Engenharia, desejaram utilizar os seus conhecimentos positivos para restaurar a ordem social. Tendo percebido que a mudança social em curso não era irreversível, os positivistas sociológicos tentaram criar uma "ordem científica", "positiva" que constituísse uma nova base de reorganização social. Comte e Durkheim fundaram uma sociologia da" ordem e do progresso" assente, precisamente, na sua grande preocupação com a desordem e a estagnação social. A Revolução Industrial foi o acontecimento que mais directamente contribuiu para dar à sociologia a sua especificidade. Produzindo transformações em série, desde o êxodo rural, à proletarização das cidades e ao estabelecimento de grandes burocracias e serviços necessários à sociedade industrial, gerou também marginalidade social, conflito, alteração súbita de normas, movimentos migratórios, miséria e acumulação de grandes riquezas em simultâneo. Karl Marx, Emile Durkheim, Max Weber e Georg Simmel, dedicaram toda a sua vida ao estudo dos problemas sociais do século XIX, gerados pela nova situação industrial. Estes sociólogos tornaram-se deste modo, os pais fundadores da nova disciplina científica e nomotética: a ciência positiva a que Comte deu o nome de sociologia em 1830, no seu Cour de philosophie positive. As principais correntes clássicas da sociologia incluem: O positivismo que se refere-se à análise científica dos objectos reais, em função da convicção epistemológica de que é possível conhecer "objectivamente" o real ou seja, conhecê-lo "tal como ele é" sem interferências necessárias do sujeito, logo, sem " subjectividade". O pensamento científico positivo opõe-se desde logo ao pensamento filosófico negativo. O funcionalismo e o organicismo originais, que estabelecem uma analogia entre a sociedade e os organismos, e explicam a interacções entre as pessoas como resultado do desempenho de funções próprias do sistema social o qual se impõe coerciva e inconscientemente aos indivíduos. A sociologia histórica e o estudo da autoridade burocrática, caracterizado pela atribuição de uma especificidade própria aos fenómenos humanos (diferentemente dos físicos e naturais) e uma intencionalidade racional nas acções.

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O marxismo na sua formulação original que acentua o papel do conflito na teleonomia da história. Como se pode verificar desde o século XIX e portanto, da sua criação, a sociologia foi marcada pela diversidade de pontos de vista que correspondiam a outros tantos objectivos políticos e sociais. Se qualquer dos seus fundadores quis contribuir para a constituição de uma ciência objectiva, cada um deles, à sua maneira, projectou as suas esperanças no modo como concebeu o social: Marx, como outros socialistas anti-liberais, concebeu as relações humanas marcadas pela mudança teleonómica em direcção ao comunismo e por isso, na revolução e na luta de classes, viu escrita uma página indispensável do progresso humano que convinha potenciar e acelerar, já que o destino do homem era inexoravelmente o comunismo e a sociedade sem classes que se seguiriam ao capitalismo. A sua proposta política e social correspondente a esta leitura da história humana pode ser resumida pelo mais conhecido dos panfletos já produzidos: " O manifesto do Partido Comunista" e a palavra de ordem "proletários de todo o mundo uni-vos!". Ao contrário, outros fundadores tais como Weber ou Durkheim, eram anti-socialistas. Não concebiam a revolução como um estádio necessário do desenvolvimento humano mas, como um mal desnecessário causa mudança súbita e excessiva. Empenharam-se por isso, com a reconstituição da ordem social, tentando estudar a fundo todos os factores que a pudessem conservar e, "pregando" um moralismo social conservador. A sua palavra de ordem face aos problemas do Capitalismo, não foi " revolução" mas sim "reforma". Temendo igualmente capitalismo e marxismo, deram início a uma história teórica da sociologia muitas vezes escrita por reacção ou resposta, quer ao marxismo quer a outras correntes. Também entre si não existia uma conformidade de pontos de vista. A sociologia foi pois, marcada desde a sua fundação pela diversidade e conflitualidade teórica. Mas foi também muito especialmente marcada pelo espírito “cienticista” da época.

A importância do espírito científico A ciência do século XVIII viveu fascinada pela sua própria evolução. Deslumbrada pela biologia criou novos mitos naturalistas em todos os domínios acreditando que a vida poderia ser gerada pela electricidade recém descoberta e, que os metais poderiam nascer, morrer e adoecer tal como os organismos.

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(LALOUP, Jean,1966, capítulo I). Ao contrário, Lavoisier, Pasteur e Claud Bernard, mostrarão que " não é a vida que explica a físico-química, mas a físico-química que explica a vida." ( LALOUP, 1966, 178). O século XIX foi marcado pela superação dos últimos resquícios mitológicos do passado e pelo domínio definitivo do quantitativo sobre o qualitativo na explicação dos fenómenos. A ciência depois de Newton e Leibniz rege-se pelo Cálculo e abandona as noções qualitativas. O determinismo impõe-se como base epistemológica da ciência e os cientistas não cessam de procurar descobrir as regularidades do comportamento dos fenómenos físicos e químicos. A alquimia transforma-se em química definitivamente. Não se procuram substâncias, procuram-se relações quantitativas objectivamente observáveis. Este espírito matemático e científico irá estender-se a todas as ciências sem excepção para a sociologia. Mas não basta a expressão matemática para definir o estatuto científico de uma forma de pensar. A cienticização da sociologia pressupõe uma observação sistemática e controlada dos fenómenos. Pressupõe a experimentação como método de observação empírica, o único que garante a positividade, isto é, a " prova dos factos". Aliás só a "prova dos factos" garante a objectividade que é mais um dos pilares estruturantes do pensamento científico. A observação controlada garante o sucesso da vigilância epistemológica sobre preconceitos, crenças distorcidas, interesses e ideologias. Por isso ela é a pedra basilar do pensamento científico. Garantindo a objectividade por via metodológica e epistemológica, o trabalho do cientista resume-se à procura das leis gerais que regem os fenómenos. A acumulação de experiências registadas e expressas matematicamente permite formular hipóteses, que pela via indutiva ampliem os conhecimentos. Essa é de facto a génese de todas as leis científicas, que concatenadas darão origem a teorias e modelos explicativos do real. Eis a herança científica da sociologia. A sociologia do século XIX vive o espírito do século, é cienticista. Acredita no progresso da espécie humana através da instauração de um governo científico de toda a vida humana e faz da ciência a nova religião com a sua moral particular. É valorativa e acredita que pode conhecer a verdade uma vez que o seu objecto é cognoscível. Cuin mostra isto ao citar Saint-Simon, ideólogo do socialismo e da revolução na sua História da sociologia (CUIN, 1995, 23): " Ora qualquer nova acção resultante de uma experiência desse tipo só pode ser classificada como boa ou má a partir das observações feitas sobre os seus resultados.". O desenvolvimento da sociologia foi também marcado pelas diferentes Histórias nacionais e reflecte a evolução da sociedade Europeia. Destaca-se o desenvolvimento da sociologia em França e na Alemanha.

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A sociologia francesa, as Luzes e a Revolução. Sendo a Revolução Francesa o triunfo da burguesia e o fim do Antigo Regime, ela foi sustentada pela Filosofia das Luzes, liberal e progressista, destruidora de todas as concepções orgânicas da sociedade e emancipadora da ideia de indivíduo. O modelo de entendimento do social passou a ser orientado pela mecânica com base na divisão do trabalho e nas relações inter-individuais de tipo racional. Os teóricos do "direito natural" levaram a uma primeira separação entre a sociedade e o Estado o que constituiu o primeiro golpe no corpo orgânico tradicional. Foi a separação entre a economia e a política. O contrato social torna-se a pedra de toque do pensamento político e leva á criação de uma consciência social acerca do poder: este não tem origem divina mas sim humana e social. Resulta da negociação. Por outro lado a desigualdade social passa a ser entendida como o resultado da divisão do trabalho e das diferenças na propriedade e não da divisão social orgânica medieval em estados. Entre as contribuições da filosofia das Luzes para a sociologia destaque-se a elaboração dos conceitos de sociedade civil, sociedade e cultura. Foi igualmente determinante a ideia de progresso que permitiu apoiar as ideias evolucionistas. Também o estudo dos povos selvagens proporcionado pelas descobertas e amplamente cultivado durante o século XIX permitiu acelerar o desenvolvimento de ideias relativistas. As teorias sobre o homem natural e o bom selvagem estimularam os estudos comparativos entre sociedades. Estes estudos baseados na observação e não na especulação ajudaram a promover uma autonomização do pensamento do social, em relação à reflexão filosófica. Por outro lado a geração tardia de iluministas, tais como Rousseau (1712-1778) e Montesquieu (1689- 1755) tratou os grandes sistemas abstractos dos iluministas da primeira geração, tais como Descarte (1596-1650) Hobbes (1588- 1679) e Locke (1672-1704) e procurarou uma aproximação ao real e uma análise crítica do mundo. O iluminismo generalizou a crença de que a evidência científica deveria constituir o critério supremo da verdade, e que a razão e a experiência, na linha do positivismo Newtoniano, poderiam proporcionar o controlo do mundo. Esta concepção foi directamente transferida para a sociologia francesa e protagonizada por Comte e Durkheim no que se chamou o positivismo sociológico. Em todo o caso a sociologia francesa foi, desde logo, marcada pelo pensamento anti-iluminista e pela filosofia contra-revolucionária católica

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representada por Bonald (1754-1840) e Maistre (1753- 1821). Assim, duas tendências filosóficas marcaram o pensamento sociológico francês. No quadro que se segue aparecem sintetizadas por Ritzer, as principais clivagens intelectuais significativas para a sociologia francesa deste período.

Filosofia das luzes Filosofia contra-iluminista 1. Ênfase nos fenómenos individuais Ênfase na sociedade 2. Psicologia e comportamento individual como principais objectos de reflexão.

2. Sociedade como principal unidade de análise e como "produtora" dos indivíduos através do processo de socialização.

3. Indivíduo como sendo o elemento básico da sociedade.

3. Papeis, posições sociais, relações sociais, estruturas e instituições como elementos básicos da sociedade.

4. Indivíduos como dando origem ao social munidos da sua liberdade de afirmação diferenciada.

4. Inter-relação necessária entre as partes que constituem uma sociedade. Qualquer mudança numa parte afectará todas as outras.

5. Ruptura com as instituições tradicionais vista como desejável

5. Ruptura institucional vista como causa de sofrimento e desordem. Ruptura visto como desnecessária.

6. Tendência para analisar os efeitos negativos das instituições

6. Tendência para analisar componentes sociais de larga escala e menosprezar os efeitos sociais daí decorrentes

7. Grande importância dada aos aspectos macrossociais e aos individuais.

7. Pequenas unidades sociais tais como famílias, vizinhanças etc. considerados essenciais para os indivíduos e a sociedade.

8. Mudança social e modernização industrial e urbana desejáveis e vistas como fonte de progresso.

8. Mudança social. Industrialização e urbanização vistas como fontes de disfunções sociais.

9. Ênfase na importância da racionalização da vida social.

9. Ênfase nos factores não racionais da vida social tais como, ritos e cerimoniais por exemplo.

10. Apologia da igualdade. 10. Afirmação da necessidade de existência de uma hierarquia social que promova diferenciações de status e de remunerações.

Augusto Comte e Émile Durkheim são os mais destacados representantes sociólogos franceses desta época. Para ter acesso a uma pequena síntese do seu pensamento e das suas principais contribuições para a sociologia, leia o ponto 4. Autores e obras, deste capítulo.

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A sociologia alemã O desenvolvimento da teoria sociológica em França levou ao desenvolvimento de outros pensamentos sociológicos fora das fronteiras desse país. O pensamento sociológico alemão foi fragmentado desde o princípio tendo como principais eixos estruturantes os trabalhos de três proeminentes cientistas, Karl Marx, Max Weber e Jeorg Simmel. Geralmente, acerca da sociologia alemã falamos de pensamento marxista e pensamento não marxista, que veremos adiante. Em conclusão, o século XIX estabeleceu a sociologia como disciplina científica distinta de outras ciências. Os estudos clássicos incidiram sobre as questões do capitalismo e seu desenvolvimento nomeadamente: Algumas correntes, como o funcionalismo consideraram o capitalismo industrial positivo e pretenderam apenas melhorá-lo e aperfeiçoá-lo minimizando as suas “patologias sociais”. Autores como Marx consideraram o capitalismo destinado a desaparecer dada a gravíssima injustiça e desequilíbrio da sua natureza. A verdade é que interessante ou não, forte ou susceptível à sua própria autodestruição, o capitalismo do século XIX veio a transformar-se radicalmente depois do período de ruptura que foram as duas primeiras décadas do século XX. O capitalismo não desapareceu mas transformou-se, robusteceu-se, adaptou-se e veio a impor-se totalmente na época contemporânea. De tal forma que a teoria sociológica não pôde abandonar as grandes questões clássicas que lhe deram origem. Ela teve de continuar a escrever precisamente sobre a realidade social dominante: o capitalismo. As suas consequências e os seus problemas. Teve apenas que retomar as grandes questões que preocuparam os seus fundadores mas, agora re-enformadas pela evolução do sistema e as novas realidades, ampliadas pelas novas extensões dos problemas. Entre esses problemas incluem-se: Problemas ligados às migrações e às relações entre géneros e raças, problemas ligados às grandes rupturas e à mudança social acelerada, à escala ampliada da guerra, á predominância da ideologia ou o seu fim, à superação do industrialismo e surgimento da sociedade global de informação, aos conflitos civilizacionais, marginalidade, delinquência e todos os tipos de tráfico, acentuação das clivagens sociais e pauperização de grande parte da humanidade, problemas ecológicos em escala capaz de os transformar em problemas mundiais etc.

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Capítulo 1 - Teoria Social Clássica

1. Competências a adquirir Depois de completar o estudo deste capítulo deverá ser capaz de:

- Explicitar a que se refere a expressão "Teoria Social Clássica". - Localizar a sua produção no tempo e no espaço. - Relacionar a Teoria Social Clássica com acontecimentos históricos

relevantes. - Conhecer os principais temas e conceitos a que a teoria se refere,

nomeadamente dicotomias. - Identificar os principais autores da Teoria Social Clássica e seus

principais contributos, nomeadamente oposições e disputas. - Conhecer a bibliografia mais importante deste período.

2. Conceitos prévios Antes de começar a sua leitura verifique se conhece os conteúdos dos seguintes conceitos: Capitalismo Industrialização Secularização Individualismo Racionalismo Burocracia Urbanização Democracia Utilitarismo Contrato social Sociedade Natureza Determinismo Livre arbítrio Estrutura Acção social Modo de produção Classe social Superstrutura

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Infra-estrutura

3. As ideias Ideias apresentadas no manual Para o estudo deste capítulo deve ler a Introdução e o Capítulo 1 do manual (páginas 1 a 49). O manual desenvolve uma perspectiva que vai para além das teorias sociológicas considerando também as teorias sociais, especialmente a sociedade moderna. Abarca por isso, teoria política, sociologia, feminismo e análise da cultura. Tratando essencialmente da sociedade moderna, começa por distinguir " que "comunidade natural" de sociedade industrial. A primeira é determinada pela tradição e pela satisfação tradicional ou convencional de desejos e necessidades, enquanto a segunda é uma forma revolucionária, única e não natural de lidar com desejos e necessidades. Acerca desta maneira única e revolucionária de viver iniciada na época moderna, vários autores desenvolveram modelos de leitura e explicação: Marx falou da criação artificial da economia, Tönnies distinguiu comunidade de sociedade. Um grande conjunto de conceitos, baseados em oposições, foi formulado para distinguir a nova realidade relativamente ao passado tradicional: Sagrado e profano, indivíduo e sociedade, autoridade e poder, status e classe social, e sobretudo a já referida, comunidade e sociedade. O campo de estudo da sociologia e da antropologia clássico definiu-se durante a época industrial e foi desenvolvido por distinção em relação à economia. Assim, o estudo do social clássico centrou-se essencialmente nos valores, acções não racionais, problema da ordem e da competição ao nível institucional, religião, temas e abordagens que podem ser representadas em grande medida pelo pensamento de Talcott Parsons. Já o pensamento contemporâneo, pós-industrial, aderiu a uma concepção diferente do social especialmente marcado pela incerteza quanto à natureza da sociedade contemporânea. O social passa a ser identificado como o cultural. O período pós-moderno, por sua vez, anuncia o fim do social provocado pela ascensão dos meios de comunicação modernos que teriam levado à implosão do social sobre si mesmo. O Declínio da teoria social? A sociologia clássica apareceu com base numa concepção forte do social como distinto de outras esferas da acção humana. Desenvolveu um importante

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programa de investigação empírica, programa esse que foi especialmente importante na sociologia americana embora tenha também existido uma visão da teoria como sistema lógico-dedutivo. Refira-se o nome de Hempel. Na sociologia contemporânea dominou o ponto de vista de que a sociologia se deve mover de proposições gerais para a operacionalização de conceitos.1São disto exemplos, os trabalhos de Merton e de Jonathan Turner. A antropologia cultural afastou-se da sociologia ao e rejeitar, em gera, o recurso a esquemas conceptuais gerais e universais, tendo enveredado pelo relativismo e desenvolvido métodos centrados na descrição de singularidades etnográfica e aproximando-se do pós-modernismo sociológico que perdeu a confiança nos grandes desenvolvimentos teóricos assentes na generalização. Assim, actualmente, desenvolvem-se duas linhas no capo da sociologia: teoria a escolha racional, na tradição da teoria forte e generalizável, e pós-modernismo assente no paradigma fraco da teoria social. Continuidade e acumulação na teoria social Poucas escolas sociológicas tiveram continuidade ao longo do século XX e mesmo aquelas que tiveram, como o marxismo, foi uma continuidade mal sucedida pois foi caracterizada por divisões profundas ao longo das gerações. A teoria sociológica, à excepção do que se passou na teoria da escolha racional e no interaccionismo simbólico, deve pois ser considerada pela sua fragmentação, mais do que pelo seu crescimento contínuo. Aquelas teorias, embora com fragmentações partilham todas os mesmos pressupostos básicos. Isto parece explicar em parte o sucesso do seu desenvolvimento, mas a análise histórica mostra também que o desenvolvimento de uma continuidade teórica é devedor de boas condições institucionais. Principais problemas da teoria social Dificuldade em resolver o problema das dicotomias: Explicação e interpretação. Acção e praxis, Acção e estrutura, Micro e macro, Indivíduo e sociedade. Perspectivas da teoria social

1 Para melhor compreenção do que e entende por operacionalização de conceitos, consulte a seguinte obra, especialmente o capítulo construção do modelo de análise (pg. 107 a 154): QUIVY, Raymond e CAMPENHOUDT, Luc Van – Manual de investigação em ciências sociais, Lisboa, 2 ª ed. Gradiva, 1998, 282 pp.

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A história da sociologia mostra que o sucesso teórico está ligado ao comprometimento da teoria com a investigação empírica. As questões políticas, guardado o cuidado do aviso de Weber para o não envolvimento, parecem ser factor de sucesso das teorias sociológica nas sociedades contemporâneas, nomeadamente o estudo dos principais problemas actuais, a saber: pobreza e desigualdade, papel de mulher na sociedade, cidadania e direitos humanos, sociologia médica, poluição e ambientalismo, modernidade, transformação da identidade, incerteza. Importa ainda ter presente que tem permanecido no campo sociológico o conflito entre a sociologia americana e a sociologia europeia, iniciada com os trabalhos de Parsons nos anos 30 e a migração da Escola de Frankfurt para a América, na IIGM. Relativamente às perspectivas contemporâneas é ainda necessário ter em conta a dimensão moral da teoria social. A sociologia foi marcada À nascença pela preocupação moral com a vida social, de forma pessimista quanto às mudanças revolucionárias, que se pensava, podiam destruir o tecido social. A preocupação moral mão está excluída do pensamento actual. As novas questões morais colocam-se em relação aos novos problemas desencadeados pelo uso da tecnologia e a intervenção no corpo humano, capazes de provocar grandes transformações na identidade humana. Origens/ teoria social clássica/ introdução O termo sociologia surgiu no século XX com Parsons. Referia-se ao estudo científico da sociedade industrial. Inaugurou o chamado período clássico também desenvolvido por Durkheim, Saint-Simon, Simmel, Toqueville e Weber. O período clássico termina com a morte de Weber em 1920. Durante essa fase a teoria sociológica autonomizou-se da filosofia e desenvolveu o seu programa teórico com base no estudo da Revolução Francesa e da Revolução Industrial. Foram essencialmente estudados os processos de urbanização e desenvolvimento do capitalismo e do industrialismo, a secularização da sociedade e o desenvolvimento da burocracia moderna. a sociologia desenvolveu-se tanto na Europa como os Estados Unidos mas de formas diversas teoria sociológica foi construís a partir da tensão entre valores tradicionais e valores modernos e usou generalizadamente as dicotomias que serviram precisamente para ilustrar essa tensão. Teoria a sociedade As principais contribuições da Teoria Social clássica foram.

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Distinção entre Natureza e Cultura, Distinção entre livre arbítrio e determinismo, Distinção entre estrutura e acção. Karl Marx Desenvolve uma teoria estrutural determinista considerando que a estrutura domina a acção individual. A estrutura é caracterizada por relações de classe associadas a modos de produção. Assim é a economia, (modo de produção) que explica as relações sociais. Na sociedade do seu tempo, Marx considera que o modo de produção capitalista produz, ao nível das relações sociais, um antagonismo entre operários e capitalistas. Este tipo de relações caracterizado pela dominação da primeira classe pela segunda, inscreve-se "previsivelmente" no desenvolvimento do processo histórico materialista determinista e teleonómico que há-de conduzir à sociedade sem classes. Marx desenvolve o materialismo histórico em colaboração com Engels. O marxismo teve grande influência no pensamento sociológico, criando uma tradição de análise dinâmica da sociedade (mudança social e conflitos). A influência do marxismo em vindo a diminuir desde a última década do século XX após a queda da URSS. São as seguintes os principais fraquezas da teoria de Marx: - Não resolveu as relações entre estrutura e acção (agency), - Sobrevalorizou os aspectos ligados às bases materiais da acção social, - Deficiente explicação do problema da manutenção da ordem e coesão social, - Menosprezo pela importância da democracia, - Desprezo pelos factos de teor normativo. Durkheim Tem uma concepção estruturalista da vida social. Para explicar a estrutura social não recorre, como Marx, ao modo de produção mas às relações de solidariedade ou de ligação entre as pessoas. Constrói os conceitos de solidariedade mecânica e orgânica. Define o social e as regras de observação dos factos sociais (os factos sociais só são explicáveis por outros factos sociais), distingue sociedade de cultura. Critica o utilitarismo e o liberalismo económico pelo facto de tentarem eliminar a importância da necessária base normativa de constituição da sociedade. Considerava o interesse próprio insuficiente para o funcionamento da sociedade e defendia a existência de uma base moral nas relações sociais capazes de fazer funcionar o contrato social apoiado em bases legais (estas insuficientes para a coesão social). Explicou a interdependência social a par da diferença, por acção

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da principal instituição moderna, a divisão do trabalho que pode responder às necessidades de coesão social nas sociedades modernas. Estuda ainda o direito e os tipos de leis como enquadramentos legais para as bases não contratuais do contrato. Isto permitiu-lhe relacionar os elementos normativos da análise social relacionando instituições políticas, direito e solidariedade social. Durkheim veio a influenciar decisivamente o futuro pensamento sociológico, especialmente as sociologias estruturalistas que consideram a sociedade como um constrangimento esterno exercido sobre os sujeitos sociais. O pensamento de Durkheim evolui para evidenciar já não tanto a coacção que a sociedade exerce sobre os indivíduos mas os efeitos de assimilação das normas sociais permitidos pelos processos de socialização. Toqueville Considera a Revolução francesa acusa da grande transformação social da Europa do seu tempo. Visita os Estados Unidos e encanta-se com a democracia americana que lhe parece muito mais eficaz que as novas democracias revolucionárias da Europa. Recorrendo também ás dicotomias da época, construiu os conceitos de autoridade tradicionalmente do Antigo Regime dispersa e autoridade centralizada do Estado democrático moderno. Estuda o estado democrático e caracteriza-o em função e quatro aspectos: Carácter absolutizante ou totalizador, Base de apoio centrada nas massas, Centralização e Racionalização. Sendo o Estado democrático centralizador e totalizador, Toqueville considera-o a maior ameaça à liberdade individual e uma penetrante forma de poder sem precedentes. Segundo este autor, a tendência dos indivíduos para se remeterem aos seus interesses e à sua esfera privada iria ser acentuada pela existência do estado totalizador democrático e iria afastar os indivíduos do interesse público criando o individualismo e desencorajando a criação de instituições intermédias entre o indivíduo e o Estado que defendessem o primeiro do segundo. Ou seja, Toqueville identifica na Revolução Francesa um fermento para a privacidade individual e para o despotismo de Estado e propôs o reequilíbrio da relação indivíduo-Estado através de um conjunto de medidas tendentes a conferir aos indivíduos direitos de cidadania e a separar o poder judicial do legislativo, de modo a limitar a arbitrariedade do poder executivo. As principais falhas do pensamento de Toqueville têm sido apontadas como: - Fraqueza na explicitação da natureza e surgimento dos direitos de cidadania, -Não explicação das relações "promíscuas" entre os grupos poderosos e o aparelho de Estado.

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Max Weber Weber ao contrário dos autores anteriores não é um estruturalista mas um teórico da acção, acentuando o ponto de vista do actor e não o do grupo. Sofreu influência do romantismo e do idealismo alemães e considerou a acção social subordinada à cultura e não à estrutura social. Weber tentou desenvolver uma perspectiva multidimensional da acção para evitar a reificação de conceitos tais como, consciência colectiva, ou comunidade popular orgânica. Baseia a sua teoria numa epistemologia algo diferente da dos seus contemporâneos, influenciada por Kant e pelo idealismo, e colocando o sujeito cognoscente no centro da relação de conhecimento. Assim, preconiza a interpretação e a construção de sentido por parte da mente individual relativamente aos fenómenos que observa. Considera portanto que o sentido dos factos sociais é construído socialmente incorporando valores e interesses. Por isso, Weber postula que não é aceitável qualquer explicação da sociedade que exclua o sentido das acções relevantes dos actores envolvidos. Weber tenta também conciliar acção com estrutura. A concepção de estrutura liga-se ao conceito de "consequências não intencionais da acção". Esta concepção vê as principais instituições humanas como consequências e (e não causas) da acção humana. Nesse sentido assemelha-se a Marx que vê a estrutura como resultado da acção humana, mas difere dele ao interpretar a estrutura como resultado de uma acção imbuída de sentido, e não determinada pelas relações de classe próprias de cada modo de produção. Esta diferença pode ser vista na interpretação que ambos fazem do capitalismo moderno. Enquanto Marx o explica pela lógica económica do modo de produção, Weber explica-o pelos factores morais ligados ao espírito do protestantismo, e à racionalização do mundo ocidental, de que a esfera económica é apenas uma parte. Esse processo de racionalização, aos olhos de Weber domina toda a sociedade ocidental e, por consequência estende-se à administração, dando origem a poderosas burocracias que dominam sob a forma de constrangimentos as acções individuais. É assim que a estrutura se transforma num constrangimento externo aos indivíduos. O conceito de dominação burocrática legítima explica, portanto a ligação entre acção e estrutura. As principais fraquezas da teoria de Weber são: - As suas teorias da acção só fazem sentido no quadro da aceitação do individualismo liberal do século XIX, - A teoria social é construída com base do ideal do sujeito virtuoso, - Subvaloriza a capacidade da democracia e da cidadania reduzirem a dominação burocrática e a racionalização.

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4. Autores e obras Alexis de Toqueville Nasceu em Verneuil, França, em 1805 e faleceu em Cannes em 1859. Fez o liceu em Metz e estudou direito em Paris. Durante a Restauração, foi prefeito em vários departamentos e Juiz -Auditor em Versalhes. Entre 1831 e 1832, deslocou-se aos Estados Unidos para aí estudar o sistema penitenciário americano. A partir de 1832 dedicou-se à política e foi eleito várias vezes deputado até se afastar em 1851. Desempenhou numerosos cargos, entre os quais o de Ministro dos Negócios Estrangeiros. Em 1838 foi eleito membro da Academia das Ciências Morais e Políticas. Depois de abandonar a política continuou a dedicar-se ao estudo da sociedade e da política. Em Tour estudou os documentos antigos que lhe permitem conhecer a sociedade do Ancien Régime. Fez novas viagens. Primeiro à Alemanha onde estudou o antigo sistema feudal e posteriormente à Inglaterra para estudar documentos da Revolução. Raymond Aron presta tributo a este grande teórico da democracia, considerando que é injusto que ele não figure entre os criadores do pensamento sociológico. As suas ideias políticas são absolutamente fundamentais para a compreensão do Estado moderno, da Democracia e das relações entre Indivíduo, Comunidade ou Sociedade Civil e Estado. Na realidade, Toqueville parece ter formulado algumas das questões fundamentais que iriam acompanhar a história do pensamento sociológico e que permanecem hoje mais actuais que nunca. Pierre Ansart (2002, 1) afirma que "duas concepções de sociedade começaram a formar-se em sentidos opostos na década de 1840. É possível ilustrar esta oposição com os nomes de Marx e de Proudhon, por um lado, e de Toqueville, por outro". Ao contrário de Marx e Prouthon que viam a sociedade como um cosmos de contradições e conflitos em que os indivíduos eram vítimas de uma estrutura social coerciva desigualitária e injusta, Toqueville deixou-se fascinar pela ideia de modernidade no que ela tinha de ruptura com o fechamento social feudal. Acreditava que o homem moderno se encontrava num processo de libertação caracterizado por vínculos não coercivos e resultantes de acções e decisões livres. A relação social da sociedade moderna seria marcada pela ascensão da democracia, regime político destinado a minar os sistemas hierárquicos e a estabelecer, tendencialmente, o igualitarismo. Mas Toqueville compreendeu

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perfeitamente que existia um perigo na sociedade democrática: o individualismo. Livre dos vínculos coercivos da sociedade medieval, o homem tenderia a estabelecer uma relação directa com o Estado e a tornar-se isolado e, por isso, vítima do autoritarismo do Estado que assim se tornava totalitário. Toqueville, fez um estudo comparativo entre a França e os Estados Unidos e mostrou como os dois diferentes processos de institucionalização da Democracia, resultantes de processos históricos radicalmente diferentes, serviam para demonstrar a sua tese. Em França, a democracia foi imposta pelo Estado, pela via revolucionária e a igualdade atribuída de forma compulsiva a cidadãos que ainda não dispunham de liberdade de gestão regional e local (não existia o que hoje chamamos Sociedade Civil). O Estado tornou-se despótico e baseado numa administração centralizada. No caso dos Estados Unidos, a autoridade do Estado resultou de uma federação de interesses de múltiplas associações voluntárias nas quais os indivíduos se inseriam livre e facilmente e como agentes participativos activos (existia o que hoje chamamos Sociedade Civil). Ou seja, a igualdade não foi imposta por via revolucionária. Ao contrário, a Revolução, destruiu a dominação central colonial e substituiu-a pela institucionalização da igualdade perante a lei, de indivíduos diferentes e livres. A governação central foi estabelecida para conjuntos de indivíduos que eram livres de se auto-governarem por processos de negociação e cooperação dentro dos seus grupos de interesses. O Estado Federal em vez de despótico, tornou-se numa fonte de equilíbrio das diferentes expressões sociais de homens livres. A democracia americana é liberal desde sempre e a Democracia Francesa teve uma enorme dificuldade em manter um regime político livre. Apesar do seu apreço pelo sistema político americano, Toqueville não deixou de sublinhar os limites de qualquer democracia, considerou que impõem uma tirania da maioria, assimilando as minorias e submetendo-as às decisões da maioria. O indivíduo encontra-se assim perdido numa nuvem social que lhe impõe a vontade da maioria. Principais obras de Toqueville: A democracia na América - 1835, tomos I e II e 1840, tomos III e IV (Edição portuguesa da Princípia, 2002, Edição brasileira Da Ed. Belo Horizonte, 1977). O Antigo regime e a revolução - 1856, primeira parte (Edição brasileira da Ed. Universidade de Brasília, 1979). Existe uma publicação francesa com as Obras completas de Toqueville: Toqueville - Ouvres complétes de Toqueville, Paris, Ed. Gallimard. Para um estudo mais aprofundado de Toqueville:

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ARON, Raymond - As etapas do pensamento sociológico (referência completa na Bibliografia deste caderno). Os principais conceitos sociológicos desenvolvidos por Toqueville foram: Democracia Sociedade democrática Liberdade Igualdade/desigualdade Augusto Comte Comte nasceu em Montepelier, França, em 1798. Teve uma educação católica e monárquica mas afastou-se da sua formação tradicional tendo-se tornado agnóstico e republicano. Estudou na Escola Politécnica de Paris de onde foi expulso por ser livre-pensador tendo-se tornado professor particular de matemática. Dedicou-se ao estudo dos grandes matemáticos e posteriormente à filosofia e à economia política. Comte fundou o positivismo na filosofia e nas ciências sociais, particularmente na sociologia. Foi ele quem utilizou pela primeira vez a designação de sociologia para referir a análise positivista dos fenómenos sociais e políticos, que ele julgava estarem sujeitos às leis naturais. Entre 1817 e 1824 foi secretário de Saint-Simon com o qual entrou em divergência até à ruptura de relações. O seu pensamento seguiu, ao contrário do e Saint-Simon, uma orientação tradicionalista e conservadora enquanto o Conde, foi um socialista liberal e progressista. Podemos considerar que, na linha de Bonald e Maistre, se orientou intelectualmente por reacção ao pensamento iluminista e revolucionário francês. Combateu a desorganização e a anarquia mas o seu pensamento difere também dos católicos Franceses conservadores pois, ao contrário deles não deseja nem concebe um retorno à Idade Média e, fundamenta as suas ideias num sistema conceptual a que chama sociologia e que é elaborado segundo a crença no positivismo e não no catolicismo. Representa, portanto, tanto o pensamento pro-positivo como o pensamento revolucionário. É, um conservador que acredita que a desordem social se deve à desordem intelectual e que é fundamental educar o povo para organizar a sociedade. Para isso, segundo ele, deve utilizar-se a sociologia. Esta, deve constituir uma teoria a aplicar à vida colectiva de modo a criar-se um novo consenso moral que sirva de base à nova ordem. Comte foi um acérrimo defensor do unitarismo metodológico.

