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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU IAVM A ADOÇÃO HOMOAFETIVA NO PROCESSO CIVL Leonardo Luís Vaz Lopes Orientador Prof. José Roberto Rio de Janeiro Setembro de 2012

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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU

IAVM

A ADOÇÃO HOMOAFETIVA NO PROCESSO CIVL

Leonardo Luís Vaz Lopes

Orientador

Prof. José Roberto

Rio de Janeiro

Setembro de 2012

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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU

IAVM

A ADOÇÃO HOMOAFETIVA NO PROCESSO CIVIL.

Apresentação de monografia ao instituto A

vez do Mestre – Universidade Cândido

Mendes como requisito parcial para

obtenção do grau de especialista em

Processo Civil.

Por: Leonardo Luís Vaz Lopes

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente a Deus, meus pais, minha

irmã, minha noiva e aos meus amigos.

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DEDICATÓRIA

Queria dedicar esse trabalho ao meu

cunhado José Carlos (in memorian) que

sempre me incentivou na minha carreira e foi

o percursor para que eu fizesse direito.

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RESUMO

A presente monografia propõe uma análise acerca da adoção homoafetiva. O Direito de Família é um ramo jurídico que vem sendo construído através das diversos julgados posicionados de forma semelhante e coerente com os objetivos desejados pela sociedade. Objetiva-se como essa pesquisa analisar o instituto da adoção e sua aplicação no direito de família, focando especialmente a questão do reconhecimento da união homoafetiva como entidade familiar. É bastante comum verificar casais homossexuais, com o intuito de constituírem família, optarem pela adoção, chamada de adoção homoparental.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÂO.................................................................................................. 07

1. GERAÇÕES DE DIREITOS E PRINCÍPIOS

1.1. Gerações de direito...................................................................................... 09

1.2. Princípio da igualdade ............................................................................... 12

1.3. Princípio da dignidade da pessoa humana................................................. 15

1.4. Princípio do acesso à justiça........................................................................ 18

2. ASPECTOS CONSTITUCIONAIS DA UNIÃO ESTÁVEL

2.1. A união estável entre homem e a mulher................................................... 22

2.2. A união homoafetiva e o parágrafo 3° do artigo 226 da Constituição....... 22

3. A ADOÇÃO HOMOAFETIVA

3.1. Direitos garantidos: em sede administrativa............................................... 25

3.2. Do procedimento de adoção...........................................................

3.3. Efeitos da adoção.........................................................................

3.4. O princípio do melhor interesse da criança......................................

3.5. Adoção por casais homoafetivos...........................................................

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4. CONSIDERAÇÕES FINAIS ..............................................................

REFERÊNCIAS..............................................................................................

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem como objetivo de garantir a adoção homoafetiva, proveniente da

união estável homoafetiva. Desta forma, como é cediço na ciência jurídica, o direito acompanha

os fatos sociais, surgindo às normas jurídicas de condutas reiteradas da sociedade, condutas estas

que sempre deságuam em projetos e na elaboração de leis para prevenir ou resguardar direitos

dos indivíduos, buscando-se, desta forma, a segurança jurídica nas relações entre o Estado e o

indivíduo ou somente entre indivíduos.

Portanto, quando o Estado representado por seus legisladores fecha os olhos para os fatos

sociais ocorridos de forma reiterada, sobretudo àqueles que trazem significantes mudanças no

mundo jurídico, acaba ocasionando injustiças e desigualdades entre os envolvidos naquela

relação.

Aqueles que elaboram as leis não devem levar em conta questões filosóficas ou

religiosas, ou seja, o direito deve acolher os indivíduos de forma igualitária, sem qualquer

discriminação por cor, raça, porque se assim o fizerem, estará mitigando, ou até mesmo

suprimindo direitos eminentemente importantes para a segurança das relações interpessoais.

O significado do acesso à justiça também tem relação com o reconhecimento dos fatos

sociais de forma plena, principalmente quando estes fatos se tornam valores sociais,

transpassando, desta forma, para normas sociais de garantia de direitos, sejam estes direitos

patrimoniais ou não. Portanto, quando o Estado não reconhece direitos que estão explícitos no

meio social, fornecendo garantias jurídicas e segurança para os envolvidos direta e

indiretamente, estará o Estado de forma omissa suprimindo o direito constitucional garantido do

acesso à justiça.

É importante salientar sobre o reconhecimento da sociedade homoafetiva como entidade

familiar, como também pela adoção realizadas pelos homossexuais, pois possui uma grande

relevância para o mundo jurídico, ou seja, trará maior segurança para o patrimônio amealhado

entre os conviventes no lapso da relação homoafetiva, bem como garantirá os direitos

sucessórios do companheiro do falecido como também para os adotados, sobretudo para uma

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divisão equânime e justa com os outros herdeiros do falecido, fato este que não acontece

atualmente.

Insta destacar, ainda, que o reconhecimento da referida entidade familiar possui grande

relevância para a sociedade, trazendo garantias constitucionais para todos os cidadãos, sem

qualquer tipo de preconceito ou conservadorismo que intensifiquem direitos expressos na

Constituição Federal, principalmente porque estes mesmos direitos são garantidos a outros tipos

de entidade familiar, tendo como exemplo a união estável e a família monoparental.

Em suma, o presente trabalho tem como objetivo a segurança jurídica e social que traria

o reconhecimento da adoção por homoafetivos, os princípios constitucionais da Isonomia, da

Dignidade da Pessoa Humana e do Acesso à Justiça, garantido as todos os cidadãos brasileiros.

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1. GERAÇÕES DE DIREITOS E PRINCÍPIOS

Através do presente capítulo pretende-se esclarecer alguns aspectos e sobre a geração de

direitos, em especial os direitos fundamentais que passaram por uma evolução histórica e sobre

alguns dos principais princípios constitucionais.

1.1. GERAÇÕES DE DIREITOS

Os direitos fundamentais passam por uma evolução histórica, sendo relevante para o

presente trabalho fazer uma síntese desta evolução. Os direitos consagrados pela revolução

francesa de 1789 são os direitos de primeira geração, tendo como características o

individualismo, no qual se preza o indivíduo, e, o não intervencionismo estatal nas relações

sociais, sendo as partes livres para contratar. Em relação à preservação da liberdade individual,

“o sujeito de direitos é o indivíduo, e o seu objeto, a liberdade”.1 Por conseguinte, tratava-se de

direito que garantia a liberdade que somente poderia ser limitada pela lei, expressão da vontade

geral, principalmente em função do interesse comum2. Ocorre que o pressuposto deste direito de

primeira geração era a igualdade formal, a qual somente privilegiava a minoria burguesa,

havendo na verdade muita desigualdade social.

Conseqüentemente, os direitos econômicos, sociais e culturais, expressos nos textos

constitucionais a partir da Constituição de Weimar, de 1919, são ditos como direitos de segunda

geração. Desta forma, busca-se atitudes do Estado, para promover a igualdade, não a simples

igualdade formal de todos frente à lei, mas a “igualdade material de oportunidades, ações e

resultados entre partes ou categorias sociais desiguais, protegendo e favorecendo juridicamente

os hipossuficientes em relações sociais específicas, como as relações de trabalho, de consumo

etc”.3 Com isso os direitos de segunda geração, busca-se igualar os desiguais na medida que se

desigualam.

