Upload
vuthien
View
217
Download
0
Embed Size (px)
Citation preview
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
PSICOMOTRICIDADE E FONOAUDIOLOGIA NOS DISTÚRBIOS
DA LÍNGUA ESCRITA
Por: Fannia Macedo de Oliveira
Orientadora
Profª. Maria Esther de Araújo Oliveira
Rio de Janeiro
2009
2
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
PSICOMOTRICIDADE E FONOAUDIOLOGIA NOS DISTÚRBIOS
DA LÍNGUA ESCRITA
Apresentação de monografia à Universidade
Candido Mendes como requisito parcial para
obtenção do grau de especialista em
Psicomotricidade
Por: Fannia Macedo de Oliveira
3
AGRADECIMENTOS
Agradeço ao Espírito Santo pela
companhia, aos meus familiares e
amigos pelo incentivo e a todos os
professores que me ensinaram a amar
a Psicomotricidade.
5
RESUMO
Entre as principais expressões das dificuldades de aprendizagem estão
os transtornos da Língua Escrita. Sendo a escrita um ato motor e, portanto,
ligado à Psicomotricidade, podemos indagar até que ponto transtornos
psicomotores influenciam na escrita.
Para melhor compreender estas dificuldades devemos olhar o papel da
Psicomotricidade para uma adequada conduta Fonoaudiológica, sendo esta
também uma área de intervenção essencial, nesses casos.
Ao situar estas duas ciências como relevantes na compreensão da
escrita e seus transtornos, chegou-se à conclusão que a escrita depende de
um desenvolvimento psicomotor adequado. Além disso, há transtornos de
escrita influenciados e não influenciados por transtornos psicomotores.
Uma avaliação fonoaudiológica, com um “olhar psicomotor” torna-se
imprescindível não só para diagnosticar e tratar as dificuldades de escrever,
mas também como forma de prevenção destas.
6
METODOLOGIA
Este estudo será baseado em referências bibliográficas relacionadas à
Psicomotricidade, Fonoaudiologia e à Aquisição da Língua Escrita.
O estudo se concentrará, principalmente, na fase de aquisição da
Língua Escrita, ou seja, no primeiro ciclo do Ensino Fundamental, que engloba
crianças de seis a oito anos.
Estas referências citadas nos parágrafos anteriores dizem respeito a
livros, revistas, sites da Internet e artigos eletrônicos.
7
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
08
CAPÍTULO I - Etapas do Desenvolvimento Cognitivo, Psicomotor e da
Língua Escrita.
11
1.1 - O Desenvolvimento Cognitivo segundo Piaget 11
1.2 - O Desenvolvimento Psicomotor segundo Jean Le Boulch 14
1.3 - O Desenvolvimento da Língua Escrita segundo Ferreiro e
Teberosky
17
CAPÍTULO II - Fonoaudiologia e Escrita 19
2.1 - Principais Distúrbios da Língua Escrita 19
2.2 - A Fonoaudiologia em parceria com a Psicomotricidade
20
CAPÍTULO III - Psicomotricidade e Escrita 25
3.1 - Habilidades Psicomotoras e principais Distúrbios Psicomotores 27
3.2 - A Psicomotricidade como apoio à Fonoaudiologia nos distúrbios da
Língua Escrita
31
CONCLUSÃO
33
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
34
ÍNDICE
37
FOLHA DE AVALIAÇÃO 38
8
INTRODUÇÃO
Adquirir Escrita é uma forma de inclusão, é participar de sua
comunidade como sujeito ativo e consciente de suas responsabilidades e
direitos. Nas palavras de Santos & Navas (2004, p.2), a escrita nada mais é do
que “uma forma de mediação lingüística”.
Apesar das inúmeras bibliografias correntes sobre o desenvolvimento da
escrita este tema parece nem sempre ser correlacionado com o
desenvolvimento psicomotor. Fala-se em aspectos biológico, cognitivo e
comportamental, em desenvolvimento lingüístico e suas relações
psicomotoras, mas acreditamos que este tema seja relevante quando falamos
em distúrbios de escrita, já que a motricidade é a base dessa atividade.
Psicomotricidade, segundo a Sociedade Brasileira de Psicomotricidade,
(SBP), é a ciência que tem como objeto de estudo o homem através do seu
corpo em movimento e em relação ao seu mundo interno e externo. Está
relacionada ao processo de maturação, onde o corpo é a origem das
aquisições cognitivas, afetivas e orgânicas. É sustentada por três
conhecimentos básicos: o movimento, o intelecto e o afeto.
O Conselho Federal de Fonoaudiologia, diz que esta
“é a ciência que tem como objeto de estudo a comunicação
humana, no que se refere ao seu desenvolvimento,
aperfeiçoamento, distúrbios e diferenças, em relação aos
aspectos envolvidos na função auditiva periférica e central, na
função vestibular, na função cognitiva, na linguagem oral e
escrita, na fala, na fluência, na voz, nas funções orofaciais e na
deglutição.”
Fávero e Calsa (2003, p. 114) afirmam, ao citar estudos realizados por
Cunha (1990), que o desenvolvimento psicomotor é de grande importância
para o aprendizado da leitura e escrita e que as crianças com nível superior de
9desenvolvimento conceitual e psicomotor são as que apresentam os melhores
resultados escolares.
A Fonoaudiologia, especialmente na área da Linguagem, trabalha na
reabilitação das dificuldades relacionas à escrita e dessa forma, deve
interessar-se pelas questões psicomotoras como formas de facilitação de sua
intervenção. Por isso, o tema Psicomotricidade como apoio à Fonoaudiologia
nos distúrbios da Língua Escrita foi eleito para este trabalho monográfico.
A questão central do estudo é verificar se alterações psicomotoras
podem influenciar no desenvolvimento da Língua Escrita. Dessa forma,
objetivou-se: discriminar as habilidades psicomotoras relacionadas à escrita;
descrever como se manifestam as dificuldades psicomotoras na escrita e
demonstrar como o conhecimento de conceitos psicomotores pode auxiliar na
intervenção fonoaudiológica.
O primeiro capítulo destina-se à descrição do desenvolvimento cognitivo
segundo Jean Piaget, segundo a abordagem “Construtivista” elaborada pelo
mesmo. Cita o Desenvolvimento Psicomotor segundo Jean Le Boulch, fazendo
uma analogia às fases do Desenvolvimento Cognitivo proposta por Piaget. A
descrição do desenvolvimento da escrita segundo Emília Ferreiro e Ana
Teberosky, levando em conta sua abordagem baseada na teoria
“Construtivista” de Piaget e a análise da aquisição da Língua escrita através de
níveis (“Nível Pré-Silábico”, “Nível Silábico” e “Nível Alfabético”) também se
encontra neste capítulo.
