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Departamento de História
Um olhar sobre o Império do Brasil: viagens, exílios e impressões
de letrados argentinos sobre o Brasil no século XIX
Aluno: James Gerald Coutinho Marko
Orientadora: Profª Maria Elisa Noronha de Sá
Introdução
A pesquisa consiste em analisar a construção da imagem do Brasil nos escritos
de Juan Bautista Alberdi. A intenção é explorar, na chave da história intelectual e das
histórias cruzadas, os efeitos destes “olhares cruzados” na construção das
representações identitárias dos povos da América, mais especificamente da Argentina e
do Brasil, e aprofundar o conhecimento da complexidade histórica destes processos de
construção a partir de uma perspectiva histórica centrada na análise tanto do “nacional-
estrangeiro” como de sua contraparte, o “estrangeiro-nacional”.
A produção intelectual de Alberdi, nos revela uma percepção valiosa sobre
temas como a monarquia, a escravidão, a natureza, a questão das raças, política externa
e muitas outras, que podem revelar significativas impressões acerca de como este
letrado entendia o Império do Brasil, um “outro” bastante peculiar por representar uma
espécie de contraponto ao projeto de nação republicano que ele pretendia para a
Argentina.
Sem dúvida, o exílio e as viagens de Alberdi e com certeza sua passagem pelo
Brasil foram fundamentais para o projeto elaborado e vivido pelos membros da Geração
Romântica de 1837 de formação de uma nação e de uma identidade nacional argentina.
O Brasil, na América, ou para muitos escritores americanos, parecia combinar o exótico
com o familiar e constituir um ponto fundamental na peregrinação dos jovens em
formação, porque se converteu no “outro interno do continente”.
Os argentinos faziam, assim, uma constante leitura política deste outro, evidente
nas críticas e comentários permanentes sobre as diferenças tanto governamentais quanto
culturais e sociais que viam entre o Brasil e a Argentina. Neste sentido, mais que um
espaço no qual desenvolviam ideias sobre o outro para o outro, o Brasil era, para os
argentinos, um espaço onde desenvolver ideias sobre o próprio.
Objetivos
Analisar, na chave da história intelectual e das histórias cruzadas, a
construção da imagem do Brasil nos escritos de Juan Bautista Alberdi e
de alguns de seus contemporâneos argentinos.
Explorar os efeitos destes “olhares cruzados” na construção das
representações identitárias da Argentina e do Brasil no contexto especial
da construção de nações no século XIX.
Aprofundar o nosso conhecimento da complexidade histórica destes
processos de construção de novas identidades a partir de uma perspectiva
histórica centrada na análise tanto do “nacional-estrangeiro” como de sua
contraparte, o “estrangeiro-nacional”.
Perceber as mudanças das imagens, impressões e opiniões sobre o Brasil
nos discursos de Alberdi, relacionando-as não só aos contextos
intelectuais, políticos, culturais e pessoais no qual estavam inseridos,
como também a câmbios no lugar ocupado pelo Brasil no continente
americano e na sua política externa.
Metodologia
Ao definir o conjunto de perspectivas teóricas e metodológicas da pesquisa no
âmbito da História intelectual, propõe-se refletir as relações entre ideias e história na
construção de certo tipo de conhecimento histórico pautado na estreita relação entre
história das ideias e história social. Ainda dentro deste campo, o projeto permitirá o
desenvolvimento de um trabalho de história comparada, inserido no subgênero das
histórias cruzadas e das intercessões culturais, que nas últimas décadas vem se
consolidando como importante espaço de interrogação histórica.
Desenvolvimento
Desde março de 2015, coube a mim, neste projeto, realizar um levantamento de
escritos de Juan Bautista Alberdi sobre o Império do Brasil. Ao longo da pesquisa foi
feito o levantamento de toda a documentação existente das obras do autor, nas quais ele
aborda questões que envolviam o império brasileiro. Na atual conjuntura, fui designado
para trabalhar na leitura e análise da introdução e do primeiro capítulo da obra,"El
Imperio del Brasil ante la democracia de América", publicada por Alberdi em 1869 e
produzida anteriormente como folhetos em 1865 intitulados; “Las disensiones de las
Repúblicas de Plata y las maquinaciones del Brasil”, durante a Guerra do Paraguai.