Já os direitos de terceira geração, surgiram após a Segunda Guerra Mundial, assegurando

a dignidade da pessoa humana. Segundo Maria Berenice Dias, “são direitos que compõem a

1 DIAS, Maria Berenice. União homossexual: o preconceito & a justiça. 3. ed. atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006, p. 71. 2 Ibid., p. 72 3 Ibid., p. 72

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dignidade pessoal e constituem a condição humana, cuja valoração resulta nos valores fundantes

da humanidade.”4 Insta destacar que o direito de terceira geração teve como pressuposto o

reconhecimento das desigualdades materiais.

È importante mencionar as palavras de Sérgio Resende quando diz que: “ninguém pode

realizar-se como ser humano se não tiver assegurado o respeito ao exercício da sexualidade,

conceito que compreende tanto a liberdade sexual como a liberdade à livre orientação sexual.”5

Por conseguinte, com uma visão desdobrada dos direitos, nota-se que a sexualidade é um direito

de primeira geração. Destaca-se que a liberdade compreende o direito a liberdade sexual, aliado

ao direito de tratamento igualitário, independente da tendência sexual.6 Com isso, não se pode

admitir o desrespeito aos direitos dos homossexuais em razão de orientação sexual, sendo a

sexualidade um direito natural que acompanha o indivíduo desde o seu nascimento.

Observa-se, ainda, que a livre orientação sexual também é um direito de segunda geração,

por conseguinte, em razão da discriminação e preconceito que são vítimas os homossexuais dão

origem a uma categoria social digna de proteção.7 Com isso, é imperioso que haja uma proteção

aos direitos dos homossexuais nas sociedades homoafetiva.

Importante mencionar que os homossexuais também são hipossuficientes, tendo em vista

que sempre foram alvos de exclusão social. Oportuno relatar que a hipossuficiência social é

gerada por preconceitos e discriminações8, desaguando pela via reflexa na hipossuficiência

jurídica. Tal assertiva pode ser comprovada nos dias de hoje, principalmente quando os

homossexuais buscam seus direitos no judiciário, e, no entanto, não possuem suporte legal que

possa garantir plenamente seus direitos. Contudo, a hipossuficiência não deve ser identificada

somente pelo lado econômico, mas também quando existe tratamento diferenciado.

Consequentemente, o direito à sexualidade avança para ser inserido como direito de

terceira geração, que compreende os direitos decorrentes da natureza humana, tomados não

individualmente, mas genericamente, solidariamente.9 Sendo assim, deve haver respeito a este

direito difuso, devendo a sociedade respeitar os direitos dos homossexuais como se seus direitos

fossem.

4 Ibid., p. 72 5 DIAS, Maria Berenice ibid., p. 73. 6 DIAS, op. cit , p. 73 7 BARROS, Sérgio Resende apud Maria Berenice. p. 73. 8 Ibid., p. 73 9 Ibid., p. 74

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Os direitos humanos foram sendo positivados em nível constitucional, em razão da

evolução dos valores histórico-sociais. Por conseguinte, segundo Maria Berenice Dias,

“imperioso reconhecer que a garantia do livre exercício da sexualidade integra as três gerações

de direitos, porque está relacionada com os postulados fundamentais da liberdade individual, da

igualdade social e da solidariedade humana”.10 Desta forma, é importante relatar que as gerações

dos direitos servem para realizar todos os indivíduos, portanto, não pode a relação homossexual

ser excluída de tais direitos.

1.2. PRINCÍPIO DA IGUALDADE

Desde a Carta Magna de 1988, o Legislador adotou o Princípio da Igualdade de Direitos,

assim, expresso no art. 5º, caput, sendo todos iguais perante a lei sem qualquer distinção. É

importante observar que a igualdade de direitos deve ser vista sob dois planos distintos, ou seja,

frente ao legislador na elaboração de leis, e, diante da autoridade pública na interpretação e na

aplicação das leis de forma isonômica 11. Com isso, sob o primeiro prisma, o mais importante

para o tema proposto, segundo o doutrinador Alexandre de Moraes, o legislador ou o próprio

executivo, na edição, respectivamente, de leis, atos normativos e medidas provisórias, não pode

criar tratamentos abusivamente diferenciados a pessoas que encontram-se em situações

idênticas.12

No entanto, o que se constata pela realidade de nossa sociedade, são desigualdades na

criação de leis e também em sua aplicação, suprindo respectivamente o legislador e o aplicador

das normas jurídicas, os direitos e garantias constitucionais de alguns cidadãos, no caso em tela

as sociedades homoafetivas. É comum que o legislador deve acompanhar o fato social no

momento da elaboração de leis, as leis são oriundas dos fatos sociais reiterados.

Sendo assim, quando da criação e elaboração de leis, o legislador não observar quais são

os anseios da sociedade fechando os olhos para fatos que ocorrem de maneira reiterada a cada

ano que passa, o mesmo estará de forma omissiva causando uma desigualdade para aqueles que

dependem da criação de certas leis para viverem de forma igualitária com seus companheiros.

Hoje, mais do que algumas décadas atrás, as sociedades homoafetivas, dependem que o 10 DIAS, op. cit , p. 74 11 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 13 ed. São Paulo: Atlas, 2003. p., 65. 12 MORAES, Ibid, p. 65.

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legislador abra os olhos para seus anseios, reconhecendo a referida sociedade como entidade

familiar, garantindo desta forma seus direitos.

Observa-se, ainda, que os juízes também estão agindo de forma omissa, causando

desigualdades substanciais, quando em seus julgamentos não reconhecem a sociedade

homoafetiva como entidade familiar, tendo o julgador como fundamento legal que não existem

leis para garantir tal direito pleiteado. Cabe observar que durante ano se aplica a regra de que

quando a lei for omissa, “o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os

princípios gerais de direito”, conforme dispõe o artigo 4º da Lei de Introdução ao Código Civil.

Com isso, seria um grande avanço se o julgador em suas decisões usasse do dispositivo citado

acima, para julgar os casos de reconhecimento da sociedade homoafetiva como entidade

familiar, criando, jurisprudência e precedentes para seus colegas magistrados. Importante

mencionar que a jurisprudência como fonte indireta ou mediata do direito, “acaba encaminhando

mais cedo ou mais tarde à elaboração de normas” 13.

Importante mencionar que se a união entre irmãos, entre avós e netos e entre sobrinho e

tio constituem entidades familiares, visto que o rol do artigo 226 da Constituição Federal é

meramente exemplificativo, sendo as uniões homoafetivas núcleos familiares, reclamando

idêntica proteção Estatal 14. Sendo assim, o que se conclui, após analisar a referida norma

constitucional, são critérios discriminatórios para o não reconhecimento da união homoafetiva

como entidade familiar, abrigados na omissão legislativa, bem como na interpretação dos

julgadores na hora de julgar os casos concretos. Desta forma, não é demais mencionar que

quando não há proteção Estatal de forma igualitária para os cidadãos, cerceia-se, o princípio

basilar da igualdade de direitos.

