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Um homem que está sofrendo não faz barba

Um homem que está sofrendo não faz barba - perse.com.br · Um homem que está sofrendo não faz a barba ... sempre presente em meu coração. Tive poucos ... esta não é uma coletânea,

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Um homem que está sofrendo não faz barba

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CLODOALDO TURCATO

Um homem que está sofrendo não faz a barba

Segunda Edição

Editora do Livre Pensador

Recife, Pernambuco

2013

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Titulo Original

Um homem que está sofrendo não faz a barba

Segunda Edição

Copyright @ 2013 by Clodoaldo Turcato

Copyright da edição @ 2013

Editora do Livre Pensador

Avenida Presidente Kennedy, 4834

Candeias

54430-030 – Jaboatão dos Guararapes – PE

Telefone (081) 3525.4516/ (081) 8162.4184

www.editoradolivrepensador.com

e-mail:

[email protected]

Todos os direitos reservados.

A reprodução não autorizada desta publicação, no todo ou

em parte, constitui violação dos direitos autorais. (Lei

9.610/98).

Capa: Instituto do Livre Pensador

Ilustração de capa: Clodoaldo Turcato

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Índice

Dedicatória 05

Prefácio por mim mesmo 06

O Prato Principal 09

Um homem muito esperto 63

Um homem que está sofrendo não faz a barba 69

A pequena fortuna 73

A boa nova 86

O causa da estrada de Cabrobó 95

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Para Jessica, distante, mas

sempre presente em meu

coração. Tive poucos

momentos contigo... porém

eternos.

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Prefácio por mim mesmo

Este é meu quinto livro de contos. Neste trabalho

reuni apenas cinco estórias, todas cobertas de sarcasmo.

Ao contrário dos demais, esta não é uma coletânea, onde

reuni coisas escritas durante vinte anos, mas sim coisas

inéditas e produzidas este ano. É a primeira produção pós-

cadeia.

O Prato Principal abre este livro. É um conto

macabro, com uma definição moralista e hipócrita. De um

concurso milionário, pessoas comuns se defrontam com a

realidade de um bairro miserável em Olinda e todos os

meandros que cercam a pobreza. De tudo percebe-se a

extrema hipocrisia e maldade embutida nos personagens

que lutam pelos cem mil reais. Esta maldade é combatida

com engodo, pois o concurso não pode ser cumprido. De

toda sorte o engano só é percebido no final.

Na sequencia segue o conto Um homem muito

esperto. Uma narrativa leve revelando a inocência de um

homem, que de um lance genial engana dois malfeitores,

porém em seguida os confia seu segredo. E de enganador

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passa a ser enganado, para no final notar-se ingênuo e

gritar que não salvou nem seus arquivos magnéticos.

O conto titulo deste livro narra a desventura de um

homem que é abandonado pela sua esposa, porém mantém

sua rotina normal, levantando suspeitas de um velho

policial. Mesmo contra todas as tendências, no final é

desmascarado, junto com toda uma vida pregressa e expõe

o ódio por sua ex-esposa e pela vida que levava, o

desgosto com o filhos: caí a máscara.

A pequena fortuna relata um homem que reserva

dez mil reais, fruto de seu trabalho com lixo. Porém por

falta de sorte e medo de ser roubado deixa a caixa

contendo toda sua vida com um desconhecido. Este

homem, aparentemente honesto, passa a extorqui-lo e

leva-o diante de um Delegado corrupto leva metade de seu

dinheiro, metade de sua vida. Mesmo roubado não perde a

única coisa valiosa que a vida lhe coube: a honra.

No final temos A boa nova. O relato real de uma

mulher que engravida e imagina se redimir com todos ao

seu redor. A caminha da casa do pai, o primeiro que

saberia, recorda de sua vida até ali e de como a notícia

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mudará totalmente o rumo de sua história pessoal. No

entanto ao chegar encontra sua mãe na cama, sangrando:

fora obrigada a abortar. Ao dar com seu pai, este diz para

não se preocupar, tudo estava resolvido. No final apenas

as rosas sob a cova onde seu irmãozinho fora enterrado

teima em crescer frondosa, destoando da pequenez que é

sua vida presente.

Nesta segunda edição, incorporei o conto O causo

da estrada de Cabrobó, que escrevi no ano de 2012, para

aumentar o numero de páginas do livro e atender

necessidades gráficas. Esta passagem narra a desventura

de um matuto que sai de manhã de casa para compras de

Natal, e no caminho encontra uma viajante que o seduz e

rouba seu dinheiro.