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Morreu em 1857 considerado louco e abandonado por todos. Acreditou e quis fundar uma nova religião fundada na razão o "positivismo", baseado na teoria sociológica positivista. O positivismo enquanto religião tinha como objectivo ensinar a teoria positivista ao povo supondo que esta seria uma religião "verdadeira" e "científica", que permitiria estabelecer uma moral geral na qual todos deveriam ser educados para que a integração social se fizesse da melhor forma. Comte teve grande influência no futuro da sociologia, especialmente em Spencer e Durkheim também positivistas. Principais obras de Comte: Cours de philisophie positive, 1830-42 Système de politique positive -1824 Discours sur l´esprit positif - 1844 Discours sur l´ensemble du positivism - 1848 Catéchisme positiviste ou Sommaire exposition de le religion univrerselle - 1852 Para um estudo mais aprofundado de Comte: ARON, Raymond - As etapas do pensamento sociológico (referência completa na Bibliografia deste caderno). BRAYANT, c. -"What is positivism?” Social Studies Review, 1986 Os principais conceitos sociológicos desenvolvidos por Comte foram: Filosofia positiva Ordem/progresso Religião científica Lei dos três estádios Leis de desenvolvimento social Valor moral Sociologia positivista Émile Durkheim

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Durkheim nasceu em 1858 em Epinal, na Alsácia-Lorena (nessa altura território francês, mas integrando a Prussia depois da guerra Franco-Perussiana de 1870) e faleceu em 1917. Durkheim viveu numa época profundamente instável para a França. Durante a sua vida, sucederam-se diversas crises sociais e políticas: A época da Restauração Bonapartista e do Império de Napoleão III seguido da sua queda, a Guerra Franco-Perussiana e a invasão da França pela Prussia, a declaração da III República, as revoltas do povo da Alsácia-Lorena contra o ocupante alemão e, no fim da vida, a I Guerra Mundial na qual, com grande desgosto viu perecer o seu único filho. Talvez tenha sido o sentimento de instabilidade e insegurança decorrente da vivência da humilhação nacional francesa, e segundo alguns, o facto de ter sido também vítima de anti-semitismo, que fez dele um entusiasta do estudo da solidariedade social ou seja, dos recursos sociais que permitem manter coeso um povo, ao qual podemos chamar, por isso, uma sociedade. Sendo o seu pai judeu, Durkheim recebeu educação judia mas, mais tarde veio a converter-se ao catolicismo e, posteriormente, tornou-se agnóstico. Frequntou a elitista Ecole Normal Supérieure onde se graduou em 1882 como aluno brilhante e veio a tornar-se um académico de carreira. Como Professor de filosofia, deu aulas na região de Paris entre 1882 e 1887, mas afastou-se progressivamente da tradição do ensino da filosofia pretendendo inaugurar um método científico de conhecimento da sociedade, que tivesse o objectivo de conduzir os destinos dos homens por uma via moral "normal", ou seja, sem a desordem que presenciou na sociedade francesa do seu tempo. Durkheim visitou a Alemanha e deixou-se influenciar pelas ideias democráticas e pela psicologia científica de Wundt. Quando regressou à França como Professor da Universidade de Bourdeaux, a partir de 1887, criou o primeiro curso de ciências sociais em França e até 1902, altura em que regressou a Paris, produziu a maior parte das suas obras e granjeou uma verdadeira hoste de alunos e discípulos interessados na nova ciência da sociedade. Em 1902 iniciou a sua actividade docente na Sorbonne em Paris, e, em 1906 foi ali nomeado catedrático de Educação e Ciência Social até 1013, ano em que passou a leccionar Ciência da Educação e Sociologia. Foi na Sorbonne que iniciou a publicação da revista L´Ánnée sociologique, a mais prestigiada publicação periódica francesa na área da sociologia, e que se viria a tornar no meio mais eficaz de divulgação do ponto de vista durkheimiano e fonte de criação da escola de pensamento do autor. Morreu em 1917 de ataque cardíaco aos 55 anos. Durkheim é visto como herdeiro intelectual de Comte no que ele tem de conservador e cienticista. Ao contrário dele, foi um académico de grande prestígio que muito contribuiu para a institucionalização da sociologia. Embora liberal do ponto de vista político, Durkheim temia como Conte e os católicos, a desordem social revolucionária. Por isso, dedicou a maior parte dos

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seus trabalhos ao estudo da ordem social. Foi um reformista convicto de que a revolução é não só dispensável como indesejável, pelas consequências negativas que acarreta. Empenhou-se em distinguir a sociologia das outras ciências, particularmente da psicologia e da história e estabeleceu como objecto da sociologia, o estudo das relações entre indivíduo e sociedade, níveis analíticos que considerava totalmente distintos. Considerou que a tarefa principal da sociologia é o estudo dos factos sociais que são por natureza distintos dos factos individuais. Assim na sua obra As regras do método sociológico (1895) explicou a natureza do social e a sua necessária metodologia de análise. Nela afirma que os factos sociais são externos às consciências individuais e dotados de poder coercitivo em virtude do qual se impõem aos indivíduos. Com Durkheim (e em parte também já com Comte) a sociologia adquiriu o seu estatuto científico e tornou-se uma disciplina autónoma, com teorias e métodos próprios. Os principais conceitos sociológicos desenvolvidos por Durkheim foram: Factos sociais, Anomia, Divisão do trabalho, Lei sociológica, Comunidade moral, Consciência colectiva, Representações colectivas, Ordem social, Solidariedade social, Suicídio, Sagrado e Profano. Principais obras de Durkheim: A divisão do trabalho social -1893 As regras do método sociológico - 1895 O suicídio - 1897 As formas elementares da vida religiosa - 1912 Para um estudo aprofundado de Durkheim:

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ARON, Raymond - As etapas do pensamento sociológico (referência completa na Bibliografia deste caderno). LUKES, Steven - Émile Durkheim: his life and work, 1973.

Karl Marx Karl Heinrich Marx, nasceu em 1818 em Trier, na Prússia Renâna. Fez o liceu e os estudos secundários em Bonna e iniciou também ali o curso de Direito que veio a completar em Berlim. Nessa cidade, juntou-se ao grupo dos chamados Jovens Hegelianos e dedicou-se a estudar Filosofia e História. Em 1841 fez o seu doutoramento em Filosofia da Universidade de Iena e em 1842 tornou-se jornalista em Bonna do Rheinische Zeitung de Colónia. Em 1843 partiu para França onde publicou os seus primeiros trabalhos. Em Paris, estudou economia política e conheceu Engels. Em 1845, a pedido do governo da Prussia, foi expulso de Paris e partiu para Bruxelas onde permaneceu até 1848 continuando ali a publicação das suas obras. Em 1847 foi, com Engels a Londres ao II congresso da Liga dos Comunistas de onde regressaram com a incumbência de escrever um manifesto. Em 1848, publicam em Bruxelas O Manifesto Comunista. Nessa altura, Marx foi expulso da Bélgica e instalou-se em Colónia prosseguindo a sua actividade como jornalista, desta vez como redactor-chefe da Neue Rheinische Zeitung. Aí desenvolveu uma intensa campanha política radical com vista à revolução na Alemanha. Em 1849 foi expulso da Renânia e instalou-se definitivamente em Londres onde prosseguiu a sua actividade jornalística e viveu permanentemente com dificuldades financeiras. Em 1864 redigiu os estatutos e o discurso inaugural da Associação Internacional dos Trabalhadores (AIT) a cuja formação esteve ligado. Em 1867 começou a publicar a sua obra magna, O capital, na cidade de Hamburgo. Prosseguiu a luta política, interessou-se pela Russia e estudou o Russo. Em 1881 colaborou na realização do programa do Partido Operário Francês e moreu em 1883 deixando incompletas ou por publicar várias obras. Entre 1885 e 1894, Engels publicou os volumes II e III de O capital. O pensamento de Marx foi especialmente influenciado pelo filósofo alemão mais proeminente do segundo quarto do século XIX, Hegel, e pela revisão que Feuerbach fez das suas teses. Não foi contudo seguidor nem de um nem de outro mas fez uma releitura criativa dessas teorias. Os dois conceitos chave da filosofia de Hegel são a dialéctica e o idealismo. A dialéctica é simultaneamente um método de pensamento e uma imagem do real. Sublinha os aspectos dinâmicos, conflituais, evolutivos e contraditórios da realidade. Hegel aplicou este conceito essencialmente às ideias mas, Marx

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aplicou-o ao processo histórico e aos aspectos materiais da vida, nomeadamente à economia – Materialismo Histórico. Hegel construiu uma teoria geral de evolução do mundo, teoria subjectiva na qual, a mudança inevitável ocorre (primeiro) por via das consciências, independentemente das suas vontades. Feuerbach evolui a partir do pensamento de Hegel e relativizou o papel das consciências avançando para uma leitura materialista da mudança centrando-a nos aspectos materiais da vida e considerando que, uma religião centrada em Deus deve ser ultrapassada por uma filosofia materialista, na qual as pessoas se tornam o objectivo máximo. Marx adere à crítica materialista e Feuerbach e adopta não só uma filosofia materialista como o desejo de intervenção prática na vida humana. Marx interessa-se especialmente pelos factos reais mais que pelas ideias abstractas. Considera que os problemas que na sua época afectavam os homens se deviam a factos concretos e identificáveis e não a uma inexorável evolução da consciência humana. Assim, propõe encontrar soluções também no quadro real da vida dos homens do seu tempo. A sua atitude não é a atitude filosófica de interpretação do mundo é, além disso, a "praxis" que pode e deve mudar o mundo. O materialismo de Marx, especialmente aplicado ao campo económico, separou-o da filosofia e situou-o entre os economistas políticos. Elaborou uma teoria baseada na crença de que o trabalho é a fonte da riqueza e, de que, a apropriação que os capitalistas fazem do trabalho dos operários é a fonte de acumulação de capital. A exploração da força de trabalho torna-se possível porque o capitalista paga ao operário uma quantia inferior ao que ele produz, alienando-o assim de parte da sua produção e apropriando-se dela. Trata-se de um valor, sob a forma de trabalho, acrescentado pelo operário às matérias-primas que lhe são entregues, o qual reverte a favor do capitalista sob a forma de lucro. Embora Marx não tenha sido um sociólogo, (era um jornalista), podemos considerar que, as suas teorias contêm uma visão sociológica do mundo e deram origem a uma corrente de estudos ditos marxistas (porque se apoiaram nas ideias de Marx), que são trabalhos sociológicos realizados por sociólogos. Muitos dos trabalhos sociológicos que foram elaborados desde o seu tempo foram-no por reacção, adesão ou contestação à sua teoria. O pensamento conservador rejeitou as suas ideias pelo facto de as considerar profundamente ideológicas. Marx foi, portanto, impossibilitado de ser aceite como sociólogo. Parece poder ser considerado mais um economista do que um sociólogo, facto que justifica a rejeição dos seus colegas e contemporâneos. Além disso, se os pais fundadores da sociologia, hoje considerados clássicos, elaboraram as suas teorias essencialmente por reacção ao Iluminismo e à Revolução Francesa, Marx, ao contrário, foi um revolucionário. Não pode por isso ser aceite entre os primeiros sociólogos como seu par. Além disso, enquanto os conservadores,

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foram directamente influenciados por Kant e pela sua teoria da causa-efeito, Marx foi influenciado por Hegel e logo pela leitura dialéctica e crença na interdeterminação recíproca dos fenómenos sociais. A maior parte da obra de Marx data de meados do século XIX. Este autor concebeu o homem como um ser necessariamente produtivo. Esta necessidade derivaria da própria lógica da sobrevivência. O processo produtivo foi, contudo subvertido ao longo da história e culminou no sistema capitalista, que constitui uma destruição das relações produtivas comunitárias naturais e conduz à alienação do trabalho de uns em favor de outros. A situação social gerada pelo capitalismo levou à existência de um pequeno grupo privilegiado e de um extenso grupo de oprimidos e explorados. Devido às suas convicções, Marx empenhou-se em fazer evoluir rapidamente este sistema, que segundo ele, devido às contradições internas, estava destinado ao colapso, para dar lugar ao socialismo, sociedade isenta de alienação. Peter Hamilton Worsley (Worsley, 1982) sintetiza o pensamento de Marx considerando os três eixos interligados com que explica este processo de desenvolvimento capitalista:

a) Processo económico que cria capital e o faz circular, b) Modelo social em que a classe burguesa explora o proletariado, c) Modelo ideológico em que o aparelho e o discurso do Estado, funcionam

como formas de manutenção e justificação desse sistema de exploração. Principais obras de Marx: Produziu extensíssima bibliografia que abarca vários tipos, desde o científico ao panfletário. A sagrada Família – 1844/5 A ideologia Alemã – 1845 A miséria da filosofia – 1847 Manifesto comunista -1848 Trabalho, salário e capital - 1849 As lutas de classes na França - 1850 O 18 Brumário de Luís Bonaparte - 1852 Crítica da economia política - 1859 Salário, preço e mais-valia - 1865 O Capital, livro I - 1867 Princípios da crítica da economia política - 1839-41 (publicação póstuma). Para um estudo aprofundado de Marx:

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ARON, Raymond – As etapas do pensamento sociológico (referência completa na Bibliografia deste caderno). McLELLAN´S, David - Karl Marx: his life and thought, 1973. WORSLEY, Petter - Marx and Marxism, ed. Travistock, 1982. Os principais conceitos sociológicos desenvolvidos por Marx foram: Capital Capitalismo Alienação Mais-valia Valor-trabalho Salário Processo de produção Modo de produção Relações de produção Classe social Luta de classes Ditadura do proletariado Ideologia Max Weber Max Weber nasceu em Erfurt, na Turíngia em 1864 e faleceu em Munique em 1920. Educado no seio de uma família com importantes contactos políticos e elevado nível intelectual, Weber veio a tornar-se num dos últimos "sábios" do Ocidente, desenvolvendo competências intelectuais múltiplas, que iam da História à Economia, Filosofia, Sociologia, Teologia e Direito. Até 1882, desempenhou cargos políticos e pertenceu ao grupo dos liberais da direita, tendo iniciado os seus estudos superiores na Faculdade de Direito em Heidelberg. Em 1883 torna-se Oficial do Exército Imperial. Em 1884 retoma os estudos, desta vez em Berlim e Göttingen. Faz o Doutoramento em Direito com uma tese sobre a Idade Média, em 1889 e em 1891 inicia a sua careira de docente universitário na Faculdade de Direito de Berlim. Em 1893 é nomeado professor de economia política na Universidade de Friburgo e em 1896 na universidade de Heidelberg. Em 1893, funda, juntamente com Werner Zombart os Archiv für socialwissenschaft und sozialpolitik. Faz uma viagem aos Estados Unidos em

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1904, participando num congresso de ciências sociais, de onde regressa profundamente impressionado. Em 1905 começa a estudar Russo para poder ler documentos originais em 1808 organiza a Associação Alemã de Sociologia. Em 1914, com o início da IGM pede a reintegração na vida militar e dirige hospitais na região de Heidelberg desempenhando posteriormente, cargos de influência junto do governo alemão para impedir a expansão da guerra. Contudo afirma a vocação da Alemanha para a política mundial e vê a Rússia como o principal inimigo alemão. Em 1918 torna-se consultor da delegação alemã em Versailles e em 1919 retoma a docência com uma cátedra na Universidade de Munique. No mesmo ano participa na comissão encarregue de escrever a Constituição de Weimar. Morre em Munique em 1920. Embora Marx e os seus seguidores tenham dominado o pensamento alemão durante a Segunda metade do século XIX e princípio do século XX, muito desse pensamento foi desenvolvido em oposição a eles. É o caso de Max Weber que considera a teoria marxista demasiado simplista e demasiado economicista. Recusa aceitar a ideia de Marx de que as ideias sejam um simples reflexo do mundo material e dedica-se a estudar a influência destas nos factos históricos, nomeadamente, do surgimento do capitalismo. Weber considerou o mundo das ideias como autónomo em relação à economia e capaz de a afectar de forma decisiva, especialmente as ideias religiosas, que associou ao desenvolvimento do racionalismo ocidental e à sua manifestação na esfera económica – sistema capitalista. Acerca disso escreveu uma tese que se tornou central no pensamento sociológico, A ética protestante e o espírito do capitalismo (1905). Um outro aspecto particularmente importante no pensamento de Max Weber que o opõe a Marx é a sua teoria da estratificação social. Enquanto o esboço de teoria das classes sociais de Marx põe a tónica na existência de classes que se distinguem pelo lugar que os indivíduos ocupam no processo de produção, Weber acentua os aspectos ligados ao "status" e considera que este sendo também determinado pela esfera económica, o é igualmente por outras esferas, tais como o prestígio e o poder etc. Assim não rejeita as ideias de Marx mas amplia-as e complexifica-as. Uma vez que trabalha essencialmente como reacção às ideias de Marx, algumas vezes opõe-se-lhe e outras corrobora-as. Weber não trabalhou somente por reacção a Marx e podemos encontrar influências de outros pensadores no seu trabalho. É o caso da influência determinante de Immanuel Kant mas também de Nietzsche. A influência de Kant manifesta-se numa visão muito mais estática da sociedade e do processo histórico do que a visão de Marx que, foi determinada pela dialéctica de Hegel.

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O trabalho de Weber não se centra, como o de Marx no estudo do capitalismo mas no estudo do processo de racionalização de que o capitalismo constituiria uma parcela. Assim, é significativo o esforço que faz para estudar a burocracia como fenómeno de afirmação da racionalização do mundo, e ainda, o estudo das religiões e o seu papel neste processo. Do ponto de vista político encontra-se para além do liberalismo e, embora também tenha sido um critico feroz do capitalismo liberal, não é tão radical quanto Marx. Produziu inúmeros estudos históricos dos quais retirou conclusões políticas, embora eles tenham sempre permanecido na esfera estritamente académica e científica, pois foi uma das suas preocupações permanentes conseguir separar a vocação política da vocação científica. A este propósito pode ler O político e o cientista (1919) A maior parte da sua obra foi produzida no final do século XIX e princípio do século XX. Em 1910, fundou, com outros, a Sociedade Alemã de Sociologia. Tornou-se influente fora da Alemanha especialmente nos Estados Unidos onde as ideias de Marx foram rejeitadas. Principais obras de Weber: História agrária de Roma e a sua significação para o direito público e privado - 1891 O Estado nacional e a política económica - 1895 A objectividade do conhecimento na ciência social e na ciência política - 1904 A ética protestante e o espírito do capitalismo - 1904/5 A situação da democracia burguesa na Rússia - 1906 As relações de produção na agricultura do mundo antigo - 1909 Ensaio sobre algumas categorias da sociologia compreensiva - 1913 A ética económica das religiões universais - 1915 "Crítica positiva da concepção materialista da história" - 1918 Sentido da neutralidade axiológica nas ciências sociais e económica - 1918 História económica geral - 1924 (publicação póstuma) Economia e sociedade - 1922, 1925 e 1956 (publicação póstuma) Para um estudo aprofundado de Weber: ARON, Raymond – As etapas do pensamento sociológico (referência completa na Bibliografia deste caderno). Os principais conceitos sociológicos desenvolvidos por Weber foram: Acção social Racionalização

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Sociologia compreensiva Compreensão Explicação Interpretação Burocracia Dominação burocrática Organização burocrática Relação aos valores Tipo ideal Significação vivida Sentido subjectivo Relação social Costume Hábito Ordem legítima Sociedade/comunidade Poder Dominação Acção racional Associação/Instituição Grupo hierocrático Julgamento de valor

5. Exercícios de controlo A. Complete os espaços em branco de modo a dar sentido pertinente às frases. 1. Proudhon via a sociedade como um cosmos de ___________ e ___________ em que os indivíduos eram vítimas da _____________ social. 2. Segundo Augusto Comte a desordem social deve-se à ________________ e, potanto, é necessário ___________ o povo para organizar a sociedade. 3. Durkheim chamou a si a tarefa de demarcar a sociologia das outras ciências sociasis, nomeadamente, a ____________ e a _______________. B. Diga se são verdadeiras ou falsas as seguintes afirmações. 1. Segundo Durkheim os factos sociais são fenómenos das consciências individuais. 2. O Manifesto Comunista é uma obra de Lenine.

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3. Karl Marx foi influenciado por Hegel. C. Assinale a única resposta verdadeira. A dialética é: a) um conceito comunista. b) um conceito de Hegel. c) um conceito realista. Soluções A. 1 - Conflitos/contradições/estrutura 2 - Desordem intelectual/ educação 3 - Psicologia/ história B. 1 - f 2 - f 3 - v C. b)

Capítulo 2 - A Filosofia da Ciência Social

1. Competências a adquirir Depois de completar o estudo deste capítulo deverá ser capaz de: - Distinguir as opiniões de positivistas, pragmatistas, hermenêutas, fenomenologistas e marxistas, quanto a quem deve fazer a filosofia das ciências sociais. - Distinguir ciência e filosofia. - Explicar o que se entende por filosofia das ciências sociais - Explicar como se relacionaram no século XX a filosofia, a ciência e a filosofia das ciências sociais.

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- Explicar a importância da filosofia das ciências sociais no desenvolvimento dos programas de investigação das ciências sociais. - Identificar três fases no desenvolvimento da filosofia das ciências sociais no século XX. - Referenciar os principais autores e escolas da filosofia das ciências sociais no século XX.

- - Identificar as principais controvérsias da filosofia das ciências sociais, nomeadamente a principal argumentação positivista e não positivista, quanto à ontologia, epistemologia e metodologia das ciências sociais.

- - Distinguir unitarismo metodológico de dualismo metodológico e relacioná-los com correntes e autores do século XX.

- - Explicitar a principal linha de clivagem ontológica/epistemológica do pensamento sociológico, distinguindo: positivismo/naturalismo/objectivismo, construtivismo/anti-naturalismo/subjectivismo, naturalismo crítico.

- - Distinguir e explicitar os conceitos de epistemologia interna e externa relacionando-as com diversas práticas científicas concretas (americana, francesa etc.).

- - Identificar e caracterizar o Círculo de Viena. - - Identificar os principais autores da filosofia das ciências sociais e as suas

principais ideias.

2. Conceitos prévios Ontologia Epistemologia Metodologia Fenomenologia Hermenêutica Pragmatismo Funcionalismo Positivismo Positivismo lógico Naturalismo Realismo Teoria do conhecimento Empirismo Racionalismo Formalismo Dedução Indução Atomismo

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Holismo Metateoria Paradigma

3. As ideias Para o estudo deste capítulo deve ler o Capítulo 3 do manual (páginas 86-106). Introdução Todas as ciências se autonomizaram a partir do pensamento filosófico. Primeiro as ciências formais, depois as ciências físicas/naturais e, finalmente, as ciências sociais. A filosofia, na sua especialidade de filosofia das ciências, reflectiu acerca da actividade das ciências e dos cientistas ao longo dos tempos produzindo uma teoria filosófica da ciência – metateoria. A metateoria reflecte acerca da teoria científica, quer do ponto de vista formal ou interno (relativo à lógica, método e correcção dos raciocínios utilizados etc.), quer do ponto de vista social ou externo (relativo às condições sociais da produção científica, culturas e modus faciendi sociais, limites estruturais e conjunturais, relações de poder etc.). O processo de autonomização ocorreu de modo diverso para as diferentes ciências. No caso das ciências físico/naturais, a metateoria foi feita por filósofos profissionais, e não pelos próprios cientistas, os quais se limitaram a produzir teorias científicas. No caso das ciências sociais, verificamos que não houve completa separação de trabalho intelectual e que a filosofia das ciências sociais foi feita, em grande medida, pelos próprios cientistas sociais. A história da ciência mostra, portanto, que as ciências sociais não se mantiveram independentes da filosofia que se debruçou sobre elas. As teorias do social tornaram-se muito dependentes da metateoria construída pelos próprios cientistas sociais que desviando muitas vezes os seus esforços heurísticos do objecto real, se dedicaram, essencialmente, à reflexão acerca do objecto formal. Assim, é muitas vezes difícil distinguir teoria de metateoria no seio das ciências sociais. Para tornar ainda mais complexa a reflexão acerca da metateoria social, as próprias correntes científicas não se entendem quanto aos fundamentos filosóficos das suas disciplinas. No interior de um vasto conjunto de problemas ontológicos, epistemológicos e metodológicos podemos, no entanto, desenhar algumas linhas orientadoras de grandes divisões paradigmáticas. A principal linha de clivagem no seio do pensamento sociológico alinha o positivismo/naturalismo/objectivismo e correntes daí derivadas ou inspiradas

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contra o construtivismo/antinaturalismo/subjectivismo e respectivas correntes derivadas ou inspiradas. No primeiro grupo encontram-se por exemplo Durkheim e Parsons bem como a maioria das correntes anglo-saxónicas e parte dos marxistas tais como Engels, e Althusser. No segundo, encontra-se Max Weber e grande parte do pensamento germânico, bem como outros marxistas tais como Lukács, Sartre e a Escola de Frankfurt . Um outro grupo alternativo a este dualismo histórico surgiu recentemente e pode ser considerado como naturalista crítico, ou pós-positivista, pois apresenta um programa realista não-positivista da ciência. O positivismo ou naturalismo foi o modelo clássico ou dominante, baseado numa proposta teórica realista explicativa aplicada às ciências sociais. Ontologicamente, afirmar o realismo significa que está presente a crença de que a realidade existe independentemente do conhecimento que temos dela. A realidade deixa-se conhecer sem alterar a sua natureza e, as proposições acerca dela são generalizáveis pois, a sua natureza é regular e organiza-se por relações causais (causa-efeito). Isto é, o positivismo pretende explicar os fenómenos sociais através da existência de leis gerais que regem todos os fenómenos e que permitem explicar as acções ou ocorrências observáveis. Do ponto de vista epistemológico, o positivismo considerar que existem duas esferas: sujeito e objecto as quais são independentes. Enquanto a esfera do real permanece inalterável face ao sujeito, a esfera do sujeito transforma-se pela relação de conhecimento. A isto se chama dualismo epistemológico ou separação entre o sujeito e o objecto de estudo. O positivismo postula a possibilidade de aceder ao conhecimento objectivo através da explicação dedutiva, a qual garante a possibilidade da previsão de factos com base no conhecimento de condições iniciais. Além disto, o positivismo apoiado no cartesianismo rejeita qualquer promiscuidade entre factos e valores. Do ponto de vista metodológico são várias as implicações da assunção desta ontologia e epistemologia, a saber, adopção de uma metodologia experimental/manipulativa para verificação de hipóteses, utilização preferencial de métodos quantitativos e adesão ao unitarismo metodológico ou seja, consideração de um único método científico para todos os ramos da ciência. Este paradigma é usualmente acusado de reducionismo e determinismo. O construtivismo ou anti-naturalismo também designado por alguns autores como "hermenêutica" encontra-se no pólo oposto do pensamento do social.

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Ontologicamente, o construtivismo é relativista e afirma que a realidade é apreendida de formas múltiplas através de conceitos mentais intangíveis que se baseiam na experiência social e pessoal dos indivíduos e, portanto, esses conceitos jamais podem ser unificados por uma fórmula ou lei geral pois obedecem à variabilidade psicológica e social. Os fenómenos sociais são ontológicamente diferentes dos físicos/naturais pois regem-se por regras que não são logicamente independentes dos comportamentos humanos. A linguagem é a estrutura que materiliza os sentidos subjectivamente visados pelos agentes sociais. Uma vez que ela tem uma estrutura semântica, é importante compreender por interpretação, os sentidos manifestados na linguagem (sentido semiótico e não apenas linguístico). Assim, os conceitos não se consideram mais ou menos verdadeiros mas apenas mais ou menos elaborados ou contendo mais ou menos informação. Por outro lado eles são alteráveis tal como as realidades pessoais e sociais que lhes deram origem. Do ponto de vista epistemológico a proposta hermenêutica afirma a impossibilidade da previsão por aplicação de leis gerais. (previsão incondicional). O que explica as regras de funcionamento do social são os sentidos atribuídos pelos sujeitos e grupos às suas acções, e esses devem ser interpretados, não explicados. A explicação dessas razões não é generalizável ficando assim posta em causa a sua utilidade. A epistemologia construtivista diz-se transaccional o que significa que sujeito e objecto interagem e não são independentes. Os factos não existem por si. São criados pelo investigador – subjectivismo. Isto destrói a linha que separa rigorosamente a ontologia da epistemologia (os factos não têm natureza própria são criados pela relação de conhecimento). Do ponto de vista metodológico, a consequência da ontologia/epistemologia construtivista é a adopção de metodologias hermenêuticas e dialécticas que permitem interpretar e comparar relações variáveis, imprevisíveis, e singulares ou seja, não generalizáveis. Quanto aos realistas críticos ou pós-positivistas eles combinam aspectos dos dois paradigmas anteriores. São realistas e portanto consideram que a realidade existe antes e fora dos sujeitos, mas a realidade social é simultaneamente imanente e transcendente em relação aos indivíduos. Assim, a ontologia da estrutura social não é independente da ontologia dos sujeitos. Consideram que existe uma relação entre a realidade (estrutura externa omnipresente) e a subjectividade dos sujeitos que agem socialmente (acção ou mediação humana). O seu programa intelectual pretende conciliar estes dois pólos. Consideram que a acção dos sujeitos se conjuga de modo a criar a estrutura que lhes é exterior e

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os condiciona ("teoria da estruturação" de Anthony Giddens e "modelo transformacional da actividade social" de Baskar). Os realistas críticos consideram que existe uma estratificação real na sociedade. O conhecimento não é uma construção ou classificação subjectiva operada pelo investigador mas a tentativa metódica de apreender a variabilidade real, os mecanismos geradores e as estruturas causais que explicam os fenómenos concretos. A principal contribuição epistemológica pós-positivistaé a superação do dualismo epistemológico positivista pela afirmação de que a realidade social está imbuída de valores e o papel das ciências sociais inclui a descrição e explicação desses valores que condicionam a estrutura social. Ou seja, a realidade produzida pelas acções individuais, e que se impõe colectivamente aos indivíduos como estrutura, reflecte as valorações de todos os indivíduos. Esses indivíduos têm uma falsa consciência da estrutura pois avaliam-na do seu ponto de vista, ou seja de acordo com os seus valores. Ao avaliarem distorcidamente a estrutura (porque julgam a realidade em função dos seus valores) os indivíduos agem nessa estrutura em função das suas leituras e não em função da verdadeira estrutura. Ou seja, o pós-positivismo concilia, neste ponto de vista, realidade objectiva e realidade subjectiva da acção social (a primeira incorpora a segunda e a segunda distorce oportunisticamente a primeira condicionando-a à posteriori pela re-acção social). Havendo em paralelo uma realidade objectiva e uma avaliação subjectiva que condiciona essa realidade objectiva (pois essa avaliação não é neutra nem estática, mas activa e transformadora da mesma realidade), o papel das ciências sociais pode incluir a avaliação crítica das acções individuais que transformam as estruturas em função dos valores que subjazem a essas acções. E pode "julgar" as acções sociais individuais em função das transformações que operam na estrutura. Daí a designação de "crítica" que se atribui a este tipo de realismo diferente do realismo positivista objectivista e dualista. O programa pós-positivista não se esgota na avaliação nem na explicação do social. Ele pretende atingir o nível de intervenção através da avaliação científica dos movimentos e transformações das estruturas sociais com base numa leitura dita realista do objecto de estudo. Assim sendo, os pós-positivistas realistas críticos postulam diferenças ontológicas e epistemológicas significativas entre ciências sociais e físico/naturais pelo que optam pelo dualismo metodológico. Ideias apresentadas no manual

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Quem deve fazer a filosofia da ciência social? Filósofos que não conhecem a fundo a ciência social ou cientistas sociais que não conhecem a fundo a filosofia? A discussão permanece com os investigadores divididos: Positivistas, convencionalistas e pragmatistas afirmam que deve ser feita pelos cientistas e reclamam-se em geral, do unitarismo metodológico. Outro tipo de pensadores tais como os hermeneutas, fenomenologistas, marxistas etc. Situam-se no pólo oposto. Turner agrupa em três períodos a principal produção da filosofia das ciências sociais: Primeiro terço do século XX - posições várias contraditórias e complexas, grande número de pontos de vista. Décadas intermédias do século XX - Predominância do positivismo lógico do Circulo de Viena. A partir da década de 60 do século XX - Retorno à diversidade das teorias do início do século. A natureza da ciência social O debate filosófico acerca das ciências sociais começa por se fundamentar na discussão acerca da ontologia do objecto de estudo (neste caso o objecto não é o social pois estamos a fazer filosofia. O objecto de estudo são as ciências sociais e é acerca delas que estamos a discorrer). Pergunta-se, em primeiro lugar, qual é a natureza das ciências sociais. Ao colocar esta questão os pensadores tentam discorrer acerca das características do pensamento dessas ciências. As posições são contraditórias e divergentes e vão evoluindo ao longo do século XX, segundo influências e modas intelectuais. Alguns pensam que a sociologia (e outras ciências sociais) são matérias científicas equivalentes à biologia ou à física e que não há razão de ser para a distinção entre ciências, e letras ou humanidades. São os unitaristas metodológicos ou naturalistas. Outros pensam que as ciências sociais não são ciências tais, como as físicas e naturais e, portanto, não devem ser tratadas e pensadas usando os mesmos métodos. São os dualistas metodológicos (dois métodos distintos segundo se trate de um ou outro tipo de ciência), ou anti-naturalistas. Alguns unitaristas: Augusto Comte

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Ernst Mach - Circulo de Viena Posição intermédia: Max Weber Alguns anti-naturalistas: Dilthey Windelband Rickert Husserl Alfred Schutz Gadamer A evolução da filosofia das ciências sociais, teve reflexos directos e indirectos na produção teórica das ciências sociais: na escolha dos temas de estudo e sua atribuição por especializações científicas (as várias ciências sociais), sendo responsável pela instauração de um ambiente pró-interdisciplinaridade; na evolução dos métodos e técnicas de investigação, etc. Filosofia da ciência Desenvolveu-se em sentidos vários: a) Filosofia anglo-americana (positivismo instrumental) e alemã, incluindo o circulo de Viena (positivismo lógico) - Trata-se de uma epistemologia interna ou reflexão acerca do conjunto de requisitos para a produção de evidências científicas. Incide especialmente no rigor das proposições, induções e deduções. É uma análise do formalismo do pensamento científico. A verdade é considerada uma conformação de proposições linguísticas à realidade e, portanto, um discurso objectivo acerca do real. b) Filosofia/epistemologia francesa e marxismo, incluindo Khun - epistemologia externa ou conjunto de factores externos aos processos intelectuais em si, que podem condicionar e configurar a produção e os resultados das investigações. Incide especialmente nas condições sociais e históricas (conjuntura e estrutura) no quadro das quais se iniciam e produzem estudos científicos. É relativa ao poder, à política, à economia, à cultura, à ideologia etc. A verdade é construída socialmente e é relativa no tempo e no espaço.

