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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
ARTETERAPIA NO UNIVERSO INFANTIL
Por: Ana Cristina Vale Mendes
Orientador
Profª. Fabiane Muniz
Rio de Janeiro
2015
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
ARTETERAPIA NO UNIVERSO INFANTIL
Apresentação de monografia à AVM Faculdade Integrada
como requisito parcial para obtenção do grau de
especialista em Arteterapia em Educação.
Por: Ana Cristina Vale Mendes
AGRADECIMENTOS
a Deus por me dar força e persistência para
continuar seguindo na arte de educar.
DEDICATÓRIA
.....aos meus amores Marcos, Marcos Felipe e
Ana Clara que me estimularam e apoiaram nos
diversos momentos deste estudo e souberam
lidar bem com minha ausência.
RESUMO
Este estudo tem como principal objetivo entender a importância da Arteterapia realizada com crianças. Através do processo terapêutico a criança é capaz de identificar seus sentimentos e superar medos e situações de desequilíbrio tornando-se mais saudável. Para compreender melhor os benefícios da Arteterapia realizada com crianças é imprescindível saber que a Arteterapia é um processo terapêutico que utiliza diferentes materiais plásticos para dar voz a conteúdos inconscientes que afloram durante o processo de criação e estão presentes na imagem criada. Ao se entrar em contato com esses conteúdos eles se tornam conscientes e passíveis de serem mudados. Para que este processo ocorra é necessário levar em conta as fases de desenvolvimento infantil, as características que o arteterapeuta deve ter para lidar com crianças, bem como entender passo a passo como este processo deve ocorrer. A prática da Arteterapia também é abordada ao se analisar o setting terapêutico e as propriedades dos materiais plásticos. Esta prática poderá ser aplicada na Educação, em ambiente hospitalar e em consultórios, cada situação exige um objetivo a ser alcançado e uma forma específica de ser realizada. Chegou-se a conclusão que a Arteterapia aplicada na infância desenvolve a criatividade e a imaginação criadora, promove o aprendizado emocional ao cognitivo, soluciona problemas de socialização e ameniza o egoísmo. A criança aprende desde cedo a lidar com seus sentimentos e a superar problemas atingindo um estado de equilíbrio integral.
METODOLOGIA
A metodologia aplicada nesse trabalho foi a pesquisa bibliográfica, onde cito
autores como Vanessa Coutinho, Maria Cristina Urrutigaray, Susan Bello, Angela
Philippini entre outros.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 07
CAPÍTULO I - O que é Arteterapia? 09
1.1- Símbolos 11
1.2- Criatividade 12
CAPÍTULO II - Crianças e Arteterapia 15
2.1- Entendendo melhor as crianças 16
2.1.1- Desenvolvimento psicossocial infantil 16
2.1.2- Estágios de desenvolvimento humano segundo Piaget 18
2.2- O papel do arteterapeuta 19
2.3- Desenvolvendo o processo arteterapêutico 21
2.2.1- O início do processo 23
2.2.2- Trabalho desenvolvido em grupos 25
CAPÍTULO III – A prática da Arteterapia 28
3.1- Setting terapêutico 28
3.2- Explorando alguns materiais plásticos 29
3.3- Algumas considerações sobre a prática da Arteterapia 33
3.3.1- Na Educação 34
3.3.2- Em ambiente hospitalar 35
3.2.3- Em consultórios 36
CONCLUSÃO 38
BIBLIOGRAFIA 41
WEBGRAFIA 43
7
INTRODUÇÃO
Este estudo é sobre Arteterapia no universo infantil e busca entender
a importância do trabalho arteterapêutico realizado com crianças.
A Arteterapia é um processo terapêutico que utiliza materiais plásticos
para expressão permitindo que indivíduos entrem em contato com conteúdos
inconscientes. Desenhar, modelar, recortar, colar, pintar, representar com
fantoches são atividades que as crianças desempenham naturalmente e
carregam um mundo de significações que não são expressas pela linguagem
verbal. Através das imagens produzidas pela expressão plástica e
acompanhada pela música, pela dança e pelo teatro as crianças encontram
caminho imaginário livre para superarem suas dificuldades e expressarem seus
sentimentos escondidos; brincando conhecem um pouco mais de si mesmas e
do mundo ao redor. Explorar este caminho de significados, desenvolver a
sensibilidade e incentivar a liberdade de expressão são alicerces do trabalho
arteterapêutico. Compreender os benefícios da arte aliada à terapia no
universo infantil, bem como encontrar a melhor forma de desenvolver este
processo terapêutico é de fundamental importância para formação do
arteterapeuta que deseja acompanhar crianças. A Arteterapia aplicada na
infância permite que desde cedo as crianças aprendam a lidar com seus
sentimentos, a superar problemas e a encontrar o estado de equilíbrio integral.
Portanto, são objetivos deste estudo pesquisar a importância do
trabalho arteterapêutico com crianças, analisar seus benefícios, identificar em
que momentos este trabalho deve ser aplicado, destacar as principais
características do arteterapeuta que lida com crianças e diferenciar o trabalho
arteterapêutico feito em escolas, consultórios e hospitais.
A Arteterapia realizada com crianças desenvolve a criatividade
exercitando a imaginação criadora; promove a integração do aprendizado
emocional ao aprendizado cognitivo; permite a identificação de sentimentos e
medos; através da criação, possibilita o processo de autoconhecimento e
transformação; explora o imaginário infantil, através das atividades lúdicas,
8
solucionando problemas de socialização diminuindo as barreiras do egoísmo;
auxilia o desenvolvimento do pensamento intuitivo e a descoberta de outras
possibilidades.
9
CAPÍTULO I
O QUE É ARTETERAPIA?
“Arteterapia é um modo de trabalhar utilizando a linguagem artística
como base da comunicação cliente-profissional. Sua essência é a criação
estética e a elaboração artística em prol da saúde”, segundo a Associação
Brasileira de Arteterapia.
A Arteterapia pode ser definida ainda como
(...) um processo terapêutico decorrente da utilização de modalidades expressivas diversas, que servem à materialização de símbolos. Estas criações simbólicas expressam e representam níveis profundos e inconscientes da psique, configurando um documentário que permite o confronto, no nível da consciência, destas informações, propiciando ‘insights’ e posterior transformação e expansão da estrutura psíquica. (PHILIPPINI, 1988,p.1)
Ou como uma técnica que
(...) visa, através da mediação de instrumentos plásticos, a expressão ou a comunicação de representações como as fantasias e sentimentos. Possibilitando, assim, um espaço para a liberação de energias psíquicas, favorecendo a expressão posterior à criação estabelecida em palavras daquilo que antes não tinha nome ou identidade e nem lugar ou espaço para manifestar-se. (URRUTIGARAY, 2008, p. 24)
A Arteterapia abre caminho para expressão do inconsciente através de
materiais expressivos. Usando estes materiais como meio, o individuo é
estimulado a criar. Este processo criativo vai desvelando conflitos, sentimentos,
vivências, medos, sonhos. Toda esta energia psíquica é representada em forma
de símbolos. A partir destas manifestações simbólicas, o indivíduo toma ciência
do seu mundo interior permitindo a reflexão e a superação de seus traumas e
dificuldades e a ampliação de sua estrutura psíquica tornando-se um ser mais
saudável.
10
Segundo Philippini (1988) a palavra arte tem um significado
abrangente, no contexto da Arteterapia. Arte como "processo expressivo". Não
há "preocupação estética e com técnicas, sendo privilegiada a possibilidade de
expressão e comunicação e o resgate e ampliação de possibilidades criativas".
(p.1)
O fazer artístico e o imaginar possibilitam revelar, iluminar e
transformar o indivíduo. As imagens e o próprio processo terapêutico
conduzem à compreensão de si mesmo e de seu papel no mundo.
