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Uma Experiência de Ensino de Redes de Computadores via Internet Luciano Paschoal Gaspary [email protected] Rejane Frozza [email protected] Alessandra Dahmer [email protected] Bettina Steren dos Santos [email protected] Elizabeth Rizzato [email protected] Universidade de Santa Cruz do Sul Departamento de Informática Av. Independência 2293, 96815-900, Santa Cruz do Sul, RS Resumo: Muitos cursos a distância via Internet têm sido oferecidos nos últimos anos. Embora esta modalidade de ensino seja apontada como muito promissora, muitos desses cursos têm repetido as velhas fórmulas do ensino tradicional e se tornado experiências mal sucedidas de ensino a distância. Consciente dessa problemática, a Universidade de Santa Cruz do Sul, UNISC, criou um grupo interdisciplinar de professores para elaborar uma metodologia de ensino a distância. A primeira experiência com base nessa metodologia foi a disciplina Redes de Computadores via Internet, oferecida a alunos de graduação do curso de Ciência da Computação. Este artigo apresenta a organização da disciplina, a estrutura física utilizada, a metodologia e os recursos usados na preparação do material didático, a forma de comunicação e os resultados obtidos. Abstract: Many web-based courses have been offered in the recent years. Although this teaching modality is considered very promising, most of such courses have repeated the old plane formulas of the traditional education system and have become unsuccessful experiences of distance teaching. Aware of this problem the University of Santa Cruz do Sul, UNISC, created an interdisciplinary group of professors to elaborate a methodology for distance teaching. The first experience based on this methodology was a Computer Networks web-based course, offered to Computer Science graduation students. This paper presents the organization of the course, the physical structure used, the methodology adopted and the resources used to prepare the material, the communication mechanisms and the results obtained. Palavras-chave: ensino de graduação, Internet, redes de computadores 1. Introdução O final dos anos 90 foi marcado pela proliferação de cursos a distância via Internet nos mais diversos setores da atividade humana. Muitos desses cursos, talvez a maioria deles, apresentam o material de estudo formado basicamente por textos e imagens e propõem uma série de atividades que o aluno desenvolve de forma autônoma ou em grupo. Um fato importante é que o ensino centrado no aluno requer uma atenção maior na elaboração do material que é disponibilizado a ele. Enquanto em uma sala de aula o professor usa e abusa da criatividade para manter a atenção do aluno, como fazer o mesmo ou algo similar para manter o aluno concentrado e motivado no material que lhe é apresentado em uma situação de aprendizado a distância? Essa e outras questões têm sido pouco consideradas e exploradas em grande parte dos cursos oferecidos atualmente. Além de desconsiderar aspectos mais subjetivos como os comentados acima, muitos dos cursos pecam em aspectos bem mais simples ao dimensionar mal as atividades propostas, ao

Uma experiencia de ensino de redes de computadores via interne · Embora esta modalidade de ensino seja apontada como muito ... de professores para elaborar uma metodologia de ensino

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Uma Experiência de Ensino de Redes de Computadores via Internet

Luciano Paschoal Gaspary [email protected]

Rejane Frozza [email protected]

Alessandra Dahmer [email protected]

Bettina Steren dos Santos [email protected]

Elizabeth Rizzato [email protected]

Universidade de Santa Cruz do Sul

Departamento de Informática Av. Independência 2293, 96815-900, Santa Cruz do Sul, RS

Resumo: Muitos cursos a distância via Internet têm sido oferecidos nos últimos anos. Embora esta modalidade de ensino seja apontada como muito promissora, muitos desses cursos têm repetido as velhas fórmulas do ensino tradicional e se tornado experiências mal sucedidas de ensino a distância. Consciente dessa problemática, a Universidade de Santa Cruz do Sul, UNISC, criou um grupo interdisciplinar de professores para elaborar uma metodologia de ensino a distância. A primeira experiência com base nessa metodologia foi a disciplina Redes de Computadores via Internet, oferecida a alunos de graduação do curso de Ciência da Computação. Este artigo apresenta a organização da disciplina, a estrutura física utilizada, a metodologia e os recursos usados na preparação do material didático, a forma de comunicação e os resultados obtidos. Abstract: Many web-based courses have been offered in the recent years. Although this teaching modality is considered very promising, most of such courses have repeated the old plane formulas of the traditional education system and have become unsuccessful experiences of distance teaching. Aware of this problem the University of Santa Cruz do Sul, UNISC, created an interdisciplinary group of professors to elaborate a methodology for distance teaching. The first experience based on this methodology was a Computer Networks web-based course, offered to Computer Science graduation students. This paper presents the organization of the course, the physical structure used, the methodology adopted and the resources used to prepare the material, the communication mechanisms and the results obtained. Palavras-chave: ensino de graduação, Internet, redes de computadores

