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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
O PRINCÍPIO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA E A JUSTIÇA FISCAL SOB A LUZ DA CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA DE 1988
Por: Silvia Teixeira Tavares
Orientador: Professor: Anselmo Souza
Rio de Janeiro 2010
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
2
O PRINCÍPIO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA E A JUSTIÇA FISCAL SOB A LUZ DA CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA DE 1988
Apresentação de monografia à Universidade
Candido Mendes como requisito parcial para
obtenção do grau de especialista em Direito
Público e Tributário
Por: Silvia Teixeira Tavares
AGRADECIMENTOS
3
Agradeço a Universidade Candido Mendes pelo curso
de pós-graduação oferecido que possibilitou a
ampliação de meus conhecimentos, aos professores e
ao meu orientador Anselmo Souza. Agradeço ainda ao
meu marido Claudio pelo companheirismo e paciência
durante a elaboração desta monografia.
DEDICATÓRIA
4
Dedico este trabalho aos meus Pais Dario e Sônia e
ao meu irmão Gláucio que sempre me apoiaram
incondicionalmente em todos os momentos da minha
vida
RESUMO
5
A presente monografia tem por objetivo analisar o Princípio da
Capacidade Contributiva como possível meio para se alcançar a Justiça
Tributária. Desta forma, inicialmente, será feito um histórico do Princípio da
Capacidade Contributiva desde o seu surgimento até os dias de hoje, com
destaque a sua aplicação nas nossas constituições. A seguir, passa-se a
apreciação de suas características principais, abordando pontos como
conceituação, mínimo existencial, confisco, progressividade, seletividade e a
relação com outras espécies tributárias. Finalmente, a monografia analisa a
relação do Princípio da Capacidade Contributiva com a Justiça Fiscal,
fornecendo alguns indicadores tributários para verificação da observância
destes dois temas na Tributação Brasileira.
METODOLOGIA
6
A metodologia empregada para elaboração desta monografia englobou o estudo de livros de renomados doutrinadores, bem como, artigos publicados na rede de internet.
SUMÁRIO
7
INTRODUÇÃO.............................................................................................08
CAPÍTULO 1
HISTÓRICO DO PRINCIPIO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA........09
1.1- Origem e histórico......................................................................................09 1.2- Princípio da Capacidade Contributiva nas Constituições brasileiras.........12
CAPÍTULO 2
O PRINCIPIO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA..................................14
2.1- O Princípio da Igualdade............................................................................14 2.2- Conceito do Princípio da Capacidade Contributiva....................................17 2.3- Capacidade contributiva e capacidade econômica....................................20 2.4- Princípio da Capacidade Contributiva e progressividade..........................22 2.5- Princípio da Capacidade Contributiva e seletividade.................................25 2.6- Aplicação do Princípio da Capacidade Contributiva..................................27 2.6.1- Impostos diretos e indiretos............................................................27 2.6.2- Impostos reais e pessoais...............................................................28 2.6.3- Tributos Vinculados.........................................................................30 2.7- Princípio da Capacidade Contributiva e o Minímo Existêncial...................33 2.8- Princípio da Capacidade Contributiva e o Não-Confisco...........................35
CAPÍTULO 3
JUSTIÇA FISCAL............................................................................................39
3.1- A Justiça Fiscal tendo por base o Princípio da Capacidade Contributiva..39 3.2- Indicadores Tributários...............................................................................42
CONCLUSÃO................................................................................................45
ANEXO............................................................................................................46
BIBLIOGRAFIA............................................................................................49
ÍNDICE............................................................................................................52
FOLHA DE AVALIAÇÃO...........................................................................53
INTRODUÇÃO
8
As receitas tributárias caracterizam-se como a principal fonte do
Estado no que diz respeito ao custeio de suas funções. Para auferir tais
recursos o Poder Pùblico possui a faculdade constitucionalmente prevista para
instituir e, consequentemente, cobrar a receita tributária que denominamos
tributo. Contudo, tal prerrogativa não pode ser exercida ao bel prazer do ente
estatal, pois é imprescindível a necessária observância aos ditames
constitucionais, bem como, o respeito aos limites jurídicos estabelecidos em
relação a esta capacidade de arrecadação.
Dentro deste contexto, o princípio da capacidade contributiva surge
como o meio ideal para se limitar o exercício do poder de tributar, através de
critérios que possibilitem a distribuição eqüitativa, justa e adequada da carga
tributária entre os membros da sociedade. Assim, a busca do ideal de Justiça
na Tributação consiste em distribuir o ônus tributário entre os contribuintes, na
proporção adequada de sua capacidade contributiva. Significa que os mais
ricos devem destinar uma parcela maior de suas riquezas ao pagamento de
tributos que os mais pobres.
È muito comum ultimamente o debate acerca da justiça fiscal,
principalmente pela iminente Reforma Tributária que esta por vir. O principal
ponto abordado diz respeito ao fato de que no Brasil os pobres pagam mais
impostos que os ricos, e que o quantum das suas rendas, na maioria das
vezes, não é observado pelos legisladores, economistas e muito menos pelos
governantes na hora da elaboração das leis que criam os tributos
Assim, nesta monografia pretende-se, através da uma análise do
Princípio da Capacidade Contributiva, verificar se no sistema tributário hoje
vigente a justiça fiscal tem sido alcançada.
CAPÍTULO 1
HISTÓRICO DO PRINCIPIO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA
______________________________
1Foi um legislador, jurista e poeta Greco antigo 2BECKER, Alfredo Augusto. Teoria geral do direito tributário. São Paulo: Editora Saraiva, 1972, p. 437. 3CONTI, José Maurício, Princípios da Capacidade Contributiva e da Progressividade. São Paulo: Dialética, 1997. p. 37.
9
A preocupação com a justiça na tributação e a capacidade
contributiva vem desde a antiguidade, com vários registros encontrados ao
longo da história. Aqueles que se viam impelidos a contribuir sempre
defenderam a idéia de justiça no pagamento dos tributos.
1.1 - Origem e histórico
O Principio da Capacidade Contributiva esteve sempre relacionado a
problemas Estatais nos ramos político e econômico.
Este princípio remonta à Grécia, nos tempos de Sólon1, com
destaque a exigência de um imposto direto, com quatro categorias definidas de
acordo com a fortuna do contribuinte. Esta preocupação, segundo Becker2,
também estava presente no Antigo Egito onde preponderava a idéia de que o
tributo deveria estar relacionado com a riqueza daquele que deveria paga-lo.
Na Roma antiga, com o rei Servius Tullius, foi instituída uma forma
de tributação chamada Soberbo que tomava por base a riqueza de cada
contribuinte 3.
Na Inglaterra, a Magna Carta inglesa de 1215, em seu art. 12,
continha o princípio segundo o qual as prestações de cunho coercitivo
cobradas do cidadão deveriam ser moderadamente fixadas. Na verdade, foram
______________________ 4 Adam Smith, em sua obra, afirma que: “os súditos de cada Estado devem contribuir o máximo possível para a manutenção do Governo, em proporção a suas respectivas capacidades, isto é, em proporção ao rendimento de que cada um desfruta, sob a proteção do Estado”
10
os chamados burgueses, receosos de perderem seu patrimônio para o reino,
que obrigaram o rei João a aceitar tal situação.
Com o desenvolvimento do pensamento medieval, Santo Tómas de
Aquino introduz a ideia de que somente seria legítima a cobrança do tributo se
este visasse à promoção do bem comum, sob pena de tornar-se injusto e,
assim, ocasionar a não obrigação de paga-lo. Na concepção deste teólogo
para que houvesse justiça na tributação, cada pessoa deveria pagar os tributos
de forma igualitária, proporcionalmente às suas possibilidades
No século XVIII, com Montesquieu e depois Bentham , foi defendida
a tese de que o imposto deveria poupar os recursos dos indivíduos de pouca
capacidade econômica.
Em 1776, Adam Smith, em sua famosa obra A Riqueza das Nações,
sustentava, como concretização da justiça fiscal, que deveria haver intrínseca
relação entre a capacidade contributiva e o valor a ser determinado como
tributo 4. Assim, pregava que os cidadãos, para que pudessem desfrutar da
proteção estatal, deveriam contribuir, para o financiamento das despesas do
Estado, na proporção de seus recursos. O atendimento ou não desta ideologia
levaria a chamada “igualdade ou desigualdade da tributação”.
Por meio desta obra o Principio da Capacidade Contributiva se
propagou pelas sociedades ocidentais e tornou-se a base para implemento de
uma tributação mais justa.
Com o surgimento do Liberalismo, que tinha como idéia central a
não intervenção estatal na vida da sociedade, deu-se pouco destaque aos
11
efeitos que os gastos públicos ou a arrecadação de tributos tinham sobre a
economia. A concepção era de que a arrecadação de tributos deveria se ater
somente a objetivos fiscais.