O estudo da relação entre Fonoaudiologia e Escrita torna-se essencial
quando falamos em aprendizagem e nos fatores que interferem em seu
desenvolvimento. Os distúrbios da Língua Escrita passam, então, a ser
olhados de forma simultânea pela Psicomotricidade e pela Fonoaudiologia.
Desta forma, o profissional que atua nesta área deve levar em conta elementos
psicomotores que auxiliem na avaliação e na conduta a ser adotada diante do
desenvolvimento psicomotor e de suas alterações. Estas questões serão
trabalhadas de forma amplificada no segundo capítulo deste trabalho.
10No capítulo terceiro procuraremos explanar as habilidades psicomotoras
e os principais distúrbios psicomotores assim como o apoio oferecido pela
Psicomotricidade à Fonoaudiologia quando tratamos de Distúrbios da Língua
Escrita.
Parte-se do pressuposto que alterações psicomotoras podem influenciar
no desenvolvimento da Escrita e que problemas de Escrita podem não estar
relacionados com alterações psicomotoras, ocorrendo isoladamente.
O estudo se concentrará, principalmente, na fase de aquisição da
Língua Escrita, ou seja, no primeiro ciclo do Ensino Fundamental, que engloba
crianças de seis a oito anos.
11
CAPÍTULO I
ETAPAS DO DESENVOLVIMENTO COGNITIVO,
PSICOMOTOR E DA LÍNGUA ESCRITA.
Pretende-se relatar o desenvolvimento cognitivo segundo Jean Piaget,
segundo a abordagem “Construtivista” elaborada pelo mesmo. Citaremos ainda
o Desenvolvimento Psicomotor segundo Jean Le Boulch, fazendo uma
analogia às fases do Desenvolvimento Cognitivo proposta por Piaget e o
desenvolvimento da Língua Escrita Segundo Ferreiro e Teberosky.
1. 1 - O desenvolvimento cognitivo segundo Piaget
O filósofo suíço Jean Piaget observou como um recém-nascido passava
do estado de não reconhecimento de sua individualidade frente o mundo que o
cerca indo até a adolescência, onde já temos o início de operações de
raciocínio mais complexas. Do fruto de suas observações, posteriormente
sistematizadas com uma metodologia de análise, denominada o Método
Clínico, Piaget estabeleceu as bases de sua teoria, a qual chamou de
Epistemologia Genética. Por ser um processo permanente, e estar sempre em
desenvolvimento, esta teoria foi denominada de "Construtivismo", dando-se a
idéia de que novos níveis de conhecimento estão sendo indefinidamente
construídos através das interações entre o sujeito e o meio.
Segundo Piaget (1975), a origem do desenvolvimento cognitivo dá-se de
dentro para fora, ocorrendo em função da maturidade do sujeito. Este autor
considera que o ambiente poderá influenciar no desenvolvimento cognitivo,
porém sua ênfase recai no aspecto biológico, ressaltando a maturidade do
desenvolvimento, ou seja, o desenvolvimento cognitivo inicia quando
nascemos e termina na idade adulta, assim como o crescimento orgânico, que
se equilibra após a maturidade dos órgãos. Tanto como no raciocínio, o social
e o afetivo também se equilibram de acordo com o crescimento do individuo.
12Bee cita Piaget no que se refere ao desenvolvimento cognitivo da
criança, quando ele escreveu que para a criança desenvolver e passar de um
estágio para outro, a criança teria que passar por processos como o de:
assimilação, acomodação e equilibração.
Para Piaget, as atividades mentais, assim como as atividades
biológicas, têm como objetivo a nossa adaptação ao meio em que vivemos. De
acordo com essa postura teórica a mente é dotada de estruturas cognitivas
pelas quais o indivíduo intelectualmente se adapta e organiza o meio. Toda
criança, a partir dessa perspectiva nasceria com alguns esquemas básicos -
reflexos - e na interação com o meio iria construindo o seu conhecimento a
respeito do mundo, desenvolvendo e ampliando seus esquemas. Os
esquemas cognitivos do adulto derivam dos esquemas da criança e, os
processos responsáveis por essa mudança são assimilação e acomodação.
Segundo Bee, a assimilação seria o processo de absorver algo ou alguma
experiência em algum dos estágios. Por exemplo: logo que um bebê nasce,
sem querer ele bate o pé no móbile e esse por sua vez se mexe, ela passará a
observar o que está mexendo e como isso aconteceu. A acomodação para
Bee, seria uma complementação da assimilação, o resultado das assimilações
e as adaptações feitas depois de assimilado. Por exemplo: o bebê bateu pela
primeira vez seu pé no móbile sem querer e ele se mexeu, na próxima vez ele
baterá o pé propositalmente para o móbile se mexer, ou seja, ele assimilou que
da primeira vez bateu e mexe e agora acomodou essa informação e agiu para
obter a mexida do móbile.
Piaget denominou seis estágios para o desenvolvimento (Piaget, 1975, p.13),
- 1º estágio: é o dos reflexos, ou mecanismos hereditários, assim como
também das primeiras tendências instintivas (nutrições) e das primeiras
emoções;
- 2° estágio: primeiros hábitos motores e das primeiras percepções
organizadas, como também dos primeiros sentimentos;
13- 3º estágio: inteligência-motora, das regulações afetivas elementares e das
primeiras fixações exteriores a afetividade;
Segundo Piaget, esses três estágios estão por volta de um ano e meio a dois
anos.
- 4° estágio: inteligência intuitiva, o dos sentimentos espontâneos e das
relações sociais de submissão ao adulto, que está entre dois a sete anos;
- 5° estágio: operações intelectuais concretas, começo da lógica, dos
sentimentos morais e sociais e cooperação, que está entre sete a onze ou
doze anos,
- 6° estágio: das operações intelectuais abstratas, da formação da
personalidade e da inserção afetiva e intelectual na sociedade dos adultos.
Piaget coloca que cada um desses estágios caracteriza por aparições
de determinadas estruturas, cuja construção depende dos estágios anteriores.
À medida que o individuo vai crescendo essas estruturas vão se organizando,
evoluindo e equilibrando-se.
Conforme fala Piaget (1975, p.14), pode-se dizer de maneira geral que
toda ação - isto é, todo movimento, pensamento ou sentimento - corresponde a
uma necessidade: A criança como o adulto, só executa alguma ação exterior
ou mesmo inteiramente interior quando impulsionado por um motivo e este se
traduz sempre sob a forma de uma necessidade. Ou seja, todo indivíduo só
fará algo de acordo com sua necessidade e estímulo, se, não houver uma
necessidade e um estímulo, ele deixará de fazer, assim como a aprendizagem
escolar, a criança só aprenderá de acordo com estimulações e necessidades,
necessidade de aprender a ler, calcular, etc.
