Uma Agenda Para Jovens Pesquisadores

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    MA P JS A V O R RA B ER COSTA

    Em 1992, no V Salao de Iniciacao Cientffica da UFRGS, urnbolsista de Iniciacao Cientifica sob minha orientacao recebeuoPremia [ovem Pesquisador da Area de Ciencias Humanas. Seriadesnecessario descrever a alegria e as outras emocoes rnuito fortesque sentimos naquele memento - ele,um jovem estudante do Cursode Filosofia que recern se iniciava nas licles da pesquisa academica,e eu, UTIla professora de gradua

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    Caminhos investigativos II Um a agenda para j oven s pes qu i sado res 145

    Este trabalho e fruto de minhas primeiras impressoes como Boisistade Iniciacao Cientif ica. Ao partic ipar de urn projeto de pesquisa,muitas de minhas pre-concepcoes sobre 0 que se ria traba lhar empesquisa e sabre a propria natureza da pesquisa foram abaladas,e algumas delas, devo dizer, ruirarn irremediavelmente.Tinha eu urn ideal asseptico, inodorizado e inabalavel da atividadede pesquisa que, guardada sob 0braco forte da ciencia, apaziguarianossas t itanicas interrogacoes. Bastaria que aliassernos acornpctencia do pesquisador unl tema fertil e uma boa metodologiae estar iamos na senda da cer teza.Qual nao foi minha surpresa quando deparei-me com urn universeonde a maior certeza era a de que nao tinhamos muita cer teza deaonde 0 nosso trabalho iria nos levar. Ocasionalmente, eu erasurprecndido por algumas frases profer idas pela orientadora emmomentos de fadiga e extenuacao, como "Estamos mergulhadosnesse projeto que sequer eu sei ao certa aonde vai d ar".Irnpressionava-rne 0 fa to de , em determinados momentos dapesquisa, estarrnos como que parados diante de uma encruzilhadaonde diversos caminhos se nos apresentavam como sendoigualmente coerentes. Essas percepcoes tomaram rnaior dimensaoquando me vi diante do mundo concreto das escolas - objetos deestudo que se movimentavam no tempo e no espa

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    caminho dos estagios superiores da civilizacao, 0 homerrr' do seculodezessete em diante seria aquele que deseja ignorar a tradicao deuma maneira radical para dedicar-se inteiramente ao futuro.A palavra moderno. popularizada par Rousseau, expressaexatamente esta "rnoda" cujomodo de sere distanciar-se do passadoe fazer do presen teuma constante busca do novo, num rnovimentoinfinito ern direcao ao futuro que seria sempre melhor, mais perfeitodo que 0passado, Paradoxalrnente, estaria nascendo ai, no berco daracionalidade ocidental, 0mito do progresso e, como nos ensinouMartin Heidegger, ai se constitui, tarnbem. uma das caracteristicasdohornem modemo - a obsessao pela novidade. 0 novo seria, porprincipia, sempre desejavel e sempre melhor do que 0velho.

    A era denominada "Modernidade" vai se caracterizar pelavigencia de Ulna serie de conviccoes cujas enunciacoes podem sertributadas, sobretudo, a genial intuicao do cogito formulada parRene Descartes no seculo dezessete e que "iluminara" todo 0seculodezoito com suas "1uzes" . Depois das supostas trevas que teriamobscurecido 0pensamento humano na Idade Media, teria nascidourn mundo novo com a pretensao de ser sempre novo, sempremoderno, iluminado pelas luzes inequivocas da razao. Algumasdestas conviccoes, que se instalaram gradativamente (e muitasperduram ate hoje), gravitam em torno do seguinte:

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    Concepcao de que 0 real nao 56 e matematizavel como tambem ecornprovavel experimentalmente segundo metodos r igorosos.E de todos conhecido 0projeto de Augusto Comte de transformar apr6pria Sociologia numa fisica do social, .Crenca na Iiberdade incondicional do ser humano para reger seudestino. Fortalecimento da nocao de sujeito e forrnulacao doconceito de autonomia ..iI ,Conviccao de que a infelicidade humana derivaria do turvamentoda razfio pelas supersticoes, entre elas, as crencas religiosas.Crcnca na superioridade absoluta do homern sabre todos as outrosseres da criacao.Afirrnacao da dernocracia como amelhor f6nnula para a organizacaoda sociedadc.