1. Introdução

O final dos anos 90 foi marcado pela proliferação de cursos a distância via Internet nos mais diversos setores da atividade humana. Muitos desses cursos, talvez a maioria deles, apresentam o material de estudo formado basicamente por textos e imagens e propõem uma série de atividades que o aluno desenvolve de forma autônoma ou em grupo.

Um fato importante é que o ensino centrado no aluno requer uma atenção maior na elaboração do material que é disponibilizado a ele. Enquanto em uma sala de aula o professor usa e abusa da criatividade para manter a atenção do aluno, como fazer o mesmo ou algo similar para manter o aluno concentrado e motivado no material que lhe é apresentado em uma situação de aprendizado a distância? Essa e outras questões têm sido pouco consideradas e exploradas em grande parte dos cursos oferecidos atualmente.

Além de desconsiderar aspectos mais subjetivos como os comentados acima, muitos dos cursos pecam em aspectos bem mais simples ao dimensionar mal as atividades propostas, ao

propor tarefas pouco estimulantes, ao apresentar o assunto de forma confusa e desconexa. Esse fatores contribuem para a perda de interesse e para um baixo rendimento do aluno.

A comunicação também é um fator fundamental para o bom andamento dos cursos. Embora a Internet permita o intercâmbio de informações nos mais variados formatos (ex.: correio eletrônico, chat, fórum, entre outros), é preciso criar situações que motivem a discussão e o debate de idéias, como forma de enriquecer e ampliar a capacidade do aluno para propor soluções e criticá-las, bem como para avaliar alternativas.

Atenta à problemática mencionada, a UNISC iniciou em 1998 um projeto institucional de pesquisa em ensino a distância, objetivando a investigação de mecanismos, ferramentas e metodologias que poderiam ser empregadas para propiciar um ensino baseado na Web diferenciado, aproveitando as potencialidades da rede.

Um dos resultados do estudo foi o desenvolvimento de uma metodologia para a preparação de cursos oferecidos via Internet. A metodologia resgata aspectos da área da comunicação e da pedagogia, que devem ser utilizados para auxiliar na permanente motivação e direcionamento do aluno, além de lhe oferecer mecanismos que facilitem o estudo autônomo. A validação da pesquisa foi feita com a preparação e oferta da disciplina de Redes de Computadores a distância via Internet para alunos da graduação do curso de Ciência da Computação da UNISC.

O artigo está organizado da seguinte maneira. O capítulo 2 descreve a organização da disciplina e a forma como a experiência foi conduzida. A infra-estrutura utilizada pelos alunos é apresentada no capítulo 3. O capítulo 4 apresenta os aspectos relacionados à compilação e preparação do material didático, além de tratar do desenvolvimento de um tutor inteligente. No capítulo 5 são apresentadas as formas de comunicação utilizadas no decorrer da disciplina. O capítulo 6 aborda os resultados obtidos com a turma experimental, as conclusões e os trabalhos futuros.

2. Organização da Disciplina

Na UNISC, a área de Redes de Computadores oferece três disciplinas no curso de graduação: Redes de Computadores I, Redes de Computadores II e Gerência de Redes. A experiência foi realizada com a primeira da série. A turma foi dividida em dois grupos: o experimental e o de controle. O grupo experimental, composto de 11 alunos, desenvolveu a disciplina totalmente a distância, usando as ferramentas e a metodologia apresentadas nos capítulos que seguem. O grupo de controle, também composto de 11 alunos, realizou a disciplina de forma presencial, com encontros semanais em sala de aula ao longo de todo o semestre. O conteúdo lecionado nas duas turmas foi o mesmo, havendo variação apenas na forma de apresentação do mesmo.