No âmbito da escrita, podemos dizer que uma criança que conviver com
textos mais formais, falará e escreverá de uma forma mais formal, ao contrário
de uma criança que tiver apenas contato com uma linguagem informal,
14incorreta, com pouca convivência com a escrita, essa, terá grande dificuldade
para falar e escrever corretamente.
1. 2 - O desenvolvimento Psicomotor segundo Jean Le Boulch
Oliveira (2002, p.101), ao relatar o Desenvolvimento Psicomotor
segundo Le Boulch, afirma que o ser humano passa por três etapas em seu
desenvolvimento Psicomotor, as quais serão apresentadas a seguir.
- “Corpo vivido” (até 3 anos de idade)
Ao nascer e até mais ou menos 3 meses de idade, a criança apresenta
uma motricidade reflexa e pouco a pouco, vai inibindo seus reflexos arcaicos.
Um bebê, à medida que cresce, mediante um maior amadurecimento do seu
sistema nervoso, vai ampliando suas experiências e manipulando seu espaço.
Esta fase corresponde á fase da Inteligência sensório-motora de Jean Piaget.
É a fase que chamamos vivencia corporal. Sua atividade é incessante e
espontânea. A criança aprende a manipular objetos e a andar. Nesta etapa, os
elementos psicomotores e cognitivos caminham lado a lado, já que um
depende do outro. É a fase do conhecimento das partes do corpo.
Pouco a pouco, a maturação da preensão e da oculomotricidade vai
facilitar um maior domínio sobre o objeto e a criança coordenará melhor seus
movimentos. Ela se movimenta, mas sem analisar este movimento. Utiliza-se
bastante da imitação para se mover corretamente em seu meio ambiente e é
pela prática pessoal, pela exploração que se ajusta, domina, descobre e
compreende o meio, coordenado suas ações. Este ajuste significa que a
criança, mesmo sem a interferência da reflexão, adapta suas ações às
situações novas, isto é, desenvolve uma das funções mais importantes que é a
função de ajustamento. Valendo-se da memória do corpo ela atinge a eficácia
dos ajustamentos posteriores. No final desta fase pode-se falar em imagem de
corpo, pois o “eu” se torna unificado e individualizado.
- “Corpo percebido ou descoberto” (3 a 7 anos)
15O ajustamento espontâneo da primeira fase transforma-se em um
ajustamento mais controlado, embora a dissociação gestual ainda não seja
boa. Ela aperfeiçoa e refina os movimentos adquirindo uma maior coordenação
dentro de um espaço e tempo determinados. Ela tem, portanto, um maior
controle do próprio corpo. A criança consegue ajustar suas ações às situações
e aos objetos. Desenvolve uma percepção mais centrada em seu próprio corpo
por meio da função de interiorização. A denominação das partes do corpo
favorece a tomada de consciência que envolve uma percepção de si mais
acurada. Esta denominação é, pois, uma etapa importante na representação
mental do corpo. É também nesta etapa que a criança vai representar-se por
intermédio do desenho. A criança não conhece somente as partes de seu
corpo, mas também chega à orientação corporal pela tomada de posição do
corpo, associando-o aos objetos da vida quotidiana. Isto possibilita a distinção
das diversas no espaço como, por exemplo, a percepção da orientação das
letras e palavras na escrita.
Oliveira afirma ainda que nesta fase, a criança chega à representação
mental dos elementos no espaço, coma dominância do eixo corporal e da
dominância lateral. A tomada do corpo como ponto de referência “é o primeiro
passo para que a criança possa, mais tarde, chegar à estruturação espaço-
temporal”.
Por meio do eixo corporal a criança chega à representação e à
assimilação de conceitos tais como embaixo, acima, direita, esquerda. Ela
adquire também noções temporais como a duração dos intervalos de tempo,
de ordem e sucessão. Estes conceitos ainda estão muito centrados no próprio
corpo. No final desta fase – diz Le Boulch, citando Ajuriaguerra – o nível do
comportamento motor, bem como o nível intelectual, pode ser caracterizado
como pré-operatório.
- “Corpo representado” (7 a 12 anos)
Nesta etapa a criança chega a um espaço representativo. Ela amplia e
organiza seu esquema corporal. Na etapa anterior ela conhecia o ambiente por
16meio da percepção do próprio corpo. Nesta fase ela não mais se centraliza,
mas evolui para a descentralização, para a representação mental de um
espaço orientado que não toma mais somente seu corpo como ponto de
referência, mas utiliza outros pontos de referência exteriores a ela. Podem-se
citar as noções de direita e esquerda. Anteriormente ela conhecia esses
conceitos somente em função de seu corpo. Com 8-9 anos ela já consegue
distinguir essas noções em reversibilidade, isto é, face a face.
A partir de 10 anos a criança dispõe de uma imagem mental do corpo
em movimento, significando que atingiu “uma representação mental de uma
sucessão motora”, com a introdução do fator temporal. Ela adquire a noção de
conservação das distâncias, das quantidades, das formas e é capaz de situar
as seqüências lógicas do tempo mais elaboradas. É capaz também de
trabalhar em um espaço orientado. No final desta fase o nível motor da criança
evolui possuindo um domínio cada vez maior.
O desenho da figura humana torna-se mais elaborado, com mais
detalhes e mais próximo da visão do adulto. Ela consegue desenhar
esquematicamente as diferentes fases de um movimento, representa uma fase
vivida ou sonhada, mostrando as emoções e os sentimentos. Ela adquire a
capacidade de representar num desenho ou por meio de seu corpo os
sentimentos dos personagens, numa visão descentralizada de si mesma.
Outro fator importante nesta fase que merece destaque é a passagem
da imagem de corpo de reprodutora para antecipatória, revelando um
verdadeiro trabalho mental em razão da evolução das funções cognitivas
correspondentes ao estágio preconizado por Piaget de “operações concretas”.
Esta capacidade de antecipação permite-lhe encontrar as soluções mais
rapidamente e a se organizar perante elas.
A imagem do corpo representado permite à criança de 12 anos dispor
de uma imagem de corpo operatório que é o suporte que a permite efetuar e
programar mentalmente as suas ações em pensamento. Torna-se capaz de
17organizar, de combinar as diversas orientações. Ela chega às noções de
perspectiva.
A criança adquire o domínio corporal e consegue descobrir qual é o
caminho que permite melhorar ainda mais este domínio prevendo suas
características próprias.
Aos 12 anos adapta seu gesto às circunstâncias imediatas, possuindo
uma possibilidade corporal que a torna capaz de modificar seu gesto de
maneira imediata, pois seu corpo deve obedecer-lhe.