O primeiro passo na pesquisa foi adquirir uma melhor compreensão do contexto
histórico, cultural e político no qual o autor e a fonte analisada se situam. Para isso, foi
realizada a leitura da introdução e da parte referente à imprensa no século XIX, da obra
do historiador argentino, Víctor Goldgel; “Cuando lo nuevo conquistó América. Prensa,
moda y literatura en el siglo XIX” [1] e a análise do trabalho de Jorge Myers, “La
revolución en las ideas: la generación romántica de 1837 en la cultura y en la política
argentinas”, da obra organizada por Noemi Goldman;“Nueva Historia Argentina”
Tomo 3.[2]
A obra de Goldgel consiste em demonstrar o ritmo que, o próprio Alberdi e seus
contemporâneos hispano-americanos acompanharam devido aos acontecimentos
revolucionários que estavam ocorrendo nas antigas colônias espanholas. Inovações
revolucionárias de cunho cultural, político, tecnológico e comercial, sendo considerados
pelo autor, atributos de elevada importância na constituição dos novos Estados hispano-
americanos. As revoluções nestes campos, segundo o autor, realizavam diferentes
funções no universo da informação e dos letrados, todas caracterizadas pela dinâmica do
novo. Não só elas possibilitaram o acesso aos eventos que ocorriam em outras partes do
continente, mas também era o meio mais eficaz para atender as novas demandas daquela
sociedade (e, ao mesmo tempo, criar) a “fome de novidade”, que o “desejo de constante
renovação”, trazia à tona, a experiência da modernidade.
O trabalho de Myers, foca primordialmente na formação daquilo que ficou
compreendido pela história argentina, como a “geração romântica de 37” que, constituiu
o primeiro movimento intelectual com o objetivo de construir uma identidade nacional.
Movimento no qual Alberdi, Sarmiento e muitos outros letrados fizeram parte.
Myers explora as influências deste grupo de intelectuais e o contexto político e
cultural que os indivíduos desta geração vivenciaram, inclusive seus exílios em
localidades vizinhas, tais como Chile e Montevidéo. Cada um dos homens citados pelo
autor, Echeverría, Alberdi, Sarmiento e etc, possuíam projetos com perspectivas
próprias para elaborar um Estado-Nação que se encontrava em fase embrionária.
O segundo passo neste trabalho foi conhecer melhor o autor designado antes de
passar para a fonte em questão. Um breve levantamento biográfico da vida de Juan
Bautista Alberdi foi realizado, juntamente com a produção de uma linha do tempo com
acontecimentos relevantes na vida do argentino. Todas as informações sobre Alberdi
foram extraídas dos dados que os alunos que participaram desta pesquisa anteriormente
coletaram e das obras “El pensamiento de Juan Bautista Alberdi” de Maria Rosa Lojo
[3] e “Escritos Póstumos, tomo XV, Memorias y documentos” de Juan Bautista Alberdi.
[4]
Alberdi nasceu na província de Tucuman meses após a Revolução de Maio, em
29 de agosto de 1810. Seu pai, um comerciante de profissão, participou na defesa do
país durante as invasões inglesas e foi um ávido apoiador da Revolução de Maio. Sua
mãe, que veio de uma das famílias mais importantes de região, faleceu durante o parto.
Seu pai morreu quando ele tinha 12 anos de idade deixando-o sob o cuidado de seus
irmãos mais velhos. Em 1825 viaja para Buenos Aires para estudar no Colégio de
Ciências Morais, no entanto abandona os estudos, segundo o próprio, foi incapaz de se
adaptar à sua metodologia de ensino, finalizaria seus estudos em 1834 e iria construir
uma carreira em Direito e como jornalista.
