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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” AVM FACULDADE INTEGRADA A RESPONSABILIDADE CIVIL DECORRENTE DE ERRO MÉDICO Por: Thaís Loureiro de Macedo Orientador Prof. Francis Rajzman Rio de Janeiro 2012

UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · a afirmação de que a obrigação é um dever jurídico originário e a ... Em apertada síntese, responsabilidade civil é um

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

AVM FACULDADE INTEGRADA

A RESPONSABILIDADE CIVIL DECORRENTE DE ERRO

MÉDICO

Por: Thaís Loureiro de Macedo

Orientador

Prof. Francis Rajzman

Rio de Janeiro

2012

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

AVM FACULDADE INTEGRADA

A RESPONSABILIDADE CIVIL DECORRENTE DE ERRO

MÉDICO

Apresentação de monografia à AVM Faculdade

Integrada como requisito parcial para obtenção do

grau de especialista em Direito Privado e Civil

Por: Thaís Loureiro de Macedo.

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AGRADECIMENTOS

A meus queridos pais, Tadeu e Beatriz,

pelo constante incentivo aos estudos.

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DEDICATÓRIA

Ao meu amado Rodolfo, companheiro de

todas as horas.

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RESUMO

De acordo com o instituto da responsabilidade civil, toda conduta que, lesionando um dever jurídico antecedente, provoca prejuízo a outrem, gera a responsabilidade civil do causador do dano, fazendo surgir o dever jurídico de repará-lo. Nesse aspecto, encontra-se o estudo da responsabilidade civil do erro médico, a qual é apurada, em regra, mediante a verificação da culpa profissional, seja na modalidade de negligência, imprudência ou imperícia, sendo necessária, ainda, a prova da conduta comissiva ou omissiva do agente, do dano e do nexo causal. A fim de identificar a espécie de responsabilidade a qual se submete o erro médico, se dependente da existência de culpa ou não, deve-se em primeiro lugar avaliar a natureza da relação jurídica entre este e o paciente. Ademais, no que diz respeito à responsabilidade de hospitais, clínicas e casas de saúde, cabe verificar se a responsabilidade decorre de defeito no serviço, hipótese em que tais instituições respondem objetivamente pelos danos causados aos pacientes; ou de culpa médica, situação em que se faz necessário identificar previamente a existência de vínculo entre o profissional e a instituição de saúde. Por fim, no que diz respeito à reparação civil, importa verificar as espécies de danos decorrentes de erro médico, os quais podem ser de ordem material, moral ou estética, sendo amplamente admitida sua cumulação.

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METODOLOGIA

A pesquisa adotou o método de estudo de casos relatados na

jurisprudência mais recente dos tribunais brasileiros, bem como o método

bibliográfico, pelo fato de, em termos de doutrina jurídica, ser indispensável

realizar uma atividade de pesquisa com o suporte nos ensinamentos dos

autores que cuidam da matéria.

O propósito do presente trabalho é explicativo, no sentido de

esclarecer aspectos da doutrina e da jurisprudência, e descritivo, ao apontar

elementos da realidade brasileira no que diz respeito à responsabilidade civil

por erro médico.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 8

CAPÍTULO I - A RESPONSABILIDADE CIVIL NO DIREITO BRASILEIRO 10

1.1 - Conceito 10

1.2 - Os pressupostos da responsabilidade civil 11

1.2.1 - Ação ou omissão 11

1.2.2 - Culpa 12

1.2.3 - Nexo causal 13

1.2.4 - Dano 14

CAPÍTULO II - O ERRO MÉDICO E A NATUREZA JURÍDICA DA RELAÇÃO

ENTRE MÉDICOS E PACIENTES

15

2.1 - A natureza jurídica da relação entre médicos e pacientes 15

2.2 - As espécies de responsabilidade civil aplicadas ao erro médico 18

2.3 - A responsabilidade civil do médico na cirurgia plástica 19

2.4 - A responsabilidade civil de hospitais, clínicas e casas de saúde 24

CAPÍTULO III - AS HIPÓTESES DE CONFIGURAÇÃO DE ERRO MÉDICO

E OS DANOS DELE DECORRENTES

30

3.1 - A culpa stricto sensu 30

3.2 - O consentimento informado 34

3.3 - As espécies de dano decorrentes de erro médico 38

CONCLUSÃO 42

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INTRODUÇÃO

Os processos judiciais envolvendo casos de erro médico têm

tornado-se frequentes nos tribunais brasileiros, razão pela qual se apresenta

relevante o estudo e o aprofundamento do tema da responsabilidade civil

decorrente desse tipo de evento danoso.

Não se pode negar a relevância social da questão do erro médico e

sua responsabilização, uma vez que diante dos casos concretos as vítimas

(pacientes) devem ser orientadas a buscar a reparação civil dos danos

ocorridos, sejam estes materiais, morais ou estéticos, assim como os médicos

precisam estar conscientes de sua responsabilidade.

Por outro lado, os operadores do direito necessitam manter-se

constantemente atualizados, a fim de estarem preparados para a correta

interpretação e aplicação da lei nos processos judiciais relacionados a este

tema.

O presente trabalho parte do estudo do conceito e dos

pressupostos da responsabilidade civil, para posteriormente delimitar a

natureza jurídica da relação entre paciente e médicos, bem como as espécies

de responsabilidade civil aplicáveis a estes, fazendo uma análise da legislação

relacionada ao tema e do entendimento da doutrina e da jurisprudência

brasileiras.

A monografia aborda, ainda, algumas questões específicas tais

como a responsabilidade civil do cirurgião plástico, tanto na hipótese de

cirurgia reparadora como na de cirurgia estética propriamente dita, e também a

responsabilidade de hospitais, casas de saúde e clínicas em razão de defeitos

nos serviços por estes prestados, ou de danos causados por médicos em suas

dependências, avaliando-se a necessidade da existência de vínculo entre as

instituições de saúde e estes profissionais para fins de responsabilização.

O estudo do tema abrange também o exame das hipóteses de

configuração de erro médico por culpa stricto sensu, além da questão do

consentimento informado e das espécies de danos que podem decorrer do

erro médico.

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A monografia pretende explicitar o entendimento majoritário a

respeito da questão na atualidade, analisando se esse posicionamento cumpre

efetivamente os objetivos da reparação civil de danos gerados por erro médico.

Ao se ater à análise da responsabilidade civil em decorrência de

erro médico segundo o atual entendimento da doutrina e jurisprudência

brasileiras, este trabalho pretende contribuir para o estudo da matéria, em seus

aspectos teórico e prático, tendo em vista haver ainda muitas controvérsias a

respeito do tema.

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CAPÍTULO I

A RESPONSABILIDADE CIVIL NO DIREITO BRASILEIRO

1.1 - Conceito

Em termos etimológicos, a palavra responsabilidade traz a ideia

geral de obrigação, encargo ou contraprestação. Em seu sentido jurídico,

responsabilidade significa o dever de reparar o prejuízo causado pela violação

de um dever jurídico anterior.1

Nesse aspecto, cabe distinguir juridicamente obrigação de

responsabilidade. A primeira é o vínculo jurídico que dá ao sujeito ativo

(credor) o direito de exigir do sujeito passivo (devedor) o adimplemento de uma

prestação. Quando a obrigação não é cumprida surge a responsabilidade, ou

seja, esta é a consequência jurídica do inadimplemento da obrigação, por isso

a afirmação de que a obrigação é um dever jurídico originário e a

responsabilidade um dever sucessivo.

O eminente jurista Carlos Roberto Gonçalves aponta que a

responsabilidade busca restaurar o equilíbrio moral e/ou patrimonial lesionado

pelo autor do dano, de forma que este, por ter violado determinada norma,

depara-se com as consequências indesejáveis de sua conduta, podendo ser

obrigado a restaurar o statu quo ante.2

Diante deste quadro, pode-se constatar que a responsabilidade civil,

como instituto jurídico que integra o direito obrigacional, revela-se também um

fenômeno social, pois aquele que incide em um comportamento comissivo ou

omissivo do qual decorra um dano deve sofrer as consequências de sua

conduta.

Sérgio Cavalieri Filho define de forma clara o instituto:

Em apertada síntese, responsabilidade civil é um dever jurídico sucessivo que surge para recompor o dano decorrente da violação de um dever jurídico originário. (...) Daí ser possível dizer que toda conduta humana que, violando dever jurídico

1 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil, 5ª edição, Ed. Malheiros,

São Paulo: 2004, p. 24. 2 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, volume IV: responsabilidade civil – 4ª

edição – São Paulo: Saraiva, 2009, p. 1-2.

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originário, causa prejuízo a outrem é fonte geradora de responsabilidade civil.3

1.2 - Os pressupostos da responsabilidade civil

O artigo 186 do Código Civil Brasileiro prevê a regra geral da

responsabilidade civil por ato ilícito, segundo a qual: “Aquele que, por ação ou

omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a

outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”. O dispositivo

supracitado aponta os quatro pressupostos ou elementos configuradores da

responsabilidade civil: ação ou omissão, culpa, nexo de causalidade e dano.

1.2.1 - Ação ou omissão

Em primeiro lugar, o artigo 186 do Código Civil remete a qualquer

conduta comissiva ou omissiva que cause dano a terceiro. Na lição de Sérgio

Cavalieri Filho, conduta é o comportamento humano voluntário que se

exterioriza por meio de uma ação ou omissão, produzindo consequências

jurídicas.4

A ação compreende em si um comportamento positivo, um fazer,

enquanto a omissão qualifica-se pela inação, pela inércia da prática de um

dever. Por essa razão, no que diz respeito à conduta omissiva, para que se

caracterize a responsabilidade do agente, é essencial a presença de um dever

jurídico de agir, o qual caso não tivesse sido violado, impediria a ocorrência do

dano.

A ação ou omissão é, portanto, um ato consciente da vontade

humana, que em regra emana da violação de um dever, o qual pode ter sua

origem na lei ou no contrato; configurar hipótese de abuso de direito (art. 187

do Código Civil); ou, até mesmo, na hipótese de omissão, decorrer de uma

conduta antecedente do próprio agente que cria o risco de um resultado e,

posteriormente, necessita intervir para evitá-lo.

No que tange à conduta, importa destacar que a responsabilidade

civil pode derivar de ato próprio, em que o responsável pela reparação do dano

3 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil, 5ª edição, Ed. Malheiros, São Paulo: 2004, p. 24. 4 Idem, p. 40.