1.3 - O Desenvolvimento da Língua Escrita segundo Ferreiro e
Teberosky
Emilia Ferreiro e Ana Teberosky, embasadas pela teoria construtivista
desenvolvida por Piaget, demonstram como se constrói, em níveis evolutivos, a
compreensão do sistema alfabético de representação da língua, permitindo
definir atividades e intervenções pedagógicas que favorecem a compreensão
da escrita e a superação das dificuldades desta aprendizagem.
Em seus estudos com crianças de 4 a 6 anos classificaram a escrita em
cinco níveis:
1) Nível Pré-Silábico: não se busca correspondência com o som; as hipóteses
das crianças são estabelecidas em torno do tipo e da quantidade de grafismo.
A criança tenta nesse nível: diferenciar entre desenho e escrita; utilizar no
mínimo duas ou três letras para poder escrever palavras; reproduzir os traços
da escrita, de acordo com seu contato com as formas gráficas (imprensa ou
cursiva), escolhendo a que lhe é mais familiar para usar nas suas hipóteses de
escrita; percebe que é preciso variar os caracteres para obter palavras
diferentes;
2) Nível Silábico: pode ser dividido entre Silábico e Silábico Alfabético.
Silábico: a criança compreende que as diferenças na representação escrita
estão relacionadas com o “som” das palavras, o que a leva a sentir a
18necessidade de usar uma forma de grafia para cada som. Utiliza os símbolos
gráficos de forma aleatória, usando apenas consoantes, ora apenas vogais,
ora letras inventadas e repetindo-as de acordo com o número de sílabas das
palavras;
Silábico – Alfabético: convivem as formas de fazer corresponder os sons às
formas silábica e alfabética e a criança pode escolher as letras ou de forma
ortográfica ou fonética;
3) Nível Alfabético: a criança agora entende que: a sílaba não pode ser
considerada uma unidade e que pode ser separada em unidades menores; a
identificação do som não é garantia da identificação da letra, o que pode gerar
as famosas dificuldades ortográficas; a escrita supõe a necessidade da análise
fonética das palavras.
19
CAPÍTULO II
FONOAUDIOLOGIA E ESCRITA
Este capítulo pretende abordar a relação entre a Fonoaudiologia e a
Escrita, descrevendo a importância destas no processo de aprendizagem.
Inicialmente relatamos os principais distúrbios da Língua Escrita; a seguir, há a
discussão sobre a parceria Fonoaudiologia-Psicomotricidade. Para isto,
citamos os elementos psicomotores afins, a importância da avaliação dos
mesmos e a conduta a ser adotada pelo profissional que atua
simultaneamente nestas áreas, bem como atividades que auxiliem o
desenvolvimento psicomotor adequado.
2.1 - Principais Distúrbios da Língua Escrita
Quando nos referimos à Língua Escrita devemos antes fazer referência
à Língua Oral, modalidade linguística que precede e se relaciona diretamente
com a mesma. A relação entre as mesmas se dá da seguinte forma:
inicialmente, como sugere Kato (1986), há uma necessidade de apoio na
oralidade nas fases iniciais, logo após, temos a independência relativa da
Língua Escrita no decorrer do processo para finalizarmos com a influência que
a escrita terá na expressão oral (Fala 1→ Escrita 1→ Escrita 2→ Fala 2).
Há diversos fatores que interferem no aprendizado da Língua escrita e
que prejudicam o rendimento escolar de algumas crianças: neurológicos,
familiares, psicomotores, lingüísticos, pedagógicos, emocionais.
Um correto diagnóstico dos distúrbios da Língua Escrita, segundo
Mousinho (1998), deve levar em consideração o uso das palavras isoladas e o
uso do contexto. Além disso, devemos nos apoiar em uma avaliação
psicomotora que nos auxilie neste processo. É neste contexto que a
Fonoaudiologia, em sua área de Linguagem, procura avaliar, prevenir e tratar
estas alterações.
20Segundo Morais (2006), no domínio da Escrita encontramos,
basicamente, três tipos de distúrbios:
- Disgrafia
É a dificuldade em passar para a escrita o estímulo visual da palavra impressa.
Caracteriza-se pelo lento traçado das letras, que em geral são ilegíveis. A
criança disgráfica não é portadora de defeito visual ou motor, nem apresenta
qualquer comprometimento intelectual ou neurológico. No entanto, ela não
consegue idealizar no plano motor o que captou no plano visual;
- Disortografia
Caracteriza-se pela dificuldade de transcrever corretamente a linguagem oral,
havendo trocas ortográficas e confusão de letras. São normais durante as
primeiras séries do Ensino Fundamental porque a relação entre a palavra
impressa e os sons ainda não está totalmente dominada;
- Erros de Formulação e Sintaxe
São crianças que conseguem ler com fluência e apresentam uma linguagem
oral perfeita, compreendendo e copiando palavras, mas não conseguem
escrever cartas, histórias ou dar respostas a perguntas escritas em provas. Na
língua escrita comete erros que não ocorrem na língua oral, não conseguindo,
portanto, transmitir para a escrita os conhecimentos adquiridos.
2.2 - A Fonoaudiologia em parceria com a Psicomotricidade
A prática fonoaudiológica muito pode ser enriquecida pela
Psicomotricidade. A Fonoaudiologia enfoca a capacidade de comunicar-se,
enquanto a Psicomotricidade resgata o desejo de fazê-lo, sendo o corpo o
nosso meio de “ser” no mundo. Dessa forma, sendo o corpo um campo de
expressão linguística, podemos supor que muitas dificuldades de comunicação
têm como causa distúrbios psicomotores.
21 Há crianças que chegam aos fonoaudiólogos com diversos tipos de
queixa, principalmente as de caráter lingüístico e ou psicomotor. Devemos ter
em mente, ao iniciar a investigação sobre as dificuldades relatadas, que um
correto diagnóstico implicará em uma avaliação detalhada de itens
relacionados à Psicomotricidade.
A investigação parte de uma anamnese minuciosa com os responsáveis
ou com o próprio indivíduo, quando adolescente. Deve conter elementos de
identificação do sujeito, dados familiares, queixa ou motivo da consulta,
antecedentes pessoais, dados do desenvolvimento, escolaridade, linguagem,
sexualidade, aspectos ambientais, características pessoais e afetivo-
emocionais e atividades diárias realizadas. Encaminhamentos para outros
profissionais podem ser realizados nesta fase. Podemos realizar também,
quando for necessário, uma consulta ao professor ou à escola do referido
entrevistado, uma vez que há dados relevantes que só poderão ser fornecidos
por estes.
De posse da entrevista, parte-se para o “Exame Psicomotor”, que,
segundo Oliveira (2005) deve não apenas “testar” as bases da motricidade,
mas verificar também o papel da afetividade, da vivência e das experiências
passadas. Para a autora, é indispensável que atitude do examinador seja de
respeito, escuta e de estabelecimento de uma relação afetuosa com a criança.