É um texto singular, de fácil leitura, apresentando gente

comum, de pecados e defeitos, sem o véu de candura ou

moralismo barato. A vida pode ser divertida, mas sempre

será cruel, sem embargo.

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O Prato Principal

São cinco pessoas sentadas à mesa: dois homens e

três mulheres - parece não se conhecerem. Chegaram no

horário a convite de Mister Person, também desconhecido.

“Comparecer impreterivelmente às 13h00min. do dia 14.

Qualquer atraso acarretará em imediata eliminação do

concurso. A porta será aberta às 12h50min. e fechada às

13h03min. Grato Mister Person”. Finalizava o bilhete seco

e direto, sem mais delongas. Alguns não levaram a sério e

deram com a porta trancada. Ao baterem não obtiveram

respostas. Quem insistisse recebia o convite de um sujeito

alto e forte de plantão pra retirar-se ou teria confusão. E

poucos gostariam de ter confusão com um sujeito como

aquele.

_ Tenho o convite, passei na prova, retrucaria

indignado o atrasado.

_ Se insistir em importunar Mister Person, vamos

ter que conversar diferente, ameaçava o vigia.

O negócio era particularmente estranho para quatro

que atrasaram. Uma moçoila de grandes atributos chegou

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sete minutos depois do horário, usou todo o seu charme,

porém foi barrada. Nem os lindos seios quase a mostra

foram suficientes para convencer ao guardião abrir

passagem.

_ Os ingleses são criteriosos quanto à pontualidade,

disse um transeunte que assistia ao desconsolo da

pequena.

E lá se foi a destemida cheia de palavras chulas,

para a Inglaterra, sua Rainha e seus horários. Logo ela que

nunca precisou mais que um sorriso para as portas se

escancararem.

Enfim, narrados estes pormenores, restaram cinco.

Todos brasileiros, pouco dados à pontualidade, porém

temerosos a serem eliminados da possibilidade da

premiação oferecida por Mister Person. Depois de

vencerem noventa concorrentes nas provas iniciais e cinco

pelos atrasos, o mínimo da fortuna já lhes era assegurada,

pois seriam premiados os dez classificados e do quinto em

diante o prêmio era bem razoável. Todos estavam aos

sorrisos.

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Conduzidos à sala de jantar, assentaram-se de

forma adequada: os Cavalheiros de um lado e as Senhoras

do outro. Cumprimentaram-se cordialmente sem

apresentações, talvez para intimidarem-se ou por pura

timidez, sabe-se lá. Cada qual avaliou seus concorrentes

em silêncio, alguns com gostos outros com desgostos, de

lado, tentando não dar a perceber-se, sem nenhum

comentário, quietos, enquanto aguardavam o anfitrião e o

final da disputa.

Nossos Personagens estão dispostos ao redor de

uma mesa grande de madeira com onze lugares, seis deles

vazios pelos motivos acima. As cadeiras são altas e

confortáveis, comedidas nos artefatos. Simples, porém

sofisticados, combinando com a decoração vitoriana da

sala. Sobre a mesa talheres em prata, pratos de porcelana e

tigelas em aço inoxidável contendo pratos frios e saladas

diversas. Ao centro espaço para o prato principal que não

fora mencionado. Especulava-se qual seria: Porco

recheado, carne de boi com aqueles temperos

apimentados. Não! Não! Mister Person haveria de servir

alguma carne de caça, típico dos ingleses, talvez um

coelho... Também poderia ser alguma ave, patos ou

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marrecos, tão bem falados na alta culinária inglesa. Por

certo não seriam peixes... frutos do mar em geral,

improvável, os ingleses não são dados a tais iguarias. A

baixela no centro não dava qualquer indicativo, apenas

que era grande o suficiente para todos se fartarem.

A moça da esquerda chama-se Tayla Kauane da

Silva. Tem vinte e dois anos, cabelos loiros encaracolados,

alta, seios médios e pernas bem distribuídas. Os vulgos

diriam se tratar de uma moça muita bonita, com algum

respeito. Algum folgazão soltaria termos menos decentes.

