57
ABUNDÂ PEQUENOS MARGINAI Me UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciências Departamento de Biologia Animal ÂNCIA E DIVERSIDADE S MAMÍFEROS EM HABI IS NUMA PAISAGEM RU Filipa Isabel Jesus Guilherme estrado em Biologia da Conservação 2010 DE BITATS URAL

UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

  • Upload
    dodat

  • View
    221

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E

PEQUENOS

MARGINAIS NUMA

Mestrado em Biologia da Conservação

UNIVERSIDADE DE LISBOA

Faculdade de Ciências Departamento de Biologia Animal

BUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE

EQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS

ARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

Filipa Isabel Jesus Guilherme

Mestrado em Biologia da Conservação 2010

IVERSIDADE DE

ABITATS

URAL

Page 2: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

UNIVERSIDADE DE LISBOA

Faculdade de Ciências Departamento de Biologia Animal

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE

PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS

MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

Dissertação orientada pela Professora Doutora Margarida Santos-Reis

Filipa Isabel Jesus Guilherme

Mestrado em Biologia da Conservação 2010

Page 3: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE

O presente estudo enquadra

Ciências da Universidade de Lisboa (FCUL) e a Companhia das Lezírias, S.A. (CL), no contexto do

programa Business & Biodiversity patrocinado pelo Instituto para a Conserv

Biodiversidade (ICNB). Este protocolo visa aprofundar o conhecimento sobre os padrões de diversidade e

abundância de mamíferos na Charneca do Infantado e da sua relação com as práticas de gestão agro

silvo-pastoris aí desenvolvidas.

DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM

O presente estudo enquadra-se no âmbito de um protocolo assinado entre a Faculdade de

Ciências da Universidade de Lisboa (FCUL) e a Companhia das Lezírias, S.A. (CL), no contexto do

programa Business & Biodiversity patrocinado pelo Instituto para a Conservação da Natureza

(ICNB). Este protocolo visa aprofundar o conhecimento sobre os padrões de diversidade e

abundância de mamíferos na Charneca do Infantado e da sua relação com as práticas de gestão agro

AISAGEM RURAL

se no âmbito de um protocolo assinado entre a Faculdade de

Ciências da Universidade de Lisboa (FCUL) e a Companhia das Lezírias, S.A. (CL), no contexto do

ação da Natureza e

(ICNB). Este protocolo visa aprofundar o conhecimento sobre os padrões de diversidade e

abundância de mamíferos na Charneca do Infantado e da sua relação com as práticas de gestão agro-

Page 4: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

AGRADECIMENTOS

À Prof. Dr.ª Margarida Santos-Reis, pela orientação da minha tese, por ter

dado imensas sugestões para melhorar o meu trabalho e por conseguir arranjar

sempre um tempinho para me receber na sua agenda preenchidíssima!

À Prof. Dr.ª Otília Correia, por me ter indicado os métodos mais correctos

para a amostragem da vegetação e por se ter disponibilizado para demonstrar a sua

aplicação in situ, na Companhia das Lezírias.

À Prof. Dr.ª Ana Isabel Correia, por ter, prontamente, aceitado ajudar-me com

a identificação das plantas. Sem si estaria perdida, muito obrigada!

À Prof. Dr.ª Cristina Cruz, por ter dispendido imenso tempo com explicações

sobre os métodos de amostragem do solo, por ter disponibilizado todo o material

necessário e mais algum, e por [ter tentado] transmitir um pouco do seu entusiasmo

sobre o estudo do solo e da vegetação.

À Paula Gonçalves e à Sandra Alcobia, por me terem apresentado à

Companhia e terem ensinado todo o trabalho de campo, sempre com boa disposição.

Obrigada também pelas boleias! Um beijinho da vossa Taca (ou seria Lada?...)

À Sasha e à Kasia, sem as quais o trabalho de campo seria extremamente

demorado e penoso, e atrevo-me a dizer mesmo IMPOSSÍVEL! Obrigada pela

preciosa companhia durante os tempos de reclusão longe da civilização, e um especial

agradecimento à Sasha pelo reconfortante chilli nas noites frias deste ano ;) i dzęki,

Kasia!

Ao pessoal da Companhia: Eng.º Rui Alves, por ter aceitado a minha proposta

de trabalho, permitindo assim a realização desta tese; ao Sr. Zé Luís e aos guardas,

pelos ocasionais convívios que nos obrigavam a sair da pasmaceira, e, principalmente,

por nos resgatarem quando levávamos a Gertrudes e o Casimiro a tomar banhos de

imersão na lama!; ao Sr. Marinho, incansável a abrir a cancela; ao Sr. José Cândido,

sempre disponível a dar uma boleia; e à Lívia, pelo sorriso com que sempre nos

recebia :)

Page 5: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

Ao Miguel Rosalino, por estar disponível para ajudar quando mais ninguém

respondeu aos meus silenciosos gritos de socorro! Obrigada pela atenção, pelo

interesse no meu trabalho e pelas soluções para todos os meus problemas

[estatísticos]!

A todos os meus amigos, que, de uma forma ou de outra, se interessaram e

preocuparam com o meu trabalho, perguntando sempre “Como vão os ratos?” ou

“Como vai a tese?”. Um obrigada em especial à Marion, pela amizade nestes últimos

anos e pela companhia durante a escrita da tese, que me livrou da insanidade durante

este período (dentro dos possíveis, tendo em conta as circunstâncias!).

Aos meus pais, que possibilitaram o meu percurso até aqui e que aturaram o

meu stress e mau humor durante a escrita da tese (eu não faço por mal!). À minha

irmã, por me ter disponibilizado uma caminha nas idas a Lisboa! :D

Ao João, por todo o apoio, por ter ajudado em tudo o que podia e não podia,

trabalho de campo, pesquisa, correcção do trabalho escrito… Obrigada por me fazeres

esquecer da tese nalguns momentos, quando se calhar até não devia! Obrigada por

seres como és e me aceitares como eu sou… Todo o tempo que não te pude

dispensar vai ser compensado nesta nova fase das nossas vidas ^^

Page 6: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

RESUMO

A intensificação da agricultura tem levado ao declínio generalizado da

biodiversidade nas paisagens rurais. Os habitats marginais têm uma relevância

crescente neste contexto, actuando como refúgio para diversas espécies de fauna e

flora. Os pequenos mamíferos desempenham um papel fulcral nestes ecossistemas e

influenciam muitas espécies num nível trófico mais elevado.

Pretendeu-se estudar quais os factores que influenciam a abundância e

diversidade de pequenos mamíferos nas áreas marginais aos campos agrícolas, na

Companhia das Lezírias, Ribatejo. Procedeu-se à armadilhagem de pequenos

mamíferos e à caracterização do habitat segundo diversos parâmetros.

A riqueza e diversidade específica revelaram-se elevadas nas zonas não

intervencionadas e reduzidas nas zonas de montado que sofreram recentemente o

impacto do pastoreio. Efectivamente, a abundância total de pequenos mamíferos

mostrou uma relação negativa com a intensidade de pastoreio e positiva com o tempo

desde a saída do gado, sendo C. russula a espécie mais afectada pelo pastoreio. A

acção do pastoreio diminui a qualidade do habitat, causando sobretudo a diminuição

da cobertura vegetal. A presença de vegetação alta influencia a abundância de

pequenos mamíferos, pois providencia maior disponibilidade de abrigo e alimento,

sendo esta relação mais explícita no caso de C. russula.

A diversidade de habitats adjacentes não parece influenciar a abundância

geral, mas A. sylvaticus é mais abundante em áreas marginais rodeadas por diferentes

habitats, sendo favorecido por pinhais e olivais, uma fonte de alimento adicional. A

lavra dos terrenos agrícolas parece afectar negativamente toda a comunidade de

pequenos mamíferos, enquanto que a colheita afecta sobretudo M. spretus. Os

habitats marginais parecem particularmente importantes quando junto de eucaliptais,

aliviando o efeito negativo que estes parecem ter sobre a comunidade de

micromamíferos, nomeadamente C. russula.

Estes resultados acentuam a necessidade de uma gestão adequada destes

habitats, de modo a conservar a biodiversidade nas paisagens rurais actuais.

Palavras-chave: pequenos mamíferos, habitats marginais, agricultura, paisagens

rurais.

Page 7: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

SUMMARY

Agricultural intensification has led to a widespread decline of biodiversity in rural

landscapes. Marginal habitats have an increasing relevance in this context, acting as a

refuge for many species of fauna and flora. Small mammals play a main role in these

ecosystems and affect many species in a higher trophic level.

This study aims to determine the factors that influence the abundance and

diversity of small mammals in marginal areas of arable fields, in Companhia das

Lezírias, Ribatejo. Small mammals were captured with live-traps and several habitat

variables were measured.

Species richness and diversity were higher in less disturbed areas and lower in

“montado” areas that had recently been grazed. In fact, the total abundance of small

mammals showed to be negatively related with grazing intensity and positively with the

time since the cattle left the area, C. russula being the most affected species. Grazing

lowers habitat quality, mainly by reducing vegetation cover. The presence of high

vegetation influences the abundance of small mammals, providing greater availability

of shelter and food, and this relationship is more obvious in the case of C. russula.

The diversity of adjacent habitats does not seem to influence the overall

abundance, but A. sylvaticus showed to be more abundant in marginal areas

surrounded by different habitats, being favored by pine forests and olive groves, an

additional food source. Tillage seems to adversely affect the entire community of small

mammals, while the harvest affects mostly M. spretus. Marginal habitats seem

particularly important when near eucalyptus forests, relieving the negative effect they

seem to have on the community of small mammals, in particular C. russula.

These results underscore the need for proper management of these habitats in

order to maintain biodiversity in nowadays rural landscapes.

Keywords: small mammals, marginal habitats, agriculture, rural landscapes.

Page 8: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

ÍNDICE

1. INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 1

1.1. A agricultura ....................................................................................................... 1

1.1.1. Intensificação da agricultura ........................................................................... 1

1.1.2 Consequências para a biodiversidade............................................................... 1

1.2. A região mediterrânica ....................................................................................... 3

1.2.1. O montado ................................................................................................... 3

1.2.2. Diversidade biológica no montado ................................................................... 4

1.3. Os pequenos mamíferos .................................................................................... 6

1.3.1. O seu papel no ecossistema ........................................................................... 6

1.3.2. Os pequenos mamíferos nas zonas agrícolas ................................................... 6

1.4. Habitats marginais nas zonas agrícolas ............................................................. 7

1.5. Objectivos .......................................................................................................... 9

2. MATERIAL E MÉTODOS .............................................................................................. 10

2.1 Área de Estudo.................................................................................................. 10

2.2 Captura de pequenos mamíferos ...................................................................... 12

2.3 Caracterização da vegetação ............................................................................ 13

2.4. Caracterização do solo ..................................................................................... 14

2.5. Análise do pastoreio ......................................................................................... 15

2.6. Dados climáticos .............................................................................................. 15

2.7. Análise estatística ............................................................................................ 15

3. RESULTADOS ........................................................................................................... 17

3.1. Diversidade e abundância de pequenos mamíferos ......................................... 17

3.2. Efeito do uso do solo e diversidade de habitats ................................................ 19

3.3. Efeito da composição e estrutura da vegetação ............................................... 23

3.4. Efeito do solo ................................................................................................... 30

3.5. Efeito do pastoreio ........................................................................................... 31

3.6. Efeitos dos parâmetros climáticos .................................................................... 32

Page 9: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

4. DISCUSSÃO .............................................................................................................. 33

4.1. Comunidade de pequenos mamíferos .............................................................. 33

4.2. Factores determinantes da abundância das espécies ...................................... 35

4.2.1. Rato-das-hortas (Mus spretus) ...................................................................... 35

4.2.2. Rato-do-campo (Apodemus sylvaticus) .......................................................... 36

4.2.3. Musaranho-de-dentes-brancos (Crocidura russula) ......................................... 38

4.3. Limitações dos dados ....................................................................................... 40

4.4. Considerações finais ........................................................................................ 40

5. BIBLIOGRAFIA ........................................................................................................... 42

Page 10: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

1

1. INTRODUÇÃO

1.1. A AGRICULTURA

1.1.1. Intensificação da agricultura

Uma proporção substancial da superfície terrestre está ocupada por terras

dedicadas à produção de recursos para o homem (alimento, fibras e outros) (Bennet et

al., 2006). Na Europa, a agricultura é o uso do solo predominante, representando

quase metade do território europeu (Robinson & Sutherland, 2002; Stoate et al., 2009),

com 34% da área usada para cultivo e 14% para pastagens (Verbung et al., 2006 in

Reidsma et al., 2006).

