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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
A RESPONSABILIDADE DO FORNECEDOR PELO FATO DO
PRODUTO
Por: Renata de Xerez Rosa
Orientador
Prof. William Lima Rocha
Rio de Janeiro
2007
2
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
POS GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
A RESPONSABILIDADE DO FORNECEDOR PELO FATO DO
PRODUTO
Apresentação de monografia à Universidade
Candido Mendes como requisito parcial para
obtenção de grau de especialista em Direito do
Consumidor
3
AGRADECIMENTOS
Agradeço ao meu orientador, mestre e amigo, Professor Willian
Lima Rocha, pelo incentivo e pelo conhecimento transmitido, com sabedoria e
dedicação.
Aos meus amigos e familiares, que sempre me ajudaram,
transmitindo carinho e afeto nas horas em que mais precisei, nunca me
faltando, seja nas horas de alegria, ou nas de angústia.
4
DEDICATÓRIA
A Deus, o maior responsável por esta realização.
5
RESUMO
O presente trabalho tem por finalidade abordar o tema da
responsabilidade civil do fornecedor pelo fato do produto. Discorrendo sobre a
responsabilidade civil subjetiva e objetiva e sua aplicação no Código de Defesa
do Consumidor. Realizando um breve resumo sobre o conceito de consumidor
e os responsáveis pelo dever de indenizar, mediante o fato do produto,
proveniente dos defeitos de concepção, produção e informação e suas
possíveis excludentes.
6
SUMÁRIO
1. Introdução....................................................................................................07
2. Responsabilidade Civil................................................................................08
2.1.Conceito.................................................................................................................08
2.2. A distinção entre responsabilidade subjetiva e objetiva..................................08
2.3. A responsabilidade civil no Código de Defesa do Consumidor......................09
3. Consumidor .................................................................................................13
3.1. Código de Defesa do Consumidor, artigo 2º.....................................................13
3.2. Código de Defesa do Consumidor, artigo 2º, parágrafo único........................14
3.3. Código de Defesa do Consumidor, artigo 17.....................................................14
3.4. Código de Defesa do Consumidor, artigo 29.....................................................15
4. Responsáveis pelo Dever de Indenizar.....................................................17
4.1. Fabricante.............................................................................................................18
4.2. Produtor................................................................................................................19
4.3. Construtor.............................................................................................................20
4.4. Comerciante..........................................................................................................21
5. Defeito do produto.......................................................................................23
5.1. Defeitos de Construção ou Concepção.............................................................23
5.2. Defeitos de Fabricação ou Produção.................................................................24
5.3. Defeitos de Informação ou Comercialização.....................................................25
6. Causas de Exclusão da Responsabilidade...............................................27
6.1. A não colocação em circulação do produto......................................................27
6.2. A Inexistência do Defeito.....................................................................................28
6.3. A Culpa Exclusiva do Consumidor ou Terceiro................................................29
6.4. Caso Fortuito ou Força Maior.............................................................................31
7. Prescrição.....................................................................................................35
8. Conclusão.....................................................................................................37
9. Bibliografia.................................................................................................. 38
7
1. INTRODUÇÃO
O objetivo do presente trabalho é o estudo da responsabilidade
civil do fornecedor pelo fato do produto no Código de Defesa do Consumidor,
Lei 8.078, de 11.09.1990.
O crescimento econômico e as alterações radicais no sistema
distributivo dos produtos tiveram como conseqüência o aumento dos riscos ao
público consumidor, colocando-o em considerável desvantagem.
O presente trabalho discorre sobre a responsabilidade do
fornecedor como tal e enquanto tal, pelo fato de introduzir no mercado produto
defeituoso e causador de danos aos consumidores ou terceiros em geral. E,
ainda, as escusas para essas responsabilidades.
8
2. RESPONSABILIDADE CIVIL
2.1. Conceito
A responsabilidade civil, segundo a definição de Savatier1, é a
obrigação que pode incumbir uma pessoa a reparar o prejuízo causado a outra,
por fato próprio, ou por fato de pessoas ou coisas que dela dependam.
A violação de um dever jurídico configura ato ilícito, o que
acarreta dano para outrem, gerando, assim, um outro dever, o de reparar esse
dano.
Em sentido jurídico a responsabilidade civil é a obrigação de
reparar o dano ou de ressarci-lo, decorrente da violação de um outro dever
jurídico.
De certo que o dano causado pelo ato ilícito rompe o equilíbrio
jurídico-econômico pré-existente entre o agente causador e a vítima. Assim,
existe a necessidade de restabelecer o equilíbrio, recolocando o prejudicado no
statu quo, através de uma indenização fixada em proporção ao dano.
2.2. A distinção entre responsabilidade subjetiva e
responsabilidade objetiva
Diz ser responsabilidade subjetiva quando se inspira na idéia de
culpa, sendo o principal pressuposto da responsabilidade.
O art. 186 do Código Civil prescreve a culpa como fundamento da
responsabilidade subjetiva, cabendo a obrigação de reparação do dano,
somente, se provar a culpa do agente. De modo que a prova da culpa do
1 . Rodrigues, Silvio. Direito Civil. Volume 4. São Paulo: Editora Saraiva, 2002.
9 agente causador do dano é indispensável para que surja o dever de indenizar.
No caso sendo responsabilidade subjetiva, pois depende do comportamento do
agente.
O que não acontece com a responsabilidade objetiva, pois a
atitude culposa ou dolosa do agente causador do dano não tem relevância,
pois, desde que exista a relação de causalidade entre o dano experimentado
pela vítima e o ato do agente, surge o dever de indenizar.
Como bem discorre Sergio Cavalieri Filho:
“Risco é perigo, é probabilidade de dano,
importando, isso, dizer que aquele que exerce uma
atividade perigosa deve-lhe assumir os riscos e
reparar o dano dela recorrente. A doutrina do risco
pode ser, então, assim resumida: todo prejuízo deve
ser atribuído ao seu autor e reparado por quem o
causou, independentemente de ter ou não agido
com culpa. Resolve-se o problema na relação de
causalidade, dispensável qualquer juízo de valor
sobre a culpa do responsável, que é aquele que
materialmente causou o dano”.