Ao longo do semestre foram propostas três atividades práticas. Essas atividades precisaram ser realizadas em laboratório. Os alunos do grupo experimental puderam optar entre alguns dias e horários previamente sugeridos.

A avaliação foi realizada com verificações realizadas no meio e no final do semestre. Para ambas as turmas, as verificações foram as mesmas e ocorreram, presencialmente, no mesmo local, data e horário.

A disciplina Redes de Computadores I é oferecida aos alunos do sexto semestre e possui o seguinte cronograma:

• Introdução às redes de computadores,

• Modelos de referência OSI e Arquitetura TCP,

• Sinais analógicos e digitais, composição dos sinais, banda x taxa, capacidade de um canal,

• Meios de transmissão,

• Distorção e ruído,

• Transmissão de informações analógicas/digitais utilizando sinais analógicos/digitais, codificação, modulação, PCM,

• Modems,

• Aspectos mecânico, elétrico, funcional e procedural das interfaces digitais, interfaces digitais padronizadas, interface RS-232,

• Nível de enlace - parte 1: delimitação de quadros, multiplexação e controle de acesso ao meio,

• Nível de enlace - parte 2: controle de erros e controle de fluxo,

• Redes locais Ethernet e Token Ring.

As próximas seções do artigo (3, 4 e 5) apresentam informações sobre como a disciplina foi ministrada para os alunos do grupo experimental. Conforme já mencionado, o grupo de controle participou da disciplina da maneira tradicional.

3. Infra-estrutura Disponível

Muitos alunos da UNISC residem em cidades próximas a Santa Cruz do Sul, cidade sede da Universidade. Os que participaram do grupo experimental puderam realizar as atividades previstas de duas formas: nos laboratórios da Universidade ou de casa.

Como praticamente todos os alunos optaram por cursar a disciplina em casa, o material didático de cada aula foi organizado em um arquivo único compactado que os alunos, a cada semana, carregavam para a sua máquina. Isto foi feito para evitar custos muito elevados com pulso telefônico e provedor de Internet, o que impediria muitos alunos de cursar a disciplina usando esta modalidade de ensino. Em geral, os alunos dispunham de computadores dotados de modems de 33.600 bit/s.

Com esta medida, reduziu-se o tempo médio que cada aluno precisaria, em média, ficar conectado à rede. A realização completa de um módulo estava estimada para durar em torno de três horas. Com a possibilidade de trabalhar sem conexão com a Internet, o tempo gasto por cada aluno na rede em média por semana ficou estimado em 5-10 minutos para fazer a carga do material mais 30-60 minutos para participar de fóruns, bate-papos e enviar e-mails.

Uma vez conectados à rede, os alunos interagiam com o servidor WWW de EAD da instituição. Neste servidor, reside um sistema de gerenciamento de cursos a distância, bem como todo o material da disciplina. O sistema de gerenciamento usado foi desenvolvido na própria UNISC. Sua descrição está fora do escopo desse trabalho. Mais informações sobre ele podem ser obtidas em [1,2].

A figura 1 ilustra o portal, apresentado após o aluno ser autenticado pelo sistema de gerenciamento. Como é possível observar, através do menu (à esquerda) o aluno pode visualizar as últimas novidades (1), as instruções sobre como realizar o curso (2), o

cronograma da disciplina (3) e os compromissos e datas importantes agendadas (4), pode ainda carregar um novo módulo (5) e participar dos fóruns (6) e bate-papos (7).

Figura 1 - Portal da disciplina

4. O Material Didático

4.1 Metodologia de Preparação do Material

Tem-se observado que grande parte dos cursos oferecidos via Internet carecem de mecanismos que permitam manter o aluno constantemente motivado durante o curso. Além disso, esses cursos não oferecem formas de direcionamento, o que dificulta a realização e o entendimento das relações existentes entre os conteúdos propostos. Conforme já mencionado, a metodologia utilizada na preparação do material resgata aspectos da área da comunicação e da pedagogia.