Nos últimos séculos, verificou-se um incremento significativo da área utilizada

para a agricultura e da produção agrícola, principalmente no século XX, período em

que a população humana global aumentou 3,7 vezes (Tilman et al., 2001). De 1700 a

1980, a área cultivada aumentou 466% e a área dedicada à cultura de regadio

aumentou 2400% (Meyer & Turner II, 1992), e as previsões do uso do solo à escala

global sugerem que, no futuro, cada vez mais área será aproveitada para a agricultura

(Tilman et al., 2001).

Seguindo políticas governamentais, avanços tecnológicos e mudanças de

mercado, surgem alterações às práticas agrícolas visando a intensificação da

agricultura (aumento da produção por unidade de superfície) (Schmucki et al., 2002;

Michel et al., 2006; Michel et al., 2007). Aumentou o uso de maquinaria pesada e o

uso de agroquímicos, como fertilizantes e pesticidas, e verificou-se uma expansão dos

terrenos agrícolas e a destruição da maior parte dos elementos naturais ou semi-

naturais das paisagens, como florestas, matas, prados naturais e cercas vivas (Burel &

Baudry, 1990; Petit & Burel, 1998; Stoate et al., 2001; Jongman, 2002). Estas

alterações permitiram um aumento sem precedentes da produtividade e,

consequentemente, dos rendimentos, mas levaram a uma transformação drástica dos

padrões do uso do solo na paisagem rural, sendo os impactos ecológicos ainda pouco

conhecidos (Agger & Brandt, 1988; Stoate et al., 2009).

1.1.2 Consequências para a biodiversidade

O domínio territorial do uso agrícola do solo, assim como a sua gestão,

tradicionalmente de reduzida intensidade, resultou numa elevada biodiversidade

associada a estes ecossistemas (Duelli & Obrist, 2003; Bennet et al., 2006; Stoate et

Page 11: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

2

al., 2009). De facto, 50% de todas as espécies existentes na Europa dependem de

habitats agrícolas, incluindo espécies endémicas e ameaçadas (European

Environment Agency in Stoate et al., 2009). Assim sendo, é hoje reconhecido que a

conservação da biodiversidade depende não só de áreas protegidas (como reservas e

parques naturais, entre outros) mas também da preservação de áreas dominadas pelo

homem e da sua correcta gestão (Fitzgibbon, 1997; Burel et al., 1998; Duelli & Obrist,

2003; Bennet et al., 2006).

A intensificação da agricultura tem sido apontada como uma das principais

causas da perda de diversidade de espécies, especialmente devido à modificação do

padrão do uso do solo, que provocou um declínio na diversidade e qualidade dos

habitats (McLaughlin & Mineau, 1995; Sala et al., 2000; Robinson & Sutherland, 2002;

Duelli & Obrist, 2003). Tem vindo a ocorrer uma vasta destruição e fragmentação dos

habitats naturais e semi-naturais das paisagens rurais, resultante da conversão de

áreas naturais em campos agrícolas e da sua expansão (Sotherton, 1997; Millán de la

Peña et al., 2003).

A paisagem agrícola consiste num mosaico de diferentes usos do solo, onde

as áreas mais perturbadas (plantações de cereais, horticulturas, pomares, pastagens e

instalações humanas) estão intercaladas com manchas de vegetação natural, como

bosques, matas, árvores dispersas, vegetação ripícola e campos ditos marginais, que,

embora incluindo elementos naturais, apresentam outros que são resultantes da

actividade humana (Agger & Brandt, 1988; Bennet et al., 2006). Algumas espécies

existentes nas áreas rurais não conseguem residir no interior dos terrenos cultivados

ou pastados intensivamente, conseguindo apenas sobreviver associadas aos

elementos mais naturais da paisagem (Renjifo, 2001; Daily et al., 2001; Eilu et al.,

2003). Assim, a fragmentação da paisagem agrícola resulta na formação de pequenas

manchas isoladas de habitat adequado rodeado de terreno inóspito que pode criar

resistência à movimentação e dispersão de muitas espécies (Bennet et al., 1990;

Plieninger, 2006).

Os habitats naturais têm vindo a ser destruídos para aumento dos terrenos

agrícolas, agravando ainda mais os efeitos da fragmentação (LeCœur et at, 2002;

Duelli & Obrist, 2003). Tal resulta na perda do habitat disponível para a flora e fauna e

no seu isolamento, o que por sua vez leva à diminuição do efectivo populacional e

aumenta a vulnerabilidade das populações a factores estocásticos, como perturbações

ambientais, flutuações demográficas ou deterioração genética, o que acaba por

conduzir a um maior risco de extinção ou extirpação (Wilcox & Murphy, 1985 in Gelling

et al., 2007). As espécies mais afectadas são as espécies raras e especialistas no que

diz respeito aos seus requisitos de habitat, enquanto que as espécies generalistas e

Page 12: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

3

mais comuns podem até ser favorecidas a níveis moderados de fragmentação (Love et

al., 2000 e Kleijan & Sutherland, 2003 in Michel et al., 2006; Millán de la Peña, 2003).

1.2. A REGIÃO MEDITERRÂNICA

1.2.1. O montado

Na região mediterrânica, uma região muito humanizada e na qual o sector

agrícola é particularmente relevante, as alterações induzidas pelo Homem são

responsáveis por uma parte importante da variedade e dinâmica da biodiversidade

actual. Esta zona é das mais complexas em termos de história natural, geologia,

morfologia e geografia (Blodel & Aronson, 1999).

Desde o período Neolítico (cerca de 4500 a.C.) que existem evidências da

alteração da paisagem do sul da Península Ibérica com fins agrícolas, tendo-se

assistido desde então a uma redução, mais ou menos acentuada, do estrato arbóreo e

arbustivo (Joffre, 1999; Zamora et al., 2007).

O montado é um sistema agrossilvopastoril moldado pelo homem e típico do

Mediterrâneo, tendo maior expressão na Península Ibérica, onde ocupa uma área de

3,5 a 4 milhões de hectares (Olea & San Miguel-Ayanz, 2006). Portugal é o país com a

maior extensão de montado de sobro do mundo, onde ocupa cerca de 730 mil

hectares, o que corresponde a mais de 30% da área mundial deste tipo de montado

(Pio et al., 2005).

Situado em zonas de clima mediterrânico (verões quentes e secos e invernos

chuvosos e amenos) e de solos pobres em matéria orgânica e com reduzida

capacidade de armazenamento de água, e, consequentemente, de reduzida fertilidade

(De Miguel, 1999; Pires da Fonseca, 2005; Olea & San Miguel-Ayanz, 2006), este

ecossistema é caracterizado por um coberto arbóreo relativamente aberto de sobreiros

(Quercus suber L.) ou de azinheiras (Quercus rotundifolia Lam.) dispersos de modo

não uniforme e resultantes, geralmente, da regeneração natural. A remoção artificial

da vegetação arbustiva, quer mecanicamente, quer por acção do pastoreio, permite,

ao nível do solo, um diversificado estrato herbáceo, onde é mantido um sistema de

rotação de culturas e de pastagens (Pinto-Correia, 1993; Lourenço, 1998; Pinto-

Correia & Mascarenhas, 1999; Pires da Fonseca, 2005).

Considerando as restrições ambientais do montado em termos climáticos e

edáficos, a sua exploração passa por uma gestão diversificada, de modo a aproveitar

todos os recursos naturais com elevada eficácia no uso de energia e nutrientes e

tendo em conta a flutuação anual típica da produtividade (Pinto Correia, 1993; De

Page 13: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

4

Miguel & Gómez Sal, 2002; Olea & San Miguel-Ayanz, 2006). Esta gestão exige uma

multiplicidade de actividades adaptadas às condições locais, como a criação de gado,

a extracção de cortiça e o cultivo, incluindo o de pastagens, que podem ser

complementadas com a exploração de outros produtos, como a caça, mel, plantas

aromáticas e o carvão, para além de actividades como o turismo (Pinto-Correia, 1993;

Pinto-Correia & Mascarenhas, 1999; Pereira & Pires da Fonseca, 2003; Pires da

Fonseca, 2005; Olea & San Miguel-Ayanz, 2006).

A criação de gado em regime extensivo (principalmente de porco ibérico e

ovelhas), para carne e lacticínios, é o produto mais importante do montado (Pinto-

Correia & Mascarenhas, 1999; Olea & San Miguel-Ayanz, 2006). Esta exploração tem

em consideração a capacidade de suporte do ecossistema, permitindo a simultânea

nutrição dos animais e a regeneração vegetal. O pastoreio tem também um papel

essencial no controlo do estrato arbustivo e no aumento da fertilidade do solo. No

entanto, esta exploração extensiva de gado de espécies e raças tradicionais

adaptadas ao montado tem vindo a ser substituída pela criação em regime intensivo

de raças mais produtivas de gado bovino que causam danos acrescidos no

ecossistema, ao nível da regeneração natural do coberto vegetal e da compactação do

solo (Pinto-Correia, 1993; Pinto-Correia & Mascarenhas, 1999, Pinto-Correia, 2000,

Plieninger & Wilbrand, 2001).

Houve também a intensificação das culturas, com a consequente redução de

árvores e aumento da fertilização e mecanização (Pinto-Correia, 1993; Pinto-Correia &

Mascarenhas, 1999). Nas terras mais férteis, a agricultura extensiva tradicional foi

progressivamente substituída por agricultura intensiva de regadio (Beja & Alcazar,

2003; Rigueiro-Rodriguez et al., 2008; Pita et al., 2009). Nas regiões com solos mais

empobrecidos, a intensificação levou à sua exaustão e acelerada erosão, causando a

degradação do sistema que, frequentemente, acaba por ser abandonado ou

substituído por eucaliptais (Pinto-Correia, 1993; Pinto-Correia & Mascarenhas, 1999,

Pinto-Correia, 2000; Beja & Alcazar, 2003; Rigueiro-Rodriguez et al., 2008).

1.2.2. Diversidade biológica no montado

Os habitats estruturalmente mais complexos providenciam mais nichos

ecológicos e possibilitam mais modos de exploração dos recursos, permitindo assim a

subsistência de uma elevada diversidade de plantas e animais (Plieninger & Wilbrand,

2001; Tews et al., 2004). Na maioria dos habitats, a variabilidade das comunidades

vegetais vai determinar a estrutura física do ambiente, e, por isso, tem uma influência

Page 14: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

5

notável nas distribuições e interacções que se estabelecem com espécies animais

(Bazzaz, 1995; Tews et al., 2004).

A paisagem típica das zonas de montado caracteriza-se por uma marcada

heterogeneidade de habitats e complexidade estrutural, decorrente da existência de

diversos usos do solo (cultivo, pastoreio, exploração da floresta de sobro), a par da

manutenção de elementos do ecossistema original (matos, galerias rípicolas e outros

elementos de vegetação nativa) (De Miguel, 1999; De Miguel & Gómez Sal, 2002).

Logo, o uso extensivo e integrado dos recursos naturais do montado resulta num

mosaico heterogéneo ao nível da paisagem que integra a pluralidade das actividades

humanas e a manutenção de uma biodiversidade elevada (Pinto-Correia &

Mascarenhas, 1999; Pinto-Correia, 2000; Plieninger & Wilbrand, 2001; Pita et al.,

2003; Olea & San Miguel-Ayanz, 2006). A variabilidade nas características de cada

habitat vai induzir diferentes respostas nas espécies faunísticas, fazendo com que as

comunidades se alterem ao longo da paisagem.

Para além da heterogeneidade de habitats, algumas características do

montado inerentes aos sistemas agrários tradicionais contribuem também para a

manutenção de uma biodiversidade elevada: a reduzida utilização de produtos

agroquímicos; intensidades de exploração adaptadas às potencialidades do meio;

utilização de animais domésticos adaptados aos condicionantes ambientais locais;

usos diversificados e espaçados no tempo; e imitação de padrões naturais (De Miguel

& Gómez Sal, 2002).

O montado possui então uma elevada biodiversidade faunística e florística,

incluindo espécies endémicas (Pinto-Correia, 2000; Plieninger, 2006). De facto, os

montados albergam 30% das espécies de plantas, 30% das espécies de anfíbios, 40%

das espécies de aves, 60% das espécies de répteis e 60% das espécies de mamíferos

na Península Ibérica (De Miguel, 1999). O sistema montado é um dos habitats

considerados prioritários na Directiva Habitats e está representado na Rede Natura

2000 (Olea & San Miguel-Ayanz, 2006), mas exige uma atenção especial por parte

dos conservacionistas, pois a preservação da sua biodiversidade característica

depende da manutenção de níveis de qualidade deste ecossistema que tem de

combater as tendências de intensificação, extensificação e abandono que se têm

verificado recentemente (Pinto-Correia & Mascarenhas, 1999; Verdú et al., 2000; Olea

& San Miguel-Ayanz, 2006; Reidsma et al., 2006).