Com a finalidade de eliminar tais radicalismos surge a idéia de que
apenas por intermédio do Estado, que passa a intervir mais na vida social,
seria possível obter os meios para atender às necessidades sociais
emergentes. Os tributos deixam, então, de ter somente finalidade
arrecadatória, e passam a ter também objetivos extrafiscais tendo cunho
claramente social. No desenvolvimento histórico do Princípio da Capacidade
Contributiva criaram-se diversas teorias, visando um modo justo de distribuição
dos encargos tributários.
Em 1789, a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão,
documento elaborado na primeira fase da Revolução Francesa, trouxe
importante contribuição histórica ao Principio. Este determina, em seu artigo
13, que:
“Para manutenção da força pública e para os gastos de
administração, uma contribuição comum é indispensável; ela
deve ser igualmente repartida entre todos os cidadãos na razão
das suas faculdades.”
Outra importante contribuição da Revolução foi a Constituição
Francesa de 1791, que influenciou a maior parte das Constituições que
adotaram o princípio da capacidade contributiva. A ideia adotada foi a de que
os tributos seriam uma compensação pelos benefícios concedidos pelo Estado.
O ônus da despesa pública deveria ser distribuído, entre os cidadãos de forma
igualitária, de acordo com suas possibilidades.
12
Nas constituições subsequentes também se identifica a presença do
principio da Capacidade Contributiva, com destaque para Constituição
Francesa de 1848 em seu art. 15, a Constituição Alemã de 1919 (Weimar) em
seu artigo 134, e a Constituição Italiana de 1947 em seu artigo 53.
No século XX, os países ocidentais passaram a inserir tal princípio
em suas Constituições, tendo como objetivo nortear o poder de tributar do
Estado, garantindo, assim, a justiça fiscal.
A capacidade contributiva é proveniente deste contexto histórico,
tornando-se um princípio adotado em quase todos os ordenamentos jurídicos
ocidentais atuais, inclusive o brasileiro.
1.2- Princípio da Capacidade Contributiva nas Constituições
Brasileiras
No Brasil, historicamente, a primeira referência ao princípio da
capacidade contributiva foi feita na Constituição de 1824, no art. 179, parágrafo
15, que previa: “ninquém será isento de contribuir para as despesas do Estado,
na proporção de seus haveres”
Assim, foi inicialmente trazida, para o país, a idéia de que pagar
tributos estava intimamente ligada à capacidade de cada um de contribuir. Este
artigo trouxe ainda a ideia de generalidade, traduzida pela palavra “ninguém”.
As Constituições seguintes omitiram-se em relação ao princípio da
Capacidade Contributiva, embora ele fosse reconhecido pelo pensamento
jurídico positivo. Este princípio somente reaparece, e agora de forma integral,
13
na Constituição de 1946, no artigo 202, Titulo IX, que dizia que: “os tributos
terão caráter pessoal, sempre que isto for possível, e serão graduados
conforme a capacidade econômica do contribuinte”
Em total retrocesso, a Emenda Constitucional nº 18, de 1º de
dezembro de 1965, ao veicular a reforma tributária, não mencionou o
dispositivo no Texto Constitucional, omissão que permaneceu na Constituição
de 1967 e na emenda constitucional nº 1 de 1969. Entretanto, para a doutrina
majoritária, por meio de uma interpretação sistêmica da Constituição, o
princípio continuava a constar de forma implícita na carta de 1969, uma vez
que esta adotou o regime democrático.
A Constituição Federal de 1988, dentre suas inúmeras virtudes,
devolveu, ainda que com modificação na redação, ao princípio da capacidade
contributiva a atenção que o tema requer. Vale à pena transcrever o artigo 145,
§ 1º, trazido pela CF/88:
“Art. 145 –
§ 1º – Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e
serão graduados segundo a capacidade econômica do
contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente
para conferir efetividade a esses objetivos, identificar,
respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o
patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do
contribuinte”.
A inserção deste artigo de forma explícita na Constituição passou a
despertar maior interesse sobre o assunto. Assim, abordaremos, no próximo
capitulo, o exame mais aprofundado sobre o Principio da capacidade
contributiva.
CAPITULO 2
O PRINCIPIO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA
______________________________ 5 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco: texto integral. Trad. Pietro Nasseti. São Paulo: Martin Claret, 2005, p.
109.
14
Dentre os princípios constitucionais o que mais se destaca quando
pensamos em justiça na tributação é o principio da capacidade contributiva,
assim, analisá-lo de forma mais detida, com enfoque nas suas características
principais, torna-se fundamental.
2.1- O principio da Igualdade
Antes de enfocar mais detalhadamente o principio da capacidade
contributiva é necessário analisar, mesmo que superficialmente, o princípio da
igualdade, previsto expressamente em nosso ordenamento jurídico. Não
restam dúvidas sobre a importância deste principio no Estado democrático de
direito, principalmente no que diz respeito à busca por ideais de justiça. Assim,
no tocante a tributação, não haverá justiça fiscal, sem que seja atendido o
princípio da igualdade.
Encontramos o principio da igualdade na Constituição brasileira de
1988, estampado em seu art. 5º, caput com a seguinte redação:
“Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros
residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade,
à igualdade, à segurança e à propriedade (...)”
.
Quando é feita a análise do principio da igualdade frequentemente
surgem dúvidas acerca do seu verdadeiro sentido. Em geral, a
regra usada diz respeito à máxima de Aristóteles 5 : "tratar igualmente os iguais
e desigualmente os desiguais, na medida em que eles se desigualam".
______________________________ 6ORAÇÃO AOS MOÇOS, nova edição. Ministério de Educação e Cultura: Casa de Rui Barbosa, 1956, p. 3 7MELLO, Celso Antônio Bandeira de. O conteúdo jurídico do Princípio da Igualdade. São Paulo: RT, 1978, pp. 17-18.
15
Neste sentido, cabe ressaltar, o enfoque dado ao principio da
igualdade por Ruy Barbosa em sua obra, Oração aos moços de 1956:
"A regra da igualdade não consiste senão em quinhoar
desigualmente aos desiguais na medida em que se desigualam.
Nesta desigualdade social, proporcionada à desigualdade
natural, é que se acha a verdadeira lei da igualdade. O mais são
desvarios da inveja, do orgulho ou da loucura. Tratar com
desigualdade a iguais ou a desiguais com igualdade seria
desigualdade flagrante e não igualdade real. Incerto nos
princípios relativos à capacidade tributária.” 6
Pode-se afirmar então que os indivíduos serão tratados de forma
que as suas diferenças sejam reconhecidas, atribuindo-lhes um tratamento
adequado a sua condição desigual.
Acerca da possibilidade de tratamento diferenciado, ensina Celso
Antônio Bandeira de Mello:
"O princípio da igualdade interdita tratamento desuniforme às
pessoas. Sem embargo, consoante se observou, o próprio da lei,
sua função precípua, reside exata e precisamente em dispensar
tratamentos desiguais. Isto é, as normas legais nada mais fazem
que discriminar situações, à moda que as pessoas
compreendidas em umas ou em outras vêm a ser colhidas por
regimes diferentes. Donde, a algumas são deferidos
determinados direitos e obrigações que não assistem a outras,
por abrigadas em diversas categorias reguladas por diferente
plexo de obrigações e direitos." 7
Alexandre de Moraes faz considerações importantes sobre o tema
que merecem destaque:
______________________________ 8 MORAIS, Alexandre de. Direito Constitucional. 23 ed, São Paulo, Editora Atlas, 2008, p. 36
16
“A Constituição Federal de 1988 adotou o Princípio da Igualdade
de direitos, prevendo a igualdade de aptidão, uma igualdade de
possibilidades virtuais, ou seja, todos os cidadãos têm o direito
de tratamento idêntico pela lei, em consonância com os critérios
albergados pelo ordenamento jurídico. Dessa forma, o que se
veda são as diferenciações arbitrárias, as discriminações
absurdas, pois, o tratamento desigual dos casos desiguais, na
medida em que se desigualam, é exigência tradicional do próprio
conceito de Justiça, pois o que realmente protege são certas
finalidades, somente se tendo por lesado o princípio
constitucional quando o elemento discriminador não se encontra
a serviço de uma finalidade acolhida pelo direito... “ 8
Conclui-se, portanto, que é possível um tratamento diferenciado a
todos aqueles que estejam inseridos dentro de um mesmo critério
discriminador. No entanto, mesmo havendo consenso acerca desta
possibilidade, percebe-se que é dificil aferir quais os critérios de distinção
seriam usados.
Na verdade, o critério discriminador deve estar intimamente ligado a
justificativa da desigualdade. Além disto, para que o principio da igualdade não
seja violado, é necessário que o tratamento desigual esteja de acordo com os
demais ditames constitucionais vigentes.
Após este enfoque superficial acerca do principio da igualdade é
necessário observar a sua aplicação no tocante a tributação. Inicialmente
podemos dizer que em matéria tributária o principio da igualdade encontra-se
previsto no Art. 150, II da Constituição:
“Art. 150 – Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao
contribuinte, é vedado à União, aos Estados ao Distrito Federal e
aos Municípios:
II – instituir tratamento desigual entre contribuintes que se
encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção
______________________________
9TIPKE, Klaus. YAMASHITA, Douglas. Justiça fiscal e princípio da capacidade contributiva. São Paulo: Malheiros Editores, 2002. p. 30-31.
