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UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO MARIA DAS GRAÇAS BEZERRA BARRETO A FORMAÇÃO CONTINUADA DE MATEMÁTICA DOS PROFESSORES DOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL E SEU IMPACTO NA PRÁTICA DE SALA DE AULA SÃO PAULO 2011

UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO … Nielce Meneguelo Lobo da Costa, Ruy Cesar Pietropaolo, Vera Helena Giusti de Souza, Maria Helena Palma de Oliveira e Veronica Yumi Kataoka

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UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO MARIA DAS GRAÇAS BEZERRA BARRETO

A FORMAÇÃO CONTINUADA DE MATEMÁTICA DOS PROFESSORES DOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL E

SEU IMPACTO NA PRÁTICA DE SALA DE AULA

SÃO PAULO 2011

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MARIA DAS GRAÇAS BEZERRA BARRETO MESTRADO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA

A FORMAÇÃO CONTINUADA DE MATEMÁTICA DOS PROFESSORES DOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL E

SEU IMPACTO NA PRÁTICA DE SALA DE AULA Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação da Universidade Bandeirante de São Paulo para a obtenção do título de Mestre em Educação Matemática. Orientador: Profª. Dra. Maria Elisabette Brisola Brito Prado.

SÃO PAULO 2011

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AUTORIZO A REPRODUÇÃO E DIVULGAÇÃO TOTAL OU PARCIAL DESTE TRABALHO, POR QUALQUER 

MEIO CONVENCIONAL OU ELETRÔNICO, PARA FINS DE ESTUDO E PESQUISA, DESDE QUE CITADA A 

FONTE. 

       

              

FICHA CATALOGRÁFICA 

 

 

Barreto, Maria das Graças Bezerra. A formação continuada de matemática dos professores dos anos iniciais do Ensino Fundamental e seu impacto na prática de sala de aula / Maria das Graças Bezerra Barreto. -- São Paulo: [s.n.], 2011. 194f.: il.; 30 cm. Monografia (Pós-Graduação) – Universidade Bandeirante de São Paulo, Curso de Educação Matemática. Orientadora: Profª. Dra. Maria Elisabette Brisola Brito Prado 1. Educação Matemática 2. Formação de Professores 3. Contagem I. Título.

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MARIA DAS GRAÇAS BEZERRA BARRETO

A FORMAÇÃO CONTINUADA DE MATEMÁTICA DOS PROFESSORES DOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL E

SEU IMPACTO NA PRÁTICA DE SALA DE AULA

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação da Universidade Bandeirante de São Paulo para a obtenção do título de

Mestre em Educação Matemática

_______________________________________________________ Profª. Dra. Maria Elisabette Brisola Brito Prado (Orientadora)

Universidade Bandeirante de São Paulo __________________________________________________________

Profª Dra. Maria Tereza Carneiro Soares (Membro Externo) Universidade Federal do Paraná

_________________________________________________________

Profª Dra. Angelica Fontoura Garcia Silva (Membro Interno) Universidade Bandeirante de São Paulo

Biblioteca

Bibliotecário: _____________________________________________

Assinatura: __________________________ Data: ___ / ___ / 2011

São Paulo, ___ de ________________ de 2011

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Ao meu amado e amigo Gustavo e aos meus queridos

filhos, Alessandro, Sheila, Marcelo e Vinicius, minhas

fontes de amor, compreensão e alegria.

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Agradecimentos

À Professora Maria Elisabette Brisola Brito Prado minha eterna gratidão pela sua dedicação, incentivo, exigência, paciência e carinho com que me ensinou e se tornou em pouco tempo uma grande amiga. Às Professoras Maria Tereza Carneiro Soares e Angelica Fontoura Garcia Silva pela dedicação na leitura e pelas valiosas sugestões oferecidas no exame de qualificação. Ao corpo docente do Programa de Estudos de Pós-Graduação em Educação Matemática, que contribuíram de alguma maneira para ampliar o meu aprendizado, sobretudo, Nielce Meneguelo Lobo da Costa, Ruy Cesar Pietropaolo, Vera Helena Giusti de Souza, Maria Helena Palma de Oliveira e Veronica Yumi Kataoka. À reitoria da Universidade Bandeirante de São Paulo pela bolsa que custeou parte desse trabalho. À amiga Suzete de Souza Borelli, companheira de estudos, trabalhos e incentivadora para a realização desta pesquisa. À grande amiga Ana Maria Gentil, companheira de estudos, pela leitura dedicada e sugestões carinhosas. À querida e grande amiga Marisa Silvestre Moura, amiga nos melhores e piores momentos da minha vida, que apesar de não concordar, respeita meus quereres, é e será sempre meu porto seguro. À Maria Isabel de Souza Santos, Diretora da Divisão de Orientação Técnica de São Miguel Paulista, por permitir a realização da pesquisa. Às Coordenadoras Pedagógicas, pela acolhida carinhosa e pela disposição em ajudar. Às queridas sete professoras, amigas e colaboradoras, peças-chave para o desenvolvimento desta pesquisa. Às amigas, Rosa, Silvana, Denise e Conceição, que me apoiaram direta e indiretamente. À Carmen Valéria de Andrade Barreto, pelo carinho a mim dispensado e competência com que revisou o texto. Aos meus pais João e Julia, mesmo ausentes, muito presentes na minha vida e no meu jeito de ser. À Tia Wilma, meus familiares e amigos, dos quais precisei me afastar para poder me dedicar integralmente ao mestrado.

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“Ando devagar porque já tive pressa e levo esse sorriso porque já chorei demais. Hoje me sinto mais forte, mais feliz, quem sabe só levo a certeza

de que muito pouco sei, ou nada sei. [..] Cada um de nós compõe a sua história

Cada ser em si carrega o dom de ser capaz e ser feliz”. (Almir Sater e Renato Teixeira)

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A Formação Continuada de Matemática dos professores dos anos iniciais do Ensino Fundamental e seu impacto na prática de sala de aula

RESUMO

Essa investigação teve como objetivo analisar os aspectos da Formação Continuada de Matemática de forma a compreender as relações dessa formação com os processos de mudança das práticas dos professores. Para esse fim, foi realizado um revisitar ao espaço da escola, com o propósito de identificar o que impulsiona o professor dos anos iniciais a superar suas dificuldades e/ou medos da Matemática e conseguir reconstruir sua prática. A pesquisa, de natureza qualitativa, foi realizada com sete professoras que ensinam Matemática em quatro escolas municipais de São Paulo. Para o levantamento de dados foram aplicados questionários e entrevistas semiestruturadas, utilizadas as narrativas sobre a trajetória profissional e os registros de acompanhamento e observação da prática e dos encontros de formação continuada ocorridos na escola. A investigação pautou-se em estudos teóricos centrados nos conceitos de Nóvoa, Imbernón, Ponte, Serrazina, Alarcão e Tardif que abordam, a formação continuada dos professores na perspectiva reflexiva de Schön e Zeichner, bem como as ideias de Shulman e Ball sobre o conhecimento do conteúdo matemático. Especificamente, foram enfatizadas as ideias de Vergnaud, Nunes e Bryant, Lerner e Sadovsky, Brizuela e Panizza sobre o ensino e a aprendizagem do Sistema Decimal de Numeração e o uso das estratégias de contagem por meio de problemas. Os resultados desta pesquisa confirmaram que as professoras foram mostrando de forma gradativa indícios de mudança no discurso e na prática, ampliando a compreensão de como se aprende e como se ensina Matemática. Foi possível constatar que a participação na formação propiciou uma prática diferenciada do anteriormente praticado, demonstrando estarem mais atentas com a aprendizagem dos alunos e preocupadas em investigar como eles pensam e sabem os conteúdos matemáticos. No processo de formação na escola ficou evidenciado que, para provocar mudanças, é preciso que o papel do formador adquira um novo aspecto, envolvendo saberes culturalmente abrangentes, apresentando domínio do conhecimento matemático, demonstrando facilidade em transitar pelos diferentes conhecimentos e reconhecendo as especificidades desse professor, um aprendiz, e ao mesmo tempo, um profissional prático. Nesse sentido, o formador deve assumir o papel de parceiro avançado, avanço em conhecimentos de Matemática, de Didática, de Psicologia, de Didática da Matemática e de Educação Matemática. Enfim, um formador que reconheça a formação como um palco onde os atores possam experienciar situações reais, desvelar seus saberes e se envolver com os prazeres das descobertas que os saberes matemáticos provocam uma dialogicidade entre o ensinar e o aprender. Palavras-chave: Educação Matemática. Formação de Professores. Sistema de Numeração Decimal. Contagem. Mudança nas Práticas.

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Mathematics Continuing Education for initial year’s teachers and its impact on classroom practices

ABSTRACT

This investigation aimed to examine aspects of the Mathematics Continuing Education for teachers in order to understand the relationship of this education with the process of changing teacher’s practices in public schools of São Paulo city, Brazil. Envisioning this, there was a revisit to the school space, in order to identify what drives the teacher of the initial years to overcome their difficulties and/or fears of mathematics and be able to reconstruct their practice. The research, qualitative in nature, was conducted with seven teachers who teach mathematics in the early years in four municipality schools. Questionnaires and semi-structured interviews were used to survey data, as well as the narratives of professional life and the records of observance of continuing education meetings, which took place in the school, and the following classroom practice. The research was based on theoretical studies focused on the concepts of Nóvoa, Imbernón, Ponte, Tardif, Serrazina and Alarcão which addresses on the continuing education for teachers in Schön and Zeichner's reflexive perspective, as well as Shulman and Ball's ideas about knowledge of the mathematical content. Specifically, we emphasize the ideas of Vergnaud, Nunes and Bryant, Lerner and Sadovsky, Panizza and Brizuela on teaching and learning decimal number system, as well as counting strategies through mathematical problems. The results confirmed that teachers did gradually change their classroom practices, widening their understanding of how to learn and teach mathematics. It was found that the continuing education provided an improved practice, a more attentive and investigative approach to the student’s way of thinking and knowing mathematics. In the meetings that took place at the school space, it did become evident that, to induce those changes, a new continuing education instructor complexion is needed. A complexion that shows mastery and easy transit in the midst of the mathematical knowledge and content, one that recognizes the dual nature of their pupil-teacher, being an apprentice and a functional professional at the same time. Thus, the continuing education instructor should take the role of an advanced partner, advanced in the mathematical knowledge, didactics, psychology, mathematical didactics, and mathematical education. Finally, an instructor who thinks of continuing education as a stage on which actors can experience real situations, to reveal their knowledge and engage with the pleasures of the discoveries that mathematical knowledge provokes, a dialogue between the teaching and learning. Keywords: Mathematics, continuing education, Problem solving, counting, practices  

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1: Conjunto de formas geométricas. Arranjo A. 76

Figura 2: Conjunto de formas geométricas. Arranjo B. 76

Figuras 3 e 4: Sondagem de números de março/2011 126

Figura 5: Detalhe da figura 6. Números coringa 127

Figura 6: Números coringa 128

Figura 7: Aluno C 129

Figura 8: Aluno D 129

Figura 9: Aluno E 129

Figura 10: Aluno F 129

Figuras 11 e 12: Contagem da Coleção de Tampinhas 134

Figuras 13 e 14: Tabela e gráfico da atividade “Eu sou assim...” 136

Figuras 15 e 16: Gráficos da atividade “Eu sou assim...” 136

Figura 17: Jogo de Trilha 138

Figura 18: Contagem de coleções fixas 139

Figuras 19 e 20: Representação pictórica e contagem na solução dos

problemas 148

Figura 21: Contagem na solução de problemas. Mãozinha. 149

Figuras 22 e 23: Contagem na solução de problemas com estrutura aditiva. 150

Figuras 24 e 25: Representação icônica na solução de problemas. 152

Figura 26: Movimento pendular entre os saberes. 164

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LISTA DE TABELAS E QUADROS

Quadro 1 CRONOGRAMA DE PESQUISA – DRE- SMP.................................... 97

Quadro 2 Perfil dos atores da formação.............................................................. 117

Quadro 3 Análise de sondagem de números de março/2011............................ 129

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SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO ................................................................................................................. 13 CAPÍTULO 1.......................................................................................................................... 16

HISTÓRIA DE UMA FORMAÇÃO ..................................................................................... 16 CAPÍTULO 2.......................................................................................................................... 24

PERGUNTAS QUE NÃO SE CALAM... ............................................................................ 24 CAPÍTULO 3.......................................................................................................................... 39

REFLEXÕES À LUZ DA TEORIA: SABERES DOS PROFESSORES QUE ENSINAM MATEMÁTICA ................................................................................................................... 39 3.1 NORMAL, MAGISTÉRIO OU PEDAGOGIA: ESPAÇO DE SER E FORMAR-SE PROFESSOR..................................................................................................................... 42 3.2 FORMAÇÃO CONTINUADA DE MATEMÁTICA: EXPLORAÇÃO E DESCOBERTAS50 3.3 PROBLEMAS A RESOLVER: CONTA, RECONTA, REVELA E DESVELA OS NÚMEROS ......................................................................................................................... 67

3.3.1 Da recitação à contagem: um resgate didático ..................................................... 73 3.3.2 Resolver Problemas: o conta e reconta................................................................. 78

CAPÍTULO 4.......................................................................................................................... 84 INVESTIGAÇÃO NA ESCOLA: UMA DINÂMICA DE AÇÃO E REFLEXÃO ................... 84 4.1 FORMAÇÃO CONTINUADA: UM DESPERTAR INVESTIGATIVO DA PRÁTICA DE SALA DE AULA.................................................................................................................. 85 4.2 LER E ESCREVER – CONHECENDO OS DOCUMENTOS OFICIAIS DE MATEMÁTICA.................................................................................................................... 89 4.3 PROJETO INTENSIVO NO CICLO I – PIC.................................................................. 90 4.4 GUIA DE PLANEJAMENTO E ORIENTAÇÕES DIDÁTICAS PARA O PROFESSOR DO 2º, 3º E 4º ANOS – CICLO I ........................................................................................ 91 4.6 CADERNOS DE APOIO E APRENDIZAGEM - MATEMÁTICA................................... 93 4.7 UM CAMINHO DE INDAGAÇÃO: FORMAR, OBSERVAR E TRANSFORMAR.......... 95 4.8 FORMAÇÃO NO ESPAÇO DE FORMAÇÃO – A ESCOLA ...................................... 100 4.9 NARRANDO CONVERSAS E HISTÓRIAS DE VIDA DE PROFESSORAS QUE ENSINAM MATEMÁTICA ................................................................................................ 101

CAPÍTULO 5........................................................................................................................ 118 ESCOLA - ESPAÇO DE FORMAÇÃO DA/PARA PRÁTICA.......................................... 118

CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................ 160 REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 167 ANEXOS .............................................................................................................................. 176

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APRESENTAÇÃO

 

Para melhor compreensão do caminho percorrido por esta pesquisadora, no

Capítulo 1 será encontrado um breve histórico de minha trajetória profissional como

professora de matemática e, posteriormente, como formadora de matemática para

professores que ensinam matemática nos anos iniciais do Ensino Fundamental.

Momentos diferentes, mas complementares, permitiram tecer minhas crenças e

consolidar minhas verdades no delinear de um caminho envolto por concepções e

valores. Tais momentos desencadearam reflexões e indagações que deram

propulsão e ritmo a esta investigação. No capítulo 2, elucidarei como as questões que brotavam em minha mente e

dinamizavam o meu pensar transformaram-se em objetivos norteadores de metas a

serem alcançadas. O sustentáculo da análise e da argumentação foram as

pesquisas mais significativas dos últimos tempos, que apresentavam uma

preocupação com os saberes matemáticos, a identidade, a trajetória profissional dos

professores que ensinam matemática, bem como a qualidade de sua formação

inicial e continuada com relação ao ensino desta disciplina. A constatação da falta

de pesquisadores matemáticos, que demonstrem interesse pela qualidade do ensino

de matemática realizado por estes professores, tornou-se um alerta de grande

importância a ser considerado pelo mundo acadêmico. Constatei também a

ausência de estudos envolvendo formação de formadores desses professores e

sobre o currículo de matemática que permeia o fazer do professor e o aprender

daqueles que, em um amanhã bem próximo, serão profissionais em nossa

sociedade. As pesquisas apresentadas fortaleceram a certeza de que o caminho

traçado era seguro e promissor sobre a importância de um estudo mais aprofundado

sobre a importância do Sistema de Numeração Decimal e da contagem imbricados

ao resolver problemas, e vice-versa, a importância de resolver problemas para

desvendar os segredos das leis que governam os números decimais. Este assunto

despertou o interesse de algumas investigações, mas parece ainda suscitar de muita

investigação na e da prática que estão ocorrendo nas escolas.

No capítulo 3, apresentarei o embasamento teórico que elucidou e delineou

meu caminho investigativo. Um universo de estudos e investigações acadêmicas

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das últimas décadas que colocaram-me diante de ideias e análises de Nóvoa, Tardif,

Schön, Imbernón, Ponte e Alarcão, autores que colaboraram para a análise objetiva

da prática do professor na escola, sua reflexão e sua formação. Para destacar a

importância da formação voltada para a realidade escolar e as práticas ali

estabelecidas, abrandei minha sede de saber nos estudos realizados de Serrazina,

Fiorentini, Nacarato e Pimenta. A análise subjetiva, que envolveu uma escuta atenta,

um olhar sensibilizado e relações acolhedoras, foi reforçada e justificada em

pensares filosóficos, estudos reflexivos e teorias advindas de Paulo Freire, Rubens

Alves, D’Ambrosio, Morin, Vergnaud, Nunes e Bryant, Lerner e Sandovsky,

Teberosky, Brizuela, Panizza, Moreno, Machado, Soares e Pinto, entre outros.

No capítulo 4, contarei os caminhos percorridos pela Formação Continuada

de Matemática para os professores dos anos iniciais do Ensino Fundamental da

DRE São Miguel Paulista, da Secretaria de Educação de São Paulo, com relação

aos saberes produzidos, aplicados e narrados pelos participantes. Envolveu também

o delinear da concepção que fundamenta os documentos oficiais utilizados por

esses professores. Esse processo desafiador e motivador despertaram nesta

formadora a curiosidade em saber como estavam as práticas de sete professoras

pertencentes a um dos grupos de formação continuada e deu a oportunidade para a

realização de uma formação continuada de matemática no ambiente escolar.

Formação essa que ocorreu durante os horários coletivos de estudos dos

professores, nos quais estavam as sete professoras envolvidas, e o desenrolar da

pesquisa abarcou observação de sala de aula e intervenção da

formadora/pesquisadora. Sobre a visita à escola narrarei os estudos de matemática

desencadeados pelas necessidades de cada grupo-escola, a organização das

atividades investigativas e as ações observadoras reflexivas sobre a prática.

No capítulo 5, trarei a análise do papel desempenhado e o caminho percorrido

por esta pesquisadora/formadora de professores. Foram momentos importantes de

análise e reflexão e a oportunidade de verificação na prática das teorias defendidas

com clamor pela formadora. Vivenciei papéis que se entrelaçam, difíceis de separar,

em um misturar e confundir. Para observar melhor esses papéis foi necessário um

afastamento sem contaminação, ação privilegiada da pesquisadora. Um afastar

temporário da formadora, atenta e desafiadora quando provoca e aprende com as

professoras e que, ao mesmo tempo, investiga quando observa e interpreta cada

passo dado por cada uma delas.

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Na conclusão final, será apresentado o resultado de minha pesquisa,

envolvendo não só as dificuldades, os desafios e as conquistas encontrados nas

práticas das sete mulheres, professoras que ensinam matemática nos diferentes

contextos, mas também retratarei as dúvidas que surgiram sobre essa inusitada

experiência que se mostrou, ao mesmo tempo, rica em dados e necessitada de

outros olhares investigativos e acolhedores.

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CAPÍTULO 1

HISTÓRIA DE UMA FORMAÇÃO

Esse capítulo apresenta um caminho repleto de crenças, saberes e diferentes

quereres que foram constituindo e sendo constituídos a cada observação, a cada

novo conhecimento. Este processo foi gradativamente evoluindo frente aos desafios

enfrentados, estudos do como ensinar matemática e como se dá o aprender

matemática, a cada novo conhecimento teórico-prático e, principalmente, do como

organizar um espaço de reflexão do/sobre o “fazer matemática” na sala de aula.

Este processo, que foi sendo desenhado com traços constituídos por erros e

acertos, alinhavado com incertezas, numa proporcionalidade muito maior que as

certezas, costurado com a agulha do acreditar que todos aprendem matemática e

transpassado pela linha da cor da luta por uma educação mais igualitária é que foi

urdindo a tessitura da minha trajetória profissional.

Desde 1990, venho realizando encontros de formação continuada de

professoras do Ensino Fundamental e Médio que ensinam matemática nas redes

públicas e particulares de várias cidades de São Paulo e de todo o Brasil.

Durante essa minha trajetória profissional, tenho encontrado professores dos

anos iniciais do Ensino Fundamental, denominado na Prefeitura de São Paulo de

Ciclo I. Estes professores, ao serem questionados sobre sua relação com a

Matemática declararam que, sem sombra de dúvida e sem titubear, não gostavam

dessa disciplina. Afirmaram também que a opção pelo Magistério ou Pedagogia

ocorreu para fugirem de suas garras, como se desconhecessem o fato de não só

terem que estudá-la e também ensiná-la a seus alunos.

Na busca de compreender essa aversão apresentada pelos professores e por

muitos alunos, tenho pesquisado que os motivos para essa relação conflituosa

provêm de diversos fatores. Segundo Davis e Hersh (1988), o fato de a Matemática

ser utilizada como filtro social para a seleção de alunos e profissionais pode ser um

dos motivos. Apontam a atitude contraditória do professor de Matemática dizendo

“para quem ama a Matemática, ensinar Matemática deveria ser uma festa”, (p.108) o

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que nos ajuda a compreender a postura de sedução pessoal e êxtase particular e

solitário de alguns professores frente à Matemática. Sem compartilhar esse

momento mágico com os alunos, abre-se um abismo na relação professor-

aprendizagem-aluno e colabora-se para que a maioria dos “alunos sintam pouca

atração pela Matemática” (p.108 ).

Por outro lado, Sztajn (2002) em um ato de recordação de seus professores,

faz referência a um em especial, bem humorado, que falava baixinho e quando

escrevia no quadro celebrava sua “festa matemática para um indivíduo apenas”.

Cobria-o “com exercícios, com demonstrações incríveis e com problemas que ele

decidia inventar ali na hora” (p. 17) e todos os conteúdos apresentados giravam em

torno da sua escolha, “criando novos eixos, reescrevendo as equações”. Este

parece ser um exemplo perfeito do modelo de professor de Matemática apontado

pela maioria dos professores dos anos iniciais. No entanto, podemos encontrar

também professores apaixonados por esta área de ensino, que mostram como os

conhecimentos da disciplina fazem parte do nosso cotidiano e até apresentam como

utilizá-los em aplicações mais complexas. Porém, esta atitude mais dinâmica parece

ainda ser insuficiente para proporcionar um ensino que ajude seus alunos a se

apropriar da linguagem matemática, utilizando-a para compreender e transformar a

realidade em que estão inseridos.

Apesar de encontrar diversos estudos e pesquisas sobre o processo de

ensinar e o processo de aprender Matemática, elas me levaram a refletir sobre “o como” a Matemática é ensinada nos anos iniciais. As múltiplas dificuldades e

lacunas do aprender do professor têm aprofundado cada vez mais o abismo de

incertezas no seu ensinar e reproduzem um grande vale de dúvidas no seu

aprender, verbalizada e demonstrada durante as formações.

Será que a lacuna deixada permite que se perpetue o privilégio atribuído a

algumas pessoas serem consideradas como “as escolhidas” por gostarem e

compreenderem com certa facilidade alguns conteúdos matemáticos? São esses

indivíduos “especiais” que acabam sendo definidos socialmente como “sábios” ou

“os melhores”, título validado pelo ensino de muitos professores especializados

nesta área de conhecimento e pelo uso como filtro social das avaliações

classificatórias em seleções muito concorridas.

O desabafo dos professores que ensinam matemática nos anos iniciais tem

repercutido em forma de eco no contexto dos encontros de formação em que atuei e

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atuo. O depoimento desses professores tornou-se a alavanca impulsionadora do

meu refletir e da busca por novos estudos e caminhos alternativos que

colaborassem com eles para a apropriação dos conteúdos a serem ensinados e a

compreensão da trajetória percorrida por cada aluno em sua aprendizagem.

Considero esta busca mais um desafio que vem se somar a outros que tive

em minha vida pessoal e profissional: trilhei diferentes caminhos, enfrentei

obstáculos, estudei e levantei hipóteses e busquei soluções possíveis de serem

colocadas em prática.

Em 1985, fui eleita coordenadora pedagógica de uma escola municipal de

São Paulo, onde eu exercia até aquele momento o papel de professor de

Matemática. Já nessa época, buscava grupos de formação e estudos que

trouxessem reflexões sobre abordagens diferenciadas para ajudar o aluno a

aprender Matemática, principalmente aqueles que tinham muitas dificuldades. Ao

lidar com alunos que guardavam na memória um caminho de insucesso e

frustrações matemáticas veio a certeza do quanto a minha formação inicial havia

sido precária. Eu me sentia à deriva frente a tantas dificuldades encontradas na

minha prática de sala de aula. Tinha de lidar diariamente com as diferenças de

conhecimento apresentadas pelos alunos, as convicções do desconhecimento e a

consciência intensificada pelo discurso – “você nunca vai saber fazer, pois não faz

nada certo”, ouvido no decorrer dos anos de escolaridade, e também as frustrações

envolvidas pelo cansaço ao lidar com o mito historicamente constituído que abrange

o acertar e o errar nas aulas de matemática.

Essa provocação causada pelo caos pedagógico encontrado na escola

particular e pública possuía uma temporalidade especial, movimentando-se em um

tempo que desconhecia lentidão, que desconhecia passividade, acomodação. Um

tempo que exigia decisões rápidas, novos valores, novas parcerias para novos

estudos que permitiram um mergulho nos mistérios que a Matemática encerra e o

construir de uma nova estrada na qual ela pudesse ser apresentada aos alunos de

uma forma mais agradável, clara, inteligível e palpável. Um ensinar que dialogasse

com o aprender dos alunos, um verdadeiro processo dialógico.

Em 1990, participei de uma seleção no Núcleo de Ação Educativa – NAE 2,

zona norte da cidade de São Paulo, para exercer, em caráter comissionado, a

função de supervisora de ensino. Nessa ocasião, também tive o prazer de participar

de um grupo de estudo de professores que tinha como tarefa implantar o Projeto de

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Interdisciplinaridade nas unidades daquela região. Esse grupo participava de

encontros semanais na Divisão de Orientação Técnica – DOT - Ensino

Fundamental, para estudar e discutir a formação matemática dos professores do

município de São Paulo. O grupo teve a orientação do então Secretário da

Educação na época, o ilustre Prof. Paulo Freire, em encontros mensais. Foi uma

experiência única, reflexiva, dialógica.

Após alguns anos, pude compreender o verdadeiro sentido da palavra

dialogicidade, ao ouvir embevecida o Prof. Paulo Freire (1990) envolvido por uma

cálida serenidade ao falar, que lhe era peculiar, e pela segurança de um mestre que

pratica com seus discípulos a teoria que defende. Ele explicava pausadamente,

mastigando cada palavra: “É o diálogo onde os dois lados sabem ouvir e estão

dispostos a falar”. É um momento de cumplicidade, no qual cada um se envolve

numa escuta disposta a compreender o que o outro está falando. O saber ouvir

implica momentos intermediários de silêncio, sem pressa, sem atropelo. O saber

falar envolve a compreensão do poder de silenciar, da intenção de complementação,

de ampliação. Muitas vezes, concluía a conversa afirmando convicto que era a favor

“do sonho, da utopia, da liberdade de quem recusa a acomodação e não deixa

morrer o gosto de ser gente”. Esta experiência marcou profundamente o meu gosto

de “ser gente” que lida com gente, que muitas vezes calou a fala do outro, pois

assim era mais fácil se impor, e que, a partir daquele momento, aprendeu a ouvir e a

degustar o silêncio para poder falar.

Em 1996, recebi um convite para trabalhar na DOT – Ensino Fundamental

para atuar na formação continuada de professores e participar da elaboração de

documentos curriculares que norteariam o trabalho nas escolas da rede municipal da

cidade de São Paulo.

Em 2005, ao me aposentar, dei continuidade ao trabalho que fazia na

elaboração de material de Matemática, que compunha o Programa Ler e Escrever Prioridade na Escola Municipal1.

A Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, desde 2007, vem

apresentando, em seu projeto de ação para implementar este Programa, momentos

pontuais de formação continuada para os professores de Ensino Fundamental Ciclo                                                             1 Programa Ler e Escrever Prioridade na Escola Municipal é um conjunto de livros destinados aos anos iniciais do Ensino Fundamental, intitulados Guias de Planejamento e Orientações Didáticas para o professor de 2º, 3º e 4º anos e o Projeto Intensivo do Professor no Ciclo I, para alunos e professores dos 3º e 4º Anos.

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I, nas áreas de Matemática e Língua Portuguesa. Este projeto envolveu encontros

de Formação Continuada de Professores que ensinam Matemática e Coordenadores

Pedagógicos e fui formadora em duas Diretorias Regionais de Educação - DRE (São

Miguel Paulista e Penha). Os percursos compartilhados nos encontros de formação

de professores da DRE São Miguel Paulista deram origem ao contexto da minha

pesquisa. Durante dois anos, fui formadora no Projeto de Formação Continuada, no qual

pude observar que, quando ela ocorre de forma centralizada envolvendo uma maior

abrangência de escolas, é muito mais difícil obter um conhecimento real do impacto

ou da mudança de postura do professor na prática de sala de aula. Pensar uma

formação que atenda a necessidades dos professores com relação à área de

conhecimento e, ao mesmo tempo, garantir uma nova postura na sala de aula eram

grandes desafios a serem vencidos a cada término dos encontros.

O fato era que a exigência de um relatório escrito, reflexivo no qual

esperávamos que seriam descritos todos os momentos do processo de ensino e de

aprendizagem, os diferentes procedimentos apresentados por alguns alunos, os

“erros” apontados por outros no entanto, não cumpria sua função. O relatório

produzido era simples, básico, sem muitos detalhes ou descrições. Ao lê-los, não

conseguia apascentar os devaneios que instigavam a minha curiosidade a respeito

do que havia acontecido na sala de aula de cada uma daquelas professoras: “De

que maneira foram realizadas as atividades propostas?”, “Como a professora

organizou e planejou a aula?”, “Quais consignas foram pensadas?”, “Que

intervenções foram praticadas?”, “Em quais momentos?”.

Essas questões provocavam novas inquirições silenciosas e reflexivas acerca

do caminho, sobre o “como” a formação deveria transcorrer, a fim de sensibilizar o

professor a valorizar cada vez mais os caminhos preciosos de sua prática. Como

muni-lo para que pudesse se sentir capaz de perceber e interpretar o pensar, o

fazer, o agir e reagir, o falar e o silenciar dos alunos? Como transformar seu olhar e

seu ouvir para que estejam atentos e esta atenção facilite o registro de cada

movimento, de cada descoberta e de cada fala ocorrida neste espaço precioso e

produtivo, a sala de aula.

Como as questões não encontravam respostas nos relatos e relatórios,

continuam a “pulular” em minha mente novas indagações: “Como posso conquistar-

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lhes a confiança para que possam vencer as dificuldades e a vergonha de se despir

pedagogicamente e relatar oralmente e por escrito aulas reais de matemática?”.

Nas reuniões de organização e estudo na DOT, ocorriam discussões muito

interessantes sobre essas questões, mas não suficientes para provocar avanço. A

metodologia do projeto propunha reflexão e vivência pelo professor dos diferentes

momentos de sala de aula. Inicialmente realizavam sequências de atividades nas

quais o seu pensar e fazer a matemática eram colocados em evidência.

Posteriormente, refletiam em grupo sobre cada dificuldade apresentada e,

finalmente, era feito o fechamento com a apresentação dos estudos mais recentes

sobre os procedimentos e intervenções necessários para uma aprendizagem mais

consciente.

As questões e as reflexões sobre o caminho percorrido permeavam os

encontros como se fossem nimbos ou nuvens escuras prestes a se desmanchar em

chuvas. Isso ocorria, embora os professores, durante a formação, estivessem sendo

levados a apurar seus olhares para que percebessem e aproveitassem todos os

momentos relevantes durante a realização das atividades pelos alunos e

convencidos a observarem atentamente o desempenho de cada aluno no grupo

durante a circulação pela sala de aula.

No decorrer dos encontros, os professores cada vez mais narravam

oralmente com entusiasmo as diferentes soluções apresentadas pelos alunos para

uma determinada situação-problema, mas continuavam a esconder suas

dificuldades, a camuflar seus medos, a disfarçar suas inseguranças e receavam,

ainda, explicitar suas dúvidas.

O silêncio recaía sobre suas posturas. Muitas vezes, sua presença no

encontro de formação era silenciosa e pouco participativa.

Tanto nas falas dos grupos durante a realização das tarefas e, muitas vezes,

na ausência de vozes frente aos questionamentos propostos, era possível perceber

as falhas advindas da formação inicial. Elas eram explicitadas, muitas vezes,

durante a conceituação dos conteúdos ou nos procedimentos apresentados como

solução e certamente compreendidos de forma inadequada.

Esta lacuna é um fator preponderante que acentua as dificuldades no ensino

de muitos dos conteúdos de Matemática, principalmente nos procedimentos

utilizados para resolverem problemas. Dificuldade essa que se sobressaía tanto

durante a realização das atividades no decorrer da formação, quanto nas aplicações

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em sala de aula das atividades sugeridas como tarefas que, no encontro seguinte,

deveriam ser trazidas e compartilhadas no grupo durante as reflexões.

No momento de retomada da “teoria aplicada à prática” eu percebia muitas

vezes que as tarefas acabavam sendo encaminhadas de forma inadequada, e não

atingiam os objetivos propostos. Este fato fez ressurgir novas dúvidas a respeito dos

encaminhamentos realizados durante as atividades em sala de aula e sobre a

validade das tarefas propostas durante a formação.

Dando margem a novas ponderações, surgiu um questionamento: as

dificuldades, dúvidas e incertezas desses professores teriam origem na história de

cada um, com relação à Formação de Matemática durante a Educação Básica e

nos cursos de Pedagogia e/ou na ausência de discussões conjuntas sobre a

disciplina em questão no espaço escolar? Seriam esses fatores motivos

preponderantes na redução da quantidade de aulas de Matemática apresentados na

rotina da sala de aula, principalmente nos anos iniciais do Ensino Fundamental?

Essa situação também foi constatada por Serrazina (2009)2: os professores

participantes dos encontros de formação coordenados por ela deixavam fora de sua

sala de aula o resultado das reflexões realizadas sobre o ensinar matemática

baseado em estudos inovadores. Os professores que participaram da formação só

voltavam a procurá-la, ou se interessavam pelos procedimentos que exploravam a

forma de ver, pensar e calcular dos alunos através de boas atividades, quando seus

alunos iam participar de avaliações institucionais onde seriam checados os

procedimentos e saberes de cada um.

A professora Serrazina enfatizou que alguns professores, muitas vezes,

participavam da formação continuada apenas para ampliar seu conhecimento, mas

não tinham nenhuma intenção de transformar a própria prática. Afirmou confiante

que, para que isso ocorra, há necessidade de se rever o formato da formação para

proporcionar a real transformação das práticas pedagógicas.

Frente a este panorama, meu trabalho foi o de formar, observar e interagir

com um grupo de sete professoras que ensinam Matemática nos anos iniciais, que

atuam em quatro escolas sob a jurisdição da DRE São Miguel Paulista. Este material

deu corpo, forma e nuance a minha pesquisa.                                                             2 Durante a apresentação da palestra feita no Programa de Pós Graduação em Educação Matemática da UNIBAN, em novembro de 2009, no II SIEMAT – Seminário Internacional de Educação Matemática. A professora Serrazina coordena um trabalho de formação em Portugal, com ênfase no desenvolvimento profissional de professoras de Matemática atuando nas séries iniciais.

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MINHAS INDAGAÇÕES

A partir dessas considerações, surgem várias dúvidas que não se calam e

precisam ser respondidas com relação ao trabalho de sala de aula do professor que

ensina Matemática nos anos iniciais. Esclarecer os motivos que levam o professor a

buscar novos conhecimentos e novos caminhos para melhorar seu desempenho e o

do aluno na sala de aula é essencial:

• Será que a superação do professor que ousa no fazer está relacionada à

insatisfação com a própria prática e/ou com os resultados de

aprendizagem?

• Esta insatisfação seria a alavanca que o impulsiona a buscar a formação?

• A mudança na forma de ensinar reflete na aprendizagem do aluno?

• Maior conhecimento da área influencia na aceitação da mudança na

prática?

• Diante de novas dificuldades, o professor retornará a algumas antigas

práticas?

Apesar das perguntas serem amplas cercearam meu universo investigativo

como pano de fundo e balizaram os caminhos traçados para elucidar a seguinte

questão:

• Quais aspectos da Formação Continuada de Matemática contribuem para a

compreensão das relações dessa formação com os processos de mudança

das práticas dos professores participantes?

É nesse contexto que está ocorrendo um revisitar ao espaço de formação,

para que seja possível fazer uma releitura desse processo e acompanhamento da

relação teoria-prática presente em sala de aula.

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CAPÍTULO 2

PERGUNTAS QUE NÃO SE CALAM... Neste capítulo, as perguntas que estimulam o meu pensar e fazer motivaram

a busca por teorias que pudessem ajudar-me a compreendê-las e transformaram-se

em objetivos que nortearam e norteiam o meu estudo e minha pesquisa.

Algumas das questões serão respondidas sob a luz da teoria e muitas outras

pelas observações e análises advindas do contato direto com os professores

participantes no decorrer dos nossos diálogos, numa escuta atenta e observação

sensível as suas ansiedades, conflitos, verdades e mudanças. Falas preciosas que

foram consideradas por esta pesquisadora como o aclamar de vozes estrondosas ou

silenciosas, repletas de verdades ou pedidos de ajuda, clamores tão pouco ouvidos

e valorizados pelas pesquisas.

No meu garimpar teórico tenho encontrado muitos estudos e investigações

acadêmicas, nas últimas décadas, cuja preocupação tem sido a formação de

professores e principalmente, a Formação de Professores que ensinam Matemática.

Pesquisas com reflexões e constatações valiosas, subsídios importantes que

direcionaram o meu foco para a formação do professor que ensina Matemática nos

anos iniciais. Esse professor, é considerado “polivalente” por alguns estudiosos,

talvez por ter a responsabilidade de desempenhar diferentes tarefas sem a

compreensão de sua totalidade. Professor polivalente, segundo os estudos de Lima

(2007), são “sujeitos capazes” de ensinar as diferentes áreas do conhecimento que

compõem o currículo nacional e também “apropriar-se de valores inerentes ao ato

de ensinar crianças pequenas”, interagir e comunicar-se qualitativamente bem com

os educandos” (p.65). Enfim, cabe-lhes a responsabilidade de ensinar todas as

áreas do conhecimento sem serem especializados em nenhuma.

A formação inicial tem oferecido a esse professor conhecimento superficial

sobre todas as áreas, mesmo assim, ele consegue superar suas dificuldades e

ensinar os diferentes assuntos, inclusive utilizando diferentes linguagens. Nessa

complexidade de conceitos e princípios a ser ensinado, um muro se ergue - a

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Matemática, tratada muitas vezes com excessivo cuidado e cautela, adiada o quanto

for possível, e se puder, até evitada.

Pesquisadores acadêmicos sensibilizados com esse problema têm apurado

seus ouvidos ao clamor dos professores e demonstrado uma preocupação com as

formações e saberes dos docentes que ensinam matemática nos anos iniciais do

Ensino Fundamental.

Com relação a esse assunto encontramos em Nacarato e Paiva (2008) um

convite empolgado aos pesquisadores de Educação Matemática e a evidência da

condição real dos “professores que ensinam matemática”, termo utilizado pelos

educadores matemáticos, para se referirem aos professores polivalentes – aqueles

que ensinam matemática nos anos iniciais. Segundo as autoras, os professores que

ensinam matemática “vêm merecendo pouca atenção dos pesquisadores da área, o

que se nota pelo pequeno número de pesquisas voltadas a esses profissionais”

(p.20).

Essas estudiosas ressaltam ainda a necessidade do olhar acadêmico para a

formação de matemática desses professores e para suas condições de trabalho,

bem como para a formação do formador de professores, seja na formação inicial ou

continuada.

Com relação a essa preocupação, considero Serrazina (1999) a porta-voz do

meu pensar ao alertar sobre a necessidade de investigações contextualizadas. Esta

autora declara que: são necessários mais estudos sobre os professores do 1º ciclo na sua faceta de professores de Matemática, quer no nível da formação inicial quer da formação contínua. Por outro lado, devem ser realizadas investigações que relacionem o conhecimento dos professores com o contexto escolar e a aprendizagem dos alunos”. (SERRAZINA, 1999, p. 126)

Investigações que aconteçam na escola permitindo ao formador/pesquisador

uma leitura da realidade do contexto escolar, repleto de elementos objetivos e

subjetivos, cuja especificidade exige uma postura do investigador mais próxima dos

parceiros e atores da escola.

Para isso, os cursos de formação inicial de professores dos primeiros anos do

Ensino Fundamental precisam ter olhar perscrutador para seus currículos e

direcionar o holofote para a ação investigativa – o estágio, ponte que interliga o

aluno – futuro professor – um investigador/observador e os atores que compõem a

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realidade do contexto escolar. Trata-se de um processo recursivo e dinâmico que

valoriza o observar e ser observado, o aprender e ensinar, o compartilhar estudos e

o estudar com/no coletivo da escola propiciando uma parceria reflexiva e produtiva

entre as partes envolvidas: instituição – futuro professor – professores e equipe

escolar.

Há necessidade de se ressaltar também a importância de uma proposta

pedagógica bem estruturada e bem desenvolvida, nos cursos de Magistério e de

Pedagogia, para a formação dos futuros professores dos anos iniciais do Ensino

Fundamental. Esses, além de dominar a metodologia do ensino da Matemática,

precisam também conhecer com profundidade os conceitos e procedimentos

básicos desta disciplina para uma atuação mais segura, eficaz e envolvente.

Os conhecimentos matemáticos abordados no curso de Pedagogia foram

objeto de estudo de Mello (2008). Ao analisar as ementas dos cursos de Pedagogia,

a pesquisadora percebeu que a maioria delas priorizava as questões metodológicas

do ensino de Matemática, como essenciais para a formação do professor dos anos

iniciais. Diante desse fato e com o propósito de verificação e aprofundamento,

escolheu, como estudo de caso, um curso que apresentava a disciplina Metodologia

do Ensino Fundamental II: Matemática e Ciências. Após análise, enfatiza

conclusivamente que: para haver um adequado ensino de Matemática nos anos iniciais, é preciso que o curso de formação inicial ofereça oportunidades para consolidar e aprofundar [...] o conhecimento dos conteúdos matemáticos, didáticos desses conteúdos e conhecimento do currículo de matemática. Além disso, desenvolver atividades práticas que possam levar aos professores a reflexão e teorias que as fundamentem [...] devem levar em conta as experiências anteriores dos professores e favorecer a discussão e reflexão de sua própria experiência, para que o ensino e a aprendizagem de matemática sejam significativos. (MELLO, 2008, p.103)

Após o estudo realizado, a autora assegura que não pode afirmar se os

alunos do curso analisado saem munidos de um conhecimento matemático com

fundamentação suficiente e sólida que possibilite se tornarem bons professores

“ensinadores” de Matemática.

Como podemos perceber, muitas dúvidas pairam ao derredor da Formação

de Matemática. Reflexões e discussões têm sido realizadas sobre os saberes de

Matemática mais adequados que devam compor o currículo oferecido nas

formações inicial e continuada e sobre as práticas eficientes de sala de aula, um

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conhecimento que vem constituindo e tem constituído a prática atual dos

professores atuantes em nossas escolas públicas e particulares.