2.3. A Responsabilidade Civil no Código de Defesa do
Consumidor
A responsabilidade civil imposta pelo sistema do CDC é objetiva,
independe de culpa. Basta, somente, a demonstração da existência de nexo
causal entre o dano experimentado pelo consumidor e o vício ou defeito no
serviço ou produto.
O CDC encampou como fundamento da responsabilidade do
fornecedor a teoria do risco da atividade ou do empreendimento, segundo a
10 qual aquele que explora atividade com o potencial de gerar danos a outrem
deve ser responsabilizado por tornar indenes as eventuais vítimas,
independentemente de haver vontade do fornecedor em produzir o dano.
Este dever é imanente ao dever de obediência às normas
técnicas e de segurança, bem como aos critérios de lealdade, quer perante os
bens e serviços ofertados, quer perante os destinatários dessas ofertas. A
responsabilidade decorre do simples fato de dispor-se alguém a realizar
atividade de produzir, estocar, distribuir e comercializar produtos ou executar
determinados serviços. O fornecedor passa a ser o garante dos produtos e
serviços que oferece no mercado de consumo, respondendo pela qualidade e
segurança dos mesmos.
Assim, a presença do aspecto subjetivo no elemento "culpa" do
tripé da responsabilidade civil (culpa + nexo de causalidade + dano), mostra-se
desnecessária, e nem mesmo chega a ser investigada para fins de apuração
da responsabilidade do agente. Ainda que ele tenha pautado sua atuação com
diligência, não incorrendo em culpa em momento algum, poderá vir a ser
responsável pelo acidente de consumo causado pelo produto ou serviço.
Contudo, uma exceção é feita para a responsabilidade subjetiva:
a responsabilidade aquiliana, pelo fato do serviço, dos profissionais liberais
depende da demonstração de culpa, conforme art. 14, §4º, CDC. A
responsabilidade contratual (pela adequação do serviço) é regulada pelo art.
20, do mesmo diploma, mas não há referência a qualquer exceção em favor
dos profissionais liberais.
Esse "privilégio", de somente responder se demonstrado o
elemento subjetivo, limita-se à responsabilização pessoal do profissional liberal,
não se estendendo às pessoas jurídicas formadas por eles. Diverge o
11 posicionamento de Rizzatto2, entendendo que "o que descaracteriza a
atividade como liberal não é a existência da pessoa jurídica, simplesmente,
mas a constituição de pessoa jurídica que passe a explorar a atividade que era
de prestação de serviços liberais de maneira típica desenvolvida na sociedade
de massa pelos naturais exploradores: escolha da atividade, exame de
mercado, cálculo do custo, do preço, avaliação do risco, tendo em vista o
binômio custo/benefício, prestação do serviço em escala e utilização dos
instrumentos do marketing, especialmente a publicidade".
Porém, a doutrina não encontra um consenso ao definir quem é
profissional liberal. Para Sergio Cavalieri Filho3 profissional liberal "é aquele
que exerce uma profissão livremente, com autonomia, sem subordinação. Em
outras palavras, presta serviço pessoalmente, por conta própria,
independentemente do grau de escolaridade".
Entendemos, outrossim, que a exceção inserida pelo parágrafo
quarto não autoriza a classificação das obrigações entre de meio e de
resultado para fins de expandir o rol dos salvaguardados por esta regra. A lei,
somente, faz referência aos profissionais liberais, e em momento algum
menciona o tipo da obrigação. Não obstante, a jurisprudência tem entendido
que a partir do momento que o profissional liberal assume uma obrigação de
resultado sua responsabilidade passa a ser objetiva; na verdade, seria mais
correto fundamentar a responsabilidade nessas hipóteses como vinculação do
fornecedor à oferta, conforme prevê o art. 30, CDC. Assim, estaremos no
campo da responsabilidade contratual (havendo descumprimento do
avençado), que é sempre objetiva.
2 NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor.2ª ed., São Paulo: Saraiva,2005.
3 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 6ª ed., São Paulo: Malheiros, 2005,
pág.518.
12 É oportuno mencionar que esse tratamento diferenciado dado aos
profissionais liberais se limita ao fundamento da responsabilidade, estando
sujeitos da mesma forma que os demais fornecedores a todas as demais
regras do CDC, tais como observância aos direitos básicos do consumidor
(inclusive quanto à inversão do ônus da prova), práticas comerciais e proteção
contratual do consumidor.
13
3. CONSUMIDOR
3.1. Código de defesa do consumidor, art. 2º
O Código de defesa do consumidor prevê quatro conceitos de
consumidor.
O CDC, em seu art. 2º, caput, dispõe, sobre o primeiro conceito,
de forma clara que “consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou
utiliza produto ou serviço como destinatário final”.
Segundo Claudia Lima Marques4 destinatário final é “o
consumidor final, o que retira o bem do mercado ao adquirir ou simplesmente
utilizá-lo (Endverbraucher), aquele que coloca um fim na cadeia de produção e
não aquele que utiliza o bem para continuar a produzir ou na cadeia de
serviço”.
No que atine a destinação final utilizada pelo caput do art. 2º, do
CDC, indaga Claudia Lima Marques: “Certamente, ser destinatário final é retirar
o bem de mercado (ato objetivo), mas e se o sujeito adquire o bem para utilizá-
lo em sua profissão, adquire como profissional (elemento subjetivo), com fim de
lucro, também deve ser considerado destinatário final?”5
Responde a citada autora: “Destinatário final é aquele destinatário
fático e econômico do bem ou serviço, seja ele pessoa jurídica ou física. Logo,
segundo, esta interpretação teleológica não basta ser destinatário fático do
produto, retirá-lo da cadeia de produção, levá-lo para o escritório ou residência,
é necessário ser destinatário final econômico, do bem, não adquiri-lo para
4 MARQUES, Claudia Lima. Comentários ao código de defesa do consumidor, 2ª ed., São Paulo:Editora Revista dos Tribunais, 2006. 5 MARQUES, Claudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor, p.141 – 153, 3ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999.