17
em razão em razão de ocupação profissional ou função por eles
exercida, independentemente da denominação jurídica dos
rendimentos, título ou direitos;”
Existe uma intrinseca relação entre os principios da igualdade e da
capacidade contributiva. O princípio da capacidade contributiva deve tratar
cada contribuinte de acordo com a sua capacidade de arcar com o ônus
tributário, ou melhor, é uma das formas para se tratar igualmente os iguais e
desigualmente os desiguais no campo do Direito Tributário.
Desta forma, podemos concluir que o princípio da capacidade
contributiva é o critério utilizado para medir a igualdade e desigualdade em
termos de tributação, sendo, portanto, um desdobramento do princípio da
igualdade.
2.2 - Conceito do Princípio da Capacidade Contributiva
A capacidade contributiva conceitua-se como sendo a capacidade,
relativa ao contribuinte, de suportar o ônus tributário, ou melhor, o pagamento
de tributos. Tal princípio está ligado, no que diz respeito à distribuição da
carga tributária, à idéia de justiça e parte do pressuposto que todos
contribuirão com os gastos públicos de acordo com suas possibilidades
pessoais, sob pena de inconstitucionalidade. Assim, a sua aplicação viabiliza
um tratamento mais imparcial e justo em relação aos contribuintes. Pode-se
dizer, então, que teremos justiça em relação a um tributo se este estiver
de acordo com a capacidade de cada cidadão em suportá-lo.
Para Klaus Tipke9 o significado do Princípio da Capacidade
Contributiva representa o ideal de justiça fiscal uma vez que os contribuintes
deverão pagar impostos de acordo com a sua renda disponível. Assim, quanto
______________________________
10OLIVEIRA, José Marcos Domingues de. Capacidade Contributiva – Conteúdo e Eficácia do Princípio, 2ª
ed., revista e atualizada. Rio de Janeiro: Renovar, 1998, p. 56. 11OLIVEIRA, José Marcos Domingues de. Op. cit. p.57.
12COSTA, Regina Helena. Princípio da Capacidade Contributiva. 3 ed. São Paulo: Malheiros, 1996, p. 28.
18
maior renda maior o imposto. O quantum de imposto a ser pago será
diretamente proporcional a renda disponível.
O ilustre doutrinador Aliomar Baleeiro define a capacidade
contributiva como sendo a capacidade econômica do contribuinte “para
suportar, sem sacrifício do indispensável à vida compatível com a dignidade
humana, uma fração qualquer do custo total dos serviços públicos”10. Assim, a
capacidade contributiva será um excedente à capacidade econômica do
contribuinte.
O conceito de capacidade contributiva pode, ainda, ser entendido
sob dois aspectos:
* Capacidade contributiva absoluta ou objetiva: ocorre quando se está
diante de uma riqueza apta a ser tributada (capacidade contributiva como
pressuposto da tributação)11. Neste sentido, segundo Regina Helena Costa:
“funciona como pressuposto ou fundamento jurídico do tributo,
ao condicionar a atividade de eleição, pelo legislador, dos
fatos que ensejarão o nascimento de obrigações tributárias.
Representa sensível restrição à discrição legislativa, na medida
em que não autoriza, como pressuposto de impostos, a
escolha de fatos que não sejam reveladores de alguma
riqueza”. 12
Assim, pode-se afirmar, que a capacidade contributiva nesta
acepção, aponta para a existência de um sujeito passivo em potencial, ou
melhor, é a aptidão abstrata para concorrer aos gastos públicos.
______________________ 13 OLIVEIRA, José Marcos Domingues de. Op. cit. p.57.
19
* Capacidade contributiva relativa ou subjetiva: refere-se a um sujeito
individualmente considerado, ou seja, é a parcela da riqueza a ser tributada em
face das condições individuais (capacidade contributiva como critério de
graduação e limite do tributo)13. Expressa a aptidão de contribuir, na medida
das possibilidades econômicas, de determinada pessoa.
Ainda sobre este tema, pode-se observar no artigo 145, § 1º, da
Constituição, mencionado no final do capítulo 1, alguns aspectos importantes.
Por exemplo, a expressão “sempre que possível” tem o significado, para a
doutrina majoritária, de que os impostos, salvo se por sua natureza isto for
impossível, deverão ter caráter pessoal e serão graduados segundo a
capacidade de cada contribuinte, sob pena de serem considerados inválidos.
Além disso, a análise do presente artigo mostra que a administração tributária,
poderá, com o fito de personalizar e graduar os impostos, identificar,
respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, “o patrimônio, os
rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte”, que são os principais
indicadores do Principio da Capacidade Contributiva.
Ressalte-se, ainda, que, este princípio devido ao fato de ser utilizado
na graduação dos impostos, funcionará, também, como limitador da tributação,
ou seja, observará o mínimo vital e impedirá que a progressividade atinja níveis
de confisco.
O mínimo vital, entendido como a parcela mínima de riqueza,
suficiente para a manutenção do indivíduo e de sua família, é inseparável do
princípio da capacidade contributiva, pois este só será considerado existente
quando aferir alguma riqueza acima do mínimo vital.
Podemos concluir, então, que o principio da capacidade contributiva
______________________________
14MARTINS, Ives Gandra da Silva. Caderno de Pesquisas Tributárias Vol. 14 – Capacidade Contributiva.
São Paulo: Ed. Resenha Tributária, 1989. p. 34.
20
está ligado à idéia de proteção do individuo. Tal princípio vincula-se ao ideal de
justiça na tributação, tornando-se um dos pilares para estruturação dos
sistemas tributários dos Estados democráticos modernos.
2.3- Capacidade contributiva e capacidade econômica
Para que se possa compreender de forma mais ampla o principio da
capacidade contributiva é necessário que se faça uma análise acerca da
diferenciação entre os termos capacidade contributiva e capacidade
econômica. Isto se torna importante, principalmente, pelo fato de ter sido este
último utilizado para introduzir novamente, mesmo que não explicitamente, o
principio da capacidade contributiva no ordenamento jurídico pátrio. Neste
sentido, cabe destacar, Yves Granda Martins, que afirma que o constituinte
incorreu num erro:
“À luz de tal distinção, percebe-se que o constituinte pretendeu,
ao mencionar a capacidade do contribuinte, referir-se à sua
capacidade contributiva e não à sua capacidade econômica,
nada obstante o núcleo comum de ambas, que implica densidade
econômica capaz de suportar a imposição.“ 14
Existe muita controvérsia em relação a estes termos com diversos
autores enfatizando as suas diferenças. No entanto, autores como Ricardo
Lobo Torres consideram tais termos como expressões sinônimas:
“Capacidade contributiva é capacidade econômica do
contribuinte, como, aliás, refere à Constituição Federal de 1988,
mantendo a tradição da Constituição Federal de 1946,
coincidindo também com a Constituição da Espanha. É, pois,
______________________ 15TORRES, Ricardo Lobo. Curso de direito financeiro e tributário. Rio de Janeiro: Renovar, 2004, p. 79.
16COSTA, Regina Helena. Op. cit. p.34-36.
17TIPKE, Klaus. YAMASHITA, Douglas. Op. cit. p.31.
21
capacidade de pagar (ability to pay) como dizem os povos de
língua inglesa, significando que cada um deve contribuir na
proporção de suas rendas e haveres, independentemente de sua
eventual disponibilidade financeira. “ 15
Na verdade, embora haja divergência doutrinária existe, na minha
opinião, diferença entre os termos, pois a possibilidade de cada cidadão de
contribuir para o custeio das despesas estatais deve ser avaliada segundo o
seu potencial econômico. Assim, a análise da capacidade contributiva está
intimamente relacionada ao excedente apurado após a cobertura das despesas
com as necessidades básicas de cada um, como, por exemplo, saúde, moradia
e educação.
Regina Helena Costa16, também toma por base o entendimento
acima, quando distingue as referidas expressões. Para a autora um individuo
pode ter capacidade econômica para adquirir bens necessários a sua
sobrevivência, entretanto, se não houver excedente, poderá não ter capacidade
contributiva, já que sua renda foi consumida integralmente com o mínimo vital.
Na mesma linha Klaus Tipke e Douglas Yamashita, enfocam que a
capacidade econômico-contributiva é restringida quando é preciso sustentar a
si mesmo e a outros, pois o Estado Tributário não pode retirar do contribuinte
aquilo que o Estado social tem de lhe devolver.17
Devemos observar que para que haja a obrigação de custear os cofres
públicos e, consequentemente o atendimento aos limites da capacidade
contributiva é necessário que se tenha uma relação jurídica obrigacional
entre o Fisco e os contribuintes.