Page 15: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

6

1.3. OS PEQUENOS MAMÍFEROS

1.3.1. O seu papel no ecossistema

Os pequenos mamíferos (ordens Rodentia e Insectivora) têm um papel

importante no ecossistema que habitam e influenciam variados factores bióticos e

abióticos do meio, devido às diversas funções ecológicas que realizam: i) constituem

um recurso alimentar básico para muitos carnívoros (Michel et al., 2006); ii) são

importantes predadores de artrópodes; iii) são essenciais para a regeneração vegetal,

por fazerem dispersão de sementes (Vieira et al., 2009); e iv) contribuem para o

arejamento dos solos (Brown & Harney, 1993 in Beever & Brussard, 2004). Os

pequenos mamíferos influenciam directamente a diversidade, abundância e sucesso

reprodutor de muitas espécies de predadores, uma vez que são uma presa

fundamental de grande parte das espécies de aves de rapina (Glue, 1974; Askew et

al., 2007), mamíferos carnívoros (Tapper, 1979) e cobras (Ferrand de Almeida et al.,

2001), sendo, por isso, crucial manter populações saudáveis de pequenos mamíferos

para uma conservação eficaz das espécies carnívoras, muitas das quais ameaçadas

(Fitzgibbon, 1997; Cabral et al., 2005; Bates & Harris, 2009).

1.3.2. Os pequenos mamíferos nas zonas agrícolas

Os pequenos mamíferos são um grupo abundante e de distribuição

generalizada nas paisagens agrícolas por todo o mundo e, apesar da sua importância

ecológica, são historicamente encarados como pragas, passíveis de trazer prejuízos

para as colheitas (Jacob, 2003; Michel et al., 2006, 2007) e ser transmissores de

doenças para humanos e gado (Leiby et al., 1990; Klempa et al., 2006).

A qualidade do habitat é fortemente influenciada pela disponibilidade de

recursos e pelo risco de predação, logo os pequenos mamíferos mostram preferência

por habitats com uma cobertura vegetal abundante, onde conseguem obter o alimento

e refúgio que necessitam para subsistir (Michel et al., 2007).

A maior parte das práticas agrícolas prejudica as comunidades de pequenos

mamíferos, pois o corte ou a remoção da vegetação vai expô-los a uma predação

acrescida e reduzir a quantidade de abrigos, alimento e locais de reprodução, sendo

também a causa directa da morte de alguns indivíduos (Tew & Macdonald, 1993 in

Jacob, 2003; Michel et al., 2007).

Consequentemente, na paisagem agrícola os pequenos mamíferos estão

muito confinados aos elementos naturais ou semi-naturais da paisagem, como sebes

Page 16: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

7

ou margens, que providenciam um habitat permanente para muitas espécies, mesmo

quando a área cultivada é mais extensa e tem cobertura suficiente (Merriam & Lanoue,

1990; Burel et al., 1996; Fitzgibbon, 1997; Gelling et al., 2007). Os pequenos

mamíferos são, portanto, especialmente vulneráveis à intensificação agrícola, que tem

conduzido à diminuição dos habitats naturais na paisagem rural e à sua deterioração,

razão apontada para o declínio populacional que se tem verificado neste grupo animal

(Pita et al., 2006; Moro & Gadal, 2007; Bates & Harris, 2009).

1.4. HABITATS MARGINAIS NAS ZONAS AGRÍCOLAS

As margens dos terrenos são uma característica essencial da paisagem

agrícola. O conceito de margem é definido por Greaves e Marshall (1987) como a orla

do campo cultivado ou pastado e o habitat semi-natural a si associado (in Marshall &

Moonen, 2002).

Os principais componentes da orla agrícola são: i) o limite do terreno, que

consiste numa barreira entre os campos, como sebes, cercas ou muros; ii) a faixa

marginal, constituída por qualquer faixa entre o limite do terreno e o limite da cultura,

podendo ter cobertura vegetal ou não; iii) e o bordo da plantação, que abrange os

últimos metros do campo cultivado (Marshall & Moonen, 2002) (Figura 1, adaptada de

Marshall & Moonen, 2002).

Esta estrutura não é estática, pois as margens dos terrenos são influenciadas

pela topografia, geologia e gestão agrícola local, o que resulta numa grande

diversidade de formas destes habitats (Le Cœur et al., 2002; Marshall & Moonen,

2002; Schmucki et al., 2002; Butet et al., 2006a). Estas áreas possuem, geralmente,

um carácter linear (Marshall & Moonen, 2002), contudo está comprovado que a forma

destes habitats não influencia a diversidade e abundância de pequenos mamíferos e,

provavelmente, de outros grupos animais (Tattersall et al., 2002).

As margens dos campos têm, geralmente, funções de delimitação de terrenos

com usos distintos, gestão do gado e divisão de propriedades (Marshall & Moonen,

2002), mas contribuem também para a produtividade agrícola, ao modificar as

condições climáticas, reduzir a erosão do solo, proteger contra inundações, melhorar a

qualidade e o ciclo da água e providenciar potenciais locais de denitrificação

(Schmucki et al., 2002; LeCœur et al., 2002).

Page 17: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

8

Figura 1 – Esquema da estrutura geral de uma margem de terreno agrícola (adaptado de Marshall & Moonen, 2002).

Nas paisagens agrícolas intensamente exploradas, as áreas marginais

possuem a maior diversidade de espécies vegetais, tendo, por isso, uma maior

capacidade de suportar uma fauna diversa (Marshall & Moonen, 2002). Muitas

espécies existentes na paisagem agrícola persistem apenas nas áreas não cultivadas

(Gelling et al., 2007), áreas que têm vindo a desaparecer devido à modernização das

técnicas agrícolas (Duelli & Obrist, 2003; Burel et al., 2004). As áreas marginais

podem funcionar como habitats permanentes ou temporários para muitas espécies de

invertebrados (Lys & Nentwig, 1992; Lys, 1994), aves (Vickery et al., 2002) e

pequenos mamíferos (Gelling et al., 2007; Semere & Slater, 2007; Bates & Harris,

2009).

As margens dos terrenos cultivados ou destinados ao pastoreio são cruciais

para a conservação da biodiversidade em zonas dominadas por paisagens complexas,

como acontece no montado, onde interligam as diferentes manchas de habitat,

servindo como corredores ecológicos e aliviando os impactos negativos da

fragmentação (Marshall & Moonen, 2002; Schmucki et al., 2002; Butet et al., 2006a;

Gelling et al., 2007; Rosalino et al., 2009).

Todavia, as margens dos campos não devem ser vistas como manchas de

habitat completamente separadas do meio, pois os terrenos adjacentes vão influenciar

as comunidades que ocorrem nestes habitats, ao modificar a composição da

Page 18: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

9

vegetação, introduzir novas espécies de predadores ou competidores e ao interferir na

permeabilidade de movimentos (LeCœur et al., 2002; Haynes & Cronin, 2003; Revilla

et al., 2004; Bennet et al., 2006).

Existe uma crescente necessidade de consciencialização da importância da

biodiversidade nas áreas rurais e das ameaças que esta enfrenta. Para a conservação

da fauna e flora características da paisagem agrícola e, particularmente, as espécies

de pequenos mamíferos, é essencial a preservação de habitats marginais de

qualidade (Butet et al., 2006b; Gelling et al., 2007; Bates & Harris, 2009).

1.5. OBJECTIVOS

Pretende-se estudar a hipótese de que em locais de agricultura intensiva

como os pivots agrícolas da Companhia das Lezírias (propriedade agro-pecuária), os

habitats marginais suportam uma elevada diversidade e abundância de pequenos

mamíferos, podendo como tal actuar como habitats fonte. O presente estudo pretende

ainda contribuir para a compreensão das variáveis ambientais que justificam essa

diversidade e abundância, para que, posteriormente, possa ser aplicada uma gestão

mais adequada à manutenção da biodiversidade nesta propriedade e noutros habitats

semelhantes.

Page 19: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

10

2. MATERIAL E MÉTODOS

2.1 ÁREA DE ESTUDO

Este estudo foi realizado na Charneca do Infantado, uma das áreas da

Companhia das Lezírias, a exploração agro-pecuária e florestal de maiores dimensões

existente em Portugal (cerca de 20 000 hectares, considerando a Lezíria de Vila

Franca de Xira, a Charneca do Infantado e os Pauis). A Charneca situa-se no

concelho de Benavente, distrito de Santarém, nas proximidades dos rios Tejo e

Sorraia (Companhia das Lezírias, s. d.).

Está situada numa região de clima mediterrânico, caracterizada por verões

secos e quentes e invernos frios e chuvosos, com uma temperatura média anual de

16ºC e precipitação média anual próxima de 700mm (dados da Estação Meteorológica

do Catapereiro, para o período 2002-2010).

A Charneca do Infantado e os Pauis de Belmonte e das Lavouras perfazem

uma área de 11 500 hectares, dos quais 8 500 são ocupados por povoamentos

florestais de diversas espécies (sobreiro Quercus suber, pinheiro bravo Pinus pinaster,

pinheiro manso Pinus pinea e eucalipto Eucalyptus sp.). O montado de sobro é

dominante, ocupando cerca de 6 000 hectares, e é explorado principalmente para a

extracção de cortiça. Os outros produtos florestais incluem a madeira para serração e

rolaria, lenha e pinhas. A área de montado inclui também outras actividades como a

apicultura, a caça e diversas actividades de turismo ou lazer, e serve de suporte de

pastagens para o gado (Companhia das Lezírias, s.d.).

A Charneca tem uma extensa área devota à agricultura, sendo o arroz a

principal cultura (1 100 hectares), seguida da cultura de milho sob pivot (140 hectares).

A cultura de forragens é também expressiva, tendo um papel essencial para a

alimentação do gado. A Charneca conta também com áreas dedicadas a vinhas e

olivais, para produção de vinho e azeite, respectivamente (Companhia das Lezírias,

s.d.). Estas culturas começam a ter cada vez mais destaque, face à crescente procura

de produtos mediterrânicos no mercado actual (Stoate et al., 2009).

A criação pecuária é uma aposta forte da Companhia das Lezírias e baseia-

se num efectivo bovino de 3650 animais, destinados à produção de carne (Alves, s.d.).

Estes animais são criados de modo extensivo e biológico e seguem anualmente um

regime de transumância, alternando entre a Charneca e a Lezíria (Companhia das

Lezírias, s.d.).

Page 20: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE

A área de montado e os pauis oferecem uma enorme diversidade de habitats

que suportam um elev

conservacionista, incluindo

e diurnas e aves aquáticas

cinegética (coelho-bravo Oryctolagus

scrofa, raposa Vulpes vulpes

carnívoros, e pequenos mamíferos

explica que grande parte desta esteja abrangida n

Reserva Natural do Estuário do Tejo, integrada na Rede Natura 2000

Figura 2 – Localização da área de estudo e das zonas de amostragem.

DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM

11

A área de montado e os pauis oferecem uma enorme diversidade de habitats

que suportam um elevado número de espécies faunísticas de interesse

conservacionista, incluindo várias espécies de aves (passeriformes, rapinas nocturnas

aves aquáticas) e de mamíferos, muitas das quais com importância

Oryctolagus cuniculus, lebre Lepus granatensis

Vulpes vulpes, lontra Lutra lutra, fuinha Martes foina

mamíferos). A elevada biodiversidade presente na Charneca

explica que grande parte desta esteja abrangida na Zona de Protecção Especial e

Reserva Natural do Estuário do Tejo, integrada na Rede Natura 2000 (Alves,

Localização da área de estudo e das zonas de amostragem.

F1

F2

F3

F4 F5

F6

F7

F8

F9 F10 F11

F12

AISAGEM RURAL

A área de montado e os pauis oferecem uma enorme diversidade de habitats

ado número de espécies faunísticas de interesse

(passeriformes, rapinas nocturnas

uais com importância

Lepus granatensis, javali Sus

Martes foina e outros

. A elevada biodiversidade presente na Charneca

a Zona de Protecção Especial e

Alves, s.d.).

Page 21: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

12

A amostragem foi realizada em 12 parcelas marginais aos campos de cultivo

com pivot, que apresentam variados usos do solo e estão submetidas a distintas

práticas de gestão (Figura 2). Entre os 12 locais de amostragem, podemos encontrar

duas zonas de olival (F1 e F4); três zonas de montado (F2, F7 e F12), que são usadas

frequentemente para pastagem, embora uma delas não o tenha sido durante o período

de amostragem, mas sofreu o corte da vegetação para produção de feno quando as

pastagens estavam empobrecidas (F2); e 7 parcelas cobertas apenas por vegetação

herbácea e arbustiva espontânea, das quais três são usadas como pastagem (F5, F6

e F11), duas são utilizadas ocasionalmente para produção de feno (F3 e F8) e outras

duas não são alvo de qualquer prática de gestão (F9 e F10).