14 revenda, não adquiri-lo para uso profissional, pois o bem será novamente um
instrumento de produção”.6
3.2. Código de defesa do consumidor, art.2º, parágrafo único
O parágrafo único do art. 2º, do Código de defesa do consumidor
equipara a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis,
que haja intervindo ou se encontre sujeita ou propensa a intervir nas relações
de consumo.
O parágrafo único do citado artigo é uma extensão do campo de
aplicação do CDC, pois muitas pessoas, mesmo que não sejam consumidoras
stricto sensu, podem ser prejudicadas pelos defeitos dos produtos postos no
mercado. Essas pessoas podem intervir nas relações de consumo de outra
forma a ocupa uma posição de vulnerabilidade. Podemos citar como exemplo o
filho de um consumidor que ingere um produto defeituoso e adoece pelo fato
do produto.
3.3. Código de defesa do consumidor, art. 17
O art. 17, do CDC, discorre: “Para os efeitos desta Seção,
equiparam-se aos consumidores todas as vitimas do evento”.
Essa extensão se justifica pela gravidade dos acidentes de
consumo, que acarretam riscos à saúde e à integridade física de consumidores
e terceiros. Tendo como objetivo acolher todas as vítimas do evento danoso.
A definição de consumidor estatuída no art. 17, do CDC,
compreende as figuras do revendedor, do intermediário e do comerciante,
excluídas de proteção pela definição do art. 2º do mesmo diploma legal.
Portanto, nos chamados acidentes de consumo o conceito de consumidor é
6 Idem Ibidem, p. 142
15 ampliado para abranger todas as vítimas do evento, tenham participado ou não
das relações de consumo.
Assim, na responsabilidade pelo fato do produto, todas as vitimas
do evento, consumidores, comerciantes, intermediários ou terceiros, poderão
acionar o fornecedor pelos prejuízos causados pelo produto defeituoso.
Contudo, essa extensão do conceito de consumidor não ocorre
na responsabilidade por vícios do produto. Sendo aplicável o conceito previsto
no art. 2º do CDC, de modo que o comerciante e o intermediário não poderão
utilizar-se dos meios previstos no Código de Defesa do Consumidor contra o
fabricante ou produtor, devendo, nesse caso, recorrer à disciplina prevista no
Código Civil ou no Código Comercial.
3.4. Código de defesa do consumidor, art. 29
O quarto conceito de consumidor está disciplinado no art. 29, do
Código de Defesa do Consumidor.
Essa extensão do conceito equiparou aos consumidores todas as
pessoas determináveis ou não, expostas às praticas comerciais, isto é,
considera consumidor qualquer pessoa exposta às praticas comerciais que
dizem respeito à oferta, publicidade, praticas abusivas, cobranças de dívidas,
banco de dados e cadastro de consumidor previstas pelo CDC (art. 30 e 41),
bem como a proteção contratual quanto às clausulas abusivas e contratos de
adesão (arts. 46 a 54).
Impede-se esclarecer que a terminologia empregada pelo Código
de Defesa do Consumidor, no sentido de “equiparar-se” a consumidor todas as
pessoas expostas às praticas previstas, não quer dizer que exista qualquer
diferença de ordem prática entre consumidores “equiparados” por força do art.
16 29 e os outros consumidores conceituados por outros dispositivos do Código
de Defesa do Consumidor.
Atente-se que consumidor vem a ser qualquer pessoa física que,
isolada ou coletivamente, contrate para consumo final. Assim, há que se
equiparar o consumidor à coletividade que potencialmente esteja sujeita ou
propensa à referida contratação. Caso não fosse, deixaria a própria sorte os
consumidores “equiparados”, por exemplo, alvo de companhias publicitárias
enganosas ou abusivas, ou então sujeito ao consumo de produtos ou serviços
nocivos à sua saúde ou segurança.
17
4. RESPONSÁVEIS PELO DEVER DE INDENIZAR
O Código de defesa do consumidor, em seu art. 3º, definiu a
figura do fornecedor como “toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada,
nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que
desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, construção,
transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de
produtos ou prestação de serviços”.
Assim, são considerados fornecedores todos aqueles que
propiciem a oferta de produtos e serviços no mercado de consumo, de maneira
a atender as necessidades dos consumidores.
De certo, o fornecedor, na medida em que se trate de defeitos da
fabricação, de concepção ou de informação, em última análise, é a fonte real
do dano. É a figura que reúne as melhores condições para controlar a fonte de
perigo, prevenir a ocorrência de danos para terceiros e, estes ocorrendo,
suportar as conseqüências danosas do defeito.
De acordo com o Código de Defesa do Consumidor, podemos
destacar três figuras de fornecedor: o fornecedor real, fornecedor aparente e
fornecedor presumido.
O fornecedor real é a pessoa física ou jurídica que sob a sua
responsabilidade participa do processo de fabricação ou produção do produto
acabado. Na terminologia empregada no Código de Defesa do Consumidor, em
seu art. 12, seria o “fabricante, o produtor e o construtor, nacional ou
estrangeiro”.
O fornecedor aparente é aquele que, apesar de não ter
participado do processo de fabricação ou produção, se apresenta como tal pela
aposição no produto do seu nome, marca ou outro sinal distintivo. É essa
18 aparência, essa impressão de produção própria assim provocada que justifica e
fundamenta a extensão do conceito de produtor aparente.
O fornecedor presumido é a figura que importa os produtos, ou,
vende-os sem identificação clara do seu fabricante, produtor, incorporador ou
construtor.