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é a própria pessoa que o causou; de ato de terceiro, na forma prevista em lei,

como responsabilidade por fato de outrem (art. 932 do Código Civil); ou, ainda,

do fato da coisa (art. 936 a 938 do Código Civil).

1.2.2 - Culpa

Em segundo lugar, exige-se a culpa ou dolo do agente, com

fundamento no próprio texto do dispositivo legal, que menciona “ação ou

omissão voluntária”, bem como “negligência ou imprudência”, reportando-se ao

dolo e à culpa, respectivamente.

Desse modo, para que surja a responsabilidade de reparar o dano,

não é suficiente que o agente tenha cometido um ato ilícito, sendo

imprescindível a prova de que este atuou com culpa. A respeito do tema,

Carlos Roberto Gonçalves, citando o pensamento de Antunes Varela, aponta

que:

Agir com culpa significa atuar o agente em termos de, pessoalmente, merecer a censura ou reprovação do direito. E o agente só pode ser pessoalmente censurado, ou reprovado na sua conduta, quando, em face das circunstâncias concretas da situação, caiba a afirmação de que ele podia e devia ter agido de outro modo.5

A culpa lato sensu divide-se em dolo e culpa stricto sensu. Naquele

o agente atua deliberadamente para produzir o dano, transgredindo de forma

consciente e intencional o dever jurídico; nesta o dano é fruto de uma conduta

imprudente, negligente ou imperita do autor do prejuízo.

Novamente, Sérgio Cavalieri Filho distingue com precisão os

institutos, ao afirmar que “no dolo o agente quer a ação e o resultado, ao passo

que na culpa ele só quer a ação, vindo a atingir o resultado por desvio

acidental de conduta decorrente da falta de cuidado”.6

No que tange à culpa stricto sensu, primeiramente pode-se afirmar

que a imprudência decorre da prática de um ato sem o cuidado, o

discernimento ou a cautela demandada no caso concreto, sendo configurada

5 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, volume IV: responsabilidade civil – 4ª

edição – São Paulo: Saraiva, 2009, p. 296. 6 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 5ª edição – São Paulo, 2004, p. 50.

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por uma conduta comissiva, enquanto a negligência apresenta-se como a

mesma deficiência de cuidado, mas caracterizada por uma conduta omissiva,

ou seja, o agente deixa de atuar quando deveria fazê-lo. E, por fim, a imperícia

é a falta de habilidade ou capacidade técnica para a prática de determinada

atividade, função ou profissão.

Tendo em vista que o ordenamento jurídico brasileiro adota como

regra a teoria subjetiva da responsabilidade civil, a vítima precisa comprovar a

culpa do agente para que este seja responsabilizado. Todavia, em

determinadas hipóteses excepcionais, a lei prevê a responsabilidade objetiva,

em que não é necessária que a vítima comprove a culpa do agente para obter

a reparação do dano.

1.2.3 - Nexo causal

O terceiro elemento ou pressuposto da responsabilidade civil é o

nexo causal, que se traduz na relação de causa e efeito entre a conduta

comissiva ou omissiva do agente e o dano gerado. Esta relação de

causalidade significa a demonstração de uma relação necessária entre o fato e

o prejuízo, isto é, a certeza de que sem esse fato, o dano não teria ocorrido.7

Nesse ponto, cumpre destacar que o Código Civil Brasileiro, optou

por adotar, dentre diversas teorias sobre o nexo de causalidade, a teoria do

dano direto e imediato, a qual pressupõe a existência de uma relação de causa

e efeito direta e imediata entre a conduta e o dano, de forma que o agente

somente será responsabilizado pelos prejuízos que resultarem direta e

imediatamente de sua conduta. É o que se verifica da leitura do art. 430 do

Código: “Ainda que a inexecução resulte de dolo do devedor, as perdas e

danos só incluem os prejuízos efetivos e os lucros cessantes por efeito dela

direto e imediato, sem prejuízo do disposto na lei processual”.

Acrescente-se que na incidência de alguma das hipóteses legais de

exclusão da responsabilidade, tais como estado de necessidade, legítima

defesa, culpa exclusiva da vítima, fato de terceiro, caso fortuito ou força maior,

7 SERPA LOPES, Miguel M. de, Curso de Direito Civil, v.5, p. 251-252, citado por GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, volume IV: responsabilidade civil – 4ª edição – São Paulo: Saraiva, 2009, p. 330-331.

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nexo causal restará rompido, excluindo-se o dever do agente de reparar o

dano.

1.2.4 - Dano

Por fim, o quarto e último pressuposto da responsabilidade civil é o

dano, entendido este como o prejuízo causado pela lesão a um bem jurídico. O

dano pode ser material, moral ou, ainda, estético, modalidade esta

hodiernamente considerada pela jurisprudência pátria independente das

demais.

Pode-se afirmar que inexistindo o dano, não há o que ser reparado

ou indenizado, sendo, portanto, sua prova imprescindível para que se configure

a responsabilidade civil.

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CAPÍTULO II

O ERRO MÉDICO E A NATUREZA JURÍDICA DA

RELAÇÃO ENTRE MÉDICOS E PACIENTES

2.1 - A natureza jurídica da relação entre médicos e pacientes

Na atualidade, não se discute mais a natureza jurídica da relação

entre médicos e pacientes. Trata-se de um contrato, de forma que a

responsabilidade do profissional no caso de erro médico é de natureza

contratual.

A responsabilidade contratual pode ser com ou sem culpa

presumida, de acordo com a obrigação com a qual se comprometeu o devedor

se, respectivamente, este garantiu que atingiria certo resultado (obrigação de

resultado) ou se meramente obrigou-se por compromisso, verbal ou escrito, a

proceder de uma determinada maneira com vistas a alcançar aquele mesmo

fim (obrigação de meio).

No caso do médico, não se pode afirmar que este se compromete a

eliminar a enfermidade, curando o doente, mas tão somente que ele se propõe

a conduzir-se em conformidade com as normas e técnicas profissionais.

Portanto, não se fala em “inexecução da obrigação” se o médico simplesmente

não consegue curar o enfermo, mas emprega todos os recursos necessários e

disponíveis para esta finalidade.

Por essa razão, a doutrina majoritária entende que a obrigação dos

médicos é uma obrigação de meio e não de resultado.8 Nessa direção, Silvio

Venosa ensina que:

Quando o paciente contrata com o médico uma consulta, tratamento, terapia ou cirurgia, o negócio jurídico é nitidamente contratual, oneroso e comutativo. Não se tratando de cirurgia

8 Nesse sentido: Carlos Roberto Gonçalves (Direito Civil Brasileiro, volume IV: responsabilidade civil – 4ª edição – São Paulo: Saraiva, 2009), Sérgio Cavalieiri Filho (Programa de Responsabilidade Civil. 5ª edição – São Paulo, 2004), José de Aguiar Dias (responsabilidade Civil. 10ª edição, Rio de Janeiro: Forense, 2007), Miguel Kfouri Neto (Responsabilidade civil do médico. 5ª edição revista e atualizada à luz do novo Código Civil – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003) e Silvio Venosa (Direito Civil: responsabilidade civil, 3ª edição, São Paulo: Atlas, 2003), dentre outros.

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plástica estética, a obrigação contraída pelo médico, quer no contrato, quer fora dele, é de meio e não de resultado.9

Segundo bem sintetiza José de Aguiar Dias, o objeto do contrato

entre paciente e médico não é a cura do doente em si, o que configuraria uma

obrigação de resultado, mas a prestação de um serviço médico atento e

diligente, consoante as normas e técnicas da ciência médica.10

Por conseguinte, em regra, o profissional da medicina só poderá se

responsabilizado por erro médico se comprovada a sua atuação culposa, seja

na forma de negligência, imperícia ou imprudência. É essa a responsabilidade

subjetiva prevista no artigo 14, §4º do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº

8.078/1990), que dispõe: “A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais

será apurada mediante a verificação de culpa”, excetuando os médicos, dentre

outros profissionais liberais, da regra da responsabilidade objetiva do

fornecedor por danos causados aos consumidores por defeito na prestação de

serviços, os quais respondem independentemente de culpa, na forma prevista

no caput do mesmo dispositivo legal.

Também o artigo 951 do Código Civil, ao cuidar da questão da

indenização, corrobora a adoção da responsabilidade subjetiva, dependente da

prova de culpa do médico por parte da vítima, prevendo que:

O disposto no art. 948, 949 e 950 aplica-se ainda no caso de indenização devida por aquele que, no exercício de atividade profissional, por negligência, imprudência ou imperícia, causar a morte do paciente, agravar-lhe o mal, causar-lhe lesão, ou inabilitá-lo para o trabalho.

Entretanto, convém apontar que, por se tratar de um prestador de

serviço, o médico está submetido à Lei nº 8.078/1990, inclusive à regra do

artigo 6º, inciso VIII, segundo o qual é direito básico do consumidor:

VIII – a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências.

9 VENOSA, SILVIO. Direito Civil: responsabilidade civil, 3ª edição, São Paulo: Atlas, 2003, p. 95-96. 10 DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade Civil. 10ª edição, Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 297.

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Com fundamento no dispositivo supracitado, o juiz da causa poderá

determinar a inversão do ônus da prova em benefício da vítima do erro médico,

que figura na relação como consumidor. Por consequência, competirá ao

médico provar que agiu sem culpa.

A Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça já cuidou do tema,

consolidando a possibilidade de inversão do ônus da prova nas hipóteses de

erro médico, sendo a hipossuficiência entendida tanto no sentido econômico

quanto técnico. Nesse sentido, confiram-se os seguintes julgados:

RECURSO ESPECIAL: 1) RESPONSABILIDADE CIVIL - HOSPITAL - DANOS MATERIAIS E MORAIS - ERRO DE DIAGNÓSTICO DE SEU PLANTONISTA - OMISSÃO DE DILIGÊNCIA DO ATENDENTE - APLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. (...) 3.- A responsabilidade de médico atendente em hospital é subjetiva, necessitando de demonstração pelo lesado, mas aplicável a regra de inversão do ônus da prova (CDC. art. 6º, VIII). (...) 5.- Recurso Especial do hospital improvido. (REsp 696.284/RJ, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 03/12/2009, DJe 18/12/2009) AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO - RESPONSABILIDADE CIVIL - CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO - ERRO MÉDICO - PRESCRIÇÃO IRREGULAR DE MEDICAÇÃO - PARTO PREMATURO - PERDA DO FILHO - EXTRAÇÃO DO ÚTERO - CULPA CONFIGURADA - NULIDADE - NÃO OCORRÊNCIA - SÚMULA 7/STJ - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA - POSSIBILIDADE - CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO CONCRETO - DISSÍDIO NÃO DEMONSTRADO. (...) II - Como destacado, a inversão do ônus da prova não é automática, tornando-se, entretanto, possível num contexto da facilitação da defesa dos direitos do consumidor, ficando subordinada ao "critério do juiz, quando for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências.” (...) Agravo regimental improvido. (AgRg nos EDcl no Ag 854.005/MT, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 26/08/2008, DJe 11/09/2008)

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2.2 - As espécies de responsabilidade civil aplicadas ao erro

médico

Conforme visto anteriormente, a responsabilidade civil pode ser

objetiva ou subjetiva, em função da necessidade da presença da culpa.