22
No tocante a capacidade econômica não existe a obrigatoriedade
de uma relação jurídico-tributária com o Fisco. Na verdade, o que se verifica é
a sua intima ligação com a renda, com consumo e com patrimônio de cada
individuo. Assim, terá capacidade econômica qualquer cidadão que tenha
alguma riqueza ou a capacidade de obtê-lá. Podemos, então, nos referir a
capacidade contributiva como uma capacidade econômica especifica ligada a
possibilidade de cada contribuinte em suportar o ônus tributário.
A conclusão de tudo o que foi exposto é que uma pessoa com
capacidade econômica, poderá não ter capacidade contributiva para fins
tributários. Podemos observar tal situação quando se analisa o imposto de
renda. Na tributação deste imposto é levada em consideração a renda auferida
por cada um. Assim, um indivíduo terá através de sua renda capacidade
econômica, participando efetivamente da economia do país, por meio do
consumo de bens, por exemplo, mas não terá capacidade contributiva se a sua
renda ficar abaixo do mínimo tributável.
2.4- Princípio da Capacidade Contributiva e a progressividade
A progressividade consiste na variação da alíquota do tributo em
função de algum critério. Pode ocorrer sob o ponto de vista fiscal,
aumentando-se a alíquota em função da base de cálculo, ou extrafiscal,
aumentando-se a alíquota em função de um controle. Para a análise do
princípio da capacidade contributiva apenas nos interessa a progressividade
fiscal, ligada ao objetivo de repartição imparcial do ônus tributário.
De acordo com a Constituição de 1988 estão sujeitos à
progressividade o Imposto de Renda (Art. 153, §2º, I – em função da base de
cálculo), o Imposto Territorial Rural (Art. 153, §4º - em função da produtividade
____________________ 18CONTI, José Maurício. Op cit, p. 75
23
do imóvel) e o Imposto Predial e Territorial Urbano (Art 156, §1º, I – no tempo).
A progressividade do Imposto de Renda é fiscal. A progressividade do Imposto
Territorial Rural e do Imposto Predial e Territorial Urbano é extrafiscal. A
Emenda Constitucional 29/2000 autorizou que o Imposto Predial e Territorial
Urbano tivesse progressividade fiscal.
Quanto à alíquota um tributo pode ser fixo ou proporcional. Num
tributo fixo a lei dispensa o cálculo e define um valor. Nos tributos proporcionais
a lei define um percentual que incidirá sobre um montante tributável. Os
tributos proporcionais podem ser de alíquota fixa ou de alíquota progressiva.
Logo, um tributo progressivo é sempre proporcional, mas nem todo tributo
proporcional é progressivo. Portanto, não se pode confundir tributo progressivo
com tributo proporcional.
A discursão doutrinária no tocante a relação existente entre a
progressividade e o principio da capacidade contributiva é intensa. Alguns
doutrinadores tendem para a intrinseca relação entre estes principios, outros
defendem sua total incompatibilidade e um terceiro grupo enfoca a existência
de compatibilidade, mas afirmam que o principio da capacidade contributiva
não exige tributos progressivos.
Na linha dos defensores da relação existente entre a
progressividade e o principio da capacidade contributiva temos José Mauricio
Conti que entende que por meio da progressividade, o percentual do imposto
cresce na medida em que cresce a capacidade contributiva, ou seja, quanto
maior for a capacidade contributiva, maior será o valor do imposto devido.18
Contrário a este entendimento, Zilvetti afirma que os dois principios
____________________ 19zILVETTI, Fernando Aurélio. Progressividade, justiça social e capacidade contributiva. In Revista dialética de direito tributário. São Paulo: Dialética, n° 76 Janeiro / 2002, p. 29-31. 20BRASIL. Supremo tribunal Federal . RE 227.033/SP, publicado no DJ de 17/09/99, p. 59. Consulta no site do STF, disponível em http://www.stf.gov .br/jurisp.html. Acesso em 08.11.2010. 21TIPKE, Klaus. YAMASHITA, Douglas. Op. cit. p.35.
24
não se relacionam, uma vez que existe a dificuldade de se medir a capacidade
contributiva a partir da progressividade. Para este autor:
“Mesmo que procurássemos na progressividade a justificação
da igualdade na tributação, concluiríamos, forçosamente, que os
sistemas de tributação progressiva não medem capacidade
econômica, são meros instrumentos políticos de distribuição de
riqueza. Equivoca-se, portanto, quem afirma que a igualdade de
sacrifícios no suporte do custeio do Estado não se atinja pela
proporcionalidade e sim pela progressividade.” 19
Neste sentido, o STF já firmou posicionamento de que o principio
da capacidade contributiva não se fundamenta na progressividade, sendo está
somente aceita nos casos expressamente previstos no texto constitucional. 20
Na terceira linha de pensamento, temos o entendimento de Klaus
Tipke segundo o qual:
“O principio da capacidade contributiva exige uma base de
cálculo adequada. Não se aduz dele que a alíquota deva ser
progressiva. Contudo, a alíquota progressiva é compatível com o
principio da capacidade contributiva. Pelo menos sua
admissibilidade resulta do principio do Estado Social.” 21
Conclui-se, portanto, que a base de cálculo serve de parâmetro
para a progressividade, pois, quanto maior a base econômica, maior deverá ser
o ônus tributário imposto ao contribuinte. Entretanto, isto não leva, no caso da
variação da base de cálculo, a aplicação de uma aliquota sem qualquer
____________________ 22DERZI, Misabel Abreu Machado. Comentários na atualização da obra de BALEEIRO, Aliomar. Direito tributário brasileiro. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 2005, p. 178 23CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 20 ed. São Paulo: Malheiros,
2004. p. 71.
25
parâmetro plausível. Na verdade é importante, para saber o onus da tributação,
o tamanho de sua riqueza de cada contribuinte. Para isto deve se instituir
alíquotas variáveis, de modo que na maior base de cálculo incida a maior
aliquota.
Assim, a progressividade torna-se um meio de se alcançar a
justiça fiscal, sendo uma das formas pelas quais o Princípio da Capacidade
Contributiva se concretiza. Neste sentido, cabe ressaltar o entendimento, de
Misabel Derzi22 que define progressividade como sendo a graduação dos
impostos, na medida em que possibilite que os economicamente mais fortes
paguem progressivamente mais por esses gastos do que os mais fracos,
levando a uma maior justiça social.
2.5 – Principio da Capacidade Contributiva e a seletividade
O Princípio da Seletividade estabelece que o tributo será seletivo
quando a carga tributária variar de acordo com a essencialidade do produto,
mercadoria ou serviço. Ou seja, quanto mais essencial menor a carga
tributária, ao passo que quanto mais supérfluo maior a carga tributária.
Portanto, a essencialidade seria um atributo da seletividade, referindo-se a um
fator objetivo, ou seja, o bem.
Está o Princípio da seletividade previsto expressamente na
Constituição, em seu Art. 156, §3º, I e em seu Art. 155, §2º, III. O Constituinte
estabeleceu obrigatoriedade de observância deste Princípio para o IPI,
entretanto facultou sua observância para o ICMS.
Segundo Roque Carraza23 o Princípio da Seletividade pode ser
alcançado por meio de um “sistema de alíquotas diferenciadas, por meio de
26
variação de base cálculo de impostos, ou por meio de criação de incentivos
fiscais”.
A ideia seria possibilitar o acesso da maioria da população aos
bens de consumo final considerados essenciais, como os da “cesta básica”, por
exemplo, através de uma menor carga tributária. Assim, os preços desses
produtos ficariam menores e, consequentemente, mais acessíveis a todas as
pessoas, e principalmente aos mais pobres..
O principio da seletividade não atende ao principio da capacidade
contributiva, uma vez que ricos e pobres pagam indiretamente o mesmo valor
dos impostos quando consomem produtos e serviços. Na verdade, o que este
princípio busca é a igualdade do consumo minimo, com a incidência de uma
maior tributação recaindo sobre bens que, em princípio, não são consumidos
pelas pessoas de menor renda.
Apesar de todo exposto, cabe ressaltar, que paira certa
divergência entre os doutrinadores sobre o Princípio da Seletividade ser ou não
ser um Sub-Princípio do Princípio da Capacidade Contributiva. Para alguns, por
referir-se a um aspecto objetivo (o bem) e não a um aspecto subjetivo (o
contribuinte), não seria um sub-princípio. Outros pensam diferentemente,
defendendo que a essencialidade é uma forma pela qual se aplica o Princípio
da Capacidade Contributiva, buscando na natureza do bem identificar a
capacidade contributiva do contribuinte.
A seletividade é sim uma forma, conforme foi dito anteriormente, de
se garantir o mínimo existencial, pois estabelece que os bens mais necessários
recebam menor carga tributária ou não sejam tributados em razão de sua
utilidade para o contribuinte na satisfação de suas necessidades mais básicas.
27
2.6 – Aplicação do Príncipio da Capacidade Contributiva
2.6.1- Impostos diretos e indiretos
Os impostos diretos são caracterizados pelo fenômeno da percusão
tributária, no qual o sujeito passivo cumpre a prestação e suporta o ônus
financeiro, ou seja, o sujeito passivo de direito é também o sujeito passivo de
fato. Em suma, o contribuinte é impossibilitado de transferir o ônus financeiro
para terceiros.