O art. 12 do Código de Defesa do Consumidor, ao mencionar os
responsáveis pelo dever de indenizar pelo fato do produto, definiu as figuras do
fabricante, produtor, construtor e importador.
Nas hipóteses do artigo supramencionado, a lei não
responsabiliza indiscriminadamente o "fornecedor", mas as categorias do
gênero fornecedor. Assim, ocorrendo acidente de consumo, a lei atribui a
responsabilidade tão somente ao fabricante, ao construtor, ao produtor, e
solidariamente, quando for o caso, ao importador.
É importante, ainda, ressaltar que quando a lei designa o
fabricante, o construtor e também o importador, está apontando apenas o
responsável direto e, muito provavelmente, aquele a quem o consumidor
lesado dirigirá seu pleito. Porém, os outros produtores envolvidos indiretamente
não estão excluídos. São todos responsáveis solidários na medida de suas
participações, conforme os arts. 7º e 25, §§1º e 2º, do CDC.
4.1. O fabricante
O fabricante é a pessoa física ou jurídica que coloca no mercado
produtos industrializados, manipulados ou processados, acabados ou semi-
acabados. Esse conceito abrange os fabricantes que produzem os produtos
acabados, mas também, aqueles que produzem matéria-prima, componentes e
peças para serem utilizados na fabricação de outros bens.
19 Portanto, existe o fabricante final do produto, conhecido por
assembler, ou seja, aquele que detém o controle do processo produtivo
integrado, e o fabricante de fase, que produz a matéria-prima, componentes e
peças para serem incorporados nesses produtos.
Na definição de fabricante, é importante sublinhar, que também
estão abarcados os montadores, que utilizando produtos prontos criam um
novo, e o fabricante aparente, encontrado, sobretudo, no campo das licenças
de uso de marca comercial, como nas franquias – nessa situação, tanto o
fabricante aparente como o real, terão responsabilidade solidária pelos danos
causados ao consumidor, tanto os contratuais como os extracontratuais.
A divisão existente no processo de produção, entre fabricante de
fase e o assembler, não significa que haverá uma divisão na responsabilidade
pelo fato do produto que obrigue a vítima a distinguir entre o defeito do produto-
base ou do produto parcial, incorporado ao produto-base.
No caso de produtos compostos, a responsabilidade será do
fabricante final por ele controlar o processo produtivo integrado, dessa forma,
não podendo eximir-se da obrigação de indenizar, mesmo provando que o
defeito era do produto parcial incorporado ao produto final.
4.2. Produtor
Produtor é aquele que introduz no mercado produtos naturais ou
produtos não industrializados, sendo inovação trazida pelo Código de Defesa
do Consumidor a sua introdução no rol de responsáveis pelo dever de
indenizar.
20 4.3. Construtor
O “construtor” é o responsável pela introdução no mercado de
produtos imobiliários. O construtor é aquele que por intermédio de um contrato
por empreitada obriga-se a executar determinada obra ou trabalho, mediante
preço determinado, calculado por unidade de medida ou para a obra completa
a executar-se, com material próprio ou fornecido pela outra parte.
O construtor de materiais e execução responde durante cinco
anos pela solidez e segurança do trabalho, tanto em razão dos materiais como
do solo. A garantia é necessária, tendo em vista que determinadas edificações
não revelam desde logo os seus vícios. Sendo que essa responsabilidade
pressuponha um vício de construção que afete um edifício ou outra obra
considerável, como exemplo pontes, viadutos, represas. Alem disso, os vícios
devem comprometer a estrutura e a segurança do prédio, de modo a criar um
estado de insegurança quanto à possibilidade de ruína. O construtor responde,
ainda, pelos danos causados à saúde e à segurança do consumidor por
defeitos na obra.
4.4. Importador
O importador introduz no mercado do país produtos
industrializados ou naturais. Ele não atua direto no processo produtivo,
entretanto, foi equiparado ao fabricante e produtor com a finalidade de facilitar
o ressarcimento dos prejuízos sofridos pelo consumidor decorrente pelo fato do
produto. O consumidor afetado por um produto defeituoso terá dificuldade em
acionar um fabricante estrangeiro e, desse modo, o nosso diploma legal
permite que o consumidor responsabilize e acione o importador por danos que
decorram de um defeito que advêm de uma falha no âmbito de sua atividade
(armazenamento, acondicionamento, transporte, etc) ou que tenha origem no
processo de fabricação.
21 4.5. Comerciante
O comerciante é também responsável pelo dever de indenizar o
consumidor pelos prejuízos causados. Entretanto, a sua responsabilidade é
eventual e especial, sendo objetivamente responsabilizado sempre que se
configurar uma das hipóteses elencadas no art. 13, do CDC.
Essa eventualidade e especialidade são justificadas pelo fato do
fabricante e produtor serem os verdadeiros introdutores do risco no mercado,
ao colocar produtos defeituosos em circulação.
Em determinadas circunstâncias, o comerciante é
responsabilizado pelos danos causados aos consumidores por produtos
defeituosos, objetivando, assim, maior garantia à vítima de ser ressarcida dos
prejuízos amargados. Pois, havendo dúvida quanto ao momento da
deterioração do produto, o melhor entendimento, no sentido de garantir a
proteção do consumidor (art. 6º, VI), é defender a solidariedade entre todos os
participantes da cadeia produtiva.