Entende-se como subjetiva a responsabilidade que tem como um de seus

pressupostos a culpa do agente, ou seja, a prova da culpa é indispensável

para que este seja obrigado a reparar o dano.

Por outro lado, a responsabilidade objetiva deriva da lei, a qual,

fundamentando-se na teoria do risco, determina que em certas hipóteses o

agente responda pelos prejuízos causados independentemente de ter atuado

com ou sem culpa, devendo ser provados apenas o nexo causal e o dano.

A responsabilidade objetiva está prevista no art. 927, parágrafo

único, do Código Civil:

Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

É certo que não se pode atribuir aos médicos o exercício de uma

atividade que por sua própria natureza implica risco para os direitos de terceiro,

uma vez que a atividade médica, em si, não gera riscos aos direitos do

paciente, mas ao contrário visa afastar o risco à sua saúde.11

Importa destacar que na responsabilidade objetiva a culpa poderá

em algumas hipóteses ser presumida pela lei e em outras meramente ser

dispensada a sua prova, situação em que a culpa deixará de ser pressuposto

essencial da responsabilidade. No primeiro caso, inverte-se o ônus da prova,

cabendo à vítima provar apenas a conduta comissiva ou omissiva do agente, o

nexo causal e o dano para que a culpa se presuma. Caso o autor do dano não

comprove a existência de alguma excludente, será responsabilizado, pois sua

culpa é presumida por lei.

11 KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade civil do médico. 5ª edição revista e atualizada à luz do novo Código Civil – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 61.

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Na segunda hipótese, a culpa pode ou não estar presente, contudo

torna-se simplesmente prescindível a sua prova, sendo indispensável somente

a prova do nexo causal entre a conduta e o dano. Destarte, em ambas as

situações, incumbirá ao agente a prova da culpa exclusiva da vítima, ou da

ocorrência de caso fortuito ou força maior, a fim de isentar-se da

responsabilidade.12

2.3 - A responsabilidade civil do médico na cirurgia plástica

No que tange à responsabilidade civil do cirurgião plástico, faz-se

necessário primeiramente distinguir a cirurgia plástica corretiva (reparadora) da

cirurgia plástica estética. A primeira destina-se a corrigir defeito físico de

origem congênita ou adquirido em razão de algum acidente. A respeito do

tema Sérgio Cavalieiri Filho aponta que:

O médico, nesses casos, por mais competente que seja, nem sempre pode garantir, nem pretender, eliminar completamente o defeito. Sua obrigação, por conseguinte, continua sendo de meio. Tudo fará para melhorar a aparência física do paciente, minorar-lhe o defeito, sendo, às vezes, necessárias várias cirurgias sucessivas.13

Por outro lado, na cirurgia plástica estética a finalidade é melhorar a

aparência do paciente, corrigindo alguma imperfeição meramente estética,

situação em que o médico se compromete a alcançar o resultado almejado

pela pessoa. É por tal motivo que a doutrina majoritária entende a cirurgia

reparadora como obrigação de meio e a cirurgia estética como obrigação de

resultado.

Nesse sentido é a lição do saudoso mestre Caio Mário da Silva

Pereira:

(...) a cirurgia estética gera obrigação de resultado e não de meios. Com a cirurgia estética, o cliente tem em vista corrigir uma imperfeição ou melhorar a aparência. Ele não é um doente que procura tratamento e o médico não se engaja na sua cura. O profissional está empenhado em proporcionar-lhe

12 São exemplos de responsabilidade objetiva previstos no Código Civil os artigos 927, parágrafo único, 929, 930, 933, 936, 937, 938, 939 e 940. 13 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 5ª edição – São Paulo, 2004, p. 379-380.

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o resultado pretendido, e se não tem condições de consegui-lo, não deve efetuar a intervenção.14

O ilustre civilista Silvio Rodrigues corrobora este posicionamento:

Ordinariamente, a obrigação assumida pelo médico é uma obrigação de meio e não de resultado. Com efeito, quando o cliente toma os serviços profissionais de um médico, este apenas se obriga a tratar do doente com zelo, diligência e carinho adequados, utilizando os recursos de sua profissão e artes, não se obrigando, portanto, a curar o doente (...) já se tem proclamado que no campo da cirurgia plástica, ao contrário do que ocorre na cirurgia terapêutica, a obrigação assumida pelo cirurgião plástico é uma obrigação de resultado e não de meio. Tal concepção advém da posição do paciente numa e noutra hipótese. Enquanto naquele caso trata-se de pessoa doente que busca uma cura, no caso da cirurgia plástica o paciente é pessoa sadia que almeja remediar uma situação que lhe é desagradável, mas não doentia. Por conseguinte, o que o paciente busca é um fim em si mesmo, tal como uma nova conformação do nariz, a supressão de rugas, a remodelação de pernas, seios, queixo, etc. De modo que o paciente espera do cirurgião, não que ele se empenhe em conseguir o resultado, mas que obtenha o resultado em si.15

O eminente jurista Ruy Rosado de Aguiar sustenta, em sentido

contrário, que, embora muitos cirurgiões plásticos assegurem a obtenção de

um determinado resultado, tal fato não define a natureza da obrigação, se de

meio ou resultado, tampouco altera sua característica de obrigação de prestar

um serviço que apresenta um risco em sua execução. Nessa orientação,

afirma que:

(...) o acerto está, no entanto, com os que atribuem ao cirurgião estético uma obrigação de meios. Embora se diga que os cirurgiões plásticos prometam corrigir, sem o que ninguém se submeteria, são, a uma intervenção cirúrgica, pelo que assumiriam eles a obrigação de alcançar o resultado prometido, a verdade é que a álea está presente em toda intervenção cirúrgica, e imprevisíveis as reações de cada organismo à agressão do ato cirúrgico.16

14 PEREIRA, Caio Mário. Responsabilidade Civil, 3ª edição. Rio de Janeiro: Forense,1993, p. 168-169. 15 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: responsabilidade civil. 14ª edição, São Paulo: Saraiva, 1995, volume 4, p. 246. 16 AGUIAR JUNIOR, Ruy Rosado de. Responsabilidade Civil do Médico, RT 718/40, citado por GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, volume IV: responsabilidade civil – 4ª edição – São Paulo: Saraiva, 2009, p. 245. Igualmente defendendo a tese da obrigação de meio na cirurgia plástica estética, Carlos Alberto Menezes Direito no trabalho intitulado “A

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Contudo, o entendimento predominante na doutrina e jurisprudência

brasileiras é no sentido de se considerar a obrigação do médico na cirurgia

plástica estética como de meio. Nessa direção, confiram-se os seguintes

julgados:

CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. NULIDADE DOS ACÓRDÃOS PROFERIDOS EM SEDE DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NÃO CONFIGURADA. CIRURGIA PLÁSTICA ESTÉTICA. OBRIGAÇÃO DE RESULTADO. DANO COMPROVADO. PRESUNÇÃO DE CULPA DO MÉDICO NÃO AFASTADA. PRECEDENTES. 1. Não há falar em nulidade de acórdão exarado em sede de embargos de declaração que, nos estreitos limites em que proposta a controvérsia, assevera inexistente omissão do aresto embargado, acerca da especificação da modalidade culposa imputada ao demandado, porquanto assentado na tese de que presumida a culpa do cirurgião plástico em decorrência do insucesso de cirurgia plástica meramente estética. 2. A obrigação assumida pelo médico, normalmente, é obrigação de meios, posto que objeto do contrato estabelecido com o paciente não é a cura assegurada, mas sim o compromisso do profissional no sentido de um prestação de cuidados precisos e em consonância com a ciência médica na busca pela cura. 3. Apesar de abalizada doutrina em sentido contrário, este Superior Tribunal de Justiça tem entendido que a situação é distinta, todavia, quando o médico se compromete com o paciente a alcançar um determinado resultado, o que ocorre no caso da cirurgia plástica meramente estética. Nesta hipótese, segundo o entendimento nesta Corte Superior, o que se tem é uma obrigação de resultados e não de meios. 4. No caso das obrigações de meio, à vítima incumbe, mais do que demonstrar o dano, provar que este decorreu de culpa por parte do médico. Já nas obrigações de resultado, como a que serviu de origem à controvérsia, basta que a vítima demonstre, como fez, o dano (que o médico não alcançou o resultado prometido e contratado) para que a culpa se presuma, havendo, destarte, a inversão do ônus da prova. 5. Não se priva, assim, o médico da possibilidade de demonstrar, pelos meios de prova admissíveis, que o evento danoso tenha decorrido, por exemplo, de motivo de força maior, caso fortuito ou mesmo de culpa exclusiva da "vítima" (paciente). 6. Recurso especial a que se nega provimento. (REsp 236708/MG, Rel. Ministro CARLOS FERNANDO MATHIAS (JUIZ FEDERAL CONVOCADO DO TRF 1ª

Responsabilidade Civil em Cirurgia Plástica” (DIREITO, Carlos Alberto Menezes. Revista de Direito Renovar, Rio de Janeiro, nº 7, Jan./Abril 1997, p. 11-19).