4.1.1 Aspectos visuais

Algumas das primeiras indagações levantadas no desenvolvimento do projeto foram: como o aluno deveria interagir com o módulo? Qual a melhor estrutura de navegação? Deveria cada módulo ter uma representação visual única, despertando a curiosidade do aluno para os módulos que estavam por vir?

Por orientação de profissionais da comunicação, optou-se por um formato visual padrão, utilizado em todos os módulos. Desta forma, o aluno facilmente distinguiria o que é conteúdo, o que é atividade, como acessar um determinado assunto diretamente, entre outros aspectos.

A figura 2 ilustra a estrutura utilizada. Na parte superior da tela, o aluno visualiza o título do módulo. Ao lado, organizada na forma de uma árvore, encontra-se a estrutura geral do módulo. Ao selecionar uma das páginas do módulo, ela é apresentada à direita.

O mecanismo criado permite ao aluno acessar diretamente algum tópico de maior interesse, além de lhe oferecer acesso direto ao fórum de discussão e aos arquivos disponíveis para download (ex.: transparências e programas multimídia de apoio). Uma vantagem importante do mecanismo proposto é apoiar o aluno a visualizar sempre a estrutura global do módulo,

1

3 4

5 6

7

2

permitindo a ele manter-se permanentemente ciente de onde ele se encontra dentro do módulo.

Figura 2 - Estrutura visual de um módulo

Botões de navegação permitem ao aluno navegar pelo conteúdo de forma linear, na seqüência como seria apresentado em uma aula presencial. Ao parar com o mouse sobre o botão de retrocesso ou avanço, é apresentado ao aluno o título da página anterior ou seguinte, respectivamente.

Uma padronização adotada está relacionada às cores das barras de títulos usadas ao longo do conteúdo. Na disciplina de redes, existem três tipos:

• azul clara: usada para identificar títulos de primeira ordem;

• verde: usada para identificar subtítulos. Vale ressaltar que os módulos são subdivididos em títulos e subtítulos apenas. Isto evita a construção de uma estrutura com muitos níveis (vide figura 3);

• azul-escura: usada para identificar atividades propostas. Uma atividade pode ser um problema, um jogo do tipo palavras-cruzadas, a participação de um fórum de discussão, entre outras (vide figura 3).

Figura 3 - Padronização visual do módulo usando cores e ícones

Como o módulo é carregado para o computador do aluno antes da realização da aula, as atividades que requerem acesso à Internet são indicadas pelo ícone ilustrado na figura 3. Ao visualizar o ícone, o aluno sabe que precisa conectar-se à Internet naquele momento para executar a atividade proposta.

Visão geral do módulo

Subtítulos e atividades

4.1.2 Aspectos pedagógicos

No desenvolvimento dos módulos, procurou-se também criar mecanismos que permitissem manter o aluno motivado no conteúdo proposto. Gagné Apud [3] lista em [4] alguns aspectos que devem ser considerados na elaboração de uma estratégia instrucional, seja o curso presencial ou a distância.

Segundo ele, o primeiro desafio nesse sentido é ganhar a atenção do aluno. Isto pode ser obtido apresentando um bom problema, uma nova situação ou, ainda, usando um anúncio multimídia. Este aspecto foi desenvolvido em cada módulo, com a utilização de imagens animadas; no início das seções de um módulo foram adicionadas animações com mensagens e efeitos que despertassem o interesse do aluno pela leitura daquela seção (vide figura 4).

Figura 4 - Faixas e letreiros animados

A atenção do aluno pode ser obtida ainda se ele souber das habilidades que irá desenvolver após o estudo do módulo. Assim, no início de cada módulo descreve-se os objetivos daquela aula, indica-se o que o aluno será capaz de realizar e como ele poderá usar o conhecimento adquirido (vide figura 5a).