Sergio Cavalieri Filho, apresenta a responsabilidade do
comerciante da seguinte forma:
“O Código, em seu art. 13, atribui-lhe apenas uma
responsabilidade subsidiária. Pode ser responsabilizado
em via secundária quando o fabricante, o construtor, o
produtor ou o importador não puderem ser identificados;
o produto for fornecido sem identificação clara do seu
fabricante, produtor, construtor ou importador ou –
hipótese mais comum – quando o comerciante não
conservar adequadamente os produtos perecíveis. São
22 Casos, como se vê, em que a conduta do comerciante
concorre para o acidente de consumo, merecendo
destaque os chamados “produtos anônimos” – legumes e
verduras adquiridos no supermercado sem identificação
da origem; os produtos mal-identificados e aqueles
outros produzidos por terceiros mas comercializados
com a marca do comerciante”.7
7 Sergio Cavalieri, ob. cit., p. 505
23
5. DEFEITO DO PRODUTO
Produto é qualquer bem, consumível fisicamente ou não, móvel
ou imóvel, novo ou usado, material ou imaterial, fungível ou infungível, principal
ou acessório – art. 3º, § 1º, CDC.
É pressuposto essencial da responsabilidade do fornecedor que o
produto seja defeituoso, ou seja, no momento em que foi colocado no mercado
apresente um defeito potencial ou real e que esse defeito seja a causa do
dano.
O art.12, do Código de defesa do consumidor, descreve o defeito
do produto como fato gerador da responsabilidade do fornecedor: “O
fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador
respondem, independentemente de culpa, pela reparação dos danos causados
aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção,
montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de
seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre
sua utilização e riscos”. Defeitos tais, que podem ser de construção, fabricação
e informação.
Ressalte-se que defeito do produto deve ser compreendido não
apenas inerente ao produto em si, mas de forma mais abrangente como os
defeitos de concepção, os defeitos de fabricação ou os defeitos de informação.
Assim, também poderá ser causa do fato do produto ou do serviço à
informação ou a publicidade insuficiente ou enganosa.
5.1. Defeito de construção ou concepção
Esses defeitos derivam de um erro na projeção, da escolha
inadequada de materiais, ou, ainda, de uma técnica de fabricação.
24 São características dos defeitos de construção ou concepção, a
evitabilidade e a extensão de defeito a totalidade da produção ou, ao, menos,
aos exemplares das series produzidas, apresentando, com isso, elevada
potencialidade.
Como exemplo de defeito de construção ou concepção podemos
citar os danos causados, por explosão de veículo, devido o posicionamento
inadequado do tanque de gasolina, que tornava o veículo mais suscetível a
esse risco no caso de colisão.
Para melhor exemplificarmos o defeito de concepção,
colacionamos o seguinte julgado:
“Consumidor – Responsabilidade pelo fato do
produto – Veículo projetado de forma que facilita a
desativação do alarme e conseqüentemente o furto –
Presunção de defeito de criação do produto não
desfeita, através de prova robusta, pelo fabricante –
Responsabilidade do fabricante reconhecida –
Exegese do art. 12 do CDC. (...) 2. O comerciante só
deveria ser responsabilizado quando inexiste qualquer
das hipóteses previstas no art. 13 do CDC. Inocorrência
no presente caso. Apelações improvidas. (TJRS – 6ª
Câm. Cív. – Ap. Cív. 598173094 – rel. Des. Marilene
Bonzanini Bernadini – j. 10.11.1999).
5.2. Defeitos de fabricação ou de produção
Os defeitos de fabricação ou produção existem durante o
processo de fabricação e que se apresentam em um ou poucos exemplares de
uma série. São considerados defeitos típicos do moderno método de fabricação
em serie decorrentes da padronização e automatização da produção.
25 Geralmente, são causados por erros dos empregados ou falhas de máquinas
no processo produtivo.
Sua identificação não é difícil, bastando, apenas, comprar o
produto defeituoso com outros exemplares da mesma série ou linha de
produção.
5.3. Defeitos de informação ou comercialização
Existe o defeito de informação quando há falta, insuficiência ou
inadequada informação, advertência ou instruções sobre o seu uso e perigos
conexos. Dessa forma, a ausência, insuficiência ou inadequação de informação
pode recair sobre o modo de emprego do produto ou eventual perigo que o uso
comporta.
Os defeitos de informação ocorrem quando o fabricante não
comunica ao consumidor que o produto, mesmo que seja fabricado em
conformidade com os padrões exigidos, apresenta determinada periculosidade
em relação a certas modalidades de uso ou condições.
O defeito de informação não é intrínseco ao produto, porém a
insuficiência ou a errônea informação sobre o uso adequado do produto
caracteriza-o como defeito formal.
A oferta, a publicidade e a informação podem causar danos ao
patrimônio do consumidor, se forem inadequadas, insuficientes, ou mesmo
inexistentes ou inverídicas. Assim, expande-se a aplicação da responsabilidade
extracontratual regulada pelo art. 12, do CDC, abrangendo aqueles que
veicularam a oferta, publicidade ou informação danosa.
Os julgados colacionados demonstram os defeitos de informação
ou comercialização:
26 “Código de Defesa do Consumidor – Lata de Tomate
A. – Dano na abertura da lata – Responsabilidade
civil do fabricante. O fabricante de massa de tomate
que coloca no mercado produto acondicionado em latas
cuja abertura requer certos cuidados, sob pena de risco
à saúde do consumidor, e sem prestar a devida
informação, deve indenizar os danos materiais e morais
daí resultantes. Rejeitada a denunciação da lide à
fabricante da lata por falta de prova. Recurso não
conhecido. (STJ – 4ª. T. – REsp 237964/SP – rel. Min.
Ruy Rosado de Aguiar – j. 16.12.1999).
“Responsabilidade civil – Fabricante – Fornecimento
de produto – Periculosidade adquirida – Risco
imprevisível – Defeito do produto – Explosão de
garrafa de refrigerante gaseificada. O fabricante de
refrigerante gaseificado acondicionado em garrafa
responde pelos danos ao consumidor decorrentes da sua
explosão em razão da ausência de informação quanto à
possibilidade deste risco em caso de manutenção
inadequada. O defeito do produto se deve ao fato de que
a periculosidade, no caso, desborda da expectativa
legítima do consumidor. (TJRS – 5ª Câm. Cív. – Ap. Cív
595124314 – rel. Des. Maria Isabel de Azevedo Souza –
j. 28.09.1995).