    A epoca moderna tern sua identidade inequivocamentemarcada pelo nascimento de uma nova concepcao de ciencia e demetodo. desenvolvida inicialmente e parcialmente par Galileu efundamentada filosoficarnente por Descartes. Segundo 0fi16sofoalemao Hans-Georg Gadamer (1983), os seculos XVIII e XIXteriamtestemunhado uma sucessao de esforcos no sentido de reconciliara heranca da metafisica corn 0espirito da ciencia moderna.

    N o seculo XX, por sua vez, todo 0conjunto de certezas queconstituiram as pilares do pensamento modemo estaria entrandoem crise. Boaventura de Souza Santos (1989), conhecido soci6Iogoportugues da atualidade, diz que vivemos uma epoca de criseparadigmatica ern que passamos Ientamente do paradigrna daciencia moderna para urn outro paradigma - cujos sinaiscornecariam a aparecer ao longo do seculo XX- que ele chama deciencia p6s-moderna.Sao numerosas e muito impor tantes as anal isescontemporaneas quepassaro enl revista aModernidade bern comoas movimentacoes operadas em seu interior e no sell entorno,reafirmando-a ou negando-a, e,nesse empreendimento, realizandourn inventario enrico de suas virtudes e mazelas. Dentre elas,

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    Crenca absoluta na exclusividade da razao para conhecer averdade, suspeitando-se de todo 0conhecimento que provernda fe, da tradicao, da mera intuicao .Aspiracao de que os conhecimcntos sejam traduzfveis emf6rmulas fisico-nlatematicas facilmente compreensiveis,dotadas do maximo de objetividade. 0 mundo subjetivo edescartado por ser distante do IIrear' que, este sim, seria comuma todos os homens.

    r 2 A expressao "homern' e aqui indicadora do genera humane, tal como foiutilizada amplamente em toda a tradicao do pensamento moderno,caracterizando a vocacao nao s6 masculina, mas rnachistada modernidade,

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    destaco os trabalhos' de Alain Touraine (Critica da modernidade) ,Anthony Giddens (A s conse q i i ii ncia s da mode rn idade , A transformaciiod a i n tim i da d e i, David Harvey (Cond i~ao p6s -moderna ), FredricJameson (P os -m od er ni sm o - a 16 gi ca cultural do capita l ismo tardio),Hans-Georg Gadamer (V erd ad e e M etod o), Richard Rorty(Obj e ti vi sm o , r e la t io i sm o e u e r da d e i, Zygmunt Bauman (Mode rn idadee ambiva lcr fc ia ) . Cito apenas algumas com 0objetivo de apontarpara aquelas que, ern alguma dimensao, subsidiam as afirrnacoesque faco,

    Estes trabalhos analiticos empreendem um debate dos indiciosrelativos a crise paradigmatica mencionada por Souza Santos e,em seu conjunto, pode-se dizer que percorrem a maior parte dasdificuldades e problemas que a contemporaneidade pode tributara modernidade. Desde questoes filos6ficas, passando pordiscuss6es epistemo16gicas e metodol6gicas, e chegando ao examee debate das transforrnacoes culturais e politicas do limiar do seculoXXI;estas analises nos ajudam a identificar os pontos focais destacrise. Para exemplificar, tome aspalavras de Richard Rorty (1997)