(a) (b)

Figura 5 - Ligação entre os módulos e seus conteúdos

Para Gagné, estimular a recuperação de conhecimentos prévios é um aspecto importante a ser considerado na elaboração de material instrucional. Este resgate pode ser realizado lembrando o aluno dos conhecimentos prévios relevantes à aula atual e mostrando como esses assuntos estão interligados. Considerando a importância de apresentar ao aluno a relação existente entre os conteúdos de cada módulo, apresenta-se, na mesma tela onde são apresentados os objetivos, o relacionamento do novo assunto com os já abordados anteriormente (vide figura 5b).

Chamando a atenção do aluno, despertando seu interesse pelo assunto

A área de redes de computadores apresenta diversos conceitos cujo entendimento fica comprometido com a simples leitura de textos e imagens. Nesse caso, a utilização de simulações e ou animações é adequada. A figura 6 ilustra uma simulação que demonstra como ocorre o fluxo de informações em uma arquitetura de protocolos organizada em camadas. Uma vantagem desse recurso é que o controle sobre a velocidade da demonstração é controlada pelo próprio aluno. A tecnologia utilizada no desenvolvimento das simulações foi a Flash.

Figura 6 - Demonstrando conceitos através de simulações

Para permitir que o aluno pudesse exercitar o conteúdo estudado, mesclou-se ao material exercícios e atividades de complementação e fixação. Buscando escapar dos tradicionais questionários, investigou-se formas alternativas e mais motivadoras de fazer com que o aluno buscasse exercitar o conteúdo apresentado. Utilizou-se, assim, jogos educacionais como palavras-cruzadas, relacionamento de colunas, preenchimento de lacunas e questões de múltipla-escolha [5] (vide figura 7). Naturalmente, em alguns casos, solicitou-se ao aluno a elaboração de exercícios com respostas descritivas. Ainda entre as atividades, procurou-se fomentar discussões por e-mail e fóruns, buscando a aplicação do conhecimento adquirido na solução de problemas reais.

Figura 7 - Exercícios baseados em jogos

Usando recursos adicionais a textos e imagens, mesclando-os

Exercitando o conteúdo trabalhado

Além de fornecer meios de o aluno exercitar o que foi estudado, é importante que ele receba um retorno do professor ou do próprio sistema, indicando os acertos e erros cometidos (vide figura 8). Gagné sugere que se mostre o que está correto na resposta do aluno, que se analise o comportamento do mesmo e que, se necessário, apresente uma solução passo a passo para o problema.

Figura 8 - Indicando os erros e acertos

A ferramenta utilizada na construção das atividades permite ao aluno verificar o que acertou e o que errou. Além disso, as atividades criadas nessa ferramenta possuem capacidade de dar dicas iniciais para a resolução dos problemas propostos.

Ao final de cada módulo, indicou-se bibliografia para os alunos interessados em conhecer mais aprofundadamente um determinado assunto. A bibliografia era composta de livros e links para sites Internet.

4.2 Utilização de um Tutor Inteligente na Apresentação do Material

Os sistemas tutores inteligentes representam uma nova abordagem de auxílio ao aprendizado e que contribui de maneira eficiente para manter o aluno motivado a interagir durante a apresentação do material didático. Trabalhos relacionados a estes sistemas podem ser encontrados em [6,7,8].

Estes sistemas inteligentes exploram a questão de como apresentar ao aluno um determinado assunto, considerando um ambiente não presencial, e que ferramentas e recursos podem ser utilizados na preparação de uma aula a distância.

Neste projeto de Ensino de Redes de Computadores via Internet, o assunto Controle de Erros em Transmissões foi abordado através de um Sistema Tutor Inteligente. O desenvolvimento deste sistema compreendeu as seguintes atividades:

• Modelagem do perfil do aluno;

• Preparação do material da base de domínio.

4.2.1 Determinação do perfil

O sistema tutor desenvolvido se adapta a tipos diferentes de alunos. Para isso, o primeiro passo na utilização do sistema é a determinação do perfil do aluno, em relação a algumas de suas preferências pessoais. O perfil influenciará na forma de exposição do conteúdo do domínio modelado.

As preferências pessoais do aluno são adquiridas através de respostas a um conjunto de dezessete perguntas, submetidas a ele no início de sua interação com o sistema. A figura 9 mostra uma tela das questões apresentadas ao aluno.