Cabe mencionar, ainda, o mesmo pensamento da doutrinadora Maria Berenice Dias, que

também entende como meramente exemplificativo o rol do art. 226 da Carta Magna, da seguinte

forma: “cláusula geral de inclusão, não sendo admissível excluir qualquer entidade que preencha

os requisitos da afetividade, estabilidade e ostensibilidade”.15

Importante destacar que não se deve confundir a união homoafetiva com a família

oriunda do casamento, ou seja, união formal entre pessoas de sexos opostos, ou com a família

convivencial, que seria a união estável. Logo, trata-se a união homoafetiva como modelo

13 MONTEIRO, Washington de Barros. 1910 -1999. Curso de Direito Civil. 38 ed. São Paulo: Saraiva, 2001. p., 12. 14 CHAVES, Cristiano de Farias, Escritos de Direito de Família. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2007, p. 139. 15 CHAVES, Cristiano aput Dias., p. 139.

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familiar autônomo, como a comunidade de tios e sobrinhos, avós e netos merecedor de especial

proteção Estatal.16

Embora, por mais que não se confunda a união homoafetiva com a união estável, deveria

assegurar os mesmos direitos dados para a família convivencial, sejam eles direitos patrimoniais

e sucessórios. Destaca-se, ainda, que uma das formas probatórias para o reconhecimento da

união homoafetiva, também poderia ser semelhante à utilizada na ação de reconhecimento da

união estável, qual seja, através de uma declaração prévia feita em cartório, no caso específico

mencionado a convivência daquele casal homossexual. Com isso, poderia se utilizar dos mesmos

requisitos para a comprovação da união estável, quais sejam: a convivência duradoura, pública e

contínua, estabelecida com o objetivo de constituição de família, conforme dispõe o artigo 1723,

caput do Código Civil.

Desta forma, como já explicitado no trabalho em tela, os julgadores deveriam utilizar-se

da analogia, fonte do direito para julgar os casos de reconhecimento da sociedade homoafetiva

como entidade familiar, levando-se em consideração os requisitos do referido artigo 1.723, caput

do Código Civil. Sendo assim, por mais que haja o silêncio dos legisladores quando a criação de

leis que possam regularizar este estado de fato dos casais homossexuais, o juiz com toda sua

autonomia, seria bem justo ao decidir de conformidade como o artigo 4º da Lei de Introdução ao

Código Civil. O entendimento da Doutrinadora Maria Berenice Dias confirma a assertiva, senão

vejamos: “Não se justifica a omissão do legislador, ao consolidar as normas de direito privado.

Deixar à margem da lei os vínculos afetivos que não se definem pela diferença do sexo do seu

companheiro, embora haja convivência duradoura, pública e contínua, com objetivo de

constituição de família, é uma postura discriminatória e inaceitável.” 17

È importante salientar que o objetivo fundamental da República Federativa do Brasil

“promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras

formas de discriminação”, conforme disposto no inciso IV do artigo 3º da Constituição da

República. Desta forma, interpretando-se esta norma constitucional, compreende-se que o

objetivo seria o bem comum dos cidadãos, sejam eles negros ou brancos, homens ou mulheres,

velhos ou novos, heterossexual ou homossexual.

Esclarece-se, ainda, que o bem comum surge também através das leis, não podendo haver

qualquer forma de preconceito e discriminação na elaboração de leis ou na votação de projetos

16 CHAVES, op. cit. , p. 138. 17 DIAS, Maria Berenice, Conversando sobre família, sucessões e o novo Código Civil. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005. p. 106.

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de lei. A lei não pode deixar de ser criada ou votada somente porque é contrária a ideologia de

vida do legislador, visto que trará a desigualdade. No entanto, o que se comprova na atual

conjuntura com relação ao tema exposto no trabalho em epígrafe, são estes preconceitos e

discriminações, conforme será comprovado pelo entendimento na época do Deputado Federal

Salvador Zimbaldi e do Deputado Federal Severino Cavalcanti, em comentário ao Projeto de Lei

n.º 1.151/1995, que foi apresentado pela Deputada Marta Suplicy, que objetiva a disciplinar a

união civil entre pessoas do mesmo sexo. Destaca-se que o primeiro Deputado Federal comentou

sobre o tema o seguinte: “a desmoralização que se quer legalizar; o desmantelamento da família,

com a instituição desta aberração contrária à Natureza, que criou cada espécie com dois sexos,

afrontam os mais comezinhos princípios éticos da sociedade brasileira”18. Já o segundo

Deputado Federal, com seu voto contrário a referido Projeto de Lei, se manifestou da seguinte

forma: “uma lei que promove, favorece e estimula a prática de atos contra a natureza está em

contraste total com a lei natural. Portanto, não deve ser considerada como lei, mas sim como

corrupção da lei. E, enquanto tal, ser repudiada e combatida; e jamais apoiada, acatada ou

tolerada” 19. Nota-se que as palavras dos Deputados não possuem qualquer fundamento jurídico,

sendo simplesmente palavras discriminatórias, preconceituosas, com ideais religiosos, que

possuem a simples finalidade de desmoralizar cidadãos que buscam seus direitos, cidadãos que

pagam impostos como todos os outros, enfim, pessoas que somente anseiam pela igualdade de

direitos.

Não é possível que no século XXI, ainda, exista tais discriminações, visto que desde

1948, com a Declaração Universal dos Direitos do Homem, já se buscava uma igualdade dos

cidadãos perante a lei, repudiando-se toda forma de desigualdade, estando evidenciado na

transcrição do artigo 7º da referida Declaração:

“todos são iguais perante a lei e têm direito, sem qualquer distinção, a

igual proteção da lei, todos têm direito a igual proteção contra qualquer

discriminação que viole a presente Declaração e contra qualquer

incitamento a tal discriminação.20

18 AZEVEDO, Álvaro Villaça. Estatuto da família de fato: de acordo com o novo código civil, Lei 10.406/02. 2 ed. São Paulo, Atlas, 2002, p. 476. 19 Ibid, p. 477. 20 PINHEIRO, Ralph Lopes. História Resumida do Direito. 10º ed. Rio de Janeiro: Biblioteca Estácio de Sá, 2001, p. 172.

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Portanto, a história da humanidade não permite que se retroaja na garantia dos direitos

fundamentais, no entanto encarar a questão do reconhecimento da união homoafetiva como

entidade familiar com a visão discriminatória e preconceituosa de alguns dos legisladores

brasileiros, somente fará com que haja estagnação do direito. Sendo assim, a igualdade de

direitos não pode ser suprimida por questões conservadoras e ideológicas de indivíduos que não

acompanham o fato social. Em suma, as leis devem alcançar todos os cidadãos de forma

igualitária, havendo sua aplicação sem qualquer preconceito, sendo a igualdade substancial a

finalidades do inciso IV do artigo 3º da Carta Magna.