Já os impostos indiretos são caracterizados pelo fenômeno da
repercussão tributária onde o sujeito passivo de dieito não se confunde com o
sujeito passivo de fato, pois o primeiro cumpre com a obrigação tributária e o
segundo suporta o ônus financeiro. Em suma, os impostos indiretos são
passíveis de repasse do ônus financeiro para terceiros, na maioria das vezes
recaindo tal ônus sobre o consumidor final.
Não há discursão doutrinária em relação a aplicação do princípio da
capacidade contributiva aos impostos diretos. Entretanto, é controvertida a
questão no tocante aos impostos indiretos devido ao fenômeno da repercussão
tributária supramencionado.
É certo que não se pode determinar de forma objetiva o sujeito
passivo de fato e qual a sua capacidade contributiva quando da incidência de
um imposto indireto. Porém, alguns critérios podem ser utilizados para
solucionar a questão. No caso do consumo de bens, por exemplo, a graduação
das alíquotas segundo a essencialidade do produto, é perfeitamente adequada
para se presumir a capacidade econômica do sujeito passivo de fato. O
________________________
24TILBERY, Henry, O Conceito de Essencialidade como Critério de Tributação. Direito Tributário Atual.
São Paulo, v. 10, Resenha Tributária/IBDT, 1990, p. 2994-2995.
28
consumo no caso dos impostos indiretos, assim como a riqueza e a renda no
caso dos impostos diretos, são indicadores que revelam a capacidade
contributiva e não devem ser ignorados.
Nesse sentido, cabe ressaltar o pensamento de Henry Tilbery,
abaixo exposto:
“[...] a imposição feita pelo Estado, sobre os recursos
financeiros das pessoas, para cobrir as necessidades públicas,
deve deixar intactos os recursos dos indivíduos para satisfação
das suas necessidades essenciais e considerando que a
observância do critério da capacidade contributiva se concretiza:
no imposto direto (sobre vendas) – pela isenção do mínimo de
subsistência; no imposto indireto (sobre vendas) – pela
aplicação do critério da essencialidade de bens; chegamos à
conclusão de que a faixa dos dispêncios, a serem atingidos
pelos impostos indiretos, é o excedente dos gastos dos
consumidores, após satisfeitas as necessidades básicas
individuais.” 24
Conclui-se, portanto, que o princípio da capacidade contributiva será
aplicado a todos os impostos, sejam eles diretos ou indiretos, utilizando-se,
para isso, critérios diferenciados com o objetivo de verificar a capacidade
econômica de cada contribuinte.
2.6.2- Impostos reais e pessoais
Impostos reais são aqueles que incidem sobre o bem, a coisa (res)
seja ela mercadoria, produto ou patrimônio, abstraindo, na maioria das vezes a
condição pessoal do contribuinte.
________________________
25 TROIANELLI, Gabriel Lacerda, Justiça e Capacidade Contributiva: a Questão dos Impostos reais.
Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo, n. 53, p. 51, fev. 2000
29
Impostos pessoais são aqueles que incidem sobre a pessoa, ou
melhor, são aqueles que quando atigem determinador indicador do contribuinte
levam em conta as suas condições pessoais.
No que diz respeito à aplicação do principio da capacidade
contributiva em relação aos impostos pessoais não há controvérsia. Temos,
simplesmente, que analisar a situação de cada sujeito passivo tributário para
que, de acordo com esta análise, seja verificada a sua capacidade de
contribuir, para assim, graduar a imposição fiscal.
No caso dos impostos reais como o fato gerador não leva em conta
o sujeito passivo e as suas qualidades, fica dificil, num primeiro momento, aferir
se o principio da capacidade contributiva pode ser aplicado. No entanto, a
aplicação deste princípio é perfeitamente viável, pois existem outras formas de
se medir a capacidade contributiva, além da renda obtida, como por exemplo, a
renda acumulada, ou riqueza, ou patrimônio. Como os impostos reais incidem
sobre estes indices, podemos dizer que, também, estarão submetidos ao
princípio da capacidade contributiva.
Neste sentido Gabriel Troianelli relata a possibilidade de aplicação
do principio da capacidade contributiva aos impostos reais, com o seguinte
enfoque:
“Ainda que se considere que a expressão sempre que possível
contida no § 1º do art. 145 da Constituição Federal se aplique
tanto ao caráter pessoal dos impostos quanto ao princípio da
capacidade econômica, também os impostos de carater real
devem observar o princípio da capacidade contributiva (...)” 25
________________________
26BRASIL. Supremo tribunal Federal . RE 153771/MG, publicado no DJ nº 170 de 05/09/97, Consulta no
site do STF, disponível em http://www.stf.gov .br/jurisp.html. Acesso em 05.12.2010. 27BRASIL. Supremo tribunal Federal . RE 234105/SP, publicado no DJ nº 63 de 31/03/2000, Consulta no
site do STF, disponível em http://www.stf.gov .br/jurisp.html. Acesso em 05.12.2010.
30
Contrário a este entendimento está o Supremo Tribunal Federal 26 que
consolidou, mesmo não sendo pacifico 27, o entendimento de que não se aplica
o principio da capacidade contributiva aos impostos reais, não se autorizando o
emprego de ténicas de progressividade que somente serão aceitas nos casos
expressamente previstos pela Constituição.
2.6.3- Tributos Vinculados
Numa análise literal do art. 145 § 1º do texto constitucional
observamos que foi restringida a aplicação do principio da capacidade
contributiva, com a sua observância apenas em relação aos impostos que são
tributos classicamente definidos como não vinculados. Como a Constituição se
atém apenas aos impostos torna-se importante abordarmos a aplicação deste
principio em relação aos tributos vinculados, mais precisamente no que diz
respeito às taxas, tanto as que provem de serviços públicos usufruídos ou
postos à disposição do contribuinte, como as decorrentes do exercício de poder
de polícia, bem como em relação às contribuições de melhoria.
È importante o destaque inicial do que vem a ser tributos não
vinculados e tributos vinculados. A diferença entre as duas espécies tributárias
está ligada basicamente a atuação do Poder Público. No caso dos tributos não
vinculados observamos que estes são independentes de uma atuação estatal ,
entretanto, no tocante aos tributos vinculados a atuação do Poder Público
se faz presente.
Existe muita discursão em relação à aplicação ou não do principio da
capacidade contributiva aos tributos vinculados. Na defesa de que o princípio
________________________
28 CARRAZZA, Roque Antonio. Op. cit. p. 84 e 113.
29 DERZI, Misabel Abreu Machado. Op. cit. p. 695.
31
da capacidade contributiva não se aplica aos tributos vinculados temos, dentre
outros, Elizabeth Carrazza 28 que admiti o emprego do principio da capacidade
contributiva apenas em relação aos impostos, já que somente esses incidem
sobre fatos do mundo econômico independentes de qualquer atuação estatal..
Baleeiro, atualizado por Mizabeu Abreu M. Derzi corobora com o
entendimento anterior e não considera a possibilidade de aplicação aos tributos
vinculados:
A Constituição brasileira, não obstante, adotando a melhor
técnica, como alerta F. Moschetti, restringe a obrigatoriedade do
princípio aos impostos, conforme dispõe o art. 145, §1º. É que,
enquanto a base de cálculo dos impostos deve mensurar um
fato-signo, indício de capacidade econômica do próprio
contribuinte, nos chamados tributos vinculados – relativos às
taxas e contribuições – ela dimensiona o custo da atuação
estatal ou a vantagem imobiliária auferida pelo contribuinte,
advinda da obra pública. 29
Dentre os doutrinadores que pregam a aplicação do principio em
analise em relação a todos os tributos, destaca-se, Sacha Calmom:
"Por ser do homem a capacidade de contribuir, a sua medição é
pessoal, sendo absolutamente desimportante intrometer no
assunto a natureza jurídica das espécies tributárias. É errado
supor que, sendo a taxa um tributo que tem por fato jurígeno
uma atuação do Estado, só por isso, em relação a ela não há que
falar em capacidade contributiva.
(...)
Nos impostos, mais do que nas taxas e contribuições de
melhoria, está o campo de eleição da capacidade contributiva.
________________________
30 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Manual de Direito Tributário. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003,
p. 17.
32
(...)
Nas taxas e contribuições de melhoria, o princípio realiza-se
negativamente pela incapacidade contributiva, fato que
tecnicamente gera remissões e reduções subjetivas do montante
a pagar imputado ao sujeito passivo sem capacidade econômica
real. É o caso, v.g., da isenção da taxa judiciária para os pobres e
o da redução ou mesmo isenção da contribuição de melhoria em
relação aos miseráveis que, sem querer, foram beneficiados em
suas humílimas residências por obras públicas extremamente
valorizadoras.." 30
Embora a analise deste tópico gire em torno da aplicação do
principio da capacidade contributiva é importante destacar que os tributos
vinculados está intimamente ligado ao princípio do benefício, e através deste
observa-se que o pagamento do tributo deverá levar em consideração o
benefício auferido pelo sujeito passivo. No caso dos tributos não vinculados,
até por estar inserido no texto constitucional, temos a plicação do principio da
capacidade contributiva.