Logo, concluímos que o defeito do produto é pressuposto
essencial para a exigibilidade da responsabilidade pelo fato do produto.
27
6. CAUSAS DE EXCLUSÃO DA RESPONSABILIDADE
Como a lei estabelece como regra a responsabilidade objetiva,
sendo irrelevante o elemento culpa, não cabe a discussão da culpa do
fornecedor na ocorrência do evento danoso.
Assim, cabe ao fornecedor demonstrar a inexistência do dano, do
ato antijurídico, ou do nexo causal entre eles, por mais taxativo que possa
parecer o rol do art. 12, §3°, e art.14, §3°, do CDC, não é verdade que a lei não
admite outras hipóteses para se excluir a responsabilidade do fornecedor; oras,
demonstrado que não houve dano ou que não foi o fornecedor apontado quem
praticou o ato antijurídico causador do dano, não há que se falar em
responsabilidade, ainda que essas situações não estejam elencadas na lei.
6.1. A não colocação em circulação do produto
O produto é posto em circulação no momento em que o
fornecedor, consciente e voluntariamente, o lança no mercado para
comercialização.
Não há que se falar em responsabilidade do fornecedor quando
ele demonstra não ter colocado o produto no mercado. Por meio dessa
disposição a lei cria uma presunção de que o fornecedor introduziu o seu
produto no mercado.
A introdução do produto no mercado contra a vontade do
fornecedor exonera-o da responsabilidade prevista no Código de Defesa do
Consumidor. Muito embora permanecendo a possibilidade de ser
responsabilizado por negligência, culpa in vigilando, com fundamento no art.
186 do Código Civil / 02.
28 As hipóteses subsumidas na causa de exclusão de
responsabilidade mencionada seriam aquelas relacionadas com a falsificação,
furto ou roubo de produtos, introduzidos no mercado, contra a vontade do
fornecedor.
Outrossim, o fornecedor será responsável também por produtos
distribuídos a título gratuito, como a entrega de bens a seus empregados,
promoções publicitárias, ou, ainda, doação de bens destinados a vítimas de
catástrofes.
6.2. A inexistência do defeito
Outra situação que leva à irresponsabilidade é a demonstração
por parte do fornecedor que o alegado defeito do produto inexiste, em outras
palavras, é a demonstração de que não foi praticado ato antijurídico pelo
fornecedor.
Inexistindo o defeito, o fornecedor não será responsabilizado
pelos prejuízos ocasionados pelo produto. Entretanto, a prova da inexistência
do defeito compete ao fornecedor, devendo demonstrar a inexistência na
ocasião da colocação do produto em circulação.
Contudo, o rigor do ônus da prova a cargo do fornecedor deve ser
mitigado. Na valoração da prova, deve o juiz atender a algumas circunstâncias,
como: o tipo da coisa; a natureza do defeito; o tempo decorrido entre o
momento da sua colocação em circulação e a ocorrência do dano.
Em relação ao tempo decorrido entre o momento da sua
colocação em circulação e a ocorrência do dano, devemos atentar que o rigor
na análise da prova da inexistência do defeito será inversamente proporcional
ao tempo decorrido entre o momento da colocação do produto e a ocorrência
29 do dano. Assim, se o dano ocorreu anos após a introdução do produto no
mercado, razoável atenuar o rigor da prova a ser produzida pelo fornecedor da
inexistência do defeito.
Para ilustrar a exclusão de responsabilidade pela inexistência do
defeito, colacionamos o seguinte julgado:
“Responsabilidade civil – produto dow corning –
prótese mamária – ação de classe – Prova técnica e
responsabilidade pelo fato do produto. A Class action,
aforada perante a justiça americana, não cria
dependência, nem subordina a instância judicial
brasileira à estrangeira (arts. 254 e 90, CPC). A prova
que não identifica defeito do produto, como sendo o
ponto determinante do nexo de causalidade entre o fato
e o resultado reclamado, não autoriza provimento
jurisdicional condenatório. Recurso provido (TJRS – 1ª
Câm. Cív. – ap. Cív. 59819395 – rel. des. Clarindo
Favretto – j. 04.02.1999).
6.3. A culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro
O sistema do CDC prevê a exoneração na hipótese do art. 12, §
3º, de culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.
Essa excludente, somente, é aplicável no caso de culpa exclusiva
do consumidor ou terceiro, pois se o fornecedor fosse concorrente, essa
excludente não seria aplicável, respondendo pela integralidade do dano
causado.
Segundo Sergio Cavalieri Filho, “fala-se em culpa exclusiva da
vítima quando a sua conduta se erige em causa direta e determinante do
30 evento, de modo a não ser possível apontar qualquer defeito no produto ou no
serviço como fato ensejador da sua ocorrência. Se o comportamento do
consumidor é a única causa do acidente de consumo, não há como
responsabilizar o produtor ou fornecedor por ausência de nexo de causalidade
entre a sua atividade e o dano8”.
Podemos exemplificar como culpa exclusiva do consumidor, o
uso de medicamento em doses inadequadas, contrariando prescrição médica.
Assim, não podemos responsabilizar o fornecedor de medicamentos, pois os
danos não foram causados pelo defeito do produto.
Contudo, se o comportamento do consumidor não for a única
causa do acidente de consumo, mas concorre para ele há que se falar em
culpa concorrente. Nossa jurisprudência entende que mesmo em sede de
responsabilidade objetiva é possível a participação da vítima na produção do
resultado. Porém, o entendimento não é pacificado, havendo alguns
doutrinadores, entre eles, Zelmo Denari, que sustentam que a lei discorrendo
sobre a culpa exclusiva como causa extintiva de responsabilidade, embora
caracterizada a concorrência de culpa, persistirá a responsabilidade integral do
fornecedor.