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c) Pragmatistas americanos, incluindo Peirce – epistemologia interna e externa conjugando rigor formal com capacidades intelectuais desenvolvidas em condicionamento cultural. Peirce sublinha o aspecto prático da aquisição de conhecimentos. A verdade deixa de ser objectiva e passa a ser consensual. Resulta de um processo colectivo de entender o mundo que corresponde a um conjunto de práticas e rotinas institucionais produzidas pela comunidade científica nas suas práticas. Esta actividade resulta da identificação de problemas práticos que se pretende sejam resolvidos. E as ciências sociais? A produção da filosofia das ciências sociais condicionou o desenvolvimento das mesmas. A influência do Circulo de Viena caracterizou-se pela emergência do neo-positivismo que foi predominante nas ciências sociais em meados do século XX. Existiram excepções a esta tendência tais como a Antropologia Cultural e algumas correntes sociológicas como o Interaccionismo Simbólico. As críticas a esta postura intelectual, a esta visão positivista e formalista da ciência unificada, tiveram como resultado novas e diversificadas perspectivas, não necessariamente compatíveis ou redutíveis umas às outras. Apareceram teorias que distinguem causas de intenções, e explicam os factos sociais tendo em conta os agentes das acções na sua individualidade e historicidade, e não em factores externos unificadores da acção social susceptíveis de se explicarem através de leis gerais. Entre essas correntes contam-se, o construtivismo, a sociologia histórica, a teoria neo-hermenêutica, a revisão crítica do funcionalismo, a teoria crítica, o anti-positivismo, o estruturalismo, o feminismo e outras abordagens mais informais do conhecimento. Mas este tipo de correntes teve também as suas críticas e, por exemplo o estruturalismo deu lugar ao pós-estruturalismo e o construtivismo ao desconstrutivismo, surgiram também teorias da acção racional, neo-marxismo, teoria dos sistemas, racionalismo, realismo etc. que recuperaram alguns aspectos da procura racional do conhecimento, em simultâneo com novas correntes de ciência mais informal, como o pós-modernismo, estudos feministas, fenomenologia etc.

4. Autores e obras Círculo de Viena O Circulo de Viena, surgiu em 1923, liderado por Moritz Schlink e manteve-se activo nas décadas de 20 e 30 do século XX. Foi constituído por um grupo de

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filósofos/cientistas seguidores da tradição do empirismo anti-metafísico iniciada por Ernst Mach na Universidade de Viena em 1895. Constituíram-se como grupo de reflexão, criaram um paradigma científico herdeiro do positivismo, designado por “positivismo lógico” que pretendeu ser o responsável pela criação de uma "concepção científica do mundo", e apresentaram-se como movimento científico e educativo com a finalidade de fazer uma síntese do empirismo e do positivismo comtiano, que através da análise e registo lógica do mundo e da fundamentação de todo o conhecimento na experiência livrasse para sempre a filosofia da metafísica. Por influência de Neurath, socialista activo, decidiram intervir como se fossem um partido político, pois a sua ambição não se limitava ao conhecimento, mas incluía a transformação social através do esclarecimento baseado nessa concepção científica do mundo. A concepção científica do mundo incluía a rejeição de toda a metafísica tradicional, e aplicava os seus princípios à teoria do conhecimento atacando radicalmente as concepções Kantianas e os conceitos de verdade subjectiva. Propunha o estabelecimento de uma ciência unificada, realista e empirista, baseada no postulado que afirma serem apenas válidos os enunciados factuais, pois são os únicos cujos termos se referem à experiência imediata, ou seja, são verificáveis (ou falsificáveis). Afirmavam portanto que a explicação sociológica, tal como a histórica, deveria seguir o modelo dedutivo-nomológico ou "lei explanatória" das ciências naturais. Principais acções do Circulo: - Criaram a sociedade Albert March em 1928. - Publicaram o manifesto designado "A concepção científica do mundo: o círculo de Viena" em 1929. - Organizaram, com a sociedade para a Filosofia Empírica (de Berlim) vários congressos. - Deram início, em 1930, a uma comunidade internacional de filosofia científica. - Publicaram a revista Erkenntnis e várias séries de monografias Os mais destacados membros deste grupo intelectual foram: Moritz Schlink – fiósofo/cientista Rudolf Carnap – filósofo e físico Otto Neurath – economista Hans Hahn – matemático E ainda, Ludwig Wittgenstein, Albert Einstein e

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Bertrand de Russel – que não sendo membros, influenciaram muitíssimo o Circulo de Viena DILTHEY(1833-1911) Filósofo hermenêuta, nasceu na Alemanha onde se formou em Heidelberg e Berlim. Foi professor de história e filosofia na Alemanha e na Suiça. Anti-naturalista, fez uma distinção entre dois tipos de conhecimento, a análise científica natural e a análise científica social. A análise científica natural é aplicável a fenómenos que se podem exprimir por leis (objecto da ciências naturais) a análise científica social é aplicável a fenómenos que exprimem intenções dos agentes (objecto das ciências sociais). A sua principal contribuição situou-se ao nível da psicologia experimental e da psicologia cultural às quais aplicou novas técnicas de medida. As suas principais obras foram: - Princípios de psicologia fisiológica 1873/4 - Psicologia dos povos 1900-1920 GADAMER (1900-) Nasceu em Marburgo, Alemanha, onde se formou em Munich e Marburgo, tendo sido discípulo de Heidegger. Especializou-se em Hermenêutica e foi professor de filosofia em Marburgo, Leipzig, Frankfurt e Heidelberg. Desempenhou um papel central na hermenêutica contemporânea. Concebe a hermenêutica como um método de interpretação à disposição do cientista social, capaz de explicitar os sentidos atribuídos tradicionalmente às acções que conjugam passado e presente no acto de conhecimento (fusão de horizontes). A produção de significados é dialógica ou seja, integra duas lógicas ou significados que se conjugam, ao alargar o horizonte do interprete a outro horizonte inicialmente desconhecido e/ou posição divergente. Assim, em presença do conhecimento de outra lógica e da estrutura da linguagem do outro, o investigador/intérprete pode chegar a conhecer plenamente aquilo que antes lhe escapava por fazer uma leitura segundo a sua própria lógia. Trata-se de uma ênfase na historicidade da compreensão, e da localização do intérprete numa tradição activa/criativa, de criação de ante-estruturas para o conhecimento. Os críticos desta posição chamam à ante-estrutura um pré-conceito e consideram-na um subjectivismo ou retrocesso em termos de conhecimento. Utilizou a figura do círculo hermenêutico para rejeitar o objectivismo.

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Influenciou, no interior das ciências sociais, o debate acerca da relação sujeito/objecto e da objectividade, a criação de métodos apropriados para as ciências sociais. A sua principal obra foi: Verdade e método 1960 HABERMAS, Jurgen (1929-) Nasceu em Dusseldorf na Alemanha em 1929, Estudou psicologia, filosofia, literatura alemã e sociologia em Zurich, Frankfurt e Bona e doutorou em 1954 em Gottingen. Foi professor na Universidade de Marburg, Heidelberg e Frankfurt. Em 1956 tornou-se associado do Instituto de Pesquisa Social de Frankfurt de onde viria a ser afastado por Horkheimer, bem como director do Instituto Max Planck, em Sarnberg de 1971 a 1982. Possui variadas distinções e prémios e é professor honorário de múltiplas universidades. Influenciou o desenvolvimento científico das ciências sociais com a sua crítica à consciência tecnológica que se desenvolve nas sociedades capitalistas tardias. Fez uma revisão do materialismo histórico mostrando que para além dos aspectos económicos evidenciados por Marx, existe uma crise de racionalidade, legitimidade e motivação nas sociedades industriais avançadas que afecta os sistemas políticos e socioculturais e põem em causa a sobrevivência das sociedades capitalists avançadas. As suas principais obras foram: Para uma sociedade racional- 1971 Conhecimento e interesses humanos -1972 Teoria e prática -1974 HUSSERL, Edmund gustav Albrecht (1859-1938) Nasceu em Prossnitz, Morávia, Áustria e formou-se em filosofia e matemática em Leipzig, Viena e Berlim. Fez uma investigação sistemática da consciência humana. Criou a Fenomenologia (ciência das aparências) como método filosófico de questionar os fenómenos da consciência, e desenvolveu questões relativas à forma pela qual se constituem os objectos na consciência humana, do ponto de vista do seu status existencial. Foi professor em Halle Götting e Freiburgo onde viria a ser sucedido pelo seu aluno Heidegger (fundador do existencialismo).

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A fenomenologia de Husserl viria a influenciar o pensamento sociológico, no final dos anos 60, principalmente através do pensamento de Alfred Schutz (fenomenologia sociológica) e Harold Garfinkel (etnometodologia). As suas principais obras foram: Investigações lógicas – 1901 Ideias para uma fenomenologia pura e uma filosofia fenomenológica – 1913 A crise das Ciências europeias e a fenomenologia transcendental – 1936 KHUN, Thomas Samuel ( 1922- ) Nasceu em Cincinatti, Ohio, nos Estados Unidos e começou por se graduar em física na Universidade de Harvard. Veio a interessar-se pela história da ciência e em 1961 tornou-se professor de Educação e História das Ciências em Berkley, na Califórnia. Foi também professor em Princeton e é actualmente professor no Massachusetts Institute of Technology (MIT) As suas principais obras foram: A revolução coperniciana -1957 A estrutura das revoluções científicas - 1962 LUKÁCS, György ( 1888- 1971) Nasceu em Budapeste, Hungria, onde se formou em filosofia, se doutorou em 1906, e onde foi professor e crítico literário. Foi um filósofo marxista, líder do movimento comunista húngaro e exilado político na Rússia estalinista. Desenvolveu estudos sobre a consciência de classe e a alienação, entre outros, e foi um dos fundadores do marxismo hegeliano, pensamento que viria a conduzir à Teoria Crítica. Contribuiu para retirar do paradigma marxista a inevitabilidade da marcha da História conduzir à racionalidade, e substituiu-a pela ideia de que a marcha da História está directamente relacionada com a praxis humana. As suas principais obras foram: A alma e as suas formas – 1910 História e consciência de classe – 1923 MANNHEIM, Karl (1893 - 1947)

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Nasceu em Budapeste, Hungria, estudou em Berlim, Budapeste, Paris, Freiburgo e Heidelberg. Foi professor de sociologia em Frankfurt em 1926, mas devido ao nazismo foi para Inglaterra em 1933 onde, de 1933 a 1945, leccionou na London School of Economics e no London Institute of Education. Durante a sua fase alemã foi muito influenciado por Luckács e estabeleceu as bases da sociolgia do conhecimento, como meio racional de conhecimento. Na sua fase britânica estudou a estrutura da sociedade de massas e a sua fragmentação e atomização, adoptando ideias extremistas de planificação social para restabelecimento da ordem social. As suas principais obras foram: Ideologia e utopia - 1929 e 1960 O homem e a sociedade numa idade das reconstruções – 1940 Ensaios de sociologia do conhecimento – 1962 Liberdade, poder e planeamento democrático – 1950 SCHUTZ, Alfred (1899- 1959) Nasceu em Viena onde se graduou em Direito e Ciências Sociais e onde desenvolveu intensa comunicação com Husserl e o método fenomenológico. Depois da invasão da Austria, na Segunda Guerra Mundial, refugiou-se nos Estados Unidos onde combinou o trabalho como bancário com o estudo da filosofia, e onde foi professor na New York School of Social Research em 1952. Introduziu na sociologia a fenomenologia de Husserl combinando-a com outras escolas interpretativas e criando condições para o surgimento da Etnometodologia (Garfinkel) e da teoria crítica de Habermas. A sua principal obra foi: A fenomenologia do mundo social -1923

5. Exercícios de controlo A. Complete os espaços em branco de modo a dar sentido pertinente às frases. 1. Os positivistas afirmam que a filosofia da ciência deve ser feita pelos ________________, enquanto que os ___________________, afirmam que ela deve ser trabalho de filósofos.

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2. Os _________________________consideram que as ciências sociais não devem ter um método específico. 3. A epistemologia do Circulo de Viena é de tipo _____________, ou seja incide no rigor das proposiçãoes B. Diga se são verdadeiras ou falsas as seguintes afirmações. 1. A epistemologia do Circulo de Viena pode ser considerada formal. 2. A epistemologia francesa é indutiva/dedutiva. 3. O pragmatismo americano é imanentista. C. Assinale a única resposta verdadeira. A produção da filosofia das ciências sociais: a) Condicionou o seu desenvolvimento. b) Foi a única base teórica estável de uniformização das ciências sociais.c) É de tipo relativista externo. Soluções A. 1 - Cientistas/ hermenêutas ou marxistas ou fenomenologistas 2 - Unitaristas metodológicos. 3 - Interno B. 1 - v 2 - f 3 - f C. a)

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PARTE II - A PLURALIDADE PARADIGMÁTICA

Introdução Como já vimos, a sociologia nasceu optimista quanto às possibilidades de racionalizar a vida social e minimizar os prejuízos da Revolução. A evolução foi tida como sendo natural pela teoria positivista e pelas teleonomias, quer Marxista, quer anti-marxista. No entanto, a evolução do sistema capitalista acentuou as assimetrias sociais e ampliou todo o tipo de disfunções e problemas. Isso veio a provocar na sociologia uma evolução para formas mais críticas. As escolas do século XIX que tinham sido naturalistas, organicistas e mecanicistas, à medida que se avançou no século XX, foram-se tornando obsoletas, ao mesmo tempo que foram aparecendo tendências intelectuais anti-evolucionistas, especialmente, através das influências filosóficas de Schopenhauer e de Nietzsche. Os positivistas tinham acreditado que todas as sociedades humanas se desenvolviam através de uma sucessão regular e necessária de estádios sociais. Esta atitude causou grandes discussões entre historiadores (defendendo a singularidade das suas cronologias) e sociólogos (tentando uniformizar a explicação dos fenómenos através de leis gerais). Por outro lado, o desenvolvimento da antropologia e da etnografia, mostrando a diversidade e relativizando as normas e os modelos sociais permitiu mostrar uma impossibilidade de unitarismo no desenvolvimento social. A própria crise nas ciências físicas com o surgimento da geometria não-euclidiana, a teoria dos conjuntos e a decadência do Cálculo como único modelo de conhecimento do Universo contribuíram para repensar a epistemologia das ciências sociais, até aí marcadas pelo paradigma científico positivista. Assim, foi sendo desmitificada a ciência "pura e dura" e mostradas as disparidades reais entre progresso científico e bem-estar social geral. Neste processo, os métodos das ciências naturais e exactas pareceram cada vez mais desadequados ao estudo dos fenómenos sociais. Em 1894 foi organizado em Paris o I Congresso do Instituto Internacional de Sociologia. No início do século XX a sociologia vivia uma situação instável, com os sociólogos desentendidos quanto ao objecto e métodos a utilizar nas suas investigações. No entanto, a geração de grandes sociólogos do século XIX e princípio do século XX esteve unida. Ligou-a a preocupação com os graves

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problemas da sociedade capitalista, a metodologia, a objectividade, a necessidade de separação dos métodos da sociologia dos das ciências exactas, a separação definitiva da sociologia relativamente á filosofia, a necessidade de realização de estudos empíricos e a abordagem estruturo-analítica em substituição da histórico-evolucionista. Por outro lado, é marcante a diferença cada vez mais acentuada entre a sociologia não marxista e a sociologia marxista como pontos de vista irredutíveis. Evoluindo em torno destas questões, no final do século XIX e princípio do século XX, a sociologia não tinha atingido de forma nenhuma uma unidade paradigmática: Para além das contribuições dos pais fundadores de que já falámos, toda uma pluralidade de estudos e investigadores surgiram na sociologia na época da sua fundação. Desencadeou-se uma certa febre de reflexão sociológica, através de contribuições completamente diferentes: Na Inglaterra, James Bryce começou a publicar através da Sociedade Sociológica de Londres a revista "Sociological Rewiew", mas só em 1907 foi criada a primeira cadeira de sociologia na Universidade de Londres. Em França, reservava-se o termo sociologia para os estudos dos discípulos de Comte. Os seguidores de Le Play consideravam que produziam estudos de "ciência social". Após a decadência do positivismo, os descendentes intelectuais de Durkheim foram incapazes de encontrar um novo líder intelectual. Fora dessa herança, destaca-se Georges Gurwitz com os seus trabalhos mas, este acaba por se refugiar nos Estados Unidos durante a IIGM. No mesmo período, são ainda de mencionar as contribuições teóricas de Raymond Aron e Georges Friedman entre outros. Duas escolas de sociologia, a de Le Play (1806-1882) – criador do método monográfico e a de René Worms (1869- 1926) – organicismo, contemporâneas de Durkheim, foram igualmente incapazes de deixar como herança uma reflexão condutora do pensamento sociológico francês, apesar de terem sido criados em 1893 o Instituto Internacional de Sociologia e a revista Internacional de Sociologia. Ligados àquela instituição, distinguiram-se Gabriel Tarde (1843- 1904) – nominalismo e, Espinas (1844-1922) – percursor da etologia. Na Europa, a sociologia chegou às vésperas da Segunda Guerra Mundial sem influência e sem prestígio. Na Alemanha as faculdades de filosofia que incluíam as ciências humanas recusavam todos os estudos empíricos. A sociologia não era aceite nem pelas universidades nem pela burocracia dirigente. Tonnies criou a sociedade Sociológica Alemã em 1909 muito antes de ser institucionalizada a disciplina. Weber não teve propriamente uma descendência teórica mas estende a sua influência a muitos outros pensadores. Depois de Marx e Weber, é a Tonnies (1855- 1936) que cabe a mais importante produção teórica ao longo de mais de

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cinquenta anos. Juntamente com Simmel é um dos fundadores da Sociologia formal. No final da IIGM a sociologia estava decadente: " exangue na Alemanha, desdenhada em Inglaterra, ignorada em Itália." (CUIN, 1995, 173). Ao contrário, nos Estados Unidos o ensino superior não estava rigidamente organizado, havia abundância de meios materiais disponíveis, as universidades faziam concorrência entre si e, a influência de Spencer e do pragmatismo dava origem a ideias reformadoras. Em 1876, foi leccionado em Yale o primeiro curso de sociologia e em 1893, Small iniciou em Chicago a primeira cadeira de especialização em sociologia. Em 1895 foi criada a revista "American Journal of Sociology" e em 1905 foi criada a Sociedade Sociológica Americana. A sociologia americana foi iniciada por pensadores e investigadores das mais diversas áreas e não profissionais de sociologia. A sociologia americana começou a desenvolver-se na Segunda metade do século XIX, fortemente caracterizada pelas ideias liberalistas e darwinistas e sob a influência determinante de Herbert Spencer. Ao chegar o século XX, eram mais de 160 as universidades e Colégios que tinham cursos de sociologia com destaque para a Escola de Chicago que veio a constituir um importante núcleo de reflexão e produção teórica graças aos trabalhos de Small, Park, Thomas, Cooley e especialmente Mead com o interaccionismo simbólico. Depois de Chicago, em Harvard a sociologia é introduzida por Pitirim Sorokin, e posteriormente, Talcot Parsons eleva-a ao mais alto expoente, não só, por dar a conhecer as principais correntes europeias, mas por desenvolver uma teoria geral da acção e, mais importante ainda, criar o “estrutural funcionalismo”, escola cuja preponderância na sociologia americana veio a afirmar-se depois do desaparecimento da Escola de Chicago. A tradição liberal da sociologia americana apoia-se em dois elementos essenciais: primeiro, muito mais influenciada por Spencer do que por Comte, crê na liberdade e no bem-estar individual. Segundo, muitos sociólogos americanos adoptaram um ponto de vista evolucionista quanto ao progresso social, embora nem todos estejam de acordo quanto á forma de o atingir. Alguns acreditam no "lessez-faire", e outros teorizam a intervenção do Estado de forma progressiva. Uns e outros são, no entanto, pouco críticos do sistema social capitalista no seu todo. Na prática a sociologia americana é conservadora e ajudou a racionalizar a exploração, o domínio político interno e externo e a desigualdade social. Entre os factores que influenciaram o pensamento sociológico americano conta-se o cristianismo protestante e a sua ética associada. A sociologia tornou-se então uma resposta moral e intelectual aos problemas do dia-a-dia. Por outro lado, a sociologia americana é contemporânea do nascimento do sistema universitário americano no seu conjunto, pelo que obteve logo um reconhecimento institucional. Um outro traço do carácter geral da sociologia

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americana é o facto de se afastar de abordagens históricas e buscar um carácter empírico de tipo científico quantitativo, acusando pouca ou nenhuma influência de Weber, Marx e Durkheim. Antes de Parsons a sociologia americana é especialmente representada pela escola de Chicago. Esta escola está profundamente ligada à religião e muitos dos seus membros são ministros religiosos afirmando, que o objectivo último da sociologia deve ser cristão. A escola de Chicago visa uma produção científica com vista ao melhoramento social. Pretende afastar a sociologia de esquemas teóricos abstractos e aproximá-la dos problemas reais através da produção de estudos empíricos. Um dos seus objectivos é conhecer o que as pessoas pensam, e de que forma a sua maneira de pensar as afecta. Isto é, a perspectiva da escola de Chicago é microssociológica e afasta-se radicalmente dos estudos macrossociológicos europeus de Durkheim, Marx e Weber. A Escola de Chicago é representada por THOMAS, W. I. (1863-1947) e por Robert PARK (1864-1944) especialmente ligados, a questões de emigração e à ecologia humana ou sociologia urbana. Estes autores fazem estudos sobre o comportamento humano em meio urbano. A cidade é um excelente campo de observações pois nela existe todo o tipo de problemas próprios do espaço urbano, desde a não integração dos emigrantes, á violência e marginalidade social etc. Na escola de Chicago predominam os estudos descritivos e culturalistas. Duas outras figuras se tornaram centrais na Escola de Chicago: Charles Horton COOLEY e George Herbert MEAD. Estes dois autores estão ligados á Escola através da mais destacada contribuição dessa mesma Escola: O interaccionismo simbólico. Tanto Cooley como Mead recusaram a perspectiva behavorista aplicada aos seres humanos pois, entendiam que estes não respondiam cega e inconscientemente a estímulos externos. Ao contrário, postularam a importância da consciência moldada pela interacção social contínua. Isto é, recusam separar a consciência do contexto social. Do ponto de vista metodológico o interaccionismo recorreu à observação sistemática do comportamento humano. Observou o que fazem os homens, enquanto actores nas mais diversas situações, no intuito de compreender os significados que estes atribuem às suas acções, e bem assim, os motivos que as desencadeiam. Utilizou o método da introspecção compreensiva, que consiste em tentar colocar-se no lugar do outro. Este método muito criticado, foi por muitos considerado não científico. Mead aumentou a capacidade desta corrente e tornou-se o mais destacado pensador do interaccionismo. Não tinha formação sociológica mas filosófica. Mead começou a ensinar filosofia na Universidade de Chicago em 1894 e aí permaneceu até à sua morte em 1931.

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A Escola de Chicago entrou em crise após a morte de Mead e o afastamento de Park. Muitos dos seus estudos ficaram marcados por perspectivas pessoais dos seus autores. Park, por exemplo, foi progressivamente fugindo à utilização de estatísticas que lhe pareciam obstáculos à compreensão da subjectividade da acção social. Pese embora a sua enorme importância nos anos vinte e trinta do século XX as criticas e as oposições à Escola foram-se acentuando e a concorrência de outras universidades, que se começaram a destacar, tal como Harvard, contribuíram também para o declínio de Chicago. Assim, o interaccionismo ficou em grande parte circunscrito a uma tradição empírica oral facilmente ultrapassado pelas grandes formulações teóricas mais elaboradas e escritas como o estrutural funcionalismo. Na Universidade de Harvard a sociologia começou a destacar-se com a chegada de Pitirim Sorokin que aí organizou o primeiro departamento de sociologia. Foi nesse departamento que Talcott Parsons se viria a destacar, quer como introdutor do pensamento europeu na sociologia americana e autor de importante contributo teórico fundamental para a sociologia, quer pela sua grande popularidade entre os alunos. Talcott Parsons viria aliás, a ser professor de figuras destacadas do estrutural funcionalismo tais como Robert Merton, Kingsley Davis e Wilbert Moore. A sociologia americana até Parsons foi marcada pelo empirismo e a realização de grandes inquéritos, tradição encerrada na América por Myrdal (1944) e Riesman no princípio dos anos quarenta. Depois deles, Teodoro Adorno em 1950, faz já a ponte para a nova tradição empírica que virá a ser representada por Samuel A. Stouffer e Lazarsfeld. Este novo grupo de empiristas dedicados à realização de grandes inquéritos situa-se já numa linha de pensamento diferente da linha tradicional e com uma orientação individualista quantitativa e nominalista. Do ponto de vista epistemológico estes inquéritos são sustentados pela crença de que o indivíduo é uma fonte segura de verdade para aceder ao todo social. Só o comportamento individual é directamente observável e positivamente testável. As estruturas sociais são, por isso, vistas como sendo um resultado da agregação dos diferentes indivíduos que as compõem, e os comportamentos individuais vistos como resultantes da influência que as estruturas produzem nos indivíduos. Esta corrente empirista é muito inspirada no behavorismo atribuindo um papelcentral às atitudes, que infere a partir das opiniões individuais emitidas em situação de inquérito. A estatística é a técnica cujo desenvolvimento permitiu pôr em evidência as convicções empíricas. É uma sociologia pragmática que ignora completamente a teoria por não acreditar na sua relevância. É interessante constatar que a teoria estatística aplicada às ciências sociais e a maior parte de todos os métodos quantitativos de análise do social foram

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criados fora da América, no seio de grandes tradições teóricas. No entanto, nunca como nos Estados Unidos atingiram tal grau de importância, pois na Europa, foram sempre consideradas técnicas ao serviço de pontos de vista teóricos de enquadramento do real social. Foram os americanos que usaram estas técnicas assumindo-as como modelo de leitura do real, que se impõe por si. Não se pense no entanto que não há reflexão epistemológica. Lazarsfeld representa uma abordagem que se debruça intensivamente sobre os aspectos teóricos e metodológicos das técnicas de inquérito e amostragem, recolha e tratamento de dados. Este autor é responsável pela cientificidade dos inquéritos sociológicos. Pretende mostrar que estes podem ser realizados segundo as técnicas de controlo científico e sujeitos a uma disciplina intelectual normativa. Deve-se-lhe o desenvolvimento da técnica de tradução das proposições reais em proposições formais capazes de se converterem em indicadores operacionalizáveis. Estes indicadores, por sua vez permitem a construção de índices sintéticos e tipologias para medir fenómenos sociais segundo técnicas de inferência estatística baseada nas probabilidades. As Teorias Feministas surgiram no seio da teoria sociológica a partir dos anos sessenta e caracterizam-se por uma abordagem da vida social e das relações humanas a partir de uma perspectiva feminista da sociologia dos géneros. Podemos dividir as abordagens feministas entre: Funcionalistas, teorias do conflito e neo-marxistas sob a forma de abordagens macro-sociais baseadas, todas, na convicção de que as mulheres ocupam uma posição subordinada no grupo doméstico correspondente a uma situação social, e não a uma colecção de situações individuais. É a própria organização social que gera esta situação de subordinação e, portanto ela impõe-se às mulheres coercivamente. Interaccionismo simbólico e etnometodologiasob a forma de abordagens micro-sociais, afirmando que o género se produz a partir das relações interpessoais. As questões feministas andam em torno da situação das mulheres enquanto situação diferenciada da masculina por acção da sociedade. Esta diferença é considerada como desigualdade social, como inferioridade de grupo, resultante da opressão masculina, mas também, em função de privilégios diferenciados. As respostas à questão básica de, como deve ser explicada a diferença entre a vida das mulheres e a dos homens, encontram variadíssimas perspectivas e orientações. As teorias feministas são múltiplas e encontraram respostas que passam pela explicação da situação social das mulheres em função de critérios bio-sociais, institucionais, culturais, relativos à interacção social, psicológicos etc.

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Entre os estudos feministas funcionalistas, destacam-se os trabalhos de Miriam Jhonson a partir de 1988. No seio da teoria dos conflitos, o trabalho que mais se destacou na perspectiva feminista foi o de Janet Chafetz. Ao nível do interaccionismo simbólico, destacam-se Cahill e Goffman enquanto que no campo da etnometodologia, são de referir Fenstermaker e Zimmerman. Outros nomes destacados do feminismo sociológico são Carol Gilligan, Deborah Tannen, Ruddick, Kaufman, Richardson, Bate, Helen Cixous, Campbell, Briget Berger e Peter Berger, Garfinkel, Luce Irigary, Jessie Bernard, Kuhn, Norma S. Chinchilla, Nancy Folbre, Marth Giminez, Nancy Chodorow, Dorothy Dinnerstein, Dorothy E. Smithetc. Um dos grandes temas de discussão no seio da sociologia depois dos anos sessenta liga-se com a compreensão do mundo actual. Pretende-se saber se estamos perante novas formas sociais que já não podem ser explicadas pelos paradigmas e teorias clássicas da sociologia, ou se esses quadros teóricos ainda são explicativos do mundo actual. As interpretações mais uma vez divergem. Alguns sociólogos contemporâneos afirmam que nos encontramos numa sociedade moderna evoluída, e que a sociologia dos clássicos, eventualmente complementada com o pensamento social do século XX, pode explicar a realidade social. Outros autores preferem falar numa sociedade pós-moderna, para referir uma época distinta do passado e, do passado recente, a qual já não pode ser explicada pelos paradigmas sociológicos existentes, uma vez que eles foram construídos para compreender um mundo que em poucos anos deixou quase completamente de existir. Em sociologia, as narrativas da modernidade foram essencialmente construídas pelos fundadores: Marx, Weber, Durkheim e Simmel. Marx desenvolve o seu estudo da modernidade associando-a ao sistema económico capitalista e aos problemas que dele decorrem nomeadamente da desigualdade da alienação e da exploração, dos operários pelos capitalistas. Weber caracteriza a modernidade como a época de desenvolvimento e institucionalização da racionalidade social. A racionalidade abarca progressivamente todos os domínios. Na economia gera o sistema capitalista europeu, na administração do Estado gera as modernas burocracias. Na vida social gera um aprisionamento da liberdade individual e uma desumanização progressiva. Durkheim entende que o carácter da modernidade se distingue do da pré-modernidade pelo estabelecimento de vínculos sociais de tipo orgânico. A solidariedade ou mecanismo social que mantém a sociedade integrada ou coesa, passa a ser caracterizada pelo reforço da liberdade individual, multiplicidade de papéis desempenhados pelo mesmo indivíduo em sucessão e espacialmente separados. A consciência colectiva enfraquece e a vida moral degrada-se em certa medida que é preciso combater. O controlo social abranda

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e o indivíduo sente-se relativamente perdido na complexidade de normas mutáveis e muitas vezes mal definidas, caindo em estado de anomia – uma patologia social. A narrativa de Simmel incide especialmente no estudo da vida urbana e na economia monetária que caracterizam a modernidade. Podemos perguntar se estas ou a maior parte destas características são aplicáveis ases sociedades onde vivemos, ou se carecemos de novos quadros teóricos. Antonny Giddens, um dos mais proeminentes sociólogos actuais, desenvolveu uma leitura particular da sociedade actual tendo-a considerado a fase radical dessa modernidade. Essa radicalidade não é uma absoluta diferença em relação ao passado e ao passado recente. É antes uma consequência da acumulação no tempo dos efeitos particulares da modernidade. Giddens considera a modernidade actual como extremamente dinâmica, marcada pela supressão do espaço e do tempo possível com a utilização das novas tecnologias, e produzindo grande número de conflitos e contradições, e muito em especial, um sentimento generalizado de insegurança. Para o autor de As consequências da modernidade, a época moderna caracteriza-se pelas suas quatro instituições básicas: capitalismo, industrialismo, vigilância e poder militar. Giddens constrói uma interpretação estruturalista da modernidade e apresenta-a como caracterizada pela distanciação e descontextualização das relações sociais e, pela reflexibilidade, elementos associados ao Estado Nacional. A radicalização da modernidade conduziu à standardização e esvaziou os sentidos do tempo e do espaço permitindo uma racionalização cada vez maior e criando uma cultura de risco. Entre outras leituras da modernidade encontra-se também em destaque a de Jurgen Habermas. Considerado um dos expoentes máximos do Neo-marxismo, Habermas alargou as suas perspectivas a muitas outras influências, tendo dedicado particular importância ao estudo da comunicação. Mais que os temas clássicos do marxismo e das relações de produção interessou-se pelos problemas da distorção da informação e da liberdade de comunicação no mundo actual. Tal como Marx, entende que a modernidade ainda não está completa mas o mundo avança nessa direcção. Acredita assim ainda numa grande narrativa da história o que o coloca em oposição ao pós-modernismo. Outra teoria social (não propriamente sociológica) que considera determinante o papel da estrutura social é o estruturalismo. Este distingue-se muito claramente do estrutural funcionalismo. Esta última teoria, como já vimos refere-se aos

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aspectos da estrutura social enquanto sistema de manutenção da coesão social. O estruturalismo, de modo diferente, refere-se à estrutura simbólica que se manifesta em toda a acção social e que não é imediatamente visível. Esta estrutura social é essencialmente linguística e operatória e permite a leitura em termos linguísticos ou semióticos da vida social. O estruturalismo como teoria social, ou seja, de análise do social mediante critérios externos à sociologia, mas que relevam das ciências sociais e são essencialmente multidisciplinares, surgiu a partir do paradigma de análise linguística do suíço Ferdinand de Saussure (1857-1913) nos anos setenta do século XX. Saussure havia feito uma diferenciação entre língua e palavra em que a língua era considerada como constituindo um sistema formal de elementos fonéticos cujas relações entre si eram governadas por leis. A língua era vista como uma estrutura em que o significado de cada signo se estabelecia pelas relações de similitude e oposição que estabelecia com os outros signos num quadro referencial particular. Não existia qualquer significação independente do sistema de significações que é a língua. Este paradigma de análise foi estendido para além das fronteiras da análise linguística e tomou o nome de semiótica, quando aplicado à análise da comunicação no meio social em geral, incluindo a linguagem gestual, simbólica etc., trabalho que foi desenvolvido por Rolland Barthes. A aplicação da teoria estruturalista da linguística à antropologia cultural foi feita pelo antropólogo francês, Claud Lévi-Strauss. Considerado como pai do estruturalismo, aplicou o paradigma de Saussure ao estudo dos mitos e dos sistemas de parentesco nas sociedades primitivas. Considerou que o sistema de trocas sociais, como a troca de esposas e o sistema geral de parentesco, não poderia ser interpretado senão referindo-se ao seu contexto particular. Assim, tal como no caso da língua os elementos do parentesco definiam-se pelas relações estabelecidas entre si, sem qualquer valor absoluto fora do seu sistema. Lévi-Srauss considerou, posteriormente, que estes sistemas eram inconscientes para os sujeitos neles implicados e resultavam das estruturas lógicas mentais dos indivíduos. Os mesmos sistemas, instalados inconscientemente nas mentes humanas regiam-se por leis que importava conhecer para compreender os sistemas, quer linguístico, quer de parentesco que delas emanam. O marxismo fez também uma adaptação estruturalista, embora remeta a sua influência não para Saussure, mas para o pensamento do próprio Marx. Efectivamente Marx também advogava uma estrutura subjacente e escondida na realidade social. Os marxistas estruturais preocuparam-se em encontrar a estrutura social entendida como pré-requisito para a compreensão da história humana que a reflecte. Os principais representantes desta corrente são Althusser, Nicos Poulanzas e Maurice Goudelier. A estrutura social é