Figura 9 – Questões para perfil do aluno

As informações do perfil do aluno são armazenadas em um banco de dados. São elas: identificação do usuário, classificação (visual, auditivo, visual-auditivo) e preferência de cores (claras, escuras, vibrantes). Estas informações geram nove combinações de perfis.

4.2.2 Base de domínio do sistema tutor

A partir da modelagem do perfil do aluno, diferentes formas de exposição e abordagem do conteúdo são proporcionadas pelo sistema tutor. A base de domínio possui o assunto modelado em páginas WWW para cada perfil diferente.

O conteúdo é abordado e apresentado com variadas estratégias de ensino, levando em consideração o perfil do aluno: conceitos, exercícios, animações, exploração de imagens e sons. A figura 10 ilustra uma tela de apresentação do conteúdo ao aluno.

Figura 10 – Apresentação do contéudo do domínio

5. Comunicação e Acompanhamento Pedagógico

Os ambientes de aprendizado baseados na Internet suportam vários formatos de comunicação. Na experiência realizada, utilizou-se correio eletrônico, fóruns de discussão e bate-papos.

O correio eletrônico foi usado em diferentes cenários. A cada atualização no portal da disciplina (ex.: novo módulo disponível, atualização do cronograma), os alunos recebiam um e-mail indicativo. Este procedimento tornou desnecessário que o aluno acessasse o portal da disciplina a cada dia para verificar se havia ou não algo novo disponível.

O correio eletrônico foi usado ainda para promover debates e discussões assíncronas a respeito do assunto. As dúvidas individuais mais significativas foram repassadas a todos os

alunos para que, junto com o professor, pudessem ser resolvidas da melhor forma possível. Procurou-se, sempre que possível, desenvolver as atividades de forma cooperativa.

Em alguns momentos do curso foram realizadas gincanas baseadas em questões teórico-práticas formuladas sobre o assunto sendo estudado no momento. Nas gincanas, o objetivo era confrontar pontos de vista e motivar os alunos a utilizarem ativamente o correio eletrônico. As gincanas permitiram ainda criar um ambiente competitivo bastante salutar, onde cada aluno procurou relacionar da melhor forma possível os conceitos repassados até então na resolução de problemas reais. Apresenta-se abaixo uma das atividades propostas.

Uma empresa sediada em Santa Cruz possui duas filiais: uma em Sobradinho (filial A) e outra em Vera Cruz (filial B). Até o momento a sede e as filiais não estão interligadas. A empresa, no entanto, adquiriu um sistema que automatizará o processo de venda/controle de estoque/produção mas, para ser usado, primeiramente será necessário interligar a matriz às duas filiais.

Fatos importantes: o tráfego de dados entre a matriz e a filial A ocorrerá durante todo o dia, ou seja, o tráfego não se concentrará em um determinado horário. A comunicação da matriz com a filial B, por outro lado, ocorrerá apenas no turno da noite.

Considerando esse cenário, proponha uma solução para essa interligação. Consulte as páginas do módulo 7, da Embratel, da CRT ou outra para verificar os serviços oferecidos por essas empresas.

O professor utilizou o correio eletrônico para se comunicar individualmente com cada aluno para comentar sobre seu desempenho e resultados. A possibilidade de comunicação privada usando essa ferramenta é uma vantagem se comparada ao ambiente de ensino tradicional onde, em geral, a discussão de problemas dos alunos é pública e pode constranger os envolvidos.

Os fóruns de discussão foram utilizados para que os alunos publicassem suas impressões e opiniões. Cada assunto importante foi organizado em um fórum específico. A figura 11a ilustra os fóruns realizados ao longo do curso. Na figura 11b, é possível observar a forma como as opiniões eram apresentadas.

Em geral, as questões motivadoras dos fóruns estimulavam contribuições bastante pessoais. Pelo fato de terem suas opiniões expostas aos colegas, esperava-se que os alunos se sentissem incentivados a escrever mais.