Segundo Sergio Cavalieri Filho9, sobre a concorrência de culpa,
“temos sustentado que a concorrência de culpas pode ter lugar na
responsabilidade objetiva disciplinada pelo Código do Consumidor desde que o
defeito do produto ou serviço não tenha sido a causa preponderante do
acidente de consumo”.
Decerto que, a culpa do consumidor perde toda expressão desde
que demonstrado que sem o defeito do produto o dano não teria ocorrido.
8 Idem, ibidem. 9 Idem, ibidem.
31 Nosso Tribunal já se posicionou nesse sentido, conforme o
julgado colacionado:
“Código de Defesa do Consumidor –
Responsabilidade do fornecedor – Culpa concorrente
da vítima – Hotel – Piscina – Agência de viagens.
Responsabilidade do hotel que não sinaliza
convenientemente a profundidade da piscina, de acesso
livre aos hóspedes – Art.14 do Código de Defesa do
Consumidor. A culpa concorrente da vítima permite a
redução da condenação imposta ao fornecedor – Art. 12,
§ 2º, III, do Código de Defesa do Consumidor”. (STJ – 4ª.
T. – REsp 287.849/SP – rel. Min. Ruy Rosado de
Aguiar).
6.4. Caso fortuito ou força maior
É de se notar que o Código não menciona o caso fortuito e a
força maior como excludentes da responsabilidade. Segundo a lição de Nelson
Nery Jr., nem o poderia fazer, ou derrubaria toda a sua coerência interna, visto
que são situações que eliminam a culpa:
"O caso fortuito e a força maior não excluem o dever de
indenizar porque são circunstâncias que quebram o nexo de
causalidade na conduta do agente. Só são válidas para excluir
a responsabilidade subjetiva, mas não a objetiva. Como o
sistema do CDC é fundado na responsabilidade objetiva, não
se aplicam, aqui, o caso fortuito e a força maior como
excludentes do dever de indenizar. Caso fortuito e força maior
32 excluem a culpa, elemento estranho e irrelevante para a
fixação do dever de indenizar no regime do CDC10".
Ocorre que a colocação do caso fortuito ou de força maior como
excludente da culpabilidade não encontra amparo entre os doutrinadores da
área obrigacional, que dão solução diversa à questão.
Caio Mário tende a colocar o caso fortuito ou de força maior fora
do campo da culpa:
"A tese central desta escusativa está em que, se a
obrigação de ressarcimento não é causada pelo fato do
agente, mas em decorrência de acontecimento que
escapa ao seu poder, por se filiar a um fator estranho,
ocorre a isenção da própria obrigação de compor as
perdas e danos. Neste sentido é que alguns autores
somente consideram como escusativa a força maior
externa (Philippe Le Tourneau, Agostinho Alvim). Por tal
razão, não se enquadram na força maior os fatos que
sejam direta ou indiretamente inerentes a ela, como a
ruptura dos freios do veículo, o furo do pneu ou o
rompimento da barra de direção (Alex Weill e François
Terré, Droit Civil, Les Obligations, nº 731, p. 740).
Invocando a teoria inglesa da frustration, Malaurie e
Aynès enunciam uma fórmula genérica para definir a
força maior como um acontecimento irresistível,
imprevisível e exterior (Droit Civil, Les Obligations, nº
10 NERY JUNIOR, Nelson. Código de processo civil comentado e legislação processual civil extravagante vigente. 3ª ed., São Paulo: RT. 1998.
33 477), conceito expendido também por Philippe Le
Tourneau, Responsabilité Civile, nº 383, p. 157)11".
Mais adiante, o autor resume a posição de Agostinho Alvim,
pertinente o presente estudo:
"Agostinho Alvim, um tanto na linha de Colin e Capitant,
vê no caso fortuito um impedimento relacionado com a
pessoa do devedor enquanto que a força maior é um
acontecimento externo (Da Inexecução das Obrigações,
nº 208). Daí extrai conclusões de ordem prática: na teoria
da culpa o caso fortuito exonera o agente, e com maioria
de razão a força maior o absolverá. Para os que se atêm
à doutrina do risco, o simples caso fortuito não exime o
agente, somente estará liberado este se ocorrer o
acontecimento de força maior, ou seja, ‘o caso fortuito
externo’. Nesta hipótese, acrescenta ele, os fatos que
exoneram vêm a ser: culpa da vítima, ordens das
autoridades (fait du prince), fenômenos naturais (raio,
terremoto) ou quaisquer outras impossibilidades de
cumprir a obrigação por não ser possível evitar o fato
derivado da força externa invencível: guerra, revolução
etc. Adverte, entretanto, Agostinho Alvim que, mesmo
nestes casos, ‘é preciso indagar se o fato não é devido a
qualquer culpa do autor do dano, ainda que indireta ou
remota, como no caso de morte pelo raio’ (Da
Inexecução das Obrigações, nº 208)".12
Seguindo essa doutrina, Sergio Cavalieri Filho, refuta a
impossibilidade de se invocar o caso fortuito como excludente da
responsabilidade, pois assim se estaria impondo "uma responsabilidade
objetiva fundada no risco integral, da qual o Código não cogitou". O autor dá a
seguinte solução à questão: 11 PEREIRA, Caio Mario da silva. Responsabilidade Civil. 9ª ed, Rio de Janeiro: Forense,1999. 12 Caio Mário, responsabilidade civil, nº 244, p.303-304
34 "O fortuito interno, assim entendido o fato imprevisível e,
por isso, inevitável ocorrido no momento da fabricação
do produto ou da realização do serviço, não exclui a
responsabilidade do fornecedor porque faz parte da sua
atividade, liga-se aos riscos do empreendimento,
submetendo-se à noção geral de defeito de concepção
do produto ou de formulação do serviço. Vale dizer, se o
defeito ocorreu antes da introdução do produto no
mercado de consumo ou durante a prestação de serviço,
não importa saber o motivo que determinou o defeito; o
fornecedor é sempre responsável pelas suas
conseqüências, ainda que decorrente de fato
imprevisível e inevitável.