No entanto, é na formação continuada que deveríamos fincar nossa bandeira

branca que, ao ser agitada, trouxesse a todos os envolvidos uma tranquilidade e

confiança dos saberes. Que acionasse o impulso para enfrentar as dificuldades e as

diversidades da sala de aula, bem como a segurança do fazer ao ensinar

matemática. Ela deveria representar a propulsão dos “quereres”, das curiosidades,

das descobertas, dos diálogos abertos, das investigações de novos conhecimentos

e de novas metodologias, das práticas reflexivas que subsidiassem fazeres que

deixassem marcas profundas nos educandos, vistos como ser integral e dos

“gostares” em sonhar e conviver com o diferente.

Com base nessas reflexões e em estudos realizados, essa investigação tem

como objetivo principal analisar a Formação Continuada de Matemática de forma a

compreender as relações dessa formação com os processos de mudança das

práticas dos professores participantes.

Dentro desse amplo cenário investigativo focarei a lente para o propósito de

identificar o que impulsiona o professor dos anos iniciais a superar suas dificuldades

e/ou medos da Matemática e conseguir reconstruir sua prática.

Encontrei nos estudos de Esteves (2007), considerações que dialogam com

as minhas observações enquanto formadora, a constatação da precariedade do

conhecimento matemático dos professores e de sua prática, que fizeram parte de

sua investigação, no qual conclui: sem a contribuição dos cursos de formação, tanto inicial como continuada, os professores não aprofundam nem ampliam seus conhecimentos matemáticos, por isso, muitas vezes, buscam em suas experiências como alunos os alicerces para esse ensino, como observado em nossa investigação (ESTEVES, 2007, p. 127).

A metodologia adotada por seus professores, na época em que foram alunos,

acaba sendo o modelo fundante3 às suas dificuldades e incertezas e que revela

marcas antigas deixadas pelas compreensões ou incompreensões matemáticas e

constituindo-se em alicerces a sustentar o ensino dos conteúdos pouco dominados

ou nunca aprendidos.

Muitas vezes, esses alicerces didáticos têm como subsídio vivenciar o ensino

sob um foco tradicional e elaborar compreensões inadequadas de conceitos                                                             3 Fundante utilizado no sentido de fundir, moldar.

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matemáticos importantes para sua prática. Os professores carregam histórias

recheadas de incertezas e inseguranças e as revelam quando são colocados diante

de desafios que vão além de suas possibilidades e compreensão. Igualmente fazem

histórias, as de seus alunos que, como as suas, explicitam frustração e desânimo

frente às escolhas pedagógicas do fazer e impotência diante do “não-fazer”.

Os dilemas enfrentados pelos professores muitas vezes interferem nas

tomadas de decisões ou intervenções diante das dificuldades apresentadas pelos

alunos, no que se refere ao caminho a ser percorrido ou durante a elaboração de

atividades complementares a serem aplicadas. Estas mesmas situações foram

percebidas em professores no início de carreira investigadas por Silva (2009) que

constatou o que eles apontam como dificuldade: “recriar exercícios”, mas o que mais chamou a atenção foi com relação à didática do ensino da matemática que, de uma maneira ou de outra, a maioria dos sujeitos aponta como dificuldade. Em relação ao conteúdo de Matemática, que os professores tiveram em seu curso de Pedagogia ou Magistério a maioria cita que não tem lembrança do conteúdo trabalhado ou quando se lembra, diz que aplica a atividade, mas não percebe sucesso (SILVA, 2009, p. 122)

O que foi percebido nas formações continuadas é que esses dilemas e

dificuldades não afligem apenas os professores no início de carreira, mas se

perpetuam pelo fazer profissional em muitos professores que já exercem a profissão

há algum tempo.

As lacunas deixadas pela formação inicial e percebidas no conhecimento

matemático do professor que ensina matemática foram motivos de reflexão e

investigação realizadas também por Pinto (2010), que afirma serem professores sem

a formação específica carregando a grande responsabilidade de ensiná-la. Após

análise, assegura que: as lacunas no processo formativo colocam os futuros professores diante do desafio de ensinar conteúdos específicos, sem o devido preparo. Como não recebem uma base sólida de conhecimentos, as concepções sobre a Matemática e sua prática de ensino ficam comprometidas para a atuação em sala de aula (PINTO, 2010, p.27)

Sala de aula, espaço privilegiado que favorece a percepção do imediato

ocorrido, das descobertas do professor e do aluno, da opção de novos caminhos e

do desabrochar de novas teorias. Na observação atenta desse ambiente privilegiado

se constituirá mais um objetivo, com um olhar minucioso, com um “zoom” mais

específico que balizará o meu foco ao buscar compreender a mudança na prática

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dos professores. Neste caso, especificamente, o trabalho com problemas,

compreendendo a organização do sistema de numeração decimal e as estratégias

de contagem.

Resolver problemas foi tema bastante explorado e discutido no decorrer das

formações de Matemática, coordenadas por mim. Este tema atendeu as

expectativas da maioria dos professores participantes, pelo fato de gerar muitas

dúvidas e desencadear muitas dificuldades.

Propor um problema envolve desafiar o sujeito a compreender o enunciado,

colocar em prática seus conhecimentos matemáticos relacionados com o enunciado

e fazer escolhas. Para os professores, a causa das dificuldades dos alunos está

vinculada a um único problema: o não saber ler, logo não saber interpretar. Panizza

(2006) refuta esses argumentos quando alega que, com frequência, “se costuma

atribuir a dificuldade dos alunos na interpretação de enunciados a problemas de

‘leitura compreensiva’, como se a compreensão de textos matemáticos fosse uma

‘aplicação’ de uma capacidade geral de leitura” (p.28).

Ler matematicamente envolve a compreensão de um sistema simbólico,

motivo pelo qual optei por investigar a organização do sistema numérico e de seu

funcionamento. A partir daí, delinear um percurso que vai da compreensão das

regras à busca de regularidades para compreender as funções dos diferentes tipos

de números visando quantificar aspectos da realidade e, principalmente, utilizar a

contagem.

Proponho, nas formações, que uma boa prática de Matemática deve trabalhar

com problemas. Partindo dessa premissa, o professor estará propiciando a

construção de diferentes conhecimentos matemáticos (não lineares), favorecendo a

compreensão e a interpretação das relações matemáticas contidas nos enunciados

e despertando a autoconfiança para escolher os cálculos e procedimentos mais

adequados a serem realizados.

Para transformar a prática matemática em uma ação mais envolvente, ao

invés do reforço da já praticada, busquei conhecê-las com mais profundidade, bem

como a qualidade das formações que as produziram ou efetivaram.

Durante o acompanhamento dos profissionais de uma escola pública, Bertucci

(2010), com o propósito de compreender as necessidades formativas e o

desenvolvimento das práticas de aprender e de ensinar matemática, constatou

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sinais profundos deixados pela matemática nos saberes dos professores que

ensinam matemática, como sendo marcas do tempo de estudante, sendo a maioria negativa em face das experiências que tiveram; por isso, geralmente, não gostam de Matemática. O agravante para o enfrentamento desse desafio é que a maioria dos professores que opta por cursar Pedagogia, e antigamente o Magistério, o fazem por fuga da área de exatas, da Matemática. E, após sua formação, tem que lidar com o ensino desta disciplina. (BERTUCCI, 2010, p. 149)

Nesse sentido, ressalta a necessidade dos responsáveis pelos cursos de

formação inicial, a Pedagogia, revisarem suas propostas com relação à formação do

professor e do gestor e incluírem saberes dos conteúdos matemáticos como objetos

de ensino e de aprendizagem na escola e não apenas suas metodologias.

Apesar de alguns professores mostrarem-se interessados em participar

continuadamente de formação, a autora verificou que “são poucas as oportunidades

de formação na área do ensino de Matemática para os professores que a ensinam

nas séries iniciais” (p. 150). Bertucci acredita e defende que uma prática

diferenciada de formação continuada pode acontecer na escola. Uma escola que

propicie um ambiente formador em seus horários coletivos, mantendo uma relação

diferenciada entre gestores atentos e comprometidos com o ensinar e o aprender e

a universidade. Prática esta ainda não reconhecida e valorizada pelas políticas

públicas. Finalmente, afirma que, a prática pode ser vista como alavanca inicial e

meta final de reflexão, uma responsabilidade de todos os atores da escola:

professores, alunos e gestores. Mas o papel principal cabe à intervenção, que

deverá ser balizada pela teoria, pela reflexão, pelo estudo e pela análise. Somente

assim será possível aportar em um ensino de qualidade e obter um retorno

qualificado, diferenciado e transformador dessa prática e dos sujeitos que a

praticam.

A intervenção gera, na sala de aula, momentos de dúvidas e tensão. Saber o

momento adequado de intervir para que o aluno aprenda e, ainda melhor, saber o

como intervir são questões que pairam sem muitas assertivas advindas do professor.

Em Machado (2009), encontrei reflexões importantes a respeito da

necessidade de uma proposta de formação continuada para professores que

ensinam matemática que ressalte a identidade, valorize a prática, considere seus

anseios diante da formação e construa competências para transformá-los em um

Educador Matemático. Após análise dos dados pesquisados, garante que “a

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formação continuada é um processo primordial para a profissionalização do

professor. É através dela que o professor passa a ser autônomo, reflexivo e crítico”

(p.84). Afirma que, para que ocorra essa transformação profissional, deve ser

oferecida efetivamente uma proposta pedagógica elaborada coletivamente que

ajude a superar as dificuldades da prática de ensinar matemática e mobilizar

saberes teóricos e práticos. A autora conclui que: formar-se professora é estar em busca do reencantamento da educação por meio de momentos para reflexão sobre a sua prática. Esse reencantamento surgirá sempre em um processo de formação continuada. É nesse momento que o professor que ensina matemática passa a se sentir educador em matemática. O reconhecimento da importância de um processo de formação continuada que [...] possa mostrar ao professor que ensina matemática nas séries iniciais uma matemática com significado e não como um apanhado de regras e técnicas. (MACHADO, 2009, p.85)

O “reencantamento da educação”, retratado pelo autor, convida-nos a refletir

e relembrar os encantamentos despertados pela quimera de “Ser Professor”,

disseminada durante a formação inicial, Escola Normal/Magistério ou Pedagogia.

Tornar-se intelectualmente competente para sermos capazes de determinar o que o

outro deveria aprender e podermos definir futuros repletos de alegrias e realizações.

Porém, muitas vezes, esse processo acaba se transformando em um amontoado de

fracassos e medos. Incutiram em nossas mentes estudantis que o “gostar”

despertado pelo “querer” e temperados pela “curiosidade” de novos conhecimentos,

colocados na forma do “bem” planejado, fariam de cada um de nós - futuros

professores - excelentes e competentes profissionais.

No entanto, ao ir para a sala de aula a realidade se apresentava distinta, bem

mais dura. A prática diária tornava-se, a cada etapa, uma sucessão de desencontros

e desencantos. Um descerrar lento, em doses homeopáticas, da verdade nua e

crua: o quão difícil era e é ensinar. Um ensinar dialogando com o aprender.

Apesar das técnicas aprendidas e praticadas, cada batalha perdida era como

um “anulador” das vitórias e conquistas adquiridas. O cotidiano praticado embotava

a paixão germinada no início de carreira, como um extirpar dos brotos tímidos de

cada fazer e transformava-o em um ensinar que frustrava a tão procurada

competência profissional e amargurava os envolvidos nesse processo - professor e

aluno - provocando desilusão e desgostos.

A motivação inicial apagava-se e o praticado afastava-se pouco a pouco do

diferente, da audácia, da investigação, do diálogo, do acreditar no outro e em si

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mesmo. O praticado se contentava em fazer igual, em disseminar modelos sem o

compromisso de aprender com alegria e prazer.

A formação continuada é vista por muitos desses professores que,

inconformados com a sua atuação, rebelaram-se contra a estagnação profissional e

buscaram a luz da reflexão, uma maneira de vencer a desilusão. Perceberam que o

espaço coletivo favorecido pela formação, regado por muito estudo e diálogo,

despertava em cada um o re-encantamento e a “fome” do aprender mais e do fazer

diferente.

Para melhor compreender o termo “fome”, foi em Rubem Alves (2004) que

encontrei, com muita galhardia, a explicação metafórica para despertar a vontade, a

motivação, a “fome” do aprender: que para se entrar numa escola, alunos e professores deveriam passar por uma cozinha. Os cozinheiros bem que podem dar lições aos professores. [...] os banquetes não se iniciam com a comida que se serve. Eles se iniciam com a fome. A verdadeira cozinheira é aquela que sabe a arte de produzir fome (ALVES, 2004, p. 20)

O autor consegue explicar com simplicidade e profundidade o cerne da

motivação, termo tão criticado e também tão procurado pelos professores. Em sua

lógica prossegue numa poética “inocente” e sutil: Toda experiência de aprendizagem se inicia com uma experiência afetiva. É a fome que põe em funcionamento o aparelho pensador. Fome é afeto. O pensamento nasce do afeto, nasce da fome. [...] É o eros platônico, a fome que faz a alma voar em busca do fruto sonhado. (ALVES, 2004, p. 20)

Muitas vezes, este é um grande problema para os professores, o de como

provocar a “fome” de aprender e fazê-los saborear o aprendizado como se saboreia

uma manga madura que ao escorrer pelos dedos nos induz a lambê-los ávidos, para

não perder nenhuma gota do seu néctar, do aprender, do descobrir. É a busca desta

mágica, deste tesouro perdido que muitos professores se sentem impulsionados a

participar de formações continuadas, principalmente as específicas de Matemática.

Formação rara e escassa em seu oferecimento.

Para eles, os precursos da formação continuada podem ser comparados aos

“caminhos nunca dantes navegados”4, na procura de novas formas de olhar para o

antigo, de outros fazeres, de novos aprenderes e do despertar de novos quereres.

Formação, pensada e repensada na qual a principal intenção é o escutar e o falar.

                                                            4 Famosa frase da ilustre poesia “Os Lusíadas”, de Luís Vaz de Camões

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Falar dos anseios, das dificuldades, das desilusões e de outras coisas que envolvem

o mundo escolar e muitas vezes nossa vida pessoal. Uma formação cujo propósito é

o de despertar e acalentar a alma educadora adormecida com o propósito de

expandir saberes dominados e praticados a fim de poder impregná-los de prazer.

Alguns possíveis fatores que interferem na qualidade da prática foram frutos

da análise de Garcia Silva (2007), explicitados como conhecimento do conteúdo a

ser ensinado, as crenças e concepções a respeito do ensino e aprendizagem, bem

como a reflexão em grupo. A deficiência do conhecimento matemático pelos

professores dos anos iniciais foi motivo de sua reflexão frente aos resultados

apresentados pelos diversos levantamentos realizados durante as formações

continuadas sob sua coordenação e através dos dados de pesquisa e sobre a qual

considera que: na formação inicial de professores há a necessidade de inserir conteúdos específicos da Matemática, contemplando tanto os conhecimentos dos conteúdos como os conhecimentos pedagógicos e curriculares (GARCIA SILVA, 2007, p. 281).

Durante sua investigação, percebeu que, em determinados conteúdos

matemáticos, o conhecimento dos professores se igualava ao conhecimento do

aluno, inclusive apresentando os mesmos erros, situação verificada durante a

realização das atividades pelos professores e através dos testes realizados pelos

alunos. Conclui que a formação deve ser um processo contínuo e o grupo deve ser

potencializado para que produzam mudanças substanciosas e “não apenas

superficiais”, senão todo o entusiasmo e envolvimento inicial perdem-se e rescinde a

continuidade de intenção dos participantes em aprender.

Uma formação que amplie o conhecimento dos conteúdos matemáticos a ser

explorado pelos professores em sala de aula, bem como reflita e investigue o como

os conceitos e procedimentos matemáticos estão sendo abordados pelas

professoras que ensinam matemática nos anos iniciais do Ensino Fundamental.

Nesse sentido, Poloni (2010) contribui com reflexões a respeito da

importância da formação na escola e da manifestação das professoras com relação

ao estudo de Geometria no “desejo de aprender. Esse desejo vinha imbuído da

vontade de fazer mudanças em suas práticas de sala de aula visando o melhor

aprendizado de seus alunos” (p.185 ).

A estudiosa ressalta que o professor que se vê como aluno – tal qual o

aprendiz, abre-se para o novo, observa com atenção cada detalhe dos

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acontecimentos no ambiente ao seu redor e seleciona todas as informações úteis.

Esse movimento do aprendizado do novo, desconhecido para ele, torna-o mais

tolerante frente às dificuldades apresentadas pelos alunos. Destaca

conclusivamente a importância da formação continuada na escola favorecendo: reflexão tanto sobre os conteúdos matemáticos quanto sobre a prática das professoras. Em termos de formação, entendemos que seria bastante importante que outras atividades tivessem sido planejadas pelas professoras e aplicadas em sala de aula para posterior retorno às sessões de reflexão (POLONI, 2010, p. 191)

Em muitas situações, percebemos que os professores aplicam as atividades

que lhe são fornecidas pelos pesquisadores e até discutem as facilidades e

dificuldades encontradas ao aplicarem, mas somente ao elaborarem novas

atividades é que eles verdadeiramente avaliam como se deu o apropriar ou não dos

novos conhecimentos.

Sentelhas (2001) investiga se alunos de 5 e 6 anos podem se apropriar do

significado de um número com dois algarismos e do valor posicional de sua escrita.

Apresenta um tripé teórico envolvendo Vergnaud (1994), Lerner e Sandovsky (1996)

e Doaudy (1989) como fontes de sustentação para a observação sobre como o

aluno se comporta frente a leitura, escrita e comparação e uso de regularidades de

números de dois algarismos e a necessidade de memorização da sequência para

justificar resultados. Com relação aos professores, observa que o conteúdo proposto

“não é habitual” na rotina da Educação Infantil e considera que: Tenhamos contribuído aos professores quanto à compreensão de que um trabalho alicerçado em situações bem elaboradas e respaldado por um quadro teórico, que forneça os instrumentos didáticos apropriados para a realização da tarefa de ensinar, garante aos alunos a compreensão de conceitos e procedimentos considerados problemas essenciais na Educação Matemática (SENTELHAS, 2001, p. 128)

Vale ressaltar que, atualmente, alunos com a idade pesquisada pela autora,

encontram-se sentados nos bancos dos primeiros anos do Ensino Fundamental,

onde o brincar é pouco permitido e o estudar é coisa muito séria. Entretanto, o

conteúdo assinalado por ela continua encontrando resistência em ser trabalhado

pelos professores. Ainda é muito difícil os professores perceberem a importância de

ensinar matemática, principalmente durante o início do ano letivo, e raramente com

propostas de ações que atendam as observações destacadas pelos estudos de

Lerner e Sandovsky, Nunes e Bryant, Panizza, Brizuela e outros.

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Guimarães (2005) identificou dificuldades dos professores-alunos de um

Programa de Qualificação ministrado pela Universidade, com relação à

compreensão da estrutura do Sistema de Numeração Decimal. Os professores-

alunos eram professores dos anos iniciais do Ensino Fundamental. Relata que

depoimentos de professores levaram-na a acreditar que era muito marcante a ideia de que os números de unidades, dezenas, centenas etc. que compõem um número corresponde ao algarismo que representa o número de elementos em cada ordem do ábaco. Por exemplo, no caso do número 4382, a ideia mais comum era que ele contém 2 unidades e não 4382 unidades. (GUIMARÃES, 2005, p. 93).

Tais respostas também ouvidas nas formações continuadas em que atuei. A

autora finaliza afirmando que, diante das respostas obtidas nas as atividades

propostas, pode constatar um déficit de formação, deixando claro que os

professores não tinham pleno domínio dos conceitos e conteúdos matemáticos relativos ao Sistema de Numeração Decimal. Sua compreensão [...] era inadequada [...] Tal situação de déficit favorece o uso generalizado e indiscriminado do livro didático, de práticas mecânicas, sem apoio no contexto e no concreto e desconsiderando o potencial construtivo dos alunos (GUIMARÃES, 2005,p.98).

Ampliando um pouco mais os estudos encontrei em Agranionih (2008) uma

investigação sobre as concepções presentes no processo de construção da

compreensão do valor posicional e da apropriação da escrita convencional em uma

interação entre o aluno e a escrita numérica. Ela verificou que os alunos se

aproximavam do valor posicional do número, mas que isso não se dava logo de

imediato, e sim através de “situações didáticas” que provocassem reflexões sobre a

organização e regularidades dos números. Situações que exigissem sucessivas

tomadas de decisão. Enfim, foram necessárias atividades desafiadoras que

colocassem o aluno em conflito e propiciassem que ele explicitasse tudo o que sabia

pois, segundo ela, “ficou claro que as notações, por si só, não são “transparentes” às

crianças” (p.206). Finaliza indicando a necessidade de novas pesquisas para

responder com mais profundidade as análises realizadas, “naturais incompletudes

de um trabalho de pesquisa” (p.207).

Como nossos alunos pensam sobre a organização numérica mediam

questionamentos que têm despertado a curiosidade dos professores atualmente. Até

então, muitos acreditavam que treinar bastante a escrita simbólica dos números era

suficiente para que os alunos os escrevessem convencionalmente. Os cadernos

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viviam abarrotados de escritas numéricas que tomavam páginas e mais páginas,

como se o treino constante e desordenado fosse ação pedagógica suficiente para a

apropriação das regras que permitiam adentrar os segredos do mundo numérico.

Segredos não desvendados geravam acúmulos de dúvidas e erros diante das

situações-problema propostas.

Na busca de desvendar novos segredos e de encontrar novos parceiros no

aprofundamento do trabalho com números, descobri nos estudos de Grein Santos

(2004) reflexões de como está sendo feito o trabalho com contagem. Segundo ela,

contagem não é ato isolado: Contar não é simplesmente pronunciar números em sequência ou apontar e numerar objetos; é um ato reflexivo, é quantificar, com definição de parâmetros e prioridades; é perceber diferenças e semelhanças entre os elementos da natureza, categorizá-los, compará-los, enumerá-los e classificá-los, definindo os pontos comuns e os divergentes, o que pressupõe a elaboração de critérios, princípios e normas (GREIN SANTOS, 2004, p. 13).

Grein Santos propôs aos educadores aproveitarem o momento de contagem

como um espaço de descoberta, de exploração, de conhecimento. Realizou um

estudo aprofundado das publicações dos teóricos que ressaltam a importância da

contagem para o conhecimento numérico. Enfatizou que número é registro de ações

e descobertas expressas pelo gesto, fala ou escrita. Portanto, a noção de número é

construída na medida em que são proporcionadas situações de contagem, de

comparação e ordenação numérica, e seu aprender é uma construção em processo.

Para a pesquisadora, a “contagem é um meio eficaz de estimular a

descoberta do mundo” (p. 23). A investigação por problemas matemáticos, ou

procedimentos para obter um resultado necessitam de atividades de “colocar, retirar,

comparar, explorar, medir, acrescentar, diminuir, em que se quantificam grandezas,

analisam-se situações, comparam-se possibilidades; aquilatam-se as favoráveis à

mensuração de fatos, circunstâncias e ideias” (p.24). Separar Matemática da vida

cotidiana é impossível, ela possibilita descobrir os segredos e as incógnitas do

mundo ao redor.

Grein Santos assegura que qualquer ambiente permite descobertas

quantitativas, mesmo que ele seja culturalmente pobre. Em contato com as

educadoras participou do planejamento sugerindo atividades de contagem para

serem vivenciadas pelos alunos e observou a aplicação da atividade planejada em

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sala de aula. Em sua conclusão faz algumas ponderações importantes destacadas a

seguir:

1. o pesquisador deve considerar na realização de um trabalho conjunto, o

conteúdo e o método para seu ensino, o educador, em suas reações e a

interferência do pesquisador.

2. um trabalho conjunto necessita de um tempo mais longo para a realização

para que as transformações ocorridas possam se sedimentar e tornarem-

se mais estáveis.

3. a contagem deve ser intensamente pesquisada, pois pode contribuir para

o enriquecimento das atividades propostas inicialmente e colaborar com a

aprendizagem numérica dos alunos.

Finaliza afirmando: A formação de educadores implica em compreender o sentido de forma e ação (Bicudo, 2003). Esse modelo dual talvez permita compreender a complexidade e importância do trabalho conjunto, entre pesquisador e educador, uma vez que ele envolve ao mesmo tempo esses dois aspectos que se complementam e interdependem. Embora se possam elaborar estratégias para tentar utilizar melhor o tempo é preciso aguardar as mudanças e peculiaridades de cada situação. São elas que devem embasar as novas proposições. (GREIN SANTOS, 2004, p. 216)

A essencialidade ressaltada da contagem na apropriação dos números

revalida o empenho que tenho tido em convencer os professores a resgatarem

atitudes em sala de aula que permitam colocar os alunos cada vez mais diante de

situações diferenciadas de contagem.

No trabalho de Senna e Bedin (2006) encontrei mais uma fonte de reflexão

sobre a importância da contagem, sua relação ao conceito de númerosidade e a

observação do como esse processo ocorre espontaneamente nos alunos. Afirmam

que “a contagem um a um exige utilização da memória imediata” (p. 7) e a

dificuldade que elas encontram em nomear os números cujos nomes não

apresentam lógica e regularidade. Observaram, como muitos de nós, que os alunos

demoram a memorizar certos números, como por exemplo, o número treze e que

lembram-se facilmente do dezesseis (dez + seis).

As autoras concluem que o conceito de númerosidade está associado ao

desenvolvimento da contagem e aos princípios que a envolvem dando grande

abertura para a compreensão das quantidades, que

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requer da criança que associe a nomeação dos números de acordo com a sua ordem, a coordenação dos nomes dos números com a identificação dos objetos no conjunto e a contagem única de cada objeto. Ao final da contagem, a criança deverá perceber a correspondência com o total de objetos pertencentes ao conjunto (p.11).

Quando os alunos entenderem que o último número falado está relacionado

ao total de objetos do conjunto, neste instante, estará compreendida a quantidade

numérica. Segundo afirmação das autoras, “esta habilidade auxiliará a criança na

tarefa de resolução de problemas aritméticos” (p.12).

Estes estudos e reflexões, aliadas a minha experiência com Formação

Continuada de Matemática para professores dos anos iniciais do Ensino

Fundamental, colaboraram na investigação e observação de como as estratégias

utilizadas na Formação Continuada propiciaram, ou não, algum impacto na melhoria

das práticas de sala de aula.

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CAPÍTULO 3

REFLEXÕES À LUZ DA TEORIA: SABERES DOS PROFESSORES QUE ENSINAM MATEMÁTICA

No Capítulo 3 apresentarei os estudos que colaboraram para a re-

organização das minhas verdades e a fundamentação da minha leitura do mundo

percebido e observado durante a pesquisa. Tal conhecimento foi ampliado pelas

análises da condição do trabalho do professor por Nóvoa (1997), pelos saberes

profissionais dos professores ressaltados por Tardif (2000; 2002), da teoria de

Shulman (1986) ampliada pelas investigações de Ball (2008; 2009) e pelas ideias

reflexivas de Nacarato e Paiva (2008). Saberes integrados pelo conceito de

profissional prático-reflexivo de Schön (1997), Alarcão (1996) e Zeichner (1997);

substanciados pela proposta de trabalho contextualizado e de formação permanente

de Imbernón (1998; 2009); baseados na realização do trabalho de grupo e na

valorização do outro no processo de aprendizagem e da reconstrução da prática

realçado por Saraiva e Ponte (2003), Oliveira e Ponte (1997). Nas ideias de

Serrazina (1999; 2002), Oliveira e Serrazina (2002) e Ponte (1995; 1998) a respeito

da ressonância no ensinar das experiências que os professores vivenciam, busquei

colaboração para embasar a observação e a análise das práticas das professoras

participantes. O pensar desses autores e pesquisadores que ressaltam na formação

continuada do professor a qualidade da relação entre teoria e prática, também foram

abalizados e puderam fomentar minhas escolhas metodológicas de ação e de

análise dos dados obtidos nessa pesquisa.

Ao analisar os relatos orais e escritos e as observações da prática mergulhei

na riqueza dos registros das trajetórias das práticas narrativas e de análise das

narrativas advindas de Fiorentini (2003), Freitas e Fiorentini (2007), Fiorentini e

Cristovão. (2006); Fiorentini et al. (2009); na profundidade do poder da palavra de

Paulo Freire (2000) e complementei com a veia poética de Rubem Alves (2004;

2007) com o propósito de despertar uma sensibilidade que favoreceu uma

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interpretação, organização e narrativa que particularizaram os resultados da

pesquisa.

Ainda resgatei aportes teóricos que tinham a preocupação com um currículo

de Matemática mais adequado para os anos iniciais e enfocavam práticas eficientes

e de qualidade. Finalmente, para favorecer a análise das sequências didáticas,

abordei a importância de despertar no professor um olhar mais atento a estudos

mais significativos a respeito do Sistema de Numeração Decimal e da influência da

contagem para sua compreensão e conceitualização e ainda a necessidade deste

conteúdo para melhorar a própria capacidade e a dos alunos em resolver problemas.

A prática de resolver problemas, abordada não apenas com o enfoque de um

amontoado de contas, mas como um caminho desvelador do saber e desafiador, ao

permitir aos alunos repensarem princípios e leis que regem o universo numérico que

os rodeiam e buscarem outros procedimentos que os ajudem a encontrar uma

solução. As ideias e estudos de Ifrah (1997), Vergnaud (2009), Nunes e Bryant

(1997), Nunes et al. (2005), Brizuela (2006), Panizza (2006), Magina et al. (2008),

Moreno (2006), Machado (1990), Soares e Pinto (2008) ajudaram nessa empreitada.

A prática do professor e sua qualidade têm sido objeto de muitos estudos e

discussões. Quando essa qualidade é percebida pelos seus pares da comunidade

escolar e validada pela sociedade, esse profissional fica com um rótulo de “bom

professor”. No entanto, se o resultado de seu trabalho tiver uma avaliação

insatisfatória, a atenção da sociedade é voltada para a figura do professor, como se

fosse o fazer inadequado de sua prática o único responsável pelo fracasso escolar

dos alunos.

Paralelamente, pude perceber que o mesmo acontece com relação aos

professores que ensinam Matemática nos anos iniciais. Eles sentem seu trabalho

observado e avaliado pelos colegas dos anos posteriores, principalmente, pelos

especialistas, depois, pelos gestores da instituição (diretores, coordenadores

pedagógicos), e, finalmente, em última instância, pelos órgãos administrativos

educacionais. Estes órgãos fundamentam sua avaliação no desempenho

apresentado pelos alunos nas diversas avaliações institucionais ocorridas durante o

ano letivo.

Apesar de terem sido preparados para serem professores “polivalentes”, com

competência em todas as áreas do conhecimento, a lente da avaliação, seja

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institucional ou da comunidade, está sempre focada para o trabalho realizado na

alfabetização (ler e escrever) e na Matemática (contar e operar).

Uma questão que paira sobre os ares escolares é o porquê do olhar

meticuloso e analítico direcionar sua vigilância apenas para estas duas áreas do

conhecimento. Uma resposta rápida e impulsiva se faz ouvir e incita o pensar: ou as

outras áreas têm uma importância menor. Ou a magnitude de uma delas (Língua

Portuguesa ou Matemática) está relacionada às suas diferenças. Ou há uma

interdependência. Ou existe supremacia de uma delas. No entanto, o discurso mais

ouvido nas escolas extirpa qualquer dúvida que paira: “só é possível aprender

matemática quando o aluno dominar a língua materna”. A supremacia da língua

materna se faz presente.

Com relação à dependência entre elas encontramos nos estudos de Machado

(1998) a afirmação de que: ...a Matemática e a Língua Materna representam elementos fundamentais e complementares, que constituem condição de possibilidade do conhecimento, em qualquer setor, mas que não podem ser plenamente compreendidos quando considerados de maneira isolada ( MACHADO, 1998, p.83).

Asseveração tão importante para o universo educativo, mas que tem sido

esquecida ou desconsiderada. A convicção da dependência entre elas suplanta a

função de complementaridade e permeia a rotina de trabalho de muitos professores,

durante os anos escolares iniciais. A prioridade direciona toda a atenção para o

domínio da base alfabética - o aprender a ler e escrever -, e só posteriormente, é

chegado o momento de contar, operar e resolver problemas. Como se fossem

processos hierárquicos e não paralelos. Como se fossem distintos e não

complementares. Afinal, professor e aluno terão que lidar com dois signos que se

apresentam únicos em suas construções, mas ao mesmo tempo diversos em suas

funções. Diferenciados em sua representação simbólica e imagética, mas também

parecidos em sua estrutura organizacional, recheados de regras e regularidades e,

finalmente, por lidarem com princípios comuns e “um permanente e indissociável

processo de ir-e-vir cuja dinâmica importa cada vez mais investigar” (Machado,

1998, p.124).

Na prática de sala de aula, muitos professores tolhem esse ato mágico que

permite desabrochar o poder da imaginação e da criatividade, retardando ou mesmo

excluindo, o direito do aluno navegar no mundo mágico do falar, ler, produzir e

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interpretar tanto no código alfabético quanto no campo numérico. Mundo esse no

qual é permitido conjecturar, elaborar as próprias regras, descobrir procedimentos,

refletir sobre os resultados, generalizar e abstrair. Ou um adentrar para melhor

compreendê-los e poder utilizá-los para uma comunicação e participação mais

segura neste mundo cultural impregnado de imagens e de linguagens que nos

envolvem todos os dias. Diferentes linguagens e imagens que carecem por ser

descobertas, despertadas e decodificadas.

Neste momento, o meu devaneio precisa ser calado e a busca de novas

histórias e/ou causas que marcaram profundamente o ensinar desses professores

se faz necessária, para delinear o pano de fundo de minhas convicções.

3.1 NORMAL, MAGISTÉRIO OU PEDAGOGIA: ESPAÇO DE SER E FORMAR-

SE PROFESSOR

Uma história que é preciso desenrolar como se fosse um novelo de fios, no

qual cada ponta apresenta a trajetória de vida pessoal e profissional que constituiu e

constitui o jeito de ser de algumas das sete professoras participantes dessa

investigação: a formação magistério.

Eu os convido a desembaraçar este grande novelo, no qual os fios tecem as

histórias dessas professoras e se entremeiam com as histórias tecidas de outros

profissionais da Educação. Nesse emaranhado de fios e nós, as crenças, os

saberes, as convicções ou as dificuldades se desvelam e modelam o tecer opaco ou

colorido das práticas dos professores.

Segundo Tardif (2002) os saberes profissionais dos professores são

temporais, plurais e heterogêneos, “aprendem a trabalhar na prática [...] raramente

têm uma teoria ou uma concepção unitária [...] utilizam muitas teorias, concepções e

técnicas, conforme a necessidade” (p. 14). Continua categórico em sua reflexão

profunda e verdadeira afirmando que: “os saberes dos professores trazem consigo

as marcas de seu objeto de trabalho” (p.16) – o ser humano. Para ele, o contato

diário com os alunos desenvolve no professor a necessidade de conhecer a si

mesmo, de perceber suas emoções e de reolhar seus valores. O clima da sala de

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aula deve propiciar a cooperação e estar principalmente impregnado de tolerância e

de respeito pelo outro, firmando uma convivência favorável ao aprender.

Olhando por esse viés, podemos dizer que a formação inicial dessas

professoras apresenta aparência que se assemelha a de uma personagem má das

histórias infantis – vilã e culpada pelo processo de constituição de seus saberes

matemáticos revelados na prática e nos relatos reflexivos.

No transcorrer da formação inicial foram sendo firmadas as concepções e as

crenças, validados os aprendizados e não-aprendizados, dirimidas ou aumentadas

as dúvidas e as incertezas. A cada ano transcorrido foi sendo instituída uma gama

de conhecimentos que se concretizou e transformou-se em ensinos. Ensino que

desencadeou e vem desencadeando novos saberes e crenças. Ensino que vem

formando um amontoado de dificuldades e sendo formado por uma série de dúvidas

envolvendo muitos daqueles que foram ou ainda serão seus alunos.

Algumas das professoras participantes são resultado de uma formação inicial

advinda de um curso Normal, que sofreu transformação legal no nome e na sua

constituição e passou, posteriormente, a ser denominado de Magistério. Outras,

afirmam só mais tarde serem conquistadas pelo prazer de ensinar e, optarem por um

curso superior – neste caso – a Pedagogia.

Como podemos perceber, as trajetórias profissionais do público-alvo dessa

pesquisa indicam duas estradas ladrilhadas com saberes comuns que levam ao

mesmo ponto de chegada: competência profissional em Matemática. Durante a

viagem educativa, foram recheando a bagagem de cada uma das sete professoras,

com experiências diferenciadas marcadas pela concepção de currículo matemático

que cada instituição acreditava ser mais adequado e pela metodologia que mais se

adequasse a ele.

Em uma das estradas, o percurso traçado pelo curso Normal deixou sua

marca na história da Educação brasileira definido como centros de excelência na

formação de professoras. Teve como finalidade, a partir de 1946, “prover a formação

do pessoal docente necessário às escolas primárias. [...] Desenvolver e propagar os

conhecimentos e técnicas relativas à educação da infância” (Decreto-lei n. 8.530/46,

art. 1º, itens 1 e 3). Centros de excelência que atendiam devidamente as exigências

sociais da época. Uma escola tradicional e elitista que refletia os estudos e

pesquisas relacionados às técnicas difundidas na época.

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Como Nóvoa (1992), não podemos deixar de ressaltar a importância dessa

instituição responsável pela formação de muitos de nossos professores. Para ele, as

Escolas Normais tiveram papel decisivo no processo de profissionalização do

ensino, favorecendo a consolidação da imagem e do papel do professor.

Por outro lado, a excelência atribuída às instituições de formação de

professores dos anos iniciais desconsiderava o conhecimento matemático desse

aluno - um futuro professor. Conhecimento abarrotado de dificuldades e incertezas

matemáticas. Defasagem que vai se compondo e ampliando gradualmente, a cada

etapa não compreendida, constituiu e é constituída pelo medo. A cada dia, o

aprendizado de Matemática se tornava algo distante, repleto de segredos, de

armadilhas, de situações incompreensíveis, de erros, de fracassos, de conceitos

incorretos e de técnicas inadequadas e improdutivas. No entanto, para demonstrar

uma possível qualidade de ensino em suas práticas, nunca puderam deixar

transparecer seus tormentos matemáticos, suas dúvidas, seus saberes reais e

impróprios.

Matemática, cuja fama é de uma disciplina que aniquila e desequilibra, há

séculos, o percurso de toda a educação básica. O que nos causa estranheza é que,

na medida em que os estudos avançam, crescem as dificuldades. Elas vão

gradativamente transformando-se em um monstro matemático de muitas e muitas

cabeças que assombra crianças, adolescentes e jovens, perseguindo-os pela vida

toda, inclusive em suas vidas profissionais e no cotidiano.

Nas constatações assinaladas nos estudos realizados por Nóvoa (2007) e

Tardif (2000), no contato que tiveram com profissionais competentes que ensinam

Matemática nos anos iniciais, durante muitos anos e no decorrer da minha

experiência como formadora de professores, o número de professores que

confessam seus medos, é extremamente significativo, inclusive se expressam com

um “não gosto de Matemática”. No entanto, ao observar o espaço de atuação desse

profissional - a aula de Matemática - pude perceber o quanto eles espelham em

suas práticas uma matemática não-aprendida, repleta de dúvidas e de dificuldades.

Professores formados muitas vezes por outros professores com as mesmas

inseguranças, os mesmos questionamentos, enfim as mesmas dificuldades com

relação à disciplina e a sua didática. Ou por profissionais especializados,

conhecedores de Matemática, impregnados de autoconfiança, mas destituídos de

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metodologia, de diálogo em uma escuta atenta, de olhar sensível para os saberes ou

os não-saberes de seus alunos – futuros professores.

Essas observações sobre o ensino e a aprendizagem da Matemática foram

objeto de estudo de Oliveira e Ponte (1997) que convalida minhas reflexões quando

afirmam que: ...o conhecimento dos professores e futuros professores sobre conceitos matemáticos e sobre aspectos da aprendizagem desta disciplina é muito limitado e, frequentemente, marcado por sérias incompreensões. [...] mas o fato é que em certos aspectos essenciais parecem haver lacunas no conhecimento de base dos professores acerca dos assuntos que ensinam e do modo como eles podem ser aprendidos (OLIVEIRA; PONTE, 1997, p.10).

Talvez a causa dessas lacunas esteja centrada no fato de que,

pedagogicamente, eles foram frutos de uma Matemática que para ser bem ensinada

consistia em realizar eficientes processos: dar um bom exemplo, apresentar uma

boa técnica, explicar clara e detalhadamente, treinar bastante, enfim, dar uma “boa

base” e a aprendizagem transcorreria sem problemas e dificuldades. Caso a

aprendizagem se apresentasse insuficiente, era claro que o precário esforço do

aluno era justificativa suficiente para apontar um culpado. O culpado nunca era nem

a metodologia, nem o professor. Afinal, o professor havia feito a parte dele, com

dedicação e profissionalismo, havia feito tudo o que sabia e tinha aprendido nas

instituições. O resultado lógico só poderia ser um ensino com sucesso. Um sucesso

esperado pelo professor, um sucesso que desconsiderava o processo de

aprendizagem de cada aluno – o que sabia, não sabia ou conseguia apropriar-se do

conhecimento apresentado, fosse ele novo ou já trabalhado. A metodologia quase

sempre utilizada não dava suporte suficiente para compreender como seu aluno

pensava. A pedagogia do silêncio era aplicada, aluno em silêncio, o direito de falar

era do professor. Ele falava o tempo todo e ouvia pouco, só o necessário e o que lhe

convinha.

A competência do ensinar era apoiada em um tripé de qualidade: aula bem

elaborada, livro com bons exemplos e exercícios selecionados. Sobre o

conhecimento do conteúdo a ser ensinado nem se questionava, partia-se da

premissa de que se é professor então é competente. Como se somente esses

fatores – tripé de qualidade e conhecimento do conteúdo – fossem suficientes para o

bem ensinar, para proporcionar boas aprendizagens e superar as diversas

dificuldades semeadas na sala de aula.

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Logo depois, a Escola Normal foi substituída legalmente pelos cursos de

Magistério, curso profissionalizante. Com a mudança da denominação vieram as

mudanças de currículo, os conteúdos do 2º Grau-Ensino Médio eram obrigatórios,

inclusive a Matemática. Novamente vemos a Matemática ser utilizada como filtro

social classificatório, retomando as colocações de David e Herch (1988) para

selecionar os “escolhidos” e tornar-se a causadora de um abalo sísmico

intradisciplinar, deixando grandes crateras de dúvidas e várias rachaduras em seu

conhecimento.

Nesse sentido, é percebido por estudos realizados que a formação dos

professores formados nos cursos de Magistério foi sofrendo um decréscimo

acentuado em sua qualidade, no preparo para a prática. Uma crítica relevante com

relação às mudanças propostas pela reforma educacional é realizada por Frankfurt

(2008/2009). Segundo ela, o trabalho que foi argumento-chave na exposição de

motivos para a profissionalização do 2º grau acabou sendo a causa da

deteriorização da profissão professor. Ela se apóia nos estudos de Warde (1986) ao

afirmar que ...com a descaracterização dos cursos normais, a qualidade da formação dos professores decaiu de tal modo que passou a não haver diferenças entre os professores diplomados e os leigos quanto às condições técnicas para assumir uma classe de primeira série (FRANKFURT, 2008/2009, p. 132).

É percebido que os professores estão chegando às escolas, cada vez mais

despreparados para enfrentar o cotidiano de uma sala de aula, sejam eles com

formação técnica nos cursos de magistério, sejam eles com formação superior, nos

cursos de Pedagogia. A Pedagogia, apesar de ser um curso de nível superior,

contém em sua estrutura diferentes programas curriculares de formação matemática,

contraditórios em seus objetivos e práticas. Os que se preocupam em suprir as

dificuldades matemáticas do futuro professor exageram na seleção dos conteúdos

de Matemática a serem trabalhados, conferindo a professores de Matemática a

responsabilidade de suprir as defasagens dos alunos, futuros professores.