Em 1837, ele se juntou ao famoso Salão Literário, também conhecido como a
“geração de 37”. Composta por um grupo de letrados que aderiram à democracia liberal
e aos ideais políticos que afloraram durante a Revolução de Maio. Este grupo, inclusive
Alberdi, possuiam ideais contrários às políticas de Rosas, fato que culminou no exílio
de boa parte desta geração. Em agosto de 1838, as práticas ditatoriais e autoritárias
adotadas por Juan Manuel Rosas, resulta em seu exílio voluntário na cidade de
Montevidéo, de lá realiza a sua primeira viagem para Europa em 1843 e no final deste
mesmo ano, retornou ao continente americano para residir, assim como Sarmiento, no
Chile. No trajeto de seu retorno, faz a primeira visita ao Rio de Janeiro. Viveu por 17
anos no Chile, residiu a maior parte em Valparaíso, onde trabalhou como advogado e
exerceu a função de jornalista.
Em 1852 Rosas é derrotado na Batalha de Caseros, Alberdi, difunde seu trabalho
constitucional que seria tomado como base elementar da Constituição Argentina que
seria promulgada um ano depois. Passados três anos, com Juan Manuel Urquiza como
presidente, passa a exercer cargo de diplomata na Europa. Em 1862 essa função chega
ao fim com a chegada de Bartolomeu Mitre ao poder. Alberdi desencantado com a
política argentina e principalmente de Buenos-Aires, permanece no continente europeu
escrevendo e publicando.
Em 1864, com a eclosão da Guerra do Paraguai, Alberdi publica em Paris em
1865, “Las disensiones de las Repúblicas de Plata y las maquinaciones del Brasil”,
conjunto de panfletos políticos que abominava a política externa do império brasileiro e
dos interesses de Buenos-Aires. As publicações de 1865 foram reunidas no formato de
livro e publicada em 1869 intitulada; “El Imperio del Brasil ante la democracia de
América”. Criticava não só a postura brasileira em relação a guerra contra o Paraguai,
mas também as ações do governo argentino perante o mesmo conflito. É durante esse
período da vida do letrado argentino que foi produzida a fonte designada para a análise
dentro deste projeto.
“El Imperio del Brasil ante la democracia de América” (Introdução)
Nas setenta duas páginas que compõem a introdução da obra, primeiro objeto de
análise nesta pesquisa, o autor tenta explicitar de maneira clara os motivos pelos quais
realizou este livro. Se apresentando como um defensor dos interesses daquilo que
compreendia por Argentina, liberal até onde o seu século permitia e um ferrenho
defensor do republicanismo, Alberdi apresenta duras críticas em relação a postura
imperial brasileira em relação à Guerra do Paraguai, das atitudes tomadas pelos seus
conterrâneos durante a mesma e faz uma reflexão profunda sobre as implicações deste
conflito, não só para as Repúblicas do Prata como também para o Brasil. Vale ressaltar,
apontado pelo autor, o fato da introdução ter sido produzida no ano de 1869, recorte
temporal diferente da do resto da obra.
“Tal tem sido o motivo de estar aqui esses escritos . Hoje todo foco do
autor concentra-se em uma idéia: resistir, protestar, se opor ao plano
tradicional do Brasil, renovado desta vez com proporções aterrorizantes,
de reconstruir seu império em detrimento do povo, da terra e da honra
das Repúblicas do Prata.” [tradução livre] [5]
“ Simpatizando com o Paraguai porque resiste ao que resiste, o autor
não é insensível aos desastres argentinos. Os que ganharam seus graus e
títulos militares derramando o sangue de seus compatriotas em batalhas
de guerra civil, sabem que se pode aplaudir o triunfo de uma idéia sem
celebrar por isso o sangue fraterno derramado.” [tradução livre] [6]
Para ele, o Brasil representava uma ameaça para as outras repúblicas da América
hispânica, principalmente aquelas que possuíam uma proximidade territorial maior com
o império, deixando a entender que, realmente havia compreendido através de uma
análise dos eventos geopolíticos de seu tempo, os planos elaborados pelo governo
imperial brasileiro de realizar uma remodelação do Império no continente sul americano
e que esta afetaria os territórios vizinhos e seus interesses.