2.2 CAPTURA DE PEQUENOS MAMÍFEROS

A armadilhagem de pequenos mamíferos decorreu de Outubro de 2009 a

Julho de 2010, durante duas semanas consecutivas em cada mês, tendo sido

amostrados 6 locais por semana, devido ao número limitado de armadilhas

disponíveis. Foram usadas 168 armadilhas Sherman (H. B. Sherman Traps, Inc. –

Tallahassee, USA), que permitiram aplicar o método de captura-marcação-recaptura,

por não implicarem a morte dos indivíduos capturados. Em cada local de amostragem,

foram utilizadas 28 armadilhas de duas dimensões diferentes (8x9x23 cm e 10x11x38

cm) e em cada armadilha foi colocado um isco, composto por uma mistura de sardinha

de conserva e flocos de aveia, e algodão cardado, que aumenta o conforto térmico e

diminui o stress dos animais capturados durante o período de permanência na

armadilha.

As armadilhas foram colocadas seguindo um esquema em “Y”, adaptado de

Magnusson et al. (2005), visto que este era o mais adequado ao formato dos locais de

amostragem e o que permitia abranger uma maior área. Em cada zona de

amostragem, foram traçados três transectos de 90m com a mesma origem, e as

armadilhas foram colocadas a uma distância de 10m entre si e alternadas de acordo

com o seu tamanho.

Cada sessão de armadilhagem correspondeu a 4 noites consecutivas, e as

armadilhas foram verificadas todos os dias pela manhã. Os indivíduos capturados

foram analisados no local de captura para identificação da espécie (por observação

das características morfológicas gerais), registo de dados biométricos (o comprimento

cabeça-corpo, o comprimento da cauda, o comprimento da pata posterior e o peso), e

determinação do sexo e classe etária (consoante as dimensões e estatuto reprodutor).

Page 22: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

13

A cada mês eram feitas marcações de acordo com uma combinação pré-definida de

cortes no pêlo, para que pudessem ser identificados nos dias seguintes.

Para cada local de amostragem, foram calculados a riqueza específica

(número de espécies de pequenos mamíferos presente em cada local) e o índice de

diversidade de Shannon-Wiener (H’) (Equação 1):

Equação 1

�′ = − � �� ���

��

onde S corresponde à riqueza específica e pi à proporção de indivíduos da espécie i

em relação ao número total de indivíduos (ni/N) (Ricklefs & Miller, 2000).

Para calcular a abundância de cada espécie (i) em cada sessão de

amostragem (j), foi calculado um índice de abundância (Iij) (Equação 2):

Equação 2 ��� = ���

�� × �� − �∑ �� − ���� � × ���

onde Nij indica o número de indivíduos da espécie i capturados na sessão de

armadilhagem j, Tj o número de armadilhas disponíveis para a espécie i na sessão de

armadilhagem j, Rj o números de inspecções às armadilhas na sessão de

armadilhagem j, Cj o número de capturas ou recapturas de outras espécies que não i

na sessão de armadilhagem j e rj o número de recapturas da espécie i na sessão de

armadilhagem j (Pounds, 1981).

2.3 CARACTERIZAÇÃO DA VEGETAÇÃO

Para compreender como as diferenças na composição da comunidade

vegetal afectam os pequenos mamíferos, foram amostrados dois parâmetros relativos

à vegetação existente em cada local de amostragem: a percentagem de cobertura e a

altura máxima. A percentagem de cobertura do estrato herbáceo e arbustivo e a altura

máxima da vegetação foram estudadas seguindo um esquema de amostragem em “Y”

(Magnusson et al., 2005), em que os pontos distam de um metro entre si.

A percentagem de cobertura do estrato herbáceo e arbustivo foi amostrada,

nos meses de Janeiro, Abril e Julho, recorrendo ao método dos quadrados pontuais

Page 23: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

14

(Barbour et al., 1987) (Equação 3). No entanto, só foi possível identificar os

exemplares (até à família) no mês de Abril, sendo calculada apenas para este mês a

cobertura de cada família vegetal (Equação 3).

Equação 3

% ���� !" #$ = %º '� ��%!#�!�( ��), +�,� )�%�(, ") �-�)+,# .%º !�!#, '� +�%!�( × 100

A cobertura do estrato arbóreo foi estimada pelo método dos quadrados

(Barbour et al., 1987), para os meses de Janeiro, Abril e Julho, através da medição do

diâmetro da copa das árvores e, posteriormente, com o auxílio de software de sistema

de informação geográfica ArcGIS 9.2 (Environmental Systems Research Institute,

2006).

A altura máxima da vegetação foi calculada utilizando uma vara graduada,

nos meses de Janeiro, Abril e Julho, sendo esta variável registada em classes de

alturas: 0 a 5 cm, 5 a 10 cm, 10 a 20 cm, 20 a 30 cm e sucessivamente de 10 em

10cm. Nos pontos amostrados em que não foi registada a presença de nenhuma

espécie vegetal, foi registado o tipo de cobertura do solo de acordo com as seguintes

classes: “Musgo/Líquenes”, “Manta morta/Folhada” ou “Solo Nu”.

2.4. CARACTERIZAÇÃO DO SOLO

Uma vez que as características do solo podem influenciar a disponibilidade e

estrutura de tocas para os pequenos mamíferos (Laudré & Reynolds, 1993), foram

amostradas algumas variáveis consideradas relevantes: a facilidade de revolvimento

do solo (medida em revoluções), que poderá ajudar a avaliar a facilidade que os

pequenos mamíferos terão na construção de tocas; a textura, que inclui a

percentagem de areia, limo e argila; a capacidade de campo, que indica a

percentagem máxima de água que o solo pode comportar; e a percentagem de

matéria orgânica.

A amostragem dos elementos do solo foi realizada em Maio, e seguiu

também um esquema em “Y” (Magnusson et al., 2005), com 10m entre cada ponto de

amostragem.

Foi utilizado um revolutímetro para inferir a facilidade de revolvimento do solo

em cada local de amostragem. Em cada ponto foi também recolhida uma amostra de

Page 24: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

15

solo para posterior análise em laboratório, no âmbito de determinar a textura, a

capacidade de campo e a percentagem de matéria orgânica.

2.5. ANÁLISE DO PASTOREIO

Considerando que a criação de gado bovino é uma das actividades com mais

relevância na área de estudo, para cada local de amostragem foi calculada a pressão

de pastoreio e o tempo que o gado passa fora de cada talhão. Os valores do número

de cabeças de gado de cada manada e a data de entrada e de saída das manadas de

cada área constam nos relatórios fornecidos pela Companhia das Lezírias. A

determinação da pressão de pastoreio acumulada a longo prazo (de Agosto de 2007

até Julho de 2010) e a curto prazo (de Outubro de 2009 a Julho de 2010) foi

determinada de acordo com a seguinte fórmula (Equação 4):

Equação 4

1 = 2%�#��ç#)�%!� '# )#%#'#Á �# '� !#,ℎã� (ℎ#) × '9#( '� +� )#%ê%�9# %� !#,ℎã�

2.6. DADOS CLIMÁTICOS

Foram obtidos valores de temperatura máxima, média e mínima, precipitação,

humidade máxima, intensidade da radiação solar e taxa de evapotranspiração a partir

da Estação Meteorológica do Catapereiro, na Companhia das Lezírias.

2.7. ANÁLISE ESTATÍSTICA

Uma vez que não se verificavam os pressupostos para a aplicação de testes

paramétricos, foram calculados os coeficientes de correlação de Spearman para

explicar a relação entre a riqueza específica, diversidade e abundância relativa geral e

das diferentes espécies com o uso do solo. No caso de comparações múltiplas, foi

realizado um teste de Bonferroni para o ajustamento do nível de significância (Zar,

1999).

Page 25: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

16

Foram também realizados testes de Kruskal-Wallis, para verificar se existem

diferenças significativas entre a abundância de cada espécie nas zonas com distintos

usos do solo e com diferentes diversidades de manchas de habitat envolvente, e foi

realizado o teste à posteriori (teste de Dunn) quando necessário. Foi realizado um

teste de Mann-Whitney para comparar a abundância geral e das espécies nas zonas

com e sem efeitos do pastoreio.

A abundância geral e das espécies foi também analisada, recorrendo ao

cálculo do coeficiente de correlação de Spearman, para verificar se está relacionada

com as diversas características do habitat do local de amostragem (vegetação, solo,

pastoreio e clima), corrigindo o patamar de significância pelo método de Bonferroni

(Zar, 1999). Para reduzir a quantidade de informação redundante foi testada a

correlação entre cada par de variáveis. No caso das variáveis apresentarem uma forte

correlação entre si (r>0,70), foi descartada aquela que mostrava uma menor

correlação com a abundância de cada espécie (Hosmer & Lemeshow, 2000).

As análises estatísticas foram realizadas recorrendo ao software STATISTICA

7.0 (StatSoft, Inc., 2004) e R 2.11.1 (R Development Core Team, 2010).

Page 26: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

17

3. RESULTADOS

3.1. DIVERSIDADE E ABUNDÂNCIA DE PEQUENOS MAMÍFEROS

Foram capturados 410 indivíduos pertencentes a 7 espécies distintas: rato-

das-hortas (Mus spretus, Lataste 1883), rato-do-campo (Apodemus sylvaticus,

Linnaeus 1758), rato de Cabrera (Microtus cabrerae, Thomas 1906), rato-cego

(Microtus lusitanicus, Gerbe 1879) e rato-preto (Rattus rattus, Linnaeus 1758)

(roedores); musaranho-de-dentes-brancos (Crocidura russula, Hermann 1780) e

toupeira (Talpa occidentalis, Cabrera 1907) (insectívoros) (Cabral et al., 2005) (Tabela

1).

Tabela 1 – Número de indivíduos capturados (excluindo recapturas) de cada espécie, em cada local de amostragem.

Locais M. spretus A. sylvaticus C. russula M. cabrerae M. lusitanicus T. occidentalis R. rattus

F1 9 27 0 0 0 0 0 36 F2 36 0 0 0 0 0 0 36 F3 5 3 0 0 1 0 0 9 F4 8 20 2 0 0 0 0 30 F5 3 31 1 0 0 0 0 35 F6 21 21 9 0 0 0 0 51 F7 9 4 0 0 0 0 0 13 F8 19 0 3 1 0 0 0 23 F9 32 16 20 1 0 1 0 70 F10 45 5 26 1 0 0 0 77 F11 7 17 1 0 0 0 1 26 F12 3 0 1 0 0 0 0 4

197 144 63 3 1 1 1 410

A espécie mais capturada foi Mus spretus, obtendo-se um total de 197

indivíduos nos 10 meses de amostragem. O pico máximo no número de capturas para

esta espécie verificou-se em Janeiro. Foram registados 144 indivíduos da espécie

Apodemus sylvaticus e 63 de Crocidura russula, tendo os seus máximos ocorrido em

Março e Junho, respectivamente. Pode-se verificar que existe uma clara alternância

entre os picos de abundância das três espécies dominantes e que a época de maior

diversidade ocorreu de Fevereiro a Maio. As restantes espécies, Microtus cabrearae,

Microtus lusitanicus, Talpa occidentalis e Rattus rattus, foram apenas capturadas

ocasionalmente (Figura 3).

Em conformidade com o número de capturas, verificou-se uma maior

abundância da espécie Mus spretus, seguida de Apodemus sylvaticus e Crocidura

russula, sendo que Microtus cabrerae, Microtus lusitanicus, Talpa ocidentalis e Rattus

rattus se revelaram espécies raras (Tabela 2) e, como tal, as respectivas abundâncias

não foram consideradas nas análises subsequentes. Doravante, estas espécies serão

Page 27: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

18

apenas incluídas no cálculo da abundância total, da riqueza específica e do índice de

diversidade de pequenos mamíferos.

A riqueza específica, por local, variou entre 1 e 5 espécies e o índice de

diversidade (H’) entre 0 e 1,175 (Tabela 2).

Figura 3 - Variação do número de indivíduos capturados por espécie ao longo do período de amostragem.

Tabela 2 – Riqueza específica (S), índice de diversidade de Shannon-Wiener (H’) e a abundância média (em capturas/1000 noites-armadilha) de cada espécie para cada local de amostragem.