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REGIÃO), QUARTA TURMA, julgado em 10/02/2009, DJe 18/05/2009) RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ERRO MÉDICO. ART. 14 DO CDC. CIRURGIA PLÁSTICA. OBRIGAÇÃO DE RESULTADO. CASO FORTUITO. EXCLUDENTE DE RESPONSABILIDADE. 1. Os procedimentos cirúrgicos de fins meramente estéticos caracterizam verdadeira obrigação de resultado, pois neles o cirurgião assume verdadeiro compromisso pelo efeito embelezador prometido. 2. Nas obrigações de resultado, a responsabilidade do profissional da medicina permanece subjetiva. Cumpre ao médico, contudo, demonstrar que os eventos danosos decorreram de fatores externos e alheios à sua atuação durante a cirurgia. 3. Apesar de não prevista expressamente no CDC, a eximente de caso fortuito possui força liberatória e exclui a responsabilidade do cirurgião plástico, pois rompe o nexo de causalidade entre o dano apontado pelo paciente e o serviço prestado pelo profissional. 4. Age com cautela e conforme os ditames da boa-fé objetiva o médico que colhe a assinatura do paciente em “termo de consentimento informado”, de maneira a alertá-lo acerca de eventuais problemas que possam surgir durante o pós-operatório. Recurso especial a que se nega provimento. (REsp 1180815/MG, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 19/08/2010, DJe 26/08/2010)

A consequência da adoção da tese da obrigação de resultado na

cirurgia plástica estética reside no fato de que ao paciente caberá provar

apenas que o médico não alcançou o resultado contratado, o que por si só

configura o dano e presume a culpa do profissional, restando invertido o ônus

da prova.

A respeito da questão, Miguel Kfouri Neto assevera:

A caracterização da responsabilidade, em cirurgias estéticas, também exige a análise do fator subjetivo de atribuição - a culpa. Ocorre, entretanto - como afirmamos linhas atrás - que o ônus da prova se inverte: incumbirá ao médico, para se eximir da responsabilidade, demonstrar claramente culpa exclusiva da vítima (se concorrente, proporcionalizar-se-á a indenização), caso fortuito ou qualquer outra causa que aniquile o nexo causal.17

17 KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade civil do médico. 5ª edição revista e atualizada à luz do novo Código Civil – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 171-172.

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O raciocínio corresponde à própria pretensão da cirurgia estética,

pois ao paciente interessa o resultado em si. Destarte, se a sua aparência fica

pior após a realização do procedimento cirúrgico, significa que não foi atingido

o resultado tão esperado e prometido, de modo que fará jus à reparação dos

danos causados pelo médico. Na lição de Teresa Ancona Lopes:

(...) na verdade, quando alguém, que está muito bem de saúde, procura um médico somente para melhorar algum aspecto seu, que considera desagradável, quer exatamente esse resultado, não apenas que aquele profissional desempenhe seu trabalho com diligência e conhecimento científico. Caso contrário, não adiantaria arriscar-se a gastar dinheiro por nada.18

Carlos Roberto Gonçalves19 e Sérgio Cavalieri Filho20 destacam

que, em algumas hipóteses excepcionais, apesar de utilizar adequadamente as

técnicas usualmente aplicadas àquele determinado tipo de procedimento

cirúrgico, o médico não consegue obter o resultado esperado em virtude de

alguma característica individual do paciente. Ainda assim permanecerá a

presunção de culpa do médico; contudo, caso o profissional em sua defesa

comprove que o insucesso da cirurgia foi causado por uma circunstância

peculiar impossível de ser identificada antes do procedimento, restará excluída

sua responsabilidade.

Cirurgia estética. Obrigação de meio. O profissional que se propõe a realizar cirurgia, visando a melhorar a aparência física do paciente, assume o compromisso de que, no mínimo, não lhe resultarão danos estéticos, cabendo ao cirurgião a avaliação dos riscos. Respondera por tais danos, salvo culpa do paciente ou a intervenção de fator imprevisível, o que lhe cabe provar. (AgRg no Ag 37.060/RS, Rel. Ministro Eduardo Ribeiro, Terceira Turma do STJ, julgado em 28/11/1994, DJ 06/02/1995, p. 1348)

18 MAGALHÃES, Teresa Ancona Lopes de. O dano estético. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1980, p. 62. 19 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, volume IV: responsabilidade civil – 4ª edição – São Paulo: Saraiva, 2009, p. 247. 20 CAVALIEIRI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 5ª edição – São Paulo, 2004, p. 380.

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2.4 - A responsabilidade civil de hospitais, clínicas e casas de

saúde

O Código de Defesa do Consumidor prevê, em seu artigo 14, caput,

a responsabilidade civil objetiva do fornecedor de serviços:

O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

Tendo em vista que os hospitais, clínicas e casas de saúde são

fornecedores de serviço, enquadram-se na regra acima prevista, respondendo

objetivamente pelos danos causados aos pacientes no exercício de suas

atividades. Tal responsabilidade baseia-se no defeito do serviço, que por sua

vez é conceituado pelo artigo 14, §§1º e 2º do Código de Defesa do

Consumidor:

Art. 14. (...) §1º O serviço é defeituoso quando não fornecer a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais: I - o modo de seu fornecimento; II - o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam; III – a época em que foi fornecido. §2º O serviço não é considerado defeituoso pela adoção de novas técnicas.

É certo que o serviço deve ser fornecido sem defeito; portanto,

ocorrendo tal defeito, não será necessário avaliar a existência de culpa da

instituição de saúde, uma vez que sua responsabilidade é objetiva. A respeito

da questão, Sérgio Cavalieri Filho acrescenta:

E mais, será absolutamente irrelevante saber se o fornecedor tinha ou não conhecimento do defeito, bem como se esse defeito era previsível ou evitável. Em face do fato do serviço, o defeito é presumido porque o Código diz – art. 14, §3º, I – que o fornecedor só excluirá a sua responsabilidade se provar – ônus seu – que o defeito inexiste, vale dizer, que o acidente não teve por causa um defeito do serviço.21

Desse modo, a responsabilidade civil objetiva de hospitais, casas de

saúde ou clínicas por ato próprio poderá decorrer somente de defeito do

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serviço por eles prestados, nos termos do artigo 14, caput, do Código de

Defesa do Consumidor. É o caso, por exemplo, de dano causado ao paciente

em razão de infecção hospitalar ou de contaminação por HIV ou hepatite.

Entretanto, se comprovar a existência de alguma excludente, na forma do §3º

do mesmo artigo, a instituição poderá eximir-se da culpa.

Abordando o tema da infecção hospitalar, Miguel Kfouri Neto ensina:

Nas demandas indenizatórias originadas de infecção hospitalar, as vítimas argumentam que se submeteram a cirurgias limpas, tendo o processo infeccioso se instalado após a internação. Aplica-se aos hospitais a responsabilidade objetiva, fulcrada no Código de Defesa do Consumidor, sistema que acarreta a inversão do ônus da prova. Nada impede, entretanto, que a vítima prove, ela mesma, a omissão, configuradora da negligência do hospital, da qual adveio a infecção.22

Seguindo essa mesma diretriz, já decidiu o Superior Tribunal de

Justiça:

RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. INFECÇÃO HOSPITALAR. SEQUELAS IRREVERSÍVEIS. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. CULPA CONTRATUAL. (...) 2. Em se tratando de infecção hospitalar, há responsabilidade contratual do hospital relativamente à incolumidade do paciente e "essa responsabilidade somente pode ser excluída quando a causa da moléstia possa ser atribuída a evento especifico e determinado" (REsp 116.372/MG, Rel. Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, QUARTA TURMA, DJ 2.2.1998). (...) 9. Recurso especial do réu conhecido, em parte, e nela não provido. Recurso especial do autor conhecido e parcialmente provido. (REsp 903.258/RS, Rel. Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, julgado em 21/06/2011, DJe 17/11/2011) AGRAVO REGIMENTAL - AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL - INDENIZAÇÃO - NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL - NÃO OCORRÊNCIA - INFECÇÃO HOSPITALAR - RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO HOSPITAL - ACÓRDÃO RECORRIDO EM HARMONIA COM O ENTENDIMENTO DESTA CORTE - RECURSO IMPROVIDO.

21 CAVALIEIRI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 5ª edição – São Paulo, 2004, p. 383. 22 KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade civil do médico. 5ª edição revista e atualizada à luz do novo Código Civil – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 142.

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(AgRg no AREsp 10.851/RJ, Rel. Ministro Massami Uyeda, Terceira Turma, julgado em 06/10/2011, DJe 17/10/2011) RESPONSABILIDADE CIVIL. CONSUMIDOR. INFECÇÃO HOSPITALAR. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO HOSPITAL. ART. 14 DO CDC. DANO MORAL. QUANTUM INDENIZATÓRIO. O hospital responde objetivamente pela infecção hospitalar, pois esta decorre do fato da internação e não da atividade médica em si. (...) Recurso especial não conhecido. (REsp 629.212/RJ, Rel. Ministro Cesar Asfor Rocha, Quarta Turma, julgado em 15/05/2007, DJ 17/09/2007, p. 285)

Por outro lado, no caso de erro médico provocado por profissional

nas dependências de hospital, clínica ou casa de saúde, caberá verificar em

primeiro lugar a natureza da relação jurídica existente entre aquele e a

instituição.

Quando o médico possuir vínculo empregatício com a instituição de

saúde, se for comprovada a culpa do primeiro, esta responderá objetivamente

pelos danos causados por aquele, nos termos do artigo 14, caput, do Código

de Defesa do Consumidor. Trata-se de responsabilidade solidária entre o

médico e o hospital, em que este responderá pelos prejuízos provocados pela

conduta culposa daquele.

Entretanto, quando se tratar de um médico sem vínculo

empregatício com a instituição de saúde, o qual apenas se utiliza da estrutura

desta para realizar suas atividades médicas e/ou cirúrgicas, somente o

profissional responderá pelos danos por ele próprio causados, restando

afastada qualquer responsabilidade do hospital, casa de saúde ou clínica.