Muito se fala que o sistema jurídico brasileiro é democrático, onde todos são iguais

perante a lei (artigo 5º da Magna Carta), no entanto está evidenciado hordienamente que o nosso

sistema jurídico garante direitos aos cidadãos de acordo com sua raça, cor e orientação sexual,

como já mencionado faz a sociedade regredir no que se refere à garantia de direitos

fundamentais.

1.3. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

Como relatado na Carta Magna, em seu artigo 1º, inciso III, é princípio fundamental da

República Federativa do Brasil a dignidade da pessoa humana. Portanto, é importante mencionar

que tal dignidade está implicitamente vinculada à personalidade do indivíduo, sendo inerente ao

seu ser. Não sendo demais expor que somente será feliz aquela pessoa que vive com dignidade,

ou seja, a felicidade caminha junto com a dignidade.

Com vista a enriquecer o presente trabalho, merece a transcrição de algumas palavras do

mestre Alexandre de Moraes, conceituando a dignidade: “dignidades é um valor espiritual e

moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e

responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais

pessoas, constituindo-se o mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar”.

Insta relatar que a dignidade não depende apenas da própria pessoa, na verdade o Estado

é o grande responsável por proporcionar aos seus cidadãos uma vida digna, desaguando em

felicidade. A contrário sensu, quando o Estado suprime direitos dos indivíduos ou não lhe

fornece subsídios para se viver com dignidade, estará indiretamente contribuindo para o não

alcance da felicidade da pessoa. Da mesma forma, exemplificando, um indivíduo que reside em

Município do interior do Estado do Rio de Janeiro, exercendo atividade laborativa no Centro da

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cidade, auferindo mensalmente um salário mínimo, não possui condições financeiras de voltar

todos os dias para o ceio familiar, visto que o preço da tarifa do transporte público é elevado,

bem como o dinheiro que recebe para o transporte serve como complemento de sua renda

familiar. Com isso, esta pessoa por necessidade, pernoita no Centro da Cidade praticamente

todos os dias, tendo em vista economizar seu ínfimo salário. Será que esta pessoa vive com

dignidade? É claro que não, sendo o Estado o grande causador das dificuldades deste indivíduo,

visto que não dá subsídios para que esta pessoa possa viver com dignidade. Importante salientar

que o referido exemplo não é ficção, mas sim uma realidade nas grandes cidades brasileiras.

Insta ressaltar que a supressão de direitos também fere o princípio da dignidade da pessoa

humana, principalmente quando estes direitos são suprimidos em razão da orientação sexual do

indivíduo. Deve haver respeito à personalidade do indivíduo, para que o mesmo possa viver com

dignidade. Com muita probidade são as palavras de Ana Carla: “para se viver em dignidade,

deve ser respeitado o livre desenvolvimento da personalidade das pessoas, segundo sua peculiar

forma de ser. Não se pode excluir uma pessoa do sistema jurídico tutelador das conseqüências da

afetividade, como o é o Direito de Família, em razão de sua orientação sexual”.21

Desta forma, não se pode violar a dignidade da pessoa por apego a mero conservadorismo

e preconceitos, estando à dignidade da pessoa humana acima de qualquer destas questões. Não

pode a opção sexual implicar a perda de garantias fundamentais e da imprescindível dignidade

do homem.22 A dignidade do indivíduo está não somente no reconhecimento da união

homoafetiva como entidade familiar, mas também no respeito a sua opção sexual. Que

democracia é esta que não respeita a livre escolha, não se vive em um Estado Democrático de

Direitos. Quando o Estado age de forma contrária aos seus princípios, não existe segurança

jurídica nas relações, fazendo com que os cidadãos passam a desacreditar na justiça.

Cumpre destacar que no artigo 3º, inciso I, da Lei Maior, menciona que um dos objetivos

fundamentais da República Federativa do Brasil é construir uma sociedade justa. Portanto, que

sociedade justa é essa que não garante os direitos de todos os cidadãos de forma igualitária, que

sociedade livre é esta que suprime direitos em razão da orientação sexual da pessoa.

Oportuno ressaltar que Glauber Moreno Talavera diz sobre o referido trabalho: “frustrar o

direito personalíssimo à constituição de uma entidade familiar formal entre pessoas do mesmo

sexo é atentar contra a dignidade humana, consagrada na Constituição Federal”23. Com isso,

21 CHAVES, Cristiano de Farias aput Matos, op. cit., p. 137 22 CHAVES, Cristiano de Farias aput Roudinesco, op. cit., p.140 23 CHAVES, Cristiano de Farias aput Talavera, op. cit., p.

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quando a pessoa tem seus direitos retirados, suprimido pura e simplesmente em razão de

preconceitos e discriminações, faz com que haja sentimentos de injustiça e indignidade.

Interessante ressaltar a exposição de Giselle Câmara Groeninga, quando diz que: “estes

são tempos de viver o respeito ao Princípio da Dignidade humana, de aceitação das

especialidades e das diferenças. O Princípio da Dignidade Humana é um princípio ético

epistemológico, de conhecimento, do que é o ser humano e de como agir para sê-lo

plenamente”24. Cumpre ressaltar que o respeito às diferenças, pressupõe, também, garantia e

reconhecimento de direitos, para que desta forma possa haver uma sociedade mais justa e

igualitária. Portanto, uma sociedade justa é aquela que respeita e reconhece direito não somente

da maioria de seus cidadãos, mas também das minorias, mormente quando tais direitos estão

sustentados pelos pilares dos princípios constitucionais, tais como a dignidade da pessoa humana

e a isonomia, expressos na Carta Magna. Logo, “respeitar as diferenças está inclusive no respeito

à forma de vivê-las, esta é a ética das diferenças25.” Muito chato seria se todas as pessoas fossem

iguais, ou seja, são as desigualdades e diferenças de pensamento que fazem de cada ser humano

único. Portanto, não respeitar a personalidade alheia é abrir precedentes para que outros

indivíduos não respeitem sua personalidade, deve-se viver com as diferenças.

É importante ressaltar que a dignidade de uma pessoa torna-se, ainda mais infringida,

ferida, quando se está explícito a inconveniência dos legisladores e dos julgadores,

respectivamente no reconhecimento e na aplicação de direitos dos casais homossexuais. Desta

forma, para suprir direitos, a união homoafetiva é reconhecida como entidade familiar sem

qualquer óbice, conforme se pode constatar em decisão do Tribunal Superior Eleitoral, tendo o

Ministro Gilmar Mendes, reconhecido a união homoafetiva como entidade familiar para fins de

inelegibilidade eleitoral (CF, artigo 14, parágrafo 7º), observado se tratar de um “dado da vida

real”, em que, “assim como na união estável, no casamento ou no concubinato, presume-se que

haja fortes laços afetivos”26. È importante transcrever o resumo do relatório do referido Ministro:

“os sujeitos de uma relação estável homossexual, à semelhança do que ocorre com os de relação

estável, de concubinato e de casamento, submetem-se à regra de inelegibilidade prevista no art.