Portanto, temos dois princípios distintos de justiça fiscal aplicados
simultaneamente dentro do mesmo sistema tributário. O princípio da
capacidade contributiva, aplicável aos tributos não vinculados, e o princípio do
benefício, aplicável aos tributos vinculados.
Apesar disto e mesmo não havendo previsão no texto constitucional
o Princípio da Capacidade Contributiva pode ser admitido também em relação
aos tributos vinculados. Na verdade para que isto ocorra deve ser respeitado
tanto o principio do beneficio como os limites estabelecidos pelo Principio da
________________________
31CONTI, José Maurício. Op cit, p. 65
33
Capacidade Contributiva, ou melhor dizendo, o repeito ao minimo vital e o não
confisco. Neste sentido, bem observou José Maurício Conti:
"O princípio da capacidade contributiva é aplicável a todas as
espécies tributárias. No tocante aos impostos, o princípio é
aplicável em toda a sua extensão e efetividade. Já no caso dos
tributos vinculados, é aplicável restritivamente, devendo ser
respeitados apenas os limites que lhe dão os contornos inferior
e superior, vedando a tributação do mínimo vital e a imposição
tributária que tenha efeitos confiscatórios. 31
Podemos concluir, portanto, que o emprego do principio da
capacidade contributiva em relação aos tributos vinculados não é uma
imposição, mas sim uma orientação,funcionando simplesmente como uma
forma de se atingir a justiça fiscal.
2.7- Príncipio da Capacidade Contributiva e o mínimo existêncial
Existem condições mínimas para a existência humana digna que
não podem ser objeto de intervenção do Estado e que ainda exigem
prestações estatais positivas. Em termos de tributação esta intervenção
também deve respeitar o minimo necessário para o contribuinte possa viver
dignamente com a sua família, não podendo haver nenhuma incidência de
tributos.
O “mínimo vital” encontra-se em situação oposta ao Princípio do Não
Confisco. Enquanto este não permite a tributação além da capacidade
contributiva, aquele protege da tributação as pessoas que não possuem
capacidade contributiva.
________________________
32CONTI, José Maurício. Op cit, p. 53/55.
33TORRES, Ricardo Lobo. Op cit, p. 163/164.
34
Assim, qualquer tributo que incida sobre a parcela destinada a suprir
as necessidades básicas dos cidadãos, será considerado inconstitucional por
ferir o princípio da capacidade contributiva. Sobre a relação existente entre o
principio da capacidade contributiva e o minimo vital, os ensinamentos de José
Maurício Conti são bem elucidativos:
“É inconstitucional a tributação exercida sobre determinada
manifestação de capacidade econômica de um contribuinte que
o atinja naqueles recursos que destinaria às suas necessidades
básicas, imprescindíveis à garantia de sua sobrevivência. Os
recursos destinados a atender estas finalidades, se somente
para isso são suficientes, não revelam capacidade econômica
mínima, não permitindo que dela sejam extraídos quaisquer
valores destinados a compor a arrecadação do Estado, pois
estar-se-ia atingindo alguém sem capacidade contributiva
alguma - violando, pois, o princípio constitucional.” 32
Neste sentido, cabe ainda destacar, o enfoque dado acerca do tema
por Ricardo Lobo Torres:
“(...) A capacidade contributiva começa além do minimo
necessário a existência humana digna e termina aquém do limite
destruidor da propriedade. As condições iniciais da liberdade e a
inintributabilidade do mínimo vital, por consequinte, coincidem
com a não capacidade contributiva, que é a face negativa do
principio que na Constituição aparece positivamente. O mínimo
existencial encontra na capacidade contributiva o seu
balizamento e jamais o seu fundamento.” 33
Evidentemente, determinar a inconstitucionalidade de uma
imposição fiscal é uma tarefa complicada, pois é muito dificil precisar o que
venha a ser o mínimo existencial e, portanto, o que não possa ser tributado. O
________________________
34COSTA, Regina Helena. Op cit, p. 68. 35GODOI, Marciano Seabra. Justiça, igualdade e Direito Tributário. São Paulo: Dialética, 1999, p. 197.
35
"mínimo vital" dependerá do conceito que se tiver de necessidades básicas e
sua fixação estará ligada a uma decisão política do legislador, que deverá
buscar quais são as necessidades básicas de um indivíduo e de sua família.34
Assim, torna-se necessário levar em consideração as necessidades
dos indivíduos dentro do contexto social, cultural e econômico em que vivem,
sendo reconhecidos como não tributáveis os fatos que, embora demonstrem
alguma capacidade econômica, não indiquem capacidade contributiva.
Cabe ressaltar que a referida proteção engloba tanto o contribuinte
como a sua familia. bem como, as pessoas jurídicas. Neste sentido é feita a
analise de Marciano Seabra Godoi:
"O conceito de capacidade contributiva começa a formar-se
quando, nos casos das pessoas físicas, preserva-se o mínimo
vital individual e familiar, e no caso das pessoas jurídicas
deduzem-se todos os gastos e elementos passivos que influem
na situação econômica do contribuinte." 35
Conclui-se, então, que o “mínimo existêncial” não pode ser tributado
por ausência de capacidade de contribuir. Assim, somente o que estiver acima
desse “mínimo” é que pode, em tese, ser objeto de tributação. Na verdade, o
que se deve ter em mente, é que uma tributação, para respeitar ao Princípio da
Capacidade Contributiva, não deve incidir sobre o “mínimo existencial” ou
“mínimo vital”.
2.8- Princípio da Capacidade Contributiva e o Não-Confisco
A tributação, conforme descrito no item anterior, deve se ater à um
mínimo intocável. Entretanto, outra variável deve ser analisada no momento
________________________
36 MARTINS, Ives Gandra da Silva. Sistema tributário na Constituição de 1988. 5 ed. São Paulo:Saraiva, 1998, p. 125-127. 37 CRFB, art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao
Distrito Federal e aos Municípios: (...) IV - utilizar tributo com efeito de confisco. 38BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Tribunal Pleno. Questão de Ordem em Medida Cautelar em Ação
Direta de Inconstitucionalidade nº 2.551-1/Minas Gerais. Rel. Min. Celso Melo; julgado em 02.04.03. Diário de Justiça, 20 abr. 2006. Disponível em <http://www.stf.gov.br>. Acesso em: 03/12/2010.
36
da tributação. Estamos falando de um patamar máximo, acima do qual o tributo
não deve incidir sob pena de inviabilizar a continuidade da atividade
arrecadatória, configurando-a como confiscatória.
No tocante ao conceito de confisco não existe uma definição precisa,
ou melhor, existe a dificuldade de se achar o ponto a partir do qual a tributação
passa a ser confiscatória. Neste sentido ressalte-se o pensamento de Ives
Granda Martins. Afirma, este doutrinador, que não é fácil definir o que seja
confisco, mas entende que haverá confisco sempre que a tributação retire a
capacidade do contribuinte de se sustentar e se desenvolver, entendendo ser
toda a violação ao direito de propriedade sem justa e prévia indenização dos
bens materiais e imateriais. 36
Mesmo sendo impreciso o seu conceito, o não confisco encontra-se
constitucionalmente previsto no art. 150, inciso IV da carta magma 37. Acerca
deste dispositivo legal, já se manifestou o Supremo Tribunal Federal:
"A proibição constitucional do confisco em matéria tributária
nada mais representa senão a interdição, pela Carta Política, de
qualquer pretensão governamental que possa conduzir, no
campo da fiscalidade, à injusta apropriação estatal, no todo ou
em parte, do patrimônio ou dos rendimentos dos contribuintes,
comprometendo-lhes, pela insuportabilidade da carga tributária,
o exercício do direito a uma existência digna, ou a prática de
atividade profissional lícita ou, ainda, a regular satisfação de
suas necessidades vitais (educação, saúde e habitação, por
exemplo)." 38
Diante desta imprecisão caberá ao Judiciário, então, dizer quando
um tributo está sendo utilizado com o efeito proibido pela Constituição. Para
isto, deve considerar todo o sistema em que o tributo esteja sendo exigido.
________________________
39CASTILHO, Paulo César Bária de.Confisco tributário. São Paulo: RT, 2002, p. 45.
40CONTI, José Maurício. OP. cit. p. 55.
37
Cabe ressaltar a precisa definição de confisco do jurista Paulo Cesar
Baria de Castilho: “De forma geral, o conceito de confisco é identificável e tem
sido tratado como sendo a absorção da propriedade particular pelo Estado,
sem justa indenização. Quando isso se dá por meio de tributo, estamos diante
do confisco em matéria tributária”. 39
Assim, ocorre confisco se o ente tributante no exercicio de sua
função arrecadatória apropria-se de parcela considerável da propriedade do
contribuinte, sem a devida compensação. Neste caso, estara afrontando um
dos direitos fundamentais do cidadão, tutelado pela Constituição em seu art. 5º,
inciso XXII, o direito de propriedade.