Locais Uso do solo S H'

Abundância média

Mus spretus

Apodemus sylvaticus

Crocidura russula

Microtus cabrerae

Microtus lusitanicus

Talpa occidentalis

Rattus rattus

Total

F1 olival 2 0.562 12.842 37.692 0.000 0.000 0.000 0.000 0.000 33.793

F2 Montado 1 0.000 45.224 0.000 0.000 0.000 0.000 0.000 0.000 45.224

F3 veg. Natural 3 0.937 5.541 2.780 0.000 0.000 0.962 0.000 0.000 8.250

F4 Olival 3 0.803 8.404 29.802 1.992 0.000 0.000 0.000 0.000 27.643

F5 Pastagem 3 0.420 2.962 49.602 0.952 0.000 0.000 0.000 0.000 32.128

F6 Pastagem 3 1.037 28.632 30.639 12.385 0.000 0.000 0.000 0.000 46.127

F7 Montado 2 0.617 11.198 3.778 0.000 0.000 0.000 0.000 0.000 12.236

F8 veg. natural 3 0.560 21.863 0.000 2.851 1.031 0.000 0.000 0.000 20.918

F9 veg. natural 5 1.175 39.196 26.242 19.920 1.020 0.000 1.020 0.000 65.585

F10 veg. natural 4 0.914 65.019 6.147 29.338 0.909 0.000 0.000 0.000 70.430

F11 pastagem 4 0.882 11.012 30.875 0.943 0.000 0.000 0.000 1.235 32.101

F12 montado 2 0.562 3.420 0.000 1.179 0.000 0.000 0.000 0.000 4.599

O cálculo do índice de autocorrelação espacial de Moran revelou que a

abundância das três espécies mais abundantes nos diferentes locais de amostragem

não está dependente da sua localização espacial (Tabela 3), se considerarmos um

limiar de significância de 0,01 devido ao reduzido número de replicados espaciais.

0

5

10

15

20

25

30

35

40

Out Nov Dez Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul

Nº deindivíduos

M. spretus

A. sylvaticus

C. russula

M. cabrerae

M. lusitanicus

T. occidentalis

R. rattus

Page 28: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

19

Tabela 3 – Índice de autocorrelação espacial de Moran (I) para as três espécies consideradas e o respectivo valor de significância.

I p-level Mus spretus -0,0160 0,1540 Apodemus sylvaticus -0,0637 0,6325 Crocidura russula 0,0174 0,0261

3.2. EFEITO DO USO DO SOLO E DIVERSIDADE DE HABITATS

O uso do solo parece afectar tanto a riqueza como a diversidade específica,

verificando-se uma menor riqueza e diversidade de pequenos mamíferos nas zonas de

montado (F2, F7 e F12), uma riqueza e diversidade elevadas nas zonas menos

intervencionadas (F9 e F10) e valores intermédios de riqueza e diversidade específica

nos restantes locais (Tabela 2). Contudo, apenas se verifica uma correlação

significativa entre o uso do solo e a riqueza específica (rS=0,688; p=0,013) e, de facto,

a riqueza específica apresenta uma relação negativa com as áreas de montado (rS =-

0,729; p=0,007).

A abundância da comunidade de pequenos mamíferos não parece, contudo,

ser determinada pelo uso do solo apesar de, entre as espécies mais abundantes, a

abundância de Apodemus sylvaticus apresentar uma relação positiva significativa com

as zonas de pastagem (p=0,023) e uma relação negativa com as áreas de montado

(p=0,044) (Tabela 4).

Tabela 4 – Coeficientes de correlação de Spearman (rS) entre a abundância relativa total e de cada espécie e o uso do solo dominante no local de amostragem (* p<0,05; ** p<0,01).

Olival

(rS) Montado

(rS) Pastagem

(rS) Veg. Natural

(rS)

Total 0.0000 -0.3624 0.1951 0.1536

M. spretus -0.1296 -0.0279 -0.2509 0.3585

A. sylvaticus 0.3914 -0.5895* 0.6456* -0.3610

C. russula -0.1648 -0.4256 0.0851 0.4431

Ao contrário de Mus spretus, as abundâncias de Apodemus sylvaticus e

Crocidura russula parecem diferir significativamente em zonas com diferentes usos do

solo (Tabela 5), porém o teste à posteriori não confirma esta diferença para o caso da

espécie de musaranho. Assim, apenas Apodemus sylvaticus apresenta diferenças

significativas de abundância nas áreas com diferentes usos do solo. Verifica-se que as

zonas de olival e de pastagem apresentam, respectivamente, abundâncias

significativamente superiores às observadas nas zonas de montado (p<0,001) e de

vegetação herbácea e arbustiva natural (p=0,002; p=0,001) (Figura 4).

Page 29: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

20

Tabela 5 – Resultados do teste de Kruskal-Wallis, comparando a abundância relativa geral e de cada espécie nas áreas com diferentes usos do solo e o respectivo valor de significância.

H g.l. p-value Total 6,4494 3 0,0917 Mus spretus 4,1420 3 0,2465 Apodemus sylvaticus 42,5764 3 0,0000 Crocidura russula 14,5398 3 0,0023

Figura 4 – Caixas de bigodes para a abundância relativa geral (a), de Mus spretus (b), de Apodemus sylvaticus (c) e de Crocidura russula (d), nas parcelas com diferentes usos do solo.

Em relação à diversidade de habitats adjacentes à área de amostragem,

apenas Apodemus sylvaticus revelou o seu efeito (Tabela 6), apresentando valores de

abundância significativamente menores nas áreas rodeadas somente por um tipo de

habitat (teste de Dunn; diferenças entre um e dois habitats, p=0,0224; diferenças entre

um e três habitats, p=0,0375) (Figura 5). A abundância geral é também influenciada

pela diversidade de habitats ao redor das áreas da amostragem (Tabela 6), sendo que

as áreas homogéneas apresentam abundâncias relativas significativamente inferiores

que as zonas com três tipos de habitat (teste de Dunn, p=0,0035) (Figura 5).

a) b)

c) d)

Page 30: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

21

Tabela 6 - Resultados do teste de Kruskal-Wallis, comparando a abundância relativa geral e de cada espécie nas áreas com diferente diversidade de habitats na sua envolvente e o respectivo valor de significância.

H g.l. p-value Total 11,7533 2 0,0030 Mus spretus 1,6206 2 0,4447 Apodemus sylvaticus 7,7959 2 0,0203 Crocidura russula 3,7926 2 0,1501

Figura 5 – Caixas de bigodes para a abundância relativa geral (a), de Mus spretus (b), de Apodemus sylvaticus (c) e de Crocidura russula (d), nas parcelas com diferente diversidade de habitats na envolvente.

Os valores de riqueza específica (H=0,1167; p=0,9433) e do índice de

diversidade (H=1,1221; p=0,5706) não mostraram variação aparente em função da

diversidade de habitats na área circundante.

Após a correcção do limiar de significância pelo teste de Bonferroni

(αajustado=0,003125), verificou-se uma correlação negativa significativa entre a

abundância total de pequenos mamíferos e os pivots lavrados (p=0,0031) e uma

correlação positiva entre a mesma e o eucaliptal adjacente aos locais de amostragem

(p<0,0001) (Tabela 7). A abundância de Mus spretus mostrou-se positivamente

correlacionada com a vegetação cortada no pivot (p=0,0018), enquanto que a

abundância de Apodemus sylvaticus apresenta correlações positivas significativas

com a presença de olival (p=0,0002) e pinhal (p<0,0001) adjacente ao local de

Page 31: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

22

amostragem (Tabela 7). A abundância de Crocidura russula apresenta uma correlação

positiva significativa com a presença de eucaliptal (p<0,0001) contíguo à área de

amostragem (Tabela 7).

Tabela 7 - Coeficientes de correlação de Spearman (rS) entre a abundância relativa geral e de cada espécie e os diferentes usos do solo das áreas adjacentes ao local de amostragem (* p<0,003125).

Total (rS)

M. spretus (rS)

A. sylvaticus (rS)

C. russula (rS)

Piv

ot

Milho -0.1261 -0.0487 -0.0725 -0.0500 Luzerna -0.0051 -0.0360 0.1101 -0.0630 Luzerna/Vacas -0.0974 -0.1229 0.1215 -0.1312 Linho -0.1247 0.0020 -0.1183 -0.0658 Sorgo -0.1960 -0.2280 -0.2055 0.1669 Cenoura -0.1600 -0.0351 -0.1254 -0.1258 Lavrado -0.2703* -0.1904 -0.0939 -0.1440 Veg. cortada 0.1133 0.2851* -0.2573 -0.0067

Out

ro

Olival 0.0635 -0.0867 0.3375* -0.1212 Montado -0.1149 -0.1332 -0.0166 -0.1671 Montado/Vacas 0.0232 0.0948 -0.1183 -0.0658 Pinhal 0.0461 -0.1379 0.3705* -0.0146 Eucaliptal 0.3665 0.1599 0.1339 0.3616* Veg. natural 0.1121 0.0832 -0.0943 0.1693 Depósito cortiça -0.1537 0.0416 -0.1357 -0.1524 Estrada Nacional 0.1181 0.1916 -0.1668 0.2381

Foi também testada a influência que o número de campos sob pivot

adjacentes à área de amostragem poderia ter na abundância dos pequenos

mamíferos. A abundância relativa total apresentou diferenças significativas nas áreas

rodeadas por um número diferente de campos sob pivots (Tabela 8) e o teste à

posteriori revelou que as zonas rodeadas por um pivot têm abundâncias

significativamente maiores que as rodeadas por três (teste de Dunn, p=0,0030) (Figura

6). A abundância de Apodemus sylvaticus mostrou uma tendência semelhante (Tabela

8), sendo que as áreas rodeadas por três pivots revelaram valores de abundância

significativamente menores das áreas rodeadas apenas por um (teste de Dunn,

p=0,0178) (Figura 6).

Tabela 8 - Resultados do teste de Kruskal-Wallis, comparando a abundância relativa geral e de cada espécie nas áreas com diferente número de campos sob pivot na sua envolvente e o respectivo valor de significância.

H g.l. p-value Total 13,7171 2 0,0011 Mus spretus 1,7909 2 0,4084 Apodemus sylvaticus 8,0210 2 0,0181 Crocidura russula 2,9032 2 0,2342

Page 32: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

23

Figura 6 – Caixas de bigodes para a abundância relativa geral (a), de Mus spretus (b), de Apodemus sylvaticus (c) e de Crocidura russula (d), nas parcelas com diferente número de pivots na envolvente.

3.3. EFEITO DA COMPOSIÇÃO E ESTRUTURA DA VEGETAÇÃO

Nas parcelas de amostragem, foram identificadas 20 famílias vegetais

presentes ao nível do estrato herbáceo e arbustivo (Tabela 9). As famílias Asteraceae,

Fabaceae, Geraniaceae e Poaceae revelaram-se como as mais comuns, sendo que

Asteraceae e Poaceae são predominantes na maioria dos locais de amostragem. Por

outro lado, as famílias Asparagaceae, Caryophillaceae, Cistaceae, Fagaceae,

Linaceae, Malvaceae, Myrsinaceae, Oxalidaceae, Pinaceae, Scrophulariaceae e

Valenariaceae mostraram-se mais raras, surgindo em poucos locais e com reduzidas

percentagens de cobertura (Tabela 9).

a) b)

c) d)

Page 33: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

24

Tabela 9 – Percentagem de cobertura das diferentes famílias identificadas ao nível herbáceo e arbustivo, em cada local de amostragem.

Considerando apenas as abundâncias dos pequenos mamíferos em estudo

no mês de Abril, quando foi feita a amostragem da diversidade vegetal, verifica-se que

não foi revelada nenhuma correlação significativa entre a abundância geral de

pequenos mamíferos e a cobertura das famílias de plantas amostradas (Tabela 10).

Podemos, no entanto, verificar uma correlação negativa significativa entre a

abundância de Apodemus sylvaticus e a percentagem de cobertura de Poaceae

(p=0,0007) (Tabela 10), após a correcção do patamar de significância pelo teste de

Bonferroni (αajustado=0,0025). Para além disso, apesar de não mostrar uma correlação

significativa, Apodemus sylvaticus revela também uma relação aparente (R≥0,4000)

com a cobertura de Asteraceae e de Brassicaceae (Figura 7). As outras duas espécies

não revelaram nenhuma correlação significativa com a percentagem de cobertura das

diferentes famílias de plantas, porém foi detectada uma relação mais forte (R≥0,4000)

entre a abundância de Mus spretus e a percentagem de cobertura de Caryophillaceae,

Fabaceae e Malvaceae (Figura 8) e entre a abundância de Crocidura russula e as

famílias Fagaceae, Orchidaceae, Pinaceae, Scrophulariaceae e Valerianaceae (Figura

9).