14, § 7 da Constituição Federal”.27 Com isso, decisões como esta trazem um contra sensu para a

24 GROENINGA, Câmara Giselle. Relações Interdisciplinares. pos. IBDFAM. Ano 6, N. 37, Março/Abril 2006, p. 5. 25 GROENINGA, op. cit., p. 5. 26 CHAVES, op. cit., p. 138 27 DIAS, Maria aput CZAJKOWSKI Rainer. p. 29.

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justiça do país, bem como descrença daqueles que dependem desta mesma justiça para verem

seus direitos resguardados.

Destaca-se que o fato de não existir lei que reconheça a união homoafetiva como entidade

familiar, não significa que tais direitos não existam, conforme sábias palavras da

Desembargadora Maria Berenice Dias, quando diz que:

“o vazio da lei não significa ausência de direito”.28

Insta relatar que a falta de lei que reconheça a união homoafetiva como entidade familiar,

tem muito haver com as omissões dos legisladores que fecham os olhos para um assunto tão

relevante.

Oportuno ressaltar, que muitos casais homossexuais, ainda, possuem necessidade de

ocultar sua orientação sexual, tendo em vista manter seus empregos ou circulo social, em razão

do grande preconceito e discriminação que a sociedade possui. Desta forma, com o

reconhecimento da sociedade homoafetiva como entidade familiar, tiraria da clandestinidade tais

indivíduos, que são pessoas comuns como todas as outras, possuidores de direitos e obrigações,

que precisam ter seus direitos reconhecidos para que possam viver com dignidade. A orientação

sexual não pode ser vista pela sociedade, principalmente pelos legisladores e juízes, como um

ilícito ou uma culpa29, visto que se for visto desta forma somente trazem supressão de direitos,

desaguando na injustiça e no desrespeito ao princípio basilar da dignidade da pessoa humana,

princípio este tão consagrado na Constituição da República Federativa do Brasil.

1.4. PRINCÍPIO DO ACESSO À JUSTIÇA

Cumpre mencionar que o desrespeito à igualdade e a dignidade da pessoa humana acaba

desaguando também na mitigação do acesso à justiça daqueles que buscam o poder judiciário

para pleitear o reconhecimento de seus direitos.

Insta destacar que para Mauro Cappelletti e Bryant Garth30, a palavra acesso à justiça é de

difícil definição, mas determinam duas finalidades básicas do sistema jurídico, quais sejam: a

28 DIAS, op. cit. p. 79. 29 DIAS, Maria Berenice aput Rainer Czajkowski, op. cit., página 29. 30 CAPPELLETTI, Mauro. Acesso à Justiça. Tradução de Ellen Gracie Northfllet. Porto Alegre, Fabris, 1998. página 8.

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igualdade acessível para todos e a produção de resultados que sejam individual e socialmente

justos. A primeira finalidade pressupõe igualdade no sistema para todos, mas somente haverá

essa igualdade para os casais homossexuais, quando existir leis que possam regulamentar de

forma plena os direitos existentes dos mesmos.

Desta forma, enquanto não for votada ou criada a lei que reconheça a sociedade

homoafetiva como entidade familiar, não se pode falar que exista igualdade plena e acessível no

Sistema Judiciário Brasileiro para os homossexuais. Entretanto, tal culpa da não igualdade no

acesso à justiça em particular do homossexual, não pode somente ser imputada para os

legisladores, principalmente aqueles conservadores que por influências, sejam pessoais,

religiosas, discriminatórias etc, boicotam a votação de projetos de lei ou não criam leis para

garantir a união homoafetiva como entidade familiar. Ou seja, está parte da desigualdade

também deve ser imputado ao julgador, membro máximo do poder judiciário, aqueles que muitas

vezes decidem sobre a vida da pessoa, no entanto não usam das armas que dispõem para

reconhecer o direito dos homossexuais.

Insta esclarecer que uma dessas armas seria a aplicação, como já mencionado no trabalho

em epigrafe, do artigo 4º da Lei de Introdução do Código Civil, que dispõe: “Quando a lei for

omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de

direito”. Sendo assim, tais interpretações estariam sendo usadas de forma paliativa para

assegurar o acesso do homossexual de forma plena no poder judiciário. Já com relação à

produção de resultado individualmente e socialmente justo, somente ocorrerá quando houver a

criação da supra mencionada lei para que reconheça a união homoafetiva como entidade

familiar.

Destarte, que o resultado individualmente justo seria o ingresso do indivíduo no

judiciário, pleiteando seus direitos com base na lei, e, posteriormente tivesse a tutela lhe

fornecida de forma plena. Por outro lado o socialmente justo seria a certeza da lei garantido o

direito de todos homossexuais de forma igualitária com outros interessados. Um melhor

entendimento seria dado com exemplo: o caso de um casal de homossexuais que viviam juntos

durante anos, constituindo, desta forma, uma união homoafetiva, tendo adquirido imóveis no

lapso da união. Importante mencionar que os imóveis adquiridos por tais pessoas, somente foram

registrados no Registro de Imóveis em nome de um dos indivíduos. Conseqüentemente, o

indivíduo que tinha os imóveis registrados em seu nome, veio a falecer. Ocorre que, atualmente,

como não existe lei que reconheça a união homoafetiva como entidade familiar, dando ao

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companheiro vivo da união homoafetiva todos os direitos sucessórios, o mesmo buscaria outra

forma de pleitear seus direitos sobre estes imóveis, qual seja: o ingresso de uma Ação de

Reconhecimento de Sociedade de Fato, no entanto, somente teria direito a 50% (cinquenta) por

cento dos imóveis, ficando os outros cinquenta para os herdeiros do companheiro falecido. O

referido caso hipotético mostra que atualmente não existe acesso à justiça de forma plena para os

homossexuais que pleiteiam direitos como este suscitado acima. Contudo, o socialmente justo

situação hipotética, acima descrita, seria se houvesse o reconhecimento da sociedade

homoafetiva, e, desta forma, o companheiro vivo tivesse todos os direitos sucessórios garantidos

de forma plena, o que garantiria a igualdade de direitos com os demais herdeiros do falecido.

Segundo Mauro Cappelletti e Bryant Garth31, “o acesso à justiça, pode, portanto, ser

encarado como requisito fundamental, o mais básico dos direitos humanos, de um sistema

jurídico moderno e igualitário que pretenda garantir e não apenas proclamar os direitos de

todos”. Desta forma, está explícito em tais palavras que ter acesso à justiça é um direito básico

das pessoas, sendo direito fundamental, e, não se admitindo sua supressão por omissões

legislativas. Ressalta-se, ainda, que somente existirá um sistema jurídico igualitário quando

houver o referido acesso de forma plena, que para o caso dos homossexuais seria o

reconhecimento da união homoafetiva como entidade familiar, não necessitando se utilizar de

manobras jurídicas para verem seus direitos garantidos, como no caso citado, propor Ação de

Reconhecimento de Sociedade de Fato no lugar de Ação de Reconhecimento de União Estável.