Alberdi deixa claro que apesar das ambições imperiais, o Brasil ainda carecia
daquilo que um homem de sua época entendia por progresso e civilização, fazendo uma
aluzão ao fato deste ter se tornado independente mais tarde do que os demais países da
américa-ibérica, ainda realizar práticas escravistas e de possuir um vínculo comercial
maior com o continente europeu do que com os Estados latino-americanos em si. Essa
situação, segundo ele, era preocupante pois; Como um país, que possui atributos
considerados tão negativos, poderia ter a pretensão de exercer de fato, soberania sobre
os outros Estados na América Latina? Alberdi, ao fazer uma comparação do Brasil em
relação às potências do cenário internacional, fala dos atributos que carecem o Império,
tais como; capital, população, artes, indústria, ciências, conhecimentos gerais, fatores
climáticos, uma marinha mercante ativa e exercer de fato uma maior presença no
continente.
O autor compreende que os interesses brasileiros não só prejudicariam o
Paraguai mas também a Argentina que, segundo ele, se encontrava debilitada devido aos
interesses divergentes internos envolvendo a cidade de Buenos Aires e as demais
províncias. Esse fator que culminava na descentralização do território argentino, estava
sendo explorado pela política internacional brasileira para alcançar os objetivos
almejados, seu temor era de que o Brasil apoiasse somente os interesses buenairenses e
por fim, mudasse o foco dos objetivos de expansões imperiais para a Argentina em si.
“No Prata, as instituições que são débeis, não os homens e nem as
coisas. O Brasil não se engana ao contar com a divisão que prejudica a
República da Argentina, com seu melhor elemento de predomínio.[...]”
[tradução livre] [7]
“O triunfo do Brasil no Prata não consiste na derrubada do governo
Lopez. Já tem conseguido em parte pela caída do centralismo argentino,
em que consiste realmente; e enquanto este princípio dorme enterrado
com seu ilustre campeão na tumba de Rivadavia, o Brasil manterá seu
predomínio no Prata, com esquadras ou sem elas.” [tradução livre] [8]
Ele utiliza o exemplo da guerra civil norte-americana que tinha Nova York como
um polo centralizador que administrava o poder e que Buenos Aires adotaria para si este
exemplo de acontecimento “moderno” para utilizar de pretexto e concentrar
efetivamente o polo de tomada de decisões nas mãos da cidade.
Alberdi, realiza duras críticas e compara a postura do Brasil com a de outros
Estados que possuem semelhantes ambições expansionistas, relacionando a posição do
império às posições da França na Europa, dos EUA na América do Norte e comparando
irônicamente com Roma. Deixando bem explícito o tom passivo-agressivo de seus
escritos quando afirma que, se o império brasileiro conhecia a história dos romanos
deveria aprender de como os “povos livres” lutaram para preservar sua integridade e
liberdade contra o império romano.
“Se o império conhece a história dos Romanos, seus vizinhos podem
aprender a história dos Germanos, que é a história de povos livres, na
qual as repúblicas agredidas e assediadas aprenderam em como
frustrar, em nome da paz do mundo, um império que vive para perturbá-
la.” [tradução livre] [9]
O autor deixa claro a gama de conhecimentos que possuí como um indivíduo do
século XIX, escrevendo com propriedade em assuntos que envolviam os mais variados
tópicos, tais como, política externa e doméstica, geografia e geopolítica, História e
cultura, tanto geral quanto da recente nação de seu berço, sem mencionar as
informações que ele adquiria sobre o Império brasileiro para realizar as suas análises e
tirar as suas conclusões. Para chegar a essa conclusão, fiz um paralelo com o texto do
Victor Goldgel em relação a imprensa, acredito que os homens do século XIX faziam
suas análises, não só trocando ideias e correspondência, mas também utilizando as
informações contida nos periódicos que podiam acessar.
Ele encerra a introdução enumerando aquilo que considera principal para que os
planos do Império se realizem. Chegando a conclusão de que a Guerra do Paraguai é
uma grande revolução e ainda por cima, arquitetada pela mão do Império brasileiro que
segundo ele se encontra em estado de decadência fazendo menção aos atributos que
poderiam gerar vantagem para o Brasil conquistar os seus objetivos tais como, a
inferioridade do Paraguai territorial e bélica em relação ao Brasil. Apesar de apontar
diversos pontos negativos sobre o império pode-se perceber um tom de preocupação do
autor dos planos se concretizarem.
“1° A debilidade das repúblicas do Prata, que as tornam instrumentos
do Brasil de maneira involuntária.
2° A inferioridade relativa do Paraguai.