(...) o fazer artístico nos provê uma oportunidade de nos mobilizarmos em ação; de em ação nos percebemos e entrar em contato com conteúdos dantes não contatuados, e de experimentarmos possibilidades de integração e transformação em nosso ser e em nossa relação com o mundo. É no e ao decorrer do fazer e imaginar que isto se dá. (CIORNAI, 1995, p. 40)
A atividade artística além de ampliar a visão de si mesmo e do mundo,
promove a estruturação, a ordenando e a organização de elementos de nossa
percepção interna e externa. Isto possibilita compreender melhor nossa
existência. É no fazer artístico que se mobiliza a coordenação motora, a
percepção, a imaginação, a intuição e a cognição emergindo, assim, a carga
emocional atual e as funções cognitivas. (CIORNAI, 1995)
Através do exercício da arte, entendida como um conjunto de ações coordenadas, sistematizadas e integradas entre si para a execução de alguma tarefa, sempre buscando o alcance de seu aperfeiçoamento, o indivíduo tem a possibilidade de perceber que, ao por em jogo processos de criação, abre futuros em termos de estratégicos, devido ao próprio treino ‘técnico’ exercido pela busca de aprimorar-se. O reencontro com sua dimensão virtual, suas possibilidades, ilusões, dota o indivíduo do poder de transformar o real e factual em novas virtualidades, criando novas possibilidades, expectativas e interesses ainda não atualizados, abrindo-lhe novos horizontes. (URRUTIGARAY, 2008, p. 28)
A utilização de técnicas expressivas oportuniza desenvolver
habilidades que revelam estruturas intelectivas, cognitivas e emocionais.
Oportunizando o equilíbrio integral do indivíduo tornando-o mais saudável.
11
A arte, o processo de criação artística, costuma nos ajudar a reforçar nossos aspectos saudáveis. Ao criarmos, abrimos as portas de nossa sensibilidade, o que possibilita a construção de meios para a transformação pessoal. (COUTINHO, 2009, p. 49)
1.1- Símbolos
Segundo Coutinho (2009) as imagens originadas a partir do fazer
criativo traz em si a subjetividade de seu criador através de diversos símbolos. E,
pela observação e relação terapêutica “as construções e as criações reveladas
constituem-se em meios de autoconhecimento que, bem compreendidos, podem
auxiliar no desenvolvimento do ser.” (p.44) Promovendo a modificação pessoal
solucionando situações de desequilíbrio.
A abordagem junguiana parte da premissa que os indivíduos, no curso normal de suas vidas, em seus processos de autoconhecimento e transformação, são orientados por símbolos. Estes emanam do SELF, centro de saúde, equilíbrio e harmonia, representando para cada um o potencial pleno, a totalidade da psique, e a essência de cada um. Na vida, o self através de seus símbolos, precisa ser reconhecido, compreendido e respeitado. (PHILIPPINI, 1994, p.4)
A exploração desta linguagem simbólica permite trazer à consciência
dados do inconsciente.
(...) por símbolo devemos entender algo, seja na forma de um termo, um conceito ou mesmo uma imagem que, apesar de nos parecer familiar, pode alcançar outras conotações diferentes de seu significado evidente e convencional. Assim, uma imagem é portadora de um conteúdo simbólico porque ela transcende a realidade manifesta, ou empírica, possuindo um aspecto inconsciente mais amplo, que não consegue ser precisamente definido ou explicado. Sendo sempre uma aproximação, um como se. (URRUTIGARAY, 2008, pp.29 e 30)
Bello (1994) apresenta a pintura espontânea como meio de expressar
lados esquecidos e sufocados de nossa consciência.
12
Na medida em que as pessoas contactam a sua essência, reorganizam-se na sua individualidade. A energia contida nas imagens traz para a consciência um potencial adormecido no inconsciente que direciona o indivíduo para a autorealização. (BELLO, 1994, p.47)
A Arteterapia abre caminho para o processo de individuação.
Philippini (1988) define individuação como uma "árdua tarefa de tornar-se um
indivíduo (aquele que não se divide face a pressões externas) e que assim
procura viver plenamente, integrando seus talentos, as suas feridas e faltas
psíquicas".(p.3) Este processo ocorre na medida em que o indivíduo entra em
contato com níveis inconscientes tornando-os objetivados, conscientes, e assim
passíveis de serem transformados.
Vale complementar que
Os símbolos trazem para os indivíduos a possibilidade de conhecer, compreender, refazer, recuperar, rememorar, reparar e transcender. O símbolo como linguagem metafórica do inconsciente contém em si próprio o significado de todos os enigmas psíquicos, cabendo ao arteterapeuta trazer ao setting os instrumentos necessários para viabilizar este processo. (PHILIPPINI, 1994, p.5)
1.2- Criatividade
Os processos criativos são processos construtivos globais. Envolvem a personalidade toda, o modo da pessoa diferenciar-se dentro de si, de ordenar e relacionar-se em si e de relacionar-se com outros. Criar é tanto estruturar quanto comunicar-se, é integrar significados e é transmiti-los. Ao criar, procuramos atingir uma realidade mais profunda do conhecimento das coisas. Ganhamos concomitantemente um sentimento de estruturação interior maior; sentimos que nos estamos desenvolvendo em algo de essencial para nosso ser. (OSTROWER, 1993, p.142)
Segundo Urrutigaray (2008) a prática da Arteterapia oportuniza que o
sujeito entenda melhor seu mundo interior, sua subjetividade. No momento em
que o sujeito criador confronta-se com a imagem criada, inicialmente pela
13
análise de seus elementos, ele permite que conteúdos inconscientes possam ser
conscientizados.
Quando um sujeito "reage" confrontando-se com um símbolo objetivado, ele transforma essa realidade simbólica e se transforma concomitantemente, possibilitando a passagem de energia de um nível a outro, pelo desenvolvimento da criatividade. (...) a possibilidade de poder penetrar na esfera irracional da vida e da experiência, através do contato com imagens produzidas, possibilita a ativação da fantasia que, por sua vez, desenvolve a atividade criativa; libertando o homem da prisão de ser ‘só isso’, transformando sua vida pela experimentação do lúdico, ou da possibilidade de brincar, de jogar e de ter novas experiências". (URRUTIGARAY, 2008, p.38)
É necessário um clima de confiança para que a sensibilidade possa
se manifestar e assim a criação surgir. Com relação à expressão e criação a
emoção possui um grande poder de energia que inibe qualquer outro desejo,
tornando-os menos importante. A elaboração desta emoção através das formas,
sons, imagens acontece através do trabalho criador. A emoção, em sua
intensidade, é investida na experiência estética, na atenção, no cuidado e na
transformação por ela produzida na elaboração plástica. (MEIRA, 2003)
Bueno (1998) apresenta as ideias de Vigotsky sobre a imaginação
criadora. Ele destaca três momentos.
O primeiro considera a imaginação criadora como resultante da reformulação de experiências vividas, combinadas com outros elementos do mundo real. O segundo incorpora a participação do afetivo e dos elementos sociais que envolvem o indivíduo. O terceiro objetiva a criação como resultado de um processo que interfere na transformação do mundo. (VIGOTSKY apud BUENO, 1998, p.82)
Todo esse processo imaginativo tem função diferente no adulto e na
criança.
Nas crianças, a criatividade se manifesta em todo seu fazer solto, difuso, espontâneo, imaginativo, no brincar, no sonhar, no associar, no simbolizar, no fingir da realidade e que no fundo não é senão real. Criar é viver, para a criança. (OSTROWER, 1987, p.127)
14
Para Vigotsky é necessário interesse e experiência acumulados para
criar. Isso diferencia claramente a imaginação da criança e a do adulto. Este já
possui uma bagagem de conhecimentos e experiências que foi acumulando ao
longo de tempo e a criança ainda está construindo sua bagagem básica.