Que democracia é esta que não reconhece o direito de todas as pessoas, tratando os

direitos dos homossexuais com indiferença, não fornecendo para os mesmos todos os caminhos

para que realmente possam pleitear seus direitos igualitariamente. Não adianta somente

proclamar o direito de todos, mas sim garantir o direito de todos, de forma a não trazer

desigualdades substancias, irreversíveis.

É importante mencionar que as sábias palavras de Mauro Cappelletti e Bryant Garth,

quando dizem que: “a efetividade perfeita, no contexto de um dado direito substantivo, poderia

ser expressa com a completa igualdade de armas, a garantia de que a conclusão final depende

apenas dos méritos jurídicos das partes antagônicas”.32 Ocorre que a igualdade de armas

mencionada pelos referidos autores, somente será fornecida para os homossexuais, quando

houver a lei que reconheça a união homoafetiva como entidade familiar. Com isso, homossexual

31 CAPPELLETTI, op. cit., p. 12. 32 CAPPELLETTI, op. cit., p. 15.

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poderá ter efetividade em sua pretensão, desaguando no acesso à justiça de forma plena. Desta

forma, a garantia dos direitos dos homossexuais, dependerá somente de seus esforços em provar

a união homoafetiva.

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2. ASPECTOS CONSTITUCIONAIS DA UNIÃO ESTÁVEL

No presente capítulo será abordado como foi à evolução da união estável entre homem e

a mulher e a omissão ou até mesmo a discriminação constitucional em tratar sobre a união

homoafetiva, ou seja, a união de pessoas do mesmo sexo.

2.1 A UNIÃO ESTÁVEL ENTRE HOMEM E A MULHER

É importante salientar que até bem pouco tempo, a relação de concubinato, não integrava

o direito de família, esta relação fazia parte apenas no direito civil, pois as questões judiciais

versavam apenas sobre efeitos patrimoniais, isso porque a idéia, estabelecida pela sociedade

brasileira, era de que a união de pessoas sem a marca do casamento (propriamente dito) era

constituída como um fato fora da Lei, portanto ausente no ordenamento jurídico.

Desta forma, os tribunais decidiam as demandas de efeito patrimonial, sob a ótica jurídica

de que a relação consubstanciava uma sociedade de fato, e de que ainda caberia indenização

pelos serviços domésticos prestados pela companheira, posto que o fato típico, união entre

homem e mulher, não tinha nenhuma previsão legal, ensejando que os magistrados buscassem a

analogia como fonte do direito para ser devidamente aplicado ao caso concreto.

Cumpre mencionar, que a partir da Constituição Federal de 1988, que reconheceu a união

estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, os nossos juristas, em especial os

juízes, começaram a formar uma nova concepção em relação aos deveres e direitos dos

concubinos, passando dessa forma a integrar o direito de família e não mais o direito civil e

todos tendo seus direitos e deveres reconhecidos.

2.2. A UNIÃO HOMOAFETIVA E O PARÁGRAFO 3° DO ARTIGO 226 DA

CONSTITUIÇÃO.

O parágrafo 3º do artigo 226 da Carta Magna traz uma grande discussão para o tema

proposto no referido trabalho, tendo em vista que vai de encontro ao princípio constitucional da

dignidade da pessoa humana e de seu corolário, o princípio da isonomia. Está evidente no

referido artigo, quando se menciona que somente é reconhecida a união estável “entre homem e

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mulher”, que existe grande preconceito e discriminação com relação à união homoafetiva.

Destaca-se, ainda, que o mencionado artigo constitucional afronta de forma reflexa a liberdade

pessoal e sexual, bem como “subtrai dos homossexuais os direitos deferidos aos

heterossexuais”.33

Para Adauto Suannes, “tanto o parágrafo 3º do art. 226 da Constituição Federal como o

Código Civil que o regulamenta afrontam o espírito e a letra da Constituição de 1988, quando

restringem a proteção legal apenas às uniões estáveis de pessoas de sexo diferente”.34 Sendo

assim, não pode o Estado, representado por seus legisladores, afrontar normas da própria

constituição, sendo evidente a supressão de direitos. Também não existe qualquer argumento

plausível que explique o motivo da união estável somente ser criada através da união entre

pessoas de sexo diferente. Como já foi exposto no trabalho em tela, a Constituição reconhece

como entidade familiar à convivência do neto com o avô, sendo pessoas do mesmo sexo.

Embora os princípios constitucionais devam estar acima de normas constitucionais,

principalmente quando estas lhes afrontam.

Consequentemente, está explícito no texto constitucional que existe uma situação de

desigualdade entre os princípios estabelecidos e o parágrafo 3º do artigo 226 da Constituição

Federal, quando para reconhecer a união estável, dá como requisito a diversidade de sexos.

Diante de tal desigualdade, sugere Celso Antônio Bandeira de Mello “que se investigue se há

congruência entre a distinção de regime estabelecida e a desigualdade de situações

correspondentes”.35 Servindo o referido método para saber se existe ou não desigualdade. No

entanto, nas palavras de Maria Berenice Dias, “a exigência da diversidade de sexo para o

reconhecimento de uma união estável encobre dissimulada discriminação à orientação sexual”.36

É importante ressaltar que o matrimônio, a diversidade de sexo ou a capacidade

procriativa não podem servir como elementos para identificação do que seja família,

principalmente porque o artigo 226 da Constituição Federal não traz um rol taxativo do que seja

entidade familiar. Ressalta-se, ainda, que a única diferença da união homoafetiva com a de

pessoas de sexo diferente é a incapacidade de gerar filhos. Desta forma, direitos não podem ser

suprimidos somente por este fato, não servindo tal circunstância como fundamento.

33 DIAS, op. cit., pág. 79 34 DIAS, op. cit., pág. 79 35 DIAS, op. cit, p. 80. 36 DIAS, op. cit., p. 80.

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Com efeito, as palavras de Michel Temmer, dizendo que “é preciso atentar que a

Constituição, além de ser um conjunto de normas, constitui antes e acima de tudo um conjunto

de princípios”37, princípios estes que devem afeiçoar as próprias normas constitucionais. Sendo

assim, quando se cria uma norma constitucional, deve o legislador observar a Carta Política,

atentando para seus princípios basilares, mormente aqueles que divergem dos direitos

fundamentais, tais como a igualdade e a dignidade da pessoa humana. Quando não existe esta

observância, acaba-se criando uma norma constitucional inválida ou ineficaz. Segundo Otto

Bachof, “uma norma só formalmente inconstitucional pode ser nula se desrespeitar, em medida

insuportável, os postulados fundamentais da justiça”.38 Por conseguinte, segundo este

entendimento, a consagração da dignidade da pessoa humana tem o condão de subtrair a eficácia

de qualquer regra que a infirme, ainda que ela se encontre no bojo da própria Constituição.39

Com isso, se todos são iguais perante a lei, não se pode permitir que exista uma norma

constitucional que eleja a diferenciação do sexo como requisito para proteção estatal.