A respeito da responsabilidade de médicos e hospitais, Ruy Rosado

de Aguiar Júnior, mencionando a obra de José de Aguiar Dias, leciona que:

(...) o hospital responde pelo dano produzido pelas coisas (instrumentos, aparelhos) utilizadas na prestação dos seus serviços: ‘ao dono da coisa incumbe, ocorrido o dano, suportar os encargos dele decorrentes, restituindo o ofendido ao statu quo ideal, por meio da reparação. Essa presunção não é irrefragável. Mas ao dono da coisa cabe provar que, no seu caso, ela não tem cabimento’ (Aguiar Dias, Da Responsabilidade Civil, Forense, n. 165). (...) Também responde pelos atos do seu pessoal, com presunção de culpa: ‘É presumida a culpa do patrão ou comitente pelo ato culposo do empregado ou preposto’ (Súmula 341, do STF). Isso, contudo, não dispensa que se

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prove a culpa do servidor, na prática do ato danoso. (...) pois é preciso provar a culpa deste, para somente depois se ter como presumida a culpa do hospital.23

Este entendimento prevalece na jurisprudência pátria, tendo sido

sedimentado pelo Superior Tribunal de Justiça:

DIREITO CIVIL. RESPONSABILIDADE DO HOSPITAL POR ERRO MÉDICO E POR DEFEITO NO SERVIÇO. (...) INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. TERMO INICIAL DE INCIDÊNCIA DA CORREÇÃO MONETÁRIA. DATA DA DECISÃO QUE FIXOU O VALOR DA INDENIZAÇÃO. 1. A responsabilidade das sociedades empresárias hospitalares por dano causado ao paciente-consumidor pode ser assim sintetizada: (i) as obrigações assumidas diretamente pelo complexo hospitalar limitam-se ao fornecimento de recursos materiais e humanos auxiliares adequados à prestação dos serviços médicos e à supervisão do paciente, hipótese em que a responsabilidade objetiva da instituição (por ato próprio) exsurge somente em decorrência de defeito no serviço prestado (art. 14, caput, do CDC); (ii) os atos técnicos praticados pelos médicos sem vínculo de emprego ou subordinação com o hospital são imputados ao profissional pessoalmente, eximindo-se a entidade hospitalar de qualquer responsabilidade (art. 14, § 4, do CDC), se não concorreu para a ocorrência do dano; (iii) quanto aos atos técnicos praticados de forma defeituosa pelos profissionais da saúde vinculados de alguma forma ao hospital, respondem solidariamente a instituição hospitalar e o profissional responsável, apurada a sua culpa profissional. Nesse caso, o hospital é responsabilizado indiretamente por ato de terceiro, cuja culpa deve ser comprovada pela vítima de modo a fazer emergir o dever de indenizar da instituição, de natureza absoluta (arts. 932 e 933 do CC), sendo cabível ao juiz, demonstrada a hipossuficiência do paciente, determinar a inversão do ônus da prova (art. 6º, VIII, do CDC). (...) 9. Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta parte, parcialmente provido, apenas para determinar a incidência da correção monetária a partir da fixação do valor da indenização. (...) (REsp 1145728/MG, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Rel. p/ Acórdão Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 28/06/2011, DJe 08/09/2011) CONSUMIDOR. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL. MÉDICO PARTICULAR. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA. HOSPITAL. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM.

23 AGUIAR JÚNIOR, Ruy Rosado de. Responsabilidade civil do médico, RT, 718/41 citado por GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, volume IV: responsabilidade civil – 4ª edição – São Paulo: Saraiva, 2009, p. 250.

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1. Os hospitais não respondem objetivamente pela prestação de serviços defeituosos realizados por profissionais que nele atuam sem vínculo de emprego ou subordinação. Precedentes. 2. Embora o art. 14, § 4º, do CDC afaste a responsabilidade objetiva dos médicos, não se exclui, uma vez comprovada a culpa desse profissional e configurada uma cadeia de fornecimento do serviço, a solidariedade do hospital imposta pelo caput do art. 14 do CDC. 3. A cadeia de fornecimento de serviços se caracteriza por reunir inúmeros contratos numa relação de interdependência, como na hipótese dos autos, em que concorreram, para a realização adequada do serviço, o hospital, fornecendo centro cirúrgico, equipe técnica, medicamentos, hotelaria; e o médico, realizando o procedimento técnico principal, ambos auferindo lucros com o procedimento. 4. Há o dever de o hospital responder qualitativamente pelos profissionais que escolhe para atuar nas instalações por ele oferecidas. 5. O reconhecimento da responsabilidade solidária do hospital não transforma a obrigação de meio do médico, em obrigação de resultado, pois a responsabilidade do hospital somente se configura quando comprovada a culpa do médico, conforme a teoria de responsabilidade subjetiva dos profissionais liberais abrigada pelo Código de Defesa do Consumidor. (...) 7. Recurso especial parcialmente provido. (REsp 1216424/MT, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 09/08/2011, DJe 19/08/2011) CIVIL E PROCESSUAL. RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ERRO MÉDICO. RESPONSABILIDADE DO HOSPITAL. I. Restando inequívoco o fato de que o médico a quem se imputa o erro profissional não possuía vínculo com o hospital onde realizado o procedimento cirúrgico, não se pode atribuir a este a legitimidade para responder à demanda indenizatória. (Precedente: 2ª Seção, REsp 908359/SC, Rel. p/ acórdão Min. João Otávio de Noronha, DJe 17/12/2008). II. Recurso especial não conhecido. (REsp 764.001/PR, Rel. Ministro Aldir Passarinho Junior, Quarta Turma, julgado em 04/02/2010, DJe 15/03/2010) RECURSO ESPECIAL: 1) RESPONSABILIDADE CIVIL - HOSPITAL - DANOS MATERIAIS E MORAIS - ERRO DE DIAGNÓSTICO DE SEU PLANTONISTA - OMISSÃO DE DILIGÊNCIA DO ATENDENTE - APLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR; 2) HOSPITAL - RESPONSABILIDADE - CULPA DE PLANTONISTA ATENDENTE, INTEGRANTE DO CORPO CLÍNICO - RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO HOSPITAL ANTE A CULPA DE SEU PROFISSIONAL; 3) MÉDICO - ERRO DE DIAGNÓSTICO EM PLANTÃO - CULPA SUBJETIVA - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA APLICÁVEL (...).

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1.- Serviços de atendimento médico-hospitalar em hospital de emergência são sujeitos ao Código de Defesa do Consumidor. 2.- A responsabilidade do hospital é objetiva quanto à atividade de seu profissional plantonista (CDC, art. 14), de modo que dispensada demonstração da culpa do hospital relativamente a atos lesivos decorrentes de culpa de médico integrante de seu corpo clínico no atendimento. 3.- A responsabilidade de médico atendente em hospital é subjetiva, necessitando de demonstração pelo lesado, mas aplicável a regra de inversão do ônus da prova (CDC. art. 6º, VIII).(...) 5.- Recurso Especial do hospital improvido. (REsp 696.284/RJ, Rel. Ministro Sidnei Beneti, Terceira Turma, julgado em 03/12/2009, DJe 18/12/2009)

Por fim, cabe acrescentar que também se submetem à regra da

responsabilidade objetiva, com fundamento no art. 14 do Código de Defesa do

Consumidor, os bancos de sangue, os centros de exames radiológicos e os

laboratórios de análises clínicas, como prestadores de serviço.24

24 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, volume IV: responsabilidade civil – 4ª edição – São Paulo: Saraiva, 2009, p. 249.

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CAPÍTULO III

AS HIPÓTESES DE CONFIGURAÇÃO DE ERRO

MÉDICO E OS DANOS DELE DECORRENTES

3.1 - A culpa stricto sensu

Conforme visto anteriormente, a responsabilidade civil do médico é

subjetiva, razão pela qual depende da existência de culpa stricto sensu, que se

divide em negligência, imperícia e imprudência, além do nexo causal entre a

conduta do agente e o dano. Importa, ainda, distinguir detalhadamente as

espécies de culpa em sentido estrito.

Em primeiro lugar, a negligência médica se constitui de uma

passividade, inação, indolência ou inércia, decorrente de uma conduta

omissiva. Miguel Kfouri Neto, citando a lição de Avecone, aponta que a

negligência é a atitude oposta à diligência, que por sua vez remete a agir com

cuidado e atenção, a fim de evitar distrações ou erros, acrescentando que a

negligência representa “uma omissão dos comportamentos recomendáveis,

derivados da comum experiência ou das exigências particulares da prática

médica”.25

A jurisprudência dos tribunais brasileiros registra inúmeros casos de

negligência médica, que variam desde pequenas distrações a erros grosseiros.

Podem-se citar como exemplos o esquecimento de um objeto dentro do corpo

do paciente; a ausência de esterilização do material cirúrgico; a negligência no

atendimento inicial do paciente com a consequente realização de um

diagnóstico equivocado; a falha na atuação do anestesista; a demora na

realização de procedimento de urgência, dentre outros, conforme se observa

dos julgados abaixo colacionados:

APELAÇÃO CÍVEL. INDENIZATÓRIA. HOSPITAL. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. VÍDEO-HISTEROSCOPIA DIAGNÓSTICA E CIRÚRGICA. ESQUECIMENTO DE GAZE NO CORPO DA PACIENTE. DANO MATERIAL COMPROVADO. DANO MORAL CONFIGURADO E

25 KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade civil do médico. 5ª edição revista e atualizada à luz do novo Código Civil – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 94.

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MODERADAMENTE ARBITRADO. (...) 2. O conjunto probatório produzido nos autos demonstra o defeito na prestação do serviço, tendo em conta a realização de vídeo-histeroscopia diagnóstica e cirúrgica e o esquecimento de gaze no interior do corpo da autora, constituindo circunstância que positiva a existência de negligência. 3. O laudo médico, o prontuário referente ao procedimento e o depoimento das testemunhas corroboram a narrativa autoral, não se desincumbindo o hospital réu de demonstrar a inexistência de falha na prestação do serviço, ônus que lhe cabia, resultando na obrigação de indenizar os danos causados. (...) 8. Desprovimento do recurso. (TJRJ, Apelação nº 0009833-88.2006.8.19.0014, Des. Elton Leme - julgamento: 14/09/2011 - Décima Sétima Câmara Cível) RESPONSABILIDADE CIVIL. ERRO MÉDICO. CIRURGIA DE CATARATA. PERDA DE VISÃO. INFECÇÃO HOSPITALAR. RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO. OCORRÊNCIA. Seguindo a teoria da responsabilidade subjetiva, para que reste configurada a responsabilidade do médico, necessária se faz a prova do agir culposo, que, no caso, ficou demonstrada em razão de sua negligência, consistente na falta de cuidados para evitar as infecções, pois realizava cirurgias sem exigir a esterilização e a troca dos materiais (principalmente em relação às canetas e ponteiras utilizadas para a cirurgia de catarata). Responsabilidade civil do nosocômio. (...) Apelações Parcialmente Providas. (TJRS, Apelação Cível nº 70040763583, Décima Câmara Cível, Relator: Túlio de Oliveira Martins, Julgado em 27/10/2011) APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ERRO DE DIAGNÓSTICO. SERVIÇO HOSPITALAR DE EMERGÊNCIA. PACIENTE COM ACIDENTE VASCULAR CEREBRAL HEMORRÁGICO. MORTE. FATO DO SERVIÇO. (...) A responsabilidade do estabelecimento hospitalar, mesmo sendo objetiva, é vinculada à comprovação da culpa do médico, sob pena de não haver erro médico indenizável. Evidência de que o profissional que atendeu a paciente, tendo em vista os sintomas apresentados, não procedeu à investigação clínica que pudesse afastar a hipótese de acidente vascular cerebral hemorrágico, porquanto característicos desta enfermidade, de acordo com a ciência médica. Ao tratar a paciente para a suspeita de sinusopatia, perdeu-se a chance de um prematuro diagnóstico acerca da verdadeira patologia que acometia a paciente que, posteriormente, veio a falecer. (...) Negligência caracterizadora do erro médico, enquadrando-se a situação fática na perda de uma chance. (...) Apelo provido. (TJRS, Apelação Cível Nº 70042894287, Nona Câmara Cível, Relator: Leonel Pires Ohlweiler, Julgado em 19/10/2011)