Levando em consideração que criar é fazer algo novo, ele chega à conclusão
que todos são capazes de criar, em maior ou menor grau, e “que a criação é
acompanhante normal e permanente do desenvolvimento infantil". (VIGOTSKY
apud BUENO, 1988, pp. 82 e 83)
A criatividade deve ser estimulada na criança, diz Iavenberg (2006),
sem este estímulo ela repetirá formas na vida adulta. A autora cita Munari ao
dizer que “uma pessoa sem criatividade é uma pessoa incompleta, o seu
pensamento não consegue defrontar os problemas que se lhe apresentam, e
terá sempre que recorrer à ajuda de outra pessoa de tipo criativo”.(p.85) Neste
sentido, Munari afirma que a criatividade na criança deve ser estimulada através
de jogos que a façam aprender algo novo, técnicas novas e regras da linguagem
visual. Destaca a importância da linguagem visual ao dizer que todo desenho
possui uma mensagem, mas se as regras da linguagem visual não forem
seguidas não haverá comunicação, logo, não ocorrerá o entendimento desta
mensagem. ( MUNARI apud IAVENBERG, 2006)
15
CAPÍTULO II
CRIANÇAS E ARTETERAPIA
Para Bueno (1988), a criança está inserida em uma sociedade de
consumo que cada vez mais dita normas que modificam a conduta infantil
tornando-a cada vez mais marcada por modelos estereotipados. Estes modelos
se tornam a forma mais segura adotada na expressão plástica porque a criança
evita a exposição, se arrisca menos. Com isso a construção de um
conhecimento mais significativo fica prejudicada, não há desafios e a
acomodação se instala. É necessário “(...) favorecer a autoconfiança, a
capacidade de enfrentar desafios, o autoconhecimento e a imaginação criadora,
a fim de resgatar a criança inventiva". (p.38)
Coutinho (2009) diz que desde o nascimento temos forte necessidade
de nos expressar e que “o brincar e a arte são formas de expressão possíveis de
serem utilizadas pelas crianças".(p.62)
Ao pintar, desenhar, modelar, a criança se encontra diante de múltiplas possibilidades criativas, explorando os materiais, o que se constitui em uma atividade enriquecedora, que combina e aguça todos os sentidos. Não há necessidade de ensinar a criança. Ela deverá ter tempo para entrar em contato com o material, experimentar, tentar, ousar, vivenciar. (COUTINHO, 2009, p.62)
O adulto deve acompanhar este processo para que seja uma
experiência segura. As crianças devem ser estimuladas e suas produções
devem ser aceitas sem julgamentos estéticos. Deve-se respeitar a elaboração
da criança levando-se em consideração sua idade e o momento cognitivo em
que se encontra. Sua produção é um registro afetivo, “externalização de seu
mundo interior”. (p. 63)
Ainda na visão de Coutinho
É necessário considerarmos as crianças como sujeitos em plenitude e compreendermos que certos acontecimentos, que para os adultos poderiam facilmente configurar-se em tolices,
16
para as crianças podem ser causadores de angústia e ansiedade legítimas. Nunca é demais um bom estudo a respeito do desenvolvimento infantil. Ajudará muito se estivermos plenamente cientes sobre o que esperar que cada criança, em determinada fase, seja ou não capaz de realizar. (COUTINHO, 2009, p. 15)
2.1- Entendendo melhor as crianças
Para empregar a Arteterapia como forma de auxílio à criança, faz-se
imprescindível buscar um maior conhecimento sobre o desenvolvimento infantil.
Não cabe aqui fazer um estudo aprofundado sobre o assunto, mas trazer dados
que possibilitem adequar o trabalho arterapêutico às necessidades da criança.
O desenvolvimento humano é um processo contínuo que acontece a
partir do próprio indivíduo e de sua relação com o meio social. Este
desenvolvimento não acontece apenas no campo cognitivo, mas também, e
principalmente, no campo afetivo. Na interação com o meio o indivíduo vivencia
emoções diversas que precisam ocorrer de forma saudável e equilibrada.
2.1.1- Desenvolvimento psicossocial infantil
Freitas (2010) apresenta o desenvolvimento psicossocial infantil em
três momentos. Segue, em linhas gerais, a descrição de cada fase segundo a
autora.
• Nos três primeiros anos de vida (primeira Infância)
É um momento caracterizado por grandes mudanças principalmente
em relação ao físico e ao motor. O relacionamento com os pais se intensifica no
fim do primeiro ano criando uma relação de apego. Desde o nascimento a
criança está mais intensamente vinculada à mãe e esta exerce papel
17
fundamental na construção das emoções do bebê. É através dos cuidados que
ele recebe que o bebê aprende a diferenciar as suas sensações do ambiente
externo. A forma com que a criança é cuidada imprime nela um modelo de atuar
na relação com o outro. A afetividade recebida é fundamental para o
desenvolvimento emocional da criança. O pai exerce um importante papel neste
momento porque ele entra na relação entre a criança e a mãe construindo laços
afetivos além da mãe. Neste período inicia-se o desvinculo da mãe e a criança
começa a buscar o seu próprio desejo. Ao final do primeiro ano a criança começa
a andar e a explorar o ambiente. O desenvolvimento da linguagem começa
através de trocas sonoras com a mãe e vai evoluindo até a criança poder falar
por si mesma. Com o desenvolvimento motor e da linguagem a criança começa
a descobrir o mundo e estabelece um marco de separação da mãe. (FREITAS,
2010)
• De 3 a 6 anos (segunda infância)
Há um maior desenvolvimento da força e das habilidades motoras
simples e complexas na criança. Apresenta um comportamento egocêntrico, e
ocorre um aumento em sua independência e em seu autocontrole. Mas, a
família continua fundamental para sua vida e é o ponto de partida de suas
experiências emocionais. A capacidade de elaboração simbólica é aumentada.
Ao conseguir pensar e falar sobre algo que está ausente, ela adquire a
capacidade de representação, fundamental para a elaboração do pensamento.
As experiências afetivas já são representadas e recordadas, demonstra maior
consistência no gostar e não gostar. Freitas (2010) cita Wallon ao afirmar que o
comportamento anti-social da criança tende a ser gerado na segunda infância.
Diz que a afetividade é anterior à inteligência, logo as influências afetivas da
criança (desde o início de sua vida) serão fundamentais para o seu
desenvolvimento psíquico. A criança começa a reconhecer o outro, o que
permite que ela adquira algumas regras de socialização: sabe esperar sua vez,
sabe participar de brincadeiras em grupo. (FREITAS, 2010)
• De 6 a 12 anos (terceira infância)
18
A criança apresenta diminuição do egocentrismo e maior
desenvolvimento da memória e da linguagem. Os amigos passam a ter um papel
fundamental na vida da criança. Ela adquire um grande desenvolvimento físico,
cognitivo, emocional e social favorecido pelas experiências no ambiente escolar.
Depois da família a escola passa a ser o grupo social mais importante para a
criança. É a escola que prepara a criança para a sociedade. Ocorre um maior
desenvolvimento físico e motor favorecendo a integração em grupos voltados
para a prática esportiva. O desenvolvimento cognitivo ocorre pelo
aprimoramento na capacidade de escrita e leitura, de memória, de mudanças no
pensamento e de julgamento moral. Nesta fase as diferenças individuais ficam
mais evidentes e afetam a autoestima, a popularidade e o desempenho escolar.
As influências afetivas que a criança recebe de outras pessoas de seu convívio
influenciam o seu desenvolvimento psíquico. Assim, este desenvolvimento
psíquico só será possível mediante as condições sociais, mesmo sendo a
criança possuidora de todas as condições biológicas. (FREITAS, 2010)
2.1.2- Estágios de desenvolvimento humano segundo Piaget
Piaget dividiu em quatro fases o processo de desenvolvimento
humano. Elas são caracterizadas “por formas de organização mental que
possibilitam as diferentes maneiras do indivíduo relacionar-se com a realidade
que o rodeia”. (TERRA, S.D)
Segundo Piaget todos os indivíduos passam pelas quatro fases, na
mesma sequência. O início e o término de cada fase é variável porque depende
da estrutura biológica de cada um e dos estímulos que o indivíduo recebe do
meio ambiente em que vive. Por isso, vale ressaltar, que a divisão por faixa
etária é apenas uma referência.
19
Segue a transcrição do texto de Guila Eitelberg Azevedo destacando
as principais características de cada fase.