Desta forma, quando existe este aparente conflito de normas, não somente para Bachof,

mas também para Rios e Suannes, “mostrando-se uma norma constitucional contrária a um

princípio constitucional, ou apresentando ela incompatibilidade com um direito supra legal

consagrador das garantias e dos direitos individuais, o dispositivo carece de legitimidade”.40

Diante de tal impasse, é celebre a distinção feita por Carl Schmitt, “sendo a constituição

princípio que exprime decisão política intangível, já as leis constitucionais devem seguir esses

princípios, mas não são intocáveis e, em certos casos mesmo quando inseridas no texto

constitucional podem até ser mudadas pelo processo legislativo ordinário.”41 Sendo assim, os

legisladores deveriam corrigir o erro cometido na elaboração da norma em tela.

37 TEMMER Michel, aput DIAS, p. 81. 38 BACHOF Otto, aput DIAS, p. 81. 39 DIAS, op. cit, pág. 81. 40 DIAS, op. cit, pág. 81. 41 DIAS, Maria aput Carl Schmitt, op. cit., pág. 81.

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3. A ADOÇÃO HOMOAFETIVA

3.1. REQUISITOS E EFEITOS DA ADOÇÃO

A adoção não é concedida a qualquer pessoa que tenha interesse nela, é necessário seguir

a algumas formalidades, alguns requisitos e razoáveis medidas de prevenção e segurança, para

resguardar, em especial, o direito da criança e do adolescente, visto ser este processo muito

delicado para ambas as partes (adotante/adotado).

O primeiro e mais importante requisito da adoção é a idade mínima para adotar. O

Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece 21 anos como idade mínima para tornar-se

adotante, entretanto, ainda determina outro requisito a ser obedecido; a diferença de idade entre o

adotante e o adotado deve ser de pelo menos, 16 anos. O Código Civil de 2002, conserva a

necessidade de que o adotante seja pelo menos 16 anos mais velho que o adotado, mas, reduz o

limite de idade mínima do adotante para 18 anos.

Em relação ao estado civil do pretenso adotante, a lei não faz distinção. Assim, podem

adotar os solteiros, independente do sexo, os casados, os divorciados, desde que o estágio de

convivência com a criança tenha se iniciado durante o casamento e que estejam de acordo quanto

à guarda e às visitas, ou quem vive em união estável, comprovada a estabilidade familiar, sendo

que, nesse caso, a adoção deverá ser pretendida e solicitada por ambos, e estes participarão

juntos de todas as etapas do processo.

Ainda pode ocorrer de um dos cônjuges adotar o filho do outro, na chamada adoção

unilateral, do tutor ou curador da criança ou do adolescente, adotá-lo, desde que encerrada e

quitada a administração dos bens, ou ainda, o pretendente que tenha falecido durante o processo

de adoção, na chamada adoção póstuma.

Em relação ao adotado, poderá ser qualquer criança ou adolescente, que não seja irmão

ou descendente do adotante e que tenha, no máximo, 18 anos até a data do requerimento de

adoção, salvo se já estiver sob a guarda ou tutela do adotante. Além disso, podem ainda ser

adotadas crianças e adolescentes cujos pais sanguíneos tenham falecido, tenham sido

judicialmente destituídos do poder familiar, tenham consentido legalmente na colocação de seus

filhos no programa de família substituída ou tenham sido abandonadas e os familiares não

encontrados. É importante destacar que quando tratar-se de adoção de crianças maiores de doze

anos, ficará subordinada há concordância expressa destas.

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3.2. DO PROCEDIMENTO DE ADOÇÃO

A adoção pressupõe um processo judicial que tramitará perante o Juizado Especial da

Infância e da Juventude. Por essa razão, o vínculo da adoção constitui-se por sentença, a qual

será inscrita no Registro Civil.

Desta forma, o primeiro passo para que se adote uma criança é dirigir-se ao Juizado da

Infância e Juventude da Comarca de sua cidade e solicitar uma entrevista com os técnicos para

obter as informações preliminares necessárias à formalização do seu pedido de inscrição em

programa de colocação de crianças e adolescentes em família substituta.

Deve-se, então, apresentar a documentação exigida para o preenchimento da ficha

cadastral. Geralmente são exigidos: Carteira de Identidade, Certidão de Casamento (se houver),

comprovante de renda, residência e atestado de antecedentes criminais, atestado de sanidade

física e mental dos interessados, atestado de idoneidade moral. Caso já tenha uma criança, o(a)

postulante deverá dirigir-se munido(a) com a Certidão de Nascimento, atestado escolar (caso a

criança já esteja em idade escolar), e os pais do adotando.

Após essa etapa, os interessados em adotar serão submetidos a uma entrevista com

psicólogos e assistentes sociais, na qual poderão escolher o perfil de seu futuro filho, ou seja,

idade, sexo, cor, entre outros.

A aprovação dos adotantes é a etapa mais demorada do processo, em especial porque o

bem estar da criança ou adolescente adotado deve ser confirmado. Somente depois de

esclarecidas todas as dúvidas dos técnicos do Juizado e do Promotor se manifestar sobre a

habilitação é que, finalmente, o processo seguirá para o Juiz que, encontrando-o

satisfatoriamente instruído, poderá deferir ou não a habilitação dos adotantes. Deferida, estarão

em condições de adotar e passarão a integrar um cadastro de possíveis adotantes.

A concretização do processo de adoção ocorrerá com sentença constitutiva. No entanto,

antes disso é necessário que se cumpra um estágio de convivência entre adotante e adotado por

prazo fixado pelo juiz, que levará sempre em consideração cada caso concreto. Entretanto, esse

prazo poderá ser dispensado, no caso de a criança ou adolescente, de qualquer idade, já estar na

companhia do adotante por tempo suficiente, ou ainda, quando a criança possuir idade inferior a

um ano.

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3.3. EFEITOS DA ADOÇÃO

Os efeitos da sentença que concede a adoção só serão produzidos a partir do trânsito em

julgado da mesma, com exceção da chamada adoção póstuma, que é aquela em que o adotante

morre no decurso do processo de adoção. Nesse caso, os efeitos da sentença serão retroativas à

data do óbito, conforme entendimento do art. 1.628 do Código Civil de 2002, que repete o art. 47

§ 6º do ECA.

O principal efeito esta na irrevogabilidade, ou seja, findo o processo de adoção, a criança

nunca mais deixará de ser filho do adotante. A sentença de adoção atribui a condição de filho ao

adotado, inclusive para efeitos sucessórios, com os mesmos direitos e deveres, dos filhos

consangüíneos. Assegura-se ao adotado o direito a alimentos e os deveres de assistência aos pais

adotivos. A partir de então se encerra todo e qualquer vínculo do adotado com sua família

natural, exceto no que se refere aos impedimentos matrimonias que neste caso existirão tanto em

relação à família biológica quanto a família adotiva.

Segundo o art. 1.627 do Código Civil, que mantém o disposto no art. 47 § 5º, do ECA, é

permitida a alteração do sobrenome do adotado e, tratando-se de adotando menor, o prenome

também poderá ser alterado, a pedido do adotante ou do adotado.