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RESPONSABILIDADE CIVIL. HOSPITAL. ERRO MÉDICO. ATENDIMENTO PELO SUS. PROBLEMAS NO PARTO. MORTE DO NASCITURO. RETARDO DE CESÁREA. (...) 2. A responsabilidade do estabelecimento médico-hospitalar, mesmo sendo objetiva, é vinculada à comprovação da culpa do médico ou demais prepostos da instituição de saúde. Incidência do art. 14 e § 4º do CDC, combinado com o disposto no art. 932, inciso III, do CCB/02. 3. Trata-se de pretensão indenizatória cujo suporte fático baseia-se em suposto erro médico. O conjunto probatório, prova oral e pericial, evidencia a negligência do corpo clínico do hospital demandado quando prestou atendimento à autora. A cronologia dos atendimentos e as particularidades da parturiente demonstram que seus sintomas, dores e queixas não foram devidamente considerados, e que houve a demora excessiva na realização do parto por cesariana. Como conseqüência desses atos, deu-se a perda do nascituro. Desavenças internas entre médicos plantonistas que culminaram em conseqüências desastrosas, restando feridos preceitos de ética, e de cuidado, delegados à enfermagem atos de supervisão médica exclusiva. (...) Apelos parcialmente providos. (TJRS, Apelação Cível Nº 70044759892, Nona Câmara Cível, Relator: Marilene Bonzanini Bernardi, Julgado em 07/12/2011)

Por sua vez, a imprudência médica decorre de um comportamento

comissivo praticado com falta de cuidado, ou seja, quando o profissional age

sem as cautelas exigidas em determinada situação. Nesse sentido, cabe citar

como exemplos de imprudência reconhecidos pela jurisprudência:

Apelação cível. Ação indenizatória. Atendimento médico em hospital do município. Gestação no quinto mês. Quadro de sangramento e perda de líquido amniótico. Atendimento médico com liberação no mesmo dia mediante receita médica. Parecer do conselheiro do Cremerj afirmando que diante do quadro apresentado seria recomendada a internação da paciente, visto que uma hemorragia e infecção seriam desdobramentos possíveis e com a internação haveria uma diminuição do risco de infecção generalizada. Imprudência do agente público ao liberar a paciente com receita. Posterior morte fetal. (...) Ausência de rompimento do nexo de causalidade. Dever de indenizar. (...) Sentença mantida, inclusive em reexame necessário. Desprovimento do recurso. (TJRJ, Apelação nº 0003593-27.2004.8.19.0023, Des. Paulo Sergio Prestes, Julgamento: 01/03/2011 - Décima Nona Câmara Cível) APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS MÉDICOS E AMBULATORIAIS. Filha menor dos autores-apelados que recebeu diagnóstico equivocado de pneumonia, levando os pais a retornar por duas vezes às

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dependências do réu-apelante, tendo os seus prepostos diagnosticado derrame pleural e recomendado buscar o atendimento em hospital público, onde foi constatado o agravamento de meningite sem tempo hábil de salvar a criança, que faleceu em 19/09/94. Invocação de imprudência e erro médico. (...) Processo administrativo instaurado junto ao CRM que é suficiente para constatar a imprudência e a negligência dos prepostos do réu-apelante, além de relatar que o réu não disponibilizou os exames indispensáveis ao correto diagnóstico da doença que vitimou a filha dos autores. Desnecessidade de perícia. Cerceamento de defesa não caracterizado. Diagnóstico equivocado constatado pelo Colegiado do Conselho Regional de Medicina. Responsabilidade do apelante que decorre da culpa de seus prepostos. (...) Óbito da filha dos autores que lhes impôs intensa dor e sofrimento. Danos morais caracterizados. (TJRJ, Apelação nº 0029455-90.2005.8.19.0014, Des. Gilberto Dutra Moreira - Julgamento: 13/04/2011 - Décima Câmara Cível)

Por fim, a responsabilidade civil do médico pode decorrer de

imperícia, a qual segundo Miguel Kfouri Neto define-se como a falta de

conhecimentos técnicos de um determinado ofício, a incapacidade ou

inabilidade para o exercício de uma atividade específica, a inobservância de

normas regulamentares da profissão.26

Ainda que a medicina seja uma profissão a qual pressupõe o

conhecimento técnico, uma vez que ao se graduar o profissional encontra-se

habilitado para o seu exercício, é certo que um médico pode vir a atuar de

forma imperita, ou por não possuir a especialização médica exigida para uma

determinada área - por exemplo, cardiologia, ginecologia, obstetrícia, anestesia

etc. -, ou por simplesmente deixar de observar as normas e técnicas exigidas

pela ciência médica diante de um determinado quadro de saúde do paciente.

Nessa direção, os seguintes precedentes:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA. MÉDICO-ANESTESISTA. (...) CIRURGIA DE CORREÇÃO DE ESTRABISMO. SEQUELAS NEUROLÓGICAS ATRIBUÍDAS A ERRO ANESTÉSICO. CULPA COMPROVADA. NEXO DE CAUSALIDADE DEMONSTRADO. (...) DANOS MATERIAIS. (...) 4. A responsabilidade civil dos médicos anestesistas é subjetiva, com culpa presumida, cabendo a estes afastá-la, o que não restou evidenciado na hipótese. 5. Laudo pericial

26 KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade civil do médico. 5ª edição revista e atualizada à luz do novo Código Civil – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 97.

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conclusivo no sentido de ter sido a filha dos autores vítima de acidente anestésico pela administração de mistura gasosa inadequada durante cirurgia para correção de estrabismo bilateral, vindo a sofrer sequelas neurológicas irreversíveis pela prolongada falta de oxigenação na fase final da cirurgia. 6. Conjunto probatório firme comprovando que a médica-anestesista preceptora ausentou-se indevidamente da sala de cirurgia durante o procedimento cirúrgico, sem a adequada substituição por outro profissional, ali deixando apenas o médico residente, reconhecidamente sem experiência e habilitação para conduzir sozinho o ato, vindo este a concordar com tal situação e, portanto, assumindo o risco e a responsabilidade pelo evento, caracterizando a conduta de ambos como negligência. (...) 10. Provimento parcial do primeiro recurso e desprovimento dos segundo e terceiro recursos. (TJRJ, Apelação nº 0145634-88.2001.8.19.0001, Des. Elton Leme - Julgamento: 16/11/2011 - Décima Sétima Câmara Cível) Apelação cível. Ação indenizatória por danos material e moral. Demandante portador de hérnia epigástrica. Alegação de ocorrência de imperícia médica em procedimento cirúrgico. Sentença de improcedência. Realização de hernioplastia umbilical quando deveria haver sido realizada cirurgia para retirada de hérnia epigástrica. Laudo médico pericial que esclarece que a referida moléstia poderia ter sido diagnosticada quando do pré-operatório e que poderia ter sido corrigida na mesma oportunidade do procedimento efetivamente realizado. Dano material não comprovado. Dano moral configurado. Sentença parcialmente reformada. Recurso a que se dá parcial provimento. (TJRJ, Apelação nº 0007874-23.2008.8.19.0011, Dês. Wagner Cinelli – Julgamento: 23/11/2011 - Sexta Câmara Cível)

3.2 - O consentimento informado

Associado aos deveres da profissão, bem como ao dever de cautela

em suas atividades, cabe também ao médico e aos hospitais, casas de saúde

e clínicas, o dever de informar, previsto no art. 6º do Código de Defesa do

Consumidor, segundo o qual o fornecedor deve prestar ao consumidor todas

as informações relativas ao produto e/ou serviço, regra esta confirmada pelo

art. 31 do mesmo diploma:

Art. 31. A oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os

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riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores.

Insere-se, ainda, nos deveres de informação, a obrigatoriedade de o

médico orientar o paciente e seus familiares sobre o tratamento ou cirurgia

adequada à enfermidade, os seus riscos, os medicamentos necessários e seus

possíveis efeitos colaterais, bem como de obter deste a autorização para

submetê-lo aos procedimentos médicos. Trata-se do consentimento informado,

cuja necessidade advém de um direito da personalidade, previsto no art. 15 do

Código Civil, consoante o qual “Ninguém pode ser constrangido a submeter-se,

com risco de vida, a tratamento de saúde ou a intervenção cirúrgica”.

A norma comporta uma obrigação do profissional da medicina no

sentido de não agir sem o prévio consentimento do paciente, cuja autorização

precisa ser precedida de todas as informações indispensáveis sobre o seu

quadro de saúde e sobre o tratamento, a fim de que esta seja conferida com

plena ciência dos riscos inerentes ao caso concreto.

Miguel Kfouri Neto conceitua consentimento para o ato médico

como o comportamento através do qual se autoriza ao médico uma atuação na

esfera físico-psíquica do paciente, com a finalidade de melhoria de seu estado

de saúde. Acrescenta, ainda, que na ocorrência de um dano por atuação

culposa do médico, será prescindível avaliar a presença ou clareza do

consentimento informado. Contudo, quando o procedimento do médico for

perfeito, mas dele decorrer uma sequela cuja possibilidade não era do

conhecimento do paciente, pela ausência do consentimento informado, poderá

o médico ser responsabilizado civilmente em razão da ausência ou deficiência

da informação, ainda que tenha agido sem culpa no tocante ao ato médico em

si.27

Sérgio Cavalieri Filho, apontando a valiosa lição de Ruy Rosado de

Aguiar Junior sobre a responsabilidade civil dos médicos, sintetiza:

Além dos deveres de cuidado e sigilo, deve ainda o médico prestar ao paciente todas as informações necessárias sobre a terapêutica ou cirurgia indicada para o caso, seus riscos e possíveis resultados, dele obtendo o indispensável consentimento (ou do responsável). Toda vez que houver

27 KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade civil do médico. 5ª edição revista e atualizada à luz do novo Código Civil – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 36.