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considerada real mas, aqui já não se trata da estrutura da mente como em Lévi-Stauss mas da própria estrutura da sociedade, como no estrutural funcionalismo e nas outras grandes abordagens institucionais e holistas. O marxismo estrutural é, acima de tudo, anti-empirista e procura um meio de identificar a estrutura escondida na realidade social, não observável directamente, continuando a ser como na teoria clássica um fenómeno eminentemente económico. Uma corrente teórica extremamente recente que se distingue do estruturalismo, pelo facto de considerar a estrutura social não constrangedora do indivíduo, uma vez que resulta apenas da escrita que é independente dos indivíduos, tomou o nome de pós-estruturalismo. A estrutura não existe na linguagem mas no discurso acerca da linguagem. A linguagem é instável e mutável, não está sujeita a uma estrutura constrangedora e apenas a escrita está nesta situação. O pós-estruturalismo representado por Jaques Derrida, apresenta-se como um projecto teórico hostil às grandes narrativas e à existência de uma lógica interna ao desenvolvimento social. A crença nesse ponto de vista logocêntrico, diz o autor, marcou erradamente todo o pensamento ocidental e levou ao fechamento do pensamento filosófico e social e, deve agora ser desconstruido. Michel Foucault é sem dúvida o mais conhecido dos pós-estruturalistas e faz uma abordagem personalizada da atitude pós-estruturalista, que se distingue da que acabámos de referir. Trata-se de um pós-estruturalismo, pois não é já uma abordagem do ponto de vista linguístico, mas caracteriza-se por uma multiplicidade de influências, nenhuma delas dominante no pensamento do autor. As posições de Foulcault, reflectem o ponto de vista weberiano relativo á racionalização mas distinguem-se deste, e reflectem as ideias marxistas não se confundindo com elas. No seu pensamento, sem vínculo a qualquer corrente, cruzam-se perspectivas fenomenológicas, estruturalistas e nietzianas. A classificação do pensamento de Michel Foucault como pós-estruturalista deve-se precisamente a esta multiplicidade de influências teóricas. O pós estruturalismo evoluiu ao longo da última década para o que se tem chamado pós-modernismo, corrente ou tendência teórica ainda pouco definida e pouco distinta da primeira, excepto no que respeita a uma radicalização das suas teorias. O pós-modernismo parte do princípio de que nos últimos anos, a sociedade capitalista sofreu modificações e rupturas tão significativas que deram origem a uma nova sociedade claramente diferenciada da sociedade moderna. Esta ruptura radical com o passado segue imediatamente a época dita moderna e toma o nome de pós-modernidade. A pós-modernidade tem como correspondente na esfera da produção cultural o pos-modernismo, cujos objectos culturais são totalmente diferentes dos modernos. Por outro lado, na esfera da reflexão acerca do social, a pós-modernidade caracteriza-se pelo

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surgimento de novas teorias que afirmam o fim da época moderna. O pós-modernismo pode ser observado na arquitectura, que reflecte uma impossibilidade de descobrir soluções racionais para a maior parte dos problemas sociais, e deixa de construir edifícios enormes destinados a erradicar a pobreza e a miséria humanas. Após modernidade radica na crença de que não existe apenas uma maneira de responder a qualquer pergunta formuladas mas que, ao contrário, haverá sempre uma multiplicidade de pontos de vista a aplicar a qualquer explicação do social. Ao nível cultural o pós-modernismo caracteriza-se por uma produção massificada, dirigida para as técnicas de cópia e não de criação. A teoria social pós-moderna tende a ser relativista irracional e niilista, baseada nos pontos de vista de Foucault e Nietzsche. É contrária a uma grande narrativa da história, fragmentada e dispersa nos seus interesses e nas suas explicações. É, no fundo, anti-histórica. Jean François Lyotard distingue-se entre os mais famosos pós-modernistas. Rejeita a narrativa sintética da humanidade e procura teorizar a diversidade e a diferenciação, os aspectos locais, limitados e circunscritos da actividade e da vida social. Procura a diferença e aceita o incomensurável numa atitude amplamente anti-positivista. Tanto Lyotard como Derrida não são sociólogos mas constróem as suas teorias sociais. Outra corrente ainda no âmbito do pós-modernismo que, no entanto afirma existir uma continuidade entre os dois períodos, é representada pelos estudos de Frederic Jameson. Este autor acredita que relativamente à época moderna, na pós-modernidade existe uma continuidade no sistema económico e uma ruptura ao nível cultural. Existe uma diferenciação cultural pós-modernista que reflecte uma pluralidade de influências culturais diferentes. Segundo Frederic Jameson, a cultura moderna é superficial, imitativa, e portanto constitui uma cultura de simulacros. Os simulacros já nem sequer são cópias do original mas cópias de representações de objectos originais. Isto é são cópias de coisas que não existem, e que por sua vez, são representações de outras, despojadas de expressividade emotiva, e portanto, alienadas e impessoais, carentes de dimensão histórica, fragmentadas e descontínuas. O facto de esta cultura destruir as emoções leva ao surgimento de sentimentos generalizados de indiferença e incapacidade de percepção da própria complexidade da manipulação cultural levada a cabo pelo e dentro do sistema. O actor encontra-se perdido face à abundância de informação e precisa de ser localizado por meio de mapas do real. Estes mapas ou pontos de vista orientados por diversas selecções particulares feitas a partir da totalidade do real, chegam ao actor social através das mais variadas formas de produção de informação: pela literatura, pela ciência, pela TV etc. Jameson tenta fazer uma síntese do pós-modernismo e do pensamento marxiano. Para isso incorpora variadíssimas posições teóricas, algumas delas

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contraditórias entre si. A rejeição das grandes narrativas teóricas e a assunção de pontos de vista fragmentados e dispersos contraria o esforço histórico da sociologia de se constituir como ciência e encontrar uma teoria sintética geral. Rejeitar narrativas significa rejeitar a produção teórica histórica da sociologia. Qual será o futuro da sociologia depois de mais este contributo para a conflitualidade interna? 4. Os autores Anthony GIDDENS Anthony Giddens nasceu em Londres em 1938. Foi o primeiro membro da sua família a frequentar a universidade. Estudou nas universidades de Hull, Londres e London School of Economics, onde se veio a tornar director. Foi leitor e professor em Leichester, Cambridge e King´s College e várias universidades americanas e canadianas. em 1985 tornou-se directoe da Polity Press e tem sido considerado o guru de Tony Blair. Possui mais de 30 livros e 200 artigos publicados em 22 línguas. Construiu uma teoria própria da estruturação social. Jurgen HABERMAS Ver autores do capítulo 2

Capítulo 3 – Teoria Crítica, Marxismo e Neo-marxismo

1. Competências a adquirir Depois de completar o estudo deste capítulo deverá ser capaz de: - Distinguir marxismo de teoria crítica e neo-marxismo. - Nomear os principais representantes teóricos do marxismo, teoria crítica e neo-marxismo. - Explicitar o objectivo central do marxismo. - Dizer qual a época histórica de desenvolvimento do marxismo, da teoria crítica e do neo-marxismo. - Explicitar quais as principais correntes a que se opôs o marxismo. - Explicitar o ponto de vista marxista em relação à importância do capitalismo na história humana. - Mencionar as principais obras e autores que criaram o marxismo. - Relacionar marxismo com nacionlismo e colonialismo. - Mencionar termos que remetam para a concepção da modernidade em Marx.

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- Explicar a ambivalência do marxismo em relação á moderidade. - Relacionar Teoria Crítica e Escola de Frankfurt. - Mencionar o autor e respectiva obra clássica fundadora da teoria crítica, incluindo a data da primeira publicação. -Mostrar, por argumentos, como a Teoria Crítica segue uma tradição crítica que já vinha do passado e mencionar os principais momentos dessa tradição. - Distinguir marxismo crítico de marxismo científico. - Explicitar a noção de teoria crítica segundo Horkheimer. - Conhecer a relação entre teoria crítica e materialismo. - Explicitar as principais tradições a que se opôs a teoria crítica, ao nível teórico. - Explicitar o vínculo que liga teóricos críticos e " classes governadas". - Caracterizar, do ponto de vista intelectual, a teoria crítica enquanto doutrina. - Explicitar o conceito marxista que se encontra no centro da teoria crítica. - Mencionar principal representante da teoria crítica nos EUA, a sua obra mais conhecida e a articulação das suas ideias com a Escola de Frankfurt. - Explicar em que consistiu a principal divergência entre Popper e Adorno. - Explicitar as ligações entre a teoria crítica e a crítica económica pré-marxista. - Explicar as principais contribuições de Habermas para a teoria crítica. - Situar Habermas relativamente à teoria crítica e à Escola de Frankfurt. - Mencionar os principais acontecimentos históricos que são reflectidos pela teoria crítica. - Distinguir teoria crítica de marxismo ocidental. - Referir o nome do criador da expressão "marxismo ocidental". - Situar temporal e geograficamente o "marxismo ocidental". - Situar Gramsci na tradição do pensamento marxista. - Enunciar os nomes dos principais representantes do marxismo ocidental. - Explicitar as áreas em que se concentrou o marxismo ocidental. - Relacionar o marxismo ocidental com a Revolução de Outubro. - Relacionar o marxismo com o movimento trabalhista e com o movimento anticolonialista ou anti-imperialista. - Relacionar o marxismo com o feminismo. - Posicionar o marxismo em relação a outras ideologias políticas, nomeadamente o liberalismo, o radicalismo, a social-democracia, a democracia cristã o anarquismo, o anarco-sindicalismo e o populismo russo. - Explicitar a evolução do marxismo entre as duas guerras mundiais nos principais países europeus. - Explicitar a evolução do marxismo após a Segunda Guerra Mundial, na Europa, América Ásia (nomeadamente, na China) e África. - Explicitar a evolução do pensamento académico marxista após a Segunda guerra Mundial, a sua importância na América e principais representantes.

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- Referir o criador da " análise do sistema mundial” (ver também mais detalhadamente no capítulo 10 do manual).

2. Conceitos prévios Capitalismo Modernidade Liberalismo Dialética Positivismo Social Democracia Fascismo Materialismo Imperialismo Economia Política Estrutura Troca Reflexibilidade Esquerda/Direita Ideologia Materialismo Idealismo Hegelianismo Dialética Teleonomia Capital/ Capitalistas Trabalho/ Operários Mercadoria Forças de produção Mais valia Valor de uso Valor de troca Capitalismo Socialismo Imperialismo Revolução Reformismo Revisionismo Classe social Luta de classes Ideologia

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Alienação Reificação

3. As ideias Introdução Designa-se por marxismo, um conjunto de doutrinas políticas e de teorias sociais, sociológicas, económicas, políticas, etc. que se encontraram na base ideológica da acção de muitos paridos socialistas e comunistas, e que derivam todas da obra de Karl Marx e Friedrich Engels. Esta " visão do mundo" desenvolveu-se apenas após a morte de Marx e teve grande importância, não só do ponto de vista intelectual, mas especialmente do ponto de vista dos modos de vida e organização política de, aproximadamente, um terço da população mundial, durante o século XX. Poderemos talvez afirmar que o marxismo, nas suas múltiplas vertentes foi o fenómeno mais marcante da cultura, da história, da economia e da política do século XX, quer como condutor da acção humana, quer como objecto de reacção e rejeição. Existe uma série de teorias que são directamente subsidiárias do pensamento de Marx embora, muitas vezes seguindo orientações muito diversas. Daí falarmos em Marxismos e não em Marxismo. Após Marx, as teorias marxistas seguiram de perto a convicção determinista economicista do seu inspirador. Este determinismo económico é caracterizado pela crença na existência de uma teleonomia na história humana determinada pela proeminência dos factores económicos da vida social. Assim, a economia e as lutas sociais que ela gera necessariamente, são tidos como o motor da mudança social e da evolução histórica. As outras dimensões da vida humana, tais como a política, a religiosa etc. encontram-se subordinadas aos aspectos económicos. A concepção determinista e economicista da teoria marxista, parece ter atingido o seu máximo no período que vai entre 1889 e o início da primeira guerra mundial. Na esteira de Marx e Engels, Karl Kautsky e Eduard Bernstein mantiveram a convicção de que o sistema capitalista, por natureza e lógica interna, produziria crises e contradições internas capazes de o levarem à auto-destruição. No entanto, não desistem da ideia de estimular o proletariado a acelerar essas crises, com o fim de antecipar o que a história produziria por si: o fim da sociedade sem classes.

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A importância da acção individual é relegada para segundo plano pois entende-se que todo e qualquer pensamento individual é gerado pela infra-estrutura económica e pela posição dos indivíduos no processo produtivo. O marxismo inicial foi alvo de várias críticas e reflexões que viriam a dar origem a outras perspectivas de inspiração marxista. Assim, surgiu uma corrente crítica de inspiração hegeliana representada por Georg Lukács e por Antonio Gramsci. Esta corrente teve como objectivo ultrapassar as limitações do detreminismo economicista e introduzir o subjectivismo na reflexão marxiana. Lukács reformula os conceitos centrais de reificação e consciência de classe. Trabalha o conceito de comodidades, ou seja, bens materiais produzidos pelo sistema capitalista que se impõem aos indivíduos como se fossem independentes deles, quando na realidade são inventados e produzidos pela própria sociedade. Lukács critica o Fetichismo destas comodidades que se impõem ao homem como se tivessem uma existência natural. A reificação diz respeito ao mesmo fenómeno mas estendido às instituições, à lei, ao Estado etc. Todas as formas apresentadas ao homem lhe parecem naturais e, com uma existência independente dele, quando na realidade, são produtos da ordem capitalista. Ao estudar o conceito de consciência de classe, vai debruçar-se essencialmente sobre a falsa consciência, e afirma que, as classes que não são especificamente capitalistas, são uma sobrevivência do passado. A pequena burguesia e o campesinato não se encontram em condições de desenvolver uma verdadeira consciência de classe. Apenas o proletariado, face à sua posição estrutural na sociedade capitalista, é forçado a tomar consciência da sua situação de classe e, concomitantemente, pelo desenrolar da sua luta consciente, força na grande burguesia a sua respectiva consciência de classe. A luta de classes resulta assim, simultaneamente, de posições económicas e da existência de uma verdadeira consciência de classe. Estamos então ao nível de uma dialética entre estruturas e ideias o que pode ser considerado, como uma forma de evolução ou de ligação da perspectiva determinista ao marxismo moderno, que se virá a desenvolver mais tarde. O marxismo hegeliano é também representado pelos trabalhos de António Gramsci. O seu grande objectivo foi uniformizar a teoria social com a prática, criticar o marxismo ortodoxo e o seu carácter positivista e cienticista, em particular o determinismo económico e a insistência na ligação particular entre infra-estrutura e superstrutura, a inevitabilidade das leis históricas e o colapso necessário do capitalismo. Pretendeu introduzir no pensamento a dimensão mais humanista, empírica e subjectiva. Considerava que a política a cultura e a ideologia eram independentes da economia. Sublinhou a importância das elites políticas na condução das massas para atingir o domínio político afirmando, que não basta o proletariado, nem sequer a consciência de classe para fazer a

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revolução. As ideias políticas são geradas por intelectuais que as estendem às massas e as põem em prática. As massas não podem tornar-se auto-conscientes sem a ajuda das elites. Insistiu mais nas ideias colectivas que nas estruturas económicas o que reflecte a sua formação hegeliana. Desenvolveu o conceito de hegemonia, que definiu como uma liderança cultural exercida pelas classes dominantes. O conceito de hegemonia de Gramsci teve grande influência no marxismo da pós-guerra apresentando-se como alternativa ao marxismo ortodoxo e permitindo a compreensão da complexidade do capitalismo avançado, e da falta de consciência revolucionária entre a classe trabalhadora que lhe está associada. É também uma alternativa não violenta do marxismo, mais ligada ao liberalismo e ao individualismo que ao modelo Bolshevique. O seu conceito de hegemonia distingue-se claramente do de Lenine e do de Mao Zedong que o usam com sentido político de dominação mais do que de liderança. A teoria critica é herdeira do pensamento marxista de inspiração hegeliana, e embora o primeiro seja datado, esta tem grande importância no pensamento sociológico contemporâneo. As principais contribuições desta teoria são de Marcuse, Habermas, Horkheimer, Adorno, Bottomore, Friedman, Held, Jay, Wiggershaus, Slater entre outros, principais representantes da chamada escola de Frankfurt. De facto, a teoria crítica, assim chamada por fazer uma crítica sistemática dos mais variados aspectos das sociedades contemporâneas, nasceu de um grupo alemão neo-marxista insatisfeito com os destinos do pensamento marxista da sua época. Esta organização ligada ao Instituto de Pesquisa Social de Frankfurt, foi formalmente constituída em 1923. O Instituto fechou às mãos do domínio nazi em 1933, e a maior parte dos seus membros refugiou-se em Nova York num instituto ligado á universidade de Columbia. Após o final da IIGM, alguns regressaram à Alemanha e outros permaneceram ali. Apesar deste percurso americano a teoria crítica é de inspiração e tradição europeia. A teoria crítica inspira-se no pensamento de Marx mas é uma alternativa moderna ao determinismo económico. Constitui uma crítica sistemática à sociedade gerada pelo sistema capitalista, e ao seu sistema de produção de conhecimentos. A teoria crítica continua a afirmar a importância da base económica de uma sociedade, mas não afirma o seu determinismo, pretendendo antes mostrar que no capitalismo avançado a dominação se faz pela esfera cultural e ideológica e não, como no passado, pela esfera económica. Tendo dado grande importância aos aspectos da cultura capitalista, critica também os outros marxismos de inspiração soviética ainda demasiado ortodoxos e economicistas. Como críticos da ideologia e da cultura, os autores da teoria crítica incidem as suas análises na produção científica e intelectual da sociedade capitalista, a

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começar pelo positivismo que acusam de ser desumano, não atender á especificidade dos fenómenos sociais e pretender utilizar o mesmo método par descodificar todo o tipo de fenómenos incluindo físicos e humanos. Acusam o positivismo de esquecer o actor social e o homem e o tratar como indivíduo estatístico, promovendo o distanciamento da elite intelectual relativamente ao resto da sociedade. Acusam o positivismo de ser um sistema de produção de conhecimento elitista, que conduz à passividade, quer os investigadores, quer o seu público sempre restrito, devido ao desenvolvimento de um código de comunicação hermético. A teoria crítica ataca também a própria sociologia considerando-a cienticista e vendo a ciência como um fim em si, de costas voltadas para a realidade social. Esta teoria concebe o pensamento do social como tendo a obrigação de ajudar as pessoas a lutar contra a dominação e a opressão. Sugere a criação de uma sociologia democratizada e ao serviço das comunidades, interventora, implicada nos processos sociais em prole das democracias e dos direitos do homem. Assim, critica a sociologia técnica que reduz os indivíduos a variáveis estatísticas. Enquanto que o marxismo ortodoxo tinha acentuado os aspectos constrangedores da esfera económica sobre as outras dimensões da vida humana, esta nova geração crítica transfere a sua atenção para a dominação, pela via cultural, atacando toda a produção dita cultural que gera dominação, alienação e conformismo. Assim, a televisão é fonte de todos os ataques e os meios de comunicação em geral, uma vez que utiliza processos racionais para exercer a dominação. Isso parece ser ilegítimo aos olhos dos teóricos críticos. Importa não esquecer que a teoria crítica foi moldada, não somente pela influência das ideias de Marx, como também pelas de Weber. Assim, dá importância especial às consequências da radicalização da racionalização da actividade humana. Considera que a racionalidade aplicada permitiu substituir a exploração económica por outras formas de exploração através da tecnocracia. A tecnocracia é vista como um dos lados negativos da racionalização do mundo. A técnica não é neutra e está ao serviço do poder e das classes dominantes, impondo-se pela sua racionalidade que corresponde à racionalidade dos interesses estabelecidos. Friedman apresenta o caso dos campos de concentração nazis como um exemplo de um aparelho altamente racionalizado que não pode ser aceite. Assim, nem tudo o que é racional pode e deve ser aceite. Há muita racionalidade destrutiva e a ciência não pode pactuar na produção de objectos de dominação apenas porque se considera eticamente neutra e se rege pela racionalidade. No seu todo, uma sociedade capaz da destruição massiva e racionalizada, parece ser uma sociedade irracional. Critica-se a indústria de conhecimentos que é representada pelas universidades, institutos de investigação etc., aponta-se o facto de esta viver fechada em si

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mesma como um mundo autárcico, e advoga-se a necessidade de um retorno ao senso comum. A teoria crítica considera que os problemas do mundo moderno derivam, não do sistema capitalista, mas do racionalismo endémico que, por sua vez, gerou o sistema capitalista. Aqui filia-se directamente em Max Weber mas não consegue uma formulação teórica sintética. É apenas uma colecção de críticas à sociedade. Mais que analisar, aponta o que lhe parece errado. A sua contribuição para a sociologia faz-se, por isso, mais pela negativa do que pela positiva. O afastamento que o neo-marxismo fez em relação ao determinismo economicista deixou bastante fragilizada a teoria marxista ortodoxa. Algumas reacções pretenderam devolver ao pensamento marxista a componente económica em lugar de grande relevância, e estabelecer a ponte com o pensamento sociológico. Duas grandes linhas de pensamento estabelecem então a ligação do marxismo com a sociologia económica: os trabalhos de Baran, Sweezy e Braverman acerca das relações entre capital e trabalho, e as reflexões acerca do fordismo e pós-fordismo que motivaram autores como Ritzer, Clarke, Womack, Jones, Roo etc., que constituíram uma tradição económica no pensamento sociológico contemporâneo recuperando uma via de pensamento anterior ao neo-marxismo e à teoria crítica. Uma outra contribuição destacada no seio do marxismo é a de Immanuel Wallerstein e o desenvolvimento do seu sistema teórico da Economia-mundo. As ideias apresentadas no manual O Marxismo constitui uma oposição ambivalente à modernidade. Esta corrente de pensamento que acabou por ser aceite no corpo da teoria sociológica tem também uma vertente política activa com vista à mudança social. O marxismo tem origem no pensamento de Marx e Engels e desenvolveu-se entre o final do século XIX e o final do século XX, tendo tido importantíssimas implicações na história desse período. O objectivo político do marxismo foi a denúncia da exploração capitalista, da alienação humana que lhe está associada, o consumismo, as falsas ideologias, o imperialismo etc. O marxismo defende a modernidade apesar das críticas que lhe faz e é um acérrimo defensor do urbanismo contra a " idiotia rural". Do ponto de vista teórico ou científico o marxismo dedicou-se ao estudo do capitalismo, suas contradições e conflitos sociais que lhe são próprios. A corrente designada por Escola de Frankfurt foi uma corrente intelectual marxista que se dedicou a mostrar a contraditoriedade e a negatividade da

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modernidade sem fazer promessas de um futuro melhor. Foi portanto uma teoria crítica. Momentos da tradição crítica As teorias críticas já tinham surgido antes a Escola de Frankfurt. Surgiram na Europa do século XVII e podem ser consideradas uma tradição alemã que inclui o pensamento de Kant, dos hegelianos de esquerda, Marx e Engels etc. Chamou-se crítica da economia política à ciência a que se dedicou Marx. Como corrente, a Teoria Crítica foi definida por Max Horkheimer em 1939, então director do Instituto de Frankfurt. Esta teoria pretende ser uma reflexão filosófica/crítica da dialéctica da economia política. Esta teoria é ao mesmo tempo um código de leitura do materialismo dialéctico e uma crítica do mesmo. Mantinha igualmente uma relação especial com o proletariado e afirmava a primazia da economia. A teoria crítica opunha-se à teoria cartesiana tradicional e, demarcava-se da divisão intelectual do trabalho, ou seja, das formas de concepção teórica existentes antes dela. O objecto da teoria é a sociedade e a sua transformação acelerada pelo trabalho intelectual. Do ponto de vista intelectual, esta teoria é uma conceptualização formal baseada na lógica dedutiva e na experiência, centrada no conceito marxista de troca. A Teoria Crítica, após o declínio da Escola de Frankfurt, prosseguiu o seu desenvolvimento nos Estados Unidos onde se refugiaram grande parte dos investigadores europeus de origem judia. Ali, teve um novo expoente, no americano Wright Mills, através da obra, Imaginação sociológica de 1959. Em 1961 A Associação Alemã de Sociologia confrontou Adorno com Popper acerca dos conceitos de Teoria Crítica. A principal divergência entre eles dizia respeito ao objecto do criticismo. Para Popper, o objecto da crítica deveriam ser as teorias e as soluções que elas apresentassem para resolver os problemas sociais. Para Adorno, o objecto da crítica deveria ser a própria realidade social. Apesar de toda a evolução no pensamento marxista este nunca cortou radicalmente com a crítica da economia pré-marxista. Habermas trabalhou nesse sentido e substituiu os conceitos de forças de produção e de relações de produção pelos conceitos de trabalho e interacção simbolicamente mediada. Por isso, Habermas abandonou a contradição sistémica a que e referem os conceitos marxistas substituindo-a pelas noções de diferentes tipos de acção, interesses de conhecimento e conflito entre o sistema social e o mundo quotidiano. Habermas nunca se considerou sucessor da Escola de Frankfurt e foi sempre autocrítico em relação à teoria crítica. Cortou os laços com a crítica da economia política e com os discursos anteriores a si.

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A teoria crítica que se baseou na reelaboração da crítica da economia política de Marx deve ser entendida no enquadramento específico da História do século XX. Podemos afirmar que a teoria crítica constituiu uma reflexão acerca do processo histórico de desenvolvimento da modernidade europeia. O Marxismo ocidental e os outros A teoria crítica é geralmente vista como uma parte do "marxismo ocidental". A expressão "Marxismo Ocidental" foi criada por maurice Marleau-Ponty em 1950. Trata-se mais de uma atitude intelectual do que de uma tradição ou um movimento propriamente dito. Nasceu como resposta europeia à Revolução de Outubro na Rússia e foi iniciada por dois proeminentes comunistas criticados pelos seus colegas de partido: Georg Lukács em History and class consciousness e por Karl Korsch na obra Marxism and Philosophy, em 1923. A estes dois seguiu-se Antonio Gramsci do Partido Comunista Italiano. O marxismo ocidental foi autónomo em relação ao tradiciona e em relação ao marxismo institucionalizado. São os seguintes os principais autores do marxismo ocidental: Luckács, Korch, Gramsci, Walter Benjamim, Horkheimer, Volpe, Marcuse, Lefébvre, Adorno, Sartre, Lucien Goldmann, Louis Althuser e Colleti. O Marxismo Ocidental opõe-se também ao Trotskismo. O trabalho dos marxistas ocidentais concentrou-se na epistemologia e na estética e criou novos conceitos marxistas. Nunca constituiu um grupo estruturado com consciência e identidade e é antes uma classificação que lhe foi dada posteriormente à sua existência. O marxismo ocidental pode ser vist como a transcendência da distinção entre ciência e ética segundo o modelo da dialéctica hegeliana, afirmando que a acção moralmente correcta é aquela que se baseia no conhecimento correcto da situação filosófica da História e da consciência de classe. Ou seja, uma atitude epistemológica que pretende legitimar a acção do proletariado, a Revolução de Outubro e a liderança de Lenine como um marcos importantes na história mundial. A maior parte dos marxistas ocidentais foram filósofos que se foram aproximando da sociologia e a foram condicionando em função das suas convicções. Marxismo e as rotas da modernidade O marxismo teve grande impacto na história mundial. Entre 1880 e 1970, tornou-se a principal influência intelectual de dois dos maiores movimentos sociais da modernidade: o movimento trabalhista e o movimento anti-colonialista ou anti-imperialista. O marxismo enfrentou forças contrárias

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poderosas mas persistiu no seu esforço de se globalizar, embora não o tenha conseguido com sucesso uniforme. Foi um movimento importante para o feminismo pois foi sempre pró-feminista. No entanto, foi rejeitado por movimentos religiosos e conservadores pelo que não conseguiu um apoio feminino generalizado. No espectro político, o marxismo tinha à sua direita o liberalismo, o radicalismo, e a democracia cristã. À sua esquerda tinha o anarquismo, o anarco-sindicalismo e o populismo russo. Os mais importantes baluartes marxistas encontravam-se na Europa Central e na Europa Oriental onde havia uma forte classe operária ainda sem a experiência da modernidade. Até 1914, o centro de gravidade do marxismo europeu era a democracia social alemã mas a Primeira Guerra Mundial teve grande impacto no futuro do marxismo europeu. A Revolução Russa atraiu ao marxismo grande número de pessoas, quer trabalhadores, quer intelectuais, e novos paridos comunistas estabeleceram-se e começaram a divulgar a obra de Marx e Engels. O marxismo social-democrata perdeu importância e cedeu lugar a uma versão reformista. Na França e na Grã-Bretanha o processo de difusão e aceitação do marxismo foi mais lento, mas a Russia bolchevique fez florescer o marxismo, embora após 1930 se tenha aí unstalado a ortodoxia terrorista estalinista que levou, entre outras coisas, ao exílio de grandes pensadores. É o caso e George Gurvitch e Pitirim Sorokim que trocaram a Russia por, respectivamente, Cambridge e Massachusetts. Uma parte considerável da Europa marginalizou o marxismo. A Segunda Guerra Mundial veio alterar este quadro pois os novos regimes comunistas de Leste institucionalizaram o marxismo que se burocratizou e fossilizou, deixando de estar aberto a teorias críticas ou novas ideias científicas, as quais foram progressivamente sendo silenciadas. Quanto à Europa ocidental, agora virada para a América adopta um pensamento empirista e marginaliza o marxismo enquanto o remete para uma política de extrema-esquerda. Mas na França e na Itália, o marxismo beneficiou da tradição da resistência e da grande maleabilidade da cultura latina, em simultâneo com a tradicional resistência à cultura americana. Por isso, ao nível intelectual o marxismo tornou-se dominante. Além disso estabeleceram-se grandes e poderosos partidos comunistas e socialistas. A Grã-Bretanha, com as suas tradições empiristas não se deixou influenciar muito pela cultura americana e no final da década de 1930 e início da de 1940, viu nascer movimentações políticas de estudantes comunistas tendo vindo a tornar-se o mais importante centro de estudos marxistas empíricos depois da IIGM. No final dos anos 60, a situação política europeia volta a transformar-se decisivamente, desta vez através dos movimentos estudantis, a Guerra do Vietname e a Revolução Cultural Chinesa. Nessa altura, surgiu uma nova

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actualização do marxismo que tomou o nome de neo-marxismo. O neo-marxismo assumiu múltiplas facetas e tornou-se bastante heterogéneo se comparado com o próprio marxismo ocidental. O aspecto mais relevante deste movimento intelectual foi a sua colonização do pensamento sociológico que se tornou altamente permeável às ideias de Marx e passou a considerá-las parte da teoria sociológica. Os nomes mais destacados deste movimento foram: Maurice Godelier, Claude Meilassoux e Emmanuel Terray na antropologia e Piero Safra na economia. A partir da segunda metade da década de 70, este movimento começa a ter menos importância.

4. Autores e obras GRAMSCI, Antonio Antonio Gramsci, um italiano nascido na Sardenha em 1891 e falecido em 1937. Oriundo de uma família pobre de baixa classe média estudou na Universidade de Turim e filiou-se no Partido Socialista Italiano em 1913. Sindicalista, activista político, deixa o partido socialista para, com outros, formar o Partido Comunista Italiano em 1924, ano em que foi eleito deputado. Em 1926 foi feito prisioneiro por Mossulini. Debilitado e vítima de uma hemorragia cerebral não teve tempo para beneficiar da liberdade pois morreria logo depois da sua libertação em 1937.

5. Exercícios de controlo A. Complete os espaços em branco de modo a dar sentido pertinente às frases. 1. O marxismo teve início no pensamento de ___________ e __________. 2. A alienação humana é uma das principais preocupações do _____________. 3. A teoria crítica foi definida como conceito por _______________________. B. Diga se são verdadeiras ou falsas as seguintes afirmações. 1. A teoria crítica é uma corrente americana. 2. Habermas introduziu no marxismo o conceito e interacção simbólicamente mediada. 3. O interaccionismo simbólico é uma teoria de Parsons.

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C. Assinale a única resposta verdadeira. O marxismo ocidental: a) Não teve inspiração em Marx. b) Centrou-se em aspectos estéticos e epistemológicos. c) Foi uma corrente essencialmente desenvolvida por artistas. Soluções A. 1 - Marx/ Engels 2 - Marxismo 3 - Max Horkheimer B. 1 - f 2 - v 3 - f C. b)

Capítulo 4 -Teorias da Acção e da Praxis

1. Competências a adquirir Depois de completar o estudo deste capítulo deverá ser capaz de: - Explicitar a diferença entre comportamento e acção. - Explicitar os pressupostos das teorias da acção. - Explicitar as razões pelas quais não existe uma teoria unificada da acção. - Explicitar a problemática das relações entre acção e estrutura. - Distinguir as perspectivas individualistas da acção, derivadas da sociologia de Max Weber, das perspectivas estruturalistas, deterministas e anti-individualistas derivadas da sociologia da Durkheim e ainda, das perspectivas que consideram as consequências involuntárias da acção. - Distinguir as perspectivas de orientação subjectivista das teorias da praxis.

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- Distinguir, segundo Weber, os conceitos de acção social e relação social. - Explicitar o conceito weberiano de "ordem".

2. Conceitos prévios Tipo-ideal Comportamento Relação social Acção Estrutura Utilitarismo Empirismo Consciência subjectiva Consciência objectiva Norma Conduta Ordem/ desordem Anomia

3. As ideias

Para o estudo deste capítulo deve ler o Capítulo 4 do manual (páginas 108 a 142). Para aprofundar as questões do interacionismo simbólico deve ler também o capítulo n.º 8 do manual. O fundamento das teorias da acção, no século XX, foi a filosofia utilitarista que postulava que a acção humana se desenrolava em função da natureza humana e, portanto, toda a acção correspondia a uma satisfação de necessidades, ou à minimização de perdas ou sofrimentos. A isto, opunha-se o pensamento romântico, que sublinhava os efeitos negativos da acção utilitarista por esta ter carácter oportunista e provocar indirectamente danos sociais. Mas os utilitaristas contrapunham a estes argumentos, a ideia de que a procura do interesse individual poderia também conduzir à virtude colectiva e afirmavam que a responsabilidade das acções individuais devia ser imputada aos actores e não aos constrangimentos das sus acções (estrutura).