É essencial também que se descreva tudo quanto se puder observar da
criança no decorrer do exame.
Para Mieiro e Hertz (2004) existem elementos básicos de atuação
psicomotora, fundamentais à terapia fonoaudiológica e que necessitam ser
avaliados: Conhecimento Corpo: representação relativamente global, científica
e diferenciada que a criança tem do próprio corpo; Tônus, postura e equilíbrio:
constituem a capacidade da criança de conquistar atitudes habituais cômodas
e suscetíveis de serem mantidas, com um mínimo de fadiga e sem
desequilíbrios ou vícios de postura. Lateralidade: é a propensão que o ser
humano possui ao utilizar preferencialmente mais um lado do corpo do que o
outro, em três níveis: mão, olho e pé; Orientação: divide-se em estruturação
temporal e espacial que são fundamentais no processo de adaptação do
22individuo ao ambiente; Coordenação: a coordenação global diz respeito à
atividade dos grandes músculos, depende da capacidade de equilíbrio
postural; Sociabilidade e afetividade: à medida que a criança domina melhor
seu corpo e sentimentos estimulados por atividades corporais e jogos onde se
precise respeitar regras, ela irá se conduzir com mais segurança no meio em
que vive; Percepção: é o ato ou efeito de conhecer os objetos em suas
qualidades ou relações; Atenção: é um fenômeno não manifesto e subjetivo. É
um modo como a mente seleciona e fixa determinados estímulos por um
período de tempo variável, segundo a motivação e a fadiga da criança ;
Raciocínio e compreensão: entende-se por raciocínio as formas de pensar que
envolve a resolução de problemas: coletando dados, levantando hipóteses,
selecionando-as e testando-as. A compreensão é dada de acordo com o
raciocínio. Sem raciocinar a criança não compreende uma situação, sendo ela
o ato de entendimento do problema; Memória: é a capacidade de registrar,
fixar e recordar estímulos visuais, auditivos e táteis, sejam estáticos ou
cinéticos.
Avaliados os itens acima e realizada a entrevista de devolução do
diagnóstico, parte-se para a terapia em si. Esta deve englobar atividades que,
contemplando os elementos psicomotores citados, venham promover um
desenvolvimento psicomotor harmonioso. Machado (2007) sugere as seguintes
atividades para que este desenvolvimento seja atingido:
- Esquema Corporal e Imagem Corporal: nomeação das partes do corpo, do
corpo de um colega, de uma boneca através do toque; movimentos como:
pedalar deitado no chão, andar com uma bola entre as pernas, andar com as
mãos na cabeça, bater palmas, andar de joelhos, rolar, andar de quatro e
outras; através de mímicas fingir que toma banho, imitar um movimento feito
pelo terapeuta; fazer uso de quebra-cabeça, jogo da memória e dominó,
juntando partes do corpo; músicas que cantam as partes do corpo; desenhos
de figuras humanas e recortes com colagens; “Seu mestre mandou”, através
de movimentos com a cabeça, pescoço, tronco e membros que a criança terá
que fazer através de solicitação do terapeuta.
23- Tônus e Equilíbrio: rolar uma pequena bola de borracha com os pés; andar
na ponta dos pés; andar com os calcanhares; andar com os dedos em garra;
andar com um objeto na cabeça; saltar obstáculos; pular de uma determinada
altura com os dois pés para frente; andar sobre uma linha; andar de lado
seguindo uma linha; andar cruzando os pés; pular com as pernas afastadas;
subir e descer escadas;
- Lateralidade: através dos desenhos das mãos e pés direitos e esquerdos em
papel colocá-los espalhados no chão, fazendo com que a criança tenha que
por em cima as mãos e pés correspondentes; amarelinha ora pulando com um
pé ora com o outro; jogar ou quicar uma bola com as duas mãos, depois com
uma e depois com a outra; chutar uma bola com um pé e depois com o outro
verificar qual tem mais força; abotoar camisa; enfiar miçangas ou macarrão
numa linha; em frente a um espelho fazer gestos com o terapeuta; realizar um
exercício colocando uma das mãos em alguma outra parte do corpo,
relacionando direita com direita, esquerda com esquerda e direita com
esquerda e esquerda com direita.
- Orientação Espacial e Temporal: caminhando pela sala, receber uma bola
vinda de frente, depois pelos lados direito e esquerda da criança; percorrer um
determinado espaço ao som de um instrumento musical ou batidas das mãos
do terapeuta tendo que parar quando o som cessar; marchar no mesmo lugar,
quando ouvir um som andar e parar ao ouvir outro som; pular corda devagar e
depois mais rápida; desenhar uma cena de uma historia ou de algo que a
criança tenha vivenciado; por em ordem uma historia ouvida; por em ordem
cartões com figuras que relatem uma historia;
- Coordenação Global, Fina e Óculo-Manual: andar com passos pequenos e
depois com passos largos; andar entre obstáculos com diferentes distâncias
devagar e depois andar rápido; andar e quando ouvir um sinal dar meia volta
ou mudar de direção; modelar massa plástica ou argila; apertar botões;
recortar com os dedos e fazer bolinha com as pontinhas dos dedos um papel;
através de movimentos feitos pelo terapeuta com um objeto a criança deverá
segui-los só com a movimentação dos olhos e da cabeça e depois só com os
olhos;
24- Percepção Tátil, Visual, Olfativa, Auditiva e Gustativa: apalpar materiais
ásperos, lisos, finos, grossos, macios; separar em grupos tais matérias e
objetos com formas diferentes; apalpar partes do corpo com os olhos
vendados; apalpar objetos da sala de atendimento com os olhos vendados;
verificar o que falta em um determinado desenho; verificar erros entre
desenhos iguais; identificar cores e formas diferentes; colocar dois ou mais
objetos sobre a mesa, retirar um e perguntar à criança qual o objeto que foi
retirado; matérias como: velas aromáticas, sabonetes, perfumes, chocolate e
café em pó, podem ser usados para que a criança perceba odores diferentes;
identificar e imitar sons feitos pala natureza, por animais e pelo próprio corpo
da criança; separar alimentos doces, salgados, azedos, quentes e frios e fazer
com que a criança os experimente, pode ser de olhos abertos ou fechados;
- Atenção: quando o terapeuta disser o nome de um animal bater palma; com o
ritmo de uma música acompanhá-la com pés; achar uma figura idêntica em
uma cartolina com diversos desenhos;
- Raciocínio e Compreensão: executar ordens simples e depois mais
complexas; fazer quebra-cabeças; fazer teatrinho com máscaras de bichos;
- Memória Visual, Auditiva e Viso-Motora: Jogos de memória; reproduzir
desenhos simples; separar figuras de animais e objetos baseados nos sons;
reprodução de movimentos corporais com os segmentos corporais de acordo
com a apresentação de um modelo ou depois de uma demonstração;
- Sociabilidade e Afetividade: tangrans; jogos de construção; quebra-cabeça;
imitar cenas do dia-a-dia da criança em casa e na escola;
Ao enriquecer sua intervenção fonoaudiológica com as atividades
propostas anteriormente, o profissional poderá obter resultados satisfatórios na
alteração de linguagem verificada, uma vez que estará trabalhando em
parceria com a Psicomotricidade, facilitadora do desenvolvimento a que
buscamos atingir.