3° A superioridade relativa do império brasileiro.” [tradução livre] [10]
“Las disensiones de las Repúblicas del Plata y las maquinaciones del
Brasil” (Capítulo I: El Brasil )
Como já foi citado anteriormente, esta parte da obra em questão
analisada no segundo momento da pesquisa, já havia sido publicada em março
de 1865, no formato de folhetos políticos e foram reunidas para serem
publicadas novamente em 1869 no formato de livro.
O estudo sobre esta obra, se inicia na breve introdução sobre aquilo que o
autor compreendia em relação ao Brasil, apontando para os motivos que
acredita, de fato, serem os verdadeiros para o comportamento do Império na
segunda metade do século XIX. Ao contrário do caráter reflexivo da introdução,
já analisada nesta pesquisa, estes escritos possuem uma linguagem mais direta,
de natureza pragmática, focando em análises que envolviam aspectos
econômicos, políticos, geopolíticos, culturais e até mesmo climáticos. Este olhar
mais objetivo de Alberdi, deve ser levado em conta devido ao recorte temporal
no qual os folhetos foram produzidos, ressaltando que o conflito entre Paraguai
em o Brasil estava apenas começando e o envolvimento drástico das Repúblicas
do Prata se tornando cada vez mais iminente.
Em relação a esta etapa da pesquisa, procurei apontar os pontos mais
relevantes das críticas realizada pelo autor, a meta era compreender as crises que
o Império enfrentava de fato e de como elas eram percebidas por Alberdi durante
este período de conflito com as repúblicas vizinhas.
“A questão para o Brasil, não é a forma de governo, nem de raça, nem
de nacionalidade, nem uma questão política, nem muito menos de pessoas e nem
de indenizações ou reparações de danos recebidos: é mais grave que tudo isso,
é uma questão de segurança, de subsistências, de população e de civilização, de
vida ou morte para o Brasil.” [tradução livre] [11]
Em seguida, pode-se perceber o caráter pragmático já citado neste
estudo. Ele enumera três características que considera de importância estratégica
para a expansão brasileira na Região do Prata, inclusive referente sobre a
questão do controle da navegação fluvial na região. Fato que se nota uma certa
relevância para o autor, já que a enfatiza nestes folhetos e na introdução da obra
de 1869.
“1°, a necessidade de povoar-se com raças brancas da Europa, para os
quais buscam os territórios temperados que não possuí; 2°, a necessidade de
terras apropriadas para a produção de produtos alimentícios e de sustento de
seu povo, que não possuí disponível; e 3° a necessidade de assegurar seus
atuais territórios imediatos aos afluentes do Prata, pela aquisição e possessão
das regiões proprietárias da parte inferior desses rios.” [tradução livre] [12]
Ele conclui a breve introdução deste capítulo, relacionando o
comportamento expansionista do Império ao seu processo de formação histórica.
Ele irá tratar de três pontos que considera vitais para o Brasil conquistar os seus
objetivos de aumentar o seu território até o Prata e seus afluentes; população,
subsistência e a segurança.
Ao tratar do tópico referente a população do território brasileiro, Alberdi
irá abordar questões que envolvem a vastidão territorial do império, as
dificuldades envolvendo o deslocamento dentro do mesmo e fatores climáticos,
segundo ele, essas características tornam o terreno inútil para habitação.
Lembrando que no século XIX o tamanho relativo das fronteiras de um Estado-
Nação era considerado sinônimo de poder.
Utiliza argumentos raciais, afirmando que a raça branca, que
supostamente povoaria o país, não suportaria as vicissitudes do clima brasileiro.
Em um dado momento chega a comparar o Brasil com o continente africano
mais de uma vez de forma depreciativa.