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Actualmente, o fundamento filosófico da acção continua a debater-se com problemas semelhantes mas as teorias sociológicas, estão em muitos casos de costas voltadas para a filosofia. Aliás, o traço distintivo da abordagem moderna é a pesquisa empírica distante da problemática filosófica como, por exemplo, fizeram Garfinkel e Goffman. Actualmente, as teorias dividem-se entre: teorias da acção subjectivista, (na esteira de Weber e Parsons) e teorias da práxis (Dewey, Mead, Garfinkel e Giddens). Max Weber Influenciado pelos estudos culturais alemães, Weber colocou o actor e o significado que ele atribui às suas acções, como chave de leitura da acção social. Weber definiu a acção social como sendo "os significados subjectivos que o indivíduo atribui ao seu comportamento" e considerou que toda a acção social é imbuída de significado, embora reconheça que grande parte do comportamento humano não é pensado e não tem, muito significado particular. Muitas vezes os actores não compreendem a totalidade das suas acções. Apesar disso, Weber não chegou às noções de "conduta instintiva" e "inconsciente" e preocupou-se apenas em analisar a conduta compreensível ou acção social. Interessado no carácter científico das análises, procurou um método de generalização, de modo que a variedade de significações atribuídas pelos actores não impossibilitasse a sistematização dos conhecimentos. Foi nesse esforço para compreender o sentido visado nas acções sociais que criou o método idealtípico. O método dos tipos-ideais permite construir padrões regulares na acção, tendo em conta a variabilidade de significados particulares presentes. As suas ideias foram inspiradoras de várias correntes que se desenvolveram no século XX: interaccionismo simbólico, etnometodologia e teoria da escolha racional. Todas estas teorias postulam que só os humanos podem agir de acordo com processos cognitivos e avaliativos e essa característica deve constituir a base de entendimento (de estudo sociológico) do modo como funciona a acção, a formação de instituições e de estruturas sociais. Weber colocou ainda a questão das consequências não intencionais da acção, e esse ponto de vista deu origem a outras teorias da acção, mais interessadas nesses aspectos que nas outras características da acção humana. Ao analisar o "hábito" e a "tradição" Weber compreende o limite da sua perspectiva pois reconhece que aí se encontra ausente o significado particular. Aceita esse limite mas permanece determinado a considerar determinante a sua noção de acção, mesmo tendo de admitir excepções (elas confirmam a regra, diríamos nós portugueses.) Esta perspectiva será posteriormente adoptada por Giddens e Dewey.

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São três as principais características da acção social, segundo Max Weber e, sobre as quais ele desenvolve a sua teoria da acção: 1 - A acção social (comportamento com significado atribuído) é sempre subjectivamente orientada para o comportamento dos outros. Os "outros" não são necessariamente indivíduos, podem ser grupos, populações, ser contemporâneos, antepassados ou de gerações futuras, conhecidos ou desconhecidos. 2 - A "relação social" é diferente da "acção social" pois, segundo o autor, apenas existe "relação social" se vários actores orientarem mutuamente o significado das suas acções". 3 - Pode existir um conteúdo significativo estável em relações de longa duração, conteúdo esse, que pode ser interpretado pelos actores através de máximas, regras ou normas que eles esperam que também orientem a conduta dos outros. É o caso das máximas supra-individuais tais como os preceitos religiosos, códigos burocráticos e regras práticas de sobrevivência, normas associadas a corporações ou ao Estado. Weber ressalva, que mesmo perante normas semelhantes permanece a liberdade individual de orientar a conduta pessoal singularmente. Verificamos portanto, que Weber constrói a noção de máxima ou norma supra-individual como traço ineludível da significação da acção social. A partir desse conceito, ele explica o estabelecimento da ordem de legitimidade. Entende por "ordem" qualquer relação social que se oriente por uma norma superior (não por uma norma pessoal ou privada) ou seja, qualquer relação social que se desenvolva estando presente nos seus protagonistas, a convicção moral de vinculação a um dever independente da sua vontade. Quando os actores se dispõem a agir (comportar-se em função de um significado particular) comprometidos com significados que não são pessoais mas, moral ou juridicamente postulados, estamos em presença de uma ordem legítima. A ordem corresponde, portanto, a um padrão de relação social cristalizado. O autor não pressupõe a estabilidade de toda e qualquer ordem institucional pois ela pode ou não existir. O facto de se ter estabelecido uma ordem legítima (como por exemplo um conjunto de regras burocráticas) tal não significa que os actores a ela adiram pronta e incondicionalmente. É preciso testar o fundamento das acções que pode ser o egoísmo e interesse pessoal de nível inferior ou, o altruísmo e interesse colectivo superior. A contribuição desta teoria para a problemática da desigualdade e do poder, não é especialmente relevante. Talcott PARSONS A produção teórica de Parsons foi por ele designada de "Teoria da acção". A sua primeira obra recebeu o nome de A estrutura da acção social e aborda de

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forma muito abstracta a acção social através de um modelo de explicação que designou de " acto Unidade" (Unict act). As principais ideias anteriores a Parsons, de que ele se apropria para constituir o seu "acto unidade" foram: - Racionalidade meios-fins da acção, retirada das teorias utilitaristas. - Sentido subjectivo da acção social, retirada de Weber e - Integração moral da acção, retirada de Durkheim. Parsons retoma portanto aspectos fundamentais do utilitarismo e introduziu-lhe alterações significativas provenientes das concepções de Acção Racional Instrumental e Valorativa de Weber tendo sempre em consideração o carácter activo dos actores e negando qualquer tipo de determinismo biológico ou socio-cultural. Mesmo par fins difusos ou implícitos Parsons reconhece a motivação individual para a acção social, tendo construído o conceito de "fins últimos". Os fins últimos dizem respeito a princípios que regem cadeias de acções e que se encontram presentes na acção social sob a forma de sentimentos difusos ou atitudes de valor. Este conceito que implica que o interesse que rege as acções humanas pode não ser imediato e directo mas integrar uma cadeia de interesses coordenados e interdependentes pressupõe que o actor atribua às suas acções um qualquer sentido e que percepcione a sua acção, como algum meio para atingir o fim que tem em mente. Isto significa que mesmo em situação de desigualdade social, as acções intitucionais podem interessar aos mais desfavorecidos, tendo em conta os seus desejos e expectativas e, portanto, é possível estabelecer a coesão ou integração social e manter uma certa ordem, fundada na conjugação harmoniosa de interesses diferentes. Parsons dá assim grande ênfase aos valores nas cadeias de acção racional. De que forma o equilíbrio se obtém neste conceito de ordem social, sabendo que os interesses antagónicos dos homens dizem respeito a recursos escassos e ao exercício do poder de coagir os outros? Parsons aproveita aqui as ideias de ordem de Durkheim. Para Durkheim a ordem social impõem-se através da força constrangedora das normas que, o processo de socialzação fornece coercivamente aos indivíduos. As regras portanto, possuem força moral. Mas Parsons, tal como Durkheim considera a existência de violações das normas. Apesar disso, tal como Durkheim afirma a importância marginal do número de infractores às normas. A maioria dos actores permanece respeitador e cumpridor. Parsons afirma que "as normas morais são suficientes para impedir a desintegração numa desordem hobbesiana." Um importante problema que permaneceu por explicar em Parsons foi responder à questão levantada pela complexa finalização instrumental que integra cadeias de acção que têm fins superiores complexos. Ou seja, as várias

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racionalidades que integram tal cadeia são de tipo instrumental e muitas vezes alienam-se do verdadeiro significado moral das cadeias de acção. Por isso as acções podem tornar-se moralmente vazias e é muito difícil atribuir-lhes posteriormente, qualquer valor ético, como se pode verificar pela sociedade contemporânea. Outra questão menos forte no pensamento de Parsons diz respeito à importância relativa dos hábitos e das emoções como causas da acção. Do conjunto vasto das consideradas teorias da acção acabámos de ver dois exemplos de teorias subjectivistas. Avançamos agora para teorias da praxis. John DEWLEY e George Herbert MEAD Weber e Parsons são considerados subjectivistas, pois acreditam que os actos mentais moldam ou dirigem a execução da conduta - subjectividade enquanto fundamento da acção. As teorias da praxis distinguem-se das subjectivistas essencialmente por considerarem muito menor a importância da consciência na acção social. São dois, os mais importantes teoricos da praxis: John Dewey e George Herbert Mead. Mead, não directamente, mas através do seu discípulo Blumer, apresentou um novo modelo básico de comportamento social, chamado interaccionismo simbólico. Esta corrente que se apresentou em formatos muito diferentes, perdurou ao longo do século XX no contexto de grande controvérsia, mas permanece activa actualmente. Contam-se entre as várias correntes interaccionistas, a sociologia do quotidiano, do absurdo, criativa, interpretativa, existencial, fenomenológica, etc. O principal conceito de interesse relevante introduzido pelos autores do interaccionismo simbólico foi o de "interacção". A interacção é definida como o processo pelo qual os seres humanos ajustam os seus comportamentos entre si e com o meio, ou seja, em processos que implicam a consciência e em processos que não a implicam. (quando um homem se relaciona com um objecto, o segundo não tem consciência mas a sua ontologia rege-se por algum tipo de lei material a qual é tida em conta na acção, que assim se torna relação). O conceito de interacção foi trabalhado diferentemente pelos dois autores, mas ambos consideram que o homem age por processos interactivos de ajustamento dando respostas, que podem ser coordenadas mesmo em sequências muito longas. Enquanto Dewey dá grande importância aos hábitos na acção, entendidos como ciclos de comportamento, que servem propósitos económicos (gerir a quantidade de acções da vida humana, dispensando-nos de reflectir em muitas delas), mas que estão sujeitos à mudança como as outras formas de adaptação, Mead centra-se mais nas relações sociais e no papel que a consciência pessoaL desempenha na

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interacção. Mead considera que o ajustamento na interacção é comum a homens e animais, mas os humanos ajustam a sua interacção através de símbolos expressivos. Mead foi também um filósofo pragmatista e contribuiu largamente para a psicologia anti-behavourista. Considerando apenas os aspectos comuns às várias correntes, o programa interaccionista pode resumir-se a quatro pontos fundamentais: 1. Os mundos humanos não são só materiais e objectivos, mas também fortemente simbólicos. Os homens, através da sua capacidade para gerar símbolos produzem culturas e estabelecem complexas redes de comunicação. O processo de interacção permanente leva à construção, reconstrução manipulação e transformação desses significados. 2. A permanente transformação dos significados dá origem a um processo de identidade, história pessoal ou construção do "Eu" em função da percepção do tempo, e de um sentido de ordem – história e civilização. 3. Uma vez que o conceito chave é a interacção, o interaccionismo pretende estudar os processos colectivos cuja unidade mínima de análise é o "Eu" sendo que este pressupõe a relação com o outro. Não é o Eu solitário. A noção de indivíduo é construída através do outro. 4. A investigação interacionista é sempre empírica e relativa às interacções sociais. Harold GARFINKEL Como teórico da praxis Garfinkel preocupa-se em saber como se produzem as acções, quais as " práticas" que os actores desenvolvem no seu dia a dia, no seu modus vivendis. Ora, muitas destas práticas são semi-conscientes, dizem respeito a hábitos e rotinas e os actores não lhes atribuem significados privados quando as executam. Aqui o autor está nas antípodas de Weber, e tende a deixar como marginais no seu pensamento, as condutas fora da esfera da consciência. Por outro lado, ao desprezar as questões filosóficas e dar completa importância à pesquisa empírica, situa-se nas antípodas de Mead. Garfinkel foge à controvérsia porque não entra em desenvolvimentos teóricos e é visto como minimalista, pois concentra a sua atenção em pormenores da acção. Evita mesmo tratar a questão da consciência e assenta todo o seu raciocínio na premissa fundamental de que "a acção social constitui uma realização activamente produzida (...) os actores sociais sabem como produzir uma acção, mas a maior parte do tempo mantêm apenas uma consciência tácita daquilo que sabem" - praxis. Garfinkel observa que os procedimentos que rompem com uma ordem cognitiva estabelecida, causam frustração nos actores e ele debruça-se sobre o

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estudo dos procedimentos que os actores utilizam para estabelecer essa ordem cognitiva. Percebeu através das suas análises empíricas, que essa ordem cognitiva se produz mediante procedimentos costumeiros e recíprocos, e que se esses métodos falham a anomia instala-se. Garfinkel, Goffman, John Austin e outros sociolinguistas da conversação estudam a importância simbólica da interacção, afirmando que qualquer símbolo ou gesto possui vários significados e a determinação da sua significação depende da sua inserção num contexto específico construído localmente. Este ponto de vista é susceptível de conduzir ao niilismo e Garfinkel é criticado por isso. Mas ele nunca afirma explicitamente que a etnometodologia seja um meio para "subverter" outras crenças. Acredita que a etnometodologia se deveria fechar hermeticamente a outras formas de investigação sociológica por não ser um método compatível com os outros. Um dos principais limites evidentes da etnometodologia é a ênfase colocada na praxis ou produção social da experiência consciente, em simultâneo com a fraquíssima atenção dispensada à sensibilidade subjectiva do indivíduo e aos seus sentimentos. Outra fraqueza da etnometodologia reside na sua incapacidade de explicar convenientemente as questões de poder, pois a luta pelo domínio dos meios coercivos e dos recursos escassos não pode ser explicada recorrendo às propriedades transcontextuais das relações sociais. Finalmente, existe um limite intrínseco à potência explicativa da etnometodologia que reside no facto de o estudo empírico de todas as questões práticas sem generalizção teórica, impedir a compreensão de formas recorrentes de conduta. Anthony GIDDENS Ao longo de toda a história da sociologia alguns problemas eurísticos têm permanecido como pontos de discordância teórica. Dois desses pontos são os chamados dualismos, da acção/ estrutura e do sujeito/objecto. Entre 1979 e 1984, Anthony Giddens, produziu uma teoria dita da estruturação com o objectivo de ultrapassar esses históricos dualismos. O seu grande objectivo seria considerar a importância da praxis social sem desprezar as questões persistentes, recorrentes, sistemáticas da vida social. Afirma que tudo o que acontece ou existe na vida social se produz através de formas de desempenho da conduta, que contribuem para a produção e reprodução de relações sistémicas e de padrões estruturais. O sistema e a estrutura são portanto produtos colectivos e são mais do que comportamentos localmente situados.

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A interpretação que Giddens faz do desempenho de conduta é devedora do pensamento de Garfinkel, Goffman, Winch e alguns geógrafos do tempo, mas é adaptada e reconstruída por ele. Giddens considera que o tempo e os lugares materiais condicionam os desempenhos de conduta. Analisa as práticas duradouras e recorrentes, e não reduz a análise a acções localizadas e avulsas cujo sentido se esgota no seu entorno próprio. Afirma que as práticas tacitamente executadas (instituições ou rotinas) produzem formas familiares de vida social. A mudança social aparece quando alguma prática rompe a rotina usual e leva os actores a reflectirem conscientemente acerca das suas práticas. Giddens consegue integrar a praxis na estrutura social, afirmando que existem padrões de relações sociais em todas as dimensões da vida social. Esses padrões são criados pelas práticas recorrentes que se estabelecem em ciclos duradoiros e ligam entre si os actores sociais. Para compreender as ligações entre os actores, tendo em conta praxis e estrutura, o autor distingue dois conceitos, a saber, integração social e integração sistémica. O primeiro diz respeito ao estabelecimento de relações face a face, ou seja, típicas de sistemas como famílias, aldeias, cortes aristocráticas etc., o segundo diz respeito a relações à distância física ou temporal, facilitados hoje pelos meios de transporte e comunicações. Ou seja, os actores estabelecem relações muito para além dos seus quadros locais: relações sistémicas. Giddens utiliza o conceito de estrutura para compreender as propriedades substantivas das colectividades, afirmando que as práticas ou procedimentos ocorrem integradas por quatro elementos, que assim, são designados elementos estruturais: regras de procedimento, regras morais, recursos materiais e recursos de autoridade. Ora, as unidades primárias de análise sociológica, são para Giddens as práticas estruturadas. As práticas institucionalizadas e não comportamentos avulsos. Mas o autor não esquece que a acção social é composta de práticas concretas e que estas podem variar, e portanto, conduzir à inovação e à mudança. Neste carácter da acção social pode evidenciar-se a estrutura e a praxis bem como as suas relações. O autor desenvolve o conceito de dualidade da estrutura para evidenciar a associação entre estrutura e praxis. Esta dualidade de estrutura diz respeito à prática estruturada que pressupõe a aquisição de conhecimentos e recursos adquiridos previamente. Os actores que dispõem de mais recursos materiais e cognitivos estão em condições de dominar as relações sociais e exercer o poder sobre os outros. Giddens, de resto, dá grande importância ao estudo das relações de poder entre superiores e subordinados. Um aspecto particularmente fecundo em Giddens é que ele consegue realmente fazer uma análise das práticas sem dispensar a teoria, e por outro lado, consegue analisar a estrutura sem diluir nela a personalidade individual e as

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possibilidades de mudança social protagonizada por acções de ruptura nos comportamentos estruturados. Tendo presente o papel do indivíduo na sua teoria da acção, Giddens desenvolve uma teoria do sujeito actuante baseada em três níveis de subjectividade: consciência discursiva ou nível do raciocínio, consciência prática e subjectividade inconsciente. Os actores usam os três níveis e o nível racional não predomina na acção social. Ao contrário, os actores sentem desde a nascença uma necessidade de segurança ontológica que os leva a procurar as práticas rotineiras e os sentimentos de familiaridade, evitando a anomia angustiante nas constantes mudanças. A consciência discursiva apenas é mobilizada durante rupturas críticas na rotina e serve para centrar os pensamentos dos actores em respostas que reduzam a angústia associada a essas situações. Giddens dá também atenção às consequências não intencionais da acção social. Entre as principais críticas feitas a este autor, encontram-se a de que não fornece qualquer fundação normativa para as acções solidárias e comunais, e não explica como é que se impõem os constrangimentos colectivos ou seja, os mecanismos que impedem os actores de satisfazer a sua vontade em favor do colectivo, senão através da necessidade de segurança ontológica. Giddens, de facto leva-nos a crer que os actores não estão motivados para lutar por ideais desde que tenham garantido a sua segurança ontológica.

4. Autores e obras Mead Ver em Autores e obras, do capítulo 6.

5. Exercícios de controlo A. Complete os espaços em branco de modo a dar sentido pertinente às frases. 1. As teorias da ______________________________ fundamentam-se na filosofia utilitarista. 2. Weber definiu a ________________como " os significados subjectivos que indivíduo atribui ao seu comportamento. 3. Segundo _____________, a acção social é sempre subjectivamente orientada para o comportamento dos outros

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B. Diga se são verdadeiras ou falsas as seguintes afirmações. 1. Para weber a "ordem" reporta às valorações superiores. 2. Uma "ordem legítima" é aquela a que os actores aderem incondicionalmente. 3. A estrutura da acção social é uma obra de Parsons. C. Assinale a única resposta verdadeira. Para Parsons, o conceito de "fins últimos" tem a ver com: a) Com princípios da acção social. b) Com normas estabelecidas pelo Estado. c) Com altruismo e desinteresse individual. Soluções A. 1 - Acção e praxis 2 - Acção social 3 - Weber B. 1 - f 2 - f 3 - v C. a)

Capítulo 5 – Teoria dos Sistemas

1. Competências a adquirir Depois de completar o estudo deste capítulo deverá ser capaz de: - Conhecer e explicitar os conceitos de sistema, função e funcionalismo. - Explicar a ubiquidade do funcionalismo na sociologia, - Explicitar as relações entre funcionalismo e teoria dos sistemas, - Explicar a emergência do funcionalismo americano, relacionando-o com as principais influências que estiveram na sua origem, - Localizar no tempo e no espaço o funcionalismo,

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- Indicar as principais alternativas teóricas a este paradigma, - Explicitar a divergência de preocupações entre sociologia americana e sociologia europeia até meados dos anos 60, e razões para essa diferença, - Explicitar qual a principal preocupação a que a sociologia americana esteve sempre ligada, - Explicitar o papel da Universidade de Chicago na sociologia americana, localizando a sua influência no tempo e no espaço, - Situar temática, temporal e geograficamente o declínio da Escola de Chicago e a publicação da primeira obra de Parsons, - Explicitar as principais influências subjacentes à obra de Parsons, - explicar o papel de Parsons no desenvolvimento da sociologia americana e da sociologia em geral, - Relacionar a ascensão de Parsons com o declínio da Escola de Chicago, - Explicitar a ascensão da Universidade de Hrvard, - Referir os principais autores que desempenharam papéis importantes na emergência do funcionalismo americano, - Relacionar Pareto com o funcionalismo, - Explicitar as principais figuras do funcionalismo antropológico, - Esplicar a importância da analogia biológica para o funcionalismo antropológico, - Conhecer e explicitar uma biografia sumária de Parsons e as principais influências que sofreu na sua formação, - Explicitar o papel que Parsons atribui à economia, - Fazer uma análise crítica da importância da publicação de The struture of social action, em 1937, - Relacionar a teoria de Parsons com fascismo e comunismo, - Enunciar as principais críticas e críticos do Estrtrutural funcionalismo e explicar a reacção teórica de Parsons a essas críticas, - Explicitar as principais preocupações de Parsons ao desenvolver uma teoria da acção, - Explicar o papel que Parsons desempenhou no carácter institucional da sociologia e na sua internacionalização, -Relacionar a teoria voluntarista da acção social com a epistemologia própria das ciências sociais, distinguindo-as das ciências exactas, - Distinguir e explicitar as várias fases do pensamento de Parsons, associando-as a obras e ideias, - Identificar as três componentes centrais, segundo Parsons, dos sistemas sociais, - Explicitar a concepção e Parsons da dinãmica e da estática sociais, - Distinguir estabilidade estrutural de estabilidade ontológica, - Identificar as quatro fontes essenciais da teoria estrutural-funcional na sociologia,

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- Explicar a situação actual do funcionalismo/teoria dos sistemas, e das ideias de Parsons, - Associar o neo-funcionalismo a nomes e ideias, - Referir o principal autor europeu que incorporou no seu pensamento ideias de Parsons, e a teoria que pretende recuperar a teoria dos sistemas, -

2. Conceitos prévios Função Estrutura Sistema Actor social Acção Processo de socialização Controlo social Papeis sociais Valores Normas Holismo Anomia

3. As ideias apresentadas no manual Para o estudo deste capítulo deve ler o Capítulo 5 do manual (páginas 143 a 170). Introdução A par do empirismo da Escola de Chicago a sociologia americana beneficiou de uma abordagem teórica de grande fôlego que viria a manter-se dominante até aos anos sessenta. Tratou-se de um esforço de síntese teórica muito além do contributo empirista dos inquéritos: O estrutural funcionalismo de Talcott Parsons (1902-1979). Nenhuma outra corrente sociológica teve tanta importância como o estrutural funcionalismo. Permaneceu dominante entre os anos trinta e sessenta do século XX nos Estados Unidos. O grande mérito de Parsons foi ter conseguido uma síntese completa das principais ideias sociológicas desde Durkheim a Malinowski, incluíndo Weber

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e Freud, a qual integra a capacidade de explicar os diferentes níveis sociais desde a estrutura social ao comportamento individual. The structure of social accion tornou-se uma referência para o estrutural-funcionalismo americano pois, se por um lado, introduziu no pensamento americano as grandes correntes teóricas da sociologia europeia, (Durkheim, Weber e Pareto) por outro, excluiu quase completamente o pensamento de Marx e de Simmel. Foi ainda o grande esforço de síntese teórica que faltava à sociologia americana, tendo permitido ligar os pontos de vista do actor com os pontos de vista mais macroestruturais dos sistemas social e cultural, numa perspectiva de articulação e não de contradição. O sucesso de Parsons parece ser subsidiário do facto de as suas posições darem resposta às mais importantes questões intelectuais e políticas do seu tempo. Parsons interessou-se sobretudo pelas condições de manutenção e funcionamento do sistema social e das modalidades da acção social. A sua pergunta de partida foi " de que forma as sociedades subsistem e se mantém unidas e coesas?". A resposta a esta pergunta leva-o a rejeitar os modelos económicos de explicação baseados nos interesses pessoais e, a sublinhar a importância das normas e dos valores na vida social. A perspectiva sociológica dita funcionalista não teve início em Talcott Parsons mas remonta aos fundadores. Encontramo-la já em Comte e Spencer. A novidade acrescentada por Parsons foi a introdução da estrutura na função. Considerou que a sociedade é um sistema vivo, que tem de adaptar-se a um ambiente em constante mutação, e encontrar o seu equilíbrio assegurando que cada uma das suas partes funcione de forma própria e adequada aos objectivos. Parsons considera a sociedade como um sistema auto-suficiente, constituído por vários subsistemas interligados e interdependentes. Por exemplo, o subsistema económico depende tanto do subsistema educativo para lhe fornecer técnicos, como este depende do subsistema familiar para educar indivíduos capazes de ter sucesso escolar, e por sua vez, o subsistema económico passa a ser também dependente do subsistema familiar, logo, deve funcionar de modo a não prejudicar a capacidade das famílias de educarem crianças para o sucesso escolar e social. De outro modo, o subsistema económico estaria a comprometer o seu próprio futuro. Assim, Parsons afirma que cada um dos subsistemas contribui para assegurar os “imperativos funcionais” que lhe são próprios e que são elementos básicos necessários ao equilíbrio da sociedade e, por conseguinte, necessários à sua manutenção. Ou seja, são funções de integração social. Os imperativos funcionais, segundo o autor, são quatro e são designados pelo esquema AGIL.

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O primeiro imperativo, designado por A, é a adaptação. Cada sociedade tem de se alimentar e a aquisição de recursos físicos a partir do meio envolvente requer uma adaptação a esse mesmo meio. O segundo imperativo (G), é a realização dos objectivos e diz respeito à utilização política dos recursos para atingir objectivos particulares. A terceira função de integração é realizada pelo imperativo integração dos actos que diz respeito à aquisição de regras ou normas para regular o sistema social globalmente, por exemplo as leis. Finalmente o último imperativo funcional (L) é a manutenção dos modelos latentes e assegura a transformação dos valores individuais e pessoais em modelos padronizados que são partilhados e estáveis no seio de um dado sistema social. Esta teoria das quatro funções pretende ser um modelo de interpretação dos desafios vividos pelos actores sociais de qualquer sistema social independentemente da sua dimensão. (níveis micro e macro). Parsons tentou analisar a vida social mediante uma dupla perspectiva, da acção e do sistema, não separando uma da outra. Para isso, utilizou quatro conjuntos de variáveis modelo. Acusando forte influência de Durkheim, Parsons considerou que só um sistema de valores forte permitiria ter uma sociedade estável e eficiente. Considerou também que o código de valores e o conjunto de normas estabelecidas numa sociedade asseguram a integração individual de modo a que todas as partes do sistema e todos os indivíduos estejam em perfeita harmonia. A aquisição destes valores sociais que permitem que milhões de pessoas estejam perfeitamente integradas e motivadas para os mesmos fins independentemente das suas personalidades individuais, dos seus desejos e ambições, só é possível graças ao processo de socialização, ao controlo social e ao desempenho dos papéis sociais. Ao longo da sua vida, cada indivíduo tem de desempenhar uma multiplicidade de papeis sociais – filho, aluno, trabalhador, etc.- cujo perfil de desempenho é traçado e ensinado pela sociedade. A sociedade tem expectativas de desempenho de cada papel social, e tem mecanismos não só para ensinar, como também para controlar esses desempenhos. Assim, aquilo que aparentemente é uma motivação pessoal interior resulta de um processo de internalização de normas, papeis e pontos de vista, que as consciências individuais apropriaram durante o seu processo de socialização. Por isso, também como Durkheim, Parsons sublinha a importãncia da moral para o equilíbrio social. Pelo facto de entender que uma criança é uma espécie de folha em branco onde a sociedade vai escrever normas de comportamento, particularmente através da educação familiar e do processo e socialização primário, Parsons fica automaticamente vinculado à ideia de que todo o desvio social se deve a erros no processo de socialização, quer dizer a "faltas de educação". Um comportamento desviante significa que o indivíduo que o pratica não foi correcta e eficazmente socializado, e portanto, não interiorizou correctamente as normas e os valores. Daí que entenda que esses

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indivíduos precisam de ser re-socializados e controlados nos seus comportamentos através de instituições criadas para esse efeito (polícias e prisões). Parsons entende que a sociedade contemporânea se caracteriza por contrastes e mantém em coexistência valores antagónicos. Estes valores são interiorizados pelos indivíduos e expressos no desempenho dos seus papéis sociais. (recorde-se que o sistema social é composto por subsistemas particulares, que por sua vez funcionam através de imperativos que garantem o equilíbrio do sistema, imperativos esses que se materializam na acção social decorrente do desempenho de papeis aprendidos e organizando-se segundo regras). A interiorização de valores dominantes e é feita ao longo do processo de socialização. São esses valores dominantes que, na sociedade contemporânea são contraditórios. Ao analisar as normas e os valores vigentes o autor vai agrupá-los em duas categorias principais: - Emotivos ou expressivos, e orientados para a colectividade, tais como o particularismo e a afectividade e, - Instrumentais ou orientados para a realização, tais como a aquisição, a auto-disciplina e o individualismo. Em função deste critério de divisão Parsons constrói um quadro de "variáveis estruturais", que permite descodificar os valores presentes na acção social. Assim, ele identifica na sociedade contemporânea quatro conjuntos de pares de valores antagónicos, que constitui em variáveis de análise da acção social - variáveis estruturais (Patern variables): 1. Particularismo / Universalismo. Na acção social os actores fazem julgamentos dos outros segundo critérios universais ou segundo critérios particulares (que entendem o indivíduo na sua singularidade como pessoa e não como elemento de um sistema anónimo). 2. Aquisição/ Atribuição Na acção social os actores podem julgar os outros mediante as suas capacidades adquiridas em função das suas realizações (nível de instrução, categoria profissional, rendimento, etc.) ou mediante as suas qualidades naturais e herdadas (raça, idade, sexo, casta etc.) que não resultam de esforços de aquisição. 3. Especificidade/Difusão Os actores tem de decidir relacionar-se com as pessoas na sua totalidade enquanto seres completos, ou apenas com alguns traços ou aspectos particulares. Um pai, por exemplo, relaciona-se com um filho num registo holístico tendo sempre presente a totalidade da personalidade e do ser do filho. Um bancário relaciona-se com os clientes do banco considerando apenas alguns

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aspectos do seu ser pertinentes para o negócio que os põe em relação. O que cada um é na sua totalidade não conta para a relação comercial. 4. Neutralidade/ Afectividade Na acção social os actores tem de optar por relações instrumentais neutras, que não envolvem sentimentos, ou por relações afectivas que envolvem sentimentos ou afeições. Estas variáveis permitem-nos interpretar a vida social em função de níveis de integração social e de equilíbrio, e isso também reflecte os próprios tipos de sociedade. Nas sociedades mais avançadas predominam os valores de tipo instrumental que conduzem à eficiência funcional necessária à aquisição. O objectivo deste funcionamento é sempre o equilíbrio do sistema e a melhor integração social. Por exemplo, a constituição de leis estatais durante o período de formação e consolidação dos Estados Nacionais mostra como a sociedade, no seu todo, encontrou uma solução para a resolução e conflitos ligados à justiça, à arbitrariedade e à propriedade. A lei geral dispensou assim a intervenção subjectiva do monarca no julgamento dos conflitos, é neutra e universal e aplica-se a situações específicas não permitindo julgamentos difusos. Nas sociedades tradicionais e nos grupos que mais restritos, predominam os valores expressivos e afectivos que permitem os relacionamentos mais holísticos. A família é um exemplo de grupo social expressivo e emocional, a empresa é um contexto social impessoal e instrumental. A partir desta base teórica Parsons desenvolveu uma série de estudos aplicados, nomeadamente sobre a família, a doença e as profissões, e influenciou igualmente muitos outros estudos empíricos nos Estados Unidos. Contudo o Estrutural Funcionalismo começou a evidenciar fraquezas conceptuais por volta dos anos sessenta, nomeadamente foi incapaz de explicar demasiados problemas importantes da sociedade americana tais como a questão racial dos negros, a Guerra do Vietname e os movimentos de direitos cívicos, feministas, gay, movimentos e lutas estudantis, etc., tendo acabado por entrar em colapso e sido alvo de grande criticismo. Em época de grandes agitações sociais, não foi difícil imporem-se as sociologias do conflito, que em tudo se opõem á sociologia da ordem de Talcott Parsons. Por outro lado, surgiram pontos de vista que valorizam mais a expressão individual e menos os determinismos sociais da personalidade Um dos mais reputados discípulos de Parsons foi Robert Merton. Robert Merton dedicou-se especialmente ao refinamento teórico do estrutural funcionalismo tendo trabalhado particularmente os conceitos de função latente, função manifesta, disfunção e teoria de médio alcance.