Estágio sensório-motor (até 2 anos) - Segundo Piaget, nessa fase do desenvolvimento, o campo da inteligência da criança aplica-se a situações e ações concretas. Trata-se do período em que há o desenvolvimento inicial das coordenações e relações de ordem entre ações. É também o período da diferenciação entre os objetos e o próprio corpo.
Estágio pré-operatório (dos 2 aos 6/7 anos) - É a fase em que as crianças reproduzem imagens mentais. Elas usam um pensamento intuitivo que se expressa numa linguagem comunicativa - mas egocêntrica -, porque o pensamento delas está centrado nelas mesmas.
Estágio operatório concreto (dos 6/7 aos 11/12 anos) - Nessa fase as crianças são capazes de aceitar o ponto de vista do outro, levando em conta mais de uma perspectiva. Podem representar transformações, assim como situações estáticas. Têm capacidade de classificação, agrupamento, reversibilidade e conseguem realizar atividades concretas, que não exigem abstração.
Estágio das operações formais (dos 11/12 até a vida adulta) - É a fase de transição para o modo adulto de pensar. É durante essa fase que se forma a capacidade de raciocinar sobre hipóteses e idéias abstratas. Nesse momento, a linguagem tem um papel fundamental, porque serve de suporte conceitual. (AZEVEDO, S.D) .
2.2- O papel do arteterapeuta
O arteterapeuta tem a função de promover experiências criativas que
abram caminhos para o autoconhecimento. Para que este processo de busca
interior se concretize, o arteterapeuta deve ter conhecimento sobre os materiais
plásticos a serem usados bem como ter clareza para oferecer a técnica
adequada a ser desenvolvida por seu cliente de acordo com a situação e o
momento.
Mas uma vez se descortina a necessidade de um conhecimento sólido a respeito não somente das possibilidades plásticas e afetivas de cada material, mas também dos aspectos psíquicos
20
do ser humano. Esta ética de trabalho é fundamental para nortear o caminho que o terapeuta irá propor como trilha para o sujeito em terapia. (COUTINHO, 2009, p. 52)
Neste caminho de formação o arteterapeuta deve ir acumulando
experiências com os materiais criativos ampliando suas possibilidades de
expressão. Quanto maior for o seu repertório de experiências criativas, maiores
serão as possibilidades de auxílio que ele poderá oferecer ao seu cliente. (p.48)
Coutinho (2009) cita Pain e Jarreau "para conduzir um ateliê, tendo
como objetivo o tratamento psicoterapêutico de e para a representação, é
preciso definir um profissional que tenha disposição e conhecimentos
específicos". (p. 47)
(...) para transformar-se em observador presente, ativo, empático companheiro nesta aventura do construir-se e transformar-se pela via das imagens, precisará o arteterapeuta do contínuo trabalho de autodesvelar expressivo do ateliê. (...) A necessária complementação advém do contínuo estudo no modelo teórico escolhido para nortear sua prática terapêutica e do persistente trabalho de autoconhecimento em seu próprio processo terapêutico. (COUTINHO, 2009, pp. 48 e 49)
O profissional deve estar sempre aperfeiçoando sua linguagem
plástica, para que garanta uma comunicação fluente através de diversificadas
estratégias. Esta capacidade de renovação dota o arteterapeuta de instrumentos
que o auxiliam a contribuir disponibilizando meios diversos de amenizar
bloqueios no processo criativo de seu cliente, ajudando-o a encontrar caminhos
de construção, reconhecimento e transformação através de sua produção
imagética.
Coutinho (2009) acrescenta que para lidar com crianças "um
terapeuta precisa apurar sua capacidade de compreender mensagens que lhe
cheguem por meio das modalidades não verbais de comunicação". (pp. 15 e 16)
Deve-se observar a criança como um todo. Todo seu corpo e seu modo de agir
fornecem informações valiosas para o processo terapêutico. Cabe ao terapeuta
desvelar essas mensagens a fim de direcionar seu trabalho.
21
(...) o profissional em arteterapia destina-se, assim, como agente facilitador do processo de busca pela ‘totalidade psicológica’, ou realização do Self, ao exercício de estimulação da criação e ao de observar e acompanhar o processo de criação. De maneira que seu ‘atentar’ deve dirigir-se para o que vê e ouve durante a dita execução da obra.(URRUTIGARAY, 2008, p.101)
Para ser um bom profissional, o arteterapeuta deverá usar a
sensibilidade aliada à intuição e a reflexão tendo como base sua experiência
pessoal e profissional.
Para um arteterapeuta que deseja trabalhar com crianças são
necessários alguns fundamentos básicos. Gostar de crianças é fundamental.
Conhecer um pouco mais sobre o seu desenvolvimento e compreender as
questões que estão relacionadas à faixa etária. Este profissional deve conhecer
os tipos de dificuldades de aprendizagem que afetam as crianças, pois estas
bloqueiam a aprendizagem e muitas vezes causam problemas emocionais.
Precisa conhecer o esquema familiar da criança e saber mais sobre como o
ambiente influencia a vida da criança. Diante de todas essas informações o
terapeuta precisa criar com a criança uma relação de aceitação e confiança.
Precisa ter uma postura honesta favorecendo um clima de respeito e
consideração. Cabe também ao terapeuta não fazer julgamentos e
interpretação. “Deve-se acreditar firmemente que cada criança é uma pessoa
única e digna, com todos os direitos humanos.” (OAKLANDER, 1980, p. 78)
Vale destacar também a importância do desenho como linguagem
da criança que pode se desenvolver ou não dependendo das experiências
vivenciadas. Neste ponto é preciso esclarecer o papel do profissional que
trabalha com crianças no sentido de ser cuidadoso, pois suas intervenções
podem colaborar ou abafar o desenvolvimento criativo da criança. “Nesse
sentido, vale a pena não agir conduzindo e sim organizando e orientando
propostas, com o objetivo de promover transformações para níveis de mais
saber desenhista.” (IAVELBERG, 2006, p. 27)
2.3 – Desenvolvimento do processo arteterapêutico
22
Coutinho (2009) completa que "uma das formas mais eficientes de
promover a saúde emocional das crianças é proporcionar-lhes meios de criar,
resgatando ou alimentando seu potencial criativo". (p. 38) A sensibilidade é
desenvolvida a partir do processo de criação, e seu papel é fundamental, pois
possibilita a transformação pessoal.
Urrutigaray (2008) diz que a arteterapia tem por finalidade “
possibilitar a emergência de uma imagem imaginada transposta em imagem
criada”.(p. 24) Este processo se dá pela utilização de materiais plásticos que
conferem a quem os usa, maleabilidade e flexibilidade para expressar conteúdos
íntimos.
Pintar, modelar, desenhar, recortar, colar e outras atividades
proporcionam à criança diversas possibilidades criativas. Através da exploração
de variados materiais ela experimenta, tenta, ousa, vivencia, adquire experiência
enriquecedora que ativa os seus sentidos. (Coutinho, 2009)
O desenho e a pintura ajudam a criança a exprimir sentimentos. “O
próprio ato de desenhar (...) é uma poderosa expressão de si mesmo que ajuda
a estabelecer a auto-identidade e proporciona uma forma de expressar
sentimentos.” (OAKLANDER, 1980, p.69)
A importância do desenho é inegável pela integração que propicia entre cognição, ação, imaginação, percepção e a sensibilidade. Por intermédio do desenho a criança pode expressar seus conhecimentos e suas experiências, colocando-se em sua poética de modo singular. As competências e habilidades aprendidas em desenho servirão para outras áreas de conhecimento. (IAVELBERG, 2006, p.57)
A produção realizada pela criança carrega informações de seu mundo
interior e de sua afetividade. Mas, esta produção não está desassociada das
características próprias da idade da criança bem como de seu momento
cognitivo. Neste sentido, cabe ao terapeuta a missão de estimular a criança a
aceitar suas produções sem julgamentos estéticos ou “erros”. E, seguir o
processo conversando sobre a produção e os sentimentos aflorados pela
vivência. (Coutinho, 2009)
Oaklander (2006) destaca que quando a criança possui um
desenvolvimento sadio (corpo, sentidos, sentimentos e intelecto) ela possui um
23
senso de eu forte que contribui para um bom contato com as pessoas e o com
meio ambiente. Quando a criança em terapia vivencia seus sentidos, seu
corpo, seus sentimentos e o uso de seu intelecto, ela recupera uma postura
sadia frente à vida. Logo é importante oferecer experiências nas áreas em que
a criança mais necessita.