F1

(%)

F2

(%)

F3

(%)

F4

(%)

F5

(%)

F6

(%)

F7

(%)

F8

(%)

F9

(%)

F10

(%)

F11

(%)

F12

(%)

Asparagaceae 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,8

Asteraceae 13,04 22,86 5,51 18,52 60,73 44,62 10,04 13,55 22,54 9,13 13,79 9,20

Boraginaceae 0,00 15,92 4,24 7,00 20,00 37,45 1,93 15,94 10,25 3,80 2,68 2,00

Brassicaceae 0,00 18,37 34,32 0,82 0,00 16,33 0,00 23,11 5,74 11,79 0,00 0,00

Caryophyllaceae 0,00 1,22 0,00 0,00 0,36 1,59 0,00 0,00 0,82 0,00 0,00 0,00

Cistaceae 0,00 0,00 0,00 0,00 13,82 0,40 0,00 0,00 0,00 0,76 0,00 0,00

Fabaceae 0,87 23,27 5,51 10,70 16,73 17,53 8,49 13,94 10,66 5,32 15,33 8,80

Fagaceae 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,41 0,00 0,00 0,00

Geraniaceae 13,04 1,63 2,12 0,82 1,82 8,76 25,48 5,58 20,49 3,42 4,60 2,00

Linaceae 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 3,28 0,00 0,00 1,6

Malvaceae 0,00 1,63 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00

Myrsinaceae 0,00 0,00 0,00 0,00 0,36 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00

Orchidaceae 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,38 0,00 0,00

Oxalidaceae 0,00 0,00 1,27 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00

Pinaceae 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,82 0,00 0,00 0,00

Plantaginaceae 0,00 4,49 0,00 0,00 0,00 0,00 1,16 3,98 5,74 0,00 36,40 2,80

Poaceae 10,43 78,37 94,07 27,16 34,91 45,02 32,05 67,33 62,70 80,61 26,82 89,20

Polygonaceae 0,00 3,27 0,42 4,53 5,09 4,38 0,00 19,12 10,25 1,14 1,15 1,20

Scrophulariaceae 0,00 0,00 0,00 0,41 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00

Valerianaceae 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 1,9 0,00 0,00

Page 34: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

25

Tabela 10 - Coeficientes de correlação de Spearman (rS) entre a abundância relativa geral e de cada espécie (no mês de Abril) e a percentagem de cobertura das famílias de plantas presentes no estrato herbáceo e arbustivo (* p<0,0025).

Total (rS)

M. spretus (rS)

A. sylvaticus (rS)

C. russula (rS)

Asparagaceae -0.3062 0.2598 -0.3170 -0.1720

Asteraceae 0.5709 0.2247 0.5148 0.0367

Boraginaceae 0.1401 0.1415 0.0363 0.0551

Brassicaceae -0.1852 0.0561 -0.4662 0.0761

Caryophyllaceae 0.5960 0.5000 0.2157 0.0273

Cistaceae 0.0920 0.0164 0.1808 0.0361

Fabaceae 0.1436 0.4077 0.1015 -0.2111

Fagaceae 0.4812 -0.2079 0.0453 0.6305

Geraniaceae 0.2837 0.0707 0.2103 -0.0367

Linaceae 0.1777 0.0096 -0.1784 0.3881

Malvaceae 0.1312 0.4677 -0.3170 -0.1720

Myrsinaceae -0.0437 -0.2079 0.2264 -0.1720

Orchidaceae -0.1312 -0.2079 -0.3170 0.4013

Oxalidaceae -0.4375 -0.2079 -0.3170 -0.1720

Pinaceae 0.4812 -0.2079 0.0453 0.6305

Plantaginaceae -0.0879 0.0866 -0.3328 -0.0147

Poaceae -0.4834 0.1581 -0.8339* 0.0000

Polygonaceae 0.1123 -0.1271 0.0073 0.3126

Scrophulariaceae 0.2187 -0.2079 0.3170 0.5159

Valerianaceae -0.1312 -0.2079 -0.317 0.4013

Figura 7 - Variação da abundância de Apodemus sylvaticus em cada local de amostragem e da cobertura das famílias de plantas mais relacionadas com essa abundância.

0,000

20,000

40,000

60,000

80,000

100,000

120,000

140,000

0,00

10,00

20,00

30,00

40,00

50,00

60,00

70,00

80,00

90,00

100,00

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12

Abundância(capturas/1000

noites-armadilha)

Cobertura(%)

Asteraceae

Brassicaceae

Poaceae

A. sylvaticus

Page 35: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

26

Figura 8 - Variação da abundância de Mus spretus em cada local de amostragem e da cobertura das famílias de plantas mais relacionadas com essa abundância.

Figura 9 - Variação da abundância de Crocidura russula em cada local de amostragem e da cobertura das famílias de plantas mais relacionadas com essa abundância.

Assumindo que a composição vegetal se manteve aproximadamente

constante durante todo o período de amostragem, nota-se apenas uma correlação

positiva significativa entre a abundância média de Mus spretus e a cobertura de

Asteraceae (p=0,0016) (Tabela 11). Esta espécie pode também estar positivamente

relacionada com a cobertura de Caryophyllaceae, Fabaceae, Myrsinaceae,

Oxalidaceae e negativamente com Poaceae (Figura 10) (Tabela 11). A abundância

média de Apodemus sylvaticus está mais relacionada com a cobertura de

Brassicaceae, Malvaceae, Myrsinaceae e Poaceae (Figura 11), não sendo significativa

nenhuma destas correlações (Tabela 11). A abundância média de Crocidura russula

parece estar positivamente relacionada com a cobertura das espécies vegetais mais

raras, como Boraginaceae, Cistaceae, Fagaceae, Orchidaceae, Pinaceae,

Polygonaceae e Valerianaceae (Figura 12), não se verificando nenhuma relação

0

5

10

15

20

25

30

35

40

45

0,00

5,00

10,00

15,00

20,00

25,00

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12

Abundância(capturas/1000

noites-armadilha)

Cobertura (%)

Caryophyllaceae

Fabaceae

Malvaceae

M. spretus

0

10

20

30

40

50

60

70

0,00

0,50

1,00

1,50

2,00

2,50

3,00

3,50

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12

Abundância(capturas/1000

noites-armadilha)

Cobertura(%)

Fagaceae

Linaceae

Orchidaceae

Pinaceae

Scrophulariaceae

Valerianaceae

C. russula

Page 36: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

27

significativa (Tabela 11). Novamente, a abundância da comunidade não se apresentou

correlacionada significativamente com nenhum grupo vegetal (Tabela 11).

Tabela 11 - Coeficientes de correlação de Spearman (rS) entre a abundância relativa média geral e de cada espécie e a percentagem de cobertura das famílias de plantas presentes no estrato herbáceo e arbustivo (* p<0,0025).

Total (rS)

M. spretus (rS)

A. sylvaticus (rS)

C. russula (rS)

Asparagaceae -0,4804 -0,3930 -0,3062 0,0445

Asteraceae 0,4406 0,8042* 0,3853 0,1566

Boraginaceae 0,3287 0,3566 0,0385 0,4200

Brassicaceae 0,1378 -0,2465 -0,4758 0,1993

Caryophyllaceae 0,5783 0,5201 0,1146 0,1927

Cistaceae 0,4957 0,2845 0,3862 0,4392

Fabaceae 0,1608 0,5734 0,0560 0,0783

Fagaceae 0,3930 -0,0437 0,0437 0,4001

Geraniaceae 0,1678 -0,1958 0,0490 0,0676

Linaceae -0,0108 -0,3010 -0,1723 0,3502

Malvaceae 0,2184 0,3930 -0,4375 -0,3556

Myrsinaceae 0,0437 0,4804 0,4812 -0,0445

Orchidaceae 0,4804 -0,2184 -0,1312 0,4890

Oxalidaceae -0,3930 -0,4804 -0,0437 -0,3556

Pinaceae 0,3930 -0,0437 0,0437 0,4001

Plantaginaceae -0,0373 0,0448 -0,3178 -0,0228

Poaceae -0,1399 -0,5804 -0,6410 0,1993

Polygonaceae 0,1856 0,2697 -0,0386 0,5812

Scrophulariaceae -0,1310 0,0437 0,1312 0,1334

Valerianaceae 0,4804 -0,2184 -0,1312 0,4890

Figura 10 - Variação da abundância média de Mus spretus em cada local de amostragem e da cobertura das famílias de plantas mais relacionadas com essa abundância.

0

10

20

30

40

50

60

0

10

20

30

40

50

60

70

80

90

100

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12

Cobertura(%)

Abundância(capturas/1000

noites-armadilha)

AsteraceaeCaryophyllaceaeFabaceaeMyrsinaceaeOxalidaceaePoaceaeAbund Média

Page 37: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

28

Figura 11 - Variação da abundância média de Apodemus sylvaticus em cada local de amostragem e da cobertura das famílias de plantas mais relacionadas com essa abundância.

Figura 12 - Variação da abundância média de Crocidura russula em cada local de amostragem e da cobertura das famílias de plantas mais relacionadas com essa abundância.

Das espécies mais abundantes, apenas Crocidura russula apresenta uma

correlação positiva significativa com a diversidade vegetal (Tabela 12), surgindo mais

abundantemente nos locais com maior diversidade.

Tabela 12 - Coeficientes de correlação de Spearman (rS) entre a diversidade vegetal (números de famílias amostradas) e a abundância relativa geral e de cada espécie, e o respectivo nível de significância (p-level).

rS p-level

Total 0,5436 0,0677 M. spretus 0,0462 0,8867

A. sylvaticus -0,2438 0,4451

C. russula 0,5877 0,0445

0,000

10,000

20,000

30,000

40,000

50,000

60,000

0,00

10,00

20,00

30,00

40,00

50,00

60,00

70,00

80,00

90,00

100,00

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12

Abundância (capturas/1000

noites-armadilha)

Cobertura(%)

Brassicaceae

Malvaceae

Myrsinaceae

Poaceae

A. sylvaticus

0

5

10

15

20

25

30

35

0

5

10

15

20

25

30

35

40

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12

Cobertura(%)

Abundância(capturas/1000

noites-armadilha)

Boraginaceae

Cistaceae

Fagaceae

Orchidaceae

Pinaceae

Polygonaceae

Valerianaceae

C. russula

Page 38: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

29

Em relação à altura da vegetação, para um valor de α de 0,0029 corrigido

pelo teste de Bonferroni, verifica-se uma correlação positiva significativa entre a

abundância de Crocidura russula e muitos dos valores de percentagem de vegetação

das classes correspondentes a uma altura mais elevada (Tabela 13). A abundância

relativa geral revela uma correlação positiva significativa com a percentagem de

vegetação entre os 90 e os 100 cm (p=0,0004) e entre 100 e 110 cm (p=0,0021)

(Tabela 13).

Tabela 13 - Coeficientes de correlação de Spearman (rS) entre a abundância de cada espécie e a percentagem das diferentes classes de altura da vegetação (* p<0,0029).

Total (rS)

M. spretus (rS)

A. sylvaticus (rS)

C. russula (rS)

[0;5[ -0,0506 0,0990 0,2993 -0,2800

[5;10[ -0,1494 -0,2465 -0,2623 -0,0070

[10;20[ -0,1124 -0,2553 -0,4240 0,1297

[20;30[ 0,2045 0,1056 -0,1924 0,4594*

[30;40[ 0,3229 0,1432 -0,0568 0,5806*

[40;50[ 0,3540 0,1988 -0,0059 0,5523*

[50;60[ 0,3573 0,1150 -0,1220 0,3709

[60;70[ 0,4679 0,2028 0,0567 0,5282*

[70;80[ 0,4229 0,0899 -0,0244 0,3822

[80;90[ 0,4008 0,0906 -0,1044 0,3129

[90;100[ 0,5599* 0,1070 0,0431 0,5379*

[100;110[ 0,4961* 0,0400 0,1808 0,4783*

[110;120[ 0,0732 -0,0409 0,0422 0,3414

[120;130[ 0,1987 0,0448 0,1789 0,2477

[130;140[ 0,2525 0,0212 0,1195 0,4707*

[140;150[ 0,2685 0,1063 0,1605 -0,1308

[150;160[ 0,2412 0,0440 0,1430 0,2136

A abundância total e as abundâncias de Mus spretus e de Apodemus

sylvaticus não estão relacionadas com a percentagem de cobertura do estrato arbóreo

no geral (Tabela 15). Contudo, foi detectada uma correlação negativa significativa

entre a abundância de Apodemus sylvaticus e a presença de sobreiros (Quercus suber

L.) (p=0,005) e uma correlação positiva significativa com a presença de oliveiras (Olea

europeae L.) (p=0,025) (Tabela 14). A abundância de Crocidura russula está

significativamente correlacionada com a percentagem de cobertura do estrato arbóreo

(p=0,008), parecendo ser mais influenciada pela presença de sobreiros, com a qual

apresenta uma correlação negativa significativa (p=0,021) (Tabela 14).