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Fez estudos de sociologia da cultura e sociologia do conhecimento e da ciência, distinguindo uma análise externa e uma análise interna da produção científica. Do ponto de vista externo, a análise do pensamento científico evidencia que nem mesmo a elite dos cientistas que idealmente buscam a imparcialidade e a objectividade, escapa à influência social na construção de modelos teóricos. A comunidade científica não vive isolada e depende do ponto de vista material, do resto da sociedade. Assim, Merton, retomando a ideia de Weber, afirma que a ciência moderna não nasceu antes do século XVII porque o pensamento científico não tinha qualquer função para desempenhar na sociedade pré-industrial. Além disso, reafirma o papel do protestantismo na criação do "Ethos" ético e cultural do desenvolvimento da ciência experimental, relacionando os trabalhos teóricos de cientistas como Newton e Boyle com as suas crenças religiosas puritanas. O protestantismo estimulou a investigação científica e a experimentação, como interpretação e descoberta racional da Criação. Por outro lado, as necessidades militares e económicas também depositaram as suas esperanças na ciência e na sua capacidade de encontrar respostas eficazes e racionais. Ao contrário do seu mestre, Merton não desprezou a contribuição científica de Marx e fez uma síntese entre as ideias culturalistas de Max Weber e as ideias materialistas e economicistas daquele autor. Afirma que a ciência moderna surgiu para dar cumprimento às necessidades da sociedade industrial capitalista, sublinhando as funções sociais desempenhadas pelo pensamento científico e, em especial pelos estudos aplicados. Do ponto de vista interno, analisou com pormenor o ethos que permitiu constituir a comunidade científica como grupo fechado e separado da comunidade, com os seus valores e os seus imperativos funcionais. Fez uma listagem e considerou como dos valores principais da comunidade científica: O Universalismo, que obriga a um esforço de objectividade e imparcialidade na produção científica, O Comunismo, ou posse colectiva de todo o património do saber científico que é permanentemente partilhado pela comunidade científica uma vez que, todo o conhecimento está directamente dependente de conhecimentos anteriores e é fundamento para investigações futuras. Sendo o secretismo eticamente proibido no seio da comunidade, os resultados das diversas investigações são sempre publicados e postos á disposição do grupo. O Desinteresse, ou não envolvimento de interesses pessoais. Cepticismo organizado, ou não consideração de qualquer dimensão sagrada ou intocável no real. A este sistema de valores da comunidade científica Merton chama o “paradigma”, ou seja, as regras e o jogo que limitam emocional e profissionalmente a comunidade dos cientistas. Este Ethos profissional é independente do lugar do mundo onde decorra uma investigação, promove a

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socialização dos estudantes na própria comunidade, e legitima socialmente as actividades de investigação que são postas ao serviço da comunidade geral, que por sua vez, reconhece as autoridades científicas como fontes fidedignas de verdade. A profissão de cientista torna-se assim, após reconhecimento social, uma função social. Ao fazer uma revisão adaptativa do estrutural funcionalismo critica os seus pontos mais fracos e distingue claramente a sua abordagem da de Parsons. Deixa a ambição teórica de longo alcance do mestre e dedica-se à construção de teorias de médio alcance aceitando tomar o pensamento de Marx em consideração nas suas análises, e empurrando o funcionalismo para o seu alinhamento máximo à esquerda política. Afirma que este não deve estudar apenas as funções sociais mas também e especialmente, as disfunções. Encontra três principais limitações na análise funcionalista de Malinowski e Radclif-Brown : O postulado da unidade funcional da sociedade, que supõe que as crenças e práticas sociais standardizadas são funcionais para a sociedade como um todo e para os indivíduos em particular. Isso pressupõe que a maior parte dos sectores sociais estejam plenamente integrados, facto que não se verifica necessariamente em sociedades complexas. O postulado da universalidade funcional, que supõe a existência de funções positivas em todas as formas sociais standardizadas. Merton mostra que podem existir disfunções sociais em formas sociais standardizadas. O postulado da indispensabilidade, que afirma que todos os aspectos standardizados da vida social tem funções positivas e também representam partes indispensáveis ao funcionamento completo do sistema. Para Merton, ao contrário do seu mestre, há sempre equivalentes funcionais de qualquer elemento ou função social. Merton considera que estes postulados são afirmações teóricas que tem de ser testadas positivamente e requerem portanto observação empírica. Pensa que todos os objectos sociais standardizados que se rejam por um mínimo de normas, regras, crenças ou padrões institucionais podem ser sujeitos a observação mediante o modelo funcionalista. Afirma que análise estrutural funcionalista deve distinguir os motivos subjectivos que estão na base das acções sociais. As funções, segundo Merton, definem-se como consequências observáveis que se destinam a produzir adaptação ou ajustamento num sistema. No entanto, quando um estudo incide apenas na adaptação ou integração promove uma forma de enviesamento ideológico uma vez, que só tem em conta as consequências positivas da acção social e ignora as consequências negativas. Ora, a estas consequências negativas ele chama “disfunções”, para as contrapor às primeiras. As disfunções tal como as funções podem contribuir para a manutenção de outras partes do sistema social. Merton dá o exemplo da

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existência de escravatura no sul dos Estados Unidos que claramente contribui para a existência do grupo social dos brancos do sul e a economia do algodão. Ao mesmo tempo é disfuncional pois, mantém os sulistas dependentes de uma economia agrárias, e portanto, vulneráveis num processo de industrialização. Assim, as disparidades de desenvolvimento entre Norte e Sul podem ser atribuídas à existência de escravatura no sul. Merton fala também de “não-funções”, que dizem respeito a consequências irrelevantes para o sistema social, como os movimentos ou práticas obsoletas que foram funcionais no passado e que podem sobreviver sem consequências em dado estado de evolução social. Merton introduz também os conceitos de “função latente” e “função manifesta”. As funções manifestas são intencionais, enquanto que as funções latentes são não intencionais. Por exemplo no caso da escravatura, a sua função manifesta é permitir o aumento de produtividade na produção algodoeira, enquanto que podemos identificar uma função latente de manutenção de um grupo social dominante branco. Este conceito está directamente relacionado com um outro formulado pelo autor, que é o conceito de “consequências não intencionais”. Afirma que qualquer acção tem consequências intencionais e não intencionais e a à sociologia cabe evidenciar essas consequências não intencionais da acção social. As funções latentes não se confundem com as consequências não intencionais. As funções latentes são um tipo de consequência não intencional que é funcional para o sistema social. Mas há mais dois tipos de consequências não intencionais: as que são disfuncionais para o sistema social, o que inclui as disfunções latentes, e as não-funcionais, que não afectam nem positiva nem negativamente o sistema. Merton clarifica ainda que há estruturas disfuncionais para o sistema no seu todo, que contudo permanecem, e que há estruturas que não são indispensáveis. Assim, o funcionalismo torna-se mais capaz de entender a mudança social admitindo que certos aspectos dos sistemas possam ser substituídos por outros pelo facto de serem disfuncionais ou neutros sem prejudicar o equilíbrio e a integração do sistema. Um outro conceito absolutamente fundamental do funcionalismo é o conceito de anomia. Ao estudar as relações entre cultura e estrutura, Merton retoma o conceito de anomia. Define cultura como um conjunto normativo de valores, que permitem gerir os comportamentos individuais, e comum aos membros de uma sociedade ou grupo, e estrutura social, como um conjunto organizado de relações sociais nas quais os membros de uma sociedade ou grupo estão implicados. A anomia ocorre quando existe uma dijunção aguda entre as normas e objectivos culturais e as capacidades que os membros do respectivo grupo social têm de as implementar, pois devido às suas posições na estrutura social certos indivíduos são incapazes de agir de acordo com os valores

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normativos vigentes. A cultura reclama determinado comportamento que a estrutura social deve ser capaz de gerar nos indivíduos, por exemplo. As sociedades capitalistas dão grande valor ao sucesso material mas simultaneamente produzem grandes massas de excluídos socialmente que se tornam incapazes de aceder a esse sucesso material. Isto gera anomia e tendência para o comportamento desviante. Este, é muitas vezes a única alternativa de aceder ao almejado sucesso material. Neste caso, o desvio é produzido pela grave dijunção entre o sistema cultural e o sistema social. Assim, Merton torna-se, e com ele o funcionalismo, crítico do sistema de estratificação social e coloca-se numa posição já muito distinta da do seu mestre Talcott Parsons. Principais críticas ao estrutural funcionalismo Muitos foram os críticos do estrutural funcionalismo. Contam-se entre eles, Mark Abrahamson, Turner, Maryansky, Percy Cohen, Mills, David Lockwood, Alvin Gouldner, Irving Horowitz entre outros. A principal critica que foi feita ao estrutural funcionalismo foi a acusação de se ter separado da história concreta e ter sido incapaz de a ter em consideração. Acusação, portanto, de que se trata de uma teoria a-histórica. Efectivamente esta teoria nasceu por reacção a uma certa antropologia histórica um tanto especulativa, e tentou construir um modelo universal de interpretação dos sistemas sociais e da acção social, que acabou por ser acusado do inverso: excesso de abstracção e deficit histórico. A Segunda crítica fundamental é de incapacidade de explicação da mudança social, pois seria somente um modelo de análise de estruturas estáticas. A crítica mais frequente acusa o estrutural funcionalismo de não estar habilitado a estudar conflitos sociais e de valorizar em demasia as relações sociais harmoniosas. É também acusado de considerar apenas os aspectos negativos do conflito e de exagerar o consenso social e a integração em níveis não realistas, centrando-se na análise da cultura, normas e valores. Estes três argumentos levaram à criação da ideia de que se tratou de uma teoria conservadora, ideologicamente enviesada, uma vez que mais do que as desvantagens, enfatizou as vantagens de manutenção da sociedade tal como estava. A manutenção da situação, obviamente, interessou especialmente aos favorecidos, aos que dela retiravam os maiores proveitos. O funcionalismo tomou os sistemas normativos como representando a sociedade como um todo quando na realidade, qualquer sistema normativo reflecte os interesses dos que tem capacidade de dominar as instâncias legislativas e exercer o seu poder em proveito próprio.

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Ao nível metodológico, as principais críticas foram de que o estrutural funcionalismo era vago, ambíguo e pouco claro, que trabalhava mais com noções abstractas do que com sociedades reais. Outra crítica afirmava, que erradamente o estrutural funcionalismo acreditou que a realidade social poderia ser explicada por uma única teoria integrada e um conjunto de categorias, o que não é verdade. Outra reserva principal foi é a que desconfiou de que existisse qualquer recurso metodológico capaz de abarcar a leitura de um todo tão complexo de forma integrada e simultânea. Por outro lado, o a-historicismo inviabiliza o método comparativo. O estrutural funcionalismo de facto não aceita comparações ao afirmar, que determinado elemento só é analisável no quadro do seu sistema social, e nunca fora dele. Wright Mills e a crítica do estrutural funcionalismo A grande oposição ao pensamento estrutural funcionalista veio a iniciar-se no próprio espaço da Universidade de Columbia onde Merton era professor. Essa oposição partiu de um professor contestatário e insatisfeito em permanente guerra com o sistema: Wright Mills. Devido ao impacto do estrutural funcionalismo na América, as teorias marxistas foram praticamente omitidas na reflexão social americana. C. Wright Mills constituiu uma das raras excepções, embora não tenha sido um verdadeiro marxista pois nem sequer conheceu o pensamento de Marx até meados da década de cinquenta. Publicou dois trabalhos fundamentais, Os colarinhos brancos em 1951, crítica cerrada á categoria ocupacional em expansão: os trabalhadores de colarinho branco e, A elite do poder em 1956 que, mostra como a América era dominada por uma pequena minoria de políticos, homens de negócios e altas patentes militares. Entre estas duas obras, publicou o seu principal trabalho teórico em co-autoria com Hans Gerth, Character and social structure (1953). Aqui reforça as ideias de Weber e de Freud muito mais que as ideias marxistas. Foi a partir dos anos cinquenta que os seus interesses se dirigiram para a teoria marxista e os problemas do terceiro mundo. Publica então um livro sobre a revolução cubana e outro sobre o marxismo. Como radical foi segregado pela sociologia americana, sujeito a muitas críticas, às quais reagiu tornando-se um crítico severo da própria sociologia. No seu livro A imaginação sociológica publicado em 1960, leva ao máximo o seu criticismo especialmente dirigido contra Parsons e a sua grande teoria. Aliás Mills está na linha das escolas históricas sociológicas clássicas da Europa embora o seu objectivo fosse, mais do que explicar, reformar a sociedade americana, popularizar a sociologia e desenvolver no público uma imaginação

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sociológica. Permaneceu liberal e humanista, favorável a uma liderança moral e leal à ideia iluminista de que o conhecimento poderia libertar e melhorar o mundo. O criticismo de Mills inicia uma vaga crítica em Columbia que tenderá a aumentar a partir do final dos anos sessenta. A esta vaga irá somar-se outra que parte de Harvard e Chicago. É então que se desenvolve uma oposição à sociologia parsoniana dominante. Teoria do conflito A teoria do conflito surgiu e desenvolveu-se nos anos cinquenta e sessenta como resposta às limitações do estrutural funcionalismo do qual nunca se autonomizou totalmente. Tem também raízes no marxismo e na contribuição teórica de Simmel. Esta teoria, à semelhança do estrutural funcionalismo, orientou-se para o estudo das estruturas e das instituições, mas é praticamente constituída por um conjunto de antíteses a essa teoria. A teoria do conflito é representada em primeiro lugar por Ralf Dahrendorf. As principais afirmações da teoria do conflito são as seguintes: - A sociedade não é estática, está em permanente mudança; - A sociedade não é pacífica, é conflituosa na sua natureza e o conflito manifesta-se aos mais diversos níveis; - A maior parte dos elementos constitutivos da sociedade contribuem para a existência de conflitos; - A ordem social não nasce espontaneamente de um sistema de normas e valores, ela é coercivamente imposta do topo para a base; - A ordem social é mantida pelo exercício do poder; Ralf Dahrendorf inspira-se tanto em Marx como em Weber. Tal como eles, vê os conflitos de classe como chaves do dinamismo social e da mudança. Não baseia a sua leitura do antagonismo das classes como resultante da sua posição no processo de produção, mas na desigualdade da distribuição do poder e especialmente da autoridade. É assim, segundo o autor, um processo dialéctico, que permite a evolução histórica e a mudança social, mas também, em simultâneo, a integração social. Dahrendorf afirma que a sociedade tem duas faces, a do conflito e a do consenso, e portanto, advoga uma divisão da teoria sociológica: a teoria do consenso e a teoria do conflito, cada uma analisando os aspectos sociais correspondentes ao seu quadro teórico. O conflito e o consenso são vistos como dependendo um do outro. No entanto, apesar desta mútua dependência

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Dahrendorf não acredita que uma teoria uniformizada permita estudar as duas coisas em simultâneo, por isso, inicia a sua teoria do conflito afirmando que a sociedade se mantém unida pela força dos constrangimentos o que, pressupõe a delegação de poder de alguns indivíduos noutros. Esta afirmação conduz o autor á sua tese central que é a de que a autoridade se encontra desigualmente distribuída, e que essa desigualdade é invariavelmente a fonte de conflitos sociais sistemáticos. Considera que os conflitos de grupo se desenvolvem por graus e assumem uma pluralidade de formas desde as greves das grandes empresas até às lutas dos grupos de pressão. Somente em casos extremos é que este conflito social permanente explode, dando origem a revoluções. Dahrendorf afirma que mesmo as classes sociais, se encontram desintegradas pela concorrência individual que ocorre sempre que os indivíduos têm oportunidade de avançar, ou seja, durante os períodos de prosperidade económica. Afirma, que a classe trabalhadora se encontrará progressivamente mais fragmentada e heterogénea à medida que a tecnologia se complexifique e requeira progressivamente mais técnicos qualificados tais como designers, construtores, pessoal de manutenção etc. Esta enorme especialização da classe trabalhadora vai dividi-la mais do que uni-la. A competição entre os diferentes níveis de competências dentro da mesma classe tornar-se-á mais intensa. Para Dahrendorf a luta e o conflito são inevitáveis mesmo dentro de um grupo, uma vez que este é hierarquizado e portanto, o poder encontra-se desigualmente distribuído no seu seio. Assim, enquanto aqueles que se encontram em posições dominantes lutam pela manutenção da sua situação e do seu estatuto, os que se encontram em situação dominada, lutam por melhorar a sua posição na hierarquia. O grupo é um cosmos de luta e conflito. Este conflito de interesses pode mesmo não ser consciente. Por isso, o autor desenvolve o conceito de interesse latente que contrapõe ao de interesse manifesto (que são interesses inicialmente latentes que se vieram a manifestar). Dahrendorf constrói uma tipologia de grupos em que distingue três estádios até chegar ao grupo de conflito: - Os "quase grupos", em que diversos indivíduos se encontram em posições próximas e coincidem em interesses comuns aos seus papeis. - Os “grupos de interesses”, em que os indivíduos que constituíam um "quase grupo" se organizam, estruturam e estabelecem objectivos de acção comum liderada. - Os “grupos de conflito”, constituídos por indivíduos que se encontram reunidos e estão em conflito com outros grupos. Segundo Dahrendorf, a principal tarefa da sociologia dos conflitos é estudar a relação existente entre interesses latentes e manifestos, bem como compreender e mostrar que a função do conflito no sistema social é dupla: manutenção e

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mudança. O conflito é permanente, pois alguns lutam pela manutenção do status quo e outros pela mudança de situação. Também Dahrendorf foi criticado nas suas posições e acusado de não ter em consideração os aspectos da ordem e da estabilidade social. Esta teoria foi igualmente considerada ideológica e radical por não ter conseguido, tal como o autor se propôs, fazer uma reflexão sobre as ideias marxistas pelo que, terá resultado uma numa aplicação não muito adequada do marxismo à teoria sociológica. Foi também acusado de ser mais próximo do estrutural funcionalismo do que do próprio marxismo. Finalmente, foi acusado de, tal como o estrutural funcionalismo, apenas atingir a dimensão Macro, deixando escapar o que se passa ao nível micro. A teoria do conflito acabou por não ter uma importância decisiva no pensamento sociológico, nem ter conseguido avançar em termos da recuperação do pensamento marxista para a teoria sociológica. No entanto, pode ter contribuído um pouco para o início de uma aceitação tardia (anos sessenta) do pensamento marxista nos Estados Unidos. Entre os críticos de Ralf Dahrendorf deve procurar-se especialmente Hazelrigg, Turner; Weingart. Entre os seguidores da teoria do conflito distingue-se apenas Randall Collins que pretendeu superar algumas limitações da teoria, nomeadamente a sua incapacidade de passar do nível das estruturas sociais para o nível dos actores sociais. Neofuncionalismo Após a sua queda, o estrutural funcionalismo não teve oportunidade de se recompor. Apesar disso, sem se reabilitar, em meados dos anos oitenta um novo esforço teórico tentou recuperar as ideias funcionalistas, agora sob a designação de neofuncionalismo. A utilização deste novo termo permitem, por um lado, uma ligação ao passado, e simultaneamente, a garantia de revisão dos seus aspectos mais polémicos e menos eficazes. O Neofuncionalismo foi desenvolvido por Jeffrey Alexander e Paul Colomy. Esta teoria fez, desde o seu início um esforço de síntese das grandes teorias tal como o tinha feito o estrutural funcionalismo no seu início. Os problemas associados ao estrutural funcionalismo que agora, a nova corrente quer ver ultrapassados são, o anti-individualismo, o antagonismo à mudança, o conservantismo o idealismo e o enviesamento anti-empírico ou seja, demasiada abstracção e falta de ligação á realidade. Apesar dos esforços de síntese teórica e superação dos problemas, o próprio Alexander reconheceu em meados dos anos oitenta que o neofuncionalismo era apenas uma tendência, que cinco anos mais tarde admitiu como extremamente

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frágil. Apesar das suas limitações, o neofuncionalismo estabeleceu algumas orientações teóricas: 1. Funcionou como modelo descritivo da realidade social, esta composta por elementos interagindo mutuamente formando um padrão que se diferencia do ambiente envolvente e lhe confere identidade. 2. As diferentes partes deste sistema encontram-se ligadas simbolicamente e a sua interacção não é deterministicamente gerada por qualquer força. Há uma pluralidade de forças em acção que mantém esta interacção social. 3. A análise teórica dirige-se igualmente para a ordem e para a acção social aos níveis racional e expressivo. Isto permite superar a limitação do paradigma anterior, excessivamente orientado para o nível macro. 4. A integração do sistema deixa de ser uma obsessão e torna-se uma possibilidade reconhecendo-se, que o controlo social tal como o desvio são inerentes ao sistema social. Deixa de se entender o equilíbrio social como sendo estático. 5. Mantém a ênfase na cultura, personalidade e sistema social tal como Parsons a concebeu, no entanto, introduz-se a ideia de possibilidade de mudança social neste equilíbrio de subsistemas. 6. A mudança social resulta de um processo de diferenciação dentro dos subsistemas, de personalidade, social e cultural, e não é necessariamente harmoniosa. 7. A conceptualização e teorização são independentes de outros níveis de análise sociológica. Alexander licenciou-se na Califórnia na Universidade e Berkeleys e pós-graduou-se em Harvard. Iniciou-se na reflexão neo-marxista, que o deixou insatisfeito na sua capacidade de explicação e implicações políticas, que lhe pareceram sectárias e violentas. Nas suas pesquisas teóricas pelos trabalhos de Durkheim, Weber e Parsons reconheceu neste último a capacidade de ter constituído a mais eficaz das sínteses sociológicas modernas, apesar de ter sido incapaz de evitar que a sua teoria se tivesse desviado para um carácter demasiado formal e normativo. Foi precisamente por fazer de Parsons esta leitura, que decidiu iniciar uma nova síntese teórica a partir daquela. Alexander, mercê dos seus contactos com outras correntes actuais, tais como a fenomenologia a semiótica, a hermenêutica e o pós-estruturalismo, tentou dar à teoria sociológica uma orientação pós-moderna, reconhecendo que a teoria sociológica clássica apresenta limites quanto à interpretação dos fenómenos sociais actuais, especialmente, aqueles que se ligam à globalização e à

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progressiva complexificação das relações sociais no seio da crise das democracias. Actualmente desenvolve estudos acerca da sociedade civil e dos problemas ligados ao excesso de relativismo, quer na vida social, quer na reflexão sociológica. O próprio autor considera completo o seu trabalho de recuperação do ponto de vista Parsoniano, e dedica-se agora à análise de nível micro e á análise cultural, onde pensa ainda existir grande trabalho por realizar. Colomy fez esforços para consolidar as ideias neofuncionalistas tornando-as um campo aberto à discussão teórica e à investigação empírica em simultâneo. Dedicou-se especialmente ao estudo dos processos de diferenciação no seio dos subsistemas teorizados e ao estudo da mudança social vista como resultado do descontentamento social e da desigualdade resultante da diferenciação dentro do mesmo sistema. Criou assim uma teoria da difernciação que desenvolve presentemente em parceria com Rhoades. O neofuncionalismo está pois, de certo, modo ultrapassado por falta de continuidade, como aliás, parece ser o destino de todas as correntes teóricas contemporâneas, tal como afirmámos, no início, quando caracterizámos a sociologia como fragmentária, marcada pela conflitualidade interna e incapaz de uma unificação e um consenso teórico. As ideias apresentadas no manual As Raízes históricas O funcionalismo surgiu na América na década de 30 do século XX mas tem raízes muito anteriores, já no século XIX, particularmente, no darwinismo. A sociologia americana foi significativamente diferente da sociologia europeia, pelo menos até aos anos 60 do século XX, tendo cada uma dessas tradições intelectuais construído os seus próprios modelos, marcados por preocupações diferentes. A sociologia americana teve uma vertente mais empírica desde logo associada à escola de Chicago, sem dúvida a universidade pioneira no primeiro terço do século XX. O facto de o funcionalismo ter sido uma criação americana, deve ser associado á própria história da sociedade americana. Como sociedade "moderna" e nova, onde estavam ausentes os vínculos tradicionais entre os indivíduos herdados de um passado feudal, esta sociedade viu-se a braços com a questão de se manter coesa. Por isso, deu particular importância às questões da solidariedade entre os indivíduos, às questões da manutenção e funcionamento de um sistema social em formação, composto por gentes das mais diversas proveniências.

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É costume associar-se o nascimento do funcionalismo americano com a publicação de The structure of social action de Talcott Parsons em 1937. Essa data assinala o fim da preponderância da famosa Escola de Chicago, situada na cidade do mesmo nome e com um marcado pendor empirista e grande produção de inquéritos sociológicos. A obra de Parsons pode considerar-se uma reacção intelectual ao empirismo da Escola de Chicago, que veio a constituir a primeira tentativa séria de introduzir na sociologia americana, o pensamento dos clássicos europeus, Durkheim, Weber, Tönnies e Pareto. Com um importante fundamento teórico a teoria de Parsons tornou-se um verdadeiro paradigma de investigação, algo que não pode ser dito da Escola de Chicago, precisamente pela falta de modelos teóricos que esta exibiu. A ascensão de Parsons em Harvard é simultânea com o declínio da Escola de Chicago mas não foi fácil nem imediata. Parsons começou por leccionar economia pois não era sociólogo e só veio a tornar-se professor de sociologia em 1931 após ter publicado dois artigos em que teve oportunidade de aplicar os conhecimentos adquiridos na Europa. O funcionalismo na américa. A centralidade de Talcott Parsons Parsons foi a figura central da sociologia americana entre 1930 e 1960. A ele se liga o funcionalismo enquanto teoria sociológica. Esta preponderância veio a estender-se a uma influência decisiva sobre a sociologia fora da América que se prolongou até aos anos 70. Parsons teve oportunidade de estudar em Inglaterra, na London School of Economics, entre 1924 e 1925, e aí contactou com a antopologia funcionalista de Malinowsky e Radcliffe-Brown, corrente que estabelecia uma analogia funcional com a biologia. Posteriormente, Parsons estudou mais um ano na Universidade de Heidelberg, na Alemanha, onde teve oportunidade de conhecer a obra de Max Weber então ainda bastante dominante ali. Aproximou-se igualmente da restante sociologia alemã pelo estudo que fez das obras de Marx e Sombart, entre outros. Regressado à América, teve oportunidade de ingressar em Harvard, ainda sob a influência de Pitirim Sorokin, estudou economia clássica e filosofia e foi-se rodeando de um grupo de alunos tais como Merton, Kingsley Davis e Wilbert Moore. Como resultado desta ecléctica cultura intelectual Parsons veio a distanciar-se da sociologia americana da sua época opondo-se ao positivismo e ao empirismo dominantes e centrou-se em problema sociais relacionados com o papel do Estado na sociedade ocidental, incluindo a emergência do fascismo e do comunismo, que o autor via como ameaças para as democracias capitalistas. Por isso, a teoria da Parsons constituiu uma tentativa de encontrar uma solução para o sistema social, que fosse uma terceira via liberal e democrata situada

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algures entre fascismo e comunismo, que garantisse a autodeterminação e a liberdade dos indivíduos. Curiosamente, este autor acabará por ser considerado conservador e não reformista. Parsons veio a direccionar os seus trabalhos para uma área de convergência entre sociologia, psicologia e antropologia. Esteve muito activo entre 1945 e 1956 e rodeou-se de uma extensa rede de influência baseada em alunos diplomados, que se espalharem por todas as universidades, tendo estabelecido o seu pensamento como eixo dominante da sociologia americana. Durante esses anos publicou 27 trabalhos, sozinho ou em colaboração com outros, que estabeleceram a sua nova teoria sociológica da acção humana recorrendo ao uso de conceitos sistémicos aplicados à teoria da acção. A isto se chamou a fase funcional-estrutural da teoria de Parsons, ou funcionalismo/teoria dos sistemas que dominou a sociologia americana até ao final dos anos 60. Foi a partir dos anos 50 que as grandes críticas começaram a surgir, nomeadamente por Wright Mills que acusa a teoria de não atender à realidade concreta; Ralf Dahrendorf acusa a teoria de não explicar as questões do constrangimento, conflito e mudança; George Homans (teoria das trocas) acusa a teoria de não dar explicações para além das psicológicas; David Lockwood acusa a teoria de partir de uma base normativa e não incluir problemas de poder, conflito etc. Este período crítico desenvolveu-se durante os anos 60 e foi reforçado pelo renascimento do pensamento marxista na esteira do movimento do Maio de 68, em Paris. A teoria foi contestada por muitas outras correntes, entre as quais a Etnometodologia protagonizada por Garfinkel (que por acaso foi aluno de Parosns), que a acusou de positivista, pela fenomenologia, pela teoria do conflito, pelo interaccionismo simbólico etc. Parsons reagiu às críticas e começou no início dos anos 60 a dedicar-se mais ao estudo da mudança e desenvolvimento social desenvolvendo uma abordagem sistémica. Desenvolveu então uma teoria em que o poder é visto como um meio de troca semelhante ao do dinheiro no sistema económico, afastando-se do funcionalismo estrutural e criando a teoria da acção cibernética. Dedicou-se então a questionar o funcionamento do " programa " simbólico do controlo nos sistemas de acção. Assim, reaproximou-se da biologia e da genética

4. Autores e obras Talcott Parsons Talcott Parsons nasceu em Colorado Springs nos Estados Unidos e era filho de um ministro religioso congregacional e de uma professora de liceu. Fez a sua primeira graduação em Amherst College (1920-24) e pós graduou-se na London

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School of Economics (1024-5) e em Heidelberg University (1925-6) onde sofreu a influência do famoso antropólogo Malinowski e dos discípulos de Max Weber. A partir de 1928, tornou-se leitor em Harvard University onde permaneceu ao longo de toda a sua carreira e onde teve a aportunidade de fazer discípulos que também viriam a ser importantes: Robert Merton, Kingsley Davies, Neil Smelser e Harold Garfinkel. A sua obra estende-se por mais de 150 livros publicados, sendo as mais importantes. - The struture of social action (1939), - Towards a general theory of action (1951), - The social systhem (1951) e - Societies: Evolutionary and Comparative Perspectives (1966). Robert MERTON Robert Merton nasceu em South Philadelphia em 1910. Estudou sociologia em Harvard onde também foi aluno de Sorokin e George Simpson. A partir de 1941, tornou-se professor em Columbia onde permaneceu até se jubilar em 1979. Ao longo da sua distinta vida académica publicou 23 livros além de numerosos artigos de revistas e criticas de obras. É geralmente considerado como fazendo a ponte entre o pensamento clássico do século XIX, o do princípio do século XX e o pensamento sociológico actual. C. Wright MILLS C. Wright Mills (1916- 1962) nasceu em 1916 no Texas (Waco) numa família de baixa classe média. Na Universidade do Texas, ainda estudante, publicou artigos nas duas mais importantes revistas de sociologia. Doutorou-se na Universidade de Wisconsin e começou por ser professor em Maryland, mas desenvolveu praticamente toda a sua carreira na Universidade de Columbia. Era um homem muito activo, combativo e tumultuoso, com uma vida pessoal agitada, três casamentos e muitas outras ligações informais, parecia estar permanentemente em luta com tudo e com todos. Morreu de ataque cardíaco aos 45 anos depois de já ter deixado à sociologia importantes contributos. Enquanto professor em Columbia, foi isolado e cerceado pelos seus colegas, pois esteve sempre fora e contra o sistema. Estava não só contra as pessoas mas contra a sociedade americana. Numa visita à União Soviética também não se coibiu de fazer as suas críticas. Ralf Dahrendorf

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Ralf Dahrendorf (1929-) nasceu em Hamburgo, filho de um polícia alemão. Esteve preso num campo de concentração entre 1944 e 1945 e mais tarde frequentou a universidade de Hamburgo onde estudou filologia e filosofia. Pós-graduou-se na London School of Economics onde sofreu influência de Popper. Leccionou em várias universidades tais como Saarland, Hamburgo, Tubingen e Constanz. Envolveu-se em questões políticas alemãs, filiou-se no Partido Democrático Livre e tornou-se membro do Baden Wurttemberg Landtag entre 1968 e1970 e membro do Bundestag de 1969 a 1970. Desempenhou vários cargos políticos até se tornar director da London School of Economics em 1974.

5. Exercícios de controlo A. Complete os espaços em branco de modo a dar sentido pertinente às frases. 1. O funcionalismo surgiu na ____________, nos anos________ do século __________. 2. The sructure of social action foi publicado pela primeira vez em ___________. 3. A ascenção de Parsons em ______________ é simultânea com o declíneo da _____________ de __________. B. Diga se são verdadeiras ou falsas as seguintes afirmações. 1. Parsons sofreu a influência de Malinowsky. 2. O funcionalismo/teoria dos sistemas dominou a América até ao final dos anos 60. 3. Parsons interessou-se sobretudo pela mudança social. C. Assinale a única resposta verdadeira. Parsons considera variáveis estruturais: a) Valoração/avaliação b) Aquisição/atribuição c) Negação/afirmação Soluções A.

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1 - América/30/XX 2 - 1937 3 - Harvard/ Escola / Chicago B. 1 - v 2 - v 3 - f C. b)

Capítulo 6- Interaccionismo simbólico

1. Competências a adquirir Quando tiver completado o estudo deste capítulo deverá ser capaz de: - Explicar a importância do interaccionismo simbólico ao longo do século XX, - Explicitar e explicar os quatro temas fundamentais do intraccionismo simbólico, - Explicitar o papel do eu na interacção simbólica que constrói as sociedades, - Referir sucintamente a história de desenvolvimento do estrutural funcionalismo, referindo as principais datas, autores, publicações e ideias, - Referir as principais influencias intelectuais que estiveram na origem do interaccionismo simbólico, - Relacionar o interaccionismo com a actividade da Escola de Chicago, - Explicitar e distinguir as várias contribuições e desenvolvimentos teóricos interaccionistas, referindo autores, ideias, datas e publicações principais, - Explicitar as principais críticas ao interaccionismo e as principais respostas adaptativas, - Explicitar as contribuições mais recentes para o interaccionismo, -

2. Conceitos prévios Emoção Comportamento Étnico Simbólico Símbolo Interacção Empirismo

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3. As ideias Introdução A fundação do interaccionismo simbólico deve-se a Herbert Mead (1863-1931) e teve como influência directa o ragmatismo e o behavorismo. O pragmatismo é caracterizado por alguns aspectos que podemos sintetizar da seguinte forma: - Não existe uma verdadeira realidade fora a do indivíduo, ela é criada no acto de relacionamento do indivíduo com o mundo; - As pessoas recordam e constróem conhecimentos do mundo enquanto repetem as acções. Aquilo que não praticam, esquecem. Aquilo que se repete regularmente está presente na mente humana. - As pessoas definem os objectos sociais em função da sua própria experiência pessoal ou seja, subjectivamente. - Para entendermos as perspectivas dos outros temos de nos pôr na sua pele para tentar viver a sua experiência e assim perceber o seu entendimento do mundo. Quanto ao Behavorismo é uma corrente da psicologia formulada por John. B. Watson e ligada à observação dos comportamentos humanos que correspondem a estímulos exteriores. Esta corrente relativiza os processos mentais que, decorrem entre o estímulo e o comportamento observável. Assim o comportamento humano é praticamente equivalente ao comportamento animal, que também se processa mediante o esquema estímulo/resposta. No behavorismo não são tidas em conta as capacidades humanas que permitem o uso da linguagem como meio de resposta ao estímulo. Este tipo de concepção, que rejeita a mente faz do actor apenas um sujeito passivo. Mead não aceita a perspectiva behavorista e tenta construir uma teoria que ultrapasse as propostas desta maneira de interpretar o comportamento humano. O interaccionismo simbólico é um tipo de micro-sociologia que se situa algures entre as grandes teorias de Marx e Parsons e a psicologia. Mead não publicou nada sobre o interaccionismo. Foi o seu aluno Blumer que apresentou o termo pela primeira vez em 1937 em alguns ensaios então publicados. Em termos sintéticos, o interaccionismo simbólico pode ser resumido como se segue: - Em oposição à explicação sociológica baseada nos aspectos da estrutura social esta corrente insiste na dimensão vivida da experiência individual no dia-a-dia. Pretende compreender como é que o indivíduo cria ordem e sentido para as suas

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acções, através da comunicação com os outros e dos símbolos utilizados para comunicar. - A utilização dos métodos científicos é dispensada e o trabalho do investigador resume-se à descrição e à interpretação das acções a partir de uma posição observante, que permita colocar-se na pele do outro e reconstituir os seus sentimentos e estilo de vida. Trata-se de uma interpretação do funcionamento da mente humana. - O actor é considerado a unidade mínima de análise. Aqui atende-se ao esquema estímulo resposta mas não como um mecanismo automático. O estímulo é visto como uma oportunidade para a acção e não como uma compulsão. Na resposta o homem considera não só o que está em jogo imediatamente mas, também, as suas experiências passadas e a antecipação do resultado da sua acção. Assim, o estímulo não funciona como algo absolutamente exterior. Ele implica actor e ambiente exterior numa interacção. - A percepção dos estímulos implica um raciocínio e não uma resposta compulsiva imediata. Os indivíduos sofrem em geral vários estímulos ao mesmo tempo e tem de decidir a qual deles dar resposta isso implica, uma percepção diferenciadora dos vários estímulos. O acto de nos relacionarmos com os objectos é criador de um sentido do objecto para nós. O objecto é pois, dependente do sujeito. - A resposta aos estímulos por parte do homem permite a manipulação dos objectos. A fase da manipulação implica uma pausa no acto de resposta, que não existe no comportamento animal. Esta pausa permite ao homem ensaiar várias respostas tendo em consideração as suas experiências passadas e expectativas futuras. É em função disso que o actor delibera o seu comportamento. - O acto envolve uma pessoa mas, os actos sociais envolvem necessariamente mais do que uma. Nas relações inter-individuais o gesto é a expressão fundamental que funciona como estímulo que desencadeia respostas. Os gestos tem significados e o que distingue o homem do animal é essa capacidade de criar sentido e de possuir uma linguagem gestual que pressupõe um pensamento prévio. Os gestos vocais que permitem o uso da língua são os mais significativos no processo de comunicação humana uma vez que não são essencialmente involuntários como certos gestos físicos. Assim, eles pressupõem avaliação e escolha de respostas apropriadas. Pressupõem uma capacidade de auto-controlo nas reacções que permite a organização social humana. - Os estímulos significantes, exclusivamente humanos, são aqueles que desencadeiam sistematicamente respostas do mesmo tipo. Não são necessariamente iguais mas semelhantes, porque têm um sentido próximo. É o sentido partilhado pelos actores em jogo que lhes permite comunicar. Se não houvesse um sentido partilhado a comunicação não seria possível.