25
CAPÍTULO III
PSICOMOTRICIDADE E ESCRITA
De acordo com Negrine (apud Pereira, 2007), uma das aprendizagens
escolares básicas devem ser os exercícios psicomotores e sua evolução é
determinante para a aprendizagem da escrita e da leitura. Outros estudos
reafirmam a importância do desenvolvimento psicomotor para as
aprendizagens escolares e destacam a necessidade de desde o ensino pré-
escolar serem oferecidas atividades motoras direcionadas ao fortalecimento e
consolidação das funções psicomotoras, fundamentais para o êxito nas
atividades da leitura e escrita.
Para Fonseca (1995), um objeto situado a determinada distância e
direção é percebido porque as experiências anteriores da criança levam-na a
analisar as percepções visuais que lhe permitem tocar o objeto. É dessas
percepções que resultam as noções de distância e orientação de um objeto
com relação a outro, a partir das quais as crianças começam a transpor as
noções gerais a um plano mais reduzido, que será de extrema importância
quando na fase do grafismo. Fonseca (1983) destaca que na aprendizagem da
leitura e da escrita a criança deverá obedecer ao tempo de sucessão das
letras, dos sons e das palavras, fato este que destaca a influência da
estruturação temporal para a adaptação escolar e para a aprendizagem.
Fávero (2004) ressalta que o desenvolvimento psicomotor não é o único
fator responsável pelas dificuldades de aprendizagem, mas um dos que podem
desencadear ou agravar o problema. As dificuldades de aprendizagem
relacionadas à escrita alteram o rendimento escolar. Crianças com dificuldades
de escrita podem apresentar disfunção nas habilidades necessárias para a
aprendizagem escolar em outras áreas do conhecimento fatores, estes que,
podem ser acentuados pelos déficits psicomotores. A escrita exige o
desenvolvimento de habilidades psicomotoras específicas e um esforço
intelectual superior às aprendizagens anteriores à fase do letramento da
26criança. Na escrita ocorre a comunicação por meio de códigos que variam de
acordo com a cultura, e sua aprendizagem se dá por meio da realização de
atividades espontâneas e sistematizadas.
Segundo Fávero (2004), a escrita espontânea envolve um grau maior de
dificuldade, pois o modelo visual e auditivo está ausente e envolve a tomada
de decisões acerca do que vai ser escrito e como será escrito. Antes do
indivíduo escrever é preciso gerar uma informação, organizá-la de forma
coerente para posteriormente escrevê-la e revisar o que foi escrito. É preciso
diferenciar as letras dos demais signos e determinar quais são as letras que
devem ser empregadas. Além disso, a escrita pressupõe um desenvolvimento
motor adequado, pois certas habilidades como a espacial e temporal são
essenciais para que essa atividade ocorra de maneira satisfatória.
Para Ajuriaguerra (1988), a escrita é uma atividade que obedece a
exigências precisas de estruturação espacial, pois a criança deve compor
sinais orientados e reunidos de acordo com normas, a sucessão faz destes
sinais palavras e frases, tornando a escrita uma atividade espaço-temporal. A
escrita envolve, para o autor, além das habilidades cognitivas, as habilidades
psicomotoras, pois o ato de escrever está impregnado pela ação motora de
traçar corretamente cada letra e constituir a palavra. Quando se coloca em
questão o desenvolvimento motor é necessário, além da maturação do sistema
nervoso, a promoção do desenvolvimento psicomotor, objetivando o controle, o
sustento tônico e a coordenação dos movimentos envolvidos no desempenho
da escrita.
Assim, ao analisarmos estes autores, podemos afirmar que a escrita,
por ser um ato motor, está ligada à Psicomotricidade e um desenvolvimento
motor adequado é pré-requisito para a qualidade da escrita.
A seguir, explanaremos as habilidades psicomotoras e os principais
distúrbios psicomotores assim como o apoio oferecido pela Psicomotricidade à
Fonoaudiologia quando tratamos de Distúrbios da Língua Escrita.
27
3.1 - Habilidades Psicomotoras e principais distúrbios
psicomotores
Algumas habilidades são muito importantes no desenvolvimento
psicomotor da criança. Para que essa pessoa se movimente no espaço com
desenvoltura, equilíbrio e coordenação é preciso ter o domínio do gesto e do
instrumento. Para Gomes (1998), a coordenação e o equilíbrio são elementos
de base para qualquer movimento. Outras habilidades como Esquema
Corporal, Lateralidade, Orientação de Espaço e Tempo também são
fundamentais.
Coordenação Motora
Para Pellegrini (2003, p.180), coordenação motora pode ser definida
como a ativação de várias partes do corpo para a produção de movimentos
que apresentam relação entre si, executados numa determinada ordem,
amplitude e velocidade.
Ainda de acordo com os autores podemos afirmar que o grau de
complexidade de uma tarefa motora está no número de elementos que
precisam ser coordenados e na rede de relações que se estabelece entre
estes elementos. Como habilidades motoras grossas identificamos aquelas
que envolvem o corpo como um todo, principalmente, mas não exclusivamente
grandes grupos musculares. Entre elas podemos citar o pular, andar,
arremessar uma bola ao cesto. Como habilidades motoras finas identificamos
aquelas que requerem muita precisão, envolvem principalmente os membros
superiores, em específico as mãos. Um grande número de músculos,
relativamente pequenos, são ativados na execução destas habilidades.
Encontramos no rol de habilidades motoras finas, o escrever, o digitar, o fazer
crochê, ou consertar um relógio e, mais precisamente no processo de
alfabetização, o discernimento entre escrever as letras que são parecidas
graficamente: m/n, g/q, l/b, dentre outras.
Equilíbrio
28 Segundo Ferreira (2005, p.21), este fator psicomotor é fundamental para
que o movimento seja realizado de modo coordenado. É a base para toda e
qualquer ação, seja ficar de pé (equilíbrio estático) ou andar em marcha
(equilíbrio dinâmico). O tripé “visão, propriocepção e sistema vestibular” é
essencial para a manutenção do equilíbrio.