Page 39: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

30

Tabela 14 - Coeficientes de correlação de Spearman (rS) entre a abundância total e de cada espécie e a percentagem de cobertura do estrato arbóreo e a presença de sobreiros ou oliveiras (* p<0,05; ** p<0,01).

Total (rS)

M. spretus (rS)

A. sylvaticus (rS)

C. russula (rS)

Cobertura -0,1849 0,0735 -0,1174 -0,4349**

Sobreiro -0,2408 -0,1273 -0,4584** -0,3829*

Oliveira 0,0072 0,2164 0,3724* -0,0922

A abundância de Apodemus sylvaticus mostra uma correlação significativa com

a percentagem de solo nu existente em cada local de amostragem (p=0,003) (Tabela

15), enquanto que a abundância relativa total e das outras espécies não revela

nenhuma relação significativa com as diferentes coberturas do solo.

Tabela 15 - Coeficientes de correlação de Spearman (rS) entre a abundância de cada espécie e a percentagem dos diferentes tipos de cobertura do solo (* p<0,05; ** p<0,01).

Total (rS)

M. spretus (rS)

A. sylvaticus (rS)

C. russula (rS)

Vegetação 0,1487 0,0545 -0,2296 0,2225

Solo nu -0,1214 0,2250 0,4858** -0,2938

Manta morta/Folhada -0,3128 -0,3186 -0,0911 -0,0631

Musgo/Líquenes 0,0786 -0,1378 0,0419 -0,1926

3.4. EFEITO DO SOLO

A abundância relativa da comunidade e de cada uma das espécies mais

capturadas não apresentou correlações significativas com as variáveis relativas ao

solo (Tabela 16).

Tabela 16 - Coeficientes de correlação de Spearman entre a abundância total e de cada espécie e os paramêtros edáficos em estudo (os valores omissos correspondem às variáveis redundantes; * p<0,05; ** p<0,01).

Revol.

(rS) Areia

(rS) Limo (rS)

Argila (rS)

Cap Campo (rS)

Mat Org (rS)

Total 0,3147 - 0,6000 -0,1879 - 0,0667 Mus spretus 0,0280 -0,4303 - 0,2485 0,2727 - Apodemus sylvaticus 0,4437 - 0,3374 -0,0552 -0,5092 - Crocidura russula 0,4378 - 0,0813 0,2939 0,3252 -

Page 40: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

31

3.5. EFEITO DO PASTOREIO

A abundância de Crocidura russula mostra diferenças significativas em áreas

com e sem pastoreio (Tabela 17; Figura 13). No entanto, a abundância relativa de

pequenos mamíferos, assim como a abundância de Mus spretus e Apodemus

sylvaticus, não revela diferenças significativas em zonas com presença ou ausência de

pastoreio (Tabela 17; Figura 13).

Tabela 17 – Resultado do teste de Mann-Whitney, comparando a abundância relativa geral e de cada espécie em locais com e sem pastoreio.

U zajustado p-level

Total 1424,0 1,7061 0,0880 Mus spretus 1640,5 0,5668 0,5709 Apodemus sylvaticus 1688,0 0,3015 0,7630 Crocidura russula 1436,5 2,3233 0,0202

Figura 13 - Caixas de bigodes para a abundância relativa geral (a), de Mus spretus (b), de Apodemus sylvaticus (c) e de Crocidura russula (d), nas parcelas com presença ou ausência de pastoreio.

a) b)

c) d)

Page 41: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

32

Em conformidade com os resultados anteriores, a abundância geral de

pequenos mamíferos parece ser afectada pelo pastoreio, uma vez que apresenta uma

correlação negativa significativa com a intensidade de pastoreio a curto prazo

(p=0,0065) e uma correlação positiva significativa com o tempo desde a saída do gado

da zona de amostragem (p= 0,0278) (Tabela 18). As abundâncias de Mus spretus e de

Apodemus sylvaticus não mostram nenhuma correlação significativa com as variáveis

relativas ao pastoreio, a pressão de pastoreio acumulada a curto prazo (p=0,0992 e

p=0,1316, respectivamente) e a longo prazo (p=0,6426 e p=0,3508, respectivamente)

(Tabela 18). A abundância de Crocidura russula e a pressão acumulada a curto prazo

não estão significativamente correlacionadas (p=0,2609), mas verifica-se uma

correlação significativa entre a abundância desta espécie e o tempo de permanência

do gado fora do local de amostragem (p=0,0006) (Tabela 18).

Tabela 18 - Coeficientes de correlação de Spearman (rS) entre a abundância relativa geral e de cada espécie e as variáveis relativas ao pastoreio (os valores omissos correspondem às variáveis redundantes; * p<0,05; ** p<0,01).

pressão

tempo (rS)

curto prazo

(rS) longo prazo

(rS) Total -0,2493** - 0,2026* Mus spretus -0,1525 0,0432 - Apodemus sylvaticus -0,1319 -0,0867 - Crocidura russula -0,1043 - 0,3123**

3.6. EFEITOS DOS PARÂMETROS CLIMÁTICOS

A abundância de pequenos mamíferos mostra-se negativamente

correlacionada com a temperatura média (p=0,0003) e positivamente com a humidade

máxima (p=0,0019). A abundância de Mus spretus está significativamente

correlacionada com a temperatura média (p<0,0001) e a radiação solar (p=0,0028), e

a abundância de Crocidura russula apresenta uma correlação significativa apenas com

a radiação solar (p=0,0026) (Tabela 19). A abundância de Apodemus sylvaticus não

parece estar relacionada com nenhum parâmetro climático (Tabela 19).

Tabela 19 - Coeficientes de correlação de Spearman (rS) entre a abundância de cada espécie e os parâmetros climáticos em estudo (os valores omissos correspondem às variáveis redundantes; * p<0,05; ** p<0,01).

Tmínima

(rS) Tmédia

(rS) Hmáxima

(rS) Rad. Solar

(rS) Total - -0,3244** 0,2824** -0,1219 Mus spretus - -0,3530** 0,2945 -0,2729** Apodemus sylvaticus -0,0625 - 0,0579 0,0827 Crocidura russula - 0,1062 -0,0580 0,2746**

Page 42: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

33

4. DISCUSSÃO

Os campos agrícolas são habitats instáveis para os pequenos mamíferos.

Podem funcionar como uma fonte adicional de recursos alimentares (Michel et al.,

2007), mas não providenciam uma protecção eficaz contra os predadores,

especialmente depois das colheitas (Fitzgibbon, 1997). As áreas marginais aos

campos agrícolas são, por isso, uma estrutura de elevada relevância para a

conservação dos pequenos mamíferos nas zonas rurais, uma vez que sofrem menos

perturbações e oferecem alimento e refúgio de uma forma mais constante ao longo do

ano (Butet et al., 2006a).

Apesar de os micromamíferos serem especialmente afectados pelas

características a pequena escala (microhabitat e mesohabitat), as características a

uma maior escala também se revelam importantes para este grupo animal (Butet et al.,

2006b). A gestão dos habitats marginais, assim como dos espaços contíguos aos

habitats marginais, incluindo os campos agrícolas, vai assim influenciar as

características do sistema ecológico em que os pequenos mamíferos se encontram

(Stoate et al., 2009).

4.1. COMUNIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS

A riqueza e a diversidade específica apresentaram valores mais elevados nas

zonas de vegetação herbácea e arbustiva espontânea, como seria expectável, visto

que estas são áreas que não sofrem nenhuma prática de gestão e são, assim, pouco

intervencionadas. Por outro lado, nas zonas de montado a riqueza e diversidade

específica revelaram-se bastante reduzidas, o que contrasta com os resultados de

estudos anteriores (Santos-Reis & Correia, 1999). Contudo, as zonas de montado

estudadas sofrem um elevado grau de perturbação, principalmente devido ao intenso

pastoreio que se verifica nalgumas alturas do ano, o que, para além de causar impacto

directo sobre os pequenos mamíferos, afecta de forma significativa as comunidades

de vegetação herbácea e arbustiva e influencia as características edáficas desses

locais (Schmidt et al., 2005; Torre et al., 2007), com consequências indirectas nas

comunidades de herbívoros e restante fauna associada.

Tal como demonstrado pelos resultados, a abundância de pequenos

mamíferos é influenciada negativamente pela intensidade de pastoreio a curto prazo e

positivamente pelo tempo desde a saída do gado da área considerada. Isto revela que

a comunidade responde rapidamente à presença de pastoreio, verificando-se uma

Page 43: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

34

descida drástica da abundância nos locais recentemente expostos à influência do

gado, e que vai recuperando gradualmente, desde que o gado não regresse à zona

em questão. No entanto, não houve diferenças da abundância geral de pequenos

mamíferos entre zonas com presença ou ausência de pastoreio, o que se pode dever

ao facto de apenas algumas espécies serem particularmente mais sensíveis a esta

perturbação, como descrito por Valone & Sauter (2005).

A heterogeneidade da paisagem, ao aumentar o número de biótopos

disponíveis, aumenta a probabilidade da ocorrência de um maior número de espécies

(Tews et al., 2004; Butet et al., 2006b). Todavia, verifica-se que os resultados obtidos

não corroboram o descrito por outros autores, uma vez que a riqueza e a diversidade

de pequenos mamíferos em estudo não parecem ser influenciadas pela diversidade de

habitats adjacentes. Por outro lado, a abundância geral de pequenos mamíferos

revelou-se mais reduzida nas zonas rodeadas por um tipo de habitat, quando

comparada com zonas rodeadas por uma maior diversidade de habitats. As áreas

amostradas que são rodeadas apenas por um tipo de habitat, neste caso apenas por

campos agrícolas, vão sofrer mais os efeitos de isolamento, visto que estão

circundadas por terreno inóspito que pode dificultar a movimentação dos indivíduos

entre manchas de habitat mais favorável.

A abundância geral revelou-se menor aquando da altura em que os terrenos

eram lavrados, provavelmente devido à mortalidade directa causada pelas máquinas

agrícolas sobre os indivíduos que se haviam deslocado para o campo de cultivo (Tew

& Macdonald, 1993 in Jacob, 2003).

Por outro lado, a presença de eucaliptais contíguos ao local de amostragem

parece causar um aumento da abundância de pequenos mamíferos nas áreas

marginais, o que se pode dever ao efeito negativo que este pode exercer sobre a

comunidade de mamíferos, como já foi reportado para a área de estudo, para o caso

do coelho-bravo (Gonçalves et al., 2008), fazendo com que se desloquem mais para

as áreas marginais. Como previsto, as áreas rodeadas por um maior número de

campos agrícolas sob pivot de rega apresentam menores valores de abundância,

devido à maior perturbação destas áreas e maior grau de isolamento.

Verificou-se também que a abundância geral de pequenos mamíferos é mais

elevada em zonas com bastante vegetação alta e de porte arbustivo (particularmente

entre os 90 e os 100 cm de altura), que confere maior protecção contra predadores e

maior disponibilidade de alimento (Eccard et al., 2000; Schmidt et al., 2005), o que

confirma o registado em estudos anteriores para a mesma área de estudo (Simões,

2009).

Page 44: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

35

A abundância geral de micromamíferos não parece ser muito influenciada

pelas características do solo, o que poderá ser explicado pelo facto das espécies

capturadas não terem um comportamento fossorial (à excepção de Microtus

lusitanicus), utilizando geralmente apenas pequenas tocas superficiais e sem formar

galerias (Macdonald & Barret, 1993; Mathias, 1999).

No que concerne aos parâmetros climáticos, verificou-se uma relação positiva

entre a abundância da comunidade de pequenos mamíferos e temperaturas reduzidas

e humidade elevada. No entanto, isto pode dever-se tanto à flutuação anual natural

das espécies, como às condições climáticas particulares que se verificaram este ano

(elevada precipitação e temperaturas reduzidas durante a maior parte do período de

amostragem).

4.2. FACTORES DETERMINANTES DA ABUNDÂNCIA DAS ESPÉCIES

4.2.1. Rato-das-hortas (Mus spretus)

Mus spretus tem uma distribuição bastante restrita (Península Ibérica, Sul de

França e Norte de África) (Macdonald & Barret, 1993) e existe reduzida informação

disponível sobre esta espécie. Mus spretus revelou-se muito abundante e com uma

distribuição generalizada por toda a área de estudo, sendo a única espécie capturada

em todos os locais de amostragem. A sua elevada abundância pode explicar a

dificuldade de determinar quais os factores que para ela mais contribuem, pois

apresentou-se relativamente abundante em áreas com características bastante

distintas, revelando o seu carácter generalista (Pita et al., 2003).