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- O conjunto de símbolos vocais significantes chama-se linguagem vocal. As palavras têm um significado associado que é também comunicado. Transmite-se não somente um som ou um gesto sonoro mas um significado inerente. Isto pressupõe imediatamente uma resposta. Os símbolos significantes estimulam portanto os indivíduos à comunicação. - Os gestos têm portanto, uma função de ajustamento dos indivíduos implicados em qualquer relação social. De um ponto de vista pragmático, o símbolo significante é mais eficaz na relação social do que qualquer outro. - É exclusivamente através de símbolos significantes que o pensamento humano se torna possível. Para Mead, " pensar é como falar com outra pessoa". O pensamento é uma conversa de um indivíduo consigo mesmo. - Os símbolos significantes também tornam possível uma interacção simbólica. Isto significa que os indivíduos podem interagir não somente através de gestos, mas de gestos significantes, o que é muitíssimo diferente, pois permite formas padronizadas complexas de interacção, que constituem formas de organização social. - A capacidade de pensar é portanto moldada pela interacção social que permite aos indivíduos aprenderem os significados e símbolos necessários ao pensamento. - Os indivíduos estão habilitados a alterar as significações atribuídas aos gestos pela sua interpretação pessoal dos mesmos, uma vez que têm capacidade de interagir consigo próprios, e a interacção é criadora de sentidos. - Os modelos de interacção e comunicação criam grupos e sociedades. -Reconhece-se a importância da estrutura social e das instituições mas recusa-se aceitar que elas sejam determinantes do comportamento humano. Apesar do que ficou dito, os interaccionistas estão convencidos que a ordem social não resulta espontaneamente da comunicação directa. A aprendizagem de papéis durante o processo de socialização ensina aos indivíduos o que os outros esperam deles nas situações particulares. Estes ensinamentos são interiorizados e funcionam como fios condutores dos comportamentos maduros, quer de resposta a estímulos, quer de manipulação dos outros. O processo de socialização permite aos indivíduos aprenderam a distinguir o "eu", do "mim". O "eu" é pessoal e íntimo enquanto o "mim" é social e construído em função das expectativas dos outros. Na vida existe uma constante luta entre, o "eu" e o "mim" entre o homem natural regido pelos seus impulsos e o homem social condicionado pelas expectativas associadas ao desempenho dos papéis. A criação de linhas de acção tem a ver com a construção de imagens do outro e auto-imagens. Não podendo saber qual será a interpretação pessoal de cada um dos outros, em relação às minhas acções, construo uma forma de agir que tem em conta um modelo médio do que penso ser o outro. É o conceito de "outro generalizado". Este conceito representa uma imagem construída pelos

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indivíduos acerca do que eles pensam que os outros pensam deles. Esta imagem é construída não em função de todos os outros, mas do outro significante. Daqueles cuja imagem que tem de nós, nos interessa. Mead considera que o ser social e a sociedade são o resultado de interacções pessoais permanentes caracterizadas pela interpretação e a significação, a negociação e a definição de expectativas. A influência da ênfase individual no pensamento do social, embora tenha partido de um filósofo teve relevância ao nível sociológico. Muitos dos alunos de Mead eram estudantes de sociologia que decidiram assistir à suas aulas pelo interesse que estes novos pontos de vista lhes suscitavam numa época, em que predominava o pensamento estrutural. Muitos trabalhos dentro da Universidade de Chicago reflectiram esta influência de Mead não só durante os anos vinte, mas depois mais tarde, nos anos sessenta e setenta quando da grande crise do estrutural funcionalismo. O interaccionismo simbólico criou uma tradição de análise empírica, especialmente em domínios ligados à marginalidade social e aos comportamentos desviantes. Produziu vários contributos teóricos tais como, a teoria da rotulagem, a etnometodologia, a fenomenologia e o modelo dramático. Tal como os outros contributos teóricos e empíricos no seio das ciências sociais, também este não pôde obter um consenso generalizado e foi alvo de críticas. Neste caso a acusação é de incapacidade de análise para além do nível dos pequenos grupos, nomeadamente fenómenos de distribuição de riqueza e poder ou trocas sociais em dimensões alargadas. Foi também acusado de reduzir a sociedade à imagem que as pessoas fazem dela, minimizando a sua importância e o seu papel, e constituindo um ponto de vista muito "americano" da liberdade individual e da afirmação do indivíduo no meio social. O trabalho mais importante do interaccionismo simbólico foi desenvolvido por Erving Goffman no seu livro Presntation of Self in Everyday Life, publicado em 1959. O sentido atribuído ao self é profundamente influenciado por Mead e a tensão identificada por este entre, o "eu" e o "mim" é expressa através do modelo dramatúrgico. Goffman produziu estudos muito pessoais na linha do interaccionismo simbólico de Mead. Tal como os outros interaccionistas estava interessado na análise da interacção social no dia-a-dia especialmente em lugares públicos. Entendia que o comportamento humano não estava pré-determinado e resultava da capacidade criativa individual e da liberdade pessoal limitada por contextos sociais, embora não determinada por estes.

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Desenvolveu o modelo dramatúrgico de acção social, que a concebe como uma actuação em público em que o indivíduo desempenha papéis, de modo a proteger o seu ser íntimo e a sua auto-imagem. A definição da identidade surge para Goffman do conflito permanente entre as definições sociais da acção e as que o indivíduo tem como suas. Para a manutenção e controlo da sua imagem pública, o indivíduo utiliza estratégias de actuação que são condutas físicas ou verbais. Elas permitem resistir à destruição do "Eu" por parte dos outros e as situações sociais mais duras como por exemplo, a experiência das instituições totais. As estratégias da interacção no dia-a-dia, passam pelo respeito de pequenas convenções, fingimento de que se desconhece coisas acerca dos outros, criação de equívocos humoristas, fingimento de que se não presta atenção ao outro - desatenção amável etc. O conceito de papel social é central no pensamento de Goffman. Os papéis sociais são definidos socialmente em função das posições que os indivíduos desempenham. Os desempenhos pessoais desses papéis são únicos e, tem a ver com o modo como cada indivíduo concebe a criação e manutenção da sua imagem em função dos traços definidos socialmente para esse papel. Trata-se de uma interpretação de papel semelhante á que os actores desempenham no palco. Goffman afirma que a vida é vivida em diferentes regiões. Estas podem ser as regiões da frente ou as da rectaguarda. As primeiras dizem respeito á intimidade e as segundas dizem respeito aos actos públicos onde os indivíduos são levados estrategicamente a agir formalmente, de modo a forjarem a imagem que lhes convém. Assim, toda a vida social está organizada em zonas de tempo e espaço que se caracterizam diferentemente. A etnometodologia, como o nome indica, é um método de análise da realidade social. Foi criada por Harold Garfinkel. Garfinkel nasceu em Newark, Nova Jersey e foi aluno de Talcot Parsons, embora tenha sido profundamente influenciado pela fenomenologia de Alfred Schutz. Foi um reputado professor da Universidade de Los Angeles, Califórnia. A etnometodologia baseia-se na observação da vida social do dia-a-dia, na tradição dos estudos empíricos do interaccionismo simbólico. Relativiza portanto, a importância das estruturas sociais. Parte do pressuposto de que o que mantém a ordem e a coesão social é a vida rotineira do dia-a dia. Somente os sociólogos e os pensadores consideram a existência de estruturas sociais e instituições responsáveis pela manutenção da ordem social. Os indivíduos, no seu dia-a-dia, preocupam-se apenas com o desempenho das suas rotinas e dos seus papéis e, só se apercebem da existência de estruturas sociais face a acontecimentos dramáticos ou muito significativos absolutamente excepcionais nas suas vidas.

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O fenómeno que permite manter unida a sociedade é o encontro concertado de práticas, regras e expectativas comuns que ocorre entre os indivíduos. Assim, a etnometodologia pretende estudar os métodos que os indivíduos utilizam nas suas relações do dia-a-dia, os quais reflectem as suas aprendizagens e as suas interpretações das experiências já vividas, os seus encontros sociais e as suas rotinas estabelecidas. Os estudos empíricos daqui resultantes produziram descrições etnográficas detalhadas de eventos rotineiros e diários geralmente negligenciados pela investigação sociológica. No fundo trata-se de estudos acerca do Senso Comum e das maneiras de viver. Para estudarem as rotinas e a sua importância na manutenção da ordem social, estes investigadores provocam, metodologicamente, rupturas nas práticas sociais, como incumprimento de regras, desrespeito pelos outros etc. Garfinkel desenvolveu três conceitos fundamentais: Método Documental, Reflexibilidade e Indexicalidade. Quanto ao primeiro é um método que permitem identificar certos padrões de interpretação e significação existentes na vida do dia-a-dia que conduzem os indivíduos a uma experiência social particular. O conceito de Reflexibilidade que se aplica à vida social, refere-se ao fenómeno de interpretação individual orientada por um sentido pré-determinado socialmente. Cada indivíduo utiliza os outros para elaborar as suas imagens pelo que elas são o reflexo das suas interacções. Por último, o conceito de Indexicalidade aponta para o facto de nenhuma palavra ou acção, ter sentido fora do seu contexto. Para a etnometodologia a linguagem e a conversação são, pois, fundamentais para criar a realidade social. Ela é socialmente construída, como afirmarão Peter Bergman e Luckman em 1965, na sua obra traduzida para português: A construção social da realidade. As palavras já não são meros símbolos de objectos, pensamentos emoções etc, são criadoras dessas mesmas realidades e são responsáveis pelo funcionamento social. Assim, a tarefa principal da etnometodologia é refutar o princípio sociológico de que a realidade social existe por si e é independente dos indivíduos. Estamos nas antípodas de Durkheim e, na tradição interpretativa da sociologia. A tarefa do sociólogo não deve ser a de criar sentido para a vida social mas sim a de descrever como é que o homem da rua cria sentido para a sua vida. Para isso basta observar. A criação de sentido, por parte do investigador, por exemplo, através da utilização de estatísticas, é tida como ilegítima pois a caracterização é subjectiva e enviesada. São os implicados nos fenómenos que tem de falar deles pela linguagem do sociólogo. Ele tem de os deixar mostrar como são e o que pensam. O sociólogo deve ser um veículo de evidenciação do mundo através da sua capacidade de interpretar os sentidos criados pelo mundo, não de produzir esse sentido.

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De um ponto de vista epistemológico, isto opõe-se ao positivismo e especialmente á revisão construtivista de Bachelard. Trata-se de um desafio demasiado grande às bases do pensamento sociológico par escapar a todo o tipo de críticas. As principais críticas feitas á etnometodologia são: - Incapacidade de explicar seja o que for, e produzir apenas descrições sem capacidade teórica. - Apresentar as pessoas como criadoras de realidade. - Não contemplar a influência do poder e da estrutura social nos comportamentos dos indivíduos. - Representar a vida social como sendo uma colecção de vidas individuais imunes aos grandes fenómenos económicos e políticos, como a revoluções ou as crises económicas, por exemplo. - Não fazer mais do que leituras de senso comum sendo incapaz de explicar qualquer fenómeno. A etnometodologia constitui o que Boaventura de Sousa Santos classificou como um "rombo no paradigma positivista" no seu livro Introdução a uma ciência Pós-moderna. Teve a virtude de focar aspectos quase sempre esquecidos na tradição sociológica relativos à vida do dia-a-dia, e apesar da grande controvérsia teórico/epistemológica que gerou, parece que como corrente se mantém com bastante força ainda. Ideias apresentadas no manual O Interaccionismo simbólico desenvolveu-se ao longo do século XX de forma irregular. Actualmente ainda tem os seus defensores que lhe advogam um rejuvenescimento e tem também aqueles que o consideram envelhecido e ultrapassado. Nunca foi, nem é um domínio pacífico. Interaccionismo Simbólico: Imagens, Histórias e Temas O interaccionismo simbólico inclui várias correntes e teorias diferentes, formuladas em décadas e universidades diferentes. Para se identificar uma corrente de pensamento como interaccionista, devemos questioná-la acerca dos seguintes quatro critérios que devem estar presentes:

1. Os mundos humanos não são só materiais mas também fortemente simbólicos e a sociologia interaccionista interessa-se pelas formas, pelas quais o ser humano constrói significados. por exemplo, como se define a si próprio, as suas emoções e comportamentos, situações em que se

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envolve, como interage com os outros manipulando, transformando e alterando esses significados.

2. A evolução das significações está ligada a um processo que resume as estratégias de aquisição de um sentido do "Eu", de desenvolvimento de uma biografia, representação mental do tempo e do espaço (ordenamento) etc.

3. A unidade de análise interaccionista não é o indivíduo, mas a interacção, que faz com que no "Eu" individual esteja sempre presente o outro.

4. Todas as descobertas são objecto de investigação empírica. Investigam-se as interacções concretas entre as pessoas, observam-se os encontros e estuda-se -lhes os significados.

Histórias Controversas George Herbert Mead foi considerado por muito tempo o fundador do interaccionismo simbólico, nos anos 20. O termo, no entanto apareceu em 1937, com Herbert Blumer. Há quem considere que foi Robert Park o fundador desta corrente na Escola de Chicago. Há até quem faça remontar a origem do interaccionismo a um período mais remoto mas pode não ser uma atribuição completamente legítima. O interaccionismo simbólico foi assim chamado após a publicação de várias teorias diferentes em alguns aspectos mas unidas pela presença dos quatro critérios acima referidos. Dada a diversidade de contributos interaccionistas simbólicos, estas teorias podem ser divididas em quatro correntes fundamentais, embora correndo-se sempre o risco de desvio e parcialidade:

1. Escola de Chicago – Blumer, 2. Escola de Iowa – Manford Khun, 3. Escola Dramatúrgica – Com raízes em Durkheim, 4. Escola Etnometodológica - Com raízes em Parsons.

Primeiros Tempos. Os Alicerces do Pensamento Interaccionista A Herança Pragamatista O pragmatismo foi a principal influência exercida sobre o interaccionismo simbólico. Os três nomes que devem ser associados a esta corrente, depois de Mead são: James ( 1842-1910) Dewey ( 1859-1952) Peirce (1839- 1914).

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São os seguintes os três traços fundamentais do pragmatismo: 1. O concreto sobrepõem-se ao abstracto e o geral sobrepõem-se ao

universal. 2. A verdade absoluta é inatingível, devemos buscar verdades parciais e

provisórias. 3. Evitar todos os dualismos filosóficos considerando-os um erro.

O formalismo e o legado de Simmel Simmel representa uma tradição interaccionista observável no seu interesse pelas formas da interacção social. Interessou-se mais pelo pormenor que pela generalização abstracta, afirmando a impossibilidade de se aceder ao conhecimento do todo. Baseia a análise sociológica na distinção entre forma e conteúdo e procura captar as formas da vida social. O apogeu Interaccionista: a Sociologia de Chicago em Acção O interaccionismo simbólico foi a mais importante teoria empírica do século XX, senão a única. É uma teoria americana que atingiu o seu máximo vigor em Chicago conjugando influências pragmatistas, formalistas e da sociologia da Simmel. Robert E. Park e E. Burgess foram as duas figuras mais conhecidas dessa escola, nos anos 20 a 40. A tendência dominante da sociologia de Chicago foi o empirismo. A observação directa da realidade, a desconfiança em esquemas generalizadores abstractos, a ideia e o método de observação participante e o estudo de casos foram a dominante nesse ambiente intelectual americano. O trabalho de George Mead foi prosseguido e revisto pelo seu principal discípulo, Herbert Blumer (1900-1986). A Continuação do Compromisso em Meados do Século: a Marcha dos interaccionistas A sociologia entrou em declínio em Chicago nos anos 50, depois da morte de Park, da reforma de Burgess e da mudança de Blumer para Califórnia mas, o interaccionismo simbólico enquanto corrente permaneceu activo prosseguindo com investigações em curso no que já foi chamada a segunda Escola de Chicago. Becker e Goffman foram os dois herdeiros desta tradição criando a Etnometodologia que viria a distinguir-se claramente do interaccionismo simbólico de modo a tornar-se também uma tradição dentro da sociologia.

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Becker Fazendo parte da Escola de Chicago, Becker destacou-se no estudo do desvio social ao qual aplicou os critérios de observação do interaccionismo. Os seus estudos são considerados percursores da teoria da rotulagem e da futura teoria do construtivismo social. Foi o primeiro sociólogo a incluir a fotografia na metodologia sociológica. Goffman Fundador da perspectiva dramaturgica, Goffman doutorou-se em Chicago, onde veio a sofrer a influência interaccionista de Hughes e Blumer. Esta influência foi matizada com outras influências, nomeaamente dos neo-durkheimianos. Desenvolveu um trabalho interaccionista especialmente preocupado com o simbólico, os rituais da vida quotidiana e da interacção social. Dedicou-se a uma análise formalista, nomeadamente no estudo das instituições totais, tais como os hospitais psiquiáricos. A partir dos anos 60 interessou-se pela fenomenologia e pela socio-linguística. Goffman sofreu grandes críticas da comunidade científica sendo muitas vezes visto mais como ensaísta do que como cientista. Etnometodologia Nem sempre considerada uma teoria interaccionista, a etnometodologia dedica-se ao estudo do dia-a-dia das pessoas, pretendendo dar resposta à clássica pergunta da sociologia: como é possível manter a ordem social? Esta teoria considera que a ordem social se mantém através das actividades diárias das pessoas, nas quais estas se esforçam para serem eficazes nas suas acções e, por razões de ordem prática, sobordinam-se às condições do seu espaço e do seu tempo aceitando a realidade que as envolve. Assim. A etnometodologia é o estudo dos métodos de construção dos sentidos étnicos ou culturais. Pretende estudar os métodos e os processos pelos quais, no dia-a-dia, as pessoas chegam a conhecer o mundo e a fazer juízos dele. Estes sentidos constroem-se de acordo com regras estruturas e processos. A etnometodologia recorre à fenomenologia e à semiologia para interpretar os sentidos do todo social. O termo é da autoria de Goffman. A etnometodologia não é globalmente aceite pela comunidade científica. Contam-se entre as críticas que lhe são feitas: - Ser um ramo do movimento hippie californiano dos anos 60, - Ser demasiado subjectiva, - Negligenciar as questões relativas à estrutura social à história e à política.

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O Momento Crítico: uma viragem na sorte O interaccionismo simbólico, foi muito influente durante os anos 60 do século XX, uma vez que fez a crítica da corrente sociológica até aí dominante e que então se encontrava em declínio: o estrutural funcionalismo de Parsons. Durante os anos 70, o interaccionismo começou a ser muito criticado. As principais críticas surgidas, foram: - Ser individualizante e subjectivo. - Ser relativista em extremo. - Ser metodológicamente desnorteado. - Ser confuso nas conceptualizações, especialmente do "Eu". - Ser excecivamente voluntarista e determinista. - Cuja orientação teórica negligenciava a vida emocional e o inconsciente. - Que era incapaz de lidar com a estrutura, o poder a economia e a história. - Que se preocupava demasiado com o transitório, o episódico, o marginal e o exótico. - Que negligenciava áreas completas da vida dos grupos. - Que era ideologicamente comprometido. A vastidão das críticas parecia anunciar o fim dos interaccionismos. Mas o que se verificou foi uma importante resposta a estas críticas, uma forte renovação e a criação da Sociedade para o estudo do Simbólico (SSSI), promotora de confeências, revistas e um boletim. Este período deu origem a muitos estudos, com o objectivo de mostrarem as falhas dos críticos, tendo o campo interaccionista sido ainda mais diversificado, de tal modo que o pensamento interaccionista contemporâneo não se encontra limitado a qualquer posição mais humanista ou mais científica. Continuam a existir investigações que privilegiam a análise do quotidiano e abriram-se novos campos de investigação que incluem a sociologia das emoções, a análise conversacional, a lógica dos Media, os movimentos sociais, a teoria dos problemas sociais etc. O interaccionismo aproximou-se da corrente dos Cultural Studies e manteve a predominância da investigação empírica. A tendência de evolução inclui cinco vias: - Transposição da divisão entre micro e macro. - Preocupação com a linguagem. - Interesse pelo simbólico. - Procura de processos formais genéricos. - Estudo da política.

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4. Autores e obras Herbert MEAD Herbert Mead nasceu em Massachussets em 1863. Ensinou filosofia, (a sua própria formação em Harvard), em Leipzig, Berlim e Michigan de 1891 a 1893 e, posteriormente, até ao fim da sua carreira foi professor da Universidade de Chicago. Foi uma figura proeminente da filosofia pragmatista e anti-behavourista ao nível da psicologia. Ervin GOFFMAN Erving Goffman nasceu em 1922 e faleceu em 1982. Era canadiano e graduou-se nas Universidades de Toronto e Chicago tendo-se depois juntado ao Departamento de Antropologia Social da Universidade de Edimburgo, para a realização de trabalhos de campo. Em 1962 tornou-se professor de sociologia na Universidade da Califórnia em Berkeley, em 1968 foi professor de antropologia e sociologia na Universidade da Pensylvania e em 1981 tornou-se presidente da Associação Americana de Sociologia. Harold GARFINKEL( 1917- ) Nasceu em Newark, Nova Jersey, nos EUA em 1917. estudou com Parsons mas foi profundamente influenciado pelas ideias de Schutz. Trabalhou na Universidade de Los Angeles, na Califórnia e dedicou-se á análise da estrutura do dia-a-dia dos actores sociais, tendo feito a sua tese de doutoramento sob o tema da percepção do outro. fundou a etnometodologia em 1967 com a publicação da obra, Studies of ethnomethodology.

5. Exercícios de controlo A. Complete os espaços em branco de modo a dar sentido pertinente às frases. 1. O interaccionismo simbólico, em rigor, apareceu em ____________ com ___________________. 2. O ____________________ foi a principal influência exercida sobre o_______________________. 3. Simmel pode ser considerado um ________________, pois interessa-se pelas formas da intracção social.

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B. Diga se são verdadeiras ou falsas as seguintes afirmações. 1. Robert Park e E. Burgess foram as mais conhecidas figuras da Escola de Frankfurt. 2. A sociologia teve o seu maior deenvolvimento em Chicago nos anos 50. 3. Becker não fez parte da Escola de Chicago. C. Assinale a única resposta verdadeira. Goffman: a) Criou a teoria da roltulagem b) Desenvolveu os aspectos simbólicos no interior do interaccionismo c) Foi um parsoniano convicto. Soluções A. 1 - 1937/ Herbert Blumer 2 - Pragmatismo. 3 - Interaccionista B. 1 - v 2 - f 3 - f C. b)

Capítulo 7 - Teoria da Escolha Racional "TER"

1. Competências a adquirir Depois de completar o estudo deste capítulo deverá ser capaz de: - Distinguir relacionar e a TER com o paradigma de Weber, nomedamente a sua teoria voluntarista da acção, - Relacionar a TER com as teorias de que partiu,

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- Relacionar a TER com os níveis de análise micro e macro, - Explicitar os pressupostos da TER, - Explicitar os principais desenvolvimentos actuais da TER, suas ideias, autores, datas e publicações, - Referir as principais revistas onde se publica actualmente esta teoria, - Relacionar o conceito de racionalidade dos actores com outras teorias anteriores à TER, - Explicar a importância e os limites da utilização do conceito de " modelo mais simples" pela TER, - Explicitar a importância de Homans para a TER, - Explicitar as relações da teoria da escolha racional coma a teoria das redes no desenvolvimento da teoria sistémica, - Explicar as relações da TER com a teoria dos jogos, - Explicitar as principais ideias desta teoria, desde as principais relações causais por ela consideradas, a natureza dos seus problemas, postulados, objectivos etc. - Explicitar as principais críticas feitas a esta teoria.

2. Conceitos prévios - Dedução - Indução - Causalidade - Nível micro - Nível macro - Explicação - Compreensão - Acção social

3. As ideias Introdução

Teoria do intercâmbio social, teoria das redes e teoria da escolha racional A evolução do pensamento do social não afastou de vez as convicções positivistas da ciência. As orientações sociológicas positivistas do presente momento encontram-se em três teorias: Teoria da troca, no seio da qual surgiram várias contribuições

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distintas, mas todas marcadas quer pelo behavorismo quer pela afirmação da existência de uma racionalidade nos comportamentos individuais dirigida para fins e objectivos particulares, e condicionante do meio social. Teoria das redes, que se dedica à compreensão das ligações entre os níveis macro e micro da realidade social e foi desenvolvida por Richard Emmerson, e teoria da escolha racional, que se deve a James Coleman como extensão e desenvolvimento especialmente teórico da teoria das trocas. Teoria da troca Esta teoria baseia-se em convicções behavoristas, isto é, afirma a importância dos comportamentos individuais na determinação do meio social e posterior re-condicionamento dos comportamentos individuais. Assim, longe das perspectivas holistas que quase fazem desaparecer o actor social, considera-se a sua capacidade individual de desenvolver comportamentos conducentes à mudança social. O fundador da teoria da troca foi George Homans com a publicação do ensaio "Social behavior as exange" em 1958. Outros trabalhos desenvolvidos por Thibaut e Kelly no âmbito da psicologia dos grupos vieram contribuir para o desenvolvimento desta teoria. A contribuição de Homans é essencialmente psicologística, pois incide sobre comportamentos individuais. Apesar disso os comportamentos individuais não são tratados enquanto comportamentos abstractamente isolados. O que o autor pretende é mostrar as consequências sociais dos comportamentos individuais nas interacções dos diferentes actores. No entanto, Homans acredita que o resultado dos múltiplos comportamentos individuais não carece de uma explicação sociológica pois pode ser explicado pela psicologia. Julga que a interpretação oportunista dos actores sociais vai pautar os seus comportamentos no meio social e, estes comportamentos devem ser compreendidos a partir da psicologia. Assim estamos nas antípodas de uma análise institucional e na refutação total do parsonianismo. Existe aqui uma profunda influência liberalista, uma convicção de que o resultado social das acções individuais está directamente ligado com os interesses privados de optimização das suas posições. Trata-se de uma teoria utilitarista. Uma importante contribuição para a teoria da troca foi formulada por Peter Blau. Este austríaco nascido em 1918, estudou nos Estados Unidos para onde emigrou em 1939. Foi professor em Columbia e, dedicou-se ao estudo das organizações formais e da estratificação social. Peter Blau pretendia compreender a estrutura social a partir das relações sociais. Compreender como é que, a partir da interacção social poderia surgir a complexidade de uma estrutura social. Blau sublinha a importância da troca

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social como originária da própria estrutura social através de um processo que decorre em quatro momentos: Num primeiro momento os indivíduos estabelecem trocas entre si. Estas trocas geram num segundo momento diferenças de poder e de estatuto. Por sua vez, os diferentes estatutos e níveis de poder buscam a sua própria legitimação e organização, o que leva a um quarto momento caracterizado pela oposição de situações e à mudança social. A teoria das trocas sublinha o aspecto behavorista do estímulo-resposta. Considera que as relações interindividuais se organizam em torno de sistemas de recompensa que, condicionam os comportamentos individuais, orientados egoisticamente para os benefícios da sua interacção social. Uma interpretação de nível macro destes princípios individualistas e utilitaristas foi desenvolvida por Richard Emerson a partir da década de sessenta e representou uma nova etapa no desenvolvimento da teoria da troca. Emerson considera que a perspectiva teórica de Homans é reducionista e incapaz de explicar a totalidade da vida social. Em 1972 desenvolve uma teoria integrada que inclui a base psicológica, mas igualmente os aspectos macro-sociais. Amplia a análise considerando que os actores sociais podem ser individuais ou colectivos. Emerson considera que os indivíduos orientam as suas acções de modo a obter benefícios próprios, e portanto, os seus comportamentos são racionais no sentido dessa obtenção. Os comportamentos que resultam em redução de benefícios são progressivamente substituídos por outros mais úteis. Por outro lado, os benefícios que cada indivíduo pode obter estão dependentes da sua capacidade de troca no meio social, e portanto, também dos benefícios que ele pode fazer obter com a sua acção social. Ao passar para o nível macro da análise do comportamento, Emerson considera estes mesmos aspectos aplicados a entidades colectivas, dotadas de determinados valores que as caracterizam, e concretizando trocas em rede entre si e entre os seus actores. Estas redes de relação criam, permanentemente, oportunidades de troca e relações sociais que se ligam através de uma estrutura a que ele chama uma rede de trocas. Assim, uma rede de trocas é segundo o próprio autor, uma estrutura social que resulta de duas ou mais relações de troca entre actores sociais, que se afectam mutuamente de forma positiva ou negativa. Este resultado é positivo, quando a troca estabelecida amplia a capacidade de troca futura do actor social, e é negativa, quando reduz a sua capacidade de troca, isto é, reduz a sua capacidade de produzir benefícios para terceiros em troca de outros benefícios que estes lhes proporcionam no seio da rede. É esta desigualdade na troca que gera a desigualdade de poder e a dependência de uns em relação a outros. O poder á um fenómeno estrutural que resulta das relações de troca em rede e que condiciona essas mesmas relações.

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A teoria das redes A orientação marcadamente psicologista destas teorias foi rejeitada e ultrapassada por outros investigadores de modo a reconduzir o pensamento do social ao ponto de vista sociológico. A teoria das redes é um exemplo de re-orientação da teoria da troca no sentido de relativizar a perspectiva atomista. A teoria das redes ultrapassa a perspectiva psicologista através de um enfoque culturalista centrado no estudo do processo de socialização, durante o qual, normas e valores são interiorizados pelos actores sociais. Transfere-se a análise do nível motivacional dos indivíduos para o cumprimento das normas, para a observação das regularidades no cumprimento dessas mesmas normas. Já não é significativo perceber o que leva os indivíduos a cumprir regras estabelecidas, mas sim, importa compreender a estrutura social, que se crê produzida pelos padrões dos modos de ligação entre os indivíduos. Assim, buscam-se redes de relações padronizadas, estruturas profundas de acção, para além das aparências superficiais dos sistemas sociais. Na teoria das redes os actores estão constrangidos pela estrutura social pelo que a perspectiva fundamental é estrutural e não individual. Nesta teoria mantém-se o paradigma de análise em função das redes de trocas de recursos. Considera-se que os actores podem ser entidades colectivas com diferentes capacidades de acesso aos recursos, o que dá origem a uma estrutura estratificada em função desses níveis. Os níveis referem-se ao poder, aos bens materiais à informação etc. A estratificação, por sua vez, mostra que hà uma estrutura de dependência de uns em relação a outros. Teoria da escolha racional Esta teoria é também uma variante e um desenvolvimento da teoria da troca, que se manteve um tanto marginal da teoria sociológica. Foi formulada essencialmente por James S. Coleman, licenciado em sociologia pela Universidade de Columbia e professor na Universidade de Chicago. Em 1989 Coleman fundou a revista Rationality and Society e, em 1990 publicou o livro Foundations of social theory que estabelece a base do seu pensamento. Em 1992 tornou-se presidente da Associação Americana de Sociologia. Segundo o seu autor, esta teoria opera na base do individualismo metodológico e pretende constituir uma base de análise micro-social que sirva de explicação do nível macro. Assim, Coleman pretende explicar o nível macro-social a partir das acções racionais dos sujeitos ao nível micro. Coleman pretende que, a teoria

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sociológica não se limite a um exercício académico e que sirva para fazer intervenção social. Uma das justificações metodológicas desta perspectiva é a de que a recolha de dados estatísticos que permitem a análise social se faz sempre a partir dos indivíduos e procede por agregação de unidades. A teoria baseia-se no pressuposto de que os indivíduos tem objectivos e valores que os orientam, os quais tentam implementar através das suas acções. Além disso, faz apelo ás concepções individualistas da economia, segundo as quais, as acções são racionais e tendem a maximizar a satisfação das necessidades e dos desejos individuais. A teoria organiza-se analisando dois elementos distintos, interligados: actores e recursos. Os actores tentam controlar os recursos cujo controlo também interessa aos outros, de acordo como seus interesses. Porque desejam o controlo de recursos controlados por outros os actores tem de envolver-se em relações sociais. Estas organizam-se em sistema de acção. É esta estrutura e a prossecução individual de fins e interesses que cria a interdependência ou o carácter sistémico da acção social. Embora reconhecendo que na vida real as pessoas não fazem só escolhas racionais, Coleman relativiza a o papel da irracionalidade na sua teoria. Por outro lado, não tem em consideração o constrangimento que o nível macro exerce sobre o nível micro. As ideias apresentadas no manual A Teoria da Escolha Racional (TER), constitui uma actualização e desenvolvimento das ideias de Max Weber quanto ao objecto da sociologia. Para Max Weber a sociologia deveria dedicar-se à compreensão interpretativa da acção social com o fim de atingir uma explicação causal dessa acção. De facto, esta teoria pretende compreender os actores individuais interagindo entre si da melhor maneira possível, tendo em conta o seu próprio interesse, os seus objectivos e recursos de que dispõem e a percepção que têm do real. A teoria da escolha racional é muito recente e está em franco desenvolvimento. Os seus contributos fundamentais estão a ser dados por Coleman e Fararo, Cook, Levi e Elster. Algumas revistas científicas tais como a Racionality and Society e o Journal of Mathematical Sociology contêm muitos artigos orientados para esta teoria. As Fundações da Teoria da Escolha Racional na Sociologia Contemporânea Como o nome indica a teoria baseia-se na crença iluminista de que a acção humana é, em geral conduzida pela razão. Tanto o marxismo como o utilitarismo se desenvolveram com base nesta mesma presunção.