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algum risco a correr, é preciso contar com o consentimento esclarecido do paciente, só dispensável em situação emergencial que não possa ser superada, ou de atuação compulsória. Cabe unicamente ao paciente decidir sobre a sua saúde, avaliar o risco a que estará submetido com o tratamento ou a cirurgia, e aceitar ou não a solução preconizada pelo médico (Ruy Rosado de Aguiar Jr., ob. cit., p. 36).28

O Código de Ética Médica (Resolução nº 1931/2009 do Conselho

Federal de Medicina) cuida da questão em seu Capítulo V, em especial nos

artigos 31 e 34:

É vedado ao médico: Art. 31. Desrespeitar o direito do paciente ou de seu representante legal de decidir livremente sobre a execução de práticas diagnósticas ou terapêuticas, salvo em caso de iminente risco de morte. (...) Art. 34. Deixar de informar ao paciente o diagnóstico, o prognóstico, os riscos e os objetivos do tratamento, salvo quando a comunicação direta possa lhe provocar dano, devendo, nesse caso, fazer a comunicação a seu representante legal.29

Pode-se afirmar, portanto, que o consentimento informado constitui

um pré-requisito de qualquer tratamento ou cirurgia, de forma que o médico

será responsabilizado por danos causados ao paciente se realizá-lo sem o seu

devido consentimento, sendo imprescindível, entretanto, a prova do nexo

causal entre a ausência da informação e o dano, ou seja, a vítima deverá

comprovar que o prejuízo decorreu de um risco acerca do qual não havia sido

informada, o que prejudicou sua análise acerca da autorização do

procedimento médico.

A respeito da questão, Carlos Roberto Gonçalves defende que:

Na impossibilidade de o doente manifestar sua vontade, deve-se obter a autorização escrita, para o tratamento médico ou a intervenção cirúrgica de risco, de qualquer parente maior, da linha reta ou na colateral até o 2º grau, ou do cônjuge, por analogia com o disposto no art. 4º da Lei n. 9.434/97, que

28 CAVALIEIRI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 5ª edição – São Paulo, 2004, p. 378-379. 29 Código de Ética Médica - Resolução nº 1931/2009, do Conselho Federal de Medicina (fonte: http://portal.cfm.org.br/, acessado em 23 de janeiro de 2012).

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cuida da retirada de tecidos, órgãos e partes do corpo de pessoa falecida.30

Todavia, caso se trate de uma situação de urgência médica em que

não haja tempo suficiente para obter a autorização do paciente ou de seus

familiares, o médico estará não só autorizado como obrigado a realizar todos

os procedimentos necessários para salvar a vida daquele, afastando-se

qualquer responsabilidade pela ausência do consentimento informado, exceto

se atuar fora dos padrões técnicos da ciência médica, com negligência,

imprudência ou imperícia.

A jurisprudência pátria tem seguido esta orientação, consoante se

depreende dos julgados abaixo colacionados:

RESPONSABILIDADE CIVIL. HOSPITAL. SANTA CASA. CONSENTIMENTO INFORMADO. A Santa Casa, apesar de ser instituição sem fins lucrativos, responde solidariamente pelo erro do seu médico, que deixa de cumprir com a obrigação de obter consentimento informado a respeito de cirurgia de risco, da qual resultou a perda da visão da paciente. Recurso não conhecido. (REsp 467.878/RJ, Rel. Ministro Ruy Rosado de Aguiar, Quarta Turma, julgado em 05/12/2002, DJ 10/02/2003, p. 222) RESPONSABILIDADE CIVIL. MÉDICO. CONSENTIMENTO INFORMADO. A despreocupação do facultativo em obter do paciente seu consentimento informado pode significar - nos casos mais graves - negligência no exercício profissional. As exigências do princípio do consentimento informado devem ser atendidas com maior zelo na medida em que aumenta o risco, ou o dano. Recurso conhecido. (REsp 436.827/SP, Rel. Ministro Ruy Rosado de Aguiar, Quarta Turma, julgado em 01/10/2002, DJ 18/11/2002, p. 228) CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. DEMANDA VISANDO REPARAÇÃO POR DANOS MORAL E ESTÉTICO. CIRURGIA PARA CORREÇÃO DE CATARATA. PERDA DA VISÃO E ATROFIA DO OLHO DIREITO. (...) É direito básico do consumidor a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem (art. 6º, III, CODECON)."A falta de informação pode levar o médico ou hospital a ter que responder pelo risco inerente, não por ter havido defeito do serviço, mas pela ausência de informação devida, pela

30 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, volume IV: responsabilidade civil – 4ª edição – São Paulo: Saraiva, 2009, p. 242-243.

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omissão em informar ao paciente os riscos reais do tratamento". (Sérgio Cavalieri Filho, Programa de Responsabilidade Civil) (...) Recurso ao qual se nega provimento. (TJRJ, Apelação nº 0007556-44.2007.8.19.0021, Des. Lindolpho Morais Marinho - Julgamento: 05/07/2011 - Décima Sexta Câmara Cível). APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. ERRO MÉDICO E HOSPITALAR. VIDEOLAPAROSCOPIA. PERFURAÇÃO DE ALÇA INTESTINAL. PERITONITE. (...) Ausência de consentimento informado. Dever de informar inerente à realização de procedimentos médicos de risco. Conquanto a perfuração de alça intestinal se insira nos riscos do procedimento a que foi submetida a autora, o que não tipificaria imperícia, houve falha na não cientificação prévia. Conduta agravada pela negligência na seqüência do procedimento, em face da sintomatologia apresentada pela autora, a quem foi dada alta precoce, propiciando o agravamento do quadro e instalação de peritonite. Responsabilidade do cirurgião e do Hospital. (...) Apelação da autora provida, da primeira ré desprovida, e provida em parte a do réu. (TJRS, Apelação Cível Nº 70018207043, Nona Câmara Cível, Relator: Marilene Bonzanini Bernardi, Julgado em 13/06/2007) APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. CIRURGIA DE VASECTOMIA. (...) Não estando comprovada nos autos a culpa do réu inviável a sua responsabilização pela gravidez não planejada da autora, mormente por que, segundo o laudo pericial e de acordo com a doutrina médica, a cirurgia de vasectomia é falível, tanto que é obrigação do médico informar ao paciente quanto à indispensável realização do espermograma para confirmação do resultado, dever, no caso, comprovadamente observado pelo réu. Termo de consentimento firmado pelos autores, no qual declaram estarem cientes dos riscos e implicações inerentes ao procedimento. Prova de que o autor não seguiu as orientações médicas, no pós-operatório, deixando de realizar o imprescindível exame de espermograma. (...) Apelação improvida. (TJRS, Apelação Cível Nº 70020459772, Décima Câmara Cível, Relator: Paulo Roberto Lessa Franz, Julgado em 24/04/2008)

3.3 - As espécies de dano decorrentes de erro médico

Conforme visto anteriormente, o dano decorrente do erro médico

pode ser de origem material, moral ou estético, sendo admitida sua cumulação.

A respeito da questão, cabe uma análise pormenorizada de cada uma destas

espécies.

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Em primeiro lugar, o dano material constitui as perdas e danos

devidas ao credor, que por sua vez “abrangem, além do que ele efetivamente

perdeu, o que razoavelmente deixou de ganhar”, conforme a regra prevista no

art. 402 do Código Civil. É o que a doutrina denomina de dano emergente e

lucro cessante.

O primeiro consiste no prejuízo efetivamente causado à vítima, isto

é, o valor correspondente à diminuição de seu patrimônio. No caso do erro

médico, por exemplo, o que o paciente gastou para efetuar uma cirurgia mal

sucedida por culpa do médico, incluindo despesas com medicamentos.

Por seu turno, o segundo é a perda de um ganho normalmente

esperado. No exemplo citado, se a mesma vítima do erro médico fosse um

profissional autônomo que ficou impedido de exercer suas atividades laborais

por três meses, quando o período normal de recuperação daquele tipo de

procedimento cirúrgico seria de quinze dias, este poderia pleitear os lucros

cessantes relativos ao que em média lucra por dia de trabalho efetivo.

Pode ser acrescida, ainda, à reparação civil, na hipótese de lesão da

qual resulte a inabilitação para o exercício de ofício ou profissão, ou a

diminuição da capacidade para o trabalho da vítima, uma pensão de valor

equivalente à importância do trabalho para o qual restou incapacitada ou da

depreciação que este sofreu, na forma do art. 950 do Código Civil.

Ademais, no caso de erro médico do qual resulte a morte da vítima,

são devidas também as despesas com o funeral, bem como os alimentos a

quem o paciente tinha o dever de prestá-los (art. 948 do Código Civil), de

acordo com o caso concreto.

Igualmente apresenta-se comum a incidência do dano moral

decorrente de erro médico, o qual pode ser conceituado como a lesão a um

direito da personalidade, diferente do dano material que representa a lesão ao

patrimônio da vítima. A respeito do tema, Carlos Roberto Gonçalves esclarece:

O dano moral não é propriamente a dor, a angústia, o desgosto, a aflição espiritual, a humilhação, o complexo que sofre a vítima do evento danoso, pois esses estados de espírito constituem o conteúdo, ou melhor, a consequência do dano. A dor que experimentam os pais pela morte violenta do filho, o padecimento ou complexo de quem suporta um dano estético, a humilhação de quem foi publicamente injuriado são estados

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de espírito contingentes e variáveis em cada caso, pois cada pessoa sente a seu modo.31

Por último, da atuação culposa do médico pode advir também o

dano estético, o qual se configura pela lesão à beleza física, à aparência de

uma pessoa. Maria Helena Diniz conceitua com precisão o instituto:

O dano estético é toda alteração morfológica do indivíduo, que, além do aleijão, abrange as deformidades ou deformações, marcas e defeitos, ainda que mínimos, e que impliquem sob qualquer aspecto um afeiamento da vítima, consistindo numa simples lesão desgostante ou num permanente motivo de exposição ao ridículo ou de complexo de inferioridade, exercendo ou não influência sobre sua capacidade laborativa. P. ex.: mutilações (ausência de membros - orelhas, nariz, braços ou pernas etc.); cicatrizes, mesmo acobertáveis pela barba ou cabeleira ou pela maquilagem; perda de cabelos, das sobrancelhas, dos cílios, dos dentes, da voz, dos olhos (RJTJSP, 39:75); feridas nauseabundas ou repulsivas etc., em conseqüência do evento lesivo.32

Teresa Ancona Lopez de Magalhães acrescenta que, tendo em vista

ser o conceito de beleza relativo, ao se apreciar o dano estético deve-se levar

em conta a modificação sofrida pela vítima em comparação ao que era antes

do evento danoso.33

Atualmente se encontra consolidada no Superior Tribunal de Justiça

a tese da possibilidade de cumulação das indenizações de danos moral e

estético, a qual foi confirmada com a aprovação da Súmula 387, nestes

termos: “É lícita a cumulação das indenizações de dano estético e dano moral”.