O direito de propriedade deve conviver com a tributação, mas desde
que está não o afonte. Na verdade, o principal é que o direito de propriedade e
a tributação se compatibilizem para que não haja uma tributação confiscatória,
e, portanto, inconstitucional.
Após a analise da relação entre o não confisco e o direito de
propriedade, é necessário que o enfoque passe a ser em relação a capacidade
contributiva.
É possivel perceber que a proibição de confisco está intimamente
relacionada ao Princípio da Capacidade Contributiva, pois, se houver a
exigência de um tributo além desta, estaremos diante de um confisco tributário.
Assim, o não confisco atua como limitador da capacidade contributiva, ou
melhor, funciona uma das formas de graduação da tributação . Através, deste,
então, pode-se verificar o limite máximo que cada contribuinte deva suportar
em termos de carga tributária.
Neste sentido, José Maurício Conti 40 ao analisar a relação entre o
Não confisco e a capacidade contributiva, considerou que o tributo ao assumir
caráter confiscatório estará atingindo valor que exceda a capacidade
contributiva, e, portanto será excessivo e injusto.
________________________
41TIPKE, Klaus. YAMASHITA, Douglas. Op. cit. p.67.
38
Pode-se, analisar, a proibição ao confisco como sendo um
componente a mais do princípio de justiça tributária, uma importante forma de
atingirmos uma tributação mais justa, uma vez que, os contribuintes somente
concorreram aos gastos publicos na medida das suas possibilidades, sob pena
da tributação ter o efeito confiscatório.
Para Klaus Tipke41, “a capacidade contributiva termina de todo modo
onde começa o confisco que leva à destruição da capacidade contributiva” 41.
Não verdade, cabe destacar que, mesmo a carga tributária não
afetando a capacidade de subsistir do contribuinte, se ela for excessiva e
injustificada estará caracterizado o confisco.
Conclui-se, portanto, que o princípio da vedação ao confisco tem por
objetivo proteger tanto a capacidade econômica do contribuinte como o direito
à propriedade e os demais direitos e garantias fundamentais. O Estado fica
impedido de apoderar-se dos bens dos cidadãos, retirando-lhes o mínimo
existencial ou impossibilitando sua atividade econômica.
CAPITULO 3
JUSTIÇA FISCAL
39
A obtenção de uma estrutura tributária ideal, sob o ponto de vista da
igualdade, da equidade e da justiça fiscal pode ocorrer por meio da aplicação
do Princípio da Capacidade Contributiva que, dentre os princípios
constitucionais de Direito Tributário, é o que melhor possibilita uma tributação
mais justa, baseada na capacidade de contribuir de cada indivíduo.
3.1- A Justiça Fiscal tendo por base o Princípio da Capacidade Contributiva.
Existem várias formas de o Estado obter recursos para manutenção
de suas atividades. Dentre estas a que mais se destaca é a tributação, utilizada
de forma compulsória e coercitiva sobre os cidadãos, que submetidos a esta
deverão contribuir com uma parcela de suas riquezas. Na verdade, não se
contesta a necessidade de arrecadação, pois o financiamento dos gastos
públicos por meio de tributos é imprescindível. Entretanto, o que deve ser
levado em consideração, na verdade, são os critérios e os princípios que
deverão nortear tal atividade.
A igualdade, importante princípio constitucional, sempre teve estreita
relação com a idéia de justiça. A garantia, nos termos de Aristóteles, do mesmo
tratamento aos iguais e diferenciação dos desiguais na medida de suas
desigualdades, é um dever de todos e principalmente do Poder Púbico, quando
desempenha suas atividades. Entretanto, se junto com esta idéia não se
atrelar um critério capaz de conseguir promover tal diferenciação o termo
igualdade perderá seu sentido.
_____________________ 42OLIVEIRA, José Marcos Domingues de. Op. cit. p.57.
40
Na verdade, a adoção de um critério de diferenciação não basta
para atingirmos a justiça em termos tributários. É necessário que tal critério
seja compatível com os ditames constitucionais, ou melhor, o tratamento
diferenciado deverá estar de acordo com os valores aclamados pela
Constituição. Ao se instituir um tributo deverão ser respeitados os direitos
ligados ao ideal de liberdade e o atendimento aos princípios constitucionais
vinculados à justiça e à igualdade. Assim, apesar da igualdade e justiça
possuírem forte ligação, tratam-se de conceitos inconfundíveis.
O ideal de igualdade, conforme dito anteriormente, possui seu
conteúdo ligado à idéia de justiça. Assim, apresenta-se o princípio da
capacidade contributiva como elemento diferenciador para a realização da
igualdade, a fim de se alcançar a justiça em termos de tributação. Tal
entendimento origina-se da idéia de que:
“se um tributo violar a capacidade contributiva estará
desrespeitando a própria isonomia constitucional e a diretriz de
Justiça de que se reveste o princípio. (...) É no ideal de justiça
que se inspira o princípio da igualdade, cujo conteúdo, por sua
vez, é integrado no Direito Tributário pelo princípio da
capacidade contributiva, determinando-se desta forma, o
profundo sentido ético-jurídico do tributo” 42
A capacidade contributiva, portanto, corresponde ao mais importante
princípio da justiça tributária, especialmente, no que diz respeito à distribuição
de renda. A estrutura tributária deve, então, buscar os meios necessários para
atingi-la, fazendo uma adequada distribuição do ônus tributário entre os
indivíduos.
_____________________ 43OLIVEIRA, José Marcos Domingues de. Op. cit. p.23.
41
Ressalte-se ser adequado, desde a elaboração da norma que vier a
instituir o tributo, a observância do princípio da capacidade contributiva. A lei
poderá instituir alguma espécie de discriminação, entretanto deverá verificar as
desigualdades naturais existentes e assim atender aos fins a que a norma se
destina. A lei deverá ainda imprimir aos tributos criados uma gradação, e
observar a capacidade econômica dos contribuintes. A atividade tributária do
Estado, portanto, é justa se for adequada à capacidade econômica da pessoa
que deva suportar o ônus tributário.
Nesse sentido, devem ainda ser observados, quando for exigido o
tributo e definida a quantia que deverá ser paga por cada contribuinte, os
limites impostos pelo princípio da capacidade contributiva. Portanto, deverá ser
protegido o mínimo existencial, de forma que cada um contribua para a
sociedade na medida de suas possibilidades, bem como, a obediência ao
principio do não-confisco.
A repartição da carga tributária, segundo o princípio da capacidade
contributiva, é condição para que possamos considerar a tributação justa, pois:
“as fundamentais exigências jurídicas em matéria tributária são
de justiça na repartição da carga fiscal conforme o princípio da
capacidade contributiva, positivado ou não, pois ele deriva do
espírito vivificador da ordem jurídica, em última análise, do
direito natural de que está imbuída a consciência humana” 43
Então, quando é feita a análise do termo justiça deve ser levada em
consideração a garantia de condições de vida digna aos indivíduos.
O uso do princípio da capacidade contributiva como meio de
diferenciar os cidadãos e determinar quem deverá suportar determinada carga
_____________________ 44 Dentre estes destacam-se os seguintes os privilégios tributários: isenções, remissões e reduções de
base de cálculo 45 Segundo Ricardo Lobo Torres: “(...) o privilégio será odioso toda vez que importe em desigualdade ou quando as diferenças estiverem afastadas dos princípios da legalidade, justiça e da segurança jurídica”.
42
tributária, bem como, quem deverá dela ser dispensado por estar abaixo do
nível mínimo de sobrevivência, não significa privilegiar um em detrimento do
outro. Na verdade, os reais privilégios tributários 44 ligados à idéia de justiça,
diferenciam-se dos denominados privilégios odiosos45 que segundo Ricardo
Lobo Torres não levam em consideração o princípio da razoabilidade e
afrontam o ideal de justiça, discriminando os iguais e igualando os desiguais.
Conclui-se, portanto, que utilizar o princípio da capacidade
contributiva, como forma de aplicação do princípio da igualdade, mostra-se um
meio eficaz para chegarmos à justiça tributária, pois para alcançar a sua
finalidade, tal princípio busca consequentemente, uma melhor distribuição de
renda, a proteção do mínimo existencial e dos valores presentes na
Constituição.
3.2- Indicadores Tributários
Na Tributação brasileira, o ônus tributário que é repartido entre os
contribuintes não observa o princípio da capacidade contributiva, não estando
de acordo com o que se imagina efetivamente de uma Justiça Tributária, ou
melhor, não considera que os contribuintes de maior renda sofram uma maior
tributação quando comparado aos contribuintes de menor renda.
O gráfico 1 do anexo mostra uma grande desigualdade quando a
análise é feita em relação a carga tributária. Podemos observar que em 2004
quem ganhava até dois salários mínimos gastava 48,8% de sua renda no
pagamento de tributos, o que não ocorria em relação à população com renda
superior a 30 salários mínimos que gastava 26,3%. Em 2008, houve um
aumento nestes percentuais acentuando ainda mais a desigualdade. A
população de baixa renda passou a suportar uma carga tributária que
_____________________ 46 Dados e informações extraídas do relatório denominado, indicadores de iniquidade do Sintema
Tributário Nacional do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, Dezembro de 2010.