Esquema Corporal
Segundo Gomes, (1998 p.58), esquema corporal é o "(...) conhecimento
do próprio corpo, não apenas em função do inter-relacionamento de suas
partes, mas também englobando o controle ou domínio de corpo em
movimento, portanto em relação ao espaço e objetos ao redor”.
Nas palavras de Jean-Claude Coste (1978), a expressão esquema
corporal é mais ou menos equivalente à imagem do corpo.
Lateralidade
A lateralidade para Gomes (1998), é a tendência que o ser humano
possui de utilizar mais um lado do corpo que o outro, em três níveis: Mão, olho
e pé, ou seja, existe uma dominância de um dos lados. O dominante apresenta
maior força muscular, precisão e rapidez, sendo que ele executará a ação
principal, enquanto o outro lado auxilia essa ação, sendo de igual importância.
Os dois lados se complementam. Se uma pessoa tiver a mesma dominância
nos três níveis, mão, olho e pé - lado direito, diremos que ela é destra
homogênea, ou canhota homogênea, se for o lado esquerdo. Se ela executar
os mesmos movimentos tanto com um lado, como com o outro, ela é chamada
ambidestra.
Estruturação Espacial
Segundo Fernandes (1999), toda nossa percepção de mundo é uma
percepção espacial, na qual o corpo é o termo de referência. É através das
relações espaciais que nos situamos no meio em que vivemos.
29Nas palavras de Coste (1978), o espaço da criança inicialmente é muito
limitado, reduzido às suas impressões táteis (o corpo da mãe, o berço...). O
meio circundante é distinto do corpo. Seu mundo espacial constrói-se
paralelamente ao seu desenvolvimento psicomotor.
Estruturação temporal
Para Fernandes (1999), as noções de corpo, espaço e tempo têm de
estar intimamente ligadas para que possamos entender o movimento. O corpo
se coordena e movimenta dentro de um espaço determinado, em função do
tempo, e em relação a um sistema de referências. A estruturação temporal,
"requer uma construção intelectual por parte da criança, baseada em
operações que são paralelas às envolvidas no pensamento lógico-matemático"
(Condemarin apud Gomes, p.64,1998).
Principais distúrbios psicomotores
As primeiras evidências de um desenvolvimento mental normal são
manifestações puramente motoras (José & Coelho, 2002, p. 108). Qualquer
distúrbio psicomotor tem ligação com problemas que envolvem o indivíduo em
sua totalidade. Distúrbios psicomotores e afetivos estão, intimamente,
associados. Os sintomas mais comuns desse distúrbio estão associados à
área do ritmo, da atenção, do comportamento, esquema corporal, orientação
espacial e temporal, lateralidade e maturação (retardos). Esses distúrbios
podem ser classificados em cinco grupos, segundo Grünspun (apud José &
Coelho, 2002, p. 111):
- Instabilidade Psicomotora
É o tipo mais complexo e causa uma série de transtornos pelas reações que o
portador apresenta, com o predomínio de uma atividade muscular contínua e
incessante. Essas crianças revelam instabilidade emocional e intelectual; falta
de atenção e concentração; atividade muscular contínua (não terminam tarefas
iniciadas); falta de coordenação geral e coordenação motora fina;
hiperatividade e equilíbrio prejudicado; deficiência na formulação de conceitos
30e no processo de percepção (discriminação de tamanho, figura-fundo,
orientação espaço-temporal); alteração da palavra e da comunicação (atraso
na linguagem e distúrbios da palavra); alterações emocionais ( são impulsivas,
explosivas, sensíveis, frustram-se com facilidade, destruidoras); alterações do
sono ( terror noturno, movimentos enquanto dormem); alterações no processo
do pensamento abstrato; dificuldades de escolaridade ( leitura, escrita,
aritmética, lentidão nas tarefas, dificuldade de copiar da lousa, entre outras
manifestações;
- Debilidade Psicomotora
Caracterizada por “Paratonia”: Limitação nas quatro extremidades do corpo
(ou apenas em duas) – “deselegância” ao correr – limitações e rigidez nas
mãos e nas pernas; e “Sincinesia”: Participação de músculos em movimentos
aos quais eles não são necessários – descontinuidade de gestos; imprecisão
nos movimentos dos braços e das pernas; dificuldade de realizar os
movimentos finos dos dedos;
- Inibição Psicomotora
Além das características da “Debilidade Psicomotora”, neste caso a ansiedade
é presença constante – a criança apresenta sobrancelha franzida; cabeça
baixa; problemas de coordenação motora; distúrbios de conduta, dentre outros;
- Lateralidade Cruzada
A maioria dos autores acredita que existe no cérebro um hemisfério
predominante responsável pela lateralidade do indivíduo – desta maneira, de
acordo com a ordem enviada pelo cérebro dominante, teremos o destro ou o
canhoto. No entanto, segundo José & Coelho (2002, p. 114), além da
dominância da mão, existe também a do pé, do olho, do ouvido. Quando essas
dominâncias não se apresentam do mesmo lado diz-se que o indivíduo tem
lateralidade cruzada – os distúrbios psicomotores são evidentes e resultam em
deformação do esquema corporal. São algumas as formas mais comuns desse
distúrbio: mão direita dominante X olho esquerdo dominante; mão direita
31dominante X pé esquerdo dominante e o inverso. Geralmente essas crianças
apresentam alto índice de fadiga; quedas freqüentes; coordenação pobre;
atenção instável; problemas de linguagem;
- Imperícias
É um distúrbio de menor gravidade, a criança apresenta inteligência normal,
apesar de uma certa frustração pela dificuldade de realizar certas tarefas que
exijam apurada habilidade manual. Apresentam dificuldades na coordenação
motora fina; quebra constante de objetos; letra irregular; movimentos rígidos;
alto índice de fadiga.
3.2 - A Psicomotricidade como apoio à Fonoaudiologia nos
distúrbios da Língua Escrita
Segundo Oliveira (2005, p.28), uma criança usa seu corpo como ponto
de referência para conhecer e interagir com o mundo que a cerca. Um corpo
não organizado, que não lhe obedece, estará prejudicando-a em seu
desenvolvimento intelectual, social e mesmo afetivo-emocional, pois não confia
em suas potencialidades. Estará também prejudicando a aprendizagem na
escola, visto que algumas habilidades psicomotoras são necessárias à
aprendizagem e ao próprio desenvolvimento.
Mieiro e Hertz (2004) afirmam que a psicomotricidade é fundamental
para a fonoterapia, pois é através dela que os fonoaudiólogos atingirão os
objetivos com agilidade. Segundo as autoras, quando se fala em
psicomotricidade, no primeiro momento de reflexão, concentra-se na
motricidade e as implicações com o corpo. A psicomotricidade tem como
verdadeira atuação desenvolver como um todo a formação do indivíduo. A sua
função principal é a de intervir sobre o corpo, através de situações vivenciadas,
para estimular a organização perceptiva e possibilitar a readaptação funcional
dos músculos e da maturidade relacional. À medida que o indivíduo domina
melhor seu corpo e seus sentimentos, gradativamente, ele irá conduzir-se com
mais segurança no seu meio ambiente.