Nessa direção, cabe destacar importantes precedentes do Superior Tribunal de

Justiça:

DIREITO CIVIL. DANOS MATERIAL, MORAL E ESTÉTICO. (...) - É possível a cumulação de dano estético e dano moral. Precedentes. (...) - Na esteira de precedente da 3ª Turma do STJ, a dor decorrente da perda de um ente querido diferencia-se da dor sofrida pela própria vitima de um acidente grave. Não é desarrazoado dizer que uma pessoa que carrega seqüelas graves, pelo resto de sua vida, como é o caso da perda de um

31 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, volume IV: responsabilidade civil – 4ª edição – São Paulo: Saraiva, 2009, p. 359. 32 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. 10. edição - São Paulo: Saraiva, 1995, v. 7. p. 61-63. 33 MAGALHÃES, Teresa Ancona Lopez de. O dano estético. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1980, p. 17.

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braço e da genitália, para um jovem de 19 anos, sofre abalo maior que a pessoa que perde um ente querido. Os precedentes do STJ que limitam a indenização por dano moral nas hipóteses de morte não justificam a limitação de indenizações para reparar eventos tão graves como os que estão discutidos neste processo. - Não é exagerada a indenização de R$ 400.000,00 para reparação do dano estético, mais R$ 800.000,00 para reparação do dano moral, na hipótese em que a vitima, com apenas 19 anos de idade, sofre queimaduras de terceiro grau em 30% de seu corpo, mais a amputação do braço direito e da genitália, em acidente que poderia ser perfeitamente evitável caso qualquer um dos três réus tivesse agido de maneira prudente. Recursos especiais não conhecidos. (REsp 1011437/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 24/06/2008, DJe 05/08/2008) INDENIZAÇÃO. "DANOS ESTÉTICOS" OU "DANOS FÍSICOS". INDENIZABILIDADE EM SEPARADO. 1. A jurisprudência da 3ª Turma admite sejam indenizados, separadamente, os danos morais e os danos estéticos oriundos do mesmo fato. Ressalva do entendimento do relator. 2. As seqüelas físicas decorrentes do ato ilícito, mesmo que não sejam visíveis de ordinário e, por isso, não causem repercussão negativa na aparência da vítima, certamente provocam intenso sofrimento. Desta forma, as lesões não precisam estar expostas a terceiros para que sejam indenizáveis, pois o que se considera para os danos estéticos é a degradação da integridade física da vítima, decorrente do ato ilícito. (...) 4. Provido o recurso especial da parte que pretendia majoração dos danos morais, fica prejudicado o recurso especial da parte que pretendia a redução da indenização. (...) (REsp 899869/MG, Rel. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, TERCEIRA TURMA, julgado em 13/02/2007, DJ 26/03/2007, p. 242) RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DE TRÂNSITO. LESÃO FÍSICA. FRATURA EXPOSTA. DANOS MORAL E ESTÉTICO. CUMULABILIDADE. POSSIBILIDADE. ORIGENS DISTINTAS. PRECEDENTES. RESTABELECIMENTO DO ACÓRDÃO DA APELAÇÃO. RECURSO PROVIDO. - Nos termos em que veio a orientar-se a jurisprudência das Turmas que integram a Seção de Direito Privado deste Tribunal, as indenizações pelos danos moral e estético podem ser cumuladas, mesmo quando derivadas do mesmo fato, se inconfundíveis suas causas e passíveis de apuração em separado. (REsp 289885/RJ, Rel. Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, QUARTA TURMA, julgado em 15/02/2001, DJ 02/04/2001, p. 303)

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CONCLUSÃO

No primeiro capítulo, foi estudado o conceito de responsabilidade

civil, partindo do pressuposto de que toda conduta que viole dever jurídico

anterior, causando dano a terceiro, gera ao agente o dever de repará-lo.

Destacaram-se também os elementos configuradores da responsabilidade civil

- a conduta comissiva ou omissiva, a culpa, o nexo causal e o dano - com a

análise da importância de cada um deles.

No segundo capítulo, aprofundou-se o estudo do erro médico, por

meio do exame da natureza jurídica da relação entre médicos e pacientes,

observando-se que, por se tratar de uma relação contratual, a obrigação

médica constitui uma obrigação de meio.

Em razão disso, foi constatado que o médico não se obriga a curar o

doente, mas a empregar todos os meios e recursos necessários e disponíveis

para atingir este fim, não se cogitando de responsabilidade por inexecução da

obrigação se o profissional não consegue eliminar a enfermidade. Desse

modo, o trabalho apontou que a responsabilidade civil do médico é subjetiva,

sendo imprescindível a comprovação de culpa, seja na modalidade de

negligência, imprudência ou imperícia, acrescida do nexo causal entre a

conduta do agente e o dano.

Posteriormente, foi analisada a responsabilidade do cirurgião

plástico, distinguindo-se a cirurgia reparadora, em que a obrigação do médico

continua sendo de meio, da cirurgia meramente estética, na qual o médico se

compromete a atingir determinado objetivo, sendo hipótese de obrigação de

resultado. Diante disso, concluiu-se que na cirurgia plástica estética, se o

paciente comprova que o médico não obteve o resultado contratado, resta

presumida a culpa do profissional, salvo se este demonstrar a existência de

alguma excludente de responsabilidade.

Ainda no segundo capítulo, destacou-se a responsabilidade objetiva

dos hospitais, clínicas e casas de saúde por danos causados por defeito no

serviço, por serem considerados fornecedores. Por outro lado, na hipótese de

erro médico causado por profissional nas dependências da instituição de

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saúde, foi apontada a necessidade de verificação da existência de vínculo de

emprego entre eles. Se este estiver presente, sendo comprovada a culpa do

médico, a instituição responde objetivamente pelos danos causados por

aquele, sendo esta responsabilidade solidária. Contudo, não havendo tal

vínculo, apenas o profissional deve arcar com a reparação civil dos prejuízos

causados à vítima, sendo excluída a responsabilidade do hospital, clínica ou

casa de saúde.

No terceiro capítulo, foi abordado o requisito da culpa stricto sensu

no intuito de distinguir detalhadamente as suas espécies, quais sejam

negligência, imprudência e imperícia, com a análise de interessantes

precedentes da jurisprudência brasileira sobre o tema, citando-se casos de

erro médico já julgados no país.

Também no terceiro capítulo foi apontada a questão da necessidade

do consentimento informado, consubstanciado na obrigação dos médicos de

orientar o paciente e seus familiares a respeito do tratamento ou da cirurgia

indicada ao caso, de seus riscos, e demais informações indispensáveis, bem

como de obter deste a autorização para submetê-lo aos respectivos

procedimentos.

Por fim, retrataram-se as espécies de dano que podem decorrer do

erro médico - material, moral e estético -, com o relato do entendimento

predominante na jurisprudência pátria no sentido da possibilidade de sua

cumulação.

Diante do quadro analisado, restou confirmada a premissa da qual

partiu o presente estudo, no sentido de que a responsabilidade civil dos

médicos por erro profissional é, em regra, subjetiva e, portanto, depende da

comprovação da conduta culposa do agente. Espera-se que esta monografia

tenha contribuído para o estudo da matéria, bem como para a aplicação da lei

nos casos concretos, de forma a tornar mais eficaz a reparação civil de danos

causados por erro médico.

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BIBLIOGRAFIA

CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil, 5ª edição, São Paulo: Malheiros, 2004. DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade Civil. 10ª edição, Rio de Janeiro: Forense, 2007.

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. 10ª edição, São Paulo: Saraiva, 1995. GAGLIANO, Pablo STOLZE e PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil, volume III: Responsabilidade Civil, 7ª edição, São Paulo: Saraiva, 2009. GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, volume IV: responsabilidade civil. 4ª edição, São Paulo: Saraiva, 2009. KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade civil do médico. 5ª edição revista e atualizada à luz do novo Código Civil, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. ___________________. Culpa médica e ônus da prova. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. MAGALHÃES, Teresa Ancona Lopes de. O dano estético. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1980. MARQUES, Claudia Lima. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. 3ª edição, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010. PEREIRA, Caio Mário. Responsabilidade Civil. 3ª edição. Rio de Janeiro: Forense,1993. RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: responsabilidade civil. Volume 4. 14ª edição, São Paulo: Saraiva, 1995. SEBASTIÃO, Jurandir. Responsabilidade Médica Civil, Criminal e Ética, 2ª edição, Belo Horizonte: Del Rey, 2000. VENOSA, SILVIO. Direito Civil: responsabilidade civil. 3ª edição, São Paulo: Atlas, 2003.

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ÍNDICE

FOLHA DE ROSTO 2

AGRADECIMENTO 3

DEDICATÓRIA 4

RESUMO 5

METODOLOGIA 6

SUMÁRIO 7

INTRODUÇÃO 8

CAPÍTULO I

A RESPONSABILIDADE CIVIL NO DIREITO BRASILEIRO 10

1.1 – Conceito 10

1.2 – Os pressupostos da responsabilidade civil 11

1.2.1 - Ação ou omissão 11

1.2.2 - Culpa 12

1.2.3 – Nexo Causal 13

1.2.4 - Dano 14

CAPÍTULO II

O ERRO MÉDICO E A NATUREZA JURÍDICA DA RELAÇÃO ENTRE

MÉDICOS E PACIENTES 15

2.1 – A natureza jurídica da relação entre médicos e pacientes 15

2.2 – O As espécies de responsabilidade civil aplicadas ao erro médico 18

2.3 – A responsabilidade civil do médico na cirurgia plástica 19

2.4 – A responsabilidade civil de hospitais, clínicas e casas de saúde 24

CAPÍTULO III

AS HIPÓTESES DE CONFIGURAÇÃO DE ERRO MÉDICO E OS DANOS

DELE DECORRENTES 30

3.1 – A culpa stricto sensu 30

3.2 – O consentimento informado 34

3.3 – As espécies de dano decorrentes de erro médico 38

CONCLUSÃO 42

BIBLIOGRAFIA 44

ÍNDICE 45