“Porque o Peru, o Equador, Nova Granada, etc. não estão cheios de
súditos brasileiros como em Montevidéu? Porque esses países estão, como ele,
na zona tórrida e em sua porção mais alta e habitável estão separados do Brasil
por oceanos de território deserto, é impraticável.” [tradução livre] [13]
“Preso entre o Equador e os Trópicos, o Brasil pode se chamar de
África do novo mundo. É pior que a África, pois estaria de parabéns se tivesse
territórios como o Delta, as montanhas da Tunísia e de Argel, e o Cabo da Boa
Esperança, que está acima de 30 graus de latitude. As grande cidades marítimas
do Brasil estão em situações semelhantes as da África, que possuí as cidades de
Senegambia, Guiné, Congo, Angola, países que so podem ser habitados por
raças de cor. O branco que ali não morre, vive morrendo.” [tradução livre] [14]
Como era fato bem conhecido no período, a escravidão no Brasil não
passa desapercebida no olhar crítico do argentino, ele sabia da crise que o
Império enfrentava envolvendo o tráfico negreiro, tinha noção da eventual
decadência do comércio de seres humanos e do papel da Inglaterra em erradicar
o mesmo, como é visto abaixo.
“Mas o tráfico de negros está condenado a desaparecer na civilização
desta época, e a Inglaterra, senhora dos mares, está encarregada de executar
esta aberração.” [tradução livre] [15]
Mais adiante na obra, Alberdi passa a abordar o segundo tópico neste
primeiro capítulo sobre o Brasil, a subsistência. Tratando dos aspectos práticos
da existência brasileira na "zona tórrida"(termo que utiliza ao longo da obra pra
descrever o clima quente). Fatores como; alimentação, logística, agricultura,
clima e doenças se tornam mais evidentes nesta parte analisada pelo autor.
Ataca a política doméstica brasileira e as suas legislações que, focavam
apenas para beneficiar a produção de produtos direcionados somente para a
lucratividade dos negócios dos grandes proprietários de terra e que estas práticas
ocasionavam em uma crescente pobreza no país. Se um estudo sobre a política
agrária do Brasil durante o período que os folhetos foram publicados fosse
realizada, é viável admitir, que o argentino não está totalmente errado. Alberdi
apesar de produzir estes escritos de caráter puramente político, realiza críticas
contundentes e pautadas na realidade.
“A legislação poderia remediar em parte esse inconveniente do Brasil;
mas os que fazem as leis, os ministérios e os parlamentos nesse país, são
justamente, os que mantêm essa situação das coisas através de cálculos de
interesses e de ganância pecuária.
O Brasil, em efeito, deve à esta praga da fome a sede de ganância de
seus grandes proprietários, que são donos de 4/5 de seu solo. Ao invés de
dedicar uma parte para o cultivo de cerais e animais para a subsistência de sua
população, destinam tudo para a produção de açúcar, de tabaco, de café, de
chá, que os enriquecem às custas do povo trabalhador que morre de fome. Essa
cultura de luxo para uns poucos, e de ruína para a maioria, realiza o Brasil
tributário, em produtos necessários para a sua subsistência, dos Estados
Unidos, da própria Europa, mas sobre tudo o Estado do Uruguai, que é a sua
despensa e armazém de provisões.” [tradução livre] [16]
Alberdi concluí esta segunda parte, sendo mais uma vez crítico aos
latifundiários brasileiros que, segundo ele, contribuíam juntamente com a
legislação do Império e o fator climático para o agravamento da fome. [17]
A terceira e última parte, constituí uma abordagem envolvendo um
aspecto geopolítico dos planos expansionistas do Brasil, apontando questões de
posicionamento estratégico e controle das rotas de navegação fluvial, apoio
logístico e a tão almejada posse dos rios Prata, Paraná, Paraguai e Uruguai. Ela
se intitula, “Segurança do território”.
No século XIX, as rotas fluviais que o autor tanto menciona, têm grande
importância para todos os Estados que possuem acesso a elas, a vantagem
operacional oferecida pelo domínio das águas de um determinado território, era
considerado de valor inestimável, aumentava a capacidade de locomoção que
abrangia um vasto campo, melhorando o fluxo comercial, aumentando a
circulação de informação e pessoas, e por fim exercendo o maior controle na
“defesa” das fronteiras aquáticas com outros Estados. [tradução livre] [18]
Pode-se perceber mais uma vez, que utiliza como argumento,o fator
climático e a questão racial, de acordo com ele, ao longo trajeto dos rios, estão
localizadas as províncias mais belas do Império, seriam os únicos locais capazes
de aclimatar o homem europeu que não resistiria ao clima hostíl do Brasil.