43
ultrapassava metade de sua renda disponível (53,9%), acréscimo este não
acompanhado pela população de mais alta renda, que apenas comprometeu a
sua renda em 29%.
Na verdade, o que pode ser observado é que a carga tributária
age na razão inversa da renda disponível do contribuinte. A questão é entender
o verdadeiro motivo desta ocorrência. Para isto, torna-se necessário um
enfoque em relação aos impostos diretos e indiretos.
Podemos observar que o sistema tributário brasileiro é caracterizado
pela regressividade, uma vez que o peso da carga tributária indireta é muito
maior do que o da carga direta. O gráfico 2 mostra que a alta carga tributária
indireta fez com que as famílias de menor poder aquisitivo comprometessem
metade de sua renda no consumo de bens e serviços. Entretanto, famílias com
renda mais alta não arcam com um ônus tributário tão grande assim.
Cabe ressaltar que em 2008 segundo dados do IBGE a carga
tributária brasileira totalizou 34,9% do PIB. Observando, os gráficos 3 e 4
constata-se que deste valor 46,8% foi cobrado de impostos indiretos (ICMS,
IPI, ISS e a COFINS) o que correspondeu a 16,3% do PIB. O que é mais
interessante é que os impostos sobre renda e patrimônio (impostos diretos) que
poderiam contribuir com a Justiça Fiscal, responderam por apenas 25,6% da
carga tributária total, ou melhor, 8,9% do PIB 46.
No caso dos impostos diretos o Imposto de Renda é o que mais se
destaca. Entretanto, este tem este imposto sido mal utilizado no Brasil como
instrumento de redistribuição de renda e promoção da justiça fiscal. Tal
imposto caracteriza-se pela progressividade, entretanto, para atendê-la fatores
como: o número de faixas de rendimentos sobre as quais são aplicadas as
alíquotas, o limite de isenção e da alíquota máxima de tributação devem ser
_____________________ 47Instituto Brasilriro de Geografia e Estatística (IBGE), observatório da equidade, relatório tributário,
http://www.ibge.gov.br/observatoriodaequidade/relatoriotributario.htm, 2009
44
levados em consideração.
O problema é que o Imposto de Renda vem perdendo a intensa
progressividade que lhe é peculiar, principalmente por causa das alíquotas
nominais em razão dos abatimentos e deduções a que está sujeito. Dados da
Receita Federal para as declarações de IRPF 2003 (ano base 2002), monstram
que os contribuintes com renda mensal tributável de até R$ 2.500 estavam
sujeitos a uma alíquota efetiva média de menos de 3% - bem inferior à alíquota
mínima de 15%. Já os declarantes que recebiam uma renda mensal acima de
R$ 10.000, apesar de estarem sujeitos à alíquota nominal máxima de 27,5%,
sofreram uma incidência efetiva de 17,8% (Receita Federal do Brasil, 2004).
Para que a justiça fiscal seja efetiva o único fator usado para
desiqualar contribuintes deve estar ligado a sua capacidade de contribuir.
Entretanto, no Brasil com a legislação atual isto não ocorre, uma vez que a
atual tabela do Imposto de Renda usa outros critérios de discriminação
contrariando o estabelecido na Constituição.
Posto isto, cabe ainda dois ultimo destaques interessantes sobre o
nosso sistema tributário: dados oficiais (IBGE e IPEA), relatam que a carga
tributária sobre os pobres teria que cair 86% para se igualar à dos mais ricos e
de uma carga tributária de 33,8% apenas 9,5% retornou à sociedade na forma
de investimentos ou em educação (4,4%), saúde (3,5%), segurança pública
(1,2%), habitação e saneamento (0,4%). 47
Assim, a estrutura tributária brasileira aprofunda a desigualdade de
renda no Brasil, ao invés de aliviá-la. Pode-se, então, chegar à conclusão de
que a desigualdade da renda, considerando o impacto dos impostos, supere a
desigualdade de renda antes dos impostos.
CONCLUSÃO
45
De acordo com o estudo, é certo que, no sistema tributário brasileiro,
a maior parcela da arrecadação é composta por tributos indiretos, os quais tem
por característica principal a regressividade. Tal regressividade se contrapõe
aos princípios e objetivos da política social, tendo implcações
macroeconômicas inclusive.
Há, ainda, uma grande variedade de alíquotas e tipos de tributos.
São mais de 70 tributos e centenas de alíquotas, o que torna o sistema
tributario brasileiro custoso para o Estado e para o contribuinte.
Além disso, constata-se ineficiência e lentidão no debate sobre a
reforma tributária. Há pouco interesse no ramo acadêmico e no setor de
pesquisa sobre o assunto.
Sem dúvida, este cenário contribui para a perpetuação da
desigualdade, ferindo o Princípio da Capacidade Contributiva, tornando-se um
obstáculo ao desenvolvimento do país, distanciando-se da idéia de justiça
fiscal.
Sendo asim, uma Reforma Tributária seria fundamental,
reestruturando a forma como se financia a atividade financeira do Estado. É de
suma importância equilibrar qualidade e quantidade no gasto e na receita. Faz-
se necessário garantir que o aumento recente do gasto social seja financiado
por um sistema tributário mais progressivo. A simplificação do sistema
também deveria ser almejada tornando-o menos custoso.
ANEXO
46
Gráfico 1- Distribuição da Carga Tributária segundo faixa de salário mínimo
Renda Mensal Familiar
Carga Tributária Bruta (2004)
Carga Tributária Bruta (2008)
Até 2 SM 48,8 53,9
2 a 3 38,0 41,9
3 a 5 33,9 37,4
5 a 6 32,0 35,3
6 a 8 31,7 35,0
8 a 10 31,7 35,0
10 a 15 30,5 33,7
15 a 20 28,4 31,3
20 a 30 28,7 31,7
Mais de 30 SM 26,3 29,0
CTB segundo CFB/DIMAC
32,8 36,2
47
Gráfico 2- Carga Tributária Direta e Indireta sobre a Renda Total das Famílias: 2004
Em % da Renda Mensal Familiar
Ônus Tributário Direto
Ônus Tributário Indireto
48
Gráfico 3- Distribuição da Carga Tributária por Bases de Incidência: 2008
Em % do Total
Gráfico 4- Distribuição da Carga Tributária dos principais tributos: 2008
Em % do Total
Fonte primária: Sistema de Contas Nacionais 2004-2008 (IBGE)
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49
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Consulta no site do STF, disponível em http://www.stf.gov.br/jurisp.html.
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50
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Conteúdo e Eficácia do Princípio, 2ª ed., revista e atualizada. Rio de Janeiro:
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51
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Dialética, n° 76 Janeiro / 2002.
ÍNDICE
52
FOLHA DE ROSTO...........................................................................................02 AGRADECIMENTO...........................................................................................03 DEDICATÓRIA..................................................................................................04 RESUMO...........................................................................................................05 METODOLOGIA................................................................................................06 SUMÁRIO..........................................................................................................07 INTRODUÇÃO...................................................................................................08 CAPITULO 1 HISTÓRICO DO PRINCÍPIO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA..................09 1.1- Origem e Histórico...................................................................................09 1.2- Princípio da Capacidade Contributiva nas Constituições Brasileiras...............12 CAPITULO 2 O PRINCÍPIO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA.........................................14 2.1- O Pricípio da Igualdade...........................................................................14 2.2- Conceito do Princípio da Capacidade Contributiva......................................17 2.3- Capacidade contributiva e capacidade econômica.................................20 2.4- Princípio da Capacidade Contributiva e progressividade.........................22 2.5- Princípio da Capacidade Contributiva e seletividade..............................25 2.6- Aplicação do Prncípio da Capacidade Contributiva.................................27 2.6.1- Impostos diretos e indiretos...............................................................27 2.6.2- Impostos reais e pessoais..................................................................28 2.6.3- Tributos Vinculados............................................................................30 2.7- Princípio da Capacidade Contributiva e o Mínimo Existêncial...............33 2.8- Princípio da Capacidade Contributiva e o Não-Confisco.......................35 CAPÍTULO 3 JUSTIÇA FISCAL............................................................................................39 3.1- A Justiça Fiscal tendo por base o Princípio da Capacidade Contributiva............39 3.2- Indicadores Tributários...............................................................................42 CONCLUSÃO...................................................................................................45 ANEXO..............................................................................................................46 BIBLIOGRAFIA.................................................................................................49 ÍNDICE...............................................................................................................52
FOLHA DE AVALIAÇÃO
53
Nome da Instituição: Universidade Cândido Mendes- Instituto
A Vez do Mestre
Título da Monografia: O Princípio da Capacidade Contributiva
e a Justiça Fiscal Sob a Luz da Constituição Brasileira de 1988
Autora: Silvia Teixeira Tavares
Data da Entrega: 10 de Janeiro de 2011
Avaliado por: Conceito: