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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO MESTRE PÓS GRADUAÇÃO “LATO SENSU “ DIREITO DO CONSUMIDOR
O CONTRATO DE SEGURO NO DIREITO BRASILEIRO EM FACE AO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
POR: MARIA OTILIA LIMA SOBRAL
ORIENTADOR: SÉRGIO RIBEIRO SILVA
RIO DE JANEIRO/ 2005
2
UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO MESTRE PÓS GRADUAÇÃO “LATO SENSU “ DIREITO DO CONSUMIDOR
O CONTRATO DE SEGURO NO DIREITO BRASILEIRO EM FACE AO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
OBJETIVOS: Apresentação de monografia a Universidade Candido Mendes como condição prévia para conclusão do curso de Pós Graduação “Lato Sensu” em Direito do Consumidor
POR: MARIA OTILIA LIMA SOBRAL
3
AGRADECIMENTOS
Deus pela serenidade, equilíbrio e proteção. Meus filhos Franclim e Laisa, por todo o carinho dedicado para que este momento pudesse ser concretizado. Minhas queridas amigas de turma Vilda e Adriana pela colaboração e solidariedade com que me acolheram, além do carinho ímpar nas horas difíceis. Professor Sérgio, pelo brilhante desempenho em sala de aula. A todos aqueles que junto comigo realizaram este sonho.
4
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho aos meus filhos, à minha querida mãe que no seu silêncio contribuiu para que este trabalho se realizasse e ao meu pai (in memorium).
5
RESUMO
O presente trabalho teve como objetivo principal delinear os pontos mais
controvertidos do contrato de seguro, segundo a ótica do Código de
Defesa do Consumidor. Partindo das demandas judiciais mais comuns
nesta área e da prática jurisprudencial emanada destes casos, tem-se um
panorama global da situação do contrato de seguro, sempre norteada
pelos princípios legais que o regem, incluídos na legislação civil, na
legislação específica dos seguros e, é claro, no CDC. O principal foco de
estudo não foi a análise dos efeitos do CDC no contrato de seguro, mas
sim em que aspectos o código pode ser utilizado na defesa dos
consumidores lesados. E isso de uma forma simples, tratando o Código
de Defesa do Consumidor não como uma lei capaz de tirar o consumidor
de situações desagradáveis e financeiramente prejudiciais, mas ajudando
a situação à realidade da lei. Dessa forma, a cláusula considerada
meramente restritiva de direitos, que atenda os requisitos delineados pelo
CDC, deve ser respeitada. Sendo cláusula abusiva, o tratamento é
diferente, pugnando por sua nulidade. Analisando o contrato de seguro
por esta linha de raciocínio os resultados são mais coerentes, deixando
de lado as inúmeras controvérsias verificadas quando do estudo
jurisprudencial. O caso concreto passa ser o foco, e não o papel
secundário. Foi analisado o contrato de seguro como um contrato de
adesão, onde as cláusulas já estão preestabelecidas, cabendo a parte
contraente aderir a todas as cláusulas, inclusive as limitativas, e estando
ele sob a proteção Contratual do Código de Proteção do Consumidor,
surge o problema de como devem ser interpretadas tais cláusulas, e se
elas se caracterizam cláusulas abusivas.
6
METODOLOGIA
A metodologia utilizada neste trabalho, abordando o tema Contrato de seguro no
direito brasileiro em face ao código de defesa do consumidor, teve três momentos:
no primeiro momento, a pesquisa do material bibliográfico, com a preocupação de
buscar autores de que discorresse sobre o assunto de maneira clara e objetiva. No
segundo momento a seleção desse material, fazendo uma leitura detalhada, com a
finalidade de focar os pontos mais importantes e polêmicos sobre o assunto. E por
fim, no terceiro momento, buscar na legislação pertinente, ou seja, no código civil,
código de defesa do consumidor e na constituição federal, fundamental legal para as
afirmações feitas pelos autores.
7
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .................................................................................... 8 CAPÍTULO I – CONTRATO DE SEGURO........................................11 CAPÍTULO II. O CONTRATO DE SEGURO EM FACE AO CÓDIGO DE DEFSA DO CONSUMIDOR.......................................................... 23 CONCLUSÃO ................................................................................. 44 ANEXO ............................................................................................. 46 BIBLIOGRAFIA................................. ............................................... 47 ÍNDICE................................................................................................ 49 FOLHA DE AVALIAÇÃO ............................................................... 51
8
INTRODUÇÃO O presente trabalho monográfico traz como tema o Contrato de
Seguro no Direito Brasileiro em face do Código de Defesa do
Consumidor.
O contrato de seguro é uma das modalidades contratuais de
adesão e por sua carga relativa à segurança dos bens humanos mais
importantes (vida e patrimônio), mereceu destaque no Código de Defesa
do Consumidor, que o enquadrou como uma das hipóteses de incidência
desta legislação.
Entendemos que o contrato de seguro gera direitos e obrigações
para as partes. Ao segurado compete o pagamento do prêmio, que é a
contraprestação ao segurador, em virtude do risco que este assume, e ao
segurador compete pagar a indenização prevista ao segurado de seus
prejuízos, na hipótese de ocorrer o risco previsto contratualmente.
O referido estudo encontra a sua justificativa pelo fato dos
cidadãos de uma maneira geral, salvo raríssimas exceções, não possuem
conhecimento da extensão e, principalmente, dos limites impostos pelo
contrato de seguro. Essa ausência ou negligência de informações em sua
grande parte causada pelos corretores de seguros.
São exatamente estas situações conflituosas que chegam ao
Judiciário que foram alvo desse estudo, que se inspirou na grande
9
repercussão do Código de Defesa do Consumidor no ramo de seguros
para analisar e avaliar as teses defendidas pelos segurados e seguradoras
em juízo.
Não foi objetivo desse estudo analisar todos os pontos
controversos e todas as questões relativas ao contrato de seguro, pois não
seria possível num trabalho desta natureza. Por esta razão, o limite do
estudo foi traçado pela análise dos contratos de seguros em face do
Código de Defesa do Consumidor.
Esse trabalho tem como objetivo alertar aos consumidores no
que se refere às cláusulas abusivas e restritivas de direito, como também
as cláusulas limitativas que norteiam os contratos de seguros.
Foram analisados, os processos relativos aos contratos de
seguros, de forma a entender que os mesmos devam ser tratados de
maneira imparcial, analisando as provas trazidas aos autos e jamais
esquecendo dos princípios do contrato de seguro.
A metodologia utilizada foi o uso de entendimentos
doutrinários e jurisprudenciais, assim como o levantamento de dados
acerca dos contratos de seguros.
O presente trabalho, além de ser um trabalho didático-
científico, é uma pesquisa teórica e bibliográfica, para fins metodológico
e aplicação que, segundo Carvalho1, “ é a atividade de localização de
fontes diversas de informação escrita para coletar dados gerais ou
1 GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa, São Paulo: Atlas, 1998. p. 58.
10
específicos a respeito de um tema.” Conforme Lakatos2, ela visa colocar
o estudante em contato direto com tudo aquilo que foi escrito sobre
determinado assunto, a fim de estuda-lo, sendo portanto o primeiro
passo de toda pesquisa científica.
Para manter uma seqüência lógica para nosso trabalho, foi o
mesmo estruturado da seguinte forma:
No primeiro capítulo será tratado o instituto do contrato de
seguro de modo geral, trazendo sua contextualização histórica, dos
elementos e classificação dos contratos de seguro. Analisamos também a
modalidade do contrato de adesão que nasce da necessidade de
uniformização das cláusulas com o intuito de promover uma
dinamização das relações contratuais, numa pluralidade de situações
uniformes. Este tipo de contrato cria para o leigo a impossibilidade de
disposição sobre o conteúdo do contrato, restando apenas a possibilidade
se aceitar ou não o proposto. Contudo, isto, por si só, não caracteriza
adequadamente o contrato de adesão, o que será exposto ao longo desse
trabalho.
No segundo e último capítulo será examinado o foco
principal da nossa pesquisa, ou seja, o contrato de seguro frente ao
Código de Defesa do Consumidor. Tratamos de estabelecer um
parâmetro entre as cláusulas limitativas e restritivas inseridas nos
contratos de seguros.
2 LAKATOS, M. de. A metodologia Científica. São Paulo: Atlas, 1993, p. 37
11
CAPÍTULO I. CONTRATO DE SEGURO 1.1 Origem histórica
O contrato de seguro surgiu na idade medieval, sendo totalmente
desconhecido do Direito Romano. O seu surgimento deu-se em função da
importância e desenvolvimento da navegação3.
Nesta época o contrato de seguro não tinha credibilidade, em função da falta
de segurança que tal modalidade de contrato oferecia. O caráter idêntico ao do jogo e
da aposta ensejava a freqüente falência das seguradoras, e conseqüentemente o
segurado não recebia nenhuma indenização na ocorrência do sinistro.
Desta forma o primeiro ramo a surgir foi o seguro marítimo, conhecido no
século XVI. Com relação ao seguro terrestre, houve o seu desenvolvimento a partir
do século XVII, na Inglaterra. Entretanto a difusão de um modo geral iniciou-se no
final do século XVIII e início do século XIX, e difundindo amplamente a final, no
século XX, atingindo excepcional desenvolvimento até a atualidade.
No Brasil, a primeira modalidade a ser regulamentada fio o seguro marítimo,
através do Código Comercial de 18504.
Com relação aos seguros terrestres, a sua regulamentação inicial deu-se através
do Decreto nº 4.720, de 16 de dezembro de 1901, modificado posteriormente pelo
art. 3º, inciso VIII, da Lei nº 1.616, de 30 dezembro de 1906. Entretanto, o Decreto
nº 5.072, de 12 de dezembro de 1903, foi de suma importância, pois submeteu as
companhias de seguros à autorização para funcionamento do país.
No Código Civil Brasileiro de 1916, a matéria de seguro de coisas e de vida foi
disciplina em cinco diferentes seções, a saber: I- Das disposições gerais sobre o
3 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 101 4 Idem, p. 103
12
seguro; II- Das obrigações do segurado; III- Das obrigações do segurador; IV- Do
seguro mútuo; e V- Do seguro de vida.
1.2 Previsão legal
O contrato de seguro está disciplinado pelo Código Civil (Lei 10.406/2002) em
seu art.757, que define este contrato como aquele pelo qual “ o segurador se obriga,
mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo
a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados”.
1.3 Conceito
Para conceituar o contrato de seguro é necessário recorrermos à doutrina.
Segundo Pontes de Miranda: “É o contrato pelo qual o segurador se vincula,
mediante pagamento a ressarcir ao segurado, dentro do que se convencionou, os
danos produzidos por sinistro, ou a prestar capital ou renda quando ocorrer
determinado fato, concernente a vida humana ou ao patrimônio”5.
No entender de Caio Mario “...é o contrato por via do qual uma das partes
(seguradas) se obriga para com a outra (segurado), mediante o recebimento de um
prêmio, a indeniza-la ou a terceiros, de prejuízos resultantes de riscos previstos”6.
Para Fran Martins: “...aquele que uma empresa assume a obrigação de
ressarcir o prejuízo sofrido por outrem em virtude de evento incerto, mediante
pagamento de uma determinada importância”7.
No entendimento de Fabio Ulhoa Coelho: “ É o contrato em que uma parte
(Sociedade Seguradora) se obriga, mediante pagamento de um prêmio, a pagar à 5 MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Tratado de Direito Privado. São Paulo: Rssoi, 1997. p. 105. 6 PEREIRA, Caio Mario da Silva. Instituições do Direito Civil: Obrigações. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 1998 p. 95 7 MARTINS, Fran. Contratos Comerciais. Rio de Janeiro: Forense, 1997, p. 111
13
outra parte seguradora, ou a terceiros, beneficiários, determinada quantia caso
ocorra evento futuro e incerto”8.
As definições apresentadas no Código Civil para o contrato de seguro são
genéricas, assim como todo o tratamento dado por este diploma legal ao instituto.
Tendo em vista o imenso campo de abrangência dos seguros na sociedade atual e a
rápida evolução das necessidades sociais, o legislador preferiu deixar para a
legislação extravagante a disciplina das diversas subespécies de seguro. Ao Código
restou a disciplina geral deste contrato.
Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado
o Código Comercial de 1850, o que não significará a abolição dos conceitos
contrários do Direito Privado e do Comercial, sobre tudo porque o novo diploma traz
em seu Livro II a disciplina do Direito Empresarial.
No entender de Orlando Gomes: “O seguro é contrato mercantil, pois, por
imposição legal, só empresas organizadas sob forma de sociedade anônima podem
celebra-lo na qualidade de segurador... A natural exigência de que o segurador seja
uma sociedade por ações desloca o contrato do Direito Civil para o Direito
Comercial, tornando-o um contrato mercantil”9.
Ao contrato de seguro também é aplicada as regras do Código de Defesa do
Consumidor. É o que se depreende da análise de caput do art. 2º e do art. 3º,
parágrafo 2º deste diploma legal, in verbis: “art. 2º Consumidor é toda pessoa física
ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final. (...)
art. 3º ... parágrafo 2º Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de
consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de
crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista”.
Da definição do Código Civil depreende-se a existência de duas partes: o
segurador e segurado, que, no entanto, não são únicas, uma vez que pode surgir a
8 COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de Direito Comercial. São Paulo: Saraiva. 1998. p. 88 9 GOMES, Orlando. Contratos. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 1999. p. 410
14
figura do beneficiário, terceiro que receberia a indenização no caso de seguros de
vida e obrigatório contra acidentes de trabalho em que resultasse a morte do
segurado. Este estaria contido na expressão “interesse legítimo do segurado”,
mostrando mais uma vez a redação mais apurada no novo Código Civil, já que no
Código Civil de 1916, a estipulação em favor de terceiro tem que vir expressa nos
dispositivos que tratam de seguro de vida.
O objeto do contrato de seguro, segundo Caio Mario da Silva Pereira: “é o
risco, que, por enquanto, limitar-nos-emos a defini-lo como o evento futuro e
incerto, o qual, em se concretizando, ensejará o cumprimento da contraprestação de
“indenizar” por parte do segurador”10.
1.4 Elementos do contrato de seguro
Para podermos entender melhor como se caracteriza o contrato de seguro, se
faz necessário conhecermos os seus elementos:
a) A proposta – que é, geralmente, um documento emitido pela
seguradora, em formato padronizado, que aborda os limites
dos interesses das partes na contratação do seguro e as
condições iniciais, bem como valor do prêmio e da
indenização.
b) A apólice – que é documento principal regulador das
responsabilidades e obrigações de cada uma das partes e se
constitui no contrato instituído pela seguradora, mediante
regras impostas pela lei e pelo órgãos oficiais que fiscalizam
esta atividade econômica.
c) O estipulante – que é pessoa física ou jurídica que contrata o
seguro a favor de um segurado.
10 PEREIRA, Caio Mário da Silva, Op. cit., p. 410
15
d) O beneficiário – que é a pessoa física ou jurídica a qual se
destina o valor da indenização na hipótese de ocorrência do
sinistro previsto na apólice. Em algumas situações o
beneficiário poderá ser também o estipulante e o segurado.
e) O risco – que é o hipotético evento causador do dano físico,
moral, ou patrimonial ao segurado e em razão do qual é
contratado o seguro.
f) O sinistro – que é a ocorrência do evento danoso previstos na
contratação do seguro.
g) O prêmio – que é o valor pelo qual o segurado paga para
obter a garantia do seguro e que é recebido pela seguradora
como pagamento pela assunção do risco.
h) A cobertura – que é o valor garantido pela seguradora na
hipótese de ocorrência do evento danoso denominado de
sinistro.
i) A carência – que é o período de tempo em que o segurado
paga a sua contraprestação mas que o segurador não está
obrigado a indenizar se ocorrer o evento danoso.
j) A franquia – que é um limite de valor que deverá ser
suportado pelo próprio segurado, na hipótese de sinistro, e a
partir do qual passa a se responsabilizar a seguradora, tudo
conforme estipular o contrato. A franquia é contratual, pode
ser maior, menor ou não existir.
k) O rateio – que é uma condição contratual que prevê a
possibilidade do segurado assumir uma proporção da
16
indenização do seguro quando o valor segurado é inferior ao
valor efetivo do bem segurado.
l) O prazo de vigência – que representa o período de cobertura
do seguro, deve ser examinado e considerado como elemento
formador do valor do prêmio. Embora os seguros de uma
forma geral sejam contratados por um ano, já existem no
mercado várias modalidades de seguro que cobrem períodos
de meses, semanas, ou até dias.
A renovação dos contratos de seguro não é automática, salvo em alguns
contratos com cláusula neste sentido, portanto, havendo interesse do segurado na sua
prorrogação, deve procurar a seguradora antes de vencido o prazo de vigência do
seguro, sob pena de passar algum tempo descoberto antes da formalização do
contrato e do início de sua nova vigência.
1.5 Classificação do contrato de seguro
Segundo Loureiro: “ o contrato de seguro pode ser classificado em bilateral
sinalagmático, oneroso, aleatório, consensual, de execução sucessiva ou continuada,
de adesão, de boa-fé.”11
O contrato de seguro é um contrato bilateral, pois ambas as partes contraem
obrigações decorrentes do referido contrato. O fato de em muitos casos não houver
sinistro, não muda a natureza jurídica bilateral do contrato, pois, houve a obrigação
do segurador em cobri- lo, caso ocorresse, sendo tal posição pacífica na doutrina12.
É um contrato sinalagmático em virtude de haver dependência recíproca das
obrigações, ou seja, para que uma das partes possa exigir seus direitos decorrentes do
11 LOUREIRO, Luiz Guilherme de Andrade V. Seguro saúde (Lei n. 9656/98; Comentários, doutrina e jurisprudência. São Paulo: LEJUS, 2000. p. 37 12 Idem, ibidem.
17
contrato, mister tenha cumprido suas obrigações decorrentes da mesma relação
jurídica contratual.
Em virtude de que o segurado procura obter uma proteção patrimonial, e o
segurador visa obter vantagem patrimonial, é um contrato oneroso, pois existe o
intuito especulativo, gerando ônus e vantagens para ambos os contraentes.
Trata-se de contrato aleatório, em razão de que, entre as prestações devidas
não há equivalência, não há como saber, na contratação do seguro o que vai receber
no final, pois o acontecimento previsto contratualmente e passível de indenização
(risco), pode ocorrer ou não. A aleatoriedade é uma das mais evidentes
características dos contratos de seguro.
Segundo Maria Helena Diniz: “ o ganho ou a perda dos contraentes
dependerá de fatos futuros e incertos, previstos no contrato, que constituem o risco.
A natureza aleatória do contrato de seguro advém de sua própria função econômico-
social”13.
O contrato de seguro é um contrato consensual, pois surge através do acordo
de vontades, apesar da obrigatoriedade da forma escrita prevista no Código Civil14.
Segundo Orlando Gomes: “ basta o consenso manifestado pela forma
própria”15. Para Maria Helena Diniz : “ o contrato de seguro é um contrato formal,
sendo a forma escrita exigência para a substância do contrato”16.
Trata-se de contrato de execução sucessiva ou continuada, por tratar-se de
negócio que se destina a uma certa duração, por menor que seja o tempo, a fim de
proteger o bem ou a pessoa. Tal duração será até o término da vigência do contrato,
13 DINIZ, Maria Helena. Seguro. In: Tratado Teórico e Prático dos Contratos. São Paulo: Saraiva, 1993. p. 319. 14 Idem, p. 320. 15 GOMES, Orlando. Teoria Geral dos Contratos. Contratos em espécie. Seguros. In: Contratos: Rio de Janeiro: Forense, 1998. p. 207 16 DINIZ, Maria Helena. Seguro. In: Tratado Teórico e Prático dos Contratos: São Paulo: Saraiva, 1993. p. 321
18
ficando o segurador obrigado a garantir os interesses do segurado previstos
contratualmente durante toda a vigência.
O contrato de seguro é um contrato de adesão17, em virtude de que, o
contraente, ou seja, o segurado, na contratação, deve aderir a todas as cláusulas
preestabelecidas pelo segurador, não lhe sendo facultado discutir quaisquer uma
delas. Tal situação ocorre em virtude de que há uma necessidade de se uniformizar as
cláusulas e condições para todos os segurados, tendo em vista certos elementos que
serão analisados, como a mutualidade, o cálculo das probabilidades e
homogeneidade, a fim de que se possa definir o valor de seu preço, de seu prêmio, e
a delimitação dos riscos que serão cobertos na hipóteses de sinistro.
1.6 Do princípio da boa-fé
O contrato de seguro é, primordialmente um contrato de boa-fé. A boa-fé é
exigida tanto ao segurado, quanto ao segurador, prevendo a lei sanções para quem
contratar de má-fé. A boa-fé é a alma do contrato de seguro, pois, o segurado, ao
contratar, deve fazer declarações verdadeiras, a fim de que a espécie de seguro
contratado, e os riscos cobertos possam ser devidamente honrados pelo segurador,
pois dependendo do risco a ser coberto, é que se definirá o valor do preço, e com o
recebimento dos preços dos segurados, é que o segurador forma um fundo que
propicia o pagamento das indenizações.
Ao segurador também é exigida a boa-fé, quando ao expedir a apólice, tiver
conhecimento de que o risco passou, estará agindo de má-fé. Além deste hipótese,
uma questão muito relevante, que merece atenção é a da devida entrega ao segurado
das condições do seguro, para que tenha conhecimento das cláusulas, especialmente
as limitativas. Além da efetiva entrega ao segurado, as cláusulas limitativas não
podem ser obscuras, mal redigidas, ambíguas, pois neste caso não estaria o segurador
contratando de boa-fé.
17 Op. cit., p. 322.
19
1.7 Dos contratos de adesão
1.7.1 Conceito
Define-se o contrato de adesão como negócio jurídico no qual a participação
de um dos sujeitos da relação sucede pela aceitação em bloco de uma série de
cláusulas formuladas antecipadamente, de modo geral e abstrato, pela outra parte,
para construir o conteúdo normativo e obrigacional de futuras relações concretas18.
“Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela
autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de
produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar
substancialmente seu conteúdo.”19
1.7.2 Características
O contrato de adesão caracteriza-se por permitir que seu conteúdo seja pré-
construído por uma das partes, eliminada a livre discussão que precede normalmente
à formação dos contratos20.
O traço característico do contrato de adesão é a possibilidade de pré-
determinação de sua cláusulas, a determinação do conteúdo da relação negocial, pela
parte que faz a oferta ao público, o fornecedor. Um elemento essencial, portanto, do
contrato de adesão é a ausência de uma fase pré-negocial, a falta de um acordo
prévio sobre as cláusulas que comporão o contrato. Há uma pré-fixação de seu
conteúdo, deixando ao oblato a alternativa de aceitar ou rejeitar o contrato, sem
poder modificá- lo de maneira relevante, sendo que seu consentimento manifesta-se
na adesão ao conteúdo pré-estabelecido pelo fornecedor do bem ou serviço com
quem se deseja contratar.
18 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. Teoria das Obrigações Contratuais e Extracontratuais. São Paulo: Saraiva, 1995. p. 55 19 FRONTINI, Paulo Salvador. Contratos de Adesão, São Paulo: Revista do Advogado, 1990. p. 83-87 20 GOMES, Orlando. Contratos. Rio de Janeiro: Forense: Rio de Janeiro, 1999. p. 04
20
Há um esquema contratual constituído por uma série de cláusulas ou condições
destinadas a normatizar a seqüência de relações jurídicas contratuais.
O conteúdo desses contratos tem uma determinação prévia e unilateral, sendo
as cláusulas redigidas antecipadamente por um dos sujeitos da relação.
Os contratos de adesão só têm existência no momento que ocorre a aceitação
em bloco das cláusulas pré-concebidas pela outra parte, ou seja, só existe quando o
indivíduo consente. Formam-se, como qualquer contrato, pela composição de
vontades distintas. Orlando Gomes21, neste sentido, procura ressaltar que os efeitos
jurídicos advindos do contrato de adesão ratificam a posição contratualista, não
justificando tratamento especial como categoria distinta.
A função do contrato de adesão é, portanto, agilizar os negócios jurídicos,
democratizando as relações negociais, possibilitando que um maior número de
contratantes tenha acesso aos bens22.
Há, entretanto, desvantagens no contrato de adesão. E ele normalmente só é
lembrado, debatido e estudado em função dessas desvantagens conhecidas como
cláusulas abusivas. Normalmente, essas cláusulas não são percebidas e identificadas
no momento de contratar, isto é, o aderente normalmente não tem idéia de que está
acordando. Esse tema específico voltará a ser debatido mais à frente.
Esta relação contratual pode ser definida por dois ângulos:
a) Enquanto configura apenas a formação das cláusulas por
uma só das partes, é chamada de condições gerais dos
contratos.
b) Quando há efetiva adesão ao contrato, formando-se a
relação jurídica bilateral, temos o contrato de adesão 21 GOMES, Orlando. Contrato de Adesão: Condições Gerais dos Contratos. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1995. p. 46. 22 Idem, Ibidem, p. 47
21
propriamente dito, passando assim, a observar eficácia no
mundo jurídico. Em suma, são dois aspectos do mesmo
fenômeno em momentos diversos. No entanto as condições
gerais dos contratos, enquanto não ingressem no comércio
jurídico, não passam de simples amostra de formulário,
como se refere Orlando Gomes23, usando expressão alemã.
Ou seja, não tem interesse jurídico, são meras formulações.
Por seu turno o comportamento do cliente que cria uma
relação concreta só tem relevância jurídica quando implica
adesão às condições gerais do contrato preestabelecidas
pelo empresário.
1.7.3 Condições gerais dos contratos de adesão
Não obstante todas as discussões, estudos e debates acerca da natureza, da
formação, constituição, conceito e características dos contratos de adesão, ocorre
ainda uma célere discussão acerca da terminologia do contrato de adesão: uma, para
diferenciá- lo das condições gerais do contrato, outra distingue-o dos contratos por
adesão.
A figura jurídica do contrato de adesão apresenta-se sob duplo aspecto,
conforme o ângulo no qual seja formalizada. Analisando na perspectiva da
formulação das cláusulas por uma das partes, de modo uniforme e abstrato,
denomina-se condições gerais do contrato.
Segundo Theodoro Junior: “quando analisado no plano efetivo, já tomado
corpo na eficácia jurídica, é chamado contrato de adesão, sendo analisado no
prisma do modo por que se formam as relações jurídicas bilaterais”24.
23 Op. cit., p. 119 24 JUNIOR, Humberto Theodoro. Contratos – Princípios Gerais – Tendências do Direito Contratual Contemporâneo. Revista dos Tribunais: São Paulo, RT 765, 1999. p. 33
22
O contrato de adesão é configurado pelo monopólio, de fato ou direito, do
fornecedor. Caso contrário será contrato por adesão, como nos ensina Orlando
Gomes: “É pressuposto, pois, do contrato de adesão o monopólio de fato, ou de
direito, de uma das partes que elimina a concorrência para realizar o negócio
jurídico. Se a situação não se configura desse modo, poderá haver contrato por
adesão, jamais contrato de adesão.25”
Enquanto não ingressam no comércio jurídico, tais condições não têm
interesse prático ou dogmático. Por seu turno, o comportamento do cliente que
provoca a formulação de uma relação concreta somente reveste significação
particular se implica adesão às condições gerais previamente estatuídas pelo
empresário.
25 GOMES, Orlando. Contratos. Op. cit., p. 101
23
CAPÍTULO II. O CONTRATO DE SEGURO EM FACE AO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR 2.1 Considerações iniciais
O advento do Código de Defesa do Consumidor em 1990, ocasionou
mudanças significativas nas relações contratuais de toda natureza, pois forçou os
fornecedores a estarem atentos às exigências legais, sendo então mais um aliado dos
consumidores.
A nova concepção contratual distancia-se daquela onde o que vale é a vontade
das partes. O que o CDC deixou claro é que as diferenças entre os contratantes
podem e devem ser levadas em conta, pois acarretam muitos prejuízos àqueles mais
fracos. É exatamente procura do equilíbrio contratual que a lei aparece na sociedade
de consumo moderna para destacar seu papel como limitadora e legitimadora da
autonomia da vontade, protegendo então os interesses sociais, valorizando a
confiança, as expectativas e a boa-fé dos contratantes.
No que se refere aos aspectos contratuais da proteção do consumidor, o CDC
rompeu com as tradições do direito privado, assentadas no liberalismo do século XIX
para instituir uma nova realidade.
Inicialmente, enfatizou o princípio do equilíbrio do contrato em detrimento
daquele que estabelece que os contratos devem ser cumpridos (pacta sunt servanda).
Para entendermos melhor essa afirmação, citamos o art. 6º, inciso V do Código
de Defesa do Consumidor, que declara: “ São direitos do consumidor: (...)V – a
modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais
ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente
onerosas”. Desta forma é possível perceber que a intenção maior do legislador foi
assegurar o equilíbrio contratual e não a vontade declarada no contrato.
24
Nota-se também que há a primazia da boa-fé contratual, dando a este princípio
caráter basilar das relações de consumo.
O Código de Defesa do Consumidor também impôs ao fornecedor o dever de
prestar declaração de vontade, se tiver veiculado oferta, apresentação ou publicidade,
gerando mais responsabilidades ao anunciar o produto ou o serviço, exatamente
visando transparência maior ao consumidor. E se o fornecedor veicular uma oferta
específica, determinada, ficará obrigado nos termos dela, resolvendo-a em perdas e
danos caso não a cumpra. Estes são alguns exemplos significativos das inovações e
mudanças que o CDC impôs às relações contratuais.
As alterações sofridas nas regras tradicionais foram necessárias, uma vez que,
as mesmas não mais atendem aos anseios das relações contratuais atuais,
principalmente quando se fala em contratos de adesão que, como já visto
anteriormente, são capazes de gerar mais abusividades do que os demais.
2.2 O Código de Defesa do Consumidor em relação ao contrato de
seguro
No que se refere ao contrato de seguro mais especificamente, a interpretação é
voltada em favor dos segurados nos casos em que há flagrante ambiguidade de
interesses. Outro lado da interpretação é a prevalência das cláusulas acertadas sobre
as impressas. Desta forma, quando se estiver diante de uma situação em que esteja
em jogo uma cláusula escrita à mão pelo segurado e outra impressa no modelo do
segurador, prevalecerá a escrita, pressupondo-se ser esta decorrente de um acordo
entre as partes sobre aquele ponto específico.
A interpretação dos contratos de seguro assegurada pelos mais diversos
Tribunais do país demonstra que há uma preocupação constante em sempre,
guardadas as devidas proporções, beneficiar o segurado.
25
Porém, é de se frisar que o crescimento do mercado segurador é observado
atentamente pelos organismos de controle, que reconhecem sua importância sem
deixar que a visão capitalista deturpe as conquistas já alcançadas pelo Código de
Defesa do Consumidor.
2.3 O contrato de seguro como relação de consumo
No artigo 3º parágrafo 2º do CDC, estão elencados os serviços merecedores de
sua proteção. Dentre eles, o contrato de seguro se destaca como uma atividade do
mercado de consumo, não havendo quaisquer dúvidas sobre sua inclusão, pois está
explicitamente indicado. In verbis: Art. 3º (...) Parágrafo 1º (...) parágrafo 2ºServiço
é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração,
inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as
decorrentes de caráter trabalhista.
Portanto, fica assim caracterizado que o contrato de seguro é objeto de
proteção do Código de Defesa do Consumidor, devendo estar enquadrado em sua
regras elementares. Entretanto, há que se ressaltar que o seguro é um tipo de
contratação que tem legislação específica desde 1966, pelo Decreto nº 73/66, que
regula todas as operações de seguro privado no país, dando-lhes a regulamentação
necessária ao seu efetivo comportamento no mercado.
Nos contratos, ocorre o grande problema do desequilíbrio das forças dos
contratantes. Sendo que, uma das partes é muito vulnerável, hipossuficiente26, é o
pólo mais fraco da relação contratual, pois esta parte não pode discutir o conteúdo do
contrato; mesmo com conhecimento de que determinada cláusula é abusiva, restando
somente a opção de aceitar nas condições que lhe é oferecida pelo fornecedor.
No que se refere as contratações feitas na forma de adesão, foi necessário um
rigor maior do CDC, principalmente pela incidência maior de abusividades. No
entanto, o artigo 54 deste código deixou claro que estes contratos (de adesão) não
26 GRINOVER, Ada Pelegrini. Código brasileiro de defesa do consumidor comentado pelos autores do anteprojeto. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 72
26
podem ser abominados, pela sua importância crucial nas contratações num mundo
globalizado e mais dinâmico. Por este motivo, ao mesmo tempo que no Código de
Defesa do Consumidor se proíbem as cláusulas abusivas, são admitidas
simplesmente as cláusulas limitativas de direitos, com a ressalva de estarem estas
bem redigidas e destacadas do texto principal.
Contudo, para estas cláusulas, o que se tenta é a informação e não a ignorância
do consumidor. Assim, um consumidor mais informado terá melhores condições de
se defender, ao contrário daquele que não tinha conhecimento do que estava
contratando. A cláusula limitativa ou restritiva de direitos não é nula de pleno direito,
como entendem alguns operadores jurídicos. Deve sim estar “engessada” em
parâmetros bem definidos, como faz o Código de Defesa do Consumidor. Fora destes
limites, poderá ser declarada nula. Do contrário, a nulidade não se faz presente. É o
que se vê no art. 54 do CDC e seus parágrafos, in verbis: art. 54 Contrato de adesão
é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou
estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o
consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo. Parágrafo
1º A inserção de cláusula no formulário não desfigura a natureza de adesão do
contrato. Parágrafo 2º Nos contratos de adesão admite-se cláusula resolutória,
desde que alternativa, cabendo a escolha ao consumidor, ressalvando-se o disposto
no parágrafo 2º do artigo anterior. Parágrafo 3º Os contratos de adesão escritos
serão redigidos em termos claros e com caracteres ostensivos e legíveis, de modo a
facilitar sua compreensão pelo consumidor. Parágrafo 4º As cláusulas que
implicarem limitação de direito do consumidor deverão ser redigidas com destaque,
permitindo sua imediata e fácil compreensão.
Há que ressaltar que o referido artigo em seu parágrafo 4º admite
expressamente as cláusulas limitativas, desde que elas sejam redigidas com destaque,
de modo a permitir sua imediata e fácil compreensão.
Estas cláusulas, portanto, para que possa efetivamente ter validade e estar a
salvo de qualquer contestação, devem ser incluídas na apólice ou em outro
27
documento qualquer e entregue ao segurado, com total clareza e melhor
transparência possível.
2.4 Da aplicação do Código de Defesa do Consumidor nos contratos
de seguro
Com o advento do Código de Defesa do Consumidor, os contratos de consumo
em as relações que ligam o consumidor ao profissional, fornecedor de bens ou
serviços sofreram enormes transformações, com o intuito de preservar um provável
desequilíbrio entre as partes contratantes, tal seja o consumidor. Com a promulgação
da Constituição Federal de 1988, entre os direitos individuais, está inserida a norma
que prevê a defesa do consumidor, no artigo 5º, XXXII: O Estado promoverá na
forma da lei a defesa do consumidor.
Na referida Constituição, nos Atos das Disposições Constitucionais
Transitórias, em seu artigo 48, ficou determinado que o Congresso Nacional, dentro
de cento e vinte dias da promulgação da Constituição, elaborará Código de Defesa
do Consumidor.
Diante de tal previsão constitucional, adveio o Código de Defesa do
Consumidor (Lei nº 8.078/90), cuja necessidade é de regular as “relações de
consumo”. Nas relações contratuais, o citado Código regula-as, de maneira assegurar
um justo equilíbrio dos direitos e obrigações das partes contratantes, e desta forma,
harmonizando as forças do contrato através desta regulamentação especial.
No entanto, o novo direito dos contratos está evitando que tal desequilíbrio
ocorra, procurando a equidade contratual entre as partes. A professora Cláudia Lima
Marques27 revela a importância dos contratos de seguro para tornar o direito dos
contratos mais social, a fim de tornar o desequilíbrio entre as partes menos
alarmante.
27 MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p.133
28
Os contratos de seguro foram responsáveis por uma grande evolução
jurisprudencial no sentido de conscientizar-se da necessidade de um direito dos
contratos mais social, mais comprometido com a equidade e menos influenciado pelo
dogma da autonomia da vontade.
As linhas de interpretação asseguradas pela jurisprudência brasileira aos
consumidores de seguro, são um bom exemplo da implementação de uma tutela
especial para aquele contratante em posição mais vulnerável na relação contratual.
No contrato de seguro, esta vulnerabilidade do contratante também está
presente, ou seja, há um enorme diferencial entre as partes contratantes, entretanto
com o surgimento do Código de Defesa do Consumidor vem ocorrendo uma
conscientização da necessidade de uma relação contratual mais social, com o
comprometimento com a equidade do que influenciado pela manifestação da
autonomia da vontade.
Deste modo, estas relações de consumo necessitavam de uma intervenção
regulamentadora do legislador, qual seja a intervenção de reequilíbrio, mormente
agora instrumentalizado com as normas do Código de Defesa do Consumidor.
A atividade secundária está abrangida pelo Código de Defesa do Consumidor,
em fase do artigo 3º, inciso 2º, incluindo como serviço para proteção e defesa do
consumidor.
O inciso acima mencionado define o serviço como qualquer atividade
fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza
bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de
caráter trabalhista.
Diante de tal artigo, verifica-se a aplicabilidade do Código de Proteção do
Consumidor aos contratos de seguro. Segundo José Geraldo Brito Filomeno28, um
28 FILOMENO, José Geraldo Brito. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor comentado pelos autores do anteprojeto. Rio de Janeiro: Forense, 1990. p. 40.
29
dos autores do anteprojeto do Código, faz uma clara colocação sobre o assunto:
Aliás, o Código fala expressamente em atividades de natureza bancária, financeira,
de crédito e securitária, aqui se incluindo igualmente os planos de previdência
privada em geral, além dos seguros propriamente ditos, de saúde, etc.
Segundo Cláudia Lima Marques29, em seu posicionamento sobre contratos
submetidos ao CDC, dentre eles, o contrato de seguro, demonstra a devida aplicação
do referido Código em tais contratos:
Resumindo, em todos estes contratos de seguro podemos identificar o
fornecedor exigido pelo art. 3º do CDC, e o consumidor: Note-se que o destinatário
do prêmio pode ser o contratante com a empresa seguradora (estipulante) ou terceira
pessoa, que participará como beneficiária do seguro. Nos dois casos, há um
destinatário final do serviço prestado pela empresa seguradora. Como vimos, mesmo
no caso do seguro-saúde, em que o serviço é prestado por especialistas contratados
pela empresa (auxiliar na execução do serviço ou preposto), há a presença do
‘consumidor’ ou alguém a ele equiparado, como dispõe o art. 2º e seu parágrafo
único.
Portanto os contratos de seguro estão submetidos ao Código de Proteção do
Consumidor, devendo suas cláusulas estarem de acordo com tal diploma legal,
devendo ser respeitadas as formas de interpretação e elaboração contratuais,
especialmente a respeito do conhecimento ao consumidor do conteúdo do contrato, a
fim de coibir desequilíbrios entre as partes, principalmente em razão da
hipossuficiência do consumidor em relação ao fornecedor.
Atualmente, não é o modo de formação dos contratos que é responsável pelo
surgimento de desequilíbrios contratuais, mas sim, a inserção de cláusulas limitativas
e abusivas, introduzidas unilateralmente pelo fornecedor, pelo fato de ocupar uma
posição de destaque e poder, estabelecendo antecipadamente o conteúdo do contrato,
situação que ocorre nos contratos de seguro.
29 MARQUES, Claudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor. Op. cit., p. 114
30
Geralmente, os contratos de adesão, e ai podemos inserir o contrato de
seguro, não são totalmente eivados de vícios da manifestação de vontade, mas sim,
em condições gerais demonstram através de redação capciosa não em todo o texto,
mas em determinadas cláusulas ou pontos específicos apresentam estas deformações
contratuais.
O contrato de seguro é sem dúvida um contrato de adesão, ou seja, cujas
cláusulas contratuais são determinadas unilateralmente, suprimindo-se todas e
quaisquer negociações prévias, opondo-se visivelmente aos contratos individuais,
onde são permitidas e realizadas discussões e negociações amplas das cláusulas
contratuais.
Cabe ressaltar que as cláusulas limitativas e abusivas não são exclusivamente
parte integrante dos contratos de adesão e dos contratos de consumo; também podem
estar presentes nos contratos paritários.
Diante da aplicação do Código de Defesa do Consumidor aos contratos de
seguro, mister se faz um estudo de suas cláusulas limitativas, a fim de que possa ser
verificado como devem ser utilizadas tais cláusulas no contexto contratual, sob a
égide deste diploma legal, e se, de alguma forma, as cláusulas limitativas podem se
tornar abusivas.
2.5. A interpretação das cláusulas limitativas dos contratos de seguro
em face do Código de Defesa do Consumidor
2.5.1. Da cláusula limitativa
Com aplicação do Código de Defesa do Consumidor nos Contratos de
Seguro, a questão das cláusulas limitativas no contrato em questão tem gerado muitas
controvérsias.
31
2.5.1.1. Conceito de cláusula limitativa
Cláusula limitativa é aquela que implica em limitação do direito do
consumidor30. Tal cláusula limita e impõe algumas situações contratadas pelo
consumidor, ou seja, tal cláusula não é abusiva, a princípio, apenas limita e impõe
desvantagem, sendo que a mesma não é proibida pelo Código de Defesa do
Consumidor. Toda situação ou estipulação que implicar ou carecer qualquer
limitação de direito do consumidor, bem como a que indicar desvantagem ao
aderente, deverá estar obrigatoriamente exposta, de forma mais clara, no contrato de
adesão.
2.5.1.2. As cláusulas limitativas inseridas no contrato de seguro
O contrato de seguro, em virtude de sua natureza jurídica, possui diversas
cláusulas limitativas. Tal situação ocorre em decorrência de que, na cobertura do
risco, o contrato de seguro se alicerça em alguns fundamentos que são a mutualidade,
cálculo das probabilidades e homogeneidade para definir o valor de seu preço, ou
seja, o valor do prêmio, e da futura indenização, e a delimitação dos riscos que
estarão cobertos. Portanto, o contrato de seguro possui cláusulas que são limitativas
dos riscos, para viabilizar suas contratações e indenizações.
Há que se ressaltar que tais situações ganham real importância com o dever
do fornecedor ao consumidor sobre o conteúdo do contrato.
No Código de Defesa do Consumidor, as cláusulas limitativas do risco não
ficaram proibidas, pois nesta questão, existe plena harmonia com o Código Civil.
Há que se ressaltar também, que a existência da cláusula limitativa tem por
finalidade restringir a obrigação assumida pelo segurador de acordo com o principio
milenar de que ninguém pode ser coagido a assumir obrigação maior do que deseja.
30 FILOMENO, José Geraldo Brito. Código de Defesa do Consumidor comentado pelos autores do anteprojeto. Op. cit., p. 41.
32
Reside portanto, nesta visão a própria essência da liberdade de contratar; as partes
manifestam a sua vontade livremente, estabelecendo as obrigações que entenderem
possíveis.
A maioria dos consumidores que concluem contratos pré-redigidos o fazem
sem conhecer precisamente os termos do contrato. Geralmente, o contratado não tem
a oportunidade de estudar e analisar com cuidado as cláusulas do contrato, ora
celebrado, seja porque eles as receberá somente após concluir o mesmo, seja porque
eles se encontram disponíveis somente em outro local, seja porque o instrumento
contratual é longo, impresso em pequenas letras e em linguagem técnica, tudo
desestimulando a sua leitura e colaborando para que o consumidor se contente com
as informações gerais prestadas pelo contratante.
No direito comparado, quando se analisam as cláusulas de limitação da
responsabilidade e seus efeitos nos contratos de consumo, dois temas são sempre
destacados: a necessidade de equilíbrio do contrato e o de segurança nas relações
contratuais.
As cláusulas limitativas de responsabilidade da parte mais forte, assim como
as de exclusão, desequilibram a relação contratual, impedindo uma composição
eqüitativa dos interesses privados que o contrato é regulado. Na ocorrência de cisão
deste equilíbrio entre direitos e obrigações de cada uma das partes contratadas, ao
retirar ou limitar as garantias normais que teria a parte mais fraca em contratos sem
este tipo de cláusula, enseja o desequilíbrio contratual entre as partes.
A argumentação da admissibilidade das cláusulas de limitação da
responsabilidade do fornecedor em função da redução da contraprestação, como se
fosse possível reduzir o preço de um produto comparar a irresponsabilidade ou o
direito de prejudicar os outros, não resistiu a uma análise ética.
Desta forma, coube ao legislador estabelecer alguns parâmetros quanto à
possibilidade de limitar o contrato, os direitos do contratante mais fraco, ou seja,
verificando a possibilidade de limitar a obrigação/responsabilidade do contratante
mais fraco. Há que ressaltar, que nesta linha raciocínio o legislador impôs novas
33
normas, representadas pela sua maioria imperativa no Código de Defesa do
Consumidor.
Atualmente, a tendência é contestar a validade das cláusulas limitativas de
responsabilidade, mas com o cuidado de evitar generalizações perigosas que possam
ameaçar o equilíbrio, a justiça do contrato, deixando para a Justiça o papel de
solidificação do princípio.
O Código de Defesa do Consumidor enfrentou a inclusão de algumas
cláusulas limitativas de responsabilidade do fornecedor em contratos de consumo e,
para tanto, criou formas especiais a serem cumpridas para a sua completa validação.
O legislador também concentrou e previu no CDC uma linha de proibição
genérica às cláusulas limitativas que atenuem a responsabilidade por vícios de
qualquer natureza dos produtos e serviços (art. 25 e 51, I do CDC) e as que atenuem
a responsabilidade de indenizar, prevista na seção sobre o fato do produto ou do
serviço e sobre qualidade de produtos ou serviços (art. 24 e 25 do CDC).
No entender de José Aguiar Dias:
“Sem embargo de sua utilidade, pois estimula os negócios, mediante o
afastamento da incerteza sobre o quantum da reparação, a cláusula limitativa
muitas vezes resulta em burla para o credor. Dificilmente se dá o caso de ser o
dano real equivalente à reparação prefixada: o mais freqüente é representar um
simulacro de perdas e danos.
Continuando, ainda destaca: quando a soma arbitrariamente fixada resulte em
verdadeira lesão para o credor, principalmente quando se trate de transporte,
cujo contrato geralmente é de natureza a excluir a liberdade de discussão por
parte do interessado no serviço. Portanto, diante da própria natureza jurídica do
contrato de seguro, as cláusulas limitativas são inerentes a tal espécie de
contrato, e em razão da aplicabilidade do Código de Proteção ao Consumidor
34
aos contratos de seguro, tais cláusulas devem estar de acordo com os preceitos
estabelecidos no citado Código.”31
Dentre os tais preceitos, no tocante às cláusulas contratuais, pode-se destacar
o artigo 46, que dispõe sobre a necessidade de dar ao consumidor conhecimento
prévio do conteúdo do contrato, e que veda a redação contratual efetuada de forma
que dificulte a compreensão do sentido e alcance de sua cláusulas.
2.6. Das cláusulas limitativas e as cláusulas abusivas no contrato de seguro
As cláusulas limitativas são inerentes aos contratos de seguro, em virtude da
necessidade de se delimitar os riscos cobertos no contrato.
Na análise da classificação dos contratos de seguro, o mesmo é tratado como
um contrato de adesão. Os contratos de adesão são frutos da sociedade de consumo e
da massificação das relações de consumo, e as suas características, antes do advento
do Código de Proteção ao Consumidor eram disciplinados pela doutrina e
jurisprudência, não tendo a legislação pátria regulamentado tal conceituação jurídica.
Portanto, o Código de Proteção ao Consumidor (Lei n.º 8.078/90) é a primeira
lei brasileira a disciplinar tal modalidade contratual, conceituando-a em seu artigo
54.
Pela definição do referido artigo, verifica-se que o contrato de seguro é um
contrato de adesão, devendo suas cláusulas obedecerem os dispositivos contidos nos
parágrafos do artigos em tela.
No tocante às cláusulas limitativas, o parágrafo 4º nos revela que deverão ser
redigidos com destaque, permitindo sua imediata e fácil compreensão. Fica evidente
que o Código de Proteção do Consumidor não proibiu a inserção de cláusulas
limitativas nos contratos, mas regulamentou a sua inserção dentro do contesto
contratual.
31 DIAS, Aguiar José. Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Forense, 1997. p. 59.
35
O Código Civil Brasileiro, em seu art. 760 determina que os riscos assumidos
deverão constar na apólice.
É de se analisar, portanto, que sobre as cláusulas limitativas, o Código Civil e
o Código de Proteção ao Consumidor estão em sintonia. Ocorre que, as cláusulas
limitativas merecem maior atenção em relação a abusividade, ou seja, se em algum
momento as cláusulas limitativas se caracterizam como abusivas, serão nulas de
pleno direito, conforme dispõe o artigo 51 do referido texto legal.
No tocante as cláusulas limitativas, indispensáveis para contratação de
seguros, conforme já analisado, estas devem estar inseridas no corpo contratual nos
moldes do parágrafo 4º do artigo 54 do CDC, ou seja, devidamente incluídas na
apólice, redigidas em destaque, e de fácil compreensão, além de que devem ser
entregues ao segurado, para que este tenha pleno conhecimento das limitações ao seu
direito.
O insigne Desembargador Sérgio Cavalieri Filho nos distingue a cláusula
limitativa do risco e da cláusula abusiva nos contratos de seguro, nos seguintes
termos:
“Tenho sustentado que a principal diferença entre a cláusula limitativa do risco,
da qual acabamos de falar, e a cláusula abusiva está em que a primeira tem
por finalidade restringir a obrigação assumida pelo segurador, enquanto a
segunda objetiva restringir ou excluir a responsabilidade decorrente do
descumprimento de uma obrigação regularmente assumida pelo segurador, ou
ainda a que visa a obter proveito sem causa. E, como todos sabemos,
obrigação e responsabilidade são coisas distintas, que não podem ser
confundidas.”32
32 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Visão Panorâmica do Contrato de Seguro e suas Controvérsias. São Paulo: Revista do Advogado, 1996, n. 47, p. 7-13.
36
Portanto, a princípio, as cláusulas limitativas nos contratos de seguro não são
vedadas, não sendo consideradas abusivas, devendo estar inserida no contexto
contratual de acordo com o determinado no Código de Proteção ao Consumidor.
Ocorre que, nos casos concretos, a forma como está inserida uma cláusula
limitativa, seu conteúdo em relação ao objeto do contrato, ou até a apresentação de
uma proposta simplificada na contratação, com a posterior entrega ao segurado do
contrato, e muitas vezes, sem até tal entrega, causando um total desconhecimento das
cláusulas, especialmente as limitativas ocasionam um profundo desequilíbrio entre as
partes, gerando o conflito de interesses, entre o segurado que almeja a proteção
pessoal ou patrimonial, e o segurador, que necessita limitar os riscos para a
viabilização das indenizações.
Desse modo, no conflito de interesses entre segurado e segurador, o contrato
deve ser interpretado segundo o artigo 47 do Código de Proteção ao Consumidor,
favorável ao consumidor, ou seja, ao segurado.
O referido Código, na esfera contratual, visa a coibir desequilíbrios entre as
partes, disciplinando como devem ser as relações jurídicas contratuais, devendo o
fornecedor dar conhecimento prévio ao consumidor sobre o conteúdo do contrato,
além de utilizar redação clara, destacando as que importem em limitação ao direito
do consumidor, como se verifica nos artigos 46, e 54 §§ 3º e 4º.
Em não se observando tais preceitos exigidos pelo ordenamento jurídico,
acarretará uma profunda desigualdade entre as partes contratantes, na qual o
segurado terá pago o prêmio, sem conhecimento das cláusulas que limitam seu
direito a indenização na hipótese de risco. Cabe analisar a extensão do disposto pelo
Código de Proteção ao Consumidor no tocante à interpretação das cláusulas
limitativas, a fim de que tais cláusulas não caracterizem como abusivas.
O professor Fernando Noronha define cláusulas abusivas como sendo:
aquelas em que contratos entre partes de desigual força reduzem unilateralmente as
37
obrigações do contratante mais forte ou agravam as do mais fraco, criando uma
situação de grave desequilíbrio entre elas33.
Portanto, cláusulas abusivas são aquelas em que uma parte se aproveita da sua
posição de superioridade para impor em seu benefício vantagens excessivas, que ou
defraudam os deveres de lealdade e colaboração que são os pressupostos da boa-fé,
ou sobretudo, aniquilam uma relação de equidade que é um princípio de justiça
contratual. Desta forma, o resultado desta relação será uma gravíssima situação de
desequilíbrio entre os direitos e obrigações de uma e de outra parte contratante.
Regulando o contrato de seguro, este tem submissão aos preceitos estipulados
no Código de Defesa do Consumidor, e no artigo 46, define que: os contratos que
regulam as relações de consumo não obrigarão os consumidores se não lhes for dada
oportunidade de tomar conhecimento prévio de seu conteúdo, ou se os respectivos
instrumentos forem redigidos de modo a dificultar a compreensão de seu sentido e
alcance.
Não obstante, para que uma cláusula seja considerada abusiva, é necessária
que a mesma contenha vantagens econômicas indevidas, ou facilidades originadas
pelo abuso do predisponente, tornando a negociação mais onerosa ao consumidor,
implicando em vantagem pecuniária, originária de uma flagrante demonstração de
inferioridade jurídica do aderente.
Ademais o Código de Defesa do Consumidor, no art. 51, que trata da
proteção contratual, enumera, não em numerus clausus, mas exemplificadamente, as
cláusulas nulas:
Artigo 51 – São nulas de pleno direito, entre outra, as cláusulas contratuais
relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:
(...)
33 NORONHA, Fernando. O direito dos contratos e seus princípios fundamentais (autonomia, boa-fé, justiça contratual). 1ª ed. São Paulo: Saraiva, 1999.
38
IV – estabeleçam obrigações consideradas iníquas, que coloquem o
consumidor em desvantagem exagerada, ou seja incompatíveis com a boa-fé ou a
equidade.
Com relação a interpretação dos contratos, o Código de Defesa do
Consumidor, reza no Art. 47: As cláusulas contratuais serão interpretadas de
maneira mais favorável ao consumidor.
Há que ressaltar que o legislador, preocupado com a posição ocupada pelo
aderente, procurou de maneira preventiva, evitar eventuais discrepâncias entre as
partes contratantes, determinando que a interpretação deverá ser feita de maneira
mais favorável ao consumidor, em detrimento da empresa que estabelece
unilateralmente as cláusulas contratuais.
Prática abusiva é, portanto a desconformidade com os padrões
mercadológicos de conduta boa, lícita numa relação perante o consumidor. Devem
ser consideradas como condições irregulares de negociações de consumo, que
desobedecem os alicerces da ordem jurídica, seja pelo âmbito da boa-fé, seja pela
ótica dos costumes e da ordem pública.
De um modo geral, as práticas abusivas nem sempre se mostram como
atividades enganosas, pois muitas vezes apesar de não desobedecerem o requisito da
veracidade, carregam uma carga alta de imoralidade econômica e de opressão.
O Código de Defesa do Consumidor prevê uma série de situações, sejam elas
contratais ou não, que abusam da boa-fé do consumidor, ou de sua situação de
flagrante inferioridade econômica ou técnica.
Sua manifestação, geralmente ocorrem através de atividades pré ou pós-
contratuais, e assim como propriamente contratuais, em que o consumidor sente-se
indefeso, e se as tem, não sentir-se-á incentivado, habilitado ou motivado para
exercer.
39
Desta forma, as práticas abusivas estão espalhadas pelo Código de Defesa do
Consumidor, não se limitando as situações enumeradas pelo Art. 39. Tampouco
também se limitam ao CDC, mas também estão presentes na Lei n.º 8.137/90 – Lei
dos Crimes contra a Ordem Tributária, Econômica e Contra as Relações de
Consumo).
Diante dos preceitos elencados no Código de Defesa do Consumidor, no
tocante à correta inserção das cláusulas limitativas no contexto contratual, sua forma
de interpretação, o dever de informar o conteúdo do contrato, todos devem ser
observados na elaboração e contratação de seguros.
Na hipótese de não entrega ao segurado da apólice, ou as condições gerais
que contem as cláusulas aplicadas ao seguro contratado, tal situação gera um
profundo desequilíbrio entre as partes contratantes, colocando o segurado-
consumidor em desvantagem excessiva em relação ao segurador-fornecedor. Tal
situação ocorre em virtude de que, se não são entregues ao segurado as cláusulas que
limitam o contrato de seguro, não pode o segurado ter conhecimento das mesmas.
Na contratação, o segurado-consumidor paga o prêmio e adquire direitos, e no
momento que necessita da cobertura de um determinado risco, tem conhecimento de
que aquele determinado risco estava limitado em seu contrato sua não cobertura,
devendo tal situação ser analisada sob o prisma do Código de Proteção do
Consumidor.
Ocorre que, muitas vezes, o segurado não recebe as condições gerais do
contrato de seguro celebrado, que contém as cláusulas que regem-no, recebendo
somente a apólice com os valores contratados, e um sucinto manual. Portanto, todas
as cláusulas que forem limitativas, e se enquadrarem na situação acima prevista,
tornar-se-ão cláusulas abusivas, pois não obedecidas as disposições previstas no
Código de Defesa do Consumidor para a validade das cláusulas limitativas sem
qualquer contestação, especialmente no tocante ao Art. 46, além de colocar o
consumidor em desvantagem, e não estar compatível com a boa-fé, reputando-se
abusiva, conforme disposto no Art. 51, inciso IV do citado Código.
40
A prova da efetiva entrega do contrato contendo as condições gerais, deve ser
feito pela Seguradora, conforme Art. 6º, inciso VIII do Código de Proteção ao
Consumidor, que permite a inversão do ônus da prova em favor do consumidor.
Além das situações alhures apresentada, as cláusulas limitativas devem estar
corretamente inseridas no contexto contratual, nos moldes do preceituado no § 4º do
Artigo 54 do referido texto legal. Portanto, as cláusulas limitativas, além de serem
redigidas com destaque, devem ter redação clara, de modo a não restar dúvidas ao
segurado no tocante à limitação imposta contratualmente.
Cabe analisar que, nos contratos de seguro em que as cláusulas limitativas
estiverem redigidas como as demais, sem qualquer destaque, ou a sua redação for
obscura, ambígua, de modo a não delimitar correta e claramente as limitações
impostas, tal situação também coloca o consumidor em situação de desvantagem
exagerada, além de abusar da boa-fé do segurado.
Portanto, quando as cláusulas limitativas nos contratos de seguro não
estiverem de acordo com o estabelecido no Código de Defesa do Consumidor, tais
cláusulas não só deverão ser interpretadas em favor do segurado-consumidor, mas
também deverão ser consideradas nulas de pleno direito, por não obedecerem o
determinado no referido Código, e por conseguinte, colocando o segurado em
desvantagem excessiva.
Para as empresas que o lançam no mercado, o seguro é o contrato pelo qual
elas captam recursos para pagar eventuais sinistros e, o restante, investir nas
operações financeiras, visando lucro. É um contrato baseado única e exclusivamente
em estatísticas. Funciona da seguinte forma: oferece-se um produto (seguro de
automóvel, por exemplo) para o mercado.
41
Dos contratos firmados, apenas 10 ou 15% resultarão em sinistros pagos34. O
restante, pode perfeitamente ser aplicado nas operações financeiras (títulos públicos,
valores mobiliários, etc..) para garantir o pagamento dos sinistros e o restante lucro.
Quando bem estruturado, é um dos mercados mais promissores da atualidade,
gerando fontes de riquezas e investimento para o país.
Mesmo sendo expressiva sua participação no mercado, o seguro não deixa de
ter importância nos aspectos sociais, daí a grande regulamentação legal que sofre este
tipo de contrato. Um exemplo bastante válido é o seguro obrigatório (DPVAT), em
relação ao qual, pelo seu caráter social, a legislação que o regula chegou a conceder a
indenização mesmo quando não há pagamento do prêmio respectivo.
O que se quer deixar claro é que o seguro facultativo é um contrato baseado
na mutualidade. Se, por um lado, há uma obrigação de indenizar da seguradora, há,
por outro, a obrigação de pagar o prêmio estipulado. Os riscos cobertos devem estar
também muito bem especificados, pois é com base neles que o valor do prêmio será
calculado, limitando e particularizando as hipóteses de incidência. Norteando tudo
isso, aparece ainda a boa-fé do segurado, sem a qual ele perde o direito de ser
indenizado.
Este é o ponto central da discussão. O Código de Defesa do Consumidor veda
as cláusulas abusivas e não as limitativas (ou restritivas) de direito. É aqui que se
deve centrar o estudo.
A principal diferença entre a cláusula limitativa e a abusiva é que a primeira
tem como objetivo restringir a obrigação assumida pelo segurador, enquanto a
segunda, a finalidade primeira é excluir ou reduzir a responsabilidade decorrente do
descumprimento de uma obrigação assumida, ou ainda aquela que visa a obtenção de
uma vantagem sem causa.
As cláusulas limitativas, no contrato de seguro, têm papel importantíssimo,
pois é com base nelas que o segurador terá a noção exata dos riscos que está 34 O percentual varia conforme a conjuntura econômica, a determinação da SUSEP, a gravidade do risco coberto, enfim, para cada seguro há todo um estudo estatístico que irá determninar, com alguma segurança, a margem de contratos que terá como conseqüência a indenização securitária.
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cobrindo e até onde pode haver indenização securitária. Quando o seguro exclui, por
exemplo, o pagamento da indenização se o segurado, ao colidir seu veículo, estava
embriagado, isto não significa que a seguradora está abusando ao estabelecer esta
cláusula limitativa. Pelo contrário. Além de estar respaldada pela legislação de
trânsito, é somente com base nela que o prêmio pago pelo segurado é menor. Se não
for assim, o valor do seguro aumentaria demasiadamente, onerando o consumidor, e
não a seguradora, pois, como já dito, é com o dinheiro dos prêmios que a seguradora
responde aos sinistros ocorridos. Portanto, quando o Poder Judiciário sentencia
contra as cláusulas limitativas, não é contra a seguradora sua decisão. É contra toda a
massa de segurados que pagaram o prêmio.
A cláusula limitativa do risco é válido e eficaz, e não fere nenhum princípio
do CDC, eis que ao assinar o contrato, as partes tinham em mente o que estava sendo
segurado. A única restrição que faz o Código é quanto à apresentação destas, que
devem ser destacadas do corpo geral das condições, utilizando-se de recursos como
por exemplo negrito, letras em itálico, letras maiores, enfim, informar ao segurado da
importância das mesmas.
As seguradoras têm obedecido às ordens impostas, cabendo ao segurado fazer
a sua parte, ou seja, lê- las, dando atenção maior ao que está sendo enfatizado.
Diferentes são as cláusulas abusivas, que realmente afastam a obrigação
assumida de sua concretização. Estas sim, merecem ser totalmente repelidas e
devidamente enfrentadas pelo Poder Judiciário, pois contrariam o Código de Defesa
do Consumidor.
Exemplo bastante comum desta espécie de cláusula é o encontrado no seguro-
saúde. A cláusula que limita os dias de internação é abusiva. Se a doença que
acometeu o segurado tem cobertura, como limitar os dias de tratamento? Este tipo de
cláusula impede a efetiva concretização da obrigação assumida pelo segurador. Outro
exemplo é a imposição do foro de eleição. Se o contrato foi firmado em Florianópolis
e a seguradora só possui sede no Rio de Janeiro, seria absurdo pensar que só a ação
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proposta nesta comarca poderia dirimir os conflitos oriundos do contrato. Impor esta
condição ao segurado é dificultar seu acesso à justiça, sendo totalmente abusivo.
Dessa forma, ao se impor a nulidade a uma cláusula contratual com base no
Código de Defesa do Consumidor, deve-se ter em mente esta diferenciação entre
cláusulas limitativas/restritivas e as cláusulas abusivas, para somente nesta última
atribuir a penalidade mencionada. Do contrário, o consumidor não estará sendo
equiparado ao fornecedor, como quer o CDC, e sim, sobrepondo-se a este, o que
deve ser totalmente repugnado.
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CONCLUSÃO
Diante o exposto nesta monografia, podemos destacar as seguintes
conclusões:
Os contratos de seguro, devem ter suas contratações e cláusulas submetidas
aos preceitos estabelecidos no Código de Defesa do Consumidor. Entretanto, diante
da própria natureza jurídica e social dos contratos de seguro, e das características
demonstradas, estes possuem cláusulas que limitam o direito do segurado,
delimitando os riscos que estão cobertos, com exclusão de alguns.
Visando a proteção das relações de consumo entre segurador e segurado,
garantindo- lhe uma convivência justa e harmônica, é imperativo que o Código de
Defesa do Consumidor se destaque na manutenção dos direitos e garantias,
principalmente da parte contratante considerada hipossuficiente (consumidor). Deste
modo, as cláusulas limitativas do contrato de seguro destacam-se apenas para limitar
o risco do segurador, não podendo de nenhuma forma extrapolar outros direitos ou
garantindo vantagem indevida, sobrepondo-se sobre a outra parte contratante, sob
pena das mesmas seres consideradas abusivas, e portanto, nulas de pleno direito.
Sendo o contrato de seguro uma modalidade de adesão, é imprescindível que
o contratado seja tratado numa relação de equivalência, ou seja, tais relações de
consumo devem ser claras o suficiente, para que as cláusulas limitativas sejam
destacadas no contrato, de maneira que não possa ultrajar e colocar o consumidor em
desvantagem.
Portanto, as cláusulas limitativas nos contratos de seguro não são proibidas,
mas devem estar de acordo com o dispositivo no Código de Defesa do Consumidor
seja aplicada, em que todas as cláusulas dispostas possam estar de acordo com o
preceito da equidade das partes contratantes, visando desta forma a prevalência do
equilíbrio, harmonia e paz social.
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Cabe ainda analisar que, nos contratos de seguro em que as cláusulas
limitativas estiverem redigidas como as demais, sem qualquer destaque, ou sua
redação for obscura, ambígua, de modo a não delimitar correta e claramente as
limitações impostas, tal situação também coloca o consumidor em desvantagem
exagerada, além de abusar da boa-fé do segurado.
Contudo, quando as cláusulas limitativas nos contratos de seguro não
estiverem de acordo com o estabelecido no Código de Proteção ao Consumidor, tais
cláusulas não só deverão ser interpretadas em favor do segurado-consumidor, mas
também deverão ser consideradas nulas de pleno direito, por não obedecerem o
determinado no referido Código, e por conseguinte, colocando o segurado em
desvantagem excessiva.
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ANEXO
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BIBLIOGRAFIA
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1996
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consumidor. 4ª ed. Rio de Janeiro: Forende, 1991.
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WALD, Arnold. O Contrato – generalidades. Seguros. In: Curso de
direito civil brasileiro: Obrigações e Contratos. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1997
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ÍNDICE
INTRODUÇÃO .................................................................................... 8 CAPÍTULO I – CONTRATO DE SEGURO 1.1 Origem histórica ............................................................................. 11 1.2 Previsão legal ................................................................................. 12 1.3 Conceito ......................................................................................... 12 1.4 Elementos do contrato de seguro ................................................... 14 1.5 Classificação do contrato de seguro .............................................. 16 1.6 Do princípio da boa-fé .................................................................. 18 1.7 Dos contratos de adesão ............................................................... 19 1.7.1 Conceito ..................................................................................... 19 1.7.2 Característica ............................................................................. 19 1.7.3 Condições gerais dos contratos de adesão ................................. 21 CAPÍTULO II. O CONTRATO DE SEGURO EM FACE AO CÓDIGO DE DEFSA DO CONSUMIDOR 2.1 Considerações iniciais ................................................................ 23 2.2 O CDC em relação ao contrato de seguro ................................... 24 2.3 O contrato de seguro como relação de consumo ......................... 25 2.4 Da aplicação do CDC nos contratos de seguros.......................... 27 2.5 A interpretação das cláusulas limitativas contratos de seguros.... 30 2.5.1 Da cláusula limitativa ............................................................... 30
50
2.5.1.1 Conceito de cláusulas limitativa ............................................ 31 2.5.1.2 As cláusulas limitativas inseridas no contrato de seguro ....... 31 2.6 Das cláusulas limitativas e as cláusulas abusivas ........................ 34 CONCLUSÃO ................................................................................. 44 ANEXO ............................................................................................. 46 BIBLIOGRAFIA................................. ............................................... 47 ÍNDICE................................................................................................ 49 FOLHA DE AVALIAÇÃO ............................................................... 51
51
FOLHA DE AVALIAÇÃO
UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
PROJETO A VEZ DO MESTRE
Pós-Graduação “Lato Sensu”
Título: Contrato de Seguro no Direito Brasileiro em face ao Código de
Defesa do Consumidor
Data da Entrega: 14 de Abril de 2005
Avaliado por: Professor Sérgio Ribeiro Silva Grau: __________