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    a-historico, 0 lugar da dignidade humana, envolto pdr umaperiferia acidental e nao-essencial (p. 236).Urn passeio pelos trabalhos destes pensadores e analistas da

    contemporaneidade nos permite localizar alguns foeospreferenciais, recorrentemente mencionados. Que eles dizem?Algumas destas reflexoes sao as seguintes: Desde 0final do seculo XIX e ao longo do seculo XX, transcorre

    urn perfodo de profundas rnudancas, caracterizando uma crise,urn abalo profundo nas formas de se entender, explicar econceber 0mundo em, que vivemos. Muitas expressoes saoutilizadas para indicar estes tempos - crise cu l tura l, crise de cosmo-u i si io , c ri s e d e p a ra d igma s . Trata-se de urn tempo em que saocolocadas sob suspeita boa parte das certezas edificadas aolange dos cinco ultimos seculos, ao longo da Modernidade .Os sistemas explicativos, as verdades estabelecidas, asmetanarrativas, colocam-se sob completa suspeicao, Ha mudancas radicais nao apenas nas formas de pensar sabreomundo, mas nas formas como 0mundo seorgarriza e funciona,nas forrnas como ele e gerido, nas formas como 0habitarnos.

    o poderoso sistema colonial do mundo euro-americano sedesfez. Os movimentos de descolonizacao dos anos 40 e50do

    Intelectuais conternporaneos tern abdicado da assuncao iluministade que religiao, mito e tradicao podem seropostas a algo a-hist6rico,algo comum a todos as seres humanos enquanto humanos.Antrop61ogos e historiadores da ciencia esvaeceram a distincaoentre racionalidade inata e produtos de aculturacao. Fil6sofos taiscomo Heidegger e Gadamer nos mostraram modos de ver as sereshumanos como comple ta e absolutamente hist6ricos. Outrosf i16sofos, tais como Quine e Davidson, esvaeceram a dist incaoentre verdades permanentes da razao e verdades temporaries dofato. Ps icanalistas esvaeceram a distincao entre consciencia eemococs do amor, 6dio e medo e, entao, a distincao entremoralidade e prudencia, 0 resultado e a eliminacao da imagemde si pr6prio co~um aos metafisicos gregos , a teologia cristae ao racionalismo i luminis ta: a imagem de urn centro natural

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    ~seculo XX terminam com as colonias europeias na Asia e na, ;Africa. Na decada de 60, a maioria dos paises do Caribe, Asia,e Africa ja esta livre do controle pol it ico europeu e Cuba seIiberta dos EVA. Prevalecem, contudo, as relacoes economicas

    3 Cito os titulos de algumas obras destes autores, que integram este debate,c estao pu blicadas ern portugues. 1

    - . ~com 0Ocidente. Nos anos 70,0Vietna e 0Afeganistao tomam- ,se independentes. Nesse quadro politico, verifica-se a lentaerosao dos alicerces economicos do suposto mundo moderno,Urn centro imperial (ibericos, no sec. XVI;holandeses, no sec.XVII; franceses, no sec. XVIII; br itanicos, no sec. XIX;estadunidense e russo, no sec.XX) nao mais existe. As supostassupremacias politicas e culturais estao todas corroidas, emboraa tessitura de sua racionalidade ainda persista, produzindo

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    . -IS O Cam i h os invest igat ivos ]I

    II~ Uma agenda para jovens pesqulsadcres I5 Iefeitos de discutivel significado para a solidariedade mundial.Ha urn esfacelamento dos universalismos, das totalidades.Segundo muitos destes analistas, estariamos entrando em cheiona era da fragmentacao,

    Nesse panorama, as mudancas nos modos de vida decorrentesdas novas tecnologias (telernatica, informatica, etc.) indicamtransforrnacoes, inclusive, nas nossas formas de sennos humanos,Como argumenta 0filosofo frances conternporaneo Pierre Levy,omundo humane estar ia sendo transformado por ele mesmo, e0motor disso seria a propria tecnica, nas suas verscest ecnoecono rn icas , que f azem dela 1/urn dos mais importantes temasfilos6ficos e politicos de nosso tempo" ( L E V Y , 1996, p. 7). Somoshumanos de outras maneiras, diferentes daquela definida, duranteseculos, como a verdadcira humanidade. Ha muitas rnaneiras de

    pesquisadores desse inicio do seculo XXI. Esta que apresento euma das muitas versoes possiveis no quadro daquilo que entendoser a atividade de pesquisa hoje. Ela e provisoria e advem dasrninhas conviccoes te6ricas e polit icas, bern como da forma comome posiciono como pesquisadora. Ha grande probabilidade de queuma analise mais minuciosa possa me fazer rever e reformular

    litmuitos de seus pontes. Este e mais urn dos motivos que meincentivaram a expo-Ia e a coloca-la em discussao. A ordem queadotei e totalmente aleat6ria e nao tern nenhum sentido hierarquico,isto e, ela nao reflete, necessariamente, que 0quinto ponto sejamais importante do que 0oitavo, par exemplo. Esta e sua prirneiraforrnulacao. 56 anote em sua pr6pria agenda aquila que, ap6s urncuidadoso escrutinio, julgar procedente e consistente.

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    ,sennas humanos e nao ~penas uma, universal, racional. ..E0fim,dos essencialismos. E 0advento de novas concepcoes em que 0contingente substitui 0transcendente. Estariamos radicalmenteinscritos na historia, em perrnanente recomposicao e reinvencaode nossas identidades.Estes sao os contornos do mundo que tern side denominado

    p6s-modema, entre outras coisas, por seu desacerto/ desencanto comas concepcoes vigentes na modemidade. Nele cstao sob suspeitaaquelas concepcoes que deram sustentacao a Modemidade, entreelas: a suposicao de uma ordem universal; urn modelo deracionalidade (0 ocidental); uma ideia de sujeito (0 sujeito poderoso):as metanarrativas (grandes sistemas explicativos e totalizantes): asupremacia do Homem (como especie, como genero, como medidade todas as coisas); uma cultura (a ocidental) como 0 Iugarprivilegiado a partir do qual seinventam e nomeiam as 1/outras",

    Esbocado sumariamente (e grosseiramente) 0pano de fundosobre 0qual tern se desenrolado 0que sepoderia chamar de dialogoentre a ciencia c 0 mundo, suponho estarmos minimamentepreparados para pensar uma agenda para [ovens pesquisadoras e

    Primeiro pontoPesqu i sa r e um a a v en tu r a, s e ja Ul11 born detetive e esteja a t en to a s ua sintu icoesl Pistas, intuicces, suspeitas, duvidas merecem ser objeto

    de atencao, e nao deveriam ser descartadas sern antes perscrutar-secuidadosamente varias possibilidades de conecta-las com aquilaque se deseja investigar. Ao que tudo indica, parece que nao existe1/modelo" de pesquisa minimamente confiavel que justifique 0descarte do inesperado sem dar-Ihe uma chance de "falar". Bonsestudos freqiientemente estao associados a inesperadas "sacacoes"!

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    Segundo ponto

    A cha dos e r e su l ta d os de pe squ i sa s a o p a r ci a is e p r o v is 6 r io s . N i io t en h aa pre iensi io d e co n ta r a ve rdade to ta l e de f ini i iua . A cartografia total deuma ideia ou problema vern se mostrando impossivel. Parece quenao existe a possibilidade de mapear todas as alternativas deconfiguracao de urn campo ..As constantes reformulacoes de teoriasconsagradas estao a indicar que isto se verifica mesmo nas areasde pesquisa em que 0 controle experimental e mais rfgido emeticuloso. Assim, como a contingencia parece ser nosso limite,

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    Terceiro pontoPe s qu i s a r e u m p roc ess o d e cr ia ciio e n iio d e m era c on sta ta cd o.

    A o rig in al id ad e d a p es qu is a e su i n a o rig in al id ad e d o o lh ar . Os objetosnao seencontram no mundo a espera de alguern que venha estuda-los. Para urn objeto ser pesquisado e preciso que uma menteinquiridora, munida de um aparato te6rico fecundo. problematizea lgo de forma a constitui-Io em objeto de investigacao, 0 oIharinventa 0objeto e possibilita as interrogacoes sobre ele. Assim,parece que nao existem velhos objetos, mas sim, olhares exauridos.

    livro nem sempre expressa 0apice do pensamento de um autor.A nocao de que a Hist6ria e a hist6ria do progresso ou da evolucao~humana, uma tra jet6ria em direcao ao melhor, 0 percurso do

    aperfeicoamento, e uma das tantas narrativas inventadas pelamodemidade e investidas do estatuto deverdade universal..

    abdicar a pretensao de totalidade tambern significa admitir e aceitara provisoriedade do conhecimento.

    ~

    Sexto pontoo m u nd o c on ti nu a mu da ndo . Ni i o c r i st a li z e s eu pensamen to . Ponhasua s ide ia s em discussi io, d ia lo gu e, c ri ti qu e, e xp on ha -s e. Emborapossamos ter preferencias e filiacoes enos movimentemos melhorem algumas ordens deconcepcoes te6ricas do que em outras, issonao significa que elas devam funcionar como viseiras que nao nosdeixem enxergar 0que sepassa a nossa volta. Ha muitas evariadasformas de se compreender, explicar e conceber as coisas do ~undae da vida. Encerrar-se em um universo segura de questoes resolvidase urn convite para 0anacronismo. Alem disso, sempre eborn lembrarque 0dogrnatismo cientifico ou filos6ico esta muito proximo dosfundamentalismos!

    Quarto pontoo m un do n ao e de Ul11 unico jeito. D e s co n fi e d e todos os discursos qu e

    se pret endem r ep re se nu uiu os d a "r ea lid ad e o bje tiu a" ..A realidadeassume muitas forrnas, tantas quantas nossos discursos sabre elaforem capazes de compor. Quando alguem ou alga e descrito,explicado em uma narrativa ou discurso, temos a linguagemproduzindo uma "realidade". Embora tenhamos preferencias, naoexiste pararnetro que nos permita julgar 0valor de verdade de urndiscurso. Segundo nos ensinou Michel Foucault, a verdade e destemundo ee regida por rclacoes de pader que estabelecem as criteriosde validade e legitimidade segundo os quais alga pode ser tornadocomo verdadeiro au falso. 0 que podemos ter sao hip6tesesprovis6rias e parciais que nos dao seguran

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    outras coisas, a vida digna ....justica e a paz devem ser preservadas.Como urn dos campos da realizacao hurnana, a ciencia e territ6rioda etica, descuidar-se disso e colocar em risco 0planeta e os seresque 0habitarn.

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    ~muitas pessoas estao trabalhando, pensando, contribuindo.Foucault nos ensinou que aquila que produzimos com a pesquisanao e mais do que fulguraC;6es de verdades sempre incompletas.Se concordamos com 0 fato de que 0 conhecimento e parcial eprovis6rio, fazer a nossa parte e cumprir com 0que nos cabe emprojetos que se reconfiguram permanentemente. Neles ha lugarpara todas asestrelas, incluindo aquelas que ainda estao por nascer.Toda a satisfacao que a atividade investigativa proporciona poderiaadvir da pr6pria ativ idade , dos desafios e das invencoes que elalhe possibilita.

    1

    Nono pontoPes qu i s a e u in a a ii ui da d e q u e e xi ge r ef ie xi io , r ig or , m e to da e o us ad ia .

    Lembre S C 1 l 1 p r e qu e n e 1 1 1 i od a a a i i oi d ad e i n tc l cc tua l e c i e n t i f i c a . 0 trabalhocicntifico e urn entre tantos outros e tern peculiaridades. Ha muitasatividades intelectuais que requerem habilidades complexas esofisticadas, mas nao se encaixarn em parametres de cientificidade.Ernbora estes parametres sejarn cada vez mais amplos e flexiveis,eles existent e sao distintivos desta atividade. 0 fato de nao exis tir1 0rnetodo" distintivo da ciencia, nao signif ica que se possa fazerpesquisa SelTI rnetodo. 0 trabalho de investigacao nao podeprescindir de rigor e metodo, mas voce pode inventar seu pr6priocarninho. Mui ta dedicacao a lei turas, mui ta persis tencia e dominicde habilidades para expressar-se, acuidade e curiosidade estaoentre as requis itos de quem se dedica a pesquisa.

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    Decirno segundo pontoas r es u lt ad o s d e s u a p e sq u is a sa o i mp or ta nte s. S eja u rn pesqu isador

    engajado. Par mais parciais e provis6rios que sejam os resultadosde sua pesquisa, certamente, em alguma dimensao, e de algumamaneira, elespodem contribuir para tomar melhor 0mundo e nossavida dentro dele. Seja humilde, mas nao se ja omisso . Em vez desonhar com a grande revolucao, faca sua parte nas "pequcnas Iutasdiarias", Voce nao mudara 0mundo, mas muitas coisas poderacser diferentes se voce nao deixar sua pesquisa guardada s6 paravoce au para urn grupo seleto de Uiniciados" .

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    Decimo pontoPes qu i s a r e u ma ta re fa socia l. D iu ulgu e su a pe sq uisa e p rocu re

    c on he ce r a s do s au tros. Embora uma das imagens mais difundidasda pesquisa seja a do cientista isolado e concentrado em seulabora torio, cla nos diz pouco sabre esta atividade. A investigacaocientifica e, sobretudo, urn trabalho coletivo. Para que urn

    -- _. .-pesquisador ou pesquisadora trabalhe sozinho em seu gabineteou laborat6rio, uma imensa rede de saberes, artefatos , aparatos,insti tuicocs c pcssoas esta ern operacao para tornar isto possivcl.

    oil

    Em sua reflexao sobre a ciencia p6s-moderna, Souza Santos(1989) recorre a henneneutica gadarneriana para cornpreender aciencia modema, transforrnando 0distante em pr6ximo, 0estranhoem familiar. Vou invocar suas palavras para transmitir a voceseste sentimento final.

    Decirno primeiro pontoA v er da de ou a s ve rd ad es s ao d e st e mundo . L e nt br e s e ln p re q ue a

    hum i l d ad e e Ulna v i r i u d e e niio t r a ns f onnc se u saber e m a u to ri da d e. Suasdescobertas, embora importantes, sao parte de uma rede em que

    A reflexao herrneneutica toma-se, assim, necessaria para transforrnara ciencia, de urn objeto estranho, dis tante e incomensuravel corn anossa vida, num objeto familiar e pr6ximo, que, nao falando a linguade todos as dias, e capaz de nos comunicar as suas valencias e osseus limites, as seus objetivos e 0que reaIiza aquern e alern deles,urn objeto que, por falar, sera mais adequadarnente concebido numa

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    Alfredo Veiga ..Neto e graduado em Hist6ria Natural e em Musica,mestre em Cenet ica e dou tor em Educacao. Foi professor titular doDepartamento de Ensino e Curricula da Faculdade de Educacao daUFRGS. Presenternente atua como docente e pesquisador nos programasde Pos-Craduacao em Educacao da ULBRA e da UFRGS. Nos ultimosdez anos tern se dedicado a estudar a obra de Michel Foucault e suasconexoes com a Educacao, especialmente no que diz respeito a s questoessobre a interdisciplinaridade. Atualmente investiga as relacoes entre aescola, 0neolibcralirno, 0multiculturalismo c a globalizac;ao, no registrodas mudancas no uso e percepcao do tempo e do espac;o. Tern inumeraspublicacoes sobre educacao, curriculo, disciplinaridade, dentre as.quaisse destaca a organizacao de Critica po s - e s ir u i u ra li s i a e educaciio (Sulina,1995) e E stu dos C uliu ra is d a Ciencia e E d uc aci io (Autentica, 2001). E vice-presidente da Associacao Nacional de P6s-Graduac;ao e Pesquisa emEducacao (ANPEd), e part ic ipa do Conselho Editorial de variesperi6dicos. IMaria Isabel Edelweiss Bujes e licenciada em Pedagogia (UFRGS),

    mestra em Educacao (PUCRS) e doutora em Educacao (UFRGS).Professora adjunta do Departamento de Estudps Especializados daFaculdade de Educacao da UFRGS (aposentada), coordena atualmente 0Prograrna de P6s-Graduac;ao em Educacao da ULBRA. Seus interesses d e pesquisa .na area de Educacao Infantil estao associados a suaexperiencia como professora dessa habilitacao no curso de Pedagogiada UFRGS por dez anos. Presentemente, desenvolve pesquisa sabre oscurriculos de formacao de professoras para a Educacao Infantil, na linhade pesquisa Traba lho e Fo rm a d io Do c e nt e , na ULBRA. Tambern desenvolvee orienta pesquisas que abordam as relacoes entre i n fi in c ia e p o de r sob a6tica culturalista. E autora do livro l n fd n ci a e Ma q u i na r ia s (DP&A) e co-autora, entre outros, dos seguintes livros: Es tudos Cul tura is em Edu ca d i o- midia, a r q ui te t ur a , b ri n qu e d o, biologic, l it er at ur a, c in e ma ... (Ed. daUniversidade, 2000) e E d uc a ci io I n/ an t il : p r a qu e te quero? (Artmed, 2001).Suas publicacoes mais recentes (artigos, capitulos de livros, participacaoem congressos) tern se carac terizado por abordar a ternatica dogouernamento da infancia.

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    relacao eu-tu (a relacao hermeneutical do que numa relacao eu-coisa (a relacao epistemo16gica) e que, nessa medida, se transformanum parceiro da conternplacao e da transforrnacao do mundo.Compreender assim a ciencia nao e funda-la dogmaticamente emqualquer dos pricipios absoluto au a p r i or i que a filosofia da ciencianos tern fornecido, desde 0 e ns c og it an s de Descartes a reflexaotranscendental de Kant, ao espirito absoluto de Hegel, a consciencia

    pura e sua intuicao das essencias de Husserl, a imediacao da percepcaosensorial do ernpirismo anglo-saxonico e do sensualismo frances.Ao contrario, trata-se de compreende-la enquanto pratica social deconhecimento, uma tarefa que se vai cumprindo em d'ialogo com 0mundo e que e afinal fundada nas vicissitudes, nas opressoes e naslutas que 0compoern e a nos, acomodados au revoltados (p. 13).

    Sabre autoras e autorj,I

    Referencias bibliograficasCOSTA, Marisa Vorraber (arg.). Cam i nh o s I n ve s ti g a ti vo s : n ov a s o l ha r e s n a p e sq u i sa

    em e d ucm ; i io . 2aed. Rio de janeiro: DP&A, 2002.GADAMER, Hans-Georg. A raziio na e p oc a d a c ienc ia. Trad. Angela Dias. Rio de

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    J

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    ;LEVY, Pierre. As t e cno log i as da i n te l i genc ia . Trad. Carlos Irineu da Costa. R io deJaneiro: Ed. 34, 1996.

    I. " -

    r

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    Janeiro: Graal, 1989.

    Este texto e uma versao, com poueos retoques, da palestra realizada porocasiao da abertura do 11Q Serninario de Iniciacao Cien tifiea e PremiaVasconcellos Torres de Ciencia eTecnologia - 2001, em 26de novembro de2001, no anfiteatro da Reitoria da UFF, Niter6i/RJ.

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