Entretanto, cursos cuja preocupação é o fazer pedagógico, a metodologia, a

didática, os profissionais que assumem, priorizam pouco o estudo do conhecimento

matemático fundamental e necessário para a prática eficiente dos professores

“polivalentes”.

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Nesse sentido, Serrazina, et al. (2002) assinalam análises profundas e

necessárias que nos obrigam a refletir sobre o quanto a formação inicial deve

envolver “os futuros professores em atividades didáticas parecidas as que se

pretenda que desenvolvam em sala de aula”.(p. 55). Elas propõem um fazer na

formação que possibilite reflexão e ao mesmo tempo liberte os futuros professores

dos elos constituídos por um saber matemático equivocado e proporcione

experienciar um modo diferente de aprender, pensar e ensinar Matemática.

As autoras alertam que, para mudar, há necessidade de apurar o gosto por

tarefas de investigação e pela prática de resolver problemas. Este é um trabalho que

exige investimento individual e interações em sala de aula. Ninguém reflete sozinho.

Reflexão solitária não produz diálogos nem contraponto. Reflexão mais efetiva e

profunda tem necessidade da visão do outro, da relação de cumplicidade, do

compartilhamento, do despertar para o diferente, enfim, do grupo. Os grupos

produtivos, que intensificam práticas e refletem sobre elas, devem ser acionados e o

diálogo deve ser propagado para que os alunos – futuros professores - possam

compartilhar suas descobertas e suas conclusões e, posteriormente, propiciarem

ambientes semelhantes que permitam a seus alunos fazerem o mesmo.

A análise das autoras também caminha para a reflexão de que “não basta a

presença de atividades de investigação e de resolução de problemas nas disciplinas

ligadas à didática ou à metodologia, mas que elas sejam parte da formação

matemática dos futuros professores” (p. 55). Este alerta é um leve “puxar de orelhas”

nas formações iniciais de Matemática, excessivamente formais e precárias de

reflexão. Destituídas de observação e investigação sobre e nos processos de ensino

e de aprendizagem5 de Matemática apropriados aos anos iniciais do Ensino

Fundamental. Serrazina et al. concluem, com uma constatação tão verdadeira e

atual, que para que a formação dos professores atenda a essas peculiaridades, é

primordial e “necessário que os docentes envolvidos na formação inicial possuam

formação pedagógica adequada” (p. 55). Elas enfatizam que os formadores dos

futuros professores devem estar preparados em Didática Geral, conheçam a

Matemática dos anos iniciais do Ensino Fundamental e, assim, dominem a Didática

da Matemática, e que, principalmente, aprendam a apreciar a Educação Matemática

                                                            5 São processos distintos. O processo de aprendizagem tem como sujeito o aluno e de ensino, o professor. Eles se comunicam, mas independem. O processo de ensino é que tem que se adaptar ao de aprendizagem, mantendo um diálogo desafiador, produtivo e evolutivo.

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para os anos iniciais do Ensino Fundamental. A formação de professores deve

destacar como objetivo principal a constituição de profissionais que colaborem para

o avanço da qualidade dos processos de ensino e de aprendizagem da Matemática.

Para se adequar a uma nova solicitação social, os cursos de Pedagogia, que

sempre tiveram como finalidade a formação muito mais voltada para as habilitações

pedagógicas, sofrem alterações na sua organização curricular “centrando-se a

organização curricular na formação de professores para a educação infantil e as

primeiras séries do Ensino Fundamental, consoante o princípio da docência como

base da formação do pedagogo” (SAVIANI, 2008, p. 650). Os cursos de Pedagogia

acabam praticando um currículo que acaba incorporando disciplinas voltadas muito

mais para a formação de educação, formação dos professores de educação infantil

e dos anos iniciais do Ensino Fundamental, cuja principal preocupação é a gestão,

não mais administrativa, mas de sala de aula. Por conta dessa transformação, as

relações entre teoria e prática ficaram fragilizadas e os “conteúdos são considerados

formativos em si mesmos, não deixando margem a veleidades pedagógicas”

(SAVIANI,2009, p.149) e os professores oriundos desses cursos se apresentam

ainda hoje, com um embasamento pedagógico insuficiente para uma prática

educativa segura e envolvente. Saviani (2008) afirma que para formar um educador,

que tem a tarefa de cuidar de seres humanos, é “necessário um tempo bem maior

do que aquele que tem sido destinado aos cursos de formação dos profissionais da

educação” (p.653)

No entanto, é visível a diferença entre a gestão de sala de aula de

professores que fizeram escola normal ou magistério daqueles que fizeram

unicamente pedagogia. A prática de sala de aula do professor com formação no

magistério apresenta uma organização muito mais estruturada, que envolve rotina,

preocupação com as relações na sala de aula e com o desenvolvimento de novas

atitudes e diferentes procedimentos ou habilidades. Já o professor pedagogo

apresenta dificuldade em lidar com a relação tempo-espaço da sala de aula. Em

comum, os dois grupos apresentam dificuldades em ensinar matemática. A

alfabetização ainda é o assunto mais explorado, inclusive ocupando um espaço

proporcionalmente maior nos diferentes currículos de formação inicial.

Pesquisas têm demonstrado que o ensinar matemático não tem sido uma

preocupação das instituições que acabam oferecendo essa disciplina em tempo

insuficiente para o aprendizado do conteúdo da Matemática, fato reconhecido e

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apontado pelos professores. Coincidentemente Nacarato, Mengali e Passos validam

o desabafo dos professores que ensinam Matemática, ao afirmarem que as futuras professoras polivalentes têm tido poucas oportunidades para uma formação matemática que possa fazer frente às atuais exigências da sociedade e quando ocorre na formação inicial, vem se pautando nos aspectos metodológicos (NACARATO; MENGALI; PASSOS, 2009, p. 22).

As marcas deixadas pelas experiências negativas dos tempos de estudantes

nas aulas de Matemática talvez sejam o principal motivo de muitas opções

estudantis, pelos cursos de Pedagogia ou Magistério, com o intento de fugir das

áreas de Exatas e se distanciar da aprendizagem da Matemática. No entanto, o

destino parece brincar com elas, pois ao se tornarem profissionais da Educação são

elas as responsáveis pelo ensino desta disciplina, tão odiada por uns e amadas por

outros.

Uma forma de superar essa situação artificial e ilusória, pois parece que a

ninguém interessa como se sentem os futuros professores, é a sugerida por

Serrazina (2002), cujo olhar mais abrangente, fortalecido pelas suas investigações e

larga experiência em formação, declara: tratando-se da formação para o ensino da Matemática em níveis de Educação [...] parece-nos que a discussão se deve centrar no que se poderia considerar como essencial ser trabalhado durante a formação inicial. Isto porque a maneira como os futuros professores são envolvidos na atividade matemática durante a formação é determinante na forma como virão a trabalhar a Matemática com seus alunos. Tudo isso, não esquecendo que se trata da formação de professores generalistas, em que a formação matemática é apenas uma das componentes que não pode ser dissociada das restantes (SERRAZINA, 2002, p.7).

Este é um convite a repensar as propostas de formação com relação à

Matemática. Uma formação que permita aos futuros professores ou professores

atuantes vivenciar não apenas a aplicação das atividades, mas compartilhar

situações de elaboração de novas atividades ou adaptações de atividades prontas

para os diferentes anos do Ensino Fundamental. Formação que favoreça momentos

importantes nos quais cada aluno ou professor faça e refaça matemática, pense e

repense matemática ou reflita como os alunos aprendem e vivenciem como atuar

frente à diversidade de conteúdos e procedimentos matemáticos de forma a

promover avanços.

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3.2 FORMAÇÃO CONTINUADA DE MATEMÁTICA: EXPLORAÇÃO E

DESCOBERTAS

Dada a precariedade de condições encontradas pelos professores nas salas

de aula, a busca pelas formações continuadas tem sido a oportunidade de

ampliação ou transformação de saberes matemáticos, a abertura de possibilidades

para a descoberta de algo mágico que modifique ou remodele um fazer que

incomoda ou apenas uma ocasião favorável de conhecer novas estratégias, que

ajudem a transpor enormes obstáculos para ensinar com prazer, com alegria.

Como podemos perceber, são diferentes as razões que motivam professores

a participar de uma formação continuada de Matemática. O “saber mais para ensinar melhor” é mais uma justificativa a ser considerada, pois o professor procura

colaboração e parceria que o ajude a compreender a lentidão, a insegurança e a

desordem que envolve a construção e reconstrução de seus saberes docentes em

Matemática. A certeza do “não saber” e o desconhecimento de como enfrentar o

“não-entendido”, o inesperado, impede a busca por possibilidades diferentes.

Segundo Morin (2001), temos visto no decorrer da história do homem, que o possível se torna impossível e podemos pressentir que as mais ricas possibilidades humanas permanecem ainda impossíveis de se realizar. Mas vimos também que o inesperado torna-se possível e se realiza; vimos com frequência que o improvável se realiza mais do que o provável; saibamos, então, esperar o inesperado e trabalhar pelo impossível (MORIN, 2001, p. 92).

Mudar é difícil, exige ação. Ação exige escolha de caminho e consciência do

risco a enfrentar. Alguns professores dizem não escolher um determinado caminho

metodológico, eles utilizam vários, eles “mesclam”, ficam à deriva em sua prática, e

não percebem que são escolhidos pela metodologia inculcada nos materiais

aleatórios que utilizam ou nos livros que adotam inconscientemente. Entretanto, é

possível encontrar práticas nas quais a mudança ou a estagnação não é perceptível,

nas quais “quanto mais se muda, mais tudo permanece igual” (Morin, 2001, p.89).

Onde a alienação impera e os quereres vão se esvaindo, morrendo e abafando

pouco a pouco o afã cotidiano.

Nesse sentido, é possível entender quando Saraiva e Ponte (2003) afirmam

que, “ninguém muda ninguém, [...] é necessário que o professor esteja disposto a

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correr os riscos inerentes às inovações educacionais e a enfrentar a insegurança

das novas abordagens” (p.4). Portanto, mudar seria dar um primeiro passo na busca

de novos conhecimentos e novos caminhos.

A mudança na postura do professor pode ser provocada por uma busca

própria ou incitada por escolas que olham com atenção redobrada para os

resultados escolares apresentados internamente e externamente.

Foi na palestra proferida por Nóvoa (2007)6, que encontrei uma defesa segura

e enfática de que a escola tem que estar centrada na aprendizagem e olhar em

conjunto com o professor os resultados apresentados. Ele enreda o professor em

uma linha tênue de pensamento levando-o a um espaço imaginário e sensível que

permite evidenciar a necessidade de uma constante reflexão, em um processo de

construção e reconstrução do percurso da prática que atenda a necessidade

emergente do seu grupo-classe. Afirma que as formações dos professores devem

reorganizar suas propostas, pois ou elas são “excessivamente teóricas” ou

“excessivamente metodológicas”, sem a preocupação de sanar a necessidade

emergente de seus participantes, o déficit de práticas e de reflexão sobre as

mesmas, de trabalhar com e sobre elas.

Afinal, muitos professores querem saber como fazer de outro jeito e este,

provavelmente, é o motivo que o impulsiona na busca por uma formação continuada,

com o intuito de acalmar a solidão que lhe impõe a profissão e poder compartilhar

suas ideias e seus fazeres com alguém.

Tal qual Nóvoa, tenho encontrado professores que, ao participarem da

formação continuada de Matemática, realizam a travessia da mudança na prática,

por menor que ela tenha sido, sentem dificuldade em retornar às margens do fazer

inóspito, onde estiveram anteriormente ancorados.

Nesse sentido, constatamos que o propósito da formação continuada,

oferecida por instituições públicas ou particulares e por instituições acadêmicas em

seus cursos de especialização, é o de melhorar a competência docente e

profissional dos professores. Para que possam cumprir essa finalidade, Imbernón

(2009) propõe a revisão dos conteúdos e dos processos da formação por eles

propostos, para que não se limitem apenas a uma mera atualização profissional,

mas que possam ser espaços de reflexão e participação. Uma reflexão em que a

                                                            6 Palestra proferida no SINPRO SP e disponível em: http://www.sinpro.org.br/arquivos/novoa/livreto_novoa.pdf.

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teoria subjacente às práticas possa emergir com a intenção de serem analisadas,

recompostas, justificadas ou simplesmente desacreditadas e destruídas. Uma

participação mais efetiva, consciente, audaciosa, subjetiva e coletiva. Participação

na qual a prática é o esteio para novos estudos, novas reflexões, novas ações e

diferentes fazeres.

O autor complementa com novas propostas a serem pensadas e praticadas

na formação permanente do professorado, das quais enfatizo algumas: provocar a

desaprendizagem, desenvolver o pensamento complexo e considerar o

desenvolvimento atitudinal e emocional do professor.

Uma desaprendizagem, para que possa aprender de novo, ”aprender a

desaprender complementar a aprender a prender” (p.43). No entanto, a mudança

esperada na formação é um processo complexo, e não uma simples mudança.

Ensinar sempre foi considerado uma tarefa difícil e, atualmente, essa dificuldade tem

aumentado. A atuação em sala de aula envolve adentrar em um mundo intricado e

estar preparado para manejar o confuso, o inesperado, a incerteza, a ambiguidade e

o imprevisível. Nesse processo conflituoso é que vai se tecendo uma trama

interventiva que compreende e se renova a cada passo dado, a cada ação efetiva.

Entendendo toda essa trama educativa e ampliando o acreditar em uma

formação que não busca respostas, mas novos desafios, Imbernón (2009) encontra

nos princípios da complexidade de Morin7 (1996, 1999), pistas para fundamentar

melhor a formação: a) princípio dialógico – ordem e desordem são dois inimigos, um suprime o outro, mas ao mesmo tempo, em certos casos, colaboram e produzem a organização e a complexidade. [...]está presente na relação conflito/harmonia com o contexto, na forma em que concebe o professor [...] não é desordem, mas sim deve fomentar a criatividade para além dos recursos técnicos [...] respeito à diferença como elemento importante para ver a unidade a partir da diversidade. b) princípio recursivo – processos como produzidos e produtores, o que faz com que se supere a relação causa-efeito e passe a ser um caso particular [...] formação como processo sempre inacabado [...] nos ajuda a desenvolver a auto-organização e as redes de intercâmbio [...] professor se transforma em produtor e é produto numa relação de complexidade necessária em que não importam os processos nem os tempos, e sim os produtos que se inter-relacionam e que são interdependentes.

                                                            7 “a complexidade precisa de estratégia (...) o pensamento simples resolve os problemas simples, sem problemas de pensamento. O pensamento complexo não resolve, em si, os problemas, mas constitui uma ajuda para a estratégia que possa resolvê-los”.

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c) princípio hologramático – não apenas a parte está no todo, mas o todo está na parte. [...] Nem tudo pode ser reduzido às partes [...] perspectiva holística, de compreender o todo, [...] partes estão no todo e o todo estão nas partes. Quando o professor trabalha não pode fazê-lo sem atender a preferências, tendências, satisfações etc. do alunato. [...] o professorado é um reflexo da sociedade que o envolve. d) princípio de autonomia/dependência – toda organização necessita de uma abertura relativa do sistema e de um relativo fechamento (IMBERNÓN, 2009, p.95-97).

Imbernón afirma que o processo da “formação permanente do professorado”

deve ajudar a “compreender e interpretar a complexidade na qual vive e que o

envolve” (p. 97). A formação deve favorecer intercâmbios afetivos, nos quais é

importante o ouvir o outro e ouvir do outro boas práticas, a atenção à diversidade, a

elevação da autoestima e da identidade docente. A formação deve ocorrer no

interior das escolas e possibilitar mudança individual e, principalmente, institucional,

em um processo de cultura colaborativa baseado na reflexão deliberativa e na

pesquisa-ação.

Para que a formação continuada esteja mais presente na escola e possa

agasalhar esse profissional que se apresenta transvestido de diferentes roupagens,

uma delas o “manto” Matemática, ele precisa estar munido de um olhar diferenciado

para a sala de aula, de forma a colaborar para o seu entendimento e dar sentido às

ações praticadas. Na medida em que o professor compreende sua prática vão sendo

elucidados os caminhos escolhidos e as teorias que os subjazem.

Transitando por alguns estudos nos quais as formações continuadas de

professores que ensinam Matemática estão voltadas para o contexto da escola e

cujo foco é investigar a prática do professor, encontrei em Nacarato e Paiva (2008),

formações com formato de grupos de estudos e trabalho, cuja finalidade, além de

discutir Matemática, é a de potencializar o intercâmbio entre professores e

pesquisadores que atuam tanto na educação básica quanto na educação

acadêmica. Com o mesmo propósito, destaco dentre muitos outros grupos

importantes existentes nas universidades e instituições educacionais, o Grupo de

Trabalho – GT7, coordenado por Nacarato e Paiva (2008); o Grupo de Estudos e

Pesquisas sobre Formação de Professores de Matemática – GEPFPM, subgrupo do

grupo de pesquisa PRAPEM – Prática Pedagógica em Matemática, liderados por

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Fiorentini (2009) e o Programa Observatório da Educação8 - Educação Continuada

de Professores de Matemática do Ensino Fundamental e Médio: Constituição de um

Núcleo de Estudos e Investigações sobre Processos Formativos, coordenados por

Pietropaulo (2009). Nesses grupos acontecem verdadeiros fóruns de discussão e

estudos que são divulgados por meio de publicações periódicas ou artigos em fóruns

acadêmicos. Ressaltamos, ainda, o trabalho de Serrazina e Monteiro (2004), no

Projeto “Professores e novas competências em Matemática no 1º ciclo”, cuja

proposta é perceber como os alunos desenvolvem conceitos matemáticos. Em seu

relatório, as autoras ressaltam o envolvimento de instituições de ensino superior,

responsáveis pela formação inicial de professores do 1.º ciclo, pela implementação

de projetos e destaca o envolvimento de alguns docentes.

Os estudos e pesquisas apontadas indicam a necessidade de repensar as

formações - inicial e continuada de Matemática para professores dos anos iniciais do

Ensino Fundamental, de forma que elas venham a ser um lugar propício na/para

constituição de um profissional reflexivo e para a produção de um saber matemático

com qualidade. Nesse processo, o professor passa a ser aluno e tal qual um aluno

vivencia, investiga e discute atividades didáticas com o propósito de transformar-se

e de transformar seus alunos em investigadores e fazedores reflexivos. Enredados

em uma cumplicidade educativa, na qual cada um dos envolvidos no processo –

professor ou aluno – se torne “aluno-professor” quando colabora e incentiva seus

pares e, muitas vezes, “professor-aluno” do próprio educador/coordenador da

classe, quando apresenta e defende seu pensar diferente ou um novo jeito de fazer.

Nesta forma cíclica, dialógica e dinâmica, em que todos são mestres e todos são

aprendizes, constitui-se a nova prática.

Fomentar no professor a necessidade de uma prática diferenciada, segundo os

estudos de Oliveira e Serrazina (2002), o leva a perceber o seu potencial profissional

e envolve-o em um movimento de vaivém permanente entre acontecer e compreender na procura de significado das experiências vividas. Há, através das práticas, um ganho na compreensão e esta nova compreensão pode fazer surgir um insight sobre o que significa ser professor. (OLIVEIRA; SERRAZINA, 2002, p.5).

                                                            8 Este projeto é desenvolvido no Programa de Pós-graduação de Educação Matemática da UNIBAN envolvendo professores de matemática da rede pública estadual.

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Compreender está ligado a aceitar. Compreender e o ajudar. Compreender e o

ensinar. Pensar com e sobre compreensão é avivado pelo pensar filosófico de Morin

(2001) diante da afirmação de que, é um “processo de empatia, de identificação e de

projeção [...] a compreensão pede abertura, simpatia e generosidade” (p. 95).

Compreensão pede um aprender e um reaprender constante. Compreensão

abrange atitudes. Compreensão define práticas. Compreensão institui histórias e é

instituída por elas.

Nesse sentido, uma prática reflexiva necessita de professor que olhe para a

sua prática com abertura, com generosidade, com compreensão. Que exercite o

refletir em um movimento do pensar que se volta sobre o seu fazer, como se

estivesse em um autointerrogatório e cujas respostas direcionam-se para si mesmo,

compreendendo-o, transformando-o, mudando-o e, principalmente, reconstituindo a

própria prática. É do conhecimento geral que todo processo de mudança é lento e,

muitas vezes, quase impossível. Ao mesmo tempo, espera-se que o professor

aprenda a dirigir seu olhar compreensivo, generoso e simpático para o movimentar

dos alunos, aprendendo a respeitar e compreender seus tempos, suas falas, suas

falhas e seus aprendizados.

Segundo Saraiva e Ponte (2003), para que haja mudança é preciso despertar o

querer. Mudar esbarra em obstáculos que explicam essas resistências e um deles é

a insegurança pessoal do professor. O novo desperta uma desconfiança com

relação ao resultado obtido. Uma insegurança ao mudar os hábitos com relação ao

uso de ferramentas curriculares e metodológicas que aparentemente vem dando

“certo”, já há algum tempo. Os autores buscam em Day (1999, apud Saraiva e

Ponte) a assertiva para justificar a atitude arredia do professor, de que “é natural que

o professor tenha relutância e receio em abandonar a sua base de segurança, o que

mostra que a mudança não é apenas um processo cognitivo, mas envolve, também,

emoções”. (p.4-5).

Um emocional que muitas vezes desequilibra, desorienta e coloca em risco, o

todo já construído. O construído com/por ele mesmo, sem pensar ou se preocupar

com a construção do aluno. Porém, quando fortalecido se atreve a colocar em jogo o

seu conhecimento, o seu fazer e, ao conseguir driblar o medo, ele cresce, avança e

vence qualquer obstáculo que apareça. Ele toma consciência de sua prática e

podemos perceber o quanto “uma prática reflexiva confere poder aos professores e

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proporciona oportunidades para o seu desenvolvimento” (OLIVEIRA; SERRAZINA,

2002, p. 29).

Similarmente, o descontentamento com o conhecimento da disciplina

matemática e com o conhecimento profissional interfere na qualidade da prática

diária e abala a confiança dos professores e, por conseguinte, a confiança da

comunidade educativa e da sociedade em geral.

A prática reflexiva está diretamente relacionada a um ensino reflexivo e a um

profissional reflexivo. Esse processo encontra nas ideias de Schön (1997) um olhar

analítico sobre reflexão, como ela se produz, com quem e em que momento ela

acontece ou deve acontecer. Ele propõe uma nova epistemologia da prática

profissional e analisa conceitos como reflexão na ação e a reflexão sobre a ação e

reflexão sobre a reflexão na ação.

Para o autor, o processo de reflexão na ação pode ser desenvolvido em uma

prática de ensino que combina diferentes momentos. Momentos que envolvem a

surpresa frente ao conhecimento do aluno, o pensar e repensar sobre o que o aluno

fala ou faz, o reformular/retomar a situação desafiadora, e realizar novas

experiências para confirmar suas hipóteses sobre o pensar do aluno. Segundo

Alarcão (1996), esses momentos envolvem refletir durante a ação, manter certo

distanciamento para uma reformulação imediata, como se estivéssemos

entabulando “uma conversa com a situação. Se reconstruirmos mentalmente a ação

para tentar analisá-la retrospectivamente” (p. 17), realizamos uma reflexão sobre a

ação, em um despertar da observação e percepção de minúcias até então

desvalorizadas pelo professor. Esse processo cíclico fica mais claro na medida em

que o professor adquire o hábito de registro, anota as situações importantes da sala

de aula para sustentar uma reflexão posterior, reflexão sobre a ação. Pouca

escrita, mas significativa.

Schön complementa que, após essa situação de sala de aula, em um

momento individual ou coletivo, o professor reflexivo realiza uma reflexão sobre a reflexão na ação. Ele pensa no ocorrido, no observado, no significado atribuído ao

fato. Para esse pesquisador, esse processo de “refletir sobre a reflexão-na-ação é

uma ação, uma observação e uma descrição que exige o uso de palavras” (p.83).

Diferente da reflexão na ação, que é um ato que não precisa ser verbalizado,

apenas pensado. Alarcão afirma que essa reflexão ajuda a determinar “ações

futuras, compreender futuros problemas ou a descobrir novas soluções” (p. 17).

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Reflexão na ação implica estar atento e perceber o momento de ajudar os

alunos utilizando diferentes estratégias, e a lidar com suas emoções cognitivas, a

confusão e a incerteza. Não existe aprendizagem sem confusão e incerteza, é um

processo mútuo. O professor reflexivo é aquele que incentiva e valoriza o instante

rico de confusão do aluno, inclusive a sua própria confusão. Não dar a resposta

pronta, imediata para o aluno é um contraponto à resposta exata, permitindo a

confusão. Professor reflexivo interage com a compreensão do aluno sobre um

determinado problema, e propicia uma relação interpessoal com o grupo classe.

Relação essa que envolve ressignificar o papel do professor como autoridade e

detentor do saber, sem receio de lidar com o erro, sem modelo do saber, mas

desafiando e despertando a curiosidade dos alunos.

Para Schön (1997), uma prática reflexiva tem que estar integrada ao contexto

institucional, a escola, pois, “quando um professor tenta ouvir os seus alunos e

refletir na ação sobre o que aprende entra em conflito com a burocracia da escola”

(p. 87). O professor deve aprender a transformar a escola e a sala de aula em um

espaço de escuta atenta e amorosa às vozes dos alunos.

O autor propõe um modelo de atuação, “practicum” reflexivo, para ser

utilizado pelas formações para que o professor se torne mais capaz de refletir, um

profissional prático-reflexivo. Entende por “Practicum – um tipo de aprender fazendo,

em que os alunos começam a praticar, {...} mesmo antes de compreenderem o que

estão a fazer. Tudo isso tem lugar [...] um mundo virtual que representa o mundo da

prática” (p. 89).

Um espaço formador no qual é permitido fazer experiências, errar,

compreender os erros, realizar tantas tentativas quantas forem necessárias e ter o

direito de fazer de outro jeito. Modelo de formação no qual professores ou futuros

professores podem tomar consciência de sua própria aprendizagem. No entanto,

assinala as dificuldades que as propostas de formação inicial e continuada,

apresentadas pelas universidades, têm em colocar em ação, o modelo practicum reflexivo como currículo formal, pois se encontram longe da prática e suas

investigações sobre as práticas na escola ainda estão distantes da real prática.

Presos a princípios formais, realizam uma prática que não contrapõe o saber escolar

e a compreensão espontânea dos alunos, que não valoriza o saber cultural da

escola, e desconsidera o modo espontâneo como os professores encaram o ensino.

Para Schön, o estágio deve ser mais valorizado nos currículos, um espaço de

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reflexão sobre a ação aplicada e observada, dando oportunidade de desenvolverem

“novas formas de raciocínio, novas maneiras de pensar, de compreender, de agir e

de equacionar problemas” (ALARCÃO, 1996, p. 25).

O formador em uma prática reflexiva tem sua atuação interpretada e

observada pelo formando. Ela envolve uma estratégia pessoal, heurística, em que a experimentação e a reflexão como elementos autoformativos desempenham um papel de primordial importância e assenta na ideia de que ninguém pode educar o formando se ele não se souber educar a si próprio (ALARCÃO, 1996, p. 18).

O professor ou futuro professor precisa deixar-se enredar pela investigação,

para transmutar seus conhecimentos e ampliá-los, para compreender o que está

sendo feito e poder realizar o proposto recriado e transformado pelo seu jeito de ser,

pela sua marca pessoal. No entanto, para a autora, essas estratégias formativas

exigem do formador ser um facilitador da aprendizagem, sabendo provocar a

reflexão, como também ter “uma extraordinária capacidade de interpretação,

compreensão do outro e capacidade de questionamento” (p. 29), o que se apresenta

como uma tarefa nada fácil.

Alarcão finaliza com esmero ao declarar de peito aberto: “entendo que

ninguém deve ser obrigado a ser reflexivo, embora todos devam ser estimulados a

sê-lo. E o todos começa em cada um de nós” (p. 186). Isto nos alerta para a

responsabilidade da formação, ela nos convida a provocar em todos, alunos e

professores, o querer ser diferente, o educar com e para autonomia, a postura

reflexiva, a prática com responsabilidade e o prazer de ser professor.

Ela nos remete a pensar sobre esse espaço formador, no qual o refletir exige

um registrar e um narrar reflexivamente para que se possa conhecer melhor o jeito

de ser, fazer e pensar do aluno, do formando e do professor. Conhecer para

respeitar. Conhecer para cooperar. Conhecer para instigar para o avanço.

As narrativas precisam ser olhadas por diferentes pontos de vista para que

seja possível perceber sua importância na compreensão do outro e o quanto

colabora na interpretação do conteúdo real que carrega em suas palavras. Desde

pequenos ouvimos dos outros suas histórias e enredamos os outros com nossas

histórias. Essa percepção provocou em Freitas e Fiorentini (2007) motivação para

“compreender e investigar a potencialidade das narrativas nos diferentes contextos

em que a matemática e a educação se fazem presentes” (p.63). Descrevem uso da

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narrativa como um “modo de refletir, relatar e representar experiência, produzindo

sentido ao que somos, fazemos, pensamos, sentimos e dizemos. [...] como modo de

estudar/investigar a experiência” (p. 63).

A experiência entendida sob o foco de Larrossa (1999, apud Freitas;

Fiorentini, 2007), como fenômeno narrativo comparado com uma viagem aberta, na

qual não são controlados nem os acontecimentos nem o ponto de chegada, não se

sabe o que vai acontecer, onde se vai e nem se vai chegar a algum lugar. Freitas e

Fiorentini (2007) utilizam as ideias de Larossa para explicarem que experiência

formativa é “aquilo que nos passa. Não o que se passa (o que podemos conhecer),

senão o que nos passa (como algo a que devemos atribuir sentido em relação a nós

mesmos)” (p. 64).

Os autores também se basearam em Clandinin, outro pesquisador, que

colaborou na elucidação do uso da narrativa nas formações, através da afirmação o professor, ao narrar de maneira reflexiva suas experiências aos outros, enquanto isso ele aprende e ensina. Aprende, porque ao narrar, organiza suas ideias, sistematiza e dá sentido a elas e, portanto novos aprendizados para si. Ensina, porque o outro, diante das narrativas e dos saberes de experiências do colega, pode resignificar seus próprios saberes e experiências (CLANDININ, 1993, apud FREITAS, FIORENTINI, 2007).

No entanto, os autores asseguram que, ao utilizar a metodologia de narrativa

no contexto de formação, ampliou-se a compreensão a respeito da dificuldade que

os alunos, futuros professores tinham em registrar suas reflexões e observações

nas/das aulas de Matemática. Para eles as narrativas não são meramente relatos de

experiências, elas envolvem reflexão e problematização dos saberes e práticas dos

sujeitos envolvidos, em um diálogo constante e consistente entre teoria e prática.

Com base em práticas de sala de aula que utilizaram a pesquisa narrativa, Freitas e

Fiorentini asseguram que a experiência vivenciada pelo pesquisador não se

apresenta em uma linearidade, processo onde as “informações coletadas e as

interpretações são retomadas em diferentes momentos e o próprio processo

narrativo é uma ‘narrativa’, um ‘historiar’, ‘rehistoriar’ e ‘rehistoriar’ novamente’” (CLANDININ; CONNELLY, 1991, apud FREITAS E FIORENTINI, 2007, p.68 ).

Acredito que a sala de aula deve ser vista pelo professor como um laboratório

de experiências, tal qual a ação de um pesquisador. O uso da narrativa nesse

ambiente, segundo os autores favorece um pulsar com movimentos direcionados

pelo tempo, idas e vindas. A experiência utilizando narrativa permite que tanto o

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professor quanto o pesquisador, emaranhados com a experiência, em um

experienciar a experiência e também ser parte integrante dela.

Narrando professor ou aluno produz e comunica seus saberes para si e para

os outros. As narrativas envolvem tempo e lugar. Ela abrange em seu texto o

contexto abarcando uma trama em um determinado cenário repletos de saberes,

trocas, reflexões e mudanças. Um contexto de experiências e saberes que vão se

enroscando e transformando, que segundo Alarcão (1996) essas construções

escritas e “construções verbais são fruto de uma reflexão [...] pode ocorrer em

simultâneo com a ação ou retrospectivamente” (p.16).

Saberes mobilizados e produzidos pelos professores que para Tardif (2000)

são temporais, plurais, heterogêneos, personalizados, situados e englobam

“conhecimentos, competências, habilidades (ou aptidões) e atitudes, isto é, aquilo

que muitas vezes foi chamado de saber, saber-fazer e saber–ser” (p.10,11). Afirma

que esses saberes envolvem história de vida e se desenvolve no decorrer da

carreira, são saberes variados advindos de diferentes fontes e a serviço da ação

onde adquirem significado e utilidade. Finalmente, considera que ao mesmo tempo

que os saberes contem valores, histórias, cultura, pensamentos eles carregam a

marca dos diferentes contextos que devem atender.

Para Tardif os saberes profissionais são saberes de ação, saberes do

trabalho, onde os saberes são mobilizados e construídos, logo “o profissional, sua

prática e seus saberes não são entidades separadas, mas, copertencem a uma

situação de trabalho, coevoluem e se transformam” (p.11).

Tardif e Raymond (2000) se interessaram pelos saberes profissionais dos

professores do Ensino Fundamental. Segundo eles, saberes mobilizados e empregados na prática cotidiana, saberes esses que dela se originam, de uma maneira ou de outra, e que servem para resolver os problemas dos professores em exercício e para dar sentido às situações de trabalho que lhes são próprias (TARDIF; RAYMOND, 2000, P. 211)

Essa reflexão, realizada pelos dois autores, colabora para que possamos

compreender o caminho delineado pelas práticas dos professores dos anos iniciais

que, num processo de fazer e refazer, vão reutilizando saberes, aprimorando-os,

transformando-os em novas práticas que, por sua vez, provocarão outros saberes.

Mesmo que, inicialmente, utilizem como modelo práticas dos profissionais que

fizeram parte de sua história de vida e que, muitas vezes, não conseguem

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reconhecê-las nos fazeres novos e diferentes. O ensinar Matemática diferente de

como lhe foi ensinado. Apesar de valorizarem as técnicas tradicionais do mesmo

jeito que seus professores, consideram que a diferença está pautada no uso de

diferentes estratégias para introduzi-las.

Para eles, a compreensão dos saberes dos professores está vinculada a

“compreender sua evolução, suas transformações e sedimentações sucessivas ao

longo da história de vida e de sua carreira; história e carreira que remetem a várias

camadas de socialização e de recomeços” (TARDIF; RAYMOND, 2000, P. 237).

Concluem que apenas após certo tempo de vida profissional e de carreira é

que o “eu” pessoal do professor emergido e envolvido no universo do trabalho, em

um processo lento, muda e se transforma preparando o surgimento de um “eu”

profissional. Um profissional, que pouco a pouco, vai se modificando, no individual e

na sua relação com o coletivo, com as formações e com a prática, em um apropriar

de teorias e em um enredar nas histórias de vida, sua e de seus alunos, construindo

e se constituindo em um profissional reflexivo.

No entanto, Zeichner (2000) alerta para que se tome cuidado ao tratar de

ensino reflexivo ou práticas reflexivas, a diferença de entendimentos pode significar coisas diferentes para pessoas diferentes, indo além da simples ideia de que “reflexivo” é sempre bom, porque não é assim necessariamente. Você pode ser mais reflexivo e prejudicar mais as crianças. A pergunta não é se os professores são reflexivos, mas como estão refletindo e sobre o que estão refletindo (ZEICHNER, 2000, p. 12)

Para ele, “o processo de aprender a ensinar começa muito antes dos alunos

frequentarem os cursos para professores” (ZEICHNER, 1992, p. 130), e por esse

motivo é preciso se preocupar e ajudar a elaborar as ideias, regras e saberes que

eles irão aliar as suas experiências. Nesse sentido, é preciso se preocupar com o

material de estudo oferecido, textos fáceis e compreensíveis em uma linguagem que

os alunos-futuros professores possam compreender e se apropriar de teorias

importantes para o seu trabalho diário. Conhecimento base para entenderem, como

outros estudiosos vêm afirmando, que a mudança não se dá por práticas isoladas,

individuais, mas uma mudança assumida por todos na instituição, seja ela a escola

ou a universidade.

Zeichner (2005) lamenta o “isolamento percebido entre os professores nas

escolas e os acadêmicos nas universidades, e reafirma a necessidade da

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construção de alianças entre eles para a melhoria da educação e, mais

especificamente, para a transformação social” (p. 71). Sugere algumas estratégias

de união entre as partes rompidas, professores na escola e entre escola e

universidade, como sendo maior envolvimento dos profissionais no espaço de

discussão da escola sobre materiais produzidos e a qualidade das investigações

desenvolvidas pela universidade e instituições de pesquisa. Projetos de pesquisas

inovadores realizados em colaboração com os professores nas escolas e, por último,

apoio a projetos de pesquisa-ação que respeitem o conhecimento produzido pelos

professores durante o processo.

Enquanto estas mudanças não acontecem, ato que necessita, segundo o

pesquisador, de uma grande dose de coragem e compromisso por parte dos

acadêmicos, é preciso muito empenho em construir caminhos que integrem os

produtos das pesquisas de professores no ensino nos programas de formação de

professores. A ideia de tratar seriamente o conhecimento produzido pelos

professores como um conhecimento educacional a ser analisado e discutido é uma

ideia que ainda incomoda a muitos acadêmicos.

Zeichner (2000) afirma que, para tal fato acontecer, é necessária uma conexão estreita entre a Formação de Professores na universidade com as escolas e as comunidades. Não deve haver atividades acadêmicas isoladas, em que as pessoas somente vão para as universidades e assistem aulas sobre mudança social. É preciso estudar as coisas em contexto. Talvez seja essa a maior mudança necessária. Para isso, os professores devem sair da universidade e passar mais tempo nas escolas, as quais precisam estar conectadas com as comunidades. (ZEICHNER, 2000, p. 14)

A presença dos futuros professores na escola provocaria, na própria escola,

um reolhar para as práticas vivenciadas em seu domínio; na universidade, a

necessidade de propostas de supervisão mais atuantes; no professor, a

conscientização de que seu ensino pode servir de modelo de prática para futuros

professores e, finalmente, no aluno-futuro professor, a oportunidade de conhecer e

refletir sobre o ensino real que está sendo praticado e não apenas aquele propagado

pelas teorias das universidades.

Todas essas dificuldades apresentadas por Schön, Zeichner e Alarcão

remetem o meu pensar sobre o transitar do conhecimento matemático na escola,

nas formações e nas instituições acadêmicas.

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Os alunos vêm para a escola com saberes matemáticos, intuitivos e/ou

formais, e a cada ano vão ampliando esses saberes espontaneamente e

formalmente. Os professores frente as suas “confusões” – conflito cognitivo

provocado pelos diferentes conhecimentos espontâneos de seus alunos – acabam

praticando um ensino muitas vezes centrado apenas no saber escolar, no

conhecimento do conteúdo, na valorização da técnica, do passo a passo. Entretanto,

instigados pelas formações participativas, por projetos em parceria com a

universidade, pelos novos aprenderes, pela reflexão, e reforçados pelos estudos

reflexivos na escola, os professores transpõem a valorização do ensino

convencional e se abrem para reconhecer e interpretar os diferentes saberes

produzidos, de modo a recriar a própria prática e vivenciá-la diferentemente.

Para esse salto acrobático, é propagado que o professor que ensina

matemática deve estar seguro o suficiente do conhecimento do conteúdo

matemático, saber que permita um transitar pelos diferentes assuntos inter e

intramatemática, compreendendo-os, relacionando-os e aplicando-os na realidade

local.

Um saber matemático que dê segurança suficiente para provocar diferentes

formas de aprender, que respeite e amplie procedimentos pessoais e formais de

resolver e solucionar problemas. Um saber matemático que dialogue, provoque e

consolide conhecimentos novos ou já adquiridos, em uma prática reflexiva e

investigadora. Um saber matemático que se preocupe com a cidadania.

Para D’Ambrosio (2000), proporcionar “a todos o espaço adequado para o

pleno desenvolvimento de criatividade desinibida que, ao mesmo tempo, preserva a

diversidade e elimina as inequidades” (p.121). Uma educação pautada na ética da

diversidade na qual o respeito, a solidariedade e a cooperação são praticadas em

todas as ações dentro e fora da sala de aula. O grande pensador9 afirma com muita

propriedade que a matemática é um instrumento importantíssimo para a tomada de decisões, pois apela para a criatividade. Ao mesmo tempo, a matemática fornece os instrumentos necessários para uma avaliação das consequências da decisão escolhida. A essência do comportamento ético resulta do conhecimento das consequências das decisões que tomamos. (D’AMBROSIO, 2002).

                                                            9 Teleconferência no Programa PEC – Formação Universitária, patrocinado pela Secretaria de Educação do Estado de São Paulo, 27 de julho de 2002. Disponível em: http://sites.uol.com.br/vello/aprendida.htm .

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A Matemática praticada com visão desafiadora coloca professor e aluno frente

a situações inesperadas que exigem tomada de decisão imediata, acionando todos

os conhecimentos e entendimentos para que apontem os resultados, sejam eles

certos ou errados. Esse momento de contraponto exige solidariedade, respeito pelos

saberes individuais e, ao mesmo tempo, cooperação para avançarem e superarem

as decisões tomadas.

Para o professor permitir esse movimento proposto, o saber matemático ou o

conhecimento da Matemática que ele precisa dominar, segundo a teoria de Shulman

(1986), é parte do conhecimento do conteúdo necessário para que o professor se

torne um profissional reflexivo e capaz. Shulman categoriza o conhecimento do conteúdo em “conhecimento do conteúdo do assunto, conhecimento pedagógico do

conteúdo e conhecimento curricular” (p. 9).

Transpondo para a Matemática a contribuição do pesquisador, é possível

entender que o conhecimento do conteúdo dos diferentes assuntos matemáticos vai

além de saber fatos e conceitos ou de dominar os tópicos que compõem a

Matemática. Ele envolve compreender a estrutura matemática e possuir argumento

para justificar a escolha de um determinado assunto em detrimento de outro.

Com relação ao conhecimento pedagógico da Matemática, ele abarca

diferentes formas de representação matemática para torná-la acessível, bem como a

compreensão de como se dá as facilidades e dificuldades na aprendizagem de cada

aluno e o conhecimento de estratégias para reorganizar, ampliar ou superar a

compreensão ou incompreensão do assunto.

O autor afirma que o conhecimento curricular envolve transitar lateralmente e

verticalmente pelos programas curriculares. É preciso utilizar uma variedade de

materiais didáticos indicados pelo programa, bem como ferramentas para corrigir,

avaliar e intervir na trajetória do conhecimento matemático dos alunos, conhecer um

conjunto de características que servem como “indicadores e contraindicadores para

o uso de um determinado currículo” (Shulman, p.10).

Segundo Shulman, há uma omissão nos programas de formação de

professores, com relação ao ensino do conhecimento pedagógico e do

conhecimento curricular. Esses conhecimentos necessários para apoiar a tomada de

decisão dos professores que ensinam Matemática frente à diversidade encontrada

na sala de aula e para sustentar a argumentação da opção curricular que acredita.

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O quadro teórico incitado por Shulman e seus colegas é fonte de estudos

realizados por Ball et al. (2008), que aprofunda a noção do conhecimento do

conteúdo pedagógico e a ligação entre o conhecimento e a prática, no contexto da

Matemática. Conhecimentos esses que são esperados na prática do professor, mas

que pesquisadores têm verificado a ausência ou inadequação desses

conhecimentos nos professores entrevistados. Esses decidem focar no trabalho de

ensinar, ensinar Matemática. Uma teoria com base “na prática do conhecimento

matemático para o ensino [...] preocupada com as tarefas envolvidas em ensinar e

as necessidades matemáticas destas tarefas” (p.395).

Uma teoria que vem contribuir para uma nova visão cujo holofote sai da figura

do professor e ilumina o como acontece seu ensino. Quebra com paradigmas

antigos, nos quais “bom” professor era aquele que falava matematicamente difícil e

apresentava uma postura segura, mesmo que apresentasse uma porcentagem alta

de alunos com conceitos insuficientes.