Em um dado momento, Alberdi, expõe o que acredita ser um dos motivos
principais para o Império exercer o controle das águas. Ao contrário das
repúblicas vizinhas que incentivavam a livre navegação fluvial, o Brasil era um
ferrenho opositor dessa política devido a liberdade comercial que ela ocasionaria
às províncias brasileiras, tornando-as mais autônomas minando assim a
integridade centralizadora do Império. [tradução livre] [19]
Concluí esse capítulo com a citação sobre o futuro do Império,
interessante notar que ele separa Império e Brasil.
“Para o Império, tomar o Prata significa reviver, renascer; permanecer
nos seus atuais limites, é dizer adeus à existência do Império, não do Brasil.”
[tradução livre] [20]
Conclusões
Venho trabalhando nesta pesquisa desde meados de março, de 2015 portanto ,
conclusões mais profundas sobre esses três meses de estudos e análises são arriscadas
por conta do vasto campo que ainda tenho dentro dos registros relacionados às
impressões dos letrados estudados neste trabalho tinham sobre o Império do Brasil. No
meu caso, o letrado Juan Bautista Alberdi.
Com o estudo desenvolvido a partir da leitura e análise da introdução e do
primeiro capítulo da fonte “El Imperio del Brasil ante la democracia de América”, pude
perceber, ainda que superficialmente, diante da formação do letrado em questão e das
experiências vividas pelo mesmo durante o período no qual produziu a fonte, as
percepções do mesmo em relação a postura imperial brasileira e o tipo de análise que
realizou no decorrer da Guerra do Paraguai.
A pesquisa até o presente momento, se encontra em uma fase bastante inicial
mas as obras utilizadas, de Goldgel e Myers, ajudaram na compreensão do recorte
temporal que o letrado em questão se encontra facilitando a minha análise da fonte e do
contexto na qual ela se encontra.
Notas
[1] GOLDGEL, Víctor. Cuando lo nuevo conquistó américa. Prensa, moda y
literatura en el siglo XIX. Buenos Aires: Siglo XXI, 2013
[2] MYERS, Jorge. La revolución en las ideas: la generacíon romántica de 1837 en
la cultura y en la política argentinas; GOLDMAN, Noemí. Nueva História Argentina.
Tomo 3. Buenos Aires: Sudamericana, 1998
[3] LOJO, María Rosa. Org. El pensamiento de Juan Bautista Alberdi. Buenos Aires:
El Ateneo
[4] ALBERDI, Juan Bautista. Escritos Póstumos. Tomo XV. Buenos Aires: Juan
Bautista Alberdi, 1900.
[5] ALBERDI, Juan Bautista. El Imperio del Brasil ante la democracia de América.
Paris: Imprenta A.-E. Rochette, 1869. p. II
[6] Idem. p. II-III
[7] Idem. p. XIII
[8] Idem. p. XIV
[9] Idem. p. LXXI
[10] Idem. p. LXXII
[11] ALBERDI, Juan Bautista. Las disensiones de las Repúblicas del Plata y las
maquinaciones del Brasil. Paris, 1865. p. 2
[12] Idem. p. 2-3
[13] Idem. p. 4
[14] Idem. p. 4
[15] Idem. p. 5
[16] Idem. p. 8
[17] Idem. p. 9
[18] Idem. p. 10-11
[19] Idem. p. 12
[20] Idem. p. 14
Referências bibliográficas
ALBERDI, Juan Bautista. El Imperio del Brasil ante la democracia de América.
Paris: A.-E. Rochette, 1869.
ALBERDI, Juan Bautista. Escritos Póstumos. Tomo XV. Buenos Aires: Juan Bautista
Alberdi, 1900.
GOLDGEL, Víctor. Cuando lo nuevo conquistó américa. Prensa, moda y literatura
en el siglo XIX. Buenos Aires: Siglo XXI, 2013
LOJO, María Rosa. El pensamiento de Juan Bautista Alberdi. Buenos Aires: El
Ateneo
MYERS, Jorge. La revolución en las ideas: la generacíon romántica de 1837 en la
cultura y en la política argentinas; GOLDMAN, Noemí. Nueva História Argentina.
Tomo 3. Buenos Aires: Sudamericana,