3.4. O PRINCÍPIO DO MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA

A Convenção Internacional dos Direitos da Criança foi aprovada, por unanimidade, na

sessão de 20 de novembro da Assembléia Geral das Nações Unidas, em 1989, depois de um

árduo trabalho de dez anos de representantes de 43 países-membros da Comissão de Direitos

Humanos daquele organismo internacional, à época em que se comemoravam os 30 anos da

Declaração Universal dos Direitos da Criança. Fruto de compromisso e negociação, ela

representa o mínimo que toda a sociedade deve garantir às suas crianças, reconhecendo em um

único documento as normas que os países signatários devem adotar e incorporar às suas leis.

Exige, por parte de cada Estado, que a ratifique, uma tomada de decisão, incluindo-se os

mecanismos necessários à fiscalização do cumprimento de suas disposições e obrigações

concernentes à sua infância, ou seja, pessoas menores de 18 anos. Ratificada pelo Brasil através

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do Decreto n° 99.710/90, indique-se sua versão oficial, ao dispor no art. 3.1: "todas as ações

relativas às crianças, levadas a efeito por instituições públicas ou privadas de bem-estar social,

tribunais, autoridades administrativas ou órgãos legislativos, devem considerar, primordialmente,

o interesse maior da criança”. Estamos, portanto, diante de dois conceitos diversos: a versão

original vinculada a um conceito qualitativo, o interesse maior da criança. Optamos pelo

conceito qualitativo - melhor interesse - considerando-se o conteúdo da Convenção, assim como

a orientação constitucional e infraconstitucional adotada pelo sistema jurídico brasileiro. O

Brasil incorporou, em caráter definitivo, o princípio do "melhor interesse da criança" em seu

sistema jurídico, e sobretudo, tem representado um norteador importante para a modificação das

legislações internas no que concerne à proteção da infância em nosso continente.

3.5. ADOÇÕES POR CASAIS HOMOAFETIVOS

A família é considerada a base de qualquer sociedade. Antes da Constituição Federal de

1988, até bem pouco tempo, era considerada família apenas aquela oriunda do casamento. Com a

promulgação da referida Carta Magna, passam a ser admitidas outras formas de constituição

familiar, conforme previsão contida em seu art. 226, caso da união estável entre homem e

mulher, da família constituída por ambos os genitores ou ainda, a de caráter monoparental,

formada por um dos pais e seus descendentes. Essa previsão possibilitou, a todos os cidadãos

brasileiros, o exercício do direito de constituir família, seja ela de forma natural, artificial, ou por

adoção.

A Constituição Federal de 1988 representou um grande marco de inovações no direito de

família, um grande passo jurídico, pois consubstanciou vários princípios que fundamentam as

relações familiares, adotando uma nova ordem de valores e principalmente privilegiando a

dignidade da pessoa humana.

Assim, adotou no seu art. 1º, incisos II e III como fundamentos, a cidadania e a dignidade

da pessoa humana e, no art. 3º, incisos I, II e IV como objetivos fundamentais do Estado, a

construção de uma sociedade justa e solidária; a erradicação da pobreza e da marginalização, a

redução das desigualdades sociais e a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem,

raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Ainda em seu texto, no artigo 5º, a Constituição Federal garante que todos são iguais

perante a lei, sem distinção de qualquer natureza e têm direito à igualdade, garantindo, o § 2º do

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referido dispositivo, a aplicabilidade dos tratados internacionais em que a República Federativa

do Brasil seja parte, integrando, esses mesmos tratados, portanto, o texto da própria Constituição

Federal, quando tratem, em seu bojo, de direitos e garantias individuais.

Diante disso, visto que a Constituição Federal prega em um de seus princípios

fundamentais a proibição a qualquer tipo de discriminação, percebe-se que a tese de que o

homoafetivo tem direito à adoção não é afastada, pois a Carta Magna não a discriminou.

O Estatuto da Criança e do Adolescente, por sua vez, também não apresenta nenhuma

restrição à possibilidade de adoção por homossexuais, visto que, não faz menção à orientação

sexual do adotante, prescrevendo apenas, em seu artigo 42 que "podem adotar os maiores de 21

anos, independentemente do estado civil".

Apesar disso, o tema "adoção de crianças por casais homoafetivos", é um assunto

extremamente delicado e muito discutido atualmente e, como a legislação ainda não está

adequada para a devida proteção desses casos em particular, os juízes precisam analisar o caso

em concreto para dar sua posição, pensando sempre no melhor desfecho para a criança.

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4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O reconhecimento da adoção homoafetiva possui uma grande relevância para a

sociedade, trazendo garantias constitucionais para os menores, sem qualquer tipo de preconceito

ou conservadorismo que mitiguem direitos expressos na Carta Magna, mormente porque estes

mesmos direitos são garantidos a casais heterossexuais.

Não se podem suprir direitos em razão de preconceitos, devem os legisladores deixar de

lado suas convicções pessoais e conservadorismo para se criar uma lei que reconheça a referida

união. O judiciário encontra-se assoberbado de processos com questões envolvendo tal

discussão.

Importante mencionar que com o reconhecimento da união homoafetiva como entidade

familiar, também traria maior segurança jurídica patrimonial para aqueles envolvidos, bem

asseguraria ao companheiro homossexual os direitos sucessórios, alimentícios, bem de família,

ou seja, todos os direitos assegurados à entidade familiar e consequentemente traria mais

segurança jurídica para os homossexuais que desejam adotar uma criança. Desta forma, os

abrigos que estão lotados de crianças, os mesmos teriam alguma esperança de serem adotadas e

de terem uma boa educação.

Além disso, tirariam da clandestinidade as adoções homoafetivas que hoje existem, onde

uma das partes se inscreve no programa de adoção, pois somente dessa forma consegue realizar a

tão sonhada adoção, com a regularização da adoção irá trazer para a legalidade, dando a estas

pessoas igualdade de direitos, igualdade esta que é mola mestra da Constituição Federal.

Destaca-se, ainda, que somente assim poderá se falar em eficaz acesso à justiça para os

homossexuais.

Insta destacar que não há que se falar em democracia se o direito não alcança a todos,

dando-lhes suporte para se viver uma vida digna, não suprindo direitos em razão meramente da

orientação sexual. A mentalidade daqueles que criam leis não pode se igualar ao pensamento do

homem comum, ou seja, do povo. A lei deve ser criada para todos, fornecendo igualdade de

condições, sem que haja diferenciação em razão de ser homem ou mulher, preto ou branco,

heterossexual ou homossexual. Em suma, todos são dignos e merecedores de constituir uma

família, não podendo haver a supressão deste direito pelo Estado, devendo na verdade, o Estado

dar suportes para que se possa viver com dignidade e felicidade.

Page 31: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · irmã, minha noiva e aos meus amigos. 4 DEDICATÓRIA ... qualquer tipo de preconceito ou conservadorismo que intensifiquem

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REFERÊNCIAS

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acessado em 03/09/2012.