"O mesmo já não ocorre com o fortuito externo, assim
entendido aquele fato que não guarda nenhuma relação
com a atividade do fornecedor, absolutamente estranho
ao produto ou serviço, o que, a rigor, já estaria abrangido
pela primeira excludente examinada – inexistência de
defeito (art. 14, §3º, I)."13
De qualquer forma, entendemos equivocada a opinião daqueles
que vêem no caso fortuito uma hipótese de exclusão da culpabilidade, e,
portanto, incompatível com o sistema de defesa do consumidor. É, conforme
exaustivamente debatido pelos citados autores acima, excludente do nexo de
causalidade, podendo, apesar do silêncio legislativo, ser invocada pelo
fornecedor para se eximir da responsabilidade de reparar o dano.
Não obstante, acompanhamos o entendimento de que o fortuito
interno está abrangido pela teoria do risco da atividade adotada pela legislação
do consumo, não podendo ser invocado como excludente da responsabilidade.
13 Sergio Cavalieri, ob. cit., p. 513
35
7. PRESCRIÇÃO
A prescrição da pretensão à reparação dos danos causados por
fato do produto é disciplinada no art. 27, do Código de Defesa do Consumidor.
Pelo artigo supramencionado, o prazo prescricional único para
todos os acidentes de consumo é de cinco anos.
A contagem desse prazo inicia-se com a presença simultânea de
três requisitos: o conhecimento do dano, o conhecimento de sua autoria e o
conhecimento do defeito.
O objetivo da combinação desses critérios é a proteção da vitima,
que, nuns casos, pode ter conhecimento do dano e do defeito, mas não da
identidade do fornecedor responsável, e, noutros casos, pode conhecer do
dano e a identidade do fornecedor, mas só mais tarde saber que o dano resulta
de um defeito do produto.
A contagem do prazo prescricional a partir do conhecimento do
dano, do defeito e da identidade do fornecedor pode representar, a propositura
da ação anos e anos após a colocação do produto no mercado, dificultando a
prova da inexistência do defeito no produto por parte do fornecedor.
Dessa forma, nossa jurisprudência deve corrigir essa distorção e,
baseando-se, na média de vida útil do produto, construir presunções que
auxiliem o fornecedor na prova da inexistência do defeito. Assim, quanto mais
próximo estiver o produto do término de sua vida útil, razoável aceitar-se a
mera plausibilidade da inexistência do defeito, aplicando-se o disposto no art.
12, § 3º, II, que, devendo ser plenamente observado quando o produto estiver
no início de sua vida útil.
36 O Código de Defesa do Consumidor não estabelece prazo para o
devedor solidário exercer seu direito de regresso previsto no art. 13, parágrafo
único. Assim, prevalece o prazo previsto no art. 27, isto é, de cinco anos para
exercer o referido direito. Cabendo lembrar que o Código de Defesa do
Consumidor introduziu fato novo nas relações entre fabricantes de fase e
fabricantes finais, tornando-os responsáveis solidários perante as vítimas do
evento.
As causas de suspensão e interrupção do prazo prescricional,
relativas ao fato do produto são aquelas previstas no Código Civil.
37
8. CONCLUSÃO
A proteção do consumidor tornou-se imperativa, devido ao
declínio do mercado de concorrência e pela inadequação do direito tradicional,
tendo em vista que o ideário liberal individualista era hostil à proteção do
consumidor.
Sendo quatro eixos principais da proteção do consumidor:
proteção contra práticas comerciais desleais e abusivas; informação, formação
e educação do consumidor; representação, organização e consulta; proteção
do consumidor contra produtos defeituosos e perigosos.
A responsabilidade civil do fornecedor está inserida neste último
eixo, representando um dos mais significativos aspectos da proteção do
consumidor, objetivando reparar o consumidor dos danos sofridos pelos
produtos defeituosos.
Antes da promulgação da Lei 8.078/90, a responsabilidade civil
do fornecedor, na ausência de legislação especifica, era disciplinada pelas
normas previstas no Código Civil.
Essa insuficiência normativa criou a necessidade da adoção de
normas de maior responsabilidade dos fornecedores, o que acabou por ocorrer
com a promulgação da Lei 8.078 de 11.09.1990.
De certo que a proteção do consumidor começa a ser efetiva.
Contudo temos, ainda, um longo caminho a percorrer até alcançar o que foi
desejado pelo Código de Defesa do Consumidor.
38
9. BIBLIOGRAFIA
CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 6ª ed., São
Paulo: Malheiros, 2005.
MARQUES, Cláudia Lima. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor.
São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2006.
NEGRÃO, Theotonio. Código de Processo Civil e Legislação Processual em
Vigor. 36ª ed., São Paulo: Saraiva, 2004.
NERY JUNIOR, Nelson. Código de Processo Civil Comentado e Legislação
Processual Civil Extravagante Vigente. 3ª ed., São Paulo: Revistas dos
Tribunais, 1998.
NORONHA, Fernando. Direito das Obrigações, volume 1. São Paulo: Saraiva,
2003.
LEÃES, Luiz Gastão Paes de Barros. A Responsabilidade do Fabricante pelo
Fato do Produto. São Paulo: Saraiva, 1987.
NUNES, Luiz Antônio Rizzatto. Comentários ao Código de Defesa do
Consumidor. 2ª ed., São Paulo: Saraiva, 2005.
RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. Volume 4. São Paulo: Saraiva, 2002.
PEREIRA, Caio Mario da Silva. Responsabilidade Civil. 9ª ed., Rio de Janeiro:
Forense, 1999.
SILVA FILHO, Artur Marques da. Código do Consumidor – Responsabilidade
civil pelo Fato do Produto e do Serviço. RT/666. São Paulo: RT, 1991.