Todo o trabalho de Arteterapia deve estar direcionado para as
necessidades da criança. Jamais se deve forçar uma criança a dizer ou fazer
algo. É preciso respeitar suas defesas e entrar no mundo dela com delicadeza.
A criança abre seu mundo interior somente na medida em que se sente segura.
À medida que se desenvolve a consciência da criança, podemos começar a examinar as opções e escolhas disponíveis, experimentar novas formas de ser, ou lidar com os temores que a criança tem ocultos, que a impedem de fazer novas escolhas que poderiam melhorar a sua vida. (OAKLANDER, 2006, p. 75)
Deve-se ressaltar no trabalho de Arteterapia com crianças a
importância do brincar. “O brincar tanto é um modo de exploração da realidade
quanto do domínio dela”. (p.110) Ela aprende com a brincadeira o potencial e os
limites do material que usa bem como suas próprias capacidades e limitações. É
no brincar que a criança elabora seus conflitos e aprende a diferenciar o real do
simbólico. Ela tem consciência de que brincar é “fingir”. Segundo Segal, a arte e
o brincar “são também uma tentativa de traduzir a fantasia em realidade”..
(SEGAL,1993).
Incentivar a brincadeira em grupo é sempre uma boa oportunidade
para operacionalizar comportamentos mais socializados. É através da interação,
da participação com o outro, do fantasiar junto, que as crianças vão vivenciando
situações que oportunizam quebrar as barreiras do egoísmo ou pelo menos
atenuá-las. (COROMANDEL e SOUZA, 2007)
2.3.1- O início do processo
Coutinho (2009) diz que primeiramente deve-se fazer um contrato
24
com o responsável da criança antes de iniciar um processo terapêutico.
Esta primeira entrevista é uma valiosa oportunidade de recolher o maior número possível de informações, em especial aquelas que a própria criança não poderia oferecer, como as condições de gestação e parto, doenças anteriores, internações, medicações das quais faz uso etc. Além de questões práticas, como horários e custos da terapia. Esta também é uma boa ocasião para perceber o lugar ocupado pela criança em sua família. (COUTINHO, 2009, p.19)
E complementa que durante o processo terapêutico é possível colher
mais dados diretamente da criança. É importante ter uma relação terapêutica de
equilíbrio entre o terapeuta e a criança que possui seu próprio potencial. Deve-se
ouvir e valorizar sua história, respeitar suas decisões e opiniões. “Acredito que
todos possuem em si núcleos saudáveis que poderão ser ativados (e a arte
costuma ser um privilegiado meio para isso)". (COUTINHO, 2009, p.21)
Ainda ressalta que é imprescindível que seja uma relação de
sinceridade e honestidade com a criança. A transparência é fundamental. Mas
isto exige uma grande capacidade de elaboração da criança que pode ainda não
estar preparada para verbalizar claramente seus sentimentos. Nestes casos
deve-se dar oportunidade para que ela se comunique através de outros
instrumentos.
Destaca que nos primeiros encontros a melhor forma de estabelecer
um vínculo positivo com a criança é oferecer atividades agradáveis e
prazerosas. Deixar a criança explorar diversos materiais e observar quais as
atividades são mais facilitadoras para a expressão daquela criança.
Naturalmente a confiança vai sendo instalada e a criança pode expressar melhor
suas dores e conflitos.
(...) nem sempre a criança precisa falar abertamente de seu conflito para que seja compreendida. Em algumas vezes, ela simplesmente não quer falar. Em outras, não consegue falar. Pode também ainda não ter elaborado adequadamente a situação. Ela percebe que sente algo, e este algo a incomoda, mas não sabe exatamente que sensação é essa. (COUTINHO, 2009, pp.26 e 27)
25
Coutinho (2009) ainda fala da importância do trabalho terapêutico ser
realizado com a auxilio da família. Afirma que "o comportamento da criança
reflete bastante de seu contexto familiar". E, que deve ser avaliado sempre a
participação do responsável no processo "precisamos atuar juntos, em benefício
da criança". (p.33)
Angela Philippini (1998) sugere um outro caminho para o início do
processo terapêutico.
Um caminho produtivo para facilitar o início do processo arteterapêutico pode ser a vida da consciência corporal, dos exercícios de relaxamento das tensões e da colocação da respiração em estágios mais lentos e profundos para facilitar desbloqueios, permitindo mais fluência do processo criativo, pois esta providência rebaixa as funções da vigília, permitindo o acesso mais livre à camadas inconscientes. Estes estados poderão ser ativados também pela criação de ambientes sonoros específicos, com produção e/ou escuta de determinados sons. (PHILIPPINI, 1998)
E, continua dizendo que as primeiras atividades plásticas devem ter
um caráter lúdico e prazeroso e devem ser facilmente executadas para que não
se agravem as defesas naturais e resistências que normalmente acompanham a
todo início de processo terapêutico. A partir destas primeiras experiências
emergirão dados mais complexos
que para serem melhor compreendidos deverão gradativamente ser amplificados pelas estratégias de transposição de modalidades expressivas. Estas providências permitem que um símbolo possa ser explorado e elaborado com múltiplos materiais e possibilidades plásticas. Um diversificado caminho expressivo que pode passar da configuração dos traços e fluidez na composição de cores da pintura, ou criação de volume e organização espacial na modelagem, e inúmeras outras formas de experimentação plástica. (PHILIPPINI, 1998)
2.3.2- O trabalho desenvolvido em grupos
A Arteterapia trabalhada em grupos possibilita tanto o alcance de objetivos pessoais (a individualidade), quanto os objetivos
26
sociais, já que ela fornece à personalidade em formação o viés de integrar-se às necessidades de adaptação às exigências externas da coletividade. (URRUTIGARAY, 2008, p.80)
Desenvolve-se a individualidade na medida em que a execução dos
trabalhos criativos garante a aquisição da autoestima e autoconfiança. O
reconhecimento e a valorização pessoal elevam a um grau maior a motivação, a
expressão de novas ideias e a novas escolhas, o que permite vivenciar a
liberdade.
Segundo Urrutigaray (2008) a Arteterapia realizada em grupos
permite que o indivíduo reconheça “a dimensão simbólica presente na relação
com o outro”.(p. 81) Sua percepção se expande de si para o outro, aprende a
perceber as suas dificuldades e a do outro, torna-se mais paciente consigo e
com o outro. Sentimentos de companheirismo, intimidade, satisfação,
identificação, semelhança, compreensão, esclarecimento, orientação, apoio,
proteção e ajuda são desenvolvidos neste processo. A partir de um objetivo em
comum os componentes do grupo irão desenvolvendo sentimentos de ordem,
organização e integração. Esta interação social acontece pautada na
comunicação. É através do diálogo que se cria um ambiente harmônico e as
diferenças individuais vão sendo reconhecidas e respeitadas.
a interação é ‘agente’ que possibilita explorar a criação coletiva, a percepção e a avaliação em grupo, a possibilidade da confiança para interferir na produção de modo heterogêneo e homogêneo, transversalmente ao processo e após a visualização de obras pessoais. (MEIRA, 2003, p. 119)
A Arteterapia como ação no grupo torna-se um método pedagógico
que permite a aceitação das diferenças integrando os elementos do grupo
promovendo a inclusão social.
Segundo Urrutigaray (2008) algumas regras devem ser estabelecidas
para harmonizar o ambiente de trabalho do grupo. O número de participantes
deve ser limitado a 12 participantes para cada coordenador. O número limitado
de participantes facilita a integração dos membros do grupo, bem como a troca
de ideias e participação individual para que o objetivo do trabalho se realize.
Urrutigaray (2008) complementa que inicialmente “os encontros
27
devem ser configurados sobre modelos estruturados de ação frente à utilização
de materiais.” (p.84) Estes trabalhos devem ser desenvolvidos em local e hora
determinados. O coordenador escolhe os materiais necessários para o
desenvolvimento do tema proposto e a execução do trabalho é de
responsabilidade de cada elemento do grupo. Aos poucos a intimidade entre os
componentes do grupo vai aumentando ao compartilhar os mesmos materiais e
elaborar um trabalho em comum desbloqueando ansiedades frente à exposição
de preconceitos estéticos. De acordo com o desenvolvimento do grupo o
trabalho passa a ser feito com técnicas não estruturadas. Local e hora continuam
sendo combinados previamente, mas neste momento, cada componente do
grupo realiza sua tarefa de maneira independente. Todos os materiais plásticos
estão à disposição do grupo. “O poder escolher o que fazer possibilita o reforço
da aquisição e desenvolvimento da autonomia, dada pela liberdade da ação de
seleção.” (p. 84) Percebe-se a diminuição da ansiedade de estar exposto à
críticas e o aumento do sentimento de autoconfiança e do senso de
responsabilidade.
28
CAPÍTULO III
A PRÁTICA DA ARTETERAPIA
Segundo Urrutigaray (2008), “precisamos entender que a Arteterapia
busca uma leitura simbólica do fazer artístico, entendendo por ‘leitura simbólica’
a atitude de procura do ‘sagrado’ de cada indivíduo.” (p.95) e para que este
processo possa acontecer é necessário que se tenha um ambiente adequado e
que se use o material plástico que favoreça o processo. É importante destacar
também, que todo este processo pode ser desenvolvido em ambientes
diferentes com propostas diversas para se atingir seu pleno objetivo.
3.1- Setting terapêutico
Philippini (1999) fala que o setting arteterapêutico funciona como um
ateliê, é "local de criação, de resgatar e expandir potencialidades adormecidas,
de desvelar sentimentos, de compreender conteúdos inconscientes". (p. 1)
Destaca que é necessário oferecer condições operacionais essenciais para que
seja produtivo como a luz natural, por facilitar "o contato com as cores sem
distorções"; o mobiliário e o chão devem ser práticos para limpeza e funcionais;
deve oferecer os materiais necessários às diversas modalidades expressivas; e,
reservar lugar para armazenar as produções em processo. Deve-se manter a
limpeza e a organização do espaço tendo sempre em mente que, durante o
processo criativo, é normal sujar o chão e desorganizar o material buscando a
melhor forma de expressão. "Deve-se incluir no processo terapêutico a tarefa
de organizar o espaço com cada cliente individualmente, ou com os grupos ao
final de cada atendimento". (p. 3) Manter uma atmosfera descontraída e oferecer
segurança e receptividade. O local deve estimular a expressão deixando fluir a
criatividade. É importante que tenha variedade de materiais para facilitar a
“descoberta de trilhas de acesso ao inconsciente, singulares para cada
29
indivíduo".
Reafirmando a mesma ideia, Coutinho (2009) enfatiza a importância
de se cuidar de modo especial do local que receberá a criança. É importante
que seja um espaço pensado e organizado à criação. Deve ter boas instalações
para as pessoas se acomodarem, espaço e local apropriados para guardar os
diversos materiais plásticos favorecendo assim todo o processo criativo. "A
organização (que, de forma alguma deve se confundir com rigidez ou interdição)
do espaço externo ajuda a organização interna". (p.52)
O setting arteterapeutico tem suas regras, especialmente nos trabalhos em grupo, e essas regras falam, fundamentalmente do respeito ao outro e a si mesmo. Mas ele é, principalmente, um espaço onde os afetos podem ser expressos e levados em consideração. ." (COUTINHO, 2009, p. 28)
3.2- Explorando alguns materiais plásticos
“A folha de papel, as pinturas, os lápis, as sucatas, as argilas etc...; contar e encenar as personagens míticas, ou os dos contos de fadas; as construções cênicas com as miniaturas da caixa de areia, compõem os esquemas referenciais mais próximos e seguros para conter todo fluxo energético projetado do insconsciente e ansioso para ser conhecido” (URRUTIGARAY, 2008, p. 49)
Segundo Philippini (1995), os materiais expressivos possuem
propriedades terapêuticas por possibilitarem a criação. Conhecer estes
materiais e suas propriedades bem como respeitá-las é fundamental para o
trabalho com arteterapia. (p. 6)
As informações apresentadas abaixo seguem as linhas gerais dos
escritos de Urrutigaray (2008). Para melhor entender os materiais eles foram
divididos em: material seco, tintas, materiais tridimensionais e colagem.
1. Material Seco
Abrange todos os tipos de lápis, os pastéis, as canetas hidrográficas,
30
os gizes de cera etc. Estes materiais são de fácil manuseio e controle. O que
afasta a ansiedade na execução dos trabalhos. “Ao transmitir segurança reforça
a sensação de equilíbrio e de bem estar facilitando o encontro com o material a
ser projetado”. (p. 53)
Lápis: É fabricado com diferentes graus de maciez. Vai do 8H (mais
duro) ao 8B (mais macio), passando pelo HB (maciez média). Os mais duros
desenham linhas finas e cinzas, os mais macios traçam linhas grossas e negras.
(COUTINHO, 2009)
“(...) o resultado obtido com lápis é um excelente indicativo de estados
internos, uma vez que a maneira como é seguro, a força e o controle dos
movimentos influenciarão o aspecto final do desenho” ( URRUTIGARAY apud
COUTINHO, 2009, p. 72)
Urrutigaray(2008) continua explicando que a gradação da cor produz
os efeitos de luz e sombra, de claro e escuro. O uso do lápis de cor permite
também a mistura de cores que criam novas possibilidades fazendo fluir novos
confrontos e novas visões, facilitando assim a transformação. Ainda ressalta a
importância do uso do carvão ou bastão de grafite que favorece a “projeção de
intensidade e de afirmação de um afeto” (p. 55)
Hidrocor: é um material fácil de manusear. Desliza no papel sem
escorrer a tinta como acontece com a aquarela. Ele expande afetos, mas
proporciona controle e segurança com relação aos resultados. (COUTINHO,
2009)
Giz de cera: é uma excelente opção para se usar com crianças. Ele é
fácil de manusear e de controlar. É uma excelente escolha
“para a manifestação de impulsos agressivos exógenos ou autógenos. Bem como um excelente instrumento representativo de defesas pessoais, pois por ter a característica de ser facilmente controlável, faculta a sensação de domínio do real.” (URRUTIGARAY, 2008, p. 57)
Pastel oleoso e pastel seco: os oleosos exigem maior esforço na
execução do trabalho. Urrutigaray (2008) sugere o uso de aguarrás para
facilitar o trabalho, pois “(...) materiais mais resistentes provocam o abandono da
tarefa por parte de clientes ansiosos, impacientes ou com baixa auto-estima”.
31
(p.58). O pastel seco é mais fácil de manusear, porém pode gerar frustação já
que ele pode “borrar” o trabalho final. O ideal é usar esta característica para
realizar a mistura das cores com os dedos, esfumaçando o trabalho. Para
fixação da imagem recomenda-se o uso de verniz ou fixador para cabelo spray.
(COUTINHO, 2009)
2. Tintas
“Por ser um material essencialmente fluído, ou liquefeito, proporciona
um excelente meio para a manifestação das emoções.” (URRUTIGARAY, 2008,
p. 58)
Aquarela: é uma tinta transparente que deve ser diluída em água. É
de difícil manipulação porque não permite a correção dos erros.
“As pessoas mais controladas sentem desconforto com a aquarela e, em geral, aqueles que sentem dificuldade em lidar com suas emoções também. Um outro ponto a destacar é que a aquarela permite um contato muito estreito com a delicadeza, mesmo quando estão sendo usadas cores mais vibrantes.” (CHRISTO e SILVA apud COUTINHO, 2009, p. 75)
Tinta acrílica: é um material que proporciona satisfação porque
possui fácil manuseio, possibilita correção dos erros, seca rapidamente e deixa o
trabalho final brilhoso. Diferente da tinta guache que, ao secar, perde o brilho.
Tinta para pintura a dedo: é um material de textura grossa o que
favorece o desenvolvimento da coordenação motora. Segundo Urrutigaray
(2008) “favorece o retorno a estados regressivos, sendo indicado para crianças,
propriamente ditas, e para o despertar da criança interior nos adultos.” (p.61)
3. Materiais Tridimensionais
Estes materiais possibilitam a manifestação de experiências interiores,
principalmente os mais moles.
Plastilina ou massa de modelar: é de fácil manuseio, mas permite
trabalhos de pequena execução. Desenvolve a coordenação motora e a
expressão da imaginação.
32
“A possibilidade de trocar de forma com uma intensa rapidez traz em si a vivência do poder ser de diferentes maneiras, contudo sem perder a noção de si mesmo, representado no tipo de material que continua sendo o mesmo, apesar das diferentes transformações produzidas.” (URRUTIGARAY, 2008, p. 63)
Argila: é um material natural muito maleável. Pode-se modelar, remodelar,
transformar. O fato de ser trabalhado com as mãos possibilita experiências
fortes, mais viscerais, que normalmente encontra dificuldade de expressão. Ela
ajuda na liberação das tensões.
A maioria das crianças aceita prontamente o material, embora ocasionalmente se possa ver uma criança receosa da massa molhada e ‘suja’ que a argila representa. Este fato, por si só, já conta ao terapeuta muita coisa sobre a criança e constitui uma direção proveitosa a ser seguida em terapia. Certamente existe um elo direto entre a compulsão de limpeza da criança e seus problemas emocionais, e isto pode não ficar óbvio com nenhum dos outros materiais apresentados a ela. Eu trabalharia delicadamente, voltando a introduzir a argila aos poucos após a resistência inicial. Esta criança, com muita frequência, ao mesmo tempo em que se sente repelida, sente-se fascinada, e começa a se envolver cautelosamente. ( OAKANDER apud COUTINHO, 2009, p. 81)
Urrutigaray (2008) afirma que a manipulação deste material possibilita
o emergir de emoções, promovendo descargas emocionais criando um efeito
calmante. A possibilidade de fazer e refazer o trabalho permite, a quem a
manuseia, o desenvolvimento da autoconfiança.
A manipulação da argila possibilita a integração de quem a usa com o
material permitindo que a pessoa se aproxime de seus sentimentos. Muitas
crianças com problemas motores e perceptuais necessitam deste tipo de
experiência. (OAKLANDER, 1980)
Sucata: é o aproveitamento de diversos materiais que perdem a
utilidade e normalmente vão para o lixo. A construção a partir desses materiais
permite uma experiência criativa transformadora. Cria-se nova forma, nova
ideia, planeja-se. A reutilização desses materiais exige um nível de coordenação
mental e motora. “Tal atividade pode ajudar na elaboração de que, de uma
situação, a princípio caótica, pode nascer uma solução, mais harmônica e mais
interessante.” (COUTINHO, 2009, p.82)
33
Fantoches: é um material fascinante para as crianças. A história
contada com fantoches prontos ou confeccionados pela própria criança permite
a comunicação e a compreensão mais plena daquilo que ela deseja revelar.
Também nesta linha, as máscaras são facilitadoras para comunicar as emoções
escondidas. “Ao colocar uma máscara e ‘se ocultar’, o sujeito pode permitir o
‘desmascaramento’ de alguns afetos e comportamentos que não ousa revelar
quando traz o rosto exposto.” (COUTINHO, 2009, p.84)
4. Colagem
A colagem de imagens selecionadas e sua ordenação auxiliam no
processo terapêutico além de trabalhar a coordenação motora fina e a
organização espacial.
A colagem também propicia um certo distanciamento ou simulação de determinados conteúdos psíquicos, pois quem se utiliza destas imagens recortadas pode crer que elas não têm relação direta com ela mesma, mantendo uma certa defesa de si mesmo às exposições ainda não consentidas. (...) Quanto mais imagens são utilizadas numa mesma configuração pode-se perceber o grau de defesas utilizadas pelo cliente. (URRUTIGARAY, 2008, p.66)
Quando a colagem apresenta uma composição com “perspectiva
mais clara e aberta, surgem pontos focais capazes de decifrar as interações
pretendidas” facilitando seu reconhecimento. (URRUTIGARAY, 2008, p.67)
A utilização das técnicas em Arteterapia favorece a individuação, por mediar uma conexão amorosa entre a visualização do sentido na imagem produzida, com as sensações pertinentes ao uso dos diferentes materiais e a descoberta das emoções sentidas no desfrute do trabalho concluído. ((URRUTIGARAY, 2008, p.72)
3.3- Algumas considerações sobre a prática da Arteterapia
34
3.3.1- Em Educação
Pode-se afirmar que a Arteterapia assume uma finalidade educativa
ao ter uma postura de intervenção e modificação. (URRUTIGARAY, 2007)
Bello (2003) afirma que o sistema educacional deveria expandir entre
seus alunos o autoconhecimento e o potencial criativo incorporando o
aprendizado emocional nas escolas. Assim as pessoas seriam mais autênticas,
espontâneas, conheceriam seus medos e pensamentos limitadores e saberiam
comunicar seus sentimentos e desejos.
Se a arte possibilita o desabrochar do imaginário, a partir da ideia de ser a origem do pensamento ou da ideia, cabe ao sistema educativo expandir o desenvolvimento deste sistema simbólico, através das práticas expressivas que possibilitem a integração do aprendizado emocional ao aprendizado de conhecimentos e informações adquiridas da cultura humana. (URRUTIGARAY, 2008, p.38)
A função do arteterapeuta em uma abordagem educativa, segundo
Urrutigaray (2008) é proporcionar experiências para que o indivíduo tenha mais
capacidade e habilidade de perceber e lidar com suas ações de maneira mais
consciente. E, completa que o “educador é um agente atuante na formação de
uma personalidade”. (p. 39)
Os alunos sentem-se apoiados a vivenciar suas reações em dinâmicas estimuladas pelas oficinas de criatividade, sem reduções críticas e julgamentos. A manipulação do material plástico fornece a conjugação do sensível com o cognitivo, favorecendo o despontar para relações múltiplas entre os elementos disponíveis, evitando o reducionismo focal de ser só isto ou aquilo. (URRUTIGARAY, 2008, p.39)
E Urrutigaray (2008) complementa que a Arteterapia aliada à
aprendizagem significativa minimiza “problemas de aprendizado, ou de
tratamento de dificuldades em aprender, como também atua de modo preventivo
às possíveis questões de aquisição de conhecimento”. (p. 40)
35
A autora ainda define que o objetivo da Arteterapia nas escolas é
desenvolver o potencial criativo e produtivo, a organização das ideias, a
estruturação do tempo e do espaço e a compreensão da causalidade.
A utilização de materiais diversos viabiliza o "aprender fazendo" e estimula os processos cognitivos, por despertar a motivação ou a disposição interior, pela busca; trabalhar uma construção, ou realizar uma instalação, auxilia o desenvolvimento do pensamento intuitivo, ou aquele voltado para a descoberta de outras possibilidades. Portanto, estimulando a passagem da inteligência imediata (ou aquela presa às situações), para a inteligência mediata (ou a das generalizações ou metacognição). A aquisição de novos conhecimentos, gerados pela experimentação pessoal, viabiliza o interesse pessoal pela atividade, a descoberta e o reconhecimento das potencialidades individuais, o despertar da consciência, da autenticidade e da espontaneidade, a aquisição do sentido de auto-estima. (URRUTIGARAY, 2008, p. 97)
Sabe-se que é imprescindível que se crie um vínculo positivo entre o
educador e o educando para que a aprendizagem aconteça. O educando deve
apresentar o desejo de querer aprender.