As pesquisas de Ball e seus colaboradores revelam que um professor precisa

saber mais Matemática e diferentes matemáticas para poder interpretar a fonte do

erro de seus alunos com fluência e eficiência. Para eles, o professor deve Ser capaz de se envolver nesse tipo de diálogo matemático profundo e fornecer respostas matematicamente plausíveis [..] é embasamento fundamental para determinar o que fazer no ensino desta matemática. Professores [...] têm que descobrir o que os alunos fizeram, se o pensamento é matematicamente correto para o problema, e se a abordagem funcionaria em geral. (BALL ET AL., 2008, p. 397) [ tradução nossa]

Ball et al. ampliam as categorias de Shulman e provocam uma reflexão sobre

as tarefas cotidianas de ensino e suas exigências. Perceberam que muitas tarefas

exigem conhecimento, percepção e habilidade matemática “ilustrando o pensamento

matemático especial que professores devem pensar e compreender a fim de ensinar

Matemática” (p. 398). Ensinar exige conhecimento que extrapole aquele ensinado

aos alunos. Ensinar é antecipar as facilidades, as dificuldades e as confusões dos

pensamentos dos alunos. Ensinar é tomar decisão e fazer escolhas da

sequenciação dos conteúdos, dos métodos a serem adotados e dos procedimentos

diferenciados que tenham validades como ferramenta instrucional.

Os estudos realizados apresentam contribuições importantes para realizar a

análise das práticas das professoras que ensinam Matemática e indicam alguns

interesses que conversam com a minha investigação. Eles estão interessados em

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entender como os professores raciocinam matematicamente e como eles embasam

as decisões e movimentos realizados ao ensinar. Isso inclui, para esses

pesquisadores, “habilidades, hábitos, sensibilidades, formas de raciocínio, bem

como conhecimento” (BALL et al., 2009, p. 98).

Esses autores abordam situações práticas e particulares do ensinar

Matemática nos anos iniciais do Ensino Fundamental. Apresentam o professor

diante da sua dificuldade do conteúdo matemático e a repercussão do problema

frente às diferentes possibilidades que os alunos apresentam, sejam elas erradas ou

não. Além disso, muitas vezes, eles não têm a possibilidade de fazer escolhas

curriculares ou de materiais didáticos e esbarram no seu cotidiano com as propostas

e documentos oficiais que exigem um ensinar diferenciado e o conhecimento de

diversas possibilidades de estratégias e situações investigativas. Ball et al. nos

mostrou o quanto é importante conhecer a Matemática a ser ensinada, e saber

utilizá-la de maneira útil para que ela faça sentido e seja compreensível para o

aluno.

O trabalho realizado pelo professor em sala de aula acaba sendo fruto dos

estudos realizados em suas formações, das experiências vivenciadas por ele e por

seus alunos. O desempenho dos alunos reflete a somatória do conhecimento de

Matemática do professor e do conhecimento do conteúdo pedagógico que ele utiliza

para ensinar Matemática. O professor que assume o papel de investigador em sala

de aula oferecendo atividades desafiadoras percebe que realiza um ensino com

muito mais profundidade e se surpreende com a capacidade de seus alunos em

encontrar soluções diferenciadas.

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3.3 PROBLEMAS A RESOLVER: CONTA, RECONTA, REVELA E DESVELA OS

NÚMEROS

Muitos professores que ensinam Matemática no Ensino Fundamental

ressaltam as dificuldades que os alunos apresentam ao realizarem situações que

envolvem números. Os números e as operações, na solução de problemas, são

pontos nevrálgicos que afetam a relação de alunos e professores polivalentes com a

Matemática, formando uma rede intrincada pelas dificuldades que prejudicam o

transitar seguro e eficiente por outros conteúdos matemáticos. Para romper os “nós”

formados por esta rede, busquei argumentação concreta e salutar em alguns

autores para compreensão de como as crianças pensam e lidam com os números,

para ampliação do conhecimento histórico que envolve leis e princípios que regem o

funcionamento dos números e, finalmente, sobre a relação entre os números e as

situações-problema.

Inicialmente, falar de Sistema de Numeração Decimal é reconhecer um

sistema que envolve dois princípios: princípio da base dez e princípio de posição.

Base dez, a cada dez unidades de uma ordem nos remete a unidade superior, em

um processo hierárquico e de agrupamento. Dezenas agrupadas se transformam em

centenas e estas agrupadas, milhares e assim por diante.

Segundo o historiador Ifrah (1997), o sistema utiliza para a enumeração

escrita, símbolos que são denominados de algarismos arábicos e representados por

1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 0. Os nove primeiros algarismos representam as unidades

simples e são regidos pelo princípio de posição. O valor do número é determinado

pela posição que cada algarismo ocupa no número escrito. Com relação ao “zero” o

autor afirma quanto ao décimo símbolo, ele não representa o que se chama o “zero”; serve para marcar a ausência de algarismos de uma certa ordem, tem também o sentido de “número nulo”, resultado, por exemplo, da subtração de um número dele mesmo (IFRAH, 1997, p. 49).

Com relação ao uso do zero como guardador de lugar, Brizuela (2006)

completa a informação afirmando que o seu significado era utilizado pelos

babilônios, mas à notação atual do zero, “tanto para indicar o número zero como

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para funcionar como guardador de lugar – parece ser uma invenção relativamente

recente (após o século VI, mas antes do XII)” (p. 28).

Segundo a autora, o aprendizado que envolve números escritos vai além de

aprender a escrever apenas os símbolos isoladamente. Envolve também “aprender

sobre o sistema em si e as regras que o compõem”(p. 27). Sua investigação, tanto

quanto de outros estudiosos, esclarecem-nos como os alunos entendem os números

escritos e as hipóteses que eles criam sobre o funcionamento dos números e de

outras notações matemáticas. Ela verificou que eles apresentam uma complexidade

de pensamento e de compreensões com relação aos números. Os alunos criam

hipóteses, através da interação entre as invenções e as convenções, para justificar

os padrões encontrados na notação numérica.

Inventar e criar tem um papel destacado para a construção de conhecimento

pela pesquisadora, pois tanto as convenções como as criações do indivíduo desempenham um papel na recriação do conhecimento social aceito e na compreensão das convenções matemáticas [...] por meio da interação entre convenções e invenções, as invenções tornam-se mais ricas, e as convenções passam a ter mais significado pessoal para o aprendiz (BRIZUELA, 2006, p. 56, 57).

Diante dessas constatações, é possível avaliar o valor das notações

provisórias dos alunos para a escrita dos números; notação considerada durante

muito tempo pelos professores, como sendo um erro grave, justificado pela

desatenção.

As dificuldades ou facilidades observadas nos alunos durante as aulas têm

um ligação estreita com a ressalva feita por Brizuela ao observar o quanto uma

escrita numérica imperfeita “não reflete as reflexões feitas pela criança sobre o

sistema de numeração” (p.32).

As escritas dos números dos alunos apresentam convenções padronizadas

para justificar partes desconhecidas ou não lembradas, do número proposto.

Números coringas10, utilizados na escrita com maior freqüência – normalmente o 0

(zero) e o 1 (um) – são usados pelos alunos “quando estão cientes de que um

elemento adicional deveria estar incluído em sua escrita, mas não tem certeza de

qual algarismo incluir” ( p.34).

                                                            10 Termo denominado por Alvarado e Ferreiro, segundo a pesquisadora Bárbara Brizuela.

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Outra compreensão importante do sistema, observada pela pesquisadora, é

de que alunos, mesmo os pequenos, diferenciam os números com um algarismo dos

com dois algarismos e compreendem que “números com nomes diferentes precisam

ser escritos de forma diferente e que algarismos conhecidos (1 a 9) fazem parte dos

números de dois algarismos ” (p.35).

Outro termo apresentado pela autora, números transparentes, está

relacionado aos números escritos cujos elementos podem ser identificados a partir

dos números falados (seu nome). São os números que seguem, “na escrita e na

fala, uma ordem temporal maior + menor” (p.36). Entretanto, a ordem temporal

oposta deixa o ouvinte no escuro sobre a escrita dos números. Para esses números

no escuro, termo utilizado por Greenberg (1978, apud Brizuela, 2006, p. 36), que

ficou convencionado entre os professores, números opacos. Por exemplo, no

número 19 (dezenove) – dez+nove, 600 seiscentos – seis+cento, o nome possibilita

perceber o número inicial, são números transparentes. Quanto ao número 200

(duzentos), é difícil identificar no nome o dois, afinal, para as crianças o duzentos

está mais parecido com o doze, do que com o dois. Em se tratando dos números

opacos, os alunos, frente às situações desafiadoras de escrita constante aliada a

memorização, vão gradativamente substituindo as escritas inventadas, pelas

convencionais.

A complexidade do valor posicional tem sido considerado uma das

contribuições mais elaboradas da humanidade. A relação que o aluno tem com o

valor posicional tem sido fonte de estudos de muitos pesquisadores. Uma das

primeiras a levantar essa problemática foi Kamii (1986), que alertou sobre a

dificuldade dos alunos dos anos iniciais do Ensino Fundamental, em compreender o

valor posicional. Para apoiar sua afirmação apresenta outras pesquisas (M. Kamii,

1980; Bednarz, Janvier, 1982; Ross, 1986; Cauley, 1988), cujos resultados vieram

corroborar com os percebidos por ela. Para Kamii (1997), é muito importante que

cada aluno compreenda o valor posicional para que no futuro não tenha “sérias

dificuldades em somar, subtrair, dividir e multiplicar grandes números” (p. 35).

Contudo, para Brizuela (2006), apesar de os alunos não compreenderem “por

completo o valor posicional como uma regra que governa o nosso sistema numérico”

(p.37), podem ser capazes de desenvolver ideias sobre a importância da ordem e da

posição dos números. Na comparação de dois ou mais números, a posição faz

diferença durante a análise. A observação recai ou no valor dos números

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isoladamente ou na soma desses números. Para melhor compreender, ao

compararem os números 23 e 32, para alguns alunos, eles são iguais. Não

consideram o valor posicional, apenas os algarismos isoladamente, os dois números

são formados por 2 e 3. Para confirmarem suas hipóteses, buscam a soma dos

algarismos, no número 23 – 2+3 e no número 32 – 3+2, obtendo o mesmo resultado,

mantém a afirmação.

De forma similar, as situações descritas por Brizuela são também percebidas

nos alunos dos anos iniciais que frequentam nossas escolas. Eles inventam

mecanismos para enfrentar os desafios oferecidos pelos professores e durante a

realização das tarefas é possível perceber o uso de números coringas, e o quanto a

transparência e a opacidade dos números ajudam-nos na aproximação ou não da

escrita convencional. Esse conhecimento tem ajudado a despertar em muitos

professores uma sensibilidade ao compreenderem e aceitarem a quantidade de

conhecimento existente nas escritas não-convencionais, inventadas com criatividade

por seus alunos.

No entanto, a autora apresenta uma situação que aparentemente não foi

encontrada com a mesma constância entre os alunos da nossa escola. Talvez a

causa seja a necessidade de uma investigação mais apurada do que nossos alunos

pensam ao lerem números desconhecidos. Ela apresenta uma invenção infantil para

resolver o conflito do valor posicional na escrita e leitura de números. Muitas vezes,

na escrita, eles não se preocupam com o valor posicional, apenas usam a forma

convencional observando o conhecimento social. Na escrita do número 12, por

exemplo, eles sabem que vem na ordem o 1, antes do, 2. Muitos não construíram a

noção de que o 1 representa 10 unidades.

Diante deste conflito, Brizuela (2006) apresenta um caso no qual Paula desenvolveu a ideia dos números maiúsculos. Seus números maiúsculos reuniam muitas ideias. [...] A posição ocupada pelos números torna-os diferentes de alguma maneira. . [...] se os números estão em posições diferentes, ou são diferentes de alguma maneira, então eles devem ter nomes diferentes. [...] A posição em que os números eram escritos determinava se eram ou não ‘maiúsculos’ e, assim, que número era e como seria lido. Essa hipótese permitiu à Paula começar a ler e escrever sistematicamente números de dois algarismos. (BRIZUELA, 2006, p.54).

Segundo a pesquisadora, é tomado emprestada a terminologia da linguagem

escrita, na qual cada letra tem uma minúscula e uma maiúscula correspondentes.

Apesar de serem iguais, dependendo da posição ocupada na palavra, se tornam

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diferentes. Ela transfere o percebido na escrita alfabética para solucionar conflitos

com a leitura dos números. Números iguais em posições diferentes são lidos de

forma diferente, as unidades diferentes das dezenas. Só para ilustrar, no número 33

temos um 3 onde se lê trinta e o outro 3, lê-se três mesmo, logo, temos trinta e três.

No sentido de expandir o conhecimento do pensar dos alunos a respeito dos

números, garimpei na pesquisa de Lerner e Sadovsky (1996), contribuições

importantes que pudessem ajudar o professor em sua reflexão e aprimoramento

profissional. Elas realizaram situações como “ditado de quantidades” e utilizaram

jogos para delinear o percurso das hipóteses dos alunos ao escreverem e

compararem números.

Inicialmente, as autoras observaram que alunos, ao comparem números,

mesmo sem conhecerem a denominação oral, levantavam hipóteses da magnitude do número – “quanto maior a quantidade de algarismos de um número, maior é o

número” (p.77). Ao compararem números de um algarismo com números de dois

algarismos estabeleceram uma ferramenta para a comparação de quaisquer

números com quantidade diferente de algarismos.

No entanto, os estudos de Lerner e Sandovsky (1996), como os de Brizuela

(2006), observaram em alguns entrevistados a mesma atitude ao compararem dois

números como: 112 e 89 ou 1110 e 999. Eles parecem abandonar a hipótese de que

a quantidade de algarismos é quem manda e afirmam que 89 e 999 são os maiores.

Como foi apontado em Brizuela, as hipóteses da soma dos algarismos 8+9=17

definem o número maior, ou analisam números formados com algarismos altos, 999.

Lerner e Sandovsky constatam que os alunos, ao compararem números de

mesma quantidade de algarismos, perceberam que a posição dos algarismos

cumpre um papel de destaque no sistema de numeração. Elas sabem que, para

definir o maior entre dois números de quantidade igual de algarismos, “o primeiro é

quem manda [...] sabem que, quando o primeiro algarismo das duas quantidades é o

mesmo, é preciso se apelar ao segundo para decidir o maior” (p.81). Encontraram

conflitos em alunos que utilizaram por diversas vezes suas hipóteses com

segurança, mediante uma situação conflituosa apelam para os algarismos maiores

independente de suas posições. Por exemplo, entre 24 e 16 o maior é 16, pois a

observação recai sobre o último algarismo.

As autoras apresentam mais uma observação, que particularmente, derruba a

justificativa das extensas listas numéricas pedidas pelos professores para que os

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alunos guardassem a ordem da série numérica. Afirmam que os alunos manipulam

em primeiro lugar a escrita dos “nós”, as dezenas, centenas, as escritas exatas,

para posteriormente elaborarem os intervalos entre eles, indo em um sentido inverso

à escrita convencional. Somente os “nós” eles reconhecem na ordem convencional.

Utilizam esse conhecimento na leitura dos números, partem dos nós para chegar até

o número a ser lido. Para ilustrar, os alunos ao escrevem com segurança 10, 100,

1000, 5000, podem ter dúvidas ao escrever 25. Para o escreverem, inicialmente

pensam no número exato, o 20, e vão contando ou escrevendo todo o intervalo, até

chegarem ao número 25.

Declaram que os alunos elaboram hipóteses “a respeito dos números,

baseando-se nas informações que extraem da numeração falada e em seu

conhecimento da escrita convencional dos ‘nós’ ” (p. 92). Na produção de escritas

desconhecidas, misturam os símbolos que conhecem e os organizam na mesma

ordem da numeração falada. A justaposição de palavras da numeração falada

evidencia uma operação aritmética, aditiva ou multiplicativa. Para ilustrar temos que

duzentos e quarenta e cinco representado por 200405, que é aditiva, e que dois mil

representado por 21000, multiplicativa. Na medida em que os alunos são colocados

em conflito, a insatisfação com as próprias escritas leva-os à correção, aos ajustes.

Numa reelaboração de suas escritas na medida em que percebem as regras

que regem a escrita convencional, que os “dezes” se escreve com dois algarismos,

os “cens” com três, os “mils” com quatro e assim por diante.

Como um sistema posicional se apresenta estruturalmente econômico e ao

mesmo tempo muito menos transparente, exige que os alunos descubram as

regularidades, conforme Lerner e Sandovsky (1996) que afirmam: “elas pensam ao

mesmo tempo sobre os “dezes”, os milhões e os milhares, elaboram critérios de

comparação [...]; podem conhecer a notação convencional de números muito

“grandes” e ainda assim não manipular números menores” (p.113). Alertam que o

ensino da notação numérica iniciava a sequência com a unidade, depois era

introduzido a dezena e os agrupamentos de dez em dez e outros agrupamentos

para avançar a cada nova ordem. Esse ensino tradicional que ainda é visto nas

nossas escolas acaba impedindo descobertas dos diferentes intervalos da

sequência, das regularidades e das regras que organizam o sistema de numeração.

Ao apresentar as contribuições de Moreno (2006), trarei os estudos realizados

por Nunes e Bryant (1977), Vergnaud (2009) e Castro e Rodrigues (2008),

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realizando um diálogo interativo, apontando os pontos comuns ou diferenças de

nomeações, com a intenção de clarear, despertar e complementar as ideias sobre o

contar e recontar dos números nos anos iniciais.

Moreno parte da premissa de que os alunos trazem para a escola uma

importante bagagem de ideias construídas para iniciar a aprendizagem matemática

e apresenta uma proposta de ensino do número e do sistema de numeração

consolidada por resultados de diferentes pesquisas para colaborar na tomada de

decisões didáticas dos professores.

Nunes e Braynt consideram que, para ensinar Matemática, de forma que

todos se tornem numeralizados11, é preciso observar e saber como os alunos

aprendem Matemática e como eles ampliam seu pensar matemático, indo

gradativamente do simples para o complexo.

Vergnaud garante que a noção de número não é uma noção elementar, mas

a mais importante da matemática ensinada na escola. Afirma que ela se apoia em

outras noções, como as de aplicação, correspondência biunívoca, relação de

equivalência e relação de ordem. A diferença entre a noção de número e as outras

noções é a possibilidade de fazer adição.

Castro e Rodrigues exploram a ideia de sentido de número, como um

componente chave da literacia12 matemática e como evolui e se dá a construção do

sentido de número nos primeiros anos escolares.

3.3.1 Da recitação à contagem: um resgate didático

Moreno (2006) resgata a recitação quando evidencia que os alunos possuem

conhecimentos sobre a série numérica oral, apesar de ela se apresentar de forma

diferente em cada um. A diferença não envolve apenas a “extensão do intervalo

numérico conhecido por eles, mas também nas diversas competências implicadas

na recitação convencional” (p. 55). Para isso, há necessidade de colocar os alunos

frente a diversas situações de recitação, como destacam Parra e Saiz (1992, apud                                                             11 Numeralizada(o), para autora, designa criança ou adulto que domine o sistema numérico e as operações, pensando com conhecimento matemático. 12 Literacia ou numeracia – termo relacionado à alfabetização matemática, a aritmética dentro de uma matemática atual e dinâmica que compreende, analisa e intervém na sociedade atual.

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Moreno, 2006): recitar a partir do 1 até onde domina; recitar e parar no número

pedido; recitar intercalando palavras; recitar a partir de um número diferente de um;

recitar ascendentemente e descendentemente de 2 em 2, de 5 em 5, de 10 em 10 e

outros.

Em se tratando de sequência numérica, Vergnaud (2009) assegura que os

alunos, quando a enunciam, podem estar situados em dois níveis diferentes. O nível

da simples recitação, canto de números, em que os alunos recitam as palavras na

ordem em que sabem. Mesmo ela se enganando, o que às vezes acontece, não é

possível afirmar que ela saiba contar. De maneira idêntica, Moreno afirma que

“saber recitar a série não é a mesma coisa que saber contar elementos de um

conjunto” (p. 56). No entanto, a recitação colabora para que cada aluno guarde a

palavra na ordem correspondente, se esquece, apoiado pelo grupo-classe, lembra e

prossegue. Outra justificativa da recitação é que ela permite, de forma lúdica,

adentrar nas operações mentais, que consistem em somar de 2 em 2, de 3 em 3,

assim por diante.

No entanto, o outro nível que Vergnaud destacou é o nível da contagem, que

é a correspondência entre objetos a serem contados e a sequência numérica falada,

acompanhada de gestos das mãos e movimentos dos olhos. Para ele, a contagem é

a primeira forma de aplicação numérica, apesar de ainda rudimentar.

Com relação ao saber contar, Nunes e Bryan (1997) afirmam que os alunos,

ao contarem coisas, precisam lembrar a palavra certa (nome do número) em sua

ordem certa e contar cada objeto uma única vez. O número final contado,

denominado número cardinal, se refere ao número de objetos no conjunto.

Na medida em que os alunos recitam a série, vão descobrindo parte do

quebra cabeça, a regularidade e organização do sistema, conforme evidenciam

Moreno, Nunes e Bryant.

Ao recitarem, muitas vezes os alunos falam dez, dez um, ou dezoito,

dezenove, “dezedez”, que ao serem corrigidos, continuam a recitação. Segundo

Nunes e Bryant (1997), os alunos devem aprender para o que serve a contagem,

pois contar é uma das formas de resolver alguns problemas, ou às vezes, a única

forma.

Castro e Rodrigues (2008) apresentam uma análise das pesquisas que

consideram “o conhecimento da sequência numérica e a capacidade de contagem

como o ponto de partida para o desenvolvimento do conceito numérico” (p.121).

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Os estudos de Guelman e Gallistel (1978, 1983, apud Nunes e Bryant,

Moreno, Castro e Rodrigues) sobre contagem definem que para contar há

necessidade de alguns princípios. Como primeiro princípio, temos o “princípio de

adequação única”, “princípio termo a termo” ou “correspondência termo a termo”13,

que destaca que, ao contar objetos, deve-se contar todos os objetos e contá-los

apenas uma única vez. Contar estabelece uma correspondência termo a termo entre

o objeto e a “palavra-número” (MORENO, 2006, p. 56), e a série contada deve

respeitar a ordem convencional. Além disso, se a mão for mais rápida que a boca,

contar duas vezes o mesmo objeto, pular objetos, não se estabelecerá a

correspondência e o resultado da contagem será um resultado errado.

Um segundo princípio, da “ordem lógica”, “ordem constante” ou “ordem

estável”, mostra que existe uma ordem fixa para dizer os nomes de números da

sequência, a cada vez que for contar. A contagem só altera o total dos objetos a

serem contados se a ordem da palavra falada não respeitar a ordem convencional

da série. Aliás, se um aluno contar as cartas de um jogo 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7 e outro

colega contar as mesmas cartas 1, 2, 6, 3, 7, 5, 4, os dois alunos chegaram a totais

diferentes para o mesmo conjunto de cartas.

O terceiro princípio é o “princípio da cardinalidade”14, que corresponde o total

de objetos ao último número falado na contagem. Para Nunes e Bryant, “usamos

rótulo em contagem, dizemos até cinco (1-2-3-4-5) então deve haver cinco objetos

juntos na coleção contada” (p. 37). O último termo indica o total de objetos contados.

Contudo, Moreno destaca a situação de um aluno que ainda não reconhece o

princípio, diante da questão “Quantos lápis há?” conta todos os lápis e, se a

pergunta for repetida, ele repete toda a recitação novamente.

No quarto princípio, “princípio de indiferença da ordem” (Moreno, 2006) ou

“Irrelevância da ordem” (Castro e Rodrigues, 2008), é preciso compreender que a

ordem utilizada para contar os objetos não interfere na quantidade de objetos; pode-

se contar de cima para baixo, da direita para a esquerda e vice-versa.

Castro e Rodrigues apresentam um último princípio “Abstração” que define

que em quaisquer situações, com distintos objetos, são utilizados sempre os

mesmos números. Destacam que, na medida em que esses princípios vão sendo

                                                            13 Os termos utilizados pelos autores citados: Moreno, Nunes e Bryant, Castro e Rodrigues estão dispostos na ordem em que são citados. Esta ordem é valida para o primeiro e segundo princípios. 14 Termo utilizado por todos os autores citados: Moreno, Nunes e Bryant, Castro e Rodrigues..

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compreendidos, a possibilidade de lidar com conjuntos numerosos gradativamente

aumenta. As estratégias de contagem ainda são as mais eficientes para lidar com

qualquer situação numérica. Dando continuidade, Moreno (2006) complementa que

resolver problemas é um caminho pelo qual os alunos poderão gradativamente se

apropriar desses princípios e perceber que a contagem é uma boa estratégia para

encontrar soluções.

Vergnaud (2009) observou que a disposição espacial dos objetos interfere na

contagem, levando os alunos a contar duas vezes o mesmo objeto e declarou que,

paralelamente a atividade de contagem, os alunos devem ser colocados frente a

outros aspectos do número. Observou também que a correspondência termo a

termo, na equivalência entre dois conjuntos, não são facilmente observáveis

impedindo os alunos de supor que a grandeza de um conjunto não se altera em

qualquer configuração espacial assumida por ele.

1º Momento:

Figura 1: Conjunto de formas geométricas. Arranjo A Fonte: Adaptado de Vergnaud (2009).

2º Momento:

Figura 2: Conjunto de formas geométricas. Arranjo B. Fonte: Adaptado de Vergnaud (2009).

Vergnaud afirma que alguns alunos frente a essas situações entram em

conflito e a resposta se apoia na ocupação do espaço, tem mais objetos a coleção

que ocupa mais espaço. O autor enfatiza, com certa admiração, que isso foi

observado mesmo que os alunos pequenos vejam a arrumação e tenham afirmado

que na atividade anterior, “é a mesma coisa” (p. 128).

Observo que os alunos declararem seguramente que ambos “são iguais” tem

relação com o fato de eles buscarem a confirmação da igualdade, na contagem. É

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percebido que a quantidade de objetos maior e a distribuição no espaço pode levá-

los novamente ao conflito e impulsioná-los a buscar novos recursos para garantir

uma contagem segura e uma resposta adequada. Objetos distribuídos de forma

circular, ou organizados aleatoriamente sobre a mesa, nas coleções fixas arranjadas

na forma circular ou distribuídas aleatoriamente no papel, utilizando formas com

mesma cor ou cores diferentes, são situações muito conflitantes e que exigem

colocar tudo o que sabem na busca da solução.

A contagem de coleções de objetos também foi observada por Nunes e

Bryant (1997) que, com base nos resultados da pesquisa de Fuson(1998), afirmam

que dependendo da idade o princípio de correspondência termo a termo não é

utilizado durante a contagem de objetos distribuídos em linha reta ou outros

arranjos. Esclarecem que elas até respeitam o princípio em filas com espaçamentos

regulares e conseguem encontrar um resultado, mas se perdem em distribuições

aleatórias. Os autores prosseguem: se os alunos adotam a estratégia de mover para

um lado os objetos contados, eles “definitivamente entendem a necessidade do

princípio da correspondência termo a termo” (p.39). Entretanto, se colocados frente

a arranjos em situações fixas, o conflito novamente se instaura, pois precisam

acionar outras estratégias que garantam deixar de lado cada objeto da coleção já

contado. Assim sendo, se o sistema de contagem for utilizado pelos alunos como o

“modo de trabalhar uma solução para um problema específico, podemos estar

razoavelmente seguros de que [...] demonstrou uma compreensão do sistema”

(NUNES; BRYANT, 1997, p. 43).

Na mesma direção encontramos Moreno (2006) com a afirmação de que o

aluno precisa considerar a contagem como uma ferramenta para resolver

problemas. Muitos alunos utilizam esse recurso como procedimento confiável para

resolver problemas. Eles buscam os dedos ou rabiscos como recurso para poderem

confirmar seus resultados, principalmente quando não é claro que a escrita

matemática dá conta de representar o cálculo realizado mentalmente.

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3.3.2 Resolver Problemas: o conta e reconta

Problema é um conteúdo matemático que tem sido discutido à exaustão, mas

que ainda suscita muita dúvida para o aluno em entender e, para o professor em

resolver e ensinar. Os professores apresentam dificuldades em compreender a

linguagem matemática que os problemas carregam e na escolha dos procedimentos

adequados para resolvê-los. Esse fato presenciado muitas vezes nas formações

continuadas de Matemática trouxe à tona a questão que motivou um querer saber

mais. Como é possível ensinar com segurança algo que encerra no próprio interior

tantas incertezas no seu fazer?

Ao analisarem os saberes nas práticas, Ball et al (2008) apontam a

necessidade de o professor em saber mais, e de forma diferente, o conhecimento

matemático. Mas, além disso, é essencial impregnar esse conhecimento com

conteúdo pedagógico que ajude a ensinar Matemática e que clareie o processo de

aprendizagem de seus alunos e onde estão suas dificuldades. Para dar conta desta

tarefa tão complexa que é ensinar, os professores precisam se apropriar de teorias

diferenciadas e conhecer outras práticas para sobrepujarem suas dúvidas e praticar

um ensino de avanço com foco no fazer e resolver problemas.

Soares e Pinto (2001) destacam a importância de resolver problemas, pois

essa ação favorece o desenvolvimento de estratégias ou procedimentos e permite a

circulação por diferentes conhecimentos matemáticos em situações distintas e

variáveis. Ao resolver problemas os alunos são colocados diante de situações de

aprendizagem que permitem ser estimulados e desafiados, levando-os ao “raciocinar

logicamente para indicar soluções” (p.6).

Entretanto, cabe esclarecer de qual problema estamos tratando por ser uma

atividade muito explorada nas aulas de matemática. Problema é considerado uma

situação em que não disponhamos de procedimentos automáticos que nos permitam solucioná-las de uma forma mais ou menos imediata, sem exigir, de alguma forma, um processo de reflexão ou tomada de decisões sobre a sequência de passos a serem seguidos (ECHEVERRÍA; POZO (1998p.16).

Caso tenha uma forma ou fórmula imediata que leve a solução não mais será

um verdadeiro problema, mas um exercício. A situação precisa ser reconhecida

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como um problema, pois a mesma situação pode ser problema para uns e exercício

para outros.

Da mesma forma, Nunes e Bryant (1996) propõem envolver os alunos em

situações nas quais possam utilizar a “contagem para resolver problemas e[...]

possam fazer inferências com base na contagem [...] e transformar a contagem

numa ferramenta de pensamento” (p. 53).

Para isso, o professor precisa utilizar situações que sejam verdadeiros

problemas e não apenas exercícios para simples aplicações de contas. Ele precisa

reconhecer a importância de resolver problemas para aprender Matemática,

segundo Soares e Pinto (2001), e exercer um papel de “incentivador, facilitador,

mediador das ideias apresentadas pelos alunos, de modo que estas sejam

produtivas, levando os alunos a pensarem e a gerarem seus próprios

conhecimentos” (p. 7). Para as autoras, é importante que a sala de aula seja um

ambiente onde a cooperação, a exploração e a descoberta permeiem o aprender

dos alunos. Um espaço onde se dinamize as trocas e a circulação de informações e

ainda intensifique a participação ativa de todos os alunos envolvendo todos numa

análise reflexiva de procedimentos e respostas. No entanto, essa proposta dinâmica

e desafiadora de prática encontra certa resistência por parte dos professores.

Moreno (2006) declara que a matemática defendida pela escola produz uma

“aprendizagem aritmética totalmente centrada em um único universo quantitativo de

simbolizações aritméticas universais. O que aprende não é válido para organizar e

resolver quantitativamente os problemas” (p. 63). Para ela, o ensino praticado

prioriza primeiro ensinar a conta, treinar bastante até que o aluno possa dominar o

procedimento para, posteriormente, ter segurança de utilizá-lo ao resolver

problemas. Afirma com propriedade que, se não há um problema a ser resolvido, os

números da conta e do resultado obtido são apenas números. Logo, propor uma

conta cujo resultado não tem significado, é praticar “um ensino que não contempla a

necessidade dos problemas como meio para que os alunos aprendam matemática”.

(MORENO, 2006, p.63).

A autora prossegue em sua análise e permite uma reflexão profunda quando,

ao basear-se em Moreno e Sartre (1986, MORENO, 2006), declara: “na escola, são

o professor e o livro que abstraem e isolam propriedades quantitativas e qualitativas;

na vida, é a criança quem deve abstrair, analisar e organizar toda a informação para

poder decidir como vai proceder” (p. 63). Ela nos mostra que a escola precisa

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repensar sua postura com relação a ação matemática praticada em seu interior, pois

além de ela estar distante do conhecimento do aluno, ainda não permite que ele

construa seu conhecimento.

Em busca de uma matemática dinâmica e desafiadora, que permita ao aluno

buscar regularidades nas operações melhorando sua notação escrita e elaborando

estratégias mais econômicas, percorri caminhos demarcados por Lerner e Sadovzky

(1996). Elas observaram os procedimentos elaborados por alunos estimulados a

resolver problemas através da produção de procedimentos próprios, sem nenhum

conhecimento antecipado dos algarismos convencionais. As autoras encontraram

diferentes procedimentos pessoais, que envolviam contar nos dedos, contagem um

a um dos tracinhos no total dos objetos que devem ser somados, cálculos com

decomposição em “nós” e, finalmente, encontraram alunos que apresentavam os

resultados rapidamente. Concluem os estudos afirmando que a busca de

procedimentos para resolver problemas requer do aluno, além da “aplicação do que

sabem, a descoberta de novos conhecimentos a respeito das regras que regem a

numeração escrita“ (p. 143) e, do professor, um empenho em conhecer e utilizar

todos os recursos possíveis que permitam a seus alunos avançar em seus

procedimentos até chegarem em estratégias mais econômicas de cálculo.

As autoras apontam a necessidade de o professor estar constantemente

atualizado, a buscar nos estudos individuais e coletivos, nas trocas ou nas

formações continuadas uma forma de se preparar para uma nova proposta de

prática.

Com relação aos procedimentos utilizados pelos alunos, Moreno (2006)

afirma que eles são levados a abandonar a contagem de um em um ao serem

introduzidos nas situações de adição, pois se inicia um processo no qual o contar é

ensinado pelo professor como “guardar um número na cabeça”. O problema alertado

pela autora é que esta não parece ser uma estratégia eficiente, pois os alunos

acabam fundindo um número no outro e perdem a qualidade de entidade

independente de cada número. Exemplificando, em 6 + 7 eles contam a partir do

número 7, e falam 7, 8, 9, 10, 11, 12 encontrando 6 + 7 = 12.

Essa atitude apressada do professor demonstra seu desconhecimento com

relação ao como se dá a aprendizagem dos alunos e as etapas pelas quais passam

para poderem desenvolver procedimentos pessoais de cálculo cada vez mais

econômicos, seja por contagem ou não.

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Com relação ao uso da contagem para resolver situações de adição, Nunes e

Bryant (1997) perceberam que ela não é suficiente para que os alunos entendam a

complexidade do sistema de numeração e nem sua composição aditiva. No entanto,

constataram que o “uso da estratégia de contar na sequência de adição precede a

compreensão das propriedades do sistema de numeração, que serve como base

para aprenderem a ler e escrever números” (p. 81).

Os autores destacam que os alunos mais novos, frente à situação de adição,

passam da transição de “contar todos” para “contar na sequência” (p. 62). Para eles,

resolver problemas permite aos alunos construir uma base para o seu conceito de

número, mesmo que necessitem usar representações visuais para a contagem.

Ademias, aprender a ler e escrever números abrirá novas oportunidades para o

aprendizado dos alunos, pois precisam pensar sobre a composição aditiva, relação

entre unidades e dezenas, dezenas e centenas e assim por diante.

Castro e Rodrigues (2008) destacam em seus estudos alguns pesquisadores

que afirmam que a contagem é uma estratégia que possibilita encontrar a solução

de problemas aritméticos. Dentre eles, destacarei Fuson (1987, apud Castro;

Rodrigues, 2008) que afirma que o conhecimento da sequência numérica permite

desenvolver uma contagem mais hábil e precisa, favorecendo a solução de

problemas. Vemos isso também, em Baroody (1987, apud Castro; Rodrigues, 2008),

que observou que a habilidade em contagem permite resolver problemas

mentalmente. Ele relaciona o procedimento para resolver problemas com a

observação de “número anterior” e “número posterior” ou a contagem a partir de

certa ordem. As primeiras adições são realizadas pelo uso de apoio que possa ser

contado, dedos ou objetos, e depois utilizam as mesmas estratégias de contagem só

que mentalmente.

Vergnaud (2009) ressalta a importância da adição, por ser ela que diferencia

o sistema de numeração de outros sistemas simbólicos e dá a possibilidade de seus

elementos, os números, de serem adicionados. Esclarece que os alunos, ao

resolverem problemas, aprendem a contar e vão gradativamente utilizando métodos

diferenciados e se aproximam de cálculos mais elaborados.

Inicialmente, ao realizarem problemas de adição utilizam o método de colocar

todos os elementos dos dois conjuntos juntos e recontá-los um e um.

Card (A U B), Vergnaud (2009)

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Num segundo momento, contam o primeiro conjunto e depois contam o

segundo conjunto e adicionam os dois números obtidos.

Card (A U B) = Card A + Card (B), Vergnaud (2009)

No entanto, encontrei em Magina et al. (2008), em estudos realizados através

de textos escritos por Vergnaud, a afirmação de que os alunos “usam implicações

lógicas sofisticadas, que possuem lógicas correspondentes” (p.13). Apresentam uma

estratégia utilizada pelos alunos quando encontram situações que os impedem de

realizar o ato de juntar dois conjuntos: contam os elementos de um conjunto e ao

contarem o outro conjunto, partem da quantidade obtida com a contagem dos

elementos do primeiro conjunto, obtendo o resultado total. Esta estratégia é uma

estratégia mais sofisticada do que a de juntar para contar. A essas situações

Vergnaud dá o nome de Teorema em Ação.

O processo evolutivo da situação de contagem também foi estudo dos

pesquisadores por Gray e Tall (1994), pois consideram que a “noção de adição

envolve uma série de procedimentos diferentes” (p.123), iniciando por estratégias

envolvendo contagem e avançando para o uso de estratégias mais complexas. O

primeiro procedimento, "conta todos" compreende contar o primeiro conjunto,

contar o segundo conjunto e então contar todos os objetos como se fossem um

único conjunto. Por exemplo: 4 + 5, o aluno para o 4 ( conta: 1,2, 3, 4) e para o 5 (

conta: 1, 2, 3, 4, 5) e junta os dois conjuntos 4 e 5 ( conta: 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9).

O segundo procedimento, "sobrecontagem", consideram como uma

estratégia mais sofisticada. O primeiro número é considerado um todo e o segundo

número é interpretado como um procedimento de dupla contagem, envolve a

contagem e ao mesmo tempo o controle dos números extras que estão sendo

contados. Por exemplo: 4 + 5 ou o aluno para o 4 (conta: 1, 2, 3, 4) e para o 5

(conta: 5, 6, 7, 8, 9). Ou o aluno somente conta 5 (5, 6, 7, 8, 9).

O terceiro procedimento, "sobrecontagem a partir do maior", é uma

estratégia mais econômica. O maior conjunto é colocado primeiro e a contagem

envolve o menor número de elementos do segundo conjunto. Por exemplo, 4 + 5 o

aluno conta apenas o 4 (6, 7, 8, 9).

O quarto procedimento é chamado "conhecendo o fato". Os autores

ressaltam a importância do uso de fato conhecido significativo ser gerado por um

pensar flexível, diferente de um fato apenas memorizado, treinado. Por exemplo, é o

aluno saber que 5 e 5 dão dez e que 4 e 4 dão 8 e utilizar esse conhecimento para

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facilitar os cálculos. O último procedimento, "fatos derivados", envolve composição

e decomposição de partes dos componentes de uma adição. A manipulação de fatos

conhecidos significativos leva a “fatos derivados”. Por exemplo, em 5 + 6 ela sabe

que 5 e 5 dão dez, logo, a resposta é um a mais, resultando onze.

Ressalto a importância de resultados obtidos por pesquisas como as de Gray

e Tall, Vergnaud, Nunes e Bryant , Lerner e Sadovsky, que colaboram com a

melhoria do ensino matemático e servem como sensibilizadores para despertar nos

professores o respeito pelo tempo e saberes de seus alunos.

A proposta de recursos, apresentada por Moreno (2006) para subsidiar o

caminhar do professor em ensinar Matemática, implica uma mudança profunda na

prática. Uma prática que permita utilizar os problemas como situações desafiadoras

para que os alunos reflitam sobre eles; os jogos para que os alunos possam mostrar

seus conhecimentos numéricos; as cartelas numéricas como um recurso didático

para avançar na leitura, na escrita e descobrir as regularidades e organização dos

números. Uma prática que valoriza criar situações investigativas, segundo Nunes

Bryant (1996), ajuda a compreender que o sistema de numeração é portador de significados numéricos – os números, a relação de ordem e as operações aritméticas envolvidas em sua organização –, operar e comparar serão aspectos ineludíveis do uso da numeração escrita. Também será imprescindível produzir e interpretar escritas numéricas, já que produção e interpretação são atividades inerentes ao trabalho com um sistema de numeração (NUNES; BRYANT, 1996, p.118).

Os pesquisadores propõem uma prática que coloque o aluno diante de

situações diversificadas e investigativas, que permita compreender ordenação,

reconhecer e ler números, percebendo e descobrindo regularidades, que propicie

atividades de escrita de números com qualquer grandeza. Tal prática deve constituir

uma base que norteará as escolhas e elaboração das atividades levadas para as

salas de aula.

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CAPÍTULO 4

INVESTIGAÇÃO NA ESCOLA: UMA DINÂMICA DE AÇÃO E REFLEXÃO

Nesse capítulo, irei discorrer sobre o palco que abriga meus estudos e os

procedimentos metodológicos que os norteiam. Apresentarei os atores que tiveram

papéis marcantes em cada etapa da formação continuada na qual atuei e que,

atualmente, retornam em seus papéis, se despem pedagogicamente e expõem suas

práticas e suas trajetórias de vida e profissional ao meu contemplar reflexivo e minha

atuação investigativa. Para isso, será descrita a história de vida e profissional de

cada professora e como se deu o processo de formação continuada na investigação.

A metodologia desta pesquisa é de natureza qualitativa. Com o intuito de

garantir melhor compreensão e interpretação crítica dos fatos, foram utilizados os

seguintes instrumentos: questionários, entrevistas semiestruturadas, narrativas

sobre a trajetória profissional e as análises dos registros de acompanhamento e

observação com caráter de intervenção, que ocorreram durante os encontros de

formação na escola e na prática em sala de aula.

O entusiasmo de algumas professoras ao falar de suas práticas e o

burburinho provocado, deram-me a certeza de que sentar nos bancos escolares fez

o professor se tornar aluno novamente. Suas atitudes e falas críticas são

semelhantes àquelas que tanto abominam e criticam em seus alunos. No entanto,

ele só se desnuda e se desvela quando acredita no ouvir e no falar do formador.

Quando se estabelece uma relação de confiança, de cumplicidade.

Serrazina (1998, apud Saraiva e Ponte, 2003 ) ressalta a importância desse

estreitamento afetivo que se constrói na relação entre formador e professor, entre

pesquisadora e professores pesquisados, pois “esta relação de confiança revela-se

como um pré-requisito essencial para que os professores sejam capazes de contar

as suas percepções acerca das suas aulas e acerca de novas perspectivas

curriculares” (p. 5). Esta relação de confiança também precisa estar presente na sala

de aula, fecundando um conviver afetivo entre professor e alunos e entre alunos e

alunos.

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Quando essas professoras percebem que o outro quer realmente ajudar e

colaborar, se revelam lentamente em suas narrativas, se tornando mais reflexivas.

Uma narrativa na qual é possível perceber os esforços, as crenças, o trabalho

realizado com muita garra e coragem, fruto do esforço de quem quer acertar.

Conseguindo dar aula de matemática sem saber muito de matemática.

Essas leituras e um conhecimento mais profundo foram constituindo a certeza

que, em sala de aula, cada professor faz o que sabe e se empenha para fazê-lo da

melhor forma possível. Se esse “fazer” é inapropriado ou inadequado mediante

teorias e concepções inovadoras, a causa principal é puro desconhecimento.