Veste-se de forma honesta, porém vulgar, perdoável já que

não nunca teve cultura além da televisão. Sua beleza a

torna suportável; unhas bem cuidada, com esmalte

cintilante, desses usados por adolescentes. Sua maquiagem

é carregada, com muito pó, branco que da ainda mais luz

ao seu rosto, com olhos de uma cor cinza depreciativo,

numa face que bastava pequenas correções, sem tanto

contraste claro. Tem cílios postiços, logo se percebe, o que

não é de todo mau, sob lentes de contato cor amêndoa que

em muito estragam seus olhos azuis. Talvez pretendesse

combinar com seus brincos de pedra e colares feitos por

algum Xavante do Alto do Xingú. De qualquer forma, o

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que salva sua aparência empobrecida são os dentes,

tímidos e grandes, brancos como leite, escovados e bem

tratados em uma higiene regular. Quando sorriu, mesmo

de cabeça baixa, dissipou todos os defeitos até então

constatados. Pena que risse tão pouco, dado ao ambiente

em que estava. Imagino que seu principal meio de sedução

seja o sorriso. Encantadora. Pena que ao sentar-se cometeu

a indelicadeza de atender ao telefone móvel, um desses

modelos que chamam de Smartphones, ou coisa que o

valia, repletos dessas novas tecnologias que o mercado

oferece. A dita responde, aos olhos incrédulos, a uma

mensagem de sua amiga querendo saber como são a casa,

as pessoas, o que vestem... Essas pequenezes, que dedos

rápidos tateiam em resposta, monossílabos, abreviaturas

típicas dessa linguagem horrível que compõe os papos

virtuais, usual entre jovens. Vez por outra olha para os

lados como temendo a chegada do anfitrião, ou os olhares

de censura dos demais um tanto irritados com os ruídos do

teclado. Em seus dedos vejo dois anéis e uma aliança. Pelo

menos um anel é de ouro. Nada indica que seja de

compromisso, sugere que seja dado por algum (alguma)

admirador – uma Senhorita de tão bons afeitos terá sua

orla de queridos, suponho. Dá impressão que ela

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desconhece o valor financeiro da peça. É uma impressão

apenas, afinal não temos condições de avaliar seus valores.

O que nos leva a crer é o uso do anel. Colocado no dedo

anular, sem esmero, logo neste dedo de pouca valia. Então

está é a associação que fazemos – pobre. As unhas são

naturais e longas, o que nos surpreende, já que na primeira

olhadela imaginei serem postiças. As mãos demonstram

pouca lida e distância de detergentes e ácidos. Finas e

delicadas, bem apegadas a braços longos e finos,

aglutinadas aos ombros cândidos, cobertos por uma blusa

de lã branca, sobre uma malha de viscose que marca seus

seios firmes, guardados devidamente por um sutiã

adequado. A barriga é enxuta. ( A blusa é curta e nos

permite este olhar, nem tão indiferente). É quase de se

afirmar que não tenha filhos e pratique algum esporte ou

frequente academias. Um olhar obsceno (que não cabe a

um interlocutor) não relutaria em sonhar com aquele

ventre despido e acabamos concordando que seria grave

falha esconder aquela silhueta, ao passo que dois dedos

acima da cintura nos dariam outros detalhes que a veste

esconde. O quadril se enquadra no padrão das grandes

modelos. Alguns gostariam de mais carnes, se bem que

não lhe falte, principalmente nos glúteos. Vemos tudo por

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descuido dela, não por desrespeito, afinal poderia usar um

vestido composto em vez desta calça acochada e furtaria

ao nosso olhar as zonas erógenas, pernicioso, que fazemos

agora. É, meus caros. Está tão apertada que supomos

algum desconforto daquela vestimenta. Por certo fere as

laterais, próximo a vagina, causando esfoles nada

agradáveis. A todo instante ela verifica a calça, puxa a

cintura na parte de trás, lutando para não mostrar a

calcinha. E faz bem, pois até agora não percebemos ao

menos a cor. Bem, cá estamos para uma narrativa e

desnudá-la cabe a quem o mereça. Dito que se supõe que

as coxas e pernas sejam proporcionais em beleza aos pés

pequenos e zelados por bons sabões. O que se mostram

dentro de uma sandalhota branca feita com tacos, são

dedos com poucas marcas e calcanhares lisos, combinados

e sem rachaduras. De todo, é uma mulher em descabida

beleza, mal vestida e sem os cuidados que a tornariam

ainda mais bela. Se escrevemos dos atributos físicos, e

faltou realçar a pela branca, o que dizer dos intelectuais?

Ora, não é tola de toda; classificou-se em décimo lugar em

uma prova média e como os outros não eram ignorantes.

Conclui-se ser bela e inteligente o suficiente para