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A teoria da escolha racional pressupõe que a acção social, e a criação de cultura, normas e valores está relacionada com os desempenhos individuais e as consequências desses desempenhos ao nível do sistema social. Metodologicamente, tendo em vista fins analíticos, esta teoria propõe a concepção dos actores sociais através de um modelo que reduza as suas acções à forma mais simples possível. Entre os percursores da Teoria da Escolha Racional encontra-se Homans, Peter Blau e Mancur Olson. Esta teoria está intimamente ligada à Teoria dos Jogos e à Teoria das Redes, Teoria da Aprendizagem, Teoria Mimética e Teoria Evolucionista que são consideradas teorias auxiliares. A TER parece ser um caminho de fusão entre a economia e a sociologia. A Natureza dos Problemas Teóricos em Sociologia A teoria da Escolha Racional pressupõe que os acontecimentos de nível macro se produzem pela conjugação de efeitos dos acontecimentos de nível micro. Daí que os teóricos mais extremistas desta corrente tenham produzido um reducionismo que dá pelo nome de "individualismo metodológico". A teoria da escolha racional pretende construir modelos de inter-relações com o fim de perceber pela compreensão, e explicar dedutivamente, a causalidade da acção social. A interpretação das acções sociais A teoria da escolha Racional, na esteira de Max Weber, afirma que: - A compreensão (por interpretação) da acção social deve fazer-se no pressuposto que se pode construir um modelo simples (o mais simples possível) das escolhas racionais individuais. - A acção social resulta de interacções de indivíduos e pode ser interpretada como modelo mais simples possível dessas interacções. - As causas dos fenómenos sociais devem ser procuradas nos sistemas, ou seja no nível macro e podem ser compreendidas através da observação das acções aos níveis mais baixos (médio e micro). - As acções sociais são interdependentes, ou seja, os actores têm sempre presente o comportamento dos outros embora de várias formas. Premissas da Teoria da Escolha Racional Esta teoria baseia-se em três premissas: Individualismo, ou presunção de que só os indivíduos agem, e portanto, tudo o que ocorre na vida social é proveniente da acção individual e tem

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consequências indirectas criando o sistema social, que posteriormente, condiciona as consciências individuais. Ou seja, a estrutura é explicada pela acção. Optimização ou presunção de que o indivíduo age sempre da melhor maneira que lhe é possível e, Autocentramento ou presunção que o objectivo da acção individual é sempre o bem-estar do próprio actor.

4. Autores e obras PARETO COLLEMAN HOMANS Peter BLAU Mancur OLSON FARARO

5. Exercícios de controlo A. Complete os espaços em branco de modo a dar sentido pertinente às frases. 1. A TER constitui uma actualização das ideias de ___________ quanto ao objecto da Sociologia. 2. Coleman é uma das figuras mais importantes da Teoria da ________________________. 3. A T__________________________ baseia-se na crença iluminista de que a acção humana se baseia na razão. B. Diga se são verdadeiras ou falsas as seguintes afirmações. 1. A teoria da troca faz parte da orientação neo-positivista 2. Emerson denvolveu a Teoria das Redes. 3. A teoria da troc baseia-se no Behavorismo. C. Assinale a única resposta verdadeira. Homans: a) Aperfeiçoou a teoria da troca. b) É essencialmente psicologista. c) Foi um dos principais seguidores de Parsons.

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Soluções A. 1 - Weber. 2 - Escolha racional. 3 - TER B. 1 - v 2 - v 3 - v C. b)

Capítulo 8- Sociologia do Tempo e do Espaço

1. Competências a adquirir Depois de completar o estudo deste capítulo deverá ser capaz de: - Situar no tempo o momento em que os conceitos de espaço e de tempo começaram a ser incluídos de forma generalizada na sociologia. - Explicitar como e porquê, podem ser considerados temporais os processos sociais e culturais. - Explicitar o conceito de tempo em Durkheim. - Distinguir tempo-relógio – quantitativo, de tempo social – qualitativo. - Dar exemplos de divisões sociais do tempo com características diferentes, nomeadamente, sistemas de tempo-social hostis ao tempo-relógio. - Caracterizar as sociedades modernas do ponto de vista da sua construção social do tempo. - Distinguir "orientação pela tarefa" de "orientação pelo tempo". - Relacionar, em Marx, tempo e trabalho. - Relacionar o conceito capitalista de tempo com o conceito de tempo enquanto recurso depreciável.

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- Distinguir as três principais contribuições para uma teoria social do tempo, a saber: Heiddeger, Bergson e Mead e associar cada um destes nome a noções chave ou aspectos fundamentais da concepção de tempo. - Explicitar sumariamente a relação marxista espaço-capital. - Relacionar lealdades geográficas e divisão do trabalho, em Durkheim. - Resumir a contribuição de Simmel para a sociologia do espaço. - Caracterizar sumAriamente a personalidade urbana, segundo Simmel. - Situar no tempo e no espaço a criação da sociologia urbana. - Referir os teóricos da escola de Chicago que mais contribuíram para a sociologia urbana e as suas ideias principais. - Explicitar, segundo Wirth, as três causas de diferenciação nos padrões sociais das áreas urbanas. - Relacionar padrões de vida com espaço urbano e rural. - Distinguir as três acepções do conceito de comunidade em Bell e Newby. - Identificar e explicitar as três principais contribuições críticas das teorias de tempo e espaço surgida nos anos setenta: Castells, Massey e a tese da "nova divisão internacional do trabalho". - Explicitar os três factores que permitiram que se desenvolvesse a "nova divisão internacional do trabalho". - Explicitar os principais autores nos quai se baseou Giddens para construir a sua teoria do tempo e do espaço. - Explicitar as cinco formas de diferenciação dos humanos relativamente aos objectos, segundo Giddens. - Referir, em Giddens, algumas fontes de constrangimento sobre a actividade humana e os resultados desses constrangimentos na vida humana. - Explicitar, em Giddens, os conceitos de: regionalização, presença-disponibilidade, distanciamento espacio-temporal, margens de tempo-espaço, repositórios de poder, dimensão temporal vazia. - Explicitar as principais críticas feitas a Giddens nesta teoria do tempo e do espaço. - Caracterizar a noção newtoniana-cartesiana de tempo e relacioná-las com a teoria sociológica clássica do tempo e do espaço. - Explicitar a noção de tempo absoluto. - Referir as quatro descobertas científicas do século XX que permitiram mudar o conceito de tempo newtoniano-cartesiano. - Referir e explicar de que forma tais alterações científicas se reflectiram nas análises mais recentes da sociologia do tempo, nomeadamente, a tese de Thompson e o debate do pós-modernismo.

2. Conceitos prévios

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Todos os conceitos estudados no capítulo "teoria social clássica".

3. As ideias As ideias apresentadas no manual A sociologia do espaço e do tempo O estudo do espaço e do tempo não tem uma tradição sociológica duradoura. Apesar das importantes mudanças tecnológicas da segunda metade do século XIX, que afectaram as relações do homem com o espaço e o tempo, tais como a invenção do telégrafo, do telefone, do motor de explosão, da bicicleta, da rádio, cinema, etc., a sociologia não iniciou uma reflexão sistemática neste campo. É notória a falta de estudos destas matérias. Os modelos de explicação sociológicos limitaram-se a fazer coincidir as fronteiras das sociedades com as fronteiras dos estados nacionais sem problematizar as relações sociais no espaço supranacional, pressupondo, por defeito, a consistência espacial e temporal dessas sociedades. A partir dos anos 70 e 80 do século XX, esta situação alterou-se e a sociologia passou a preocupar-se com a forma como as estruturas e os processos sociais e culturais são forçosamente temporais e espaciais. Entre as perspectivas sociológicas do tempo, podemos assinalar a concepção francesa derivada de Durkheim que afirma que o tempo nas sociedades humanas é abstracto e impessoal e organizado socialmente. Ou seja, o tempo é uma instituição social, sendo que as suas categorias não são naturais, mas sociais. Ou seja, as categorias de tempo, variam de sociedade para sociedade. Sorokin e Merton chamaram a atenção para a natureza qualitativa do tempo social que é visto como um padrão particular não necessariamente diário ou hebdomadário. Também Bourdieu mostrou a construção social do tempo nos seus estudos na Argélia, particularmente a existência naquela cultura de um tempo hostil ao do relógio. Embora não possamos afirmar que a rejeição do padrão cronométrico do tempo esteja relacionada só com sociedades pré-modernas, o que se verifica é que as sociedades modernas estão, geralmente organizadas em função do tempo do relógio. Nessas sociedades, o tempo é visto como um recurso e não como um critério de diferenciação. Sendo um recurso ele é escasso, tal como

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os outros recursos, e tende a esgotar-se. Por isso o cálculo do tempo abstracto, mensurável e divisível adquire tanta importância. Nas sociedades modernas, ao contrário das tradicionais, as pessoas orientam as suas vidas pelo relógio e não pelas tarefas, pela luz do Sol ou pelas estações. Marx problematizou a troca social com base na troca de tempos de trabalho e considerou que o capitalismo tentava alargar o tempo de trabalho para além dos limites físicos e sociais dos homens. Precisamente pelas consequências de tais abusos na exploração do trabalho, surgiram as regulações e legislações do trabalho. O Estado obrigava assim à limitação temporal da jornada de trabalho, desencadeando, a partir daí a procura do trabalho intensivo, já que não era permitido estendê-lo no tempo. Foi Max Weber que problematizou a importância do tempo do relógio na transformação das subjectividades ou seja, na forma como os actores sociais representam mentalmente o tempo e as suas actividades em relação a ele. Heidegger, Bergson e Mead deram três contribuições fundamentais para uma teoria social do tempo. Heidegger, mostrou o carácter temporal irredutível da existência humana: os seres humanos são fundamentalmente temporais e encontram o seu sentido na consciência de caminhar para o fim da existência. Bergson, por seu lado, contestou uma concepção espacializada do tempo. Os indivíduos devem ser vistos como existindo no tempo, algo que está profundamente ligado ao corpo e algo que se representa subjectivamente mais em função da vivência que se faz dele do que propriamente do tempo objectivo. Assim, propõe que a memória seja vista como a sobreposição dos passados, o que faz com que ela esteja em constante actualização. Bergson vê o tempo como uma variável qualitativa e, o espaço como variável quantitativa. Mead também desenvolveu um ponto de vista temporal que relaciona o tempo com a acção, os acontecimentos e os papéis, e portanto, como variável objectivada. Considera que só o presente é real, pelo que o passado é visto como uma reconstrução mental do sujeito levada a cabo pelo momento presente, e portanto, permanentemente recriado e sem existência real fora do sujeito. É a emergência do presente que dá sentido ao passado e que dá igualmente sentido ao futuro. Com Mead, estamos perante a mentalidade relativista típica do século XX.

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Uma Breve História do Espaço Os sociólogos clássicos não desenvolveram muito o conceito de espaço. Marx mostrou que a acumulação capitalista se baseia na aniquilação do espaço pelo tempo, e como isso gera transformações sociais, físicas, económicas etc. ao longo do espaço e do tempo. Também Durkheim analisou alguns processos de alteração das relações sociais no espaço, resultantes da progressiva divisão do trabalho, construíndo uma teoria que mostrou que as representações individuais do espaço tem origem social e, em muitos casos, essas representações reflectem o padrão dominante de organização social. Simmel, deu uma das mais importantes contribuições teóricas do espaço: analisou cinco propriedades básicas das estruturas espaciais que podem ser encontradas nas interações sociais que causm mudanças nos significados que se atribuem aos espaços. Essas cinco propriedades são: - Carácter único ou exclusivo de um espaço; - Formas nas quais o espaço pode ser dividido em partes e, respectivo enquadramento de actividades nesse espaço; - Grau em que as interacções sociais podem ser localizadas no espaço; - Grau de proximidade ou distância, especialmente da cidade; - Possibilidade de mudar de local e suas consequências. Simmel considera que um espaço é tanto menos importante quanto a organização social se separa dele. Relaciona a personalidade urbana, a liberdade pessoal no espaço urbano, o desenvolvimento pessoal, interno e externo, a imergência da mente racional e do intelectualismo, com as características do espaço urbano. Relaciona ainda a economia monetária, com o sentido cronométrico do tempo e, com o nivelar de sentimentos e atitudes. Define assim os “padrões modernos” que permitem explicar a mobilidade da vida social, a fragmentação e a diversidade da vida moderna. Estas teorias não foram desenvolvidas após a morte dos clássicos. O grande desenvolvimento sociológico que se verificou, após a morte de Weber, deve-se à Escola de Chicago e, aí, a preocupação fundamental situou-se ao nível da ecologia humana ou urbanismo de que Louis Wirth e Redfield foram os principais representantes. Estes investigadores mostraram através dos seus estudos empíricos que a organização do espaço, principalmente em termos de

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dimensão e densidade, produz padrões sociais correspondentes, o que não corresponde à ideia de Simmel. Os estudos de Wirth forneceram a base para o desenvolvimento da sociologia urbana, enquanto os de Redfield forneceram a da sociologia rural numa tentativa de mostrar que esses dois mundos são completamente distintos e estão directamente dependentes da dimensão, densidade e heterogeneidade das áreas rural e urbana. A investigação posterior viria a mostrar que essa distinção não é total e que no espaço urbano há uma diversidade de modos de vida que não pode ser uniformizada por um padrão urbano regular. A análise das ligações entre as pessoas nos espaços rural e urbano levou à problematização do conceito de comunidade em função de vários eixos explicativos:

a) Acepção topográfica – partilha do espaço. b) Acepção social – interconhecimento e participação em

instituições locais. c) Acepção afectiva – existência de comunhão moral e afectiva

entre os membros. d) Acepção ideológica – local de conflito social e dominação.

A Crítica dos Anos 1970 Nas décadas de 70 e 80 do século XX, alguns estudos sociológicos vieram trazer mudanças teóricas nas concepções de espaço e tempo. Manuel Casttels fez uma revisão da sociologia urbana e rural, com base em conceitos marxistas estruturalistas mostrando a importância das contradições do capitalismo, reflectidas sobre o espaço nomeadamente, a concentração de consumos colectivos de produção estatal, no espaço urbano (escolas, hospitais, transporte públicos etc.). Considerando que a análise dos consumos colectivos deveria constituir o objecto de estudo da sociologia urbana, Castels procurou estudar estes consumos como forma de explicar políticas espaciais. Associa vários problemas sociais a estes consumos colectivos e relaciona-os com os sistemas de cobrança e redistribuição da riqueza por parte do Estado. Considera que estes consumos são politizáveis porque são fornecidos colecativamente e, dedica atenção aos movimentos sociais urbanos. Por isso, não lê o espaço urbano em termos culturais ou de formas de vida mas, em termos de espaço, onde se geram os conflitos criados pelos consumos colectivos, consumos esses que resultam da necessidade de reprodução do poder de trabalho.

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Várias foram as críticas ao pensamento de Casttels mas basicamente centram-se na afirmação de que a distribuição espacial das actividades não deve ser vista como se fosse determinada pela estrutura social, e que o urbano é também afectado pelas mudanças nas relações de produção e, não só pelo consumo colectivo. Outro tipo de crítica às concepções clássicas do espaço e do tempo, surgiu no final dos anos 70 com Massey, autor de influência marxista, que enfatizou o modo como o urbano é constrangido pela base económica das sociedades, embora o espaço em si, tenha um papel central na explicação da actividade capitalista, que por sua vez, se reflecte no espaço, pela via dos constrangimentos económicos. Massey considera a existência de padrões espaciais, resultantes da divisão social do trabalho e cuja dimensão histórica particular é irrelevante. O carácter de tal padrão deve ser explicado pelo desenvolvimento da luta entre capital e trabalho, e as desigualdades sociais manifestam-se em desigualdade espaciais. As desigualdades espaciais resultariam portanto de uma acumulação de estratos de restruturação, dependentes do impacto de processos de acumulação em graus variáveis. (Acumulação de capital local, nacional, internacional). Daqui se evolui para a ideia de que as classes não se limitam pelas fronteiras dos Estados, mas ao contrário, são fenómenos com determinantes internacionais que se manifestam espacialmente em função de múltiplas variáveis todas elas ligados aos processos de produção e acumulação capitalistas, aos interesses de classe e aos graus de concentração espacial das classes. Outra revisão teórica dos conceitos de tempo e espaço resultou da perspectiva da tese da “ nova divisão internacional do trabalho”. Esta tese pretendia a teorização de uma suposta nova forma espacial das relações de trabalho resultante da internacionalização. São três os factores que esta tese afirma, deverem ser tidos em conta na nova divisão internacional do trabalho:

1) Rápido melhoramento na produtividade, com consequente excedente de mão-de-obra rural, disponível para trabalhar na cidade;

2) Mudanças técnicas e organizacionais no processo produtivo, facilitando a separação do processo de produção do processo de concepção e direcção;

3) Desenvolvimento de tecnologias de comunicação, possibilitando a circulação instantânea de informação e permitindo melhoramentos na supervisão e controlo.

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A conjugação destes três factores resultou numa alteração da divisão espacial do trabalho e três consequências principais, a saber:

a) Colapso generalizado do emprego na industria do Primeiro Mundo,

b) Aumento do emprego na manufactura fabril de países recentemente industrializados,

c) Intensificação da competição espacial pela atracção e manutenção do capital móvel que pode hoje localizar-se em qualquer lugar.

O Tempo e o Espaço em Giddens Guidens desenvolveu uma teoria particular do espaço e do tempo, ligada à sua teoria da estruturação social. Tendo Heidegger como inspirador postulou 5 características no ser humano:

1. Consciência da própria finitude, 2. Transcendência da experiência sensorial individual por via da

memória, 3. Consciência do passar do tempo integrada nas instituições, 4. Existência de subconsciente individual que liga passado e

presente, 5. Movimento da passagem individual pelo tempo, passível de

interpretação como uma presença ou ausência do corpo. Giddens parte da análise do carácter rotineiro da maior parte da vida humana, no dia-a-dia. Essas rotinas são condicionadas por vários constrangimentos que estão ligados aos limites do próprio ser humano, nomeadamente a natureza do corpo indivisível, finito no tempo, impossibilitado do desempenho simultâneo de tarefas e restrita capacidade de armazenamento de tempo-espaço. As redes de interacção humana são formadas por trajectórias individuais diárias, semanais, mensais, anuais etc., por situações, participação em grupos, prosseguimento de projectos etc. Essa redes estão condicionadas pelos limites dos indivíduos que as compõem e o resultado desses constrangimentos é que a conduta diária não está só confinada por fronteiras físicas e geográficas, mas também por “ paredes espacio-temporais” existentes em todos os lados. Estas “paredes” tem sofrido grandes mudanças e essas mudanças deram-se no sentido de fazer convergir o espaço com o

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tempo devido ao encurtamento do espaço (resultante das tecnologias, nomeadamente nos transportes e comunicações). Giddens considera que os processos individuais de vida estão ligados aos processos de longa duração das instituições, tentando assim integrar a teoria da acção na teoria das estruturas. Desenvolve vários conceitos para atingir esse objectivo de que podemos destacar:

a) Conceito de regionalização, ou zona de espaço-tempo relacionada com práticas sociais rotinizadas.

b) Conceito de presença-disponibilidade, ou grau e formas pelas quais os indivíduos estão co-presentes no meio social de cada indivíduo.

c) Concceito de, ou processo pelo qual as sociedades são esticadas por períodos de tempo mais curtos ou mais longos distanciamento espacio-temporal.

d) Conceito de margens de tempo, ou formas de contacto ou conflito entre sociedades organizadas segundo diferentes princípios estruturais.

e) Conceito de repositórios de poder, ou capacidade de armazenamento através do espaço-tempo.

f) Conceito de tempo vazio, ou separação do tempo e do espaço das actividades sociais.

Sociologia do tempo e do espaço A sociologia do tempo tem sido alvo de grande revisão à medida que os conceitos de tempo e espaço têm evoluindo. B. Adam propõe que deixe de se distinguir o tempo natural do tempo social tal como se deve deixar de distinguir sujeito e objecto, natureza e cultura pois muito do que os cientistas atribuem exclusivamente ao humano, está generalizado na Natureza. Só o tempo do relógio não existe na natureza, e é esse que tem sido desprezado pela sociologia por ter sido considerado como uma variável do tempo natural.

4. Autores e obras Castells

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Massey Giddens

5. Exercícios de controlo A. Complete os espaços em branco de modo a dar sentido pertinente às frases. 1. O estudo do Espaço e do tempo ______________ uma tradição sociológica duradoura. 2. Entre as perspectivas sociológicas do tempo podemos mencionar a Francesa que teve origem em _____________________. 3. ___________ e _______________ chamaram a atenção para a natureza ____________ do tempo social. B. Diga se são verdadeiras ou falsas as seguintes afirmações. 1. Bourdieu estudou aspectos relativos ao tempo social. 2. As sociedades modernas estão geralmente organizasas em função do tempo do relógio. 3. Marx não problematizou o tempo social. C. Assinale a única resposta verdadeira. Heideger mostrou que: a) A troca social se baseava na troca de tempos de trabalho. b) Trocando o seu tempo de trabalho pelo salário, o trabalhador está a ser alienado. c) A existência humana tem um carácter temporal irredutível. Soluções A. 1 - Não tem. 2 - Durkheim. 3 - Sorokin/Merton B. 1 - v

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2 - v 3 - f C. c)

V. BIBLIOGRAFIA

A. Bibliografia complementar ANSART, Pierre - Sociologia francesa contemporânea, Oeiras, Celta editora, 2002, 252 pp. CORCUFF, Philippe - As novas sociologias, Sintra, Distribuidora Editora Vral, 1997,150 pp. HERPIN, Nicolas - A sociologia americana, Porto, edições afrontamento, 1982, 199 pp.

B. Bibliografia para o estudo do pensamento dos fundadores da sociologia: ARON, Raymond - As etapas do pensamento sociológico, S. Paulo, Martins Fontes/Editora Universidade de Brasília, 1982, 557pp. BRAGA DA CRUZ, Manuel - Teorias sociológicas, I volume, os fundadores e os clássicos, Lisboa, Fundação Caloust Gulbenkian, 1989, 755pp. CLERC, Denis - Decifrar os grandes autores da economia e da sociologia, tomo I, Lisboa, Editora Pergaminho, 1999,197pp.

C. Outra bibliografia em português BERGER, Peter e LUCKMANN, Thomas, – A construção social da realidade, Petrópolis, 8 ª ed. Vozes, 1990, 248 pp.

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CARVALHO FERREIRA, J.M. e outros – Sociologia, Lisboa, Editora McGraw- Hill de Portugal Lda,1995, 514pp. CASTELLS, Manuel – A sociedade em rede, 2 volumes, Lisboa, Fundação Caloust Gulbenkian, 2002. GIDDENS, Anthony – As consequências da modernidade, Oeiras, Celta editora, 1996, 126 pp. Sousa Santos, Boaventura de – Introdução a uma ciência pós-moderna, Porto, Edições Afrontamento, 2ª ed. 1990,199 pp, Col Biblioteca das Ciências do Homem, n º10. WEBER, Max – A ética protestante e o espírito do capitalismo, Lisboa Presença, 1983, 229 pp. WEBER, Max – O político e o cientista, Lisboa, 2ª ed. Presença, 1973, 189 pp., Biblioteca de Ciências Humanas, n º 1.

D. Bibliografia em língua inglesa RITZER, George - Modern sociological theory, & ª ed. The McGraw-Hill Companies, inc., Nova York, 1996, 609 pp. SLATERRY - Key Ideas in sociology, Londres, 1992,333 pp. STONES, Rob, (selec.) - Key sociological thinkers, Londres, Ed. Rob Stones, 1998, 366 pp.

E. Dicionários e obras de consulta geral AKOUN, A; BALLE, F.BONILAURI, B. E OUTROS – Enciclopédia sociológica contemporânea, Porto, Rés-Editora, 2 volumes, 445pp e 509 pp. BOUDON-BOURRICAUD - Dictionnaire critique de la sociologie, Paris, Puf, 1982, 714 pp. BIRAU, A. – Dicionário das ciências sociais, Lisboa, Publicações D. Quixote, 1978,454 pp.

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DUNCAN, MITCHELL, G. – Novo dicionário de sociologia, Porto, Rés editora, 535 pp. GRAWITZ, Madeleine - Méthodes des sciences sociales, Paris, 8 ª ed. Daloz,1990,1140 pp. MARSHALL Gordon - Oxford dictionary of sociology -new edition, Oxford, Oxford University Press, 2 ª ed. 1998,712 pp. LALLEMAN, Michel – História das ideias sociológicas das origens a Max Weber, Petrópolis, Editora vozes, 2003, 327pp. - Páginas 85 a 142. OUTHWAITE, William e outros – Dicionário do pensamento social do século XX, Lisboa, Dinalivro, 1996, 970 pp. - VOLKOV, F. M. e outros, História da sociologia (século XIX e princípios do século XX), Moscovo, Edições progresso, 1990, 380 pp., Colecção Académica.

F. Bibliografia técnica de estudo CERVO, A. L. e BERVIAN, P.A. – Metodologia científica, S. Paulo, Makron Books do Brasil Editora Lda, 1983, 249 pp. RUIZ, João Álvaro – Metodologia científica, guia para a eficiência nos estudos, S. Paulo, 2 ª ed. Editora atlas S.A., 1991,183 pp. SEVERINO, António Joaquim – Metodologia do trabalho científico, S. Paulo, 18 ª ed. Cortez Editora, 1992, 252 pp. TORRES, Adelino - O método no estudo, Lisboa, A regra do Jogo, 1980,112 pp.

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VI. TESTES FORMATIVOS

Teste formativo N .º1 Este teste o formato e as cotações idênticas ao exame geral da cadeira e serve como modelo de exercício para a preparação do exame. Grupo I - corrigir textos (3,5 valores) Os textos que se seguem contêm erros de conteúdo. Corrija-os anotando as suas correcções no quadro ao lado. Texto 1. "Na verdade, é fácil compreender a teoria social contemporânea sem dar conta das origens históricas e dos fundamentos clássicos da teoria social." Onde se lê Deveria ler-se Texto 2. " Olhando para a história da sociologia europeia no período entre os anos trinta e sessenta somos imediatamente confrontados com a dimensão da contribuição de Talcott Parsons (1902-79) para o

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desenvolvimento da teoria económica e, em particular, para a emergência do estruturalismo". Onde se lê Deveria ler-se Texto 3. " Há algo de paradoxal quando se escreve acerca da sociologia do conflito e da cooperação. Neste sentido, a minha intenção é demonstrar que essas noções têm um significado central no interior da teoria sociológica contemporânea, mesmo sabendo que nem sempre tal aconteceu. A história da teoria social no século XX tem sido, de certa forma, a história da sua ausência singular, apesar de se poder demonstrar que se trata de uma ausência impossível de justificar por inteiro. O conflito e a cooperação emergiram em diversos lugares, rompendo com algumas opções preexistentes formadas em torno de distinções que serviram para construir uma sociologia que não era nem conflituosa, nem cooperativa". Onde se lê Deveria ler-se

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Grupo II - Relacionar argumentos ( 4,5 valores) Ligue convenientemente a primeira à segunda coluna. Na grelha da chave, complete o quadro com o número correcto retirado da coluna B. 1. Ciência no século XVIII 1. Durkheim e Comte 2. Positivismo sociológico 2. Metodologia hermenêutica 3. Dialética 3. Gramsci 4. Materialismo histórico 4. Naturalismo 5. Construtivismo 5. Engels 6. Marxismo ocidental 6. Hegel Chave 1 2 3 4 5 6

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Grupo III - Autores e obras ( 3 valores) Ligue A e B convenientemente. Na grelha da chave, complete o quadro com o número correcto retirado da coluna B. 1. Raymond Aron 1. Conhecimento e interesses

humanos 2 .Durkheim 2. A elite do poder 3. Habermas 3. The social systhem 4. Wright Mills 4. O suicídio 5. Parsons 5. A ética protestante e o espírito

do capitalismo 6. Weber 6. As etapas do pensamento

sociológico Chave 1 2 3 4 5 6

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Grupo IV - V/F - (4 valores) Marque com -V ( verdadeiro) ou F ( Falso) as seguintes afirmações: V/F 1 A Teoria da Escolha Racional afirma que as causas das

acções sociais devem ser procuradas nos sistemas. 2 A concepção francesa a sociologia do tempo é derivada de

Toqueville 3 O desenvolvimento da sociologia foi marcado pelas

diferentes histórias nacionais 4 O pensamento sociológico alemão foi unificado por Marx

e Engels 5 Durkheim foi professor na Sorbonne 6 Marx foi influenciado por Hegel 7 Weber criou uma teoria da estratificação social 8 Weber é um teórico da acção

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Grupo V - Escolha múltipla ( 5 valores) Assinale a única resposta certa de cada grupo. 1. A nível cultural o pós-modernismo caracteriza-se por:

a) Produção cultural uniforme b) Produção cultural massificada c) Produção cultural original d) Produção cultural a-tecnológica

2. O termo marxismo refere-se:

a) Unicamente à teoria de Marx b) Só aos trabalhos de Marx e Engels c) Às teorias subsidiárias do pensamento de Marx e Engels d) Às teorias deterministas no seu conjunto

3. A teoria crítica:

a) Ataca o pensamento de Habermas b) Ataca a escola de Frankfurt c) Ataca o pensamento de Horkheimer d) Ataca a própria sociologia

4. Weber e Parsons são considerados

a) Objectivistas b) Fundamentalistas c) Subjectivistas d) Positivistas

5. Parsons chamou ao seu modelo teórico da acção: a) Modelo accionista b) Modelo do acto unidade c) modelo acção/reacção d) modelo activo /subjectivo

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Teste formativo N .º2 Este teste o formato e as cotações idênticas ao exame geral da cadeira e serve como modelo de exercício para a preparação do exame. Grupo I - corrigir textos (3,5 valores) Os textos que se seguem contêm erros de conteúdo. Corrija-os anotando as suas correcções no quadro ao lado. Texto 1. "Segundo Marshall, os actores possuem, desde a infância, uma necessidade primordial, inconsciente, uma necessidade de sentimentos de familiaridade e de direcção prática dos elementos estáveis do seu mundo social. Este sentimento complexo, que Marshall designa por segurança ontológica, é assegurado, em última instância, pelos jovens através da sua participação na produção de rotinas". Onde se lê Deveria ler-se Texto 2. " O trabalho original de Parsons em A divisão do trabalho social estimulou bastante o interesse na reconstrução da teoria social, mas o desenvolvimento do paradigma da teoria crítica não se deve inteiramente aos seus esforços, pois este estava a desenvolver-se independentemente noutros locais que não Harvard - na Universidade de Columbia, por exemplo, onde R.K. Merton leccionava".

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Onde se lê Deveria ler-se Texto 3. " O grande desafio que se coloca aos teóricos da economia é o de modelar o hiato entre, por um lado, a acção social individual e os efeitos macro, por um lado, e, por outro, entre os efeitos macro e as acções colectivas. Para alcançar estes objectivos gémeos, necessitamos de um modelo do actor individual que seja simples e suficientemente flexível para nos conferir uma razoável possibilidade de êxito". Onde se lê Deveria ler-se

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Grupo II - Relacionar argumentos ( 4,5 valores) Ligue convenientemente a primeira à segunda coluna. Na grelha da chave, complete o quadro com o número correcto retirado da coluna B. 1. Teoria da democracia 1. Anti-naturalismo 2. Capitalismo 2. Círculo de Viena 3. Escola de Frankfurt 3. Liberalismo 4. Positivismo lógico 4. Ecologia humana 5. Sociologia americana 5. Toqueville 6. Escola de Chicago 6. Modernidade Chave 1 2 3 4 5 6

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Grupo III - Autores e obras ( 3 valores) Ligue A e B convenientemente. Na grelha da chave, complete o quadro com o número correcto retirado da coluna B. 1. Giddens 1. O político e o cientista 2. Weber 2. A miséria da filosofia 3. Comte 3. As formas elementares da vida

religiosa 4. Durkheim 4. Discour sur l´esprit positif 5. Marx 5. As consequências da

modernidade 6. Khun 6. A estrutura das revoluções

científicas Chave 1 2 3 4 5 6

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Grupo IV - V/F - (4 valores) Marque com -V ( verdadeiro) ou F ( Falso) as seguintes afirmações: V/F 1 A metateoria sociológica é a filosofia da sociologia. 2 O positivismo separa a esfera do sujeito da do objecto. 3 A ontologia construtivista não é relativista. 4 Os realistas críticos compatibilizam objectividade e

subjectividade. 5 Os pós-positivistas consideram que não existe uma

estratificação real na sociedade. 6 O círculo de Viena surgiu em 1912. 7 Gadamer desempenhou um papel central na hermenêutica

contemporânea. 8 Alfred Schutz introduziu na sociologia a fenomenologia

de Husserl.

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Grupo V - Escolha múltipla ( 5 valores) Assinale a única resposta certa de cada grupo. 1. As teorias da Práxis distinguem-se das subjectivistas por:

a) Considerarem muito menor a importância da consciência na acção social. b) Acreditarem que os actos mentais moldam as práticas. c) Não consideram a intervenção da consciência nas condutas individuais. d) Serem objectivistas.

2. Parsons conseguiu:

a) A unificação da sociologia americana. b) Uma síntese das ideias da sociologia, antropologia e sociologia clássicas. c) Estabelecer o estatuto científico da sociologia. d) Fazer reconhecer o estatuto da sociologia europeia.

3. Parsons considera que a sociedade contemporânea

a) Reflecte as contradições do sistema capitalista. b) Deve ser estudada pela via empírica. c) Resulta de erros na ecologia humana d) É caracterizada por contrastes e valores antagónicos.

4.Merton define cultura como: a) Uma dijunção entre anomia e estrutura. b) Um conjunto normativo de valores vigentes numa sociedade particular. c) Um conjunto organizado de relações sociais. d) Uma conjunção de valores e objectivos culturais.

5. O interaccionismo simbólico supõe:

a) Que a qualquer percepção dos estímulos uma resposta imediata.

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b) Os actos sociais são unipessoais. c) O símbolo significante está ausente da comunicação formal. d) A dispensa da utilização de métodos científicos.

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Soluções

Teste n.º 1 Grupo I Fácil/difícil Americana/europeia Teoria económica/teoria sociológica Estruturalismo/funcionalismo Conflito e cooperação/ espaço e tempo Nem conflituosa / nem cultural Nem cooperativa / nem espacial. Grupo II 1 - 4 2 - 1 3 - 6 4 - 5 5 - 2 6 -3 Grupo III 1 - 6 2 - 4 3 - 1 4 - 2 5 - 3 6 - 5 Grupo IV 1. v 2. f 3. v 4. f 5. v 6. v 7. v 8. v Grupo V 1. b) 2. c)

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3. d) 4. c) 5. b)

Teste 2 Grupo I Marshal/Giddens Jovens/adultos A divisão do trabalho social/The structure of social action Teoria crítica/ funcionalismo- teoria dos sistemas Economia/Sociologia Acções colectivas/acções individuais Grupo II 1 - 5 2 - 6 3 - 1 4 - 2 5 - 3 6 - 4 Grupo III 1 - 5 2 - 1 3 - 4 4 - 3 5 - 2 6 - 6 Grupo IV 1. v 2. v 3. f 4. v 5. f 6. f 7. v 8. v Grupo V 1. a)

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2. b) 3. d) 4. b) 5. d)