O professor que ensina matemática transita entre o que é certo fazer, o que

esperam que ele faça e o que faz, o que considera inadequado. Esse fazer também

encontra uma barreira que muitas vezes se torna intransponível: o domínio do

conhecimento do conteúdo de Matemática. Um saber matemático, que segundo

Tardif e Raymond (2000), “engloba certo número de conhecimentos, de

competências, de crenças, de valores, as atitudes“ (p. 219), é mobilizado e

construído pela prática do professor e retorna em cada tarefa realizada durante seu

trabalho cotidiano. Nesse sentido, o ser professor, sua prática e seus saberes estão

imbricados, formando sua história profissional.

Essas reflexões que, recheadas de encantamento, fomentaram minha veia

investigativa a respeito do real ocorrido nas práticas de sala de aula das sete

professoras que participaram do Projeto de Formação Continuada de Matemática

para Professoras do Ensino Fundamental, da Secretaria Municipal de Educação de

São Paulo, realizada na Diretoria Regional de Educação – DRE São Miguel Paulista.

4.1 FORMAÇÃO CONTINUADA: UM DESPERTAR INVESTIGATIVO DA

PRÁTICA DE SALA DE AULA

A Formação Continuada de Matemática para professores que ensinam

matemática nas séries iniciais do Ensino Fundamental, da qual fui uma das

formadoras, propiciou ao professor refletir sobre sua prática e vivenciar

procedimentos metodológicos para serem levados à gestão de sala de aula.

Fomentou a reflexão sobre o papel da Matemática no currículo e sua presença no

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cotidiano das pessoas, valorizando procedimentos pessoais e formais ao resolver

problemas. E, finalmente, apresentou os documentos oficiais e a teoria que o

embasavam para serem conhecidos, compreendidos e melhor aproveitados na

prática de sala de aula.

A participação dos professores nesses encontros se deu por inscrição e

seriam ministrados fora do horário de trabalho. Devido a participação ser optativa, a

composição dos grupos apresentou números variados de professoras entre 12 e 28

participantes. O período de formação transcorreu de março a dezembro de cada ano

(2008 e 2009), distribuídos em encontros quinzenais com duração de 3 horas, em

um total de 56 horas. Seu funcionamento era regido por um combinado didático

discutido no primeiro dia com todos os presentes e complementado ou alterado no

decorrer do ano, com anuência dos participantes.

Primeiramente, informávamos os princípios que norteavam a formação, gerais

e inegociáveis:

- respeito ao horário;

- realização das atividades propostas (individual e em grupo) e das tarefas

propostas ao término do curso;

- o comprometimento em levar a discussão das atividades desenvolvidas nos

encontros com seus pares no horário coletivo, articulando-se com o Coordenador

Pedagógico.

Finalmente, com o grupo-classe foram levantadas regras de bem conviver

em/no grupo. Na ocasião, pude constatar que esses grupos apresentavam

preocupações que iam desde o ouvir à explanação do outro até o compromisso de

cada um em realizar as leituras propostas.

A organização dos encontros abrangeu diferentes momentos. Em um primeiro

instante, com a intenção de propagar e propiciar um ambiente leitor, aproveitávamos

o momento como uma excelente oportunidade para compartilhar textos que

gostávamos e divulgar lançamentos de livros. Eram feitas leituras escolhidas por

mim (formadora), pelo grupo ou sugeridas pelo grupo de orientação DOT -SME15.

Criou-se um espaço de leitura pelo simples prazer de ler e ouvir histórias, sem a

obrigação de interpretar ou opinar, somente para apreciar e degustar.

                                                            15 DOT – Diretoria de Orientação Técnica, departamento da SME – Secretaria Municipal de Educação da cidade de São Paulo

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Após esse momento precioso de viagem individual e cultural, eu apresentava

a rotina, na qual eram destacados os objetivos, os conteúdos e os materiais

didáticos a serem explorados naquele encontro. Depois, os professores se

organizavam em duplas ou trios, e realizavam as tarefas, para que pudessem

perceber o quanto a ajuda do outro é importante para o nosso aprendizado e que

fazer matemática sozinho é desestimulante e frustrante, principalmente quando se

tem dúvidas. Aproveitava para discutir com elas que um bom agrupamento em sala

de aula favorece o avanço dos alunos.

Ao vivenciar esta experiência considerada um estímulo de reflexão, era

esperado que os professores repensassem a disposição de seus alunos em sala de

aula e passassem a agrupá-los de outra forma: duplas ou trios. Afinal, quando se

organiza um agrupamento com critério, a intenção é provocar discussão das

situações-problema, favorecer a colaboração/apoio entre alunos e estimular que

encontrem outros “jeitos” de representar seus procedimentos, sejam esses oriundos

dos alunos com facilidade ou dificuldade em compreender matemática.

As atividades desafiadoras propostas na formação foram elaboradas com o

intuito de que os participantes pudessem confrontar seus saberes, desvelarem suas

dificuldades e enfrentar suas limitações com relação aos conteúdos matemáticos. A

reflexão provocada levava-os a comparar a metodologia utilizada em sala de aula

com a vivenciada e estudada na formação. Este processo de reconstrução do

conhecimento e de reolhar suas práticas realizado em grupo era registrado e

compartilhado com o grupo-classe. No decorrer da narrativa, uma síntese da

discussão era apresentada contendo as estratégias levantadas, a negociação dos

diferentes procedimentos e seu fruto, enfim, uma única solução representando e

refletindo o pensar do grupo. Fazia parte da tarefa também a especificação dos

conhecimentos matemáticos acionados para se resolver as situações-problema.

Durante a minha circulação pelos grupos, as soluções apresentadas por cada

um deles, numa grande maioria, imperava a técnica e desafiava-os a pensar em

outras soluções, em outros “jeitos” de fazer. Neste momento, estimulante para

alguns e angustiante para outros, em que eram obrigados a deixar desnudo seu

conhecimento ou desconhecimento matemático, era favorável para que eu

apresentasse aos professores outros procedimentos e estratégias de solução. O

compartilhamento no grande-grupo das discussões e dos diferentes procedimentos

de solução tinha como objetivo repertoriá-los para que, na medida em que se

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sentissem confiantes, pudessem experienciar esse novo “fazer” com seus alunos,

ampliando suas estratégias, intervenções e conhecimento didático.

Ao final do encontro, numa relação entre teoria e prática, os professores

agrupavam-se novamente por ano do Ciclo com o qual trabalhavam, para discutirem

e planejarem a adaptação da(s) atividade(s), anteriormente vivenciadas, para sua

classe. O planejamento envolvia: a reelaboração da(s) atividade(s); o detalhamento

das intervenções necessárias, propiciando avanço na aprendizagem dos alunos; a

relação do(s) conteúdo(s) matemático(s) contido(s) nas atividades propostas e as

expectativas de aprendizagem atendidas, contidas no documento oficial. Alguns

grupos apresentavam dificuldades em identificar conteúdo e estratégia contidos nas

atividades. Após a adaptação da atividade para o grupo-classe de cada participante,

o planejamento elaborado e a análise das atividades propostas pelos presentes

eram levadas como tarefa para serem desempenhadas pelos/com os alunos, nas

escolas.

Nos encontros seguintes, o que diferenciava era que, após os momentos

iniciais da rotina do dia, leitura para todos e apresentação dos objetivos e conteúdos,

a primeira atividade era o compartilhamento da tarefa realizada pelos/com os alunos

através da narrativa, momento rico de análise, apropriação e discussão nos/pelos

grupos. A narrativa era utilizada para desenvolver o hábito de observar, registrar e

também como instrumento poderoso de reflexão e de revisitação. Reflexão para

ajudar o aluno, reflexão para elaborar novas situações de aprendizagem, reflexão

para replanejar numa verdadeira revisitação da prática. Atualmente, percebo que foi

um caminho utilizado e praticado por vários estudiosos (Firorentini, Nacarato, Ponte,

Serrazina e outros) que se apóiam nos princípios da formação de e com narrativas.

A tarefa havia sido detalhada em um relatório reflexivo de como ocorrera o

processo de ensino e de aprendizagem. O professor deveria registrar como se deu a

ação exploratória vivenciada pelos/com os alunos, anotando os diferentes

procedimentos apresentados como solução e como ocorreu a circulação das

informações na sala de aula. Era esperado que relatassem as intervenções

realizadas durante o seu acompanhamento nos agrupamentos. Muitas vezes, as

narrativas orais eram mais ricas que os escritos reflexivos. Essa dificuldade também

foi constatada por Fiorentini(2006) em seu grupo de estudo. Em sua reflexão,

Altrichter et al (2002, apud Fiorentini, 2006) afirma que “escrever é difícil. É

frequentemente difícil colocar as ideias no papel, ainda que elas pareçam claras e

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lógicas quando pensamos ou falamos sobre elas anteriormente” (p. 21). Reflexão na

ação e reflexão sobre a ação, proposta por Schön (1996, apud Alarcão, 1996), são

momentos ainda tão difíceis quanto registrar para o professor. Refletir durante a

ação exige ao mesmo tempo um distanciamento da ação e sua reformulação

deixando aflorar situações até então não percebidas. Assim transcorreu a formação

continuadamente, durante todo os anos de 2008 e 2009.

Diante da situação que se descortinava em cada formação, reconheci que o

conhecimento do que realmente ocorria em sala de aula se limitava apenas a alguns

relatos orais e aos relatos escritos entregues pelos participantes. Certamente que o

entusiasmo de alguns professores mais audaciosos ao descreverem com detalhes

algumas das descobertas realizadas em suas práticas contagiavam a todos,

inclusive a mim.

Alguns desses grupos de professores acabaram me encantando. Um desses

se destacou, formado por dez professoras do período da manhã. Apesar da

formação acontecer nos primeiros horários, sempre chegavam cheias de energia e

entusiasmo. Nada era empecilho para o envolvimento demonstrado por elas em

cada atividade realizada, leituras partilhadas e leituras teóricas sugeridas. Esse

conjunto de situações apresentadas foi fator preponderante que instigou o meu

querer investigativo e dirigiu o meu olhar em direção a essas professoras que

ensinam Matemática nos anos iniciais e atuam em quatro das escolas da rede

pública municipal, no bairro de São Miguel Paulista.

A seguir, vamos adentrar pelos documentos produzidos na rede pública

municipal da cidade de São Paulo, com a intenção de conhecer o material e verificar

se cumprem o seu papel e propósito nas aulas de matemática.

4.2 LER E ESCREVER – CONHECENDO OS DOCUMENTOS OFICIAIS DE

MATEMÁTICA

Ler e escrever, em todas as áreas do conhecimento, era uma bandeira

agitada aos quatro ventos e acabou despertando o pensar motivador que propiciou a

organização e produção dos atuais documentos. O propósito principal era

desenvolver competências de leitura e escrita em todos os alunos e movimentar

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todos os educadores da escola para um envolvimento na alfabetização de seus

alunos, sem distinção de área de conhecimento e de ano do Ciclo16. Os documentos

foram amplamente utilizados nas formações continuadas na rede pública municipal

de educação de São Paulo e estudados pelas escolas, nos horários coletivos de

estudo. Os educadores recebem o material17 didático, livro do professor preparado e

organizado com o propósito de colaborar no planejamento diário do trabalho em sala

de aula e de apresentar estratégias de ação e intervenção para o ensino de cada

assunto matemático. O programa é composto por documentos e projetos de ação

formadora. Destaquei apenas os documentos que estão diretamente envolvidos com

minha pesquisa. Ressalto que durante as sessões de formação continuada foram

desenvolvidos estudos e ações tendo como base os princípios educacionais

constantes nestes documentos e o propósito de colaborar na compreensão e

reflexão dos professores.

4.3 PROJETO INTENSIVO NO CICLO I – PIC

O Programa que deu origem ao projeto teve como objetivo inicial recuperar os

alunos com baixo rendimento no final do Ciclo I, utilizando um material pedagógico

desafiador e uma organização de sala de aula diferenciada. O material abrange um

conjunto formado por um livro consumível destinado ao aluno e outro, contendo as

atividades com resultados e a orientação metodológica, para uso do professor.

O PIC 4º Ano foi implantado em 2007 e no ano seguinte, o projeto foi

ampliado para alunos do 3º ano do Ensino Fundamental. Em 2011, o material do 4º

Ano foi reorganizado pela equipe da DOT.

Os autores do PIC 4º Ano18 – Matemática foram Antonio José Lopes Bigode e

Maria Virginia Ferrara de Carvalho Barbosa e, do PIC 3º Ano, Maria das Graças

Bezerra Barreto.

                                                            16 O sistema de ensino municipal para o Ensino Fundamental, com duração de 9 anos, distribuídos em Ciclo I e Ciclo II. Ciclo I abrange os quatro primeiros anos do Ensino Fundamental, de oito anos. No ensino de nove anos, os cinco primeiros anos perfazem o Ciclo I. 17 Os materiais estão disponibilizados através dos sites: http://portalsme.prefeitura.sp.gov.br, ou [email protected]. 18 Maria das Graças Bezerra Barreto colaborou com a equipe de elaboração do material.

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As atividades foram organizadas por blocos de conteúdos: Números,

Operações, Grandezas e Medidas, Tratamento de Informação e Geometria, com a

intenção de garantir ao professor maior flexibilidade e autonomia.

As situações propostas são contextualizadas com a pretensão de uma maior

aproximação das situações vivenciadas pelos alunos no seu cotidiano e de dar

sentido aos conteúdos estudados. As situações permitem que os alunos possam

observar regularidades, elaborar conjecturas e generalizar.

A concepção do material considerou o caráter especulativo do ensino da

matemática com a finalidade de desenvolver a capacidade investigativa e a prática

de um ensino mais instigante, possibilitando um maior envolvimento por parte dos

alunos. A problematização permeará todo o trabalho, pois se espera que os alunos

coloquem em jogo tudo o que sabem e pensam para buscar a solução dos desafios

propostos.

4.4 GUIA DE PLANEJAMENTO E ORIENTAÇÕES DIDÁTICAS PARA O

PROFESSOR DO 2º, 3º E 4º ANOS – CICLO I

Esse documento teve o intuito de oferecer suporte ao trabalho realizado em

sala de aula e de guiar as práticas dos professores dos 2º, 3º e 4º Anos do Ciclo I.

Por esse motivo, abrange uma diversidade de propostas didáticas e orientações.

O material de Matemática contou com a consultoria pedagógica de Maria

Virginia Ferrara de Carvalho Barbosa, nos volumes 1 e 2, do 2º ano, e de Celia

Maria Carolino Pires, nos volumes referentes ao 3º e 4º anos do Ciclo I.

A metodologia proposta para o ensino da Matemática, além do caráter prático,

utilitário e educativo escolar, também assume o caráter investigativo e especulativo,

permitindo a elaboração de conjecturas, de argumentações, de generalizações e

propicia a constituição de valores estéticos e criativos.

Nesse sentido, as atividades de Matemática estão organizadas de maneira a

abordar os cinco blocos de conteúdo: Números, Operações, Espaço e Forma,

Grandezas e Medidas e Tratamento de Informação. Elas servirão de parâmetro para

atender às necessidades de aprendizagem dos alunos podendo também servir como

modelo para o professor criar suas próprias atividades.

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4.5 ORIENTAÇÕES CURRICULARES: PROPOSIÇÃO DE EXPECTATIVAS

DE APRENDIZAGEM - CICLO I

Desde 2007, o documento tem o propósito de orientar a organização

curricular explicitando acordos sobre expectativas de aprendizagem e a finalidade

de organização e aprimoramento dos projetos pedagógicos das escolas. Seu

objetivo é o de contribuir para a reflexão e discussão sobre o que os estudantes

precisam aprender e subsidiar as escolas na seleção e organização de conteúdos

mais relevantes a serem trabalhados ao longo dos nove anos do Ensino

Fundamental.

Esse documento foi organizado por especialistas de diferentes áreas de

conhecimento e coordenado pela Diretoria de Orientação Técnica. Na área de

Matemática contou com a assessoria pedagógica de Celia Maria Carolino Pires e foi

submetido a uma primeira leitura realizada por grupos de professores, supervisores

e representantes das Diretorias de Ensino. Na sequência, foi encaminhado às

escolas para ser discutido e avaliado pelo conjunto dos profissionais da rede.

A metodologia proposta está baseada na reflexão sobre o processo de ensino

e aprendizagem em Matemática e nas diferentes contribuições das pesquisas na

área de Educação Matemática, cujos estudos são apontados como necessários de

serem aprofundados pelos professores que ensinam Matemática nos anos iniciais.

O documento discorre sobre algumas descobertas a respeito da construção

de conhecimentos matemáticos pelas crianças, tais como as hipóteses das crianças

sobre números, o estímulo à compreensão dos significados das operações, a

construção de hipóteses sobre o espaço e as formas que as rodeiam e estudos

sobre a facilidade que as crianças têm em lidar com os assuntos referentes ao

tratamento da informação.

A problematização é indicada como um eixo importante no processo de

ensino e aprendizagem em Matemática, na qual conceitos, ideias e métodos

matemáticos devem ser abordados mediante a exploração de problemas

principalmente se estiver atrelado ao trabalho investigativo em sala de aula e ao

recurso das situações cotidianas de vivência das crianças, explorando a história da

Matemática como componente necessária para uma melhor compreensão dos

conhecimentos matemáticos.

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Com relação às situações cotidianas de vivência dos alunos, a análise das

práticas matemáticas, em seus diferentes contextos culturais, é uma perspectiva

metodológica interessante a ser integrada aos currículos, bem como o uso de

recursos tecnológicos, a leitura e escrita nas aulas de Matemática e as modalidades

organizativas nas aulas de Matemática (projetos, atividades sequenciadas,

atividades permanentes e atividades ocasionais).

4.6 CADERNOS DE APOIO E APRENDIZAGEM - MATEMÁTICA

O Caderno de Apoio e Aprendizagem19, dirigido aos estudantes do 1º ao 9º

anos, é composto por oito Unidades, a serem desenvolvidas ao longo do ano letivo.

Para cada ano do ciclo, o livro consumível do aluno é acompanhado pelo livro do

professor e alguns DVD.

Em cada uma das unidades são propostas atividades relacionadas a um

grupo de expectativas de aprendizagem, retiradas das Orientações curriculares e

proposição de expectativas de aprendizagem (PMSP, Secretaria Municipal de

Educação, 2007), articulando diferentes blocos de conteúdos – números, operações,

espaço e forma, grandezas e medidas e tratamento da informação.

Os autores responsáveis pelo conjunto de nove livros foram Celia Carolino

Pires, Armando Traldi Junior, Célia Maria Carolino Pires,Cíntia Aparecida Bento dos

Santos, Danielle Amaral Ambrósio, Dulce Satiko Onaga, Edda Curi, Ivan Cruz

Rodrigues, Janaína Pinheiro Vece, Jayme do Carmo Macedo Leme, Leika Watabe,

Maria das Graças Bezerra Barreto, Norma Kerches de Oliveira Rogeri, Simone Dias

da Silva e Wanderli Cunha de Lima.

O material tem o propósito de apoiar o trabalho do professor, cuja tarefa é

muito mais complexa do que um simples transmitir de informações: envolve elaborar

boas situações de aprendizagem que mobilizem conhecimentos prévios e que

permitam a construção de novos significados, novas aprendizagens e a socialização.

As atividades propostas não devem ser “aplicadas mecanicamente”, mas de

forma que provoquem discussões entre os professores, a respeito das expectativas

                                                            19 Este material apresenta nos dois primeiros anos iniciais, uma variedade de atividades que permite aos alunos desenvolverem estratégias de contagem. 

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de aprendizagem, hipóteses e pressupostos considerados em cada uma delas, e

também as formas de enriquecê-las e ajustá-las a cada turma.

As atividades tiveram como propósito os pressupostos da exploração de uma

diversidade de conteúdos, abordando, de maneira equilibrada e articulada, números

e operações, espaço e forma, grandezas e medidas, além do tratamento da

informação, que aparece de modo transversal. Os conhecimentos matemáticos são

apresentados de forma contextualizada, com base nos problemas encontrados no

cotidiano do aluno, nas demais áreas do conhecimento e no interior da própria

Matemática, ressaltando que as ideias matemáticas sejam sistematizadas e

generalizadas para serem transferidas para outros contextos. A utilização de

diversos recursos didáticos disponíveis, tais como jogos, materiais manipuláveis,

vídeos, calculadoras, computadores, jornais, revistas e os DVD relacionados a cada

ano, devem ser amplamente explorados a serviço da aprendizagem.

Os Cadernos de Apoio e Aprendizagem deveriam ser utilizados pelo menos

em duas aulas por semana e as demais aulas de matemática ficam a cargo do

professor, quanto ao seu planejamento e à seleção das atividades propostas. A

seleção realizada pelos professores deve envolver atividades que explorem a leitura,

a produção escrita e a comunicação oral dos procedimentos e conceitos, utilizando a

investigação e a problematização. As atividades selecionadas muitas vezes são

elaboradas pelo professor ou adaptadas de outros livros e, na maioria das escolas

as atividades complementares são as contidas no livro didático adotado.

O percebido é que o uso do livro didático, na maioria das vezes, acaba se

tornando muito mais um entrave do que mais um complemento pedagógico. Isto se

dá, talvez, pela sua utilização suceder numa ordem linear, geralmente

descontextualizada e cega com relação aos assuntos emergentes do cotidiano da

escola e do aluno, como também dos temas abordados no material oficial. Percebo

um uso automático e acomodado, sem análise e sem reflexão, inibindo muitas

vezes, o lado inventor e investigador do professor, que produz aprendizagem,

desperta a curiosidade e provoca o saber mais. Em contrapartida, o uso deveria

ativar a capacidade criadora e sedutora do professor, deveria cumprir sua tarefa, tal

qual propõe as encantadoras palavras de Rubem Alves (2007) e que faço minhas ao

encerrar uma formação, A tarefa do professor é mostrar a frutinha. Comê-la diante dos olhos dos alunos. Provocar a fome. Erotizar os olhos. Fazê-los babar de

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desejo. Acordar a inteligência adormecida. Aí a cabeça fica grávida: engorda com ideias. E quando a cabeça engravida não há nada que segure o corpo (ALVES, 2007, p.128).

Um sonho esperado e propagado por mim é acordar a inteligência

matemática adormecida dos alunos e dos professores, para que engordem suas

cabeças com as descobertas matemáticas e o esperado é que esses alunos não

aceitem mais qualquer aula de Matemática, tenham sede de aprender e investigar

coisas novas e diferentes. Aos professores, o prazer de plantar a plantinha, de

ensinar.

Um sonho possível ou impossível, talvez, em um espaço chamado escola.

Escola, lugar em que a fome de aprender pudesse ser saciada com “alimentos

matemáticos” servidos em majestosas bandejas e a sede do saber, fosse saciada

em cântaros cujo frescor do conteúdo satisfizesse do mais simples ao mais exigente

aprendiz.

Esta Formação Continuada de Matemática suscitou reflexões e indagações

que despertaram um querer investigar a prática de sala de aula e observar quais

aspectos desta formação (realizada por mim) contribuiu para o processo de

mudanças das práticas dos professores participantes.

4.7 UM CAMINHO DE INDAGAÇÃO: FORMAR, OBSERVAR E TRANSFORMAR

O projeto de pesquisa inicial consistiu em um contato com dez professoras

para o levantamento de seus interesses e participação voluntária na pesquisa. Para

isso, contei com o apoio, acolhimento e acompanhamento da equipe da Diretoria de

Orientação Técnica - DOT da DRE São Miguel Paulista, na organização de um local

para a primeira reunião de apresentação da proposta. Nessa reunião,

compareceram sete das dez professoras, algumas acompanhadas de suas

Coordenadoras Pedagógicas e outras sozinhas.

Após a apresentação da proposta foi feito um levantamento da disponibilidade

e elaborado um combinado pedagógico de comprometimento para cada fase do

processo. Os encontros de formação desse grupo abrangeriam dois momentos: uma

formação dentro da escola e outra formação fora da escola. Momentos que

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compreenderiam um movimento dinâmico e autônomo em suas individualidades e

ao mesmo tempo dependentes em sua intersecção, produzindo trocas que

provocariam o estabelecimento de novas relações, comparações, reflexões bem

como novas compreensões.

Uma formação fora do contexto escolar, com uma relação

formadora/pesquisadora e professores e entre professores que permitissem a

ampliação de saberes através das trocas de vivências e informações, que

propiciasse a oportunidade de criar novos caminhos e intervenções e fosse um

espaço coletivo no qual a narrativa oral e escrita favorecessem a circulação das

investigações, descobertas e incertezas de cada participante. Paralelamente,

aconteceria a formação no âmbito escolar20, numa relação mais íntima, mais

próxima do professor, mais interativa, uma interação formador/pesquisador e

professor, segundo afirma Prado (2003), “são fundamentais para que seja

desenvolvido um trabalho em parceria, voltado para a busca de novas possibilidades

de atuação na realidade da escola” (p. 49).

Inicialmente, nas escolas, estariam vinculadas ao horário coletivo cumprido

pelo professor participante, JEIF – Jornada de Especial Integral de Formação, e ao

seu horário de aula. Para isso demandou que cada participante colocasse em um

cronograma, seus dois horários. Esclareci que as visitas na escola seriam para

colaborar e discutir a elaboração e/ou escolha da atividade para a prática e posterior

observação e reflexão sobre essa prática.

Esta proposta encontrou dois fatores primordiais de impedimentos. Em

primeiro lugar, esbarrou no fato da formação proposta ser extraoficial de participação

voluntária, impossibilitando convocar professores dentro do horário de aula. O outro

fator, a formação fora do horário de trabalho, dado os compromissos já assumidos

pelas professoras em projetos dentro e fora das escolas. A proposta sofreu

modificações em sua forma estrutural e, assim, os encontros de formação passaram

a acontecer na escola, com cada professora separadamente.

Os acompanhamentos foram realizados em cada uma das quatro escolas. O

primeiro contato foi utilizado para uma conversa sobre a formação continuada de

Professores com os Coordenadores Pedagógicos e com o grupo de professores que

tivesse a presença do professor ou dos professores destacados na seleção inicial. A

                                                            20 No sentido de ser no espaço físico da escola e nas vivências práticas de sala de aula.

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formação continuada aconteceu em dois momentos: no coletivo, envolvendo todos

os professores participantes da JEIF e no individual, apenas com as sete

professoras.

Inicialmente, os acompanhamentos ocorreram nas 2ª feiras (manhã e tarde)

em duas escolas, nas 3ª feiras e 4ª feiras, uma escola em cada dia. Após alguns

acompanhamentos, fui informada que a escola envolvida na 3ª feira teria, na 4ª feira,

um número maior de professores participantes, passando este a ser o dia do

acompanhamento. Desta forma, a organização dos acompanhamentos foi realizada

em apenas dois dias, 2ª feiras e 4ª feiras, envolvendo duas escolas em um mesmo

dia.

Os horários acertados e combinados foram organizados em um cronograma.

Os participantes da pesquisa e a Coordenadora da escola receberam um

cronograma cada um, permitindo uma organização da escola e uma visualização

geral da formação. O cronograma apresentou os dias referidos aos encontros no

coletivo da escola, os momentos individuais de elaboração das atividades e os

momentos de acompanhamento em sala de aula. A devolutiva com intervenção e

reflexão foi realizada no horário coletivo servindo de fonte de estudo e reflexão para

todos os professores participantes.

Quadro 1 CRONOGRAMA DE PESQUISA – DRE- SMP 2010

DATA/MÊS Atividade local prof. horário Agosto Set. Outubro Nov. Dez.

Escola A

Raquel

8h30 às 10h50 2ª feira

10 16 23 30 20

27 4 18 25 8 22 29 6

Escola B

Roseane Angela

14h às 17h 2ª feira

10 16 23 30 20 27 4 18 25 8 22 29 6 13

Escola C

Cora

8h30 – 10h50 4ª feira

10 17 24 1 22 29 6 20 27 10 17 24 1 8

Visita a Escola no horário coletivo. Visita a Escola para observação da aula. Encontro para devolutiva.

Escola D

Marina Cecilia Lygia

10h30 às 12h25 4ª feira

10 18 25 1 22

29 6 20 27 10 17 24 1 8

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As escolas participantes foram denominadas por A, B, C e D, cuja

classificação está relacionada com a sequência de acompanhamentos realizados

em 2010. Em 2011, retornei as escolas de forma mais esporádica, para

complementar o levantamento de dados. Para me adequar ao horário das

professoras, a sequência foi alterada.

As sete professoras serão conhecidas pelos pseudônimos de Raquel,

Roseane, Angela, Cora, Marina, Cecília e Lygia, uma homenagem às mulheres

escritoras e/ou poetisas brasileiras que dedicaram-se em escrever para crianças, e

cujos livros são lidos quase diariamente pelas professoras. As escritoras

selecionadas foram: Raquel de Queiroz, Roseane Murray, Angela Lago, Cora

Coralina, Marina Colassanti, Cecília Meireles e Lygia Fagundes Telles.

Somente a professora Angela era atendida individualmente, pois o projeto em

que estava inserida encontrava-se no horário noturno.

O combinado realizado na reunião inicial, com as professoras envolvidas, foi

mantido. Em cada escola, todos os participantes se comprometeram em

compartilhar os momentos de formação e em realizar as tarefas propostas.

Ficou nítida a satisfação dos professores participantes pela formação

continuada ocorrer no local de trabalho, principalmente daqueles que nunca tiveram

a oportunidade de participar de formações fora da escola devido a problemas

pessoais ou acúmulo de cargo. Essa oportunidade foi acolhida com alegria e

entusiasmo, inclusive, posteriormente, com a cobrança de retomada no próximo ano.

Os estudos que permearam as discussões nas Formações tiveram como

aporte teórico o “fazer matemático” definido nos documentos oficiais, aliados aos

conhecimentos oferecidos pelos estudos de pesquisas recentes sobre Educação

Matemática e Formação Continuada, cujo enfoque fosse o ensinar e o aprender

matemáticos nas séries iniciais. As pesquisas recentes foram foco dos meus estudos

e sustentáculo da minha investigação durante a formação continuada realizada na

escola.

Alguns assuntos foram retomados ou aprofundados nos momentos de

reflexão, no decorrer das conversas individuais com as professoras e após a

observação da prática de sala de aula – a intervenção.

Na Formação Continuada, os assuntos solicitados pelo coletivo apontavam

para os problemas emergentes ao ensinar matemática nas séries iniciais utilizando o

material oficial. Elas tinham dificuldade em trabalhar com problemas, algumas

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dúvidas na interpretação das sondagens de números dos alunos e ansiavam por

caminhos que as ajudassem a lidar com as dificuldades dos alunos com relação ao

SND – Sistema de Numeração Decimal.

Para compreender e analisar a prática e colaborar na observação das causas

que favorecessem a mudança dessas professoras, foram utilizados, como

procedimentos de investigação, a análise da narrativa da trajetória pessoal e

profissional, entrevistas semiestruturadas, os questionários, a elaboração de

sequências de atividades com/pela professora e o acompanhamento e observação

do desempenho da professora nos encontros de formação e na ação em sala de

aula.

A análise da narrativa da trajetória pessoal e profissional permitiu que durante

a escrita cada professora fosse resgatando as lembranças dos caminhos

percorridos, as sensações e os sentimentos envolvidos na história de vida escolar e

na história de vida do ser professora. Segundo Tardif (2002) os saberes docentes

estão contaminados pelo ato discursivo e narrativo das histórias de vida dos

professores e suas experiências de trabalho. A leitura dessas histórias possibilitou à

pesquisadora conhecer os avanços de cada professora e compreender as

fragilidades ou incertezas contidas em suas práticas ao ensinar matemática.

Os questionários e as entrevistas semiestruturadas foram utilizados com o

propósito de dimensionar as crenças, as teorias e a metodologia que embasou o

ensinar de cada professora, o seu saber matemático, a sua visão de educação, de

Matemática e da educação matemática.

O contrato pedagógico elaborado em conjunto com as professoras foi

baseado no modelo utilizado durante as formações de professores da rede pública,

registro escrito que delimitava os diferentes papéis e destacava as

responsabilidades de cada um na relação formador-professor-conhecimento-prática.

Esta prática talvez tenha sido desencadeadora de uma nova postura frente

aos grupos de formação. Ficou nítida a importância de cada participante

comprometer-se e ter o compromisso de todos, durante a realização das atividades,

no convívio grupal, nos estudos realizados no horário coletivo e nas pesquisas

praticadas em sala de aula, dimensionadas pelas tarefas.

Durante as Formações Continuadas de Matemática e em Língua Portuguesa

para professores dos anos iniciais do Ensino Fundamental, fomos repensando e

ampliando essa prática. Na medida em que a formação ia se consolidando, novos

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princípios surgiam e os contratos pedagógicos eram acrescidos ou sofriam

alterações. O grupo assinalava a necessidade de mudança quando percebia o não

cumprimento de uma tarefa, bem como quando um participante se sentia excluído

ou desrespeitado.

No entanto, era consenso entre os formadores da rede pública que, propiciar

ao professor a vivência de cada etapa do processo organizador do contrato

pedagógico, seja na elaboração ou alteração de combinados, possibilitaria, além de

uma “boa convivência”, a organização de um “espaço formador e educador”.

Constituiria um ambiente capaz de gerar confiança e motivação para incorporá-lo na

prática de sala de aula. Segundo alguns depoimentos orais das professoras, os

combinados permitiram que todos estivessem conscientes dos critérios de

convivência, propiciando melhores relações entre professor – aluno e aluno – aluno.

O material de atendimento ao grupo-escola foi organizado pela

formadora/pesquisadora contendo registros reflexivos das observações e análises

didáticas durante a formação, as atividades elaboradas e algumas atividades

aplicadas em sala de aula, bem como as narrativas sobre os momentos marcantes e

interessantes vivenciados pelas professoras.

4.8 FORMAÇÃO NO ESPAÇO DE FORMAÇÃO – A ESCOLA

O primeiro encontro de formação nas escolas foi significativo para o

levantamento das dificuldades apresentadas e dos temas indicados pelas

professoras, que foram abordados durante os encontros no horário coletivo - JEIF.

As escolas A, B, C e D ficam em bairros periféricos que atendem

comunidades diversificadas e apresentam uma estrutura física bem distribuída e

agradável contendo respectivamente, dezenove (19), quinze (15), doze (12) e vinte e

uma (21) salas de aulas em cada um dos quatro turnos. As escolas têm áreas

externas bastante privilegiadas, com mais de uma quadra esportiva e oferecem

laboratório de informática e sala de leitura. As escolas apresentam um ambiente

acolhedor e organizado. Os alunos parecem gostar das escolas. Nos horários de

intervalos, presenciei alunos sempre alegres e envolvidos em brincadeiras e bate-

papos, no pátio, aproveitando este momento de interação social.

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Duas das escolas apresentaram aspectos relevantes e diferenciais. Numa

delas, a escola B encontrei um Projeto de Matemática no qual participava uma das

professoras selecionadas. Ele envolvia duas etapas, em dias e horários diferentes: o

estudo e elaboração de atividades práticas como jogos, brincadeiras, desafios e

outros, e o atendimento aos alunos fora do horário de aula, que gostavam ou não de

matemática, para realizar as atividades elaboradas. O projeto, que envolvia estudos

exploratórios de material lúdico para a elaboração das atividades, era orientado por

uma Coordenadora Pedagógica, licenciada em Matemática. Na outra escola, a D, o

horário de intervalo supervisionado com proposta de jogos interativos teve um aparte

da minha atenção: vi os alunos participando de brincadeiras orientadas, outros

jogando pingue-pongue, xadrez, ouvindo música, dentre outras atividades sociais.

Nesse cenário, apresentando diferentes aspectos, é que vamos reconstituir

conversas com as professoras, falas constatativas, atividades pensadas e

organizadas, aulas dadas e assistidas e, finalmente, as intervenções reflexivas.

4.9 NARRANDO CONVERSAS E HISTÓRIAS DE VIDA DE PROFESSORAS

QUE ENSINAM MATEMÁTICA

Dizem que ao “Contar um Conto se aumenta um Ponto”. Espero que ao narrar

conversas e histórias escritas dos professores participantes desta pesquisa, possa

contar um Conto registrando histórias lidas, relidas à vista do meu ponto de vista e

dos estudos realizados, e possa acrescentar, sim, um ponto, um destaque

ressaltando a alegria, o querer e o afeto que envolve cada prática.

Segundo Freitas e Fiorentini (2007), os professores, ao fazerem narrativas

reflexivas, aprendem e ensinam com elas. Aprendem, pois ao narrar estruturam suas

ideias, sistematizam e dão sentido às experiências e novos aprendizados. Ensinam,

na medida em que ao escutar ou ler narrativas e saberes de outros vão

ressignificando seus saberes e experiências. Para embasar seus estudos buscam

em Clandinin (1993, apud Freitas e Fiorentini) maiores esclarecimentos para validá-

los: Quando nós ouvimos as histórias dos outros e contamos a nossa própria, nós aprendemos a dar sentido às nossas práticas pedagógicas como expressões do nosso conhecimento prático pessoal, que é o conhecimento experiencial que estava incorporado

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em nós como pessoas e foi representado em nossas práticas pedagógicas e em nossas vidas. (CLANDININ, 1993, p. 66)

Seguimos acreditando que ao narrar sua trajetória profissional e pessoal o

professor vai conscientizando-se de suas crenças, valores e saberes, vai

organizando suas experiências passadas, vai transformando e aprofundando as

experiências atuais e dando sentido aos novos estudos e experiências. É com esse

propósito que trazemos as narrativas reflexivas dos professores para mostrar o

caminho evolutivo de cada professora com relação aos seus saberes matemáticos e

ao seu ensinar.

Iniciaremos com a Professora Raquel21 que trabalha na escola A, com uma

turma de 1º Ano do Ensino Fundamental. Ela afirmou que ingressou no magistério

por vocação e realizou o seu trabalho durante vinte e quatro anos. Sempre sonhou

em ser professora, afinal em sua infância “a brincadeira predileta era brincar de

escolinha”.

Desde a primeira formação, deixou a impressão de ser alguém que gosta de

estar sempre atualizada e para isso lê muito. Sua bagagem conta com a experiência

de 24 anos de atuação em sala de aula e o compromisso com seus alunos. Muito

comunicativa, era uma das professoras que sempre narrava com entusiasmo os

avanços de seus alunos e indagava interessada sobre novos caminhos que

pudessem ajudar os alunos com dificuldades.

Ela gosta de ensinar Matemática, pois sempre foi “ótima aluna, não tinha

dificuldades, participava das Olimpíadas com sucesso”. Gosta de ler e estar sempre

atualizada.

Em nosso reencontro, apresentou-me ao grupo com muito entusiasmo e

orgulho, falando do muito que aprendeu na formação. Inclusive, fez um destaque a

respeito de um artigo que havia lido na Revista Nova Escola acerca da forma

diferenciada de trabalhar com o Sistema de Numeração Decimal. “O artigo está

falando tudo o que eu já tinha visto nas últimas formações com relação ao uso do

quadro numérico e contagem”, foi um dos seus comentários.

Sua preferência de trabalho está voltada para os primeiros e segundos anos

do Ensino Fundamental apoiada no afetivo pois, segundo ela, “as crianças menores

são mais amorosa”. Apresenta como justificativa também, a oportunidade de poder

                                                            21 Dados da pesquisa no CD anexo da versão física. 

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acompanhar os resultados do processo de ensino e de aprendizagem de seus

alunos e enfrentar o grande desafio desse processo - a alfabetização. A

alfabetização na língua materna e nos números. Esse processo complexo, mas

motivador, que pode apresentar resultados positivos ou negativos, impulsiona a

busca de novas alternativas pela professora, provocando uma ansiedade em querer

aprender cada vez mais.

Ao ler a narrativa de sua vida pareceu-me que o verdadeiro motivo subjacente

a esse afetivo, presente em sua sala de aula e em sua opção, relaciona-se às

lembranças gravadas em sua memória (palavras dela), por um fato traumático que

ocorreu em seu primeiro dia de aula, cheio de mal entendidos. Neste dia, sua

professora, talvez por inabilidade ou inexperiência, chamou-a “de lenta devido ao

ocorrido. Me senti rotulada pelas outras crianças. Penso que não é fácil para uma

criança com sete anos de idade ser discriminada e rotulada na presença dos

colegas da classe”. O fato deixou marcas profundas, como se fossem marcadas a

ferro. Cicatrizes invisíveis em sua carne e profundas em suas entranhas.

Durante os dois anos de formação, apresentou sempre uma postura atenta e

confiante, desenvolta, rápida ao realizar as atividades e comunicativa ao representar

seu grupo nas apresentações. Frente a esta imagem, foi com surpresa que encontrei

em seus escritos a afirmativa – “meu raciocínio é um pouco lento”, complementando

logo após com a declaração que emerge do fundo do seu ser como se fosse um

lenitivo que acalenta sua alma e liberta-a – “porém quando aprendo ou assimilo é

para sempre”.

Prosseguiu em suas lembranças: “lembro que me adaptei e guardei algumas

passagens que considero importantes que marcaram a minha vida escolar”. Neste

instante, ela recorda sua professora da segunda série, grande inspiradora da sua

prática, e afirma: “não era uma pessoa, mas sim uma fada, rígida, ao contrário da

professora da primeira série22”. Nos seus relatos, ela compara a postura das duas

professoras, destacando a inexperiência de uma frente à competência da outra, que

gestava a sala de aula com rigor, com pulso firme, com disciplina, “ela acolhia seus

alunos de forma carinhosa e trabalhava a Matemática com muita competência.

lembro-me que sua prática pedagógica na Matemática era enriquecida com material

                                                            22 Atualmente, corresponde, no Ensino Fundamental de nove anos, ao 2º Ano 

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concreto [...] e jogos para ensinar a conta e fazer os cálculos deixavam seus alunos

seguros e aprendiam mais”.

A professora da segunda série23 deixou germinada em seu ser a semente do

amor pela matemática e gravado em seu coração o modelo de como deve ser uma

boa professora. O elo que as une é tão forte que ela busca um pouco dessa

professora nas formações que participou. Uma eterna procura de metodologias que

indiquem caminhos que deixem seus alunos seguros, confiantes e permitam que

eles aprendam cada vez mais.

No entanto, percebo em sua escrita a respeito do trajeto estudantil que a

experiência matemática vivenciada nos anos posteriores com a maioria de seus

professores era difícil, sem funcionalidade e cansativa. É possível apreender da sua

narrativa que sua atitude ao analisar a postura de seus professores de matemática

foi mais um motivo que a impulsionou a buscar estratégias diferenciadas que

transformassem sua prática e permitissem um aprender com prazer e alegria.

É possível perceber o quanto as referências espaço e tempo são utilizadas

para alicerçar as experiências profissionais e interferem na maneira como o

professor ensina. Conforme afirma Nóvoa (1992, apud Megid, 2009), nossas

dimensões pessoais e profissionais entrecruzam-se na nossa prática docente.

Nesse sentido, a professora Raquel, pensando nos seus alunos, afirmou que

“a realidade é outra. Nossos alunos vivem numa sociedade que exige mais, ou seja,

reflexão, raciocinio prático e criativo para superar os desafios e resolver problemas

no dia a dia”. Por este motivo, considerou o ensino da maioria de seus professores

inadequado para ser reproduzido nos dias de hoje aos seus alunos,

Para atender os alunos, fruto de uma sociedade que se transforma a cada

dia, ela se esforça para ser uma professora inovadora, criativa, expressiva e

problematizadora, mesmo ao ensinar a Matemática que tanto ama. A certeza de que

uma boa professora é aquela que encanta em sala de aula é o agente motivador de

muita garimpagem pelos diversos grupos de formação dos quais participou

ativamente e que pondera: quanto mais ajuda e conhecimento melhor. Em sua

rotina, prioriza aula de matemática em todos os dias da semana.

                                                            23 Atualmente, corresponde, no Ensino Fundamental de nove anos, ao 3º Ano.

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A professora Roseane e a professora Angela atuam, respectivamente, no

2º e 4º anos na escola B, em jornadas de trabalhos com horários diferentes. Elas

pouco se veem ou trocam experiências.