(a) (b)

Figura 11 - Fóruns de discussão

A terceira forma de comunicação foi os bate-papos. As ferramentas NetMeeting, m-IRC e uma baseada em páginas HTML, presente no ambiente de gerenciamento de cursos, foram utilizadas. Dentre elas, obteve-se melhores resultados com a m-IRC, porque permitiu a troca

de mensagens de forma rápida. As outras ferramentas apresentaram problemas de desempenho no cenário de EAD utilizado.

A presença de um indivíduo responsável por provocar e organizar a discussão foi essencial. Sem ele, os alunos começavam a perguntar simultaneamente e muitas discussões em paralelo eram realizadas, dificultando que todos participassem ativamente acerca de um tema comum.

Para que todos os alunos participassem virtualmente desses encontros, eles foram anunciados com uma semana de antecedência no calendário disponível no portal da disciplina. Após a realização do bate-papo, um resumo com as principais contribuições e diálogos mais significativos foi publicado para que os alunos ausentes pudessem se inteirar das discussões realizadas.

O acompanhamento pedagógico deu-se apenas através da avaliação de trabalhos enviados pelos alunos, monitoramento do fórum de discussão e acompanhamento da participação da turma nos bate-papos propostos. No entanto, esta metodologia mostrou-se ineficiente. Os mecanismos empregados não foram suficientes para identificar características e particularidades dos alunos envolvidos na experiência. O andamento da disciplina não foi modificado, pois não conseguiu-se identificar possíveis deficiências no processo. Além disso, o volume de trabalhos a serem avaliados foi extremamente elevado, o que ocasionou, em muitos momentos, dificuldades significativas para o professor manter o tratamento individualizado com os alunos.

6. Conclusões e Trabalhos Futuros

Este trabalho apresentou a experiência obtida com a preparação e oferta da disciplina de Redes de Computadores I via Internet na Universidade de Santa Cruz do Sul. O desempenho dos alunos que cursaram a disciplina indicam que a experiência foi bem sucedida. A figura 12 ilustra um gráfico comparativo dos resultados obtidos pelo grupo de controle e o experimental.

Desempenho do grupo de controle nas verificações

0123456789

10

A B C D E F G H I J L M N O PAluno

Méd

ia d

as

verif

icaç

ões

Desempenho do grupo experimental nas verificações

0123456789

10

A B C D E F G H I J LAluno

Méd

ia d

as

verif

icaç

ões

Figura 12 - Desempenho do grupo de controle e do experimental

A média geral obtida pelo grupo de controle e pelo experimental nas verificações foi 5,8 e 6,0, respectivamente. A média da turma, ilustrada na figura 12 na forma de um traço horizontal, foi 5,9. No grupo de controle, apenas 33,3% dos alunos obtiveram média superior a da turma. No grupo experimental, este número ficou em 54,5%.

O bom desempenho dos alunos do grupo experimental não está tão diretamente associado ao grau de participação das atividades, conforme ilustra a figura 13. A figura apresenta o grau de participação de cada aluno do grupo experimental nas atividades realizadas através de correio

eletrônico, fóruns e bate-papos. Os alunos foram listados no gráfico em ordem decrescente de média obtida nas verificações. Como é possível observar, em geral, os alunos com participação média acima de 60% obtiveram médias superiores a 5,9. No entanto, o caso do aluno H mostra que embora tenha participado de 70% das atividades, sua média ficou abaixo de 5,9.

Participação do grupo experimental das atividades

0%10%20%30%40%50%60%70%80%90%

100%

G (7,6)

E (7,4)

F (6,7

)

B (6,5)

C (6,35

)

J (6,2

5)

H (5,45

)

I (5,20

)

A (5,0)

D (3,9)

L (0,0

)

Aluno (Média nas verificações)

Par

ticip

ação

Fóruns

Bate-papos

E-mails

Média das trêsatividades

Figura 13 - Relação participação nas atividades x notas obtidas

Os resultados apresentados acima são oriundos da análise quantitativa realizada com base nos resultados obtidos pelos alunos nas verificações e no número de interações realizadas pelos mesmos ao longo da disciplina. Atualmente está sendo desenvolvida a análise qualitativa onde tem-se procurado observar, caso a caso, como ocorreu a evolução do aprendizado ao longo da disciplina. Mesmo sem contar ainda com os resultados definitivos, algumas questões podem ser destacadas.