32Mattos & Kabarite (apud Jakubovicz, 2004, p.35) afirmam que na
avaliação fonoaudiológica muitos podem ser os fatores coadjuvantes que
podem tornar-se obstáculo tanto na própria avaliação quanto no processo
terapêutico. Dentre esses fatores estão os transtornos psicomotores.
Dessa forma, a Psicomotricidade torna-se essencial na atuação
fonoaudiológica, principalmente quando falamos em distúrbios da Língua
Escrita. A avaliação da Psicomotricidade precisa tornar-se uma prática
constante nas avaliações relacionadas a este tema.
33
CONCLUSÃO
A escrita, um dos principais meios de expressão e interação humana,
foi o tema central deste estudo.
De um desenvolvimento psicomotor adequado depende a estruturação
da Língua Escrita, ato motor que expressa esta forma ímpar de comunicação.
Apesar de já terem sido relatadas na literatura alterações da escrita
não relacionadas diretamente aos aspectos psicomotores, não podemos negar
a influência que estes possuem para o adequado desenvolvimento desta forma
de linguagem.
Psicomotricidade e Fonoaudiologia encontram-se em muitos aspectos,
contudo, no aspecto aqui relatado, a escrita, pode-se perceber a importância
que a primeira ciência tem para a segunda. Isto nos leva a pensar que dados
psicomotores devem fazer parte das avaliações fonoaudiológicas como meio
facilitador não só de diagnosticar e tratar alterações relacionadas à Língua
Escrita, mas também como ação preventiva para estas dificuldades.
Podemos, dessa forma, afirmar que o papel do fonoaudiólogo vai além
da área da saúde, mas passa também pela educação, principalmente quando
utiliza a Psicomotricidade como aporte para a sua atuação na área de
Linguagem.
34
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
1. AJURIAGUERRA, J. A Escrita Infantil – Evolução e Dificuldades. Porto
Alegre: Artes Médicas, 1988.
2. BEE, Helen. A criança em desenvolvimento. São Paulo: Harbra, 1991.
3. COSTE, Jean-Claude. A Psicomotricidade. Trad. Álvaro Cabral. Rio de
Janeiro, Zahar Editores, 1978.
4. FÁVERO, Maria Tereza M. Desenvolvimento psicomotor e
aprendizagem da escrita. Dissertação (Mestrado) – Universidade
Estadual de Maringá, 2004.
5. FERNANDES, Fernanda. Psicomotricidade e educação. Projeto de
Pesquisa – Universidade Estadual de Campinas. Faculdade de
Educação, 1999.
6. FERREIRA, Fernanda Silva. Eixo Corporal e Fonoaudiologia.
Monografia – Universidade Candido Mendes. Instituto A vez do Mestre,
2005.
7. FERREIRO, Emilia, Alfabetização em processo. São Paulo: Cortez,
2001.
8. FERREIRO, Emília & TEBEROSKY, Ana. Psicogênese da língua escrita.
Porto AIegre: Artes Médicas, 1985.
9. FONSECA, Vitor da. Psicomotricidade. São Paulo: Martins Fonte, 1983.
10. _________, Introdução às Dificuldades de Aprendizagem. Porto Alegre:
Artes Médicas, 1995.
11. GOMES, J.D.G.. Construção de coordenadas espaciais,
psicomotricidade e desempenho escolar. Dissertação de Mestrado –
Universidade Estadual de Campinas. Faculdade de Educação, 1998.
3512. JOSÉ, Elisabete da Assunção & COELHO, Maria Teresa. Problemas de
Aprendizagem. 12 ed. São Paulo: Ática, 2002.
13. KATO, M. No mundo da escrita – Uma perspectiva Psicolingüística. São
Paulo: Ática, 1986.
14. MACHADO, Daniele de Araújo. A Psicomotricidade de mãos dadas com
a Fonoaudiologia. Monografia – Universidade Candido Mendes. Instituto
A vez do Mestre, 2007.
15. MATTOS, Vera Maria; KABARITE, Aline V. Barreto. Avaliação da
Psicomotricidade In. JAKUBOVICZ, Regina. Avaliação em Voz, Fala e
Linguagem. Rio de Janeiro: REVINTER, 2004.
16. MIEIRO, Izabel e HERTZ, Samantha Borges, Dominando o corpo e os
sentimentos. In: Fátima Alves (org). Como aplicar a psicomotricidade
uma atividade multidisciplinar com amor e união, 2004, p.80-123.
17. MOUSINHO, Renata. Desenvolvimento da Língua Escrita e seus
transtornos. In: Márcia Goldfeld (org). Fundamentos em Fonoaudiologia
– Linguagem. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1998
18. OLIVEIRA, Gislene de Campos. Avaliação Psicomotora à luz da
Psicologia e da Psicopedagogia. Petrópolis: EDITORA VOZES, 2005.
19. PEREIRA, Lilian Alves. Prevenção didática na Escrita. Universidade
Estadual de Maringá. Anais do 16º Congresso de Leitura do Brasil,
UNICAMP, 2007.
20. PIAGET, Jean, O Desenvolvimento cognitivo da criança: seis estudos de
Psicologia. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1975.
21. TEBEROSKY, Ana. Aprendendo a escrever. São Paulo: Ática, 1992.
22. http: www.abpp.com.br/abppprnorte/pdf/a13Favero03.pdf -
23. http://www.lite.fae.unicamp.br/grupos/F.htm
37
ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO 2
AGRADECIMENTO 3
DEDICATÓRIA 4
RESUMO 5
METODOLOGIA 6
SUMÁRIO 7
INTRODUÇÃO 8
CAPÍTULO I
Etapas do Desenvolvimento Cognitivo, Psicomotor e da Língua Escrita.
11
1.1 - O Desenvolvimento Cognitivo segundo Piaget 11
1.2 - O Desenvolvimento Psicomotor segundo Jean Le Boulch 14
1.3 - O Desenvolvimento da Língua Escrita segundo Ferreiro e
Teberosky
17
CAPÍTULO II
Fonoaudiologia e Escrita
19
2.1 - Principais Distúrbios da Língua Escrita 19
2.2 - A Fonoaudiologia em parceria com a Psicomotricidade 20
CAPÍTULO III
Psicomotricidade e Escrita
25
3.1 - Habilidades Psicomotoras e principais distúrbios psicomotores 27
3.2 - A Psicomotricidade como apoio à Fonoaudiologia nos
distúrbios da Língua Escrita
31
CONCLUSÃO 33
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 34
ÍNDICE 37