A professora Roseane24, com aproximadamente quinze anos de experiências

na educação, gosta de trabalhar com os primeiros anos, pois considera que os

alunos menores não têm “tantos vícios da escolarização”.

Nunca teve problemas com a matemática, foi boa aluna e apreciava seguir o

traçado tortuoso dos “vários caminhos para chegar a um resultado, comprovando-o”.

Essa “fascinação” como ela mesma diz, foi bastante influenciada pelo pai.

No entanto, a metodologia vivenciada na escola, segundo ela, não era

adequada para ensinar: “era um pouco engessada e valorizava apenas os métodos

econômicos de operar (desvalorizando as diferentes formas de pensar) [...] um fazer

de páginas de números em sequência de um em um”. Apesar de gostar de

Matemática, a metodologia praticada não sofreu influência da vivenciada.

Apresenta uma visão bastante crítica em relação ao seu fazer e ao fazer de

seus professores. Com relação aos professores que fizeram parte de sua caminhada

escolar, em sua opinião, não deixaram nenhuma marca, nenhum registro, nada que

merecesse ser destacado. Para ela, foram simplesmente “dadores de aula”, não

sendo modelos, “nem positivamente, nem negativamente”. Talvez este seja o ponto

em que se apóia para idealizar a sua referência de ser professora. Quer fazer a

diferença na vida de seus alunos, quer deixar sua marca positiva, ser lembrada.

Sendo assim, constituir-se professora teve como ponto de partida sua

participação como monitora-estudantil em um projeto da escola na qual estudava.

Projeto esse em que os alunos com maior facilidade eram convidados a ajudar

alunos com dificuldades em matemática. Nessa época, deu-se o “primeiro contato

com o planejamento e a aula”. É perceptível o quanto estas recordações deixaram-

lhe marcas profundas que são possíveis perceber quando afirma: “percebo o quanto

foi importante esta experiência. Gratificante. De crescimento. Eu me sentia satisfeita

ao ver que meus colegas estavam entendendo o que eu dizia e percebiam minha

dedicação em ajudá-los. Nessa época usava apenas meus instintos para auxiliá-los,

numa tentativa de imitar da melhor maneira possível o que nossa professora fazia (é                                                             24 Dados da pesquisa no CD anexo da versão física. 

 

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que eu a admirava), mas com uma linguagem mais ‘facilitada’, traduzida para o

mundo pobre de vocabulário que tínhamos, deixando de lado os termos mais

técnicos”.

Ao narrar a sua experiência vivida vai aumentando a impressão deixada e

percebida de sua importância na trajetória profissional reflexiva da professora

Roseane, despertando-lhe o gostar de aprender e ensinar, mostrando-lhe a

importância de se fazer entender para o outro, e a alegria que acalenta a alma ao

constatar que ele aprendeu.

Atualmente, valoriza e trabalha com agrupamento de alunos, como um

caminho colaborativo em que os alunos podem ajudar e ser ajudados, numa

linguagem mais próxima, mais simples, mais acessível e muito mais inteligível.

Outro fator que contribuiu para enriquecer sua vivência pedagógica foi o

trabalho realizado em uma escola no Japão, como “Decassegui [...] Lá eu lecionava

para uma classe de alfabetização de crianças brasileiras[...] Não foi fácil. Além do

método tradicional de ensinar, as questões culturais pesavam muito”.

Apesar de ficar incomodada com uma metodologia mais tradicional, no início

de carreira, tal qual afirma Tardif e Raymond (2000), passa por um período

exploratório que suscita experiências e sentimentos fortes e contraditórios

provocando escolhas provisórias, através de acertos e erros. Nesse sentido, ela

tinha a certeza de que acabou reproduzindo a mesma atitude de seus professores

dos anos iniciais, que criticava. No entanto, percebia que apesar da metodologia ser

a mesma, segundo a professora Roseane “o diferencial é que eu fazia com um

aluno por vez, dedicando mais tempo, o que conferia às aulas resultados mais

positivos”.

Mas, foi no curso de Pedagogia, que conheceu uma nova forma de ensinar e

uma nova forma de olhar para o aprendiz, a metodologia construtivista. Ela se

encanta e confessa extasiada, “Que mundo novo! [...] Tive meus primeiros contatos

com Emília Ferreiro, Délia Lerner, César Coll e tantos outros”.

Ao refletir sobre o seu caminho profissional, o faz através da seguinte

reflexão: “pelas minhas experiências anteriores, posso dizer que hoje em dia estou

de bem com a minha profissão, porque me sinto não uma mera reprodutora de

conhecimentos, mas construtora de uma nova fase da educação. Sinto-me mais

autônoma da minha formação e isto me faz mais plena das minhas decisões e mais

responsáveis pelas intervenções que faça em sala de aula”.

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Como professora de Matemática, se considera compreensiva e atenta,

respeitando o ritmo do aluno ao pensar matematicamente. Para ela, isso implica

entender e poder ajudar os alunos, quando colocados frente às situações-problema

propostas, quando apresentam procedimentos pessoais ainda incompreensíveis

para o seu entender.

Ao participar da formação continuada de matemática que originou esta

pesquisa, a professora Roseane era questionadora e interessada. Tinha sede de

aprender. Participava ativamente das atividades e observava com atenção as novas

informações. Gostava e continua gostando de desafios, sempre que pode aproveita

as oportunidades para participar de cursos de formação. No entanto, a formação

continuada de 2009 foi a primeira oportunidade de participar de uma formação de

matemática, sobre a qual declara abertamente, “mudou minha visão da Matemática.

Vi a Matemática da vida e da escola”.

Em sua rotina semanal prioriza seis aulas de matemática distribuídas em

todos os dias da semana. Em dois dias da semana alternados utiliza o Caderno de

Apoio e Aprendizagem e nos demais o livro didático adotado pela escola.

Vamos falar agora da Professora Angela25 que tem dezoito anos de prática,

advindos da história de uma menina que sempre brincava de “escolinha” e sonhava

em ser professora. Em sua adolescência, esta certeza se concretizou tendo como

modelo a dedicação e a prática da irmã mais velha, que tanto admirava. Iniciou

como aluna do CEFAM26 vivenciando metodologia inovadora e, ao se formar, foi

professora de uma escola padrão na rede estadual.

Sua opção foi ensinar alunos mais velhos, do 4º ano do Ensino Fundamental

e justifica: “os alunos já têm uma certa maturidade para argumentar”, o que permite

maior aprofundamento de alguns temas trabalhados.

Tornar-se e ser professora dos anos iniciais era a oportunidade em trabalhar

com crianças pequenas e o “encanto” em estar participando e propiciando “as

primeiras descobertas no processo de escolarização” era algo que enchia seu

coração de alegria e de certeza de ter feito uma ótima escolha profissional.

Gosta de matemática, contudo considera ter sido “uma aluna regular” nas

aulas de matemáticas, pois conseguia fazer com certa facilidade alguns conteúdos,

                                                            25 Dados da pesquisa no CD anexo da versão física. 26 Centros Específicos de Formação e Aperfeiçoamento do Magistério. Decreto Estadual 28.089D13/01/88. Um projeto especial com período integral e remuneração.

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e outros, com dificuldade, segundo ela, insuficiente para “os padrões de

aprendizagens apresentados na época”.

Essa avaliação tão rigorosa apresentada sobre seu desempenho escolar tinha

sido produzido pela prática de seus professores, a qual ela reconhece

conscientemente, “não era adequada para a minha da época, nem tão pouco para

os dias atuais, pois não considerava o raciocínio construído pelos alunos e não os

preparava para o mundo externo, isto é, para atuar na realidade de uma sociedade”.

Ela narra sua vivência com uma matemática rígida, centrado numa

metodologia tradicional, e que desconsiderava o que o aluno sabia ou pensava. O

professor era o centro ativo e o aluno passivamente ia assimilando o que era

possível e o que era oferecido. A qualquer questionamento, a resposta não era

obtida. Uma matemática que pratica a metodologia do monólogo, ainda nos dias de

hoje. Um diálogo não praticado. O diálogo provoca em cada um de nós um pensar

nosso e um repensar o pensamento do outro.

Este é o diálogo promulgado por Freire (2000), um ser de comunicação, o

qual “sela o ato de aprender, que nunca é individual, embora tenha uma dimensão

individual” (p.14). Ele nos convida a dialogar mais em sala de aula, um professor

dialogando mais com seus alunos e ajudando a dizer mais sobre seus saberes,

promove também um diálogo entre os alunos dando espaço e valorizando as falas

que ocorrem na sala de aula. Finalmente, permitir um diálogo do professor e alunos

com os saberes matemáticos aprendidos ou não, numa criação e recriação desses

saberes.

Se seus professores não foram modelo para sua vida profissional,

atualmente, a professora Angela ao ensinar matemática se empenha em

“proporcionar atividades que sejam significativas para o grupo e através do escrito e

dos registros, compreender o processo realizado por cada aluno”. Sua intenção é

praticar uma “ensinagem”, uma prática atenta ao conhecimento de cada aluno,

permitindo que eles avancem e ampliem seus saberes e suas experiências. Uma

Matemática mais humana, mais próxima do aluno.

Todas as vezes que ela falava de seus alunos na Formação Continuada o

fazia com muito carinho, com muito respeito. Sempre queria saber mais, mostrava-

se interessada em compreender os diferentes jeitos de resolver problemas, e as

resoluções baseadas em cálculos mentais. Afinal, em sua classe haviam muitos

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alunos que resolviam os problemas por cálculo mental e depois não sabiam

representá-los por uma escrita matemática, colocavam apenas a resposta.

Segundo sua análise, evoluiu no seu conhecimento, apesar de afirmar que

ainda tem muito a aprender. Hoje valoriza o processo de aprendizagem dos alunos,

os procedimentos pessoais e a circulação das diferentes maneiras encontradas ao

resolverem os problemas propostos.

Ao lembrar seu tempo de estudante deixa emergir um fato que a marcou

negativamente, a professora da terceira série27, cujo nome nunca esqueceu, que

utilizava uma metodologia em que os alunos terminavam suas tarefas e, conforme

ela as corrigia ia determinando seus lugares em fileiras classificatórias. Como

sempre, a fileira A era destinada para os alunos mais inteligentes, aqueles que

acertavam toda a tarefa, e as demais fileiras eram ocupadas de acordo com a

quantidade de erros que eram cometidos. Para ela, essa atitude era vista como uma

forma de humilhação aos alunos que não apresentavam um bom desempenho.

Novamente, encontro uma relação entre a maioria das professoras que

temem matemática com a prática de uma matemática tradicional, classificatória,

passiva, que valoriza o acertar e desprestigia o errar. O errar era proibido.

Minha impressão é que hoje a professora Angela busca nas diversas

formações das quais participou, suprir uma defasagem no conhecimento matemático

deixado pelos seus professores e, inclusive, pela sua formação acadêmica. Ela

busca na formação caminhos que permitam respeitar e valorizar o conhecimento do

aluno, ajudá-los a avançar com autonomia e com confiança aprendendo com alegria

e ampliando cada vez mais seus saberes.

Avalia os assuntos tratados na formação continuada de 2009 como sendo

“fundamentais para melhorar o desempenho do professor em sala de aula,

aprimorando os conhecimentos e conseguindo atingir aos alunos na totalidade”. Sua

participação sempre foi discreta, mas compromissada.

Em sua rotina, dedica oito das 20 aulas semanais, para a matemática.

Números e Operações são atividades constantes e os demais conteúdos são

distribuídos proporcionalmente. Utiliza o Caderno de Apoio e Aprendizagem e o livro

didático em função dos conteúdos a serem trabalhados.

                                                            27 Atualmente, corresponde, no Ensino Fundamental de nove anos, ao 4º ano.

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Na escola C encontrei a professora Cora28 com mais três outras colegas

que haviam participado da formação em 2009. Por problemas particulares das

colegas, ela ficou sozinha nesse processo. Professora guerreira, com 29 anos de

profissão e de trabalho no 1º ano do Ensino Fundamental. Utiliza como justificativa a

facilidade de proximidade e afetividade com os alunos menores e a paixão pelo ato

de ensinar a ler e escrever – alfabetizar.

Apesar de gostar de matemática e de ensiná-la, tinha muita dificuldade ao

aprendê-la, fato este atribuído ao desempenho de seus professores que no seu

modo de ver a situação, “não dominava a sala” e nem a disciplina, a Matemática.

Vivenciou uma metodologia tradicional e ultrapassada, apresentando dificuldade em

assimilar/aprender Matemática. Por esse motivo, ela salienta que não utilizaria a

metodologia com a qual aprendeu, no seu ensinar.

Esta professora, sensível e atenciosa, também tem em sua história fatos que

se repetem nas histórias das outras professoras. Como elas, sua vida traz registro

da conduta de seus professores: foi colocada na classe “fraca” depois de não ter

acompanhado o ritmo da turma mais forte, e escreve deixando transparecer sua

tristeza: “me marcou muito de forma negativa, causando-me um complexo de

inferioridade que só enfrentei devido às condições familiares de amor e apoio.

Superei totalmente esse complexo quando cheguei na 4ª série”. Novamente, a

metodologia tradicional aliada a um rigor profissional deixa sulcos profundos na

trajetória de vida de seus alunos.

No entanto, esse processo de “meditação” reflexiva provocada pela escrita

narrativa encontra nos estudos de Megid (2009) explicações da profundidade que

mergulhamos “podendo trazer à margem os sentimentos, os conhecimentos, as

vivências de um determinado aspecto e, a partir dessa emersão, perceber como

interpretar o vivido e construir o por viver” (p.58) As “meditações” escritas propiciam

conhecer melhor a si mesmo, tendo consciência de seus limites, fragilidades e

potencialidades pessoais e profissionais.

Ao ler as narrativas é possível perceber o quanto as histórias contadas se

entrelaçam às histórias vividas, que se enroscam às histórias praticadas e vão

entrelaçando os fios das histórias de seus alunos na urdidura e tecendo saberes.

                                                            28 Dados da pesquisa no CD anexo da versão física. 

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Assim vai se tecendo uma rede de saberes que representa o movimento cultural e

educativo que acontece na instituição-escola.

A professora Cora crescera e estudara em uma cidade muito pequena, que

possibilitava a todos se conhecerem e, ao mesmo tempo, despertava uma

admiração pela posição ocupada pelo profissional professor na sociedade em que

estava inserida. Uma admiração que acordou o seu querer em formar-se professora.

No início da carreira, numa escola rural, enfrentou mil dificuldades, mas também lhe

despertou o gosto pelo ensinar; foi conquistada e declarou “ver aqueles olhinhos

brilharem quando aprendia, mesmo enfrentando o trabalho difícil da roça, isso me

trazia cada vez mais a segurança de que estava no caminho certo, me identificava

com a minha escolha. Hoje tenho certeza disso!!”

Esse processo, de formar-se e tornar-se professora, levou Cora a querer

aprender mais ao participar de Formações Continuadas, sobre as quais avalia que

os assuntos tratados e as atividades propostas foram relevantes e serviram de

motivação para as suas práticas. O gostar de ensinar matemática talvez tenha

refletido em sua rotina: prioriza três ou quatro aulas de matemática por semana.

Atitude que considero sensata e inovadora, tendo em vista, que muitos professores

alfabetizadores relevam o ensinar matemática para um segundo plano.

Na escola D trabalho com três professoras, Marina, Cecília e Lygia.

Observei que a professora Marina29, de todas é a que tem menos tempo de

atividade docente, por volta de uns doze anos. Na Formação Continuada mostrava-

se sempre muito interessada e realizava com eficiência todas as tarefas propostas.

Apresentava-se pouco falante, muito exigente com ela mesma, muito crítica.

Prefere lecionar para os extremos dos anos iniciais do Ensino Fundamental, o

1º ano ou 5º ano. Com relação ao início confessa que “alfabetizar é muito bom. Você

vê as crianças despertarem para o mundo das letras e números, fazerem

descobertas”. No final, ela se depara com alunos maiores que “buscam as

descobertas, que se sentem desafiados”. Acredita que o papel do professor fica

mais definido no trabalho com estes anos.

Sua trajetória como educadora teve início como alfabetizadora do MOVA-

SP30, trabalho que a encantou e teve forte influência na opção pelo curso de

Pedagogia. Os primeiros anos como educadora permitiu a ela vivenciar                                                             29 Dados da pesquisa no CD anexo da versão física. 30 Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos, criado pelo Prof. Paulo Freire.

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“experiências fundamentais que até hoje determinam a concepção de mundo e de

educação que carrego”, anos significativos marcados por ensinamentos de Emilia

Ferreiro, Paulo Freire e Mario Sergio Cortella e outros. Aprendeu a enxergar a real

importância da educação para o desenvolvimento de um país. Lembrar do trabalho

docente com adultos trouxe-lhe certezas ao declarar que “aprendi muito com meus

alunos e graças a eles fui me tornando, a cada dia mais, uma educadora que

acredita no que faz”. Este diálogo íntimo, solitário desvela o quanto esta vivência

estruturou seus saberes iniciais e delineou sua prática.

Com relação a sua experiência inicial com crianças, o início também foi

marcado pela alfabetização. Apesar de parecer o mesmo trabalho, o trabalho foi

iniciado “com muitas dúvidas, pois apesar do papel ser o mesmo – educadora – o

olhar é muito diferente, as necessidades e expectativas são outras”.

Encontrou em sua trajetória muita ajuda de colegas, como ela mesma

descreve, “sempre dispostos a estender a mão, a trocar experiências e expectativas

de aprendizagem. [..] À medida que ensinava aprendia também”. Processo não

muito comum dentro de uma escola. A colaboração vivida e ressaltada pela

professora Marina é um fator que precisa ser destacado. O que se encontra

normalmente são professores em início de profissão, sozinhos, abandonados pelos

outros professores e pela instituição.

Nosso olhar para o problema se baseia em Nóvoa (2007) que trouxe à baila

este problema em uma palestra, afirmando “Continuamos a ser uma das profissões

onde se colabora menos, [...] do ponto de vista do gesto profissional, do dia a dia

profissional, da rotina, há um grande déficit de colaboração” (p.14). Para ele o

problema da colaboração com os colegas e integração dos jovens professores é

dramático e deprimente. Alerta para a necessidade de encararmos o problema, de

estabelecermos formas de inter-relacionamento mais colaborativo, mais coerentes,

menos solitária e individualista dos professores jovens, acentuando a tendência dos

profissionais da educação, um fechamento individualista e solitário.

A professora Marina participou de formações que envolvem tanto a

Matemática como a alfabetização, garantindo que foram importantes no

desenvolvimento de seu trabalho na sala de aula e direciona sua prática no

desenvolvimento de atividades que estimulam a criatividade, o raciocínio, o senso

crítico e autoestima.

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Sempre gostou de Matemática, apresentando um bom desempenho na sua

trajetória escolar, inclusive era procurada pelos colegas para tirar dúvidas. Seu

desempenho nada tinha a ver com a metodologia dos seus professores de

Matemática. Ela como as outras professoras, vivenciaram a ênfase na memorização

e no treino de listas e mais listas com exercícios. As marcas deixadas por vários

professores ótimos se misturaram às poucas vivências negativas encontradas,

delineando o seu próprio caminho.

Falou com entusiasmo da participação na Formação Continuada de

Matemática, do tratamento diferenciado dado aos conteúdos tratados, da reflexão

realizada a respeito do seu trabalho, bem como do compartilhamento propiciado

pela troca de experiências. Para ela, foi uma experiência muito rica, relatando as

mudanças provocadas em sua prática, pois, “após a formação foi procurar entender

melhor o que eles sabem, como eles pensam e quais os mecanismos mentais que

utilizam para solucionar as contas e as situações-problema apresentadas pelo

professor. A partir daí, precisei mudar minha postura frente às dificuldades

apresentadas pelos alunos além da metodologia utilizada”.

Oferece Matemática aos alunos em seis horas-aula distribuídas por quatro

dias da semana, numa rotina que privilegia cálculo mental e problemas. O Caderno

de Apoio e Aprendizagem foi um organizador da sua prática, pois em cada unidade

contempla os blocos de conteúdos: Números e Operações, Espaço e Forma,

Grandezas e Medidas e Tratamento da Informação.

A professora Marina assim finaliza sua narrativa reflexiva: “sei que muitas

vezes a sombra de um modelo tradicional e limitante de educação ainda nos segue,

não permitindo um avanço mais sólido na direção de uma educação transformadora

e inovadora que valorize de fato cada educando, como um ser humano dotado de

diferentes capacidades e potencialidades”.

Ela demonstra seu processo de transição entre o seu fazer seguro de muitos

anos e o fazer novo ainda incerto, cheio de dúvidas, instigado pela formação

continuada. Para abalar ainda mais suas verdades, as atividades praticadas e

relatadas pela professora mostraram-lhe a importância dos saberes que transitam na

sala de aula e a importância de valorizá-los. Como é sabido, mudar é difícil, é um

processo lento e solitário. Segundo Serrazina(1999) mudar leva certo tempo e

precisa de muita persistência dos professores, as mudanças na prática ocorrem

quando

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os professores ganham autoconfiança e são capazes de refletir nas suas práticas. Isto pressupõe um elevado grau de conscientização que os ajude a reconhecer as suas falhas e fraquezas e a assumir um forte desejo de ultrapassá-las. (SERRAZINA, 1999, p.164)

Esse processo de mudança gradativa na prática de matemática em sala de

aula tem sido regado de muita reflexão e adubado com a conscientização de cada

gesto, permitindo a professora Marina, uma trajetória mais segura e dinâmica. Ela

tem duas características importantes: o querer mudar e o ousar fazer.

A Professora Cecília31 atua em uma turma do 2º ano, na escola D. Sua

formação abrange Magistério e Biologia. Sua participação no curso de formação era

atenta, interessada, mas silenciosa, pouco revelava da sua prática.

A motivação e a vontade de trabalhar com “os pequenos” são motivos fortes

para a não preferência por um ou outro ano do Ensino Fundamental, e declara “só

não lecionei para os 5º anos”.

Uma sementinha plantada por uma tia também professora, no solo fértil de

sua infância, através dos livros, lousas e semanários usados que eram dados para

alimentar a brincadeira, presente na infância de muitos professores, a “escolinha”,

despertou-a para o magistério, para ser professora.

O não gostar de Matemática é algo que ela não esconde e tem resultado em

um aprender Matemática com muitas dificuldades, apoiado na memorização e no

“muito medo de errar [..] as aulas eram chatas, sem a participação do aluno”. A

metodologia utilizada por seus professores, a seu ver, não era adequada nem para

ela, nem seria hoje para seus alunos, ela “era muito tradicional, o professor era o

doutor do saber! Será? O aluno não questionava, ele não tirava as nossas dúvidas,

apenas transmitia seu conhecimento”. Percebo que sua lembrança está

contaminada pela decepção, pela frustração do não aprender, e prossegue narrando

que se lembra de poucos professores, “alguns de forma positiva e outros não tanto”,

apesar de gostar muito de estudar. A escola como oportunidade de conhecer

pessoas e coisas novas é a única lembrança positiva deixada pela sua trajetória

estudantil. A escola vista como espaço social e transmissor do saber, independente

da atuação eficiente ou não dos atores que a institui ou são instituídos por ela.

                                                            31 Dados da pesquisa no CD anexo da versão física. 

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O gostar de estudar foi a alavanca que impulsionou o seu buscar por muitos

cursos, como ela mesma declara. É uma professora que, ao ensinar Matemática,

tenta superar suas dificuldades, com muito esforço, com vários cursos, preparando

suas aulas com cuidado e carinho. Tem uma preocupação em fazer o melhor, e

afirma que ainda precisa melhorar e muito.

Entretanto, quando participou da Formação Continuada de Matemática,

realizada sob minha orientação, avalia que os assuntos foram válidos e ricos, o que

interferiu foi o tempo, muito curto. No entanto, ao retornar a sua prática, confessa,

“achei difícil de aplicar em sala, mas, sempre fiquei com aquilo na cabeça, [...]

deveria ser aplicado o que aprendi em prol dos alunos”. O como fazer era algo que

estremecia a segurança e a certeza dessa professora. O mudar a prática para “uma

matemática mais elaborada, mais participativa, mais desafiadora, tanto para mim,

quanto para os alunos”, assustava a professora Cecília. Deixava transparecer o

quanto vencer o medo e a insegurança é fator primordial para os avanços esperados

pelos formadores.

Segundo Paulo Freire (2000), o medo é algo muito concreto e não abstrato.

Medo está relacionado a reflexão sobre a necessidade que “...temos de ser muito

claros a respeito de nossas opções, [..] exige certos tipos de procedimentos e

práticas concretas que, por sua vez, são as próprias experiências que provocam

medo”(p. 69). O autor explica que, na medida em que vai aumentando a clareza

sobre as opções e os sonhos proporcionalmente, vai clareando melhor as razões do

medo e a certeza de que ele precisa de limite. O medo imobiliza ações e a ousadia

rompe os grilhões.

Entretanto, segundo Cecília, muitos grilhões estão sendo rompidos e o medo

restringido pelo uso dos “excelentes Cadernos de Apoio e Aprendizagem” que

fizeram aflorar o aprendizado adormecido, produzindo “um trabalho mais rico”. As

atividades propostas pelo material fazem com que “o professor precise rever seus

conceitos”, e refletir sobre seus conhecimentos. No material, o trabalho com a

Matemática é proposto de maneira mais lúdica e participativa, cujas estratégias

incentivam o aluno a pensar, a buscar caminhos para a solução das mesmas.

Avalia que “os encontros estão sendo ótimos, porque a matemática sempre é

um grande nó, tanto para estudar, quanto para ensinar”.

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A professora Lygia32 é a única que nunca fez formação de Matemática, mas

mostrou-se interessada. Seus questionamentos sobre a Matemática convenceram-

me a adotá-la e passei a observar suas aulas. Ela tem uma experiência docente de

dezoito anos com alunos do primeiro ano do Ensino Fundamental.

Professora alfabetizadora por opção, mas com influência de uma família

ligada a educação, inclusive a mãe também professora. Ensinou em todos os anos

iniciais do Ensino Fundamental.

Em sua história de vida narra os diferentes caminhos que seguiu até a sua

opção final: ser professora dos anos iniciais do Ensino Fundamental, uma professora

polivalente. Foi desde vocalista de banda à professora de Língua Inglesa.

Sua trajetória estudantil foi afastando-a cada vez mais da Matemática,

enquanto a sua trajetória profissional foi aproximando-a desta área do

conhecimento, que declara não gostar. No período escolar foi amparada por um

irmão que tinha um ótimo desempenho em matemática. “Péssima, insegura e meu

raciocínio lógico nunca foi bom [...] fiz o básico para passar de ano e cheguei a ficar

de recuperação, uma vez na vida em matemática!!! Meu Pesadelo!” é a análise

realizada por esta professora que hoje ensina Matemática para seus alunos. Em sua

narrativa aflorou uma empatia relacionada às experiências vividas com uma

Matemática cuja metodologia ela elucidou: “era tudo mecânico, decorativo, dependia

de memorizar esquemas sem entender o que se estava fazendo”. Percebo uma

relação insegura, incerta, receosa em Matemática.

Sua atuação como professora que ensina Matemática demonstrou segurança,

mas não se considerava um modelo de atuação, nem um exemplo. Contou do

contato com o programa de formação – PROFA33, sobre o qual ressaltou sua

qualidade ao afirmar que ele “fez revolucionar meu jeito de ensinar abrindo um leque

de opções para deixar o tradicionalismo guardado na gaveta” e avaliou que os

diferentes investimentos formativos na área de Língua Portuguesa permitiu um rumo

certo com base mais sólida. No entanto, com relação à Formação Continuada de

Matemática só “mais recentemente é que começamos a olhar com maior atenção

para ela”.

                                                            32 Dados da pesquisa no CD anexo da versão física. 33 Programa de Formação de Professores Alfabetizadores, proposto pelo MEC e realizado na rede estadual e municipal. Ser formadora deste Programa foi mais um marco de minha trajetória profissional.

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Ao ser questionada sobre a ajuda proporcionada pelos assuntos tratados na

Formação Continuada da qual participa afirmou que achou importantíssimos, um

apoio para um trabalho mais significativo em sala de aula, a oportunidade de

aperfeiçoar o seu conhecimento matemático e também ampliar o dos seus alunos.

Salientou ainda que a formação na escola “ajudou muito, pois o que aprendemos

durante a formação inicial nem sempre é suficiente, ou eficiente, para atendermos o

dia a dia na sala de aula. E há sempre algo novo para aprender”.

A sede de aprender que esta professora apresentou superou a dificuldade

que ela declarou ter. Trabalha com matemática apenas três vezes por semana, e

utiliza apenas o Caderno de Apoio e Aprendizagem; tem uma rotina muito bem

estruturada e só lhe falta abrir mais um pouquinho de espaço para esta matemática

que tanto encanta os pequenos.

Para encerrar a narrativa das histórias de vida das sete mulheres, que

compõem uma trama sagaz e intrincada, tecida com fios coloridos e de formatos

diferentes, representando cada escola, apresento o cenário onde os atores

aparecem com roupagens diferentes (formação inicial), mas unidos por uma mesma

causa: saber mais Matemática.

Quadro 2: Perfil dos atores da formação

Formação Relação com a Matemática

Nome do Professor

Escola

Médio Superior Pós-graduação

Tempo de atuação

gostam Desempenho como aluna

Raquel A Normal Pedagogia Psicopedagogia 24 anos sim Ótimo

Roseane B Magistério Pedagogia Alfabetização 15 anos sim Bom

Angela B CEFAM Pedagogia Psicopedagogia 18 anos sim regular

Cora C Normal Pedagogia não 29 anos sim dificuldade

Marina D Médio Pedagogia Psicopedagogia 12 anos sim Bom

Cecília D Magistério Biologia não 25 anos não dificuldade

Lygia D CEFAM Letras Trad. L. Inglesa 18 anos não péssimo

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CAPÍTULO 5

ESCOLA - ESPAÇO DE FORMAÇÃO DA/PARA PRÁTICA

Nesse capítulo, contarei o desenrolar da tessitura das práticas das sete

educadoras que iniciaram a sua trajetória buscando caminhos alternativos em uma

Formação Continuada de Matemática, fora da escola e, posteriormente, em

colaboração com esta formadora/pesquisadora, dentro da escola. Foram

fortalecendo o ato de tecer a prática, ponto a ponto, em cada trama dos seus

caminhares pedagógicos, do conhecer e reconhecer dos seus saberes e também de

compreender os saberes de seus alunos. Foram, pouco a pouco, mudando seus

conhecimentos provisórios e os de seus alunos, ampliando-os na medida em que

reformulavam ou aventuravam-se por um fazer diferente.

Nesse movimento de observar e de ser observada, também fui revendo o

meu papel de formadora, no qual a emoção, os fazeres, a colaboração e a confiança

se enredavam para responder ao desafio de refletir na ação formadora e sobre essa

ação. Processo de reflexão que teve como fundamento um repensar teorias,

encaminhamentos e planejamentos conjuntos e individuais. Num processo paralelo,

fui desempenhando um novo papel, o de pesquisadora, cujo olhar atento e afastado

tudo observava, sem deixar-se contaminar pelas relações afetivas, mas

extremamente interligada e entrelaçada pelo olhar e ouvir sensível da formadora.

Processo uno e duplo, fusão de papéis desempenhados, de formadora/pesquisadora

e de pesquisadora/formadora. Segundo Morin (2001), para melhor compreendermos

a nós mesmos ou ao outro, é preciso “compreender sua unidade na diversidade, sua

diversidade na unidade. É preciso conceber a unidade do múltiplo e a multiplicidade

do uno” (p. 55).

Nesse sentido, a realização da Formação Continuada de Matemática nas

quatro escolas públicas A, B, C e D, teve como foco de atenção o estudo no coletivo

e a reflexão na e sobre as práticas, bem como, a preocupação em manter um

diálogo com os reais problemas enfrentados pelos professores ao ensinar

Matemática nos anos iniciais.

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Uma abordagem reflexiva na formação que Pimenta (1999), com base em

Zeichner (1988), afirma ser uma boa estratégia para melhorar a qualidade da

formação de professores, pois permite que seja potencializada a capacidade de

enfrentar a complexidade, as incertezas e as injustiças dentro e fora da escola. A

autora prossegue destacando que a formação envolve um duplo processo: o de autoformação dos professores, a partir da reelaboração constante dos saberes que realizam em sua prática, confrontando suas experiências nos contextos escolares; e o de formação nas instituições escolares onde atuam (PIMENTA, 1999, p. 30)

A Formação na escola foi vista como um espaço para aplicar o conhecimento

das formações iniciais e continuadas e analisar as práticas que ocorrem dentro do

espaço escolar. É a oportunidade que o professor tem de investigar o seu fazer,

compreendendo não apenas os seus saberes, mas também, os dos seus alunos.

Local propício a um repensar de atividades e intervenções, um desvelar de teorias

que sejam base para as diferentes escolhas dos professores e que lhes permitam

compreender as escolhas de seus alunos. Ambiente desencadeador de escuta

atenta, olhar observador, atitude investigativa e espírito desafiador.

Uma reflexão com o mesmo significado atribuído por Oliveira e Serrazina

(2002), que pode “abrir novas possibilidades para a ação e pode conduzir a

melhoramentos naquilo que se faz. A reflexão pode potenciar a transformação que

se deseja e que se é capaz de fazer com os outros” (p.12).

Nesse sentido, foram sendo construídos novos caminhos ou revisitados

aqueles que suscitaram dúvidas ou não produziram os resultados esperados. Muitas

questões foram sendo explicitadas e saberes despertados. Sob olhares

perscrutadores e atentos foram sendo realizadas discussões, negociações e

propostas, apesar das fisionomias envoltas pelas dúvidas. Os resultados foram

sendo construídos em uma trajetória reflexiva e produtiva que narrarei com muito

carinho por todos aqueles, integrantes deste caminhar, e colaboradores que

contribuíram para que esta investigação fosse concretizada.

Os questionamentos e interesses verbalizados pelas professoras

participantes foram delineando um caminho inicial por meio das estruturas e da

organização do SND – Sistema de Numeração Decimal e uma retomada a respeito

de como os alunos constroem suas ideias sobre números. Apesar dos professores

terem estudado os encaminhamentos propostos pelo livro do professor do Caderno

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de Apoio no horário coletivo, eles ainda apresentavam dúvidas de como lidar com

alunos que:

1) Recitam números oralmente, mas não sabem escrever os que são

propostos.

2) Na sondagem, escrevem quantidades de algarismos que excedem os

números ditados ou solicitados por meio da escrita por extenso.

3) Escrevem números com algarismos invertidos.

4) Ao comparar dois números, utilizam regras desconhecidas para destacar o

maior ou menor.

Muitas dessas dúvidas já haviam sido tratadas por mim durante as formações

continuadas que as sete professoras haviam participado. O esperado era que as

dificuldades fossem apenas das professoras que nunca haviam participado de

formação. Para minha surpresa, era comum a todos.

Por este motivo, o ponto de partida foi olhar para as sondagens realizadas

pelas professoras e cuja análise havia gerado muitas dúvidas. A sondagem envolvia

um ditado de números realizado a cada bimestre para verificar o conhecimento

numérico dos alunos. Frente ao meu questionamento sobre como haviam realizado

a análise, afirmaram que encontraram alunos que ao escreverem números “se

apoiavam na fala” ou utilizavam números com “muitos zeros ou uns” para substituir

alguns algarismos que compunham o número ditado. Inclusive, as professoras que

fizeram uma comparação com as escritas alfabéticas, afirmaram que os “alunos ao

escreverem palavras desconhecidas, registravam muitas letras relacionando a

quantidade de letra ao significado da palavra”. Utilizaram a situação como analogia

para definirem as escritas dos alunos para números desconhecidos e cuja oralidade

dava uma ideia falsa de serem números muito grandes, talvez por isso “eles usavam

muitos algarismos”. Em entonação que transmitia surpresa e ao mesmo tempo

suspeita, declararam algumas professoras que “alguns alunos usam letras quando

escrevem os números desconhecidos, eles não reconhecem e nem sabem ainda os

números e temos alunos que escrevem o número invertido. O que fazer com eles?”

Com relação a esses questionamentos e as diferenças de escritas

encontradas na sala de aula, Tolchinsky (2003) assegura que há diferenças entre a

produção da escrita numérica e o sistema que envolve o número. Para ela ordem, quantidade e repetição de marcas são restrições previsíveis na escrita, enquanto as mesmas restrições são imprevisíveis para a

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notação numérica. Na notação numérica, a regulação pelo referencial faz com que qualquer combinação seja possível, não existem restrições com relação à repetição ou quantidade de marcas”. Para ela o sistema de numeração decimal é menos limitado sintaticamente que a escrita (TOLCHINSKY, 2003, p. 206).

A autora afirma que a relação entre símbolo numérico (algarismos), seu nome

e o que ele significa são mais fáceis de compreender do que com os símbolos

alfabéticos.

Logo, uma questão pairou no ar, mas deixei-a em suspenso para ser

retomada em um momento oportuno de reflexão: Aluno que escreve letra não sabe o

que é número? Tinha a certeza que os estudos e discussões poderiam responder

essa questão após uma análise comparativa e mais apurada.

Em cada sala de aula observada, percebi que os alunos tinham a sua frente,

logo acima do quadro, o alfabeto e os algarismos de 1 a 9 e por último, o zero. Era

esperado que eles buscassem apoio naquilo que sabem e têm certeza. Como eles

leem o alfabeto diariamente, ele é mais presente, quanto aos números não tinham

uma leitura tão frequente.

Ao analisarmos as sondagens, encontrei o registro das variedades de

produções numéricas apontadas pelas professoras e também um discurso pronto e

seguro baseado nas informações obtidas nas formações anteriores, sobre algumas

das características encontradas nas escritas.

No entanto, ao serem questionadas por mim (formadora) sobre a escolha dos

números ditados em cada sondagem realizada ou, a interpretação das escritas

numéricas de seus alunos, muitas dúvidas eram evidenciadas e perguntas

mencionadas. Diante dessa situação, eu (formadora) percebi que o diálogo ali

instalado. Necessitaria de um estudo profundo, reflexivo e esclarecedor sobre

números. Estudo que seria para uns, apenas uma retomada, e para outros, um

primeiro contato mais profundo, contudo, para ambos, muito mais esclarecedor.

Primeiramente, iniciei um reolhar em conjunto com as professoras, no ditado

de números realizado com os alunos, nas escritas e no acompanhamento da ficha.

Fui problematizando e, ao mesmo tempo, delineando um panorama geral do que

cada aluno sabe sobre números e um diagnóstico dos avanços ou dificuldades

encontrados. A estratégia utilizada teve a intenção de direcionar o olhar das

professoras por outro viés: observar o que os alunos já sabem e como sabem, ao

invés de focar apenas no que eles não sabem. Cada professor foi levado a perceber

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que compreender o que aluno “tentou fazer, para descobrir qual a natureza do erro

que ele cometeu, exige um olhar mais cuidadoso” (WEISZ, 2000, p. 40), uma atitude

mais observadora. Postura que demanda do professor, segundo a autora “construir

conhecimentos de diferentes naturezas, que lhe permita ter claros os seus objetivos,

selecionar conteúdos pertinentes [...] e construir novos patamares de conhecimento”

(p. 54). Nesse sentido, a análise do material escrito e da fala dos alunos passa a

exercer um duplo papel, de intervenção para que haja avanço e de

planejamento/replanejamento para pensar/repensar estratégias de ação.

Imbuídos do querer saber retornamos a situação geradora de conflito, as

escritas numéricas, pois segundo as professoras “o avanço de alguns alunos se

dava de forma muito lenta”. Inclusive, as sondagens realizadas até aquele momento

apresentavam resultado insatisfatório, com pouco progresso, fato que as

incomodavam. “Os números são muito grandes. Talvez este seja o motivo das

dificuldades encontradas”, concluíam algumas. Outras ficavam caladas, só

aguardando.

As sondagens utilizavam como base o modelo proposto pelo documento

“Guia de Planejamento e Orientações para Professor do 2º Ano (2007, p. 26)”. Para

ilustrar, partimos dos números propostos para serem utilizados na sondagem do

segundo semestre, em agosto: 50, 84, 590, 600, 705, 3068, 6000, 8473. Números

escolhidos pelas escolas desta Diretoria para o diagnóstico dos alunos de 1º e 2º

anos do Ensino Fundamental. Mediante essa situação indaguei: “A escolha desses

números está apoiada em algum critério?”

Apesar das indignações, indagações e concordâncias, algumas professoras

disseram que utilizavam aqueles números para realizar o diagnóstico solicitado pela

Secretaria de Educação e cujo resultado deveria ser tabulado e encaminhado.

Nunca haviam questionado a seleção desses números e não de outros. Afirmaram

que “afinal são propostos por um documento oficial e selecionados para facilitar a

comparação entre as escolas, mas se pudessem proporiam números mais simples”.

Podemos perceber que muitas vezes, muitos dos professores utilizam

recursos pedagógicos como o livro didático, jogos ou sondagens, entre outros, sem

muita análise e muita clareza a respeito dos fundamentos ou critérios que os

embasam.

Após problematizar o assunto e a constatação de como os envolvidos

pensavam, eu/formadora realizei um fechamento sobre a fundamentação que

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embasava a seleção e organização de um ditado de números bem como os critérios

que as envolviam:

1) Uso de números desconhecidos: as grandezas numéricas devem ir além das

já trabalhadas pela professora, para que não paire dúvida se os alunos

escreveram de memória ou elaboraram um critério próprio no qual tenha

sido colocado em jogo tudo o que sabiam e pensavam sobre a escrita dos

números.

2) O valor posicional: alguns algarismos ocupam diferentes posições em

diferentes números, para se observar como cada aluno compreendeu e

utilizou o princípio do valor posicional. Para exemplificar, vamos nos reportar

para o modelo em destaque e observarmos o algarismo 8 que aparece nos

números 84, 3068, 8473.

No entanto, sabemos que os números 3068, 6000 e 8473 são números

desconhecidos e que ainda não foram trabalhados pelos professores dos primeiros e

segundos anos do Ensino Fundamental. A seleção realizada tinha sido feita com o

propósito de averiguar o conhecimento dos alunos, o que sabiam e como sabiam

além de compreender e utilizar as respostas dadas para a realização de novas

atividades.

Retomei e compartilhei com os professores envolvidos, uma síntese dos

estudos realizados por Brizuela (2006), Nunes e Bryant (1997), Lerner e Sadovsky

(1996), Moreno (2006), entre outros. Constatações que apoiaram os

esclarecimentos realizados, validaram os discursos e subsidiaram minha intervenção

com o grupo. Entendo por intervenção, a ação realizada pelo formador ou professor

frente a uma situação que envolve reflexão, solução e tomada de decisão.

Com relação aos alunos que misturam letras e números em suas escritas

tabulamos uma conversa baseada nos esclarecimentos de Brizuela (2006). Ela

constatou que os alunos em suas escritas utilizam letras ou números, ou só letra ou

todos os números que conhecem para representarem os números ditados ou as

escritas realizadas. Muitas vezes podemos perceber que elas repetem o mesmo

algarismo várias vezes. Frente a essa constatação dos professores a autora

complementa: “a aceitação do uso do mesmo grafismo para representar quantidade,

e sua rejeição para representar linguagem escrita, reflete o fato de que as crianças

fazem distinção entre linguagem escrita e números escritos” (p. 20).

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Brizuela (2006) busca base nos estudos de Emilia Ferreiro sobre a

aprendizagem do sistema de escrita, com quem corrobora ao afirmar “parto do

princípio de que os sistemas escritos constituem objetos conceituais. Isto é, a

aprendizagem infantil das notações matemáticas não é meramente uma questão de

habilidades perceptivo-motoras”(p.18). Isso nos permitiu refletir a respeito da

validade do preenchimento de folhas e folhas repletas de números, se essas listas

colaboraram para a compreensão da organização do sistema, a percepção das

relações que existem entre seus elementos e sobre seu funcionamento. As

professoras perceberam que fazer números de forma mecânica tinha na verdade o

único propósito de treinar a escrita simbólica, mas quando os alunos eram testados

para escrevê-los a dúvida tomava conta e na escrita apareciam números

desconexos.