A experiência realizada permitiu constatar a necessidade de transformações mais efetivas na forma de desenvolver as habilidades do aluno. Conforme foi apresentado ao longo do artigo, o conteúdo foi desenvolvido em módulos que apresentam o assunto com a utilização de imagens, textos, animações e atividades variadas. No decorrer da disciplina, os alunos mostraram-se cansados com a metodologia utilizada. Acredita-se que trabalhar com projetos possa trazer maiores benefícios. Os projetos de trabalho na concepção de Hernandez [9,10] mudam a relação do aluno com o saber, do professor em relação ao aluno e a aquisição do conhecimento. A pesquisa no projeto de trabalho favorece o aluno a descobrir a realidade, a sua realidade.

A comunicação e o trabalho em grupo são aspectos do ensino a distância que precisam ser explorados. Na experiência realizada, teve-se dificuldade em manter constante o diálogo entre o professor e os alunos. Mesmo usando de artifícios como gincanas, os alunos não ficaram motivados e participaram pouco. As ferramentas disponíveis para trabalho em grupo, por sua vez, apresentam deficiências que impedem a realização de atividades mais elaboradas.

O acompanhamento a distância é outro ponto que precisa ser investigado. Algumas publicações abordam as estratégias de ensino e avaliação a serem aplicadas, para que se possa acompanhar remotamente o desempenho do aluno em ambientes de ensino via Internet [11,12]. Já existem ferramentas para suprir estes objetivos, mas a maioria possui recursos em demasia, desnecessários na maioria das vezes, e outros, muito importantes, foram esquecidos [13].

Referências Bibliográficas

[1] Dahmer, Alessandra; Gaspary, Luciano P.; Frozza, Rejane; et al. Ambiente Integrado de Apoio ao Ensino a Distância: Gerenciamento de Aulas, Tutores Inteligentes e Avaliação Remota. In proc. of Taller Internacional de Software Educativo, Santiago, Chile, 1999.

[2] Dahmer, Alessandra; Gaspary, Luciano P.; Frozza, Rejane; et al. Um Ambiente para Desenvolvimento de Ensino a Distância. Anais do Workshop Internacional sobre Educação Virtual, Fortaleza, Ceará, 1999.

[3] Shneider, Daniel; Block, Kayla. The World-Wide Web in Education. http://tecfa.unige.ch/tecfa/research/CMC/andrea95/andrea.txt.

[4] Gagné, R. The Conditions of Learning. 4th edition. Holt Rinehart, and Winston, New York.

[5] Hot Potatoes Home Page. http://web.uvic.ca/hrd/halfbaked/.

[6] Giraffa, Lucia M. Martins; VICCARI, Rosa Maria. Estratégias de Ensino em Sistemas Tutores Inteligentes Modelados através da Tecnologia de Agentes. Porto Alegre: Instituto de Informática da PUCRS, 1998.

[7] Viccari, Rosa Maria. Sistemas Tutores Inteligentes. Anais da Escola Regional de Informática – Região Sul. Blumenau, 1998.

[8] Konzen, Andréa Aparecida. Uma Estratégia de Ensino Híbrida para Sistemas Tutores Inteligentes. Santa Cruz do Sul: UNISC, 1999.

[9] Hernández, Fernando. Transgressão e Mudança na Educação: os Projetos de Trabalho. ArtMed, 1998.

[10] Hernández, Fernando; Ventura, Mont Serrat. A Organização do Currículo por Projetos de Trabalho: o Conhecimento é um Caleidoscópio, 5a edição. ArtMed, 1998.

[11] Behar, P.A. Psicologia Cognitiva & Aprendizagem Computadorizada. Porto Alegre: Instituto de Informática da UFRGS, 1992.

[12] Bercht, M. Ambientes de Ensino Inteligente: a avaliação pedagógica no apoio a modelagem e construção estratégicas de ensino na perspectiva de arquitetura de agentes. Porto Alegre: Instituto de Informática da UFRGS, 1997.

[13] Mccormack, C.; Jones, D. Building a Web Based Education System. John Wiley, 1998.