A arte, por suas características libertadoras e organizadoras, pode se constituir em uma excelente trilha para que a escolarização dos portadores de diferenças ( e dos não-portadores também), se dê de forma mais prazerosa, respeitando potencialidades únicas e tempos próprios, em uma construção que é singular para cada aluno. (COUTINHO, 2009, p.114)
3.3.2- Em ambiente hospitalar
Objetivo da atividade: • proporcionar uma descarga de energia (catarse) através
da manipulação dos materiais. • proporciona um alívio das tensões e angústias originadas
pela internação e tratamento. • proporcionar ou aliviar o estresse. (URRUTIGARAY, 2008,
p. 98)
E, a autora continua destacando que a prática da Arteterapia em
36
hospitais deve ser feita de modo cuidadoso e planejado. Cabe ao arteterapeuta
ter em mente que todo o trabalho terapêutico deve se restringir ao tempo e
espaço da internação. Ele deve levar em consideração este ambiente, o estado
físico do seu cliente, os horários estabelecidos pela equipe hospitalar, os
materiais que podem ser utilizados naquela situação. Vale destacar que o
material usado no trabalho deve ser combinado com antecedência com o cliente,
pois no hospital não há espaço para guardá-los. Outro fator importante é que o
arteterapeuta deve estar preparado para lidar com a frustação devido a
mudanças no quadro de saúde do paciente.
Segundo Rode (1996), cabe ao arteterapeuta promover
oportunidades para encorajar e preservar a imaginação da criança doente.
Afirma que o brincar e a criatividade dão sentido à vida e cita Winnicott “O
brincar é universal e pertence a saúde. Brincar facilita o crescimento, e promove
a saúde.” (WINNICOTT apud RODE, 1996, p.29)
É necessário oferecer experiências de brincar e criar um espaço
tranquilo para a criança, a família e toda a equipe que participa do tratamento do
doente permitindo que todos experimentem um “senso de ordem e conecção”.
(RODE, 1996, p.30)
Rode (1996) ainda afirma que essas atividades criativas fazem a
criança dar forma às suas fantasias internas e aos seus conceitos e significados.
Começa a existir um diálogo entre as experiências internas da criança e o mundo
exterior. Através deste trabalho diversificado começa a se clarear a maneira com
que o paciente e a família lidam com a experiência da doença e da
hospitalização. Essas atividades criativas permitem respostas encorajadoras e
estratégias positivas de se lidar com esta experiência para a criança e sua
família.
3.3.3- Em consultório
No atendimento clínico o objetivo da atividade arteterapêutica
37
(...) é a preocupação diagnóstica e o desenvolvimento terapêutico. De acordo com a projeção dos conteúdos inconscientes nas imagens produzidas, o profissional conduzirá as suas estratégias de tratamento e interpretação analítica das imagens e das emoções nelas contidas, tendo em vista os procedimentos terapêuticos de sua linha de atuação. (URRUTIGARAY, 2008, p. 96)
É importante destacar que o consultório deve ter espaço suficiente
para organizar diversos materiais para as várias atividades a serem propostas.
Mas, o cliente deve se sentir livre para decidir se deseja trabalhar com os
materiais plásticos ou manter, apenas, a terapia verbal. Pois, os materiais são
apenas meios facilitadores do processo terapêutico. O mais importante é o
“processo analítico e sua psicoterapia”. (URRUTIGARAY, 2008, p. 96)
38
CONCLUSÃO
Este estudo permitiu entender melhor a importância da Arteterapia
realizada com crianças.
Através da experiência artística a criança é levada a ampliar a visão
de si mesma e do mundo. É no ato criador que se articula coordenação motora,
imaginação, intuição e cognição possibilitando que a emoção e as funções
cognitivas aflorem. No ato de criar, pensamento e sentimentos estão juntos. E,
ao desenvolver habilidades intelectivas, cognitivas e emocionais ocorre o
equilíbrio integral da criança, tornando-a mais saudável.
As imagens produzidas pela criança carregam em si informações de
seu mundo interior e de seus sentimentos. Cabe ao arteterapeuta estar atento e
conduzir o processo terapêutico conversando com a criança sobre a produção
realizada, suas dificuldades e sentimentos. Mas, vale destacar que este
processo deve ser realizado sem julgamentos estéticos, pois a criança está em
desenvolvimento e ela deve ser respeitada em seu momento e em sua
individualidade.
A criança é um ser inventivo por natureza. Cria ao brincar, ao
desenhar, ao sonhar, ao interagir com um grupo. E, ao se estimular esta
criatividade, dá-se oportunidade de a criança fortalecer sua autoconfiança, sua
capacidade de enfrentar desafios, seu autoconhecimento e sua imaginação
criadora.
Este estudo demonstrou que o arteterapeuta que lida com crianças
deve ter a capacidade de compreender mensagens que lhe cheguem por meios
não verbais. A criança nem sempre sabe exteriorizar seus sentimentos, medos,
conflitos e desejos. Mas sua maneira de agir, seu modo de falar e de brincar, seu
corpo carregam informações que ajudam o arteterapeuta a compreender melhor
seu paciente. É através da coleta de informações que lhe chegam por várias vias
que o profissional pode auxiliar a criança a identificar suas dificuldades e
ajudá-la a superá-las. Para que todo o processo ocorra de forma plena é
imprescindível que se tenha uma relação de confiança e respeito entre o
39
arteterapeuta e a criança.
É fundamental também favorecer a socialização através de atividades
em grupo. Brincadeiras, jogos, dinâmicas permitem que as crialnças aceitem
melhor as diferenças e superem as barreiras do egoísmo. É nesta interação que
a inclusão social ocorre.
O espaço que acolherá a criança, o setting terapêutico, deve ser
confortável e ter os materiais expressivos adequados. Os materiais plásticos
possuem propriedades terapêuticas que permitem a livre expressão da criança e
a vivência de experiências sensoriais diversas. Ao escolher o melhor material
para cada situação, o arteterapeuta cria condições para que aflore conteúdo
inconsciente no fazer e no resultado final do trabalho. Saber direcionar o
processo e propiciar um ambiente acolhedor e funcional também é atribuição do
arteterapeuta.
Este estudo abordou de maneira breve a aplicação da Arteterapia na
escola, em hospitais e em consultório. Cabe um estudo mais detalhado sobre o
uso do processo terapêutico nesses ambientes.
No ambiente educacional, a Arteterapia tem função de integrar o
aprendizado emocional ao aprendizado cognitivo; de proporcionar experiências
para que o aluno lide com suas ações de forma mais consciente; de desenvolver
o potencial criativo, a organização de ideias, a estruturação de espaço e de
tempo. Atua nos problemas de aprendizagem e previne possíveis dificuldades
de aquisição de conhecimento.
No ambiente hospitalar, a Arteterapia busca restaurar o imaginário
infantil dando oportunidade para que a criança exteriorize seus medos e sua
experiência ao lidar com a doença. Vale destacar que o arteterapeuta deve levar
em consideração o espaço físico do hospital, o estado geral do paciente, os
materiais a serem usados, bem como o estado emocional da criança e dos
familiares. Diferente função exerce a Arteterapia realizada em consultório que
possui o foco direcionado à preocupação diagnóstica e ao desenvolvimento
terapêutico.
A presente pesquisa contribui para um melhor esclarecimento e
encaminhamento para o uso da Arteterapia com crianças. O assunto não se
esgota aqui, pelo contrário, é apenas um passo inicial para fortalecer
40
profissionais e interessados no processo arteterapêutico para que a prática
aconteça de forma mais contextualizada e balizada teoricamente.
41
BIBLIOGRAFIA
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personalidade criativa. Rio de Janeiro, Wak, 2007. 3ª edição
BELLO, Susan. Pintura Espontânea. Revista Imagens da Transformação, nº1,
vol. 1, 1994)
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ensino e aprendizagem da arte na escola. São Paulo: Cortez, 1998. 3ª edição
CIORNAI, Selma. Arte Terapia Gestáltica: relatos de experiências.Revista Imagens da Transformação,nº 2 ,vol. 2, 1995)
COROMANDEL, Ivan e SOUZA, Virginia Maria Castilho de. Teorias e práticas
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19, 2007.
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