Após essa discussão encerramos o assunto, pois esse tema não era algo que

merecia um debruçar mais atencioso, elas já haviam realizado a sondagem e

enviado a análise para os órgãos centrais. A tarefa estava cumprida.

No entanto, o assunto veio à baila novamente no início do ano de 2011, e é

sobre esse momento que vou discorrer. Antes da solicitação oficial, incitei novas

reflexões, e eu/formadora provoquei os professores para que elaborassem um

ditado com novos números, utilizando os critérios já conhecidos. A sondagem teria

outra conotação; seria utilizada com o propósito de diagnosticar o conhecimento

numérico dos alunos no início do ano letivo. Com esses dados em mãos, teriam

condições de planejar ações mais adequadas que consideraria tanto a

complexidade do sistema de numeração como o processo de construção do

conhecimento de seus alunos.

Para Lerner e Sadovsky (1997), a complexidade é inseparável da

provisoriedade. Ela afirmam “ teremos que renunciar a estabelecer no início todas as

relações possíveis, e será necessário optar pela reorganização progressiva do

conhecimento” (p.118). Para elas, a aprendizagem é provisória, na medida em que

os conflitos vão se estabelecendo, o conhecimento atual vai sendo substituído por

novas descobertas e transformando-se em novos conhecimentos.

Nesse sentido, foram retomados os estudos de Brizuela (2006), Moreno

(2006), Lerner e Sadovsky (1996) e Nunes e Bryant (1997) pois, além do coletivo da

escola ter novos integrantes, devido a rotatividade, havia necessidade de novos

conhecimentos ou um estudo mais detalhado para vencer a provisoriedade dos

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saberes e colaborar na definição das intervenções. O combinado foi que os estudos

seriam realizados em outros momentos de horários coletivos e que seriam

retomados na medida do necessário quando precisassem de maiores

esclarecimentos.

Além do estudo, as professoras do horário coletivo se comprometeram em

realizar as sondagens e trazê-las no próximo encontro. As sete professoras em

horário individual (comigo como formadora) vivenciaram a organização de um ditado

de números diferentes dos propostos nos documentos oficiais:

1. A professora Roseane da escola B elaborou o seguinte ditado de

números: 6, 32, 23, 16, 300, 123, 2000, 5000.

2. O ditado organizado pela professora Cora da escola C para sua turma

envolveu arranjos dos algarismos de 1 até 5, cujo resultado obtido foi

os números: 4, 13, 25, 42, 135, 230, 2000, 5000.

3. As professoras Cecília e Lygia da escola D também optaram por

números de 1 até 5. O ditado envolveu os seguintes números: 2, 5, 24,

43, 54, 243, 300, 304, 2005, 5000.

Com as escritas dos alunos em mãos e a certeza de que “erro é fecundo e

desempenha um papel construtivo na aquisição de conhecimentos” (MORENO,

2006, p.53), encaminhei a discussão para que fizessem um contraponto entre o

discurso incorporado e utilizado com certo orgulho e o observado nas sondagens. A

discussão transcorreu ao redor do que elas achavam que seus alunos já sabiam.

Normalmente, elas desfilavam um grande número de assuntos que seus alunos não

dominavam. A mudança esperada é que elas aprendessem a olhar para os saberes

dos alunos como uma boa parte assimilada e se preocupassem com as estratégias

de ensino para atender o que eles não ainda sabem, assim a organização de tempo

da rotina seria mais eficiente. Analisei com elas diversas escritas, inclusive levei de

uma escola para outras as sondagens significativas que mereciam ser observadas

nos outros grupos-escola, como exemplos reais dos estudos realizados. Para

exemplificar, apresentarei algumas sondagens mais significativas de alunos das

professoras Roseane, Cecília e Lygia.

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Alu

no A

- P

rofe

ssor

a Ly

gia

Alu

no B

- P

rofe

ssor

a C

ecíli

a

Figuras 3 e 4: Sondagem de números de março/2011 Fonte: Acervo pessoal.

As figuras 3 e 4 representam as escritas de dois alunos com 6 anos e

frequentadores do primeiro ano do Ensino Fundamental. Apresentam saberes

diferenciados com relação à organização dos números, mesmo tendo conhecimento

escolar até o número 30. As professoras Lygia e Cecília haviam iniciado o trabalho

de números e tinham como objetivo avaliar os algarismos do 1 ao 5, distribuídos nas

diferentes posições.

O aluno da professora Lygia foi trazido como exemplo, por dois motivos.

Primeiro que é o aluno que todas as professoras ali presentes gostariam de ter e um

exemplo perfeito para as constatações das autoras mencionadas. Em segundo

lugar, foi analisado se é possível afirmar que ele escreve convencionalmente, e elas

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identificaram que ao realizar o ditado escreveu quase todos os números na forma

convencional, exceto para os números 304 e 5000. Para 304, apresenta uma escrita

apoiada na fala 3004 e para o número 5000, representou com um zero a menos,

apesar de ter escrito 2005 corretamente. Perguntei a elas: “Será que ele escreveu

2005 de memória, por isso esqueceu um zero na escrita de 5000?”. As professoras

não souberam responder e perceberam que precisariam de novas escritas. Elas

concluíram que este aluno parecia conhecer bastante sobre a organização do

sistema, parecia ter utilizado informações outras, não somente as da escola para

realizar a sua tarefa, inventou ferramentas que o aproximou da escrita convencional,

mas tudo isso eram só conjecturas. Para termos certeza precisaríamos investigar

mais sobre como ele elabora seus procedimentos.

Ao observar a figura 5, parte da escrita realizada pelo aluno da professora

Cecília, ao representar números desconhecidos entrou em conflito e utilizou

números coringas. As professoras destacaram que ele ao escrever o 243, para

representar o 200 em vez de escrever o 2, usa o 1.

Figura 5: Detalhe da figura 6. Números coringa Fonte: Acervo pessoal

No entanto, verificamos que ao representar o 300 na escrita do 304, retornou

ao uso do coringa, o 1, mesmo tendo colocado o 3 na posição correta na escrita do

300. Observamos que na escrita do número 300, apesar de ser um número exato

com nós, ele usou o 1 e 4 no lugar dos zeros e trocou de lugar o algarismo 3 pelo 1

para a escrita de 304 deixando que o algarismo 4, na posição correta. A impressão

deixada por suas escritas é que trocou os algarismos 1, 3 e 4 de lugar, não

demonstrando nenhuma restrição sobre a repetição do mesmo algarismo, o 1, ao

representar números diferentes, o 243 e o 304.

Percebemos que o aluno realizava, conforme Brizuela (2006, p. 53) denomina

“uma rotação de algarismos” que é utilizado como elemento diferenciador, uma

forma observada pela autora de interagir com as regras convencionais do sistema e

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criar as próprias convenções para compreendê-las. Continuei a nossa reflexão,

destacando que sabemos que para os alunos “não dá para escrever duas palavras

próximas iniciadas pela mesma letra”, ou a “não repetição de grafias vizinhas é uma

das mais fortes restrições” (TOLCHINSKY, 2003, p. 210) impostas pelos alunos para

que uma cadeia de grafias possa ser considerada uma escrita. No entanto, os

alunos utilizaram elementos repetidos em suas notações da quantidade, sobre o que

a autora afirma que trata-se de uma indicação de “diferenciação formal muito

importante com relação à escrita”(p. 211).

Figura 6: Números coringas Fonte: Acervo pessoal

A observação nos permitiu afirmar que o aluno B manteve a escrita do 43 no

243, logo sabe escrever o 43. Entretanto, não nos possibilitou afirmar que para a

escrita de 300 sabe que começa com 3, primeiro pelo conflito apresentado na escrita

do 304 e segundo que precisaria ter sido perguntado no dia da escrita como ele

pensava, fato que não ocorreu.

As professoras, ao serem questionadas sobre o que mais observavam nas

produções escritas, destacaram que na produção do aluno da professora Cecília,

figura 6, foram utilizados os números coringas na escrita dos números 24, 243, 300

e 304. Justificaram: “esses são números opacos”.

Na escrita de 2005 e 5000, as professoras perceberam que o aluno B colocou

os algarismos iniciais correspondentes, e completaram: “lógico, são números

transparentes, dão dica dos números que virão no início, mas o aluno apresentou

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uma escrita apoiada na fala, apesar de registrar uma escrita invertida para o número

5”.

Após as anotações feitas por mim (formadora) para organizar as falas das

professoras do horário coletivo, permitiu concluirmos que o aluno B da professora

Cecília, através de sua escrita espontânea demonstrou que sabia os algarismos, as

unidades. Conhecia convencionalmente algumas dezenas apesar dos conflitos

apresentados e resolvidos com o uso dos números coringas e a escrita apoiada na

fala. As professoras ficaram admiradas ao perceberem quanto os alunos sabiam,

considerando que esses alunos haviam chegado há pouco tempo no Ensino

Fundamental. Concluímos que eles “já sabem muito” sobre o sistema de numeração

e a cada momento os alunos têm surpreendido a todos com seus diferentes

saberes.

Realizamos a análise de mais algumas sondagens de outros alunos que

exemplificam os saberes dos alunos de escolas diferentes.

Quadro 3 Análise de sondagem de números de março/2011.

Aluno C Profª Cecília Aluno D Profª Lygia Aluno E Profª Roseane Aluno F Profª Roseane

Figura 7: Aluno C

Fonte:Acervo pessoal

Figura 8: Aluno D Fonte:Acervo pessoal

Figura 9: Aluno E Fonte:Acervo pessoal

Figura 10: Aluno F Fonte:Acervo pessoal

Escreveu unidades e

dezenas convencio-

nalmente e para as centenas e

milhares apoiou-se na fala.

Escreveu unidades, milhares e as dezenas até

40 convencionalmente e nas centenas fez uso de “coringas”.

Escreveu unidades, dezenas

e milhares convencionalmentee para as centenas

fez uso de algarismos sem relação com o número ditado.

Escreveu unidades e dezenas

convencionalmente e para as centenas e milhares apoiou-

se na fala.

 

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Eu, como formadora/pesquisadora, percebi que as ações combinadas de

embasamento teórico/estudo aprofundado e análise das sondagens de números

provocaram nos participantes de todos os grupos-escola a necessidade da

realização de novas sondagens para que pudessem realmente diagnosticar o que os

alunos sabiam e como sabiam, informação necessária para a realização de um

planejamento e em alguns casos inclusive para que pudessem retomar ações já

realizadas. Os estudos fortaleceram os grupos-escola para a tomada de decisão e a

análise de fatos reais gerou um movimento reflexivo desses grupos, inclusive das

sete professoras para um repensar das estratégias pedagógicas. A incorporação

desses conhecimentos desencadeou uma mudança na forma de selecionar as

atividades para serem realizadas com/pelos alunos. Um cuidado maior na escolha

dos materiais de apoio pedagógico utilizados em sala de aula. Uma nova maneira de

intervenção com cada dupla de alunos ou com cada aluno, de forma a investigar os

saberes e de permitir mais circulação das informações advindas dos pensares dos

alunos.

Retornávamos ao assunto na medida em que ia sendo solicitado pelos

professores participantes. Isso acontecia após a realização das sondagens e

aguardavam a minha presença para compartilharem comigo e com os colegas, o

conjunto de ações realizadas - diagnóstico/análise/dúvidas. A minha intervenção

compreendia problematizar as falas dos professores para todo o grupo por meio de

um diálogo dinâmico e produtivo enredando todas as opiniões, interpretações,

dúvidas que ainda pairavam e certezas a respeito das escritas apresentadas. Uma

atitude mediadora e interventora que assegurava a todos o direito à voz, a

verbalização de seus pensares e pesares, confiantes em um ambiente sem censura,

sem juízo de valor, sem certo ou errado. Ambiente que propiciou a todos os

envolvidos, inclusive à formadora, aprender, trocar e compartilhar o que sabiam,

organizar os conhecimentos adquiridos e acomodá-los em uma verdadeira vivência

da teoria tão propagada de Piaget, aprendizagem em espiral. Nesse processo de

desnudamento eu/formadora fui tomando consciência da dimensão dos saberes das

sete professoras presentes em seus argumentos e opiniões e compreendendo

quando Tardif e Raymond (2000) afirmam que a dimensão dos saberes dos

professores, não são somente adquiridos no e com o tempo, mas são eles mesmos temporais, pois são abertos, porosos, permeáveis, e

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incorporam, ao longo do processo de socialização, e da carreira, experiências novas, conhecimentos adquiridos em pleno processo, um saber-fazer remodelado em função das mudanças de prática, de situações de trabalho (TARDIF; RAYMOND, 2000, p. 237).

Nesse sentido, cada grupo-escola foi delineando os caminhos a serem

transpostos por eles para que seus alunos pudessem avançar em seus conceitos

provisórios e se permitissem novas descobertas a respeito dos números. O

percebido pelo grupo-escola era o descaso com que se vinha trabalhando com o

sistema de numeração em sala de aula. O destacado era que a solicitação de

escritas de séries numéricas e proposta de agrupamentos e contagem dos palitinhos

de dez em dez e colocados no quadro valor de lugar não estavam colaborando para

que os alunos produzissem e interpretassem números com segurança ou

compreendessem as regras de seu sistema. O sentimento do grupo-escola era que

as dúvidas e as incertezas dos alunos estavam aumentando ao invés de diminuírem.

Por esse motivo peregrinamos pelas propostas de intervenções apresentadas

por Moreno (2006) e por Lerner e Sadovski (1996). Entabulei uma confabulação

tomando como ponto de partida o conhecimento dominado por elas. Utilizei como

argumento problematizador, um discurso pedagógico muito difundido no ensino de

Língua Portuguesa: “Só se aprende a ler, lendo”. “Só se aprender escrever,

escrevendo”. Ao qual dei um toque matemático: “Só se aprende a escrever número,

escrevendo”. “Só se aprende a ordem numérica, recitando”. “Só se aprende a ler

matemática, lendo”. “Só se aprende a quantificar número, contando”. Finalizei: “Só

se aprende operar números, resolvendo problemas e não fazendo a conta pela

conta”.

Esta argumentação, realizada em forma de recitação, com certo ritmo e

envolvida por certo tom de brincadeira, tem sido o tremular de minha bandeira

constantemente.

Só se aprende a ordem numérica, recitando. Resgatar a recitação na sala de

aula, proposta ressaltada por Moreno (2006, p. 56), despertou nas professoras

lembranças de outros tempos. Algumas professoras reviveram seus tempos de

estudantes afirmando que a professora iniciava a recitação e os alunos todos juntos

continuavam, num mesmo ritmo cadenciado sob a batuta do mestre. Uma

professora falou: “Aquele que saía do ritmo ao ouvir o estalar da reguada em sua

carteira, logo voltava”. Outras recordaram seu início da carreira, em que realizavam

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a recitação com seus alunos, com a proposta de memorização dos números, mas

sem muita clareza de sua serventia, abandonaram esse fazer por considerarem uma

perda de tempo. Afinal, “preencher folhas e folhas de números também ajudava a

memorizar e fazia menos barulho”.

“Recitar para guardar a palavra certa na ordem certa”. Recitar na ordem

crescente ou na ordem decrescente adentrou a sala de aula e passou a fazer parte

da rotina diária de algumas práticas. Recitar a sequência iniciando por números

variados saltando quantidades diferentes, além dos intervalos que regularmente

fazem os de 5 em 5, 2 em 2 e outros. Por exemplo, dizia eu/ formadora, partindo do

número 2, saltem de 3 em 3 até chegarem ao número 40. Ao obter oralmente a

sequência: 2, 5, 8, 11, 14, 17, 20, 23, 26, 29, 32, 35, 38, registrei-a no quadro e

perguntei: “É possível perceber regularidade na sequência? Qual o próximo número

com zero?” Questões que poderiam ser discutidas com alunos dos 3º e 4º anos e

apresentadas tanto para analisar as sequências orais como as escritas.

Outro exemplo foi trabalhado: uma sequência onde os saltos são de 5 em 5,

normalmente iniciamos no 5 e paramos no 50 (treino para os fatos básicos ou a

tabuada do 5). Raramente iniciamos a sequência pelo número 4 e paramos no 50. O

obtido foi a sequência: 4, 9, 14, 19, 24, 29, 34, 39, 44, 49. No início a proposta não

foi apreciada pelos presentes, o que era compreensível. Afinal para fazer essa

atividade com os alunos, algumas professoras precisavam adquirir mais segurança

para encontrar o resultado mentalmente. “Precisavam de mais treino”, segundo elas.

A conversa sobre recitação nos remeteu a outro assunto importante que deve

fazer também parte da rotina dos alunos, os diferentes momentos de contagem. Saber contar vai além de apenas saber recitar uma série numérica. Esses momentos

devem ser vivenciados paralelamente. Contar para quantificar coleções de objetos,

contar para resolver problemas. Colocar os alunos diante de situações variadas que

permitissem um progresso em seus conhecimentos de contagem exigiu de cada

professora um repensar de sua rotina e a escolha de atividades problematizadoras

que possibilitassem observar os conhecimentos de números dos alunos e perceber

como eles lidariam com mais uma dificuldade e que saberes acionariam para

resolver os problemas propostos. Para as professoras, contar era um momento

tranquilo para os alunos, “eles sempre estão contando objetos, coisas em suas

casas” afirmavam algumas delas. O observar como eles contavam é que era a

grande novidade a ser explorada. Para isso, as professoras Raquel, Roseane,

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Cora, Cecília e Lygia, professoras dos primeiros anos do Ensino Fundamental,

planejaram atividades a serem aplicadas com seus alunos sob minha orientação

individual e durante suas práticas obtiveram resultados inesperados que as

surpreenderam bastante. Emoções que misturaram momentos de confusão e

incerteza, sentimentos que Schön designou de emoções cognitivas, pois “é

impossível aprender sem ficar confuso” (p. 85).

Emoções que envolveram os momentos individuais entre professor e

formadora/pesquisadora. Instantes propícios de estabelecimento de vínculos com as

sete professoras e também espaço ideal para incitá-las a um fazer diferente, em um

coser e recoser de olhares e práticas. Realização de práticas diferenciadas em uma

parceria colaborativa na qual foi discutido e proposto cada uma das atividades de

aprendizagem tanto pela formadora quanto pelos professores. Foi também

viabilizado o uso das atividades ou a sua transformação, a mudança ou a escolha de

outras atividades, em uma situação de estudo, análise e/ou elaboração que permitiu

conhecer os saberes matemáticos dos professores e suas estratégias de ensino.

Uma situação de estudo e análise também verificada por Serrazina, como

sendo um caminho que colabora para um conhecimento mais preciso do professor,

pois cada vez mais, nós, que somos também formadores, devemos nos colocar numa perspectiva não de fornecedores de serviços que “damos” conhecimento aos professores nos cursos, mas como facilitadores que propomos uma série de situações de aprendizagem que organizamos cuidadosamente. Ao trabalharmos assim, os professores refletem sobre a sua própria aprendizagem e nas implicações para as suas práticas pedagógicas. (SERRAZINA, 1998, p. 126)

Ao conhecerem a si mesmos e as suas limitações matemáticas, os

professores perceberam que deveriam ser mais tolerantes e compreensivos com

relação ao tempo de aprendizagem de seus alunos e seus conhecimentos

provisórios e, assim, sentiram-se desafiados a conhecer mais para ensinar melhor.

A contagem foi observada pela professora Raquel, uma professora que

sempre quer fazer diferente em sala de aula e que está a todo momento

entusiasmada em compartilhar a realização da tarefa e o envolvimento de seus

alunos. Encontrei alunos mais seguros em suas descobertas e mais autônomos ao

defenderem suas hipóteses, pois esta não era a primeira vez que observava a aula

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desta professora. Realizou o projeto Coleção de Tampinhas34 de garrafas pet com

o propósito de analisar como os alunos contam objetos em coleções móveis.

Organizou seus alunos em duplas produtivas35 para a aula de matemática, diferente

das duplas da aula de Língua Portuguesa, atendendo a diversidade a sala de aula.

Contudo, o observado foi muito interessante. Haviam duplas nas quais um

dos parceiros não havia levado tampinhas. Diante do problema, a professora

rapidamente compartilhou-o com a classe, perguntando: “Como era possível fazer a

tarefa, se alguns alunos não haviam trazido tampinhas?” A sugestão recebida foi

que quem tinha bastante daria algumas tampinhas para o colega.

Figuras 11 e 12 Contagem da Coleção de Tampinhas Fonte: Acervo pessoal

Foi nesse momento que o inesperado se fez presente e a atividade acoplou

mais um objetivo. As repartições que se sucederam foram muito interessantes. Em

uma dupla, a aluna que trouxe mais tampinhas resolveu dividir suas tampinhas com

a colega em partes iguais. Para dividir, a contagem era feita por agrupamentos de

seis em seis para cada um, quando o número ficou pequeno foi diminuindo

gradativamente, o agrupamento de distribuição, 3 em 3, 2 em 2 até chegar no 1 e 1.

A divisão não era objetivo da professora. Aproveitou o momento para

problematizar perguntando: “Como foi feito a divisão? Quantas tampinhas cada

aluno ganhou? Houve sobra?” e mostrou-se muito admirada ao perceber que os

alunos tinham noção de divisão, não uma divisão de 1 em 1. Um dividir mais

                                                            34 O planejamento detalhado do projeto Coleção de Tampinhas encontra-se no anexo 2 35 Duplas produtivas é um critério de agrupamento de alunos por semelhanças ou diferenças, desde que os envolvidos tenham coisas a ensinar e a aprender com o outro. 

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avançado, apoiado em diferentes agrupamentos baseados nos conhecimentos

adquiridos nos diferentes momentos de recitação feito com a classe, de 2 em 2, de 3

em 3, de 6 em 6 etc. Também em atividades de contagem do Caderno de Apoio e

Aprendizagem (1º Ano), realizando atividade com coleções fixas, realizadas durante

o ano anterior, acabaram constituindo em um repertório que apoiou o pensar de

seus alunos. Os alunos nunca haviam trabalhado com coleções móveis. A alegria da

professora pela descoberta e por perceber que o caminho percorrido estava dando

frutos foi mais um marco que selou a confiança em nossa parceria. Não acompanhei

a continuidade do projeto, mas orientei a elaboração de algumas situações-problema

a serem discutidas com os alunos e as observações necessárias a serem

realizadas.

Outras atividades envolvendo contagem que merecem destaque foram

organizadas pela professora Roseane. Dois momentos, um envolvendo a utilização

de tabelas e gráficos para expressar o representar o resultado de uma pesquisa, o

outro, um jogo de Trilha.

A professora Roseane iniciou conversando com a classe sobre o

levantamento das respostas dadas pelos alunos para a pesquisa “Eu sou assim...”36 realizada em outra aula e que estavam anotadas na tabela apresentada,

na figura 13. Explicou que havia contado as respostas dos alunos e registrado na

tabela. Perguntou: “O que é gráfico? Alguém sabe?”, iniciando uma conversa sobre

gráficos. Distribuiu para cada trio uma filipeta contendo os dados de uma das

afirmações e uma folha quadriculada escrito na linha horizontal, as respostas que

deveriam ser assinaladas: sim, não e às vezes. Os alunos enumeraram o eixo

vertical e ao pintarem as quantidades indicadas nas filipetas recebidas, não as

relacionavam com os números colocados ao lado dos quadradinhos. Ao pintarem,

eles contavam novamente os quadradinhos até obter a quantidade proposta, fato

que se repetiu em todas as duplas (figura 14).

                                                            36 O planejamento detalhado encontra-se no anexo 4 

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Figuras 13 e 14: Tabela e gráfico da atividade “Eu sou assim...” Fonte: Acervo pessoal

A professora, após todos os trios terem realizado a atividade, discutiu com os

alunos os gráficos que tinham como resultado em uma das colunas nenhuma

resposta, representada pelo zero. E perguntou para os alunos: “Os números ao lado

ajudaram a pintar o gráfico? Como nós sabemos quantos alunos responderam sim

para este gráfico?”

Figuras 15 e 16: Gráficos da atividade “Eu sou assim...´ Fonte: Acervo pessoal

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A grande maioria dos alunos afirmou que contaram os quadradinhos,

conforme observado por esta pesquisadora/formadora. Para responderem o total de

alunos da segunda questão, o aluno foi até o gráfico contar novamente os

quadradinhos, desconsiderando a relação numérica. A professora fez menção aos

números novamente e eles observaram-na em silêncio, sem nenhum comentário.

Em outra aula ela irá trazer novamente os gráficos para serem interpretados e

mostrará a função dos números que se encontram na vertical do gráfico. Esta

atividade elaborada pela professora havia sido discutida no individual com esta

formadora/pesquisadora e, posteriormente, em uma reflexão sobre a ação,

concluímos que havia sido uma situação de aprendizagem interessante e

motivadora, pois envolveu todos os alunos na tarefa e exigiu que os alunos

trabalhassem por colaboração. Cada aluno do trio deveria pintar uma coluna com a

colaboração dos colegas para que o gráfico representasse os dados da filipeta. A

professora manifestou seu contentamento com o desempenho dos alunos, pois

pensou que eles teriam muitas dúvidas. Eles realizaram a tarefa com autonomia, sob

o olhar atento de uma professora que realizou uma circulação problematizadora

mantendo seus alunos interessados em realizar a atividade.

Outra atividade que permitiu a observação de como os alunos se

comportavam diante de situações de contagem foi o jogo de Trilha37 do Caderno de

Apoio e Aprendizagem. O jogo foi realizado em grupos de quatro alunos. Eles

contavam os pontos retirados nos dados e recitavam o valor retirado realizando uma

correspondência termo a termo saltando as casas correspondentes no jogo. Foi

possível averiguar que alguns alunos tinham dificuldade em corresponder o número

falado com a quantidade de casas a serem saltadas. Eles recitavam um, dois, três e

tinham pulado apenas duas casas. Outra dificuldade encontrada por eles era que ao

iniciar os saltos, eles contavam a casa que o pino estava, contando duas vezes a

casa em que estavam. A casa era contada uma vez para a chegada e outra vez

quando partiam. As legendas e as instruções contidas no jogo eram ignoradas, afinal

ninguém queria voltar casa ou ficar sem jogar.

                                                            37 O planejamento do jogo de Trilha se encontra no anexo 5

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Figura 17: Jogo de Trilha Fonte: Acervo pessoal

Na medida em que jogavam iam se apropriando da contagem adequada das

casas e adquirindo mais segurança. Nas aulas que se seguiram, a professora leu

novamente as regras e eles tiveram que jogar seguindo todas as regras. Naquela

aula, jogar e contar eram tarefas suficientemente desafiadoras para todos os alunos.

Muitos alunos disseram entusiasmados que iam jogar com os irmãos em casa, como

eles já sabiam jogar e os irmãos ainda não, era um grande sinal de vitória.

As atividades do Caderno de Apoio de Aprendizagem (1º Ano e 4º Ano) foram

utilizadas por diversas vezes pelas professoras Cecília, Lygia e Marina. Ficou

combinado na escola que as duas aulas para o uso do Caderno estariam fixadas na

rotina semanal permitindo uma melhor organização dos alunos e do professor. Para

colaborar com as professoras na compreensão dos encaminhamentos propostos

pelo material do professor do Caderno de Apoio e Aprendizagem para a realização

das atividades, minhas observações em sala de aula ficaram acertadas para as

terças-feiras, um desses dias. Discutimos a escolha da atividade no momento

individual, e as professoras estudaram as estratégias propostas pelo material oficial,

as dúvidas foram discutidas posteriormente.

As professoras Cecília38 e Cora39, apesar de escolas diferentes, realizaram a

mesma atividade do Caderno de Apoio e Aprendizagem (1º Ano, p. 30). Seus alunos

deveriam criar maneiras para garantir a contagem das coleções fixas. O observado

nas duas salas de aulas foram situações semelhantes. Ao contar as bolinhas os

alunos buscaram diferentes caminhos, e quando questionados se tinham a certeza

                                                            38 Registro realizado por um aluno da Profª Cecília encontra-se no anexo 7 39 O modelo da atividade encontra-se no anexo 6

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que haviam contado todas as bolinhas, afirmavam que sim, mas o resultado

encontrado não era o mesmo.

Ao circular pela classe, percebi que mesmo os alunos que tinham riscado a

quantidade ou agrupado contavam de um em um. Muitos contaram e recontaram as

bolinhas muitas vezes e as marcas deixadas pelo lápis acabavam atrapalhando uma

nova contagem. Observei que para os alunos haviam sido muito difícil garantir que

todas as bolinhas haviam sido contadas, já que pulavam bolinhas e não percebiam.

Aluno A Aluno B

Figura 18: Contagem de coleções fixas Fonte: Acervo pessoal

Contar as bolinhas uma única vez também era uma dificuldade para alguns,

porque mesmo marcando as bolinhas como o aluno A, deixavam de contar algumas

bolinhas e não conseguiam identificá-las no todo, levando-os a resultados diferentes

do esperado. Os que riscavam as bolinhas numa certa ordem ou faziam as ligações

com um traço como o aluno B foram os que conseguiram garantir a contagem de

todas as bolinhas.

Na conversa com essas professoras, apontei a necessidade de seus alunos

serem colocados em diferentes situações de contagem, contar objetos em coleções

móveis primeiro, para depois passarem a contarem coleções fixas e somente

depois, coleções onde os objetos estivessem misturados, como era a proposta da

próxima atividade a ser realizada. Contar coleções móveis daria aos alunos a

possibilidade de compreenderem as propriedades de contagem, contar uma única

vez cada objeto. Possibilitaria ainda que utilizassem o agrupamento como um

procedimento para contar quantidades grandes, pondo em prática as recitações

realizadas na classe diariamente de 2 em 2, de 4 em 4 e assim por diante.

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A professora Lygia realizou uma atividade do Caderno de Apoio e

Aprendizagem (1º Ano, p. 8) na qual os alunos deveriam utilizar contagem e os

números conhecidos. Os alunos trabalhavam em trio e após a professora explicar as

atividades deixou-os trabalhar autonomamente. Desenvolveram as atividades em

cooperação e alguns alunos, ao contarem os colegas na classe, realizaram a

contagem de dois em dois. Ao circular pela classe, investigava as respostas dos

alunos e os desafiava a pensar diferente. Ao final da aula, pediu para dois alunos

que haviam apresentado alguma dificuldade que contassem as revistas para serem

distribuídas, mas para isso, eles deveriam também contar quantos alunos haviam

comparecido naquele dia. Ao ler para os alunos o texto de orientação para a

realização da atividade poderia ter utilizado como atividade de leitura, com

acompanhamento dos alunos, e levantamento das palavras que eles conheciam do

texto. A leitura também deve ser praticada na aula de Matemática, porém essa não é

uma prática comum em sala de aula.

Ao afirmar que só se aprende a ler e escrever números, lendo e escrevendo, nós iniciamos a discussão do assunto com uma conversa para que

elas contassem um pouco sobre como estava acontecendo o uso do quadro

numérico em sala de aula. O modelo do quadro numérico e sua exploração foram

amplamente difundidos pelos documentos oficiais e pelas Formações Continuadas

de Matemática. No entanto, encontrei professoras que ainda não tinham o hábito de

ter o quadro afixado em sala de aula, apresentando inclusive dúvidas com relação a

sua confecção. Perguntas como: “Começamos o quadro pelo 1 ou pelo zero? É para

fazer ele completo até o 100 ou pode ser feito até o 50 para os alunos dos primeiros

anos?”

Para responder as questões busquei em Ifrah (1997) o argumento de que o

início de uma contagem se dá pelo número 1, pois não se conta zero coisas. Logo, a

dedução é que o quadro numérico deva iniciar pelo 1, diferente do quadro de

números sugerido por Moreno (2006, p. 72) que inicia pelo zero. Iniciar pelo zero

favorece a algumas professoras, que se apóiam no conceito de família alfabética e

o transpõe para os números formando as famílias numéricas apresentando aos

alunos a família do dez, família do vinte etc., em vez de trabalharem com intervalos

numéricos.

No entanto, Moreno afirma que o uso da cartela numérica denominado pelo

material oficial de quadro numérico, é um recurso didático que permite aos alunos

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utilizarem números maiores do que aqueles que já sabem ler e escrever e o

considera “um portador de informação que reflete a organização do sistema” (p. 72).

Em resposta à quantidade adequada que o quadro numérico deva conter, a autora

propõe ao professor que ele “tem que ter mais números do que os alunos sabem

contar, uma vez que isso permitirá descobrir que a série dos números se prolonga

além do que eles sabem, mas sempre com organização” (p. 72). O quadro permite a

problematização com a classe: “Quantos números há entre o 7 e o 17? Que

números estão na coluna do 3 e o que eles têm em comum? Que números estão

entre 30 e 40? O que eles têm em comum?”

As professoras reconheceram a importância do uso do quadro numérico, que

adentrou em todas as salas de aula, fixado em local e altura suficiente para que os

alunos pudessem ler os números, acompanhar com os dedos a trajetória da leitura.

A leitura dos números passou a fazer parte da rotina diária numa alternância com a

recitação oral.

A confecção do quadro numérico e sua afixação foram assumidas por

algumas das quatro escolas, em atendimento à sugestão desta formadora, mas

ainda sendo utilizado de forma restrita. Este quadro era utilizado com tenacidade

para a leitura da sequência numérica pelos alunos, acompanhada pelo professor,

porém, poucas vezes para apoiar os alunos com dificuldade em suas leituras e

escritas. Observei uma atividade prática da professora Raquel que utilizou o jogo do Bingo40 para diagnosticar como os alunos reconheciam e interpretavam os

números. Conversamos sobre o objetivo do jogo que favorece a leitura e a

identificação dos números e para que eles fossem desafiados propus que as

cartelas fossem elaboradas com números desconhecidos (anexo3) e baseadas nos

jogos estruturados prontos. Como seus alunos conheciam até o número 100, as

cartelas foram confeccionadas com os números até o 200. A professora pôde

vivenciar a confecção das cartelas, atividade que segundo ela não foi fácil.

O quadro numérico afixado tinha números do 50 ao 200 e deveria ser o apoio

para os alunos com dificuldade. Os alunos, organizados em duplas, demonstraram

estarem acostumados a trabalharem em parceria. Eles marcavam os números

sorteados e a cada número não familiar, a professora investigava com a classe a

escrita correta e anotava as diferentes sugestões de registro do número na lousa,

                                                            40 O planejamento detalhado encontra-se no anexo 3.

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depois pedia ajuda dos alunos para encontrar no quadro numérico. O jogo aliado a

esse processo de intervenção foi se tornando cansativo, acabou tomando muito

tempo e deixando os alunos pouco a pouco desestimulados. Durante a minha

circulação pela sala, notei que alguns de seus alunos haviam percebido as

regularidades dos números e utilizavam suas descobertas para identificar os

números desconhecidos. Para esses alunos o jogo era um desafio e pareciam

entusiasmados. Para os alunos que apresentavam dificuldades ao encontrar

quaisquer dos números cantados, o jogo passou a ser um problema difícil de

resolver. Eles não tinham o hábito de recorrerem ao quadro numérico e não pediam

ajuda ao colega da dupla. Para esses alunos o apoio confiável ainda era a

professora.

Na análise da prática, ponderei com a professora Raquel a necessidade de

mais atividades nas quais houvesse a interação e a colaboração entre os alunos

garantindo a troca de informação. Atividades em duplas ou trios, que provocassem

discussão nas quais os alunos pudessem perceber a importância das “dicas” dos

colegas e confiar mais nelas, descentralizando a busca pela afirmação da

professora. Que as atividades de jogos tivessem uma única finalidade, o de jogar em

colaboração. Para isso, as cartelas poderiam ser distribuídas uma para cada dupla e

os alunos fariam rodízio para marcá-la. As intervenções e o uso do quadro numérico

seriam realizados em outro momento.

Apesar de a professora mostrar-se interessada e sempre disposta a fazer

diferente, percebeu que mudar a prática não é tão simples. Mudar requer estar

atenta a cada detalhe, ter a preocupação em analisar cada atividade e a clareza do

objetivo inicial para avaliar se foi atingido, senão deve refazê-la de outro modo para

chegar aos resultados esperados.

Conversamos também que cabe ao professor desempenhar em sala de aula

diferentes papéis, o de organizador de conhecimento e o de incentivador de

aprendizagem, desvinculando-se do papel de detentor do saber e informador de

conteúdo – único saber confiável na sala de aula. Este assunto foi discutido com os

grupos-escola envolvendo também a rotina diária nas aulas de matemática e os

conhecimentos acionados pelo uso do quadro numérico.

Entretanto, foi na observação da aula da professora Roseane que encontrei

uma prática que exemplifica toda essa conversa. Ela mostrou um quadro numérico

afixado numa parede da sala, montado com a colaboração dos alunos. Nas

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conversas individuais, havia sugerido sobre a possibilidade de realização dessa

atividade que, além de diagnosticar como seus alunos interpretavam os números

desconhecidos, permitia observar como acontecia a colaboração entre eles. A

função exercida pela professora seria a de mediar as discussões que ocorressem e

incentivar/incitar a confrontação entre os pensares dos alunos. Ela salientou, “Meus

alunos recitavam sem interferência até o número 30”, por esse motivo, ficou

acertado o preenchimento do quadro até o número 50. Considerando que na classe

haviam mais ou menos 30 alunos, as fichas restantes seriam distribuídas pelos

alunos com dificuldade, alguns poderiam receber até mais de duas fichas.

“Eu não acreditava que eles dariam conta da atividade. Os alunos que sabiam

mais ajudavam os colegas a colar seu número no lugar certo, explicavam com

entusiasmo. Eles não só deram conta da tarefa como querem fazê-la todos os dias.

Eu não tinha ideia de que eles sabiam tanto”, contou Roseane com entusiasmo e

mostrou o quadro numérico feito pelos alunos com orgulho. Cabe ressaltar que a

observação feita na sala da professora seria sobre outro assunto, mas achei que

valeria dar destaque a essa situação. Muitas vezes, sugerimos atividades para

serem realizadas pelos professores com seus alunos e não temos a dimensão da

abrangência da atividade, o quanto e como a situação propiciou ou não, uma

oportunidade de aprendizagem.

A retomada do assunto envolveu também uma olhada pelos materiais oficiais,

desdobrando-se no reconhecimento da existência de muitas atividades de escrita,

leitura e comparação de números utilizando a estrutura do quadro numérico que

antes eram realizadas mecanicamente e que agora, poderiam ser exploradas de

uma outra maneira pelas professoras, tendo claro onde queriam chegar.

Reconheciam que eram situações pensadas e repensadas para que os alunos

pudessem colocar em jogo todos os seus saberes. Perceberam que tinham muitos

desafios a serem vencidos e muitos problemas a serem resolvidos.

E por falar em reflexão: “Onde andam os problemas? Onde anda esse

assunto, que a gente quase não vê em sala de aula? E como será que os alunos

resolvem problemas?” Após essas indagações, um novo diálogo foi desencadeado e

o assunto era problemas.

“Os alunos ao resolverem problemas fazem tracinhos e contam, dando a

resposta sem realizar a operação”, foi a fala de um professor do horário coletivo da

escola D. Isto despertou a curiosidade de todos os professores em querer saber

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como avançar com os alunos que ainda utilizam, segundo elas, “procedimentos tão

precários”.

Nesse momento, despertamos o interesse para os problemas com estruturas

aditivas, assunto polêmico e gerador de muitas dúvidas entre os professores e

alunos. Havia a necessidade de resgatá-lo por meio de uma atitude

problematizadora e investigativa (o que sabem, como sabem e como fazer

diferente). Estratégia praticada e divulgada por esta formadora/pesquisadora.

Destaco na formação a importância de resolver problemas na Matemática, na sala

de aula, na vida diária. Situações e contextos variados nos quais o aprendiz é

desafiado para colocar em jogo tudo o que pensa e sabe.

Ao serem questionados sobre, qual a forma utilizada ao trabalhar problemas

como um dos caminhos para se ensinar Matemática, recebi muitas das respostas já

esperadas, tais como: as dificuldades encontradas para fazer o aluno compreender

o problema, o uso excessivo de resolver contas pelas contas sem relacioná-las a

problemas e as incertezas com relação à escolha adequada e, principalmente, sobre

as análises dos procedimentos propostos pelos documentos oficiais ou

apresentados pelos alunos.

“Como lidar com os alunos que apresentavam dificuldade em interpretar e

resolver situações–problema?” “Como interpretar os procedimentos propostos por

eles?”, perguntaram alguns professores.

“Vocês têm ideia da causa dessa dificuldade?”, devolvi a pergunta para eles.

Afirmaram sem pestanejar: “Alguns não resolviam problemas pois não sabiam ler

direito, outros desconheciam a conta que ajudava a encontrar o resultado”. Ao

declararem seus pontos de vista, alguns professores ficaram no aguardo da

anuência desta formadora/pesquisadora; no entanto, os que já conheciam um pouco

do meu pensar, sabiam que teríamos uma longa trajetória a percorrer e com certeza

iriam utilizar muitos problemas em sua rotina.

Outra questão alimentou a nossa conversação: “Que elas entendiam por

problema? Poderíamos considerá-lo um texto, ou não? Há diferença entre resolver

um problema de resolver um exercício? A atividade é a mesma?”

Obtive como respostas: “Para ser problema tem que ter números e uma

pergunta”. “Parece um texto, mas não tenho certeza”. [Observei que quanto a ser

um texto, pairava algumas dúvidas...] e prosseguiram com as reflexões: “Podemos

considerar um texto, mas ele tem números”. “Eu nunca pensei em um problema

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como texto, ele precisa ser interpretado, não é?” “Uma situação que a gente não

sabe a resposta, é preciso pensar, organizar um caminho”. Estas e mais outras

afirmações foram feitas, mas responderam uníssonos: “um desafio”, como se o fato

de ser desafio se diferenciasse de ser um problema, ou fosse um problema especial.

A conversa girou em torno de que problema é ou não, um texto. Todos

concordaram que fosse um texto, logo, como texto exigia algumas estratégias de

leitura para desenvolver uma compreensão leitora matemática. Inicialmente,

deveríamos fazer uma leitura desse texto de forma literal41. Compreensão do que

realmente está sendo dito, sem ler nas entrelinhas (atitude comum na leitura de

textos mais literários), sem extrapolar a informação numérica apresentada (dados do

problema). Uma leitura que permitiria compreender o texto levantando as palavras

conhecidas, destacar os dados numéricos apresentados, resgatar a linguagem

matemática envolvida para que fosse possível escolher dentre os dados somente os

relevantes. Organizar os dados numa escrita numérica e realizar a escolha do

procedimento adequado para chegar ao resultado.

Além disso, elas começaram a entender que ensinar por meio de problemas

deixa os alunos mais autônomos, pois permite desenvolver o “aprender a aprender,

habituando-os a determinar por si próprios, respostas às questões que os inquietam,

sejam elas questões escolares ou da vida cotidiana” (SOARES, PINTO, 2001, p. 1).

A elaboração e escolha dos problemas propostos são tarefas relacionadas ao

trabalho do professor e devem ser situações desafiadoras e motivadoras ao mesmo

tempo; serem possíveis de resolver para que não produza frustração ou desestimule

os alunos e muitas vezes até o professor.

Cabe ao professor compreender, segundo Moreno (2006), que deve “propor

ao aluno situações de aprendizagem para que este produza seus conhecimentos

partindo da busca pessoal dos procedimentos que lhe permitirão encontrar a

resposta para o problema apresentado” (p. 49). Nesta perspectiva, o educador deve

permitir que seus alunos apresentem diferentes “jeitos” de fazer, procedimentos

pessoais, mas sem perder o propósito final, que é progressivamente utilizar

procedimentos mais econômicos até a compreensão e uso das técnicas mais

convencionais.

                                                            41 Literal utilizado com o significado conforme a letra, ao texto.

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Comentei sobre o fato de os professores dos anos iniciais escolherem

problemas com quantidades representadas por desenhos de objetos, modelo

utilizado pelos livros didáticos, como se o desenho concretizasse e encaminhasse

para o resultado. Elas explicaram que “o desenho ajuda os alunos menores a

encontrar o resultado e é menos cansativo fazer a atividade”. Perguntei a elas: “ A

atividade é desafiadora para todos?” Frente ao silêncio explicativo, o diálogo

demandou novas argumentações, cujo fundamento teórico foi os estudos de Hughes

apresentados por Moreno (2006, p. 61-62), de que as crianças apresentam quatro

tipos de representações possíveis ao registrarem as quantidades de objetos

quaisquer:

1. Indossincráticas, as “garatujas” feitas pelas crianças pequenas, não

tem intenção de informar nem o objeto e nem a quantidade.

2. Pictográficas, os alunos usam o desenho para representar fielmente os

objetos e estabelecem uma correspondência termo a termo entre o

objeto e seu desenho, representando a quantidade exata.

3. Icônicas, as marcas utilizadas pelos alunos, não trazem nenhuma

informação sobre o objeto, mas representam exatamente a quantidade

de objetos. É considerado um salto conceitual muito grande na

compreensão matemática centrar a atenção nas propriedades

quantitativas ao invés de nas propriedades qualitativas do objeto.

4. Simbólicas, o uso de símbolos convencionais. Antes de

compreenderem que um número pode representar a quantidade de

objetos, costumam escrever todas as sequências de números que

representam as quantidades de objetos.

A autora encaminha o nosso refletir sobre oferecer aos alunos problemas com

desenhos representando a qualidade e a quantidade de objetos, estaríamos

impedindo os alunos de utilizarem seus conhecimentos ao apresentarem os

diferentes procedimentos de solução, bem como, de vivenciarem etapas necessárias

para compreenderem matematicamente os problemas propostos. Portanto, os

professores devem realizar as escolhas dos problemas a serem propostos com

muito cuidado e refletirem sobre as estratégias utilizadas para ensinar problemas.

Uma estratégia muito utilizada pelos professores ao ensinar problemas é apresentar

um modelo e explicar passo a passo a escolha do cálculo convencional, depois é

apresentado uma lista de problemas semelhantes para que sejam resolvidos pelos

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alunos. Outra estratégia, se o problema proposto suscitar dúvidas, o professor ajuda

na solução deixando como modelo e apresenta outro problema com os dados

numéricos mudados, mas com o mesmo texto escrito.

No entanto, eu/formador tenho encontrado professores que mediante os

problemas propostos para serem aplicados em sala de aula, alteram os dados

numéricos, como se os alunos menores só soubessem resolver problemas com

números até 10. Essa postura de usar números menores traz a constatação de que

os alunos resolveram rapidamente porque não houve desafio. Frente a esta

preocupação, resolvi propor para as professoras realizarem problemas com números

desconhecidos para seus alunos. As professoras Roseane e Cora aceitaram o

desafio, apesar dos ares de incredulidade. Envoltas em um misto de relutância e

curiosidade elaboraram quatro problemas com estrutura aditiva em que utilizavam a

ideia de juntar, retirar e comparar (anexos 8 e 9). Ao mesmo tempo, ficaram

ansiosas em aplicar os problemas e poder averiguar como seus alunos se sairiam

pela primeira vez ao enfrentarem problemas sem apoio ou desenho e ainda com

números, considerados por elas, grandes. No entanto, seus alunos tiveram uma

postura tranquila, sem apresentarem medo, mas sentindo-se muito desafiados,

afinal a professora havia falado que eles iam fazer uma atividade diferente. Percebi

que eles adoravam a aula de Matemática e utilizaram nos procedimentos de solução

a contagem e a representação pictográfica, ambas para confirmarem seus

resultados. Para exemplificar os procedimentos, relatarei o ocorrido durante a

observação das aulas dessas professoras e as posturas dos alunos.

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Alu

no A

Alu

no B

Figuras 19 e 20: Representação pictórica e contagem na solução dos problemas Fonte: Acervo pessoal

Os alunos A e B da professora Roseane42 utilizaram a ideia de “juntar todos”

na solução apresentada para o problema com estrutura aditiva apresentados nas

figuras 19 e 20. O aluno A desenhou uma bandeja para cada grupo de sanduíches

separadamente, enquanto o outro, aluno B, representou as quantidades de

                                                            42 A atividade completa encontra-se no anexo 8.

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sanduíches separadas em duas linhas horizontais, sem precisar representar a

bandeja. Os dois alunos tiveram a preocupação em representar os sanduíches com

detalhes. Contaram a primeira quantidade, depois a 2ª quantidade e, finalmente,

contaram todos juntos. No segundo problema, colocaram o todo e retiram

quantidades do total.

Alun

o C

Figura 21: Contagem na solução de problemas. Mãozinha. Fonte: Acervo pessoal

O aluno C43 apresentou uma solução diferente de todos os colegas, pois logo

após a leitura dos problemas realizada pela professora deu a resposta

imediatamente. Só apresentou a representação pictográfica porque a professora

disse que ele tinha que fazer o registro provando que dava aquele resultado. A prova

foi realizada de diversos jeitos. Ao ser perguntado como ele tinha achado o resultado

e o porquê do desenho da mão, explicou que havia contado nos nove dedos e

encontrado 17. Esse aluno apresenta um avanço em relação aos colegas: ele

utilizou a sobrecontagem, partindo do 8 ele só precisou de nove dedos para

encontrar o resultado; por esse motivo ele desenha a primeira bandeja com 9

sanduíches. Depois, verificando que os colegas haviam desenhado duas bandejas,

                                                            43 A atividade completa encontra-se no anexo 8. 

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volta a sua carteira e desenha uma segunda bandeja. No segundo problema realiza

sem nenhuma dificuldade, conta todos e corta as bexigas estouradas.

Alu

no A

Alu

no B

Figuras 22 e 23: Contagem na solução de problemas com estrutura aditiva Fonte: Acervo pessoal

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A maioria dos alunos da professora Cora44 ainda iam completar seis anos e,

para surpresa da professora, resolveram os problemas com contagem. Apenas

alguns alunos apresentarem mais dificuldade. Na atividade de retirar quantidade

eles não tiveram dificuldade, para eles estourar foi representado pelo cortar, apagar

ou deixar sem pintar. Percebi que o aluno A pintou todas as bexigas e depois cortou

as bexigas, o aluno B não pintou as bexigas estouradas e circulou o objeto retirado.

Para a atividade de completar, o aluno A circulou as 8 figurinhas para depois,

acrescentar a outra parte para contar todos. O aluno B, para contar todos, buscou

apoio na enumeração dos desenhos que realizou, utilizou como uma confirmação da

contagem oral e percebeu que havia passado o total, pois ele havia respondido

oralmente o resultado, logo que a professora havia terminado de ler. Ela já havia

feito problemas com os alunos, mas com objetos para serem contados e quando

este aluno respondia ela achava que ele era rápido na contagem dos objetos. Nunca

havia percebido que ele tinha sobrecontagem pelo número maior, primeiro desenhou

o 17, para depois, desenhar o número menor. Observando a sua resolução,

perguntei: “Dá 27, o total de 8 figurinhas mais 17 figurinhas? Ele conta nos dedos e

responde: “Dá 25”. Olha o resultado obtido e apaga as figurinhas excedentes.

As professoras Roseane e Cora ficaram surpresas com o desempenho de

seus alunos e com os procedimentos apresentados pelas duplas. Declararam que o

resultado obtido foi além de suas expectativas.

Essas situações observadas foram também percebidas e analisadas por

Nunes et al. (2005), nas quais os alunos, para resolverem situações-problemas

aditivas utilizaram a contagem como “instrumento de pensamento, para auxiliar sua

habilidade de registrar quantidades, e amplificar sua capacidade de resolver

problemas” (p. 20).

O habitualmente confessado pelos professores é encontrar ainda um grande

números de alunos do período final dos anos iniciais do Ensino Fundamental que, ao

resolverem problemas, também apresentam procedimentos de cálculo apoiados na

fase icônica, situação muito criticada pelos professores e exemplificada por alunos

da professora Angela45, do 4º Ano do Ensino Fundamental de oito anos.

                                                            44 A atividade completa encontra-se no anexo 9. 45 A atividade completa encontra-se no anexo 10.

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Alu

no A

Alu

no B

Figuras 24 e 25: Representação icônica na solução de problemas Fonte: Acervo pessoal

Os alunos utilizaram os risquinhos para apoiarem a contagem e encontrar o

resultado. Esta situação nos leva a concluir que esses alunos tiveram experiências

em que a preocupação deveria ser encontrar o resultado apenas através da técnica

convencional, já que apresentam pouca vivência com a elaboração de

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procedimentos pessoais e situações de cálculo mental. Conversei com a professora

para que trabalhasse mais com seus alunos o cálculo mental e retomasse os fatos

básicos das operações permitindo que eles elaborassem diferentes procedimentos

de cálculo formando um repertório de cálculos confiáveis.

Outro assunto relacionado a problemas, que veio a baila, é o fato de mudar

os dados numéricos e manter o texto escrito, atitude muito comum entre os

professores de matemática que acaba transformando uma situação-problema

desafiadora em um simples exercício. Para resolver esses problemas os alunos já

sabem antecipadamente os procedimentos. Eu/formadora argumentei que entendo

que os alunos precisam fazer exercícios algumas vezes, os exercícios podem até

apresentarem-se parecidos com a intenção de memorizar e repertoriar, mas que isso

ocorresse em outro momento, em outro dia, não imediatamente. Esclareci ainda que

a crítica se referia a postura imediata de ensinar por meio da facilidade e para evitar

que se torne um hábito constante nas práticas.

Por outro lado, encontrei professores que se empenhavam muito na

explicação das atividades, mas ainda muito reticentes em promover um diálogo

amplo e aberto a respeito do que os alunos pensam sobre o assunto. Ou permitir

que sem nenhuma intervenção deixasse os alunos autonomamente resolver as

atividades e só depois, organizariam seus saberes através da problematização.

As professoras Angela e Marina, talvez por trabalharem com alunos maiores,

foram cerceando o fazer dos alunos, passo a passo. A professora Angela sempre

elaborava situações-problemas para serem aplicados e a professora Marina

aplicava as atividades do Caderno de Apoio. Elas começavam a atividade lendo

para eles, ao invés de deixarem que seus alunos lessem individualmente ou em

duplas. Depois, a cada item da atividade elas iam problematizando a situação,

perguntando, investigando, de tal forma que não sabem como seus alunos pensam,

pois os pensares ficam diluídos ou camuflados pelos saberes daqueles que

respondiam imediatamente. Tanto a professora Angela como a professora Marina

apresentavam um bom domínio da classe. Mesmo apresentando uma organização

de classe em dupla, acabavam não utilizando muito esta organização, preocupadas

em caminhar item a item nas atividades. A professora Angela inicia a aula com uma

leitura literária, pois acredita que ler para os alunos desenvolve a capacidade leitora,

o que é muito bom, ler por prazer. Afirma: “Adquiri o hábito de ler para meus alunos

depois de ouvir suas leituras na Formação de Matemática”. No entanto, ao propor

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problemas aos alunos, ela volta a ler para eles, ao invés de deixar que eles lessem

sozinhos. Ela assessorou cada etapa da atividade, inclusive o contar as cédulas

monetárias que cada trio deveria retirar. Envolvida em seu fazer, não percebeu o

quanto os alunos estavam ansiosos para mostrarem que sabiam fazer sozinhos. Ao

observar a situação, sugeri que cada grupo enviasse um representante para contar

as cédulas e caso as cédulas não fossem suficientes para todos, discutiria a

situação com a classe, envolvendo-os na situação-problema.

Durante a minha circulação pela classe, enquanto resolviam o primeiro item

do problema, ponderei com ela para que fossem resolvidos os outros itens sem a

sua intervenção, inclusive que eles discutissem a solução proposta. A única

interferência esperada seria a de pedir outros “jeitos” de fazer desvinculando-os um

pouco da técnica convencional. Ao término da atividade, ela acompanharia a

correção realizada pelos alunos, pois ela, a cada atividade, corrigia na lousa. Propus

inclusive, que escolhesse os resultados que ela utilizaria para discutir e

problematizar com a classe, propiciando a circulação de procedimentos. Dado o

avançar do tempo, o término da atividade e a correção ficaram para a próxima aula

de Matemática, no dia seguinte, sem meu acompanhamento.

A “proteção”, tão cantada em verso e prosa pelos professores, acabava

impedindo que os alunos construíssem seus saberes e se tornassem capazes de

enfrentar qualquer situação-problema. Outro termo bastante utilizado como

justificativa pelas estratégias escolhidas é “facilitar a aprendizagem”. Analisamos se

o termo facilidade está relacionado a desafio, ou está ligado ao termo “dúvida” sobre

a capacidade dos alunos. Facilidade e proteção impedem que os alunos enfrentem

desafios, revejam seus conhecimentos e, ainda, evitam que eles estabeleçam

relações, dentro e fora da Matemática. Essa atitude faz com que o professor deixe

passar a oportunidade de ser um mediador do processo de construção dos

conhecimentos gerados nas salas de aula, aquele que mostra e apóia cada

caminho. Tal qual a prática vivenciada nessa formação.

No entanto, para uma investigação, é preciso de um observar pautado no

afastamento imposto pelo papel de pesquisadora. O observar a trajetória e as

estratégias usadas pelo professor. O observar do impacto da formação continuada

na prática. O observar do uso da teoria. O olhar supervisionado, que interpretou com

criticidade as posturas, os olhares, as falas.

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Essa observação da pesquisadora aconteceu durante as aulas das sete

professoras, um olhar de suas práticas e nos horários coletivos, um observar dos

seus saberes. Nas escolas B e D, a presença da pesquisadora nas aulas enredou-

se com a postura da formadora. Algumas professoras se sentiam amplamente

amparadas e confiantes ao solicitar a ajuda da formadora/pesquisadora durante as

problematizações, um pedido de colaboração na investigação dos saberes dos

alunos. A colaboração era vista por esta formadora/pesquisadora como a

oportunidade de praticar o propagado e tão cantado discurso do formador: desafiar

os alunos a pensarem de forma diferente o procedimento apresentado, sugerir

outros procedimentos, explorar com mais profundidade os procedimentos trazidos

pelos alunos como solução, circular informação pela classe e propiciar aos alunos a

oportunidade de seguir o pensar do colega ao apresentar a solução na lousa.

Situações nas quais ainda essas professoras não conseguiam entender a

sala de aula realizando um movimento em que houvesse confrontação das

diferentes soluções apresentadas pelos alunos, um compartilhar de solução mesmo

que se apresentasse inicialmente inadequada, mas quando compartilhada com a

classe, a análise realizada junto com os colegas permitiu que o aluno percebesse o

próprio erro e corrigisse. Este momento foi orientado e acompanhado pelo

pesquisador/formador. O pedido de cooperação do professor era silencioso,

estampado no olhar, prontamente atendido e que pouco a pouco foi escasseando,

na medida em que essas professoras foram se sentindo seguras em fazer diferente.

Ao chegar à sala, eu pesquisadora/formadora vivenciava uma relação de

carinho, pois era apresentada como “a professora da professora”. Muitos alunos

achavam interessante essa relação e faziam alguns comentários. Sentava-me numa

carteira ao fundo da sala de forma que pudesse observar o movimentar dos alunos e

da professora. Somente em uma das professoras acomodava-me em sua mesa,

como se estivesse oferecendo um lugar de destaque, o da professora.

O observado é que a relação entre as sete professoras e a

formadora/pesquisadora foi se firmando em uma relação de colaboração, respeito,

amizade e confiança. Além disso, tanto elas como os alunos foram se acostumando

com a minha presença, cobrando a minha ausência, na semana posterior.

Foi sendo mantido um diálogo que permitiu à formadora cumprir o seu

propósito principal, o de desequilibrar, de desafiar, e que foi, aos poucos,

construindo com as professoras novos caminhos. Dando a informação necessária

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que elas precisavam para se sentirem novamente apoiadas e dispostas a

enfrentarem mais um desafio: ensinar por meio de problemas. Para que o problema

fosse visto como um ensino investigativo, houve necessidade de enfatizar alguns

aspectos, tais como:

1- compreender como se resolve problemas diferenciados;

2- analisar os textos de diferentes tipos de problemas para entender quais

permitiriam aos alunos colocarem em jogo os seus saberes numéricos e

3- finalmente, analisar os procedimentos realizados por elas mesmas ou

exemplos apresentados por mim/formadora, para que descobrissem como

haviam sido realizados e quais deles se aproximavam dos procedimentos

pessoais desenvolvidos por seus alunos.

Assim, foram sendo constituídos os saberes de todas as professoras do

horário coletivo das quatro escolas, inclusive respondido os questionamentos de

algumas professoras mais interessadas e que também, foram fazendo diferente.

Essas professoras traziam suas atividades para serem analisadas e inclusive

cobravam a observação de suas práticas. Apesar de dar a atenção a elas, mantive o

meu foco somente nas sete professoras. No entanto, não deixei de utilizar o espaço

de formação como um espaço de esperança. Segundo Freire (1997), a origem da

esperança é a mesma da educabilidade do ser humano: o inacabamento de seu ser de que se tornou consciente. Seria uma agressividade contradição se, inacabado e consciente do inacabamento, o ser humano não se inserisse num permanente processo de esperançosa busca. Este processo é a educação (FREIRE, 1997, p. 114).

Como o autor, acredito na esperança de uma educação melhor. Numa

educação para todos, em saberes enredando professores e alunos. Que mudar,

mesmo que seja difícil, é necessário acreditar que não é impossível. Para mudar é

preciso querer ou pelo menos se deixar convencer. Freire nos convida a não deixar

que o amanhã se reduza a quase uma cópia do hoje, do agora, do momento vivido

e praticado, e complementa precisamos dar o primeiro passo. Acreditando que o

primeiro passo deve ser dado por nós ou conosco, defendo nas formações o direito

de sonhar e fazer diferente. Precisamos acreditar que tudo é possível e acreditar na

esperança de uma educação melhor. É preciso lutar pela utopia, pois só assim a

gente testa, erra, melhora e cria novas teorias e pratica um fazer matemática

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diferente. Uma educação matemática e uma matemática na educação praticada em

todas as salas de aula.

Uma formadora que procurou ser uma incentivadora e pesquisadora de

práticas e uma pesquisadora que buscou compreender as relações da formação

com os processos de mudança nas práticas das sete professoras.

Um fazer diário apoiado em práticas conscientes, a minha e a delas e que, na

medida em que estas práticas foram sendo constituída, fomos desempenhando a crítica sobre ela, mesclada com observações e reflexões teóricas, vai nos dando elementos para aprimorá-las. Essa nossa prática, por sua vez, vai solicitar e alimentar teorizações, que vão, por sua vez, refletir em sua modificação. O elo entre teoria e prática é o que chamamos pesquisa” (D’AMBROSIO, 2000, p.91).

Um pesquisar na e sobre esse espaço tão promissor, a sala de aula. Um

apelo a sermos juntas formadoras/pesquisadoras. Elas, professoras, pesquisarem

as teorias em suas salas de aula. Eu, formadora, a oportunidade de acoplar o papel

de pesquisadora, observadora do meu fazer e nos fazeres das sete professoras, a

reflexão de minha prática.

Sete professoras que de forma gradativa foram mostrando indícios de uma

evolução no discurso e na prática, percebido tanto na relação com o grupo e no

individual com a formadora/pesquisadora, bem como nas estratégias em sala de

aula, observadas e refletidas. Elas foram ampliando a compreensão de como se

aprende e como se ensina Matemática.

Formadora/pesquisadora e professores construíram uma relação profissional

baseada no respeito, na confiança, no acreditar, mesmo que o inicio tenha sido

marcado por olhares desconfiados, incrédulos e ensimesmados. Foi sendo

constituído um vínculo no respeito pelo tempo e pelo jeito de ser de cada um. Pelo

reconhecer desta formadora /pesquisadora de seus saberes e práticas instituídas e

que na medida em que novos aprendizados iam sendo adquiridos e acreditados,

seriam incorporados e praticados.

Eu, formadora/pesquisadora, percebi que, afinal, ter uma pesquisadora na

sala de aula exigia que as sete professoras lidassem com seus saberes, com seus

medos e incertezas. Reconheciam que ser professora/investigadora era algo mais

profundo, exigia lidar com seus tabus, com crenças e valores arraigados de que

alunos de professor/investigador são “cobaias” de uma prática desconhecida.

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Elas se esqueceram que práticas desconhecidas já haviam feito parte de suas

trajetórias profissionais. Pensar: “eles são ou não cobaias”, como elas asseveram,

remete-nos a recordar quantos alunos foram cobaias do nosso aprender a ensinar

matemática? Passamos em nossa trajetória por fases de ensinar tradicionalmente

até hoje, um ensinar mais avançado e investigativo. Os questionamentos durante o

processo de formação e observação foram permeados por um refletir conjunto desta

formadora/pesquisadora com os professores das quatro escolas, em cada encontro.

Nesse sentido, os olhares interrogativos foram sendo amenizados.

Na medida em que caminhamos, íamos reconstruindo um saber fazer mais

dinâmico e o experienciar das escolhas de atividades a serem realizadas com

consciência do ponto de partida e do ponto chegada. Iniciávamos uma travessia

repleta de descobertas, encantamentos e desencantamentos que alimentavam os

fazeres. Nesse processo, as professoras foram percebendo que poderiam confiar

nas sugestões dadas por mim/formadora e a minha presença em sala de aula foi

sendo avaliada por elas. Algumas me confidenciaram certa ansiedade com a minha

presença, fato que estranhei, pois se apresentavam muito firmes, com pleno domínio

da classe. Deparei-me com falas como a da Raquel: “durante a observação

apresento insegurança. Por que, não tenho hábito de trabalhar com outras pessoas

observando” e da Cora, deixei-a “receosa, palpitante, mesmo assim, proveitosa”.

Fiquei incrédula diante da manifestação de Lygia, cuja expressão foi “o medo bobo

de errar em algum ponto da aula, depois a sensação de alívio pela sua ajuda que

veio quando eu não consegui extrapolar nas estratégias para ajudar os alunos”.

Fiquei surpresa diante de afirmações como de Roseane, professora que

sempre deixava muito claro seu posicionamento nas formações: “Às vezes me senti

insuficiente. Ver um aluno tirar suas dúvidas com outra professora, mais experiente,

lembrou-me que não sou onipresente. [...] Isso me fez lembrar nossa conversa (o

que me deixou mais tranquila): tenho que oportunizar a autonomia dos alunos [...]

Não posso nem devo ficar o tempo todo ‘cercando’ os alunos”. Declarações como a

de Cecília que “a primeira impressão era de fiscalizadora, avaliadora da minha

prática, mas com o passar do tempo, [...] foi muito favorável e agradável, tanto para

a professora (que aprendi), quanto para os alunos, através de suas interferências

corretas e eficazes”.

Falas como as de Angela envolvida pelo carinho, “a presença foi

maravilhosa, após dois anos em processo de formação, criou um vínculo afetivo, o

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que acredito ser fundamental para que o professor possa sentir-se à vontade [...]. As

intervenções realizadas [...] ajudaram na administração do tempo, autonomia dos

alunos e algumas dicas para o desenvolvimento da atividade”. Finalmente, uma

acolhida afetuosa como a de Marina, “uma visita muito tranquila, tanto para mim

quanto para os alunos. É claro que no início criou-se certa expectativa, mas que logo

foi quebrada pois você nos deixou muito à vontade. Ao entrar em sala você entrou

como uma parceira, alguém que chegou para somar. Auxiliou os alunos sem inibi-

los”.

Fomos, gradativamente, tornando-nos aliadas e transformando-nos juntas em

professoras/formadoras investigadoras, cuja segurança para proporcionar aos

alunos momentos de descobertas, encantamentos, criatividade e consciência da

construção dos seus saberes foram se firmando. Um fazer diferente que quebrava

todas as regras. As perguntas se calaram e a segurança em sugerir foi aumentando,

se tornaram protagonistas e autoras desse processo, o fazer educativo.

Percebi que a cada fazer observado havia um reconhecimento das

professoras valorizando a problematização e o diálogo envolto pelo hábito de

circulação e exploração dos diferentes procedimentos ao resolver problemas. Este

movimento dinâmico em sala de aula que favoreceu aprendizagens e firmou

relações de confiança e cumplicidade entre professor-aluno, entre aluno-aluno e

formador/investigador-professores/alunos. Os fazeres e as argumentações das sete

mulheres professoras e investigadoras expressaram o crescer de seus

conhecimentos teóricos e um perceber da necessidade de uma reflexão diária na e

sobre a prática. Afirmaram que não conseguem mais trabalhar de outra forma, pois o

que era óbvio e prático passou a ser questionado. Foram a cada encontro dando

mais sentido aos saberes dos alunos e declararam: “Agora sim, parece que

entendemos o como”. Mostravam-se cheias de esperança e declararam que se

deslumbraram por um novo horizonte, ao vislumbrarem o amanhecer de um novo

dia, de uma nova matemática, na qual é possível descobrir infinitas possibilidades de

fazer. Uma experiência que deixou sensações diferentes frente ao diálogo entre o

ensinar e o aprender Matemática, em sete professoras e uma

formadora/pesquisadora.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

No meu caminhar pelas quatro escolas que proporcionaram a oportunidade

de conhecer melhor e ser conhecida pelas sete mulheres professoras tive a

oportunidade de garimpar seus fazeres e influenciar nos seus quereres. Os seus

saberes carregavam a influência da Formação Continuada de Matemática percebido

em seus discursos e nos conhecimentos que apresentavam. A teoria havia sido

incorporada, mas algumas propostas para o fazer diferente ainda estavam sendo

reavaliadas para serem aplicadas. Constatei que após terem participado da

formação não faziam mais igual, mostravam mais atenção com a aprendizagem dos

alunos, se preocupavam em perguntar como eles pensavam e como sabiam.

Nessas atitudes eram perceptíveis a influência das formações continuadas nas

práticas dessas professoras.

No entanto, esta pesquisadora/formadora focou sua lente mais atenta nessas

práticas para poder compreender com mais profundidade os indícios dessas

mudanças. Uma preocupação de como ela estava acontecendo e como os

conhecimentos matemáticos estavam sendo elaborados. Estar no interior da escola

e poder participar dos momentos de estudos formativos, observando as influências

provocadas no coletivo da escola pelos seus novos saberes e fazeres foi permitindo

uma reflexão sobre as práticas dessas professoras e desta formadora.

Observei e analisei como as professoras trabalhavam com os números e

organizavam ou selecionavam situações-problema para que os alunos refletissem

sobre seu uso e percebessem as regras que regem a organização do SND- Sistema

de Numeração Decimal e reavaliei/reelaborei com elas outras situações

desafiadoras de ensino. Acompanhei como os alunos elaboravam suas estratégias

de contagem e os procedimentos de solução dos problemas propostos e analisei

com as professoras novos encaminhamentos. Constatei no real vivido em sala de

aula as teorias ressaltadas pelos estudiosos e pesquisadores a respeito do ensinar e

do aprender Matemática, momentos experienciados de grandes aprendizados e

infinitas reflexões.

O fazer do professor está pautado na confiança que ele deposita nas

propostas a serem praticadas e a transformação do fazer do professor está

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proporcionalmente relacionada às oportunidades de refletir sobre o aprendido e de

repensar o praticado. Foi possível colaborar com o professor para que ele

observasse com mais atenção para as fendas abertas deixadas em seus

conhecimentos e naqueles que constituíram sua trajetória profissional. Muitas vezes,

ele tem a certeza de que está trilhando caminhos seguros não percebendo os fios

tênues que entrelaçam e enredam seus saberes. Muitas vezes, os professores

praticam tudo aquilo que está sendo veiculado, sem momentos de reflexão e sem se

aperceberem da importância do “como fazer” para que haja mudanças nas práticas.

Percebi que para provocar mudanças é preciso que o papel do formador

adquira um aspecto diferente, que envolve saberes culturalmente abrangentes,

apresente domínio do conhecimento do conteúdo da disciplina que vai explorar e

demonstre facilidade em transitar pelos diferentes conhecimentos. O formador

assume o papel do parceiro avançado, avançado em conhecimentos, sejam da

Didática e da Psicologia, da Didática de sua disciplina e da dialogicidade entre o

ensinar e aprender.

Foi na escola, na formação continuada nos horários coletivos e no contexto

de sala de aula que fiz meu palco de estudo, investigação, reflexão e prática.

Percebi que é preciso compreender que os professores que procuram uma formação

continuada são levados por fatores merecedores de atenção. Alguns fatores

verbalizados em suas expectativas se referem a compreender e/ou reelaborar seus

conhecimentos matemáticos, a conhecer novas estratégias para ensinar

matemática, a buscar novas “mágicas” e a segurança do ensinar Matemática, entre

outros. A necessidade de um fortalecimento para enfrentar as dificuldades e as

diversidades da sala de aula são motivos que impulsionam os professores em busca

de uma Formação que esperam ser colaborativa e parceira.

Constatei através da convivência e do relacionamento com os professores a

necessidade de Formações que desempenhem o seu principal papel, o de fomentar

a curiosidade, a descoberta e a investigação adentrando as práticas e colaborando

em suas mudanças para que possam deixar marcas profundas nesse profissional

prático e em seus alunos. Marcas não esculpidas pelo medo, mas delineadas pelo

prazer, fazer, gostar, acreditar, sonhar, conviver e constituir saberes.

Formações iniciais ou continuadas que contemplem a sala de aula como um

ambiente privilegiado do imediato ocorrido, de descobertas, de novos caminhos, de

novas teorias e práticas. O espaço de vencer desafios e suplantar dificuldades,

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mesmo que sejam as que envolvam compreender a organização do sistema de

numeração decimal e o uso das estratégias de contagem através de problemas com

estrutura aditiva.

A análise dos dados levantados demonstraram que as condições de práticas

que ocorrem na escola estão diretamente relacionadas as propostas de formações

inicial e continuada que estão sendo praticadas. A análise dos relatos descritos me

levou a inferir, provisoriamente, que as formações dessas professoras nas diferentes

áreas e níveis de ensino não se preocuparam com os saberes e não-saberes de

seus alunos; desconsiderou as vivências presentes em suas histórias de vida

pessoal e até profissional e, principalmente, não valorizou a reflexão nas práticas e

sobre as práticas ocorridas em ambientes reais de entrelaçamento entre o ensino e

a aprendizagem.

As reflexões conjuntas realizadas a respeito da observação sobre a prática

possibilitou a explicitação das teorias que subjazem às práticas matemáticas e a

compreensão na prática de norteadores como a investigação, a problematização dos

procedimentos e dos problemas como possibilidades de uma ação educativa

considerando o ideário e o imaginário dos professores com relação a matemática.

Nesse processo de descobertas, a aprendizagem foi sendo constituída na

medida em que foram confirmados os saberes, transpostos os desafios e

desconstruídas as normas e regras rígidas e essas professoras foram se tornando

confiantes nas propostas apresentadas por esta pesquisadora/formadora.

Eu, formadora/pesquisadora, compreendi que não basta apropriar-se dos

conteúdos, das propriedades e das técnicas. É preciso estabelecer uma relação de

cumplicidade com a Matemática para poder mergulhar em sua realidade, tal qual o

artista penetra na obra de arte para sentir o fluir da obra. Este processo de

construção e reconstrução dos conhecimentos matemáticos vividos pelos

professores nas formações poderão ajudá-los em sua trajetória delineando um

profissional reflexivo e confiante.

As narrativas das sete professoras demonstraram que o “não acreditar” de

muitos professores na capacidade dos alunos está relacionado às experiências

demonstradas nas histórias de vida de cada um, nos diversos momentos vividos de

desacreditar e de serem desacreditadas. A investigação dessa trajetória possibilitou

à formadora compreender a necessidade que as professoras tinham em querer

simplificar as atividades dos alunos, para torná-las fáceis. Parecia-me anteriormente

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um desacreditar nas capacidades dos alunos e percebi o quanto enfrentar “desafios”

era algo a ser suplantado por elas em primeiro lugar, para depois ser incorporado

como um mobilizador de saberes provisórios e reformulador de conhecimentos.

Por esse motivo, não conseguem encontrar um coser e recoser matemático

para ensinar e aprender com problemas e precisam de ajuda para pensar e analisar

procedimentos pessoais ou econômicos de soluções apresentados pelos alunos, ao

invés de apenas as técnicas convencionais. Elas entram em conflito diante da

capacidade dos alunos em inventar procedimentos pessoais, em criar soluções ou

realizar cálculos mentais, e ao vislumbrarem o assunto, se retraem, se distanciam de

um fazer problematizador, não permitindo o aflorar de novos conhecimentos em

suas práticas. Conhecer teoria não é sustentação suficiente para amparar às

práticas.

Diante de todas essas averiguações concluo que os professores precisam de

muitas informações matemáticas, culturais e teóricas para amparar o saber fazer,

mas para saber fazer diferente é necessário um apoio mais próximo, mais

acolhedor, tal qual é propagado que ele proporcione ao aluno. Ele precisa discutir

suas práticas e dúvidas matemáticas e um amparo para ajudá-lo a ver e ouvir os

“sussurrares” da sala de aula e ter segurança em provocar saberes e suscitar

dúvidas, produzindo novas teorias e novas formas de pensar, gerando em sua

prática um movimento dinâmico e prazeroso.

Para adquirir essa capacidade o professor precisa compreender como ele

aprende matemática para depois, investigar e analisar como seu aluno aprende.

Essa compreensão perpassa por perceber a relação entre os conceitos matemáticos

e suas aplicações, como um movimento pendular.

O movimento pendular decorre do processo de tradução das relações das

conceitualizações provisórias que se tem dos conteúdos em um extremo do pêndulo

e o movimento leve, imperceptível de sua aplicabilidade, no extremo oposto. As

aplicações dos conceitos em situações-problemas, investigativas, exigem uma

reavaliação dos conhecimentos provisórios provocando novamente o movimento

para o outro extremo levando conceitos reconstruídos, desequilibrando o já

aprendido e transformando-o em novos conceitos. Os desafios enfrentados nos

extremos do pêndulo são processos de incerteza e provisoriedade do conhecimento,

mas de muitas construções e aprendizados. Para muitos dos professores dos anos

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iniciais esse processo precisa ser vivenciado, enfrentado e compreendido para

depois, possibilitá-lo em seu ensinar.

Percebi que, apesar das muitas pesquisas abordando o ensino e a

aprendizagem do Sistema de Numeração Decimal, na escola dentro das salas de

aula ainda pairam muitas dúvidas com relação ao conteúdo e intervenções

investigativas que possam propiciar avanços e compreensão sobre tão complexos

conceitos. Ensinar o Sistema de Numeração Decimal, SND envolve compreender

sua organização e regras, perceber as regularidades e a importância da contagem

em todo esse processo.

Figura 26: Movimento pendular entre os saberes. Fonte: Acervo pessoal.

Esse processo de ensino deve possibilitar que os alunos utilizem os

procedimentos de contagem para refletir sobre os números e elaborar

procedimentos de cálculos ao resolver problemas e resolver problemas para avançar

no conhecimento de números e na elaboração de novos procedimentos de

contagem, onde cada lado do pêndulo sofre em seu interior uma relação de

organização, desorganização e reorganização e constituem sistemas de

conhecimentos complementares e concorrentes. O movimento é dinâmico e permite

galgar outros patamares de compreensão do sistema de numeração e de

procedimentos para resolver problemas.

Para o professor olhar para as produções dos alunos, interpretá-las e

compreender com sensibilidade o que eles já sabem e ter a possibilidade de

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identificar os conhecimentos provisórios e os já compreendidos e superados há a

necessidade de uma cumplicidade parceria que ofereça a sedução do fazer sem

impor uma linha divisória entre o proibido e o permitido, entre o errar e o acertar.

Uma parceria que reconheça a sala de aula como um espaço de formação repleto

de diversidades de saberes e não saberes. Lugar de aprendizagem e “ensinança”

que exige investigar como o outro pensa mantendo um misterioso entendimento

entre quem ensina e quem aprende sem ousar intervir abertamente, mas cerceando

o seu fazer. Espaço de formação que para ouvir/escutar e olhar/observar para

assumir posturas desafiadoras e investigativas, mas ao mesmo tempo afetuosa e

acolhedora, onde estratégias diferenciadas são pensadas com o propósito de

cooperação e colaboração para ultrapassar dificuldades e ressignificar problemas. A

sala de aula, espaço de formação onde carece garantir as falas e a circulação de

conhecimentos, onde todos são responsáveis por ensinar e por aprender com prazer

a Matemática. Um fazer que assuma um enfoque diferenciado, que realize treinos

através de atividades investigativas, que valorize o simples e reconheça o

desafiador, o complexo. Práticas que explorem novos caminhos e novas teorias,

momentos gratificantes para nós pesquisadores, educadores e alunos.

As especificidades que envolvem esses professores que ensinam

matemática, por não serem especialistas, necessitam de um formador/formador que

conheça o real acontecido na sala de aula para colaborar na busca de soluções que

possam superá-los. Um formador que investigue a sala de aula e as verdadeiras

necessidades desses professores, ao invés de oferecerem formações formatadas e

acabadas. Um formador que tenha em sua prática o fazer diferente, que revitalize

práticas, que propicie as participações dos professores em atividades a serem

aplicadas para que revejam seus conhecimentos e os compreendam e os organizem

para poderem ensiná-los. Um formador que domine o conteúdo de Matemática a ser

ensinado nos anos iniciais do Ensino Fundamental, que conheça a Didática da

Matemática, a Psicologia e a Didática e esteja sempre atualizado com relação às

investigações ocorridas na Educação Matemática. Um formador que reflita na prática

e sobre sua prática avaliando os caminhos a serem seguidos e considere os saberes

constituídos pelas histórias (vida e profissional) dos professores envolvidos. Um

formador que pratique uma escuta atenta, um olhar perceptivo e um diálogo

acolhedor, no qual os professores possam ancorar suas angústias e medos, não

saberes e os quereres diferentes, mas também que possibilite a cada

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professor/aluno reencontrar o prazer no fazer, no trocar, no desafiar e no reconstruir

caminhos que despertem a alegria no aprender.

Nesse sentido, a formação deve ser o palco que os atores envolvidos tenham

a clareza de seus papéis e possam vivenciar diferentes situações de ensino e de

aprendizagem, reconhecendo neles processos independentes e ao mesmo tempo

interrelacionados. Processos que necessitam do adubo da afetividade, da tolerância

e da generosidade para germinarem novas teorias, novos fazeres e saberes.

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ANEXOS

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Anexo1

Parecer da Comissão de Ética da UNIBAN

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Anexo 2

Projeto Coleção de Tampinhas Professora Raquel A professora realizou o projeto Coleção de Tampinhas de garrafas PET: Expectativas de Aprendizagens/Objetivos:

1. Realizar a contagem de objetos em coleções móveis pelo uso da

sequência numérica oral.

2. Escrever o número de tampinhas obtido pelas duplas e o total da

coleção das duplas (situações- problema do compor/juntar).

3. Realizar as situações-problemas utilizando os dados indicados na

tabela de resultados das duplas (ideias decompor/ juntar e comparar)

Duração: seis semanas.

Encaminhamento:

1. Após organizar a turma em duplas, entregar as fichas com tabelas para

preenchimento durante a atividade.

2. Comente que os alunos deverão contar as tampinhas e fazer o registro

na tabela.

3. Terminada a contagem, peça para realizar a soma e registrar na tabela

abaixo: NOME DA DUPLA

DATA

QUANTIDADE DO DIA TOTAL

4. Após o registro individual, faça uma tabela (resultado das duplas) na lousa ou no papel kraft enumerando as duplas e registre em conjunto os resultados obtidos.

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Resultado das duplas

Data 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12

Total

6/4 11 60 11 14 20 37 10 7 1 18 10 20 219

Total

As duplas, ao terminarem a tarefa, guardam suas tampinhas para uma nova contagem na próxima semana.

 

A sugestão é que os dados da tabela (resultado das duplas) sejam amplamente utilizados em diferentes situações-problema, tais como:

1-Para obter 100 tampinhas posso juntar as quantidades de quais duplas? .

2- Qual dupla tem mais? Qual tem menos? Quais duplas estão com a mesma quantidade de tampinhas?

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Anexo 3

Jogo do Bingo - Professora Raquel

Expectativas de Aprendizagem/Objetivos:

Utilizar os conhecimentos sobre o sistema de numeração, dentro de um intervalo previamente definido.

Materiais Necessários:

• Dois cartazes com o quadro numérico do 50 até 100 e outro, do 100 até 200;

• Fichas com números para o sorteio em um saco e

• Uma cartela para cada aluno, conforme modelo abaixo:

Encaminhamento:

Distribuir as cartelas e orientá-los que façam um x com lápis em cada número sorteado, caso o tenha na sua cartela.

Comece o sorteio cantando o número. Espere alguns instantes e marque o mesmo no quadro numérico para que os alunos acompanhem o jogo e marquem em suas cartelas, caso não se lembrem.

Ganha o jogo quem primeiro preencher a cartela.

Observação: Numa conversa individual com a professora, após escolha do jogo, conversamos sobre como seria a organização do material, o planejamento das atividades a serem exploradas após o jogo e elaboramos o modelo de cartela abaixo. A professora ficou encarregada da seleção de outros números e a elaboração das demais cartelas.

57 90 115 129 170

63 88 101 120 146

56 92 118 150

65 85 109 121 135

75 98 111 117 199

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Sugestão de atividades:

1- Marque com um X no quadro abaixo os seguintes números ditados pela

professora: Sessenta e dois, quarenta e sete, cinquenta e cinco, trinta e

nove e oitenta e quatro.

15 28 47 66 102

19 34 51 74 104

20 39 82 112

21 41 55 84 115

26 43 62 93 120

2- Circule a peça do Bingo que tem o número setenta e três.

17 37 73 33

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Anexo 4

Pesquisa “Eu sou assim” - Professora Roseane

Realizou-se uma pesquisa com seus alunos, em aulas anteriores, e utilizou-se os dados recolhidos para trabalhar o conteúdo Tratamento da Informação.

Expectativas de Aprendizagem/Objetivos:

Escrever a sequência numérica na folha quadriculada e realizar a contagem para organizar os dados recebidos em um gráfico.

Encaminhamento:

O preenchimento da pesquisa foi realizado individualmente.

 

Após recolher todos os dados, organizar com os alunos uma tabela geral. Preparar filipetas com os dados para cada trio realizar o gráfico, conforme modelo abaixo. 

 

 

 

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Gráficos da atividade “Eu sou assim”

Fonte: Acervo pessoal

Gráficos da atividade “Eu sou assim”

Fonte: Acervo pessoal

Gráficos da atividade “Eu sou assim”

Fonte: Acervo pessoal

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Anexo 5

Jogo de Trilha - Professora Roseane

Expectativas de Aprendizagem

Fazer contagem oral em escala ascendente e em escala descendente, contando de um em um.

Número de Jogadores: 4

Material: 4 pinos coloridos e 1 dado por grupo.

Regras: Começa o jogo quem tirar o maior número no dado, seguindo a mesma ordem para os demais.

Cada jogador, na sua vez, lança o dado, que indica quantas casas o pino deve avançar. Se o pino parar na casa amarela, verde ou azul, o jogador deve seguir a instrução da legenda e continuar o jogo.

Ganha quem atingir primeiro a CHEGADA.

Encaminhamento:

Leitura da regra para os alunos.

Na aula anterior foi realizada a confecção dos dados com os alunos. Cada aluno tinha o seu dado para poder jogar em casa.

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Anexo 5: Atividade de Contagem, Profa. Roseane. Fonte: Caderno de Apoio e Aprendizagem 2010.

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Anexo 6

Atividade de Contagem, Profª Cora. Fonte: Caderno de Apoio e Aprendizagem, 2010.

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Anexo 7

Atividade realizada pelo aluno da Professora Cecília

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Anexo 8

Problemas de estrutura aditiva do aluno A da Profa. Roseane

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Problemas de estrutura aditiva do aluno B da Profa. Roseane

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Problemas de estrutura aditiva do aluno C da Profa. Roseane

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Anexo 9

Problemas de estrutura aditiva do aluno A da Profa. Cora

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Problemas de estrutura aditiva do aluno B da Profa. Cora

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Anexo 10

Problemas de estrutura aditiva do aluno A da Profa. Angela

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Problemas de estrutura aditiva do aluno B da Profa. Angela