A abundância de Mus spretus nas áreas marginais mostrou uma relação

positiva com o corte da vegetação ou colheita realizada no pivot. Esta acção vai

diminuir rapidamente a cobertura vegetal presente no campo agrícola, causando uma

maior exposição à predação e fazendo com que os indivíduos se refugiem nas áreas

marginais (Fitzgibbon, 1997). Este procedimento provavelmente não causa uma

mortalidade tão elevada como no caso da lavra, visto que o corte da vegetação é

efectuado durante o período de menor actividade de Mus spretus (e das outras

espécies em estudo) e afecta só a parte superficial do terreno, não provocando a

destruição dos refúgios subterrâneos.

Segundo Moreira & Naumann-Ettiene (1987, in Pita et al., 2003), Mus spretus

prefere habitats relativamente abertos, com um estrato herbáceo denso e diverso e

com uma cobertura de gramíneas (Poaceae) relativamente elevada. Khidas et al.

Page 45: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

36

(2002) apresenta resultados semelhantes, em que Mus spretus aparece associado a

habitats com menor cobertura de árvores e arbustos altos. No presente estudo não foi

possível determinar uma relação entre a cobertura de árvores, outra vegetação com

altura mais elevada ou Poaceae como sugerido por Moreira & Naumann-Ettiene e

Khidas et al., e apenas foi revelada uma relação positiva entre a abundância média

anual desta espécie e a percentagem de cobertura de Asteraceae, que pode ser

preferida devido à sua estrutura e disposição das folhas que oferece uma elevada

cobertura ao nível do solo e confere protecção a uma espécie de pequenas dimensões

e hábitos não fossoriais como Mus spretus (Temere & Slater, 2007). Seria vantajoso,

contudo, confirmar estes resultados com mais amostragens.

A abundância de Mus spretus parece relacionada com temperaturas médias

mais reduzidas e menor radiação solar, contudo isto pode dever-se ao maior número

de capturas durante a época mais fria e chuvosa, em que os indivíduos são obrigados

a deslocar-se devido ao alagamento dos solos, pois o pico da abundância desta

espécie costuma ocorrer durante a Primavera e o Verão (e.g. Pita et al., 2003).

4.2.2. Rato-do-campo (Apodemus sylvaticus)

Apodemus sylvaticus tem uma distribuição generalizada por toda a Europa e

reside numa grande diversidade de habitats (Macdonald & Barret, 1993). De acordo

com a maior parte dos estudos, esta espécie tem um carácter generalista, não só no

que diz respeito aos requisitos de habitat, como também nos seus hábitos alimentares.

A sua dieta pode ser muito diversificada e não está completamente dependente de

herbáceas, pois consome grande quantidade de sementes, frutos, insectos e outros

invertebrados (Butet et al., 2006a; Gelling et al., 2007), conseguindo usar eficazmente

o interior dos campos agrícolas para se alimentar (Temere & Slater, 2007).

Apodemus sylvaticus mostrou-se menos abundante nas áreas rodeadas por

uma menor diversidade de habitats, o que vai de encontro aos resultados exibidos nos

estudos referidos anteriormente. Numa paisagem mais heterogénea, esta espécie

pode ocupar uma maior quantidade de nichos ecológicos, recorrendo a diversas fontes

alimentares. De facto, Apodemus sylvaticus mostrou uma relação positiva com as

zonas de pinhal e olival adjacentes, que funcionam como uma fonte de alimento

adicional. As áreas marginais rodeadas apenas por campos agrícolas oferecem uma

menor variedade de recursos, o que pode explicar a menor abundância desta espécie

nestes locais.

Apodemus sylvaticus parece ter uma relação positiva com as zonas de

pastagem e uma relação negativa com as zonas de montado, mas, durante o período

Page 46: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

37

de amostragem, a maior parte das zonas consideradas como pastagem não teve

qualquer presença de gado, enquanto as zonas de montado foram bastante afectadas

por este, principalmente no que toca à cobertura de vegetação herbácea e arbustiva.

O pastoreio repetido nos mesmos locais não permite o avanço sucessional da

comunidade vegetal para um estado mais estável e com uma cobertura arbustiva mais

desenvolvida que favorece a presença de Apodemus sylvaticus (Khidas et al., 2002;

Pita et al., 2003). No entanto, a abundância desta espécie não mostra diferenças

significativas em zonas com presença e ausência de gado, nem correlações com a

intensidade de pastoreio a curto ou a longo prazo. Estes resultados corroboram

parcialmente o verificado anteriormente para a área de estudo, em que Apodemus

sylvaticus não é muito afectado pelo pastoreio, revelando apenas diferenças em zonas

com ou sem pastoreio (Simões, 2009).

Apodemus sylvaticus está ligado a ambientes com uma maior diversidade de

estratos vegetais, preferindo uma cobertura arbustiva e herbácea elevada (Fitzgibbon,

1997; Khidas et al., 2002; Pita et al., 2003; Simões, 2009), porém não foi possível

relacionar significativamente a abundância desta espécie com a percentagem de

vegetação herbácea ou arbustiva alta. No entanto, revelou uma relação negativa com

a presença de sobreiros, que estão presentes nas zonas com presença de pastoreio

recente, o que aponta para uma deficiência de cobertura ao nível dos estratos

herbáceo e arbustivo. Foi registada também uma correlação positiva da abundância de

Apodemus sylvaticus com a presença de oliveiras, o que já era esperado tendo em

conta os resultados anteriores, que indicam a importância dos olivais como fonte de

alimento para esta espécie.

Apodemus sylvaticus mostrou-se bastante abundante nas zonas com maior

percentagem de solo nu, e que, por isso, têm menos vegetação. O local com maior

percentagem de solo nu é um dos locais com maior diversidade de habitats ao seu

redor e com habitats associados ao Apodemus sylvaticus (pinhal), o que pode explicar

a abundância elevada desta espécie nesta área.

Gelling et al. (2007) refere que Apodemus sylvaticus apresenta abundâncias

mais reduzidas em zonas de elevada cobertura de gramíneas (Poaceae), devido à

menor produtividade de sementes e aos maiores níveis de perturbação a que estas

áreas estão, geralmente, submetidas. De acordo, para o mês de Abril, esta espécie

mostrou uma relação negativa com a cobertura de Poaceae, que dominava em locais

que sofreram corte da vegetação para produção de feno nos meses de Abril e Maio.

Examinando os outros grupos vegetais, verifica-se também uma relação, embora não

significativa, entre Apodemus sylvaticus e a cobertura de Asteraceae (positiva), que se

pode dever à maior cobertura ao nível do solo que estas providenciam, e Brassicaceae

Page 47: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

38

(negativa), por aparecerem frequentemente associadas a Poaceae nos locais mais

perturbados. Considerando a abundância média desta espécie, notamos novamente a

relação negativa com Poaceae e Brassicaceae, e agora também com Malvaceae,

ligadas a ambientes intervencionados, e uma relação positiva com Myrsinaceae, que

foi registada apenas na zona de amostragem onde a abundância desta espécie atingiu

o seu máximo.

Estes resultados parecem indicar que Apodemus sylvaticus apresenta uma

menor dependência da disponibilidade de abrigos, preferindo locais com maior

disponibilidade de alimento. Isto pode estar relacionado com as maiores dimensões da

espécie e, consequentemente, com a maior capacidade de movimentação que possui,

que lhe permite explorar uma área mais extensa (Macdonald & Barret, 1993).

4.2.3. Musaranho-de-dentes-brancos (Crocidura russula)

Crocidura russula é das espécies de musaranho mais generalistas e mais

tolerantes à perturbação, podendo colonizar os campos agrícolas, principalmente

campos de milho (Millán de la Peña et al., 2003; Butet et al., 2006a; Michel et al.,

2007).

Porém, esta espécie revela-se sensível ao pastoreio, apresentando

abundâncias mais elevadas em zonas livres desta prática. Para além disso, o aumento

da sua abundância depende do tempo desde a saída do gado do local, o que pode

indicar uma recuperação lenta das populações de Crocidura russula após o fim do

pastoreio. Estes resultados são semelhantes aos apresentados por Schmidt et al.

(2009), em que uma outra espécie de musaranho mostrou ser influenciada pelo

pastoreio e sua intensidade, sendo mais abundante em zonas não expostas ao

impacto do pastoreio ou onde este ocorre com reduzida intensidade. Contudo, e ao

contrário do registado para esta espécie na área de estudo (Simões, 2009), a

abundância do Crocidura russula não se apresentou significativamente influenciada

pela pressão de pastoreio.

A influência do pastoreio sobre Crocidura russula pode estar relacionada com

a diminuição da densidade da vegetação, principalmente da vegetação arbustiva, da

qual este depende (Kutiel et al., 2000; Pita et al., 2003). Com efeito, a abundância

desta espécie apresentou correlações significativas com a percentagem de cobertura

da vegetação mais elevada, onde consegue mais disponibilidade de abrigo e alimento

(Eccard et al., 2000; Torre et al., 2007).

Por outro lado, Crocidura russula está associado a habitats com maior

percentagem de vegetação nos estratos mais baixos (arbustivo e herbáceo), onde

Page 48: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

39

existe uma maior diversidade de invertebrados, dos quais esta espécie depende (Pita

et al., 2003; Butet et al., 2006a). Esta relação não é muito óbvia no presente estudo,

porém esta espécie apresenta uma relação negativa com a cobertura do estrato

arbóreo, que pode influenciar a vegetação dos estratos inferiores. Adicionalmente,

nota-se uma relação negativa, em particular, com a presença de sobreiros nos locais

de amostragem, mas este resultado traduz uma influência indirecta da presença de

pastoreio recente nas zonas de montado.

Considerando a abundância de musaranho no mês de Abril e a abundância

média para o período de amostragem, verificamos que esta espécie parece estar

relacionada com as famílias de plantas mais raras e com porte arbustivo. Em

conformidade, a abundância desta espécie de musaranho está também correlacionada

com a diversidade vegetal. Nos locais com maior variedade de plantas conseguem

obter uma maior diversidade e abundância de insectos e a maior percentagem de

cobertura do estrato arbustivo facilita, não só uma protecção mais eficaz contra

predadores, como também melhores condições microclimáticas. Estes factores são

extremamente importantes no caso do musaranho devido aos seus elevados

requisitos energéticos (Mathias, 1999).

A abundância de Crocidura russula parece não ser influenciada pelo uso do

solo do local nem pela diversidade de habitats adjacentes. Contudo, verificou-se uma

relação positiva entre a abundância desta espécie e a presença de um eucaliptal na

zona adjacente à área marginal. Como já foi referido, a presença de eucaliptal parece

ter um efeito negativo sobre a comunidade de mamíferos (Gonçalves et al., 2008), e o

musaranho pode evitar esse habitat refugiando-se na área marginal.

Crocidura russula apresentou maiores valores de abundância no final da

Primavera e início do Verão, o que explica a relação aparente com a intensidade da

radiação solar. Este aumento de abundância pode ser justificado pelo aumento da

abundância de insectos que se seguiu à floração das plantas, que ocorreu mais tarde

devido às condições climáticas excepcionais registadas no ano de amostragem, em

que o período de chuvas e temperaturas reduzidas foi mais prolongado.

É também sugerido pelos resultados que as variáveis relativas ao próprio

habitat da área marginal têm mais influência sobre a abundância de Crocidura russula

do que as variáveis relativas a uma caracterização a maior escala, o que é suportado

pelo facto da dimensão da área vital desta espécie ser bastante mais reduzida do que

no caso dos roedores (Macdonald & Barret, 1993).

Page 49: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

40

4.3. LIMITAÇÕES DOS DADOS

O reduzido número de replicados, particularmente das variáveis ambientais,

não permitiu a obtenção de resultados muito robustos. No intuito de obter resultados

mais conclusivos, seria interessante repetir a amostragem, tanto dos pequenos

mamíferos, como de todas as variáveis referentes ao habitat e à paisagem, em mais

locais e também durante diferentes anos, de modo a registar o maior número possível

de condições ambientais. Deve ser assinalado que, devido a alguns constrangimentos,

determinadas variáveis foram medidas em apenas uma ocasião durante todo o

período de amostragem. Deste modo, seria possível reforçar os resultados e

esclarecer algumas relações entre a abundância dos pequenos mamíferos e as

variáveis ambientais, visto que a maior parte das correlações não se revelaram muito

elevadas.

Com este tipo de dados, e obtendo-se um número razoável de replicados

espaciais e temporais da abundância de micromamíferos e das variáveis ambientais,

seria uma mais valia realizar a modelação da abundância total e das espécies mais

relevantes através de modelos lineares generalizados mistos.

Seria também interessante realizar um estudo comparativo entre a

abundância dos pequenos mamíferos dentro e fora dos campos sob pivot de rega, de

modo a contribuir para a compreensão da variação anual da abundância deste grupo

nos campos agrícolas, assim como do processo source-sink que se verifica nas

populações de pequenos mamíferos nestas áreas.

4.4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os habitats marginais aos campos agrícolas são de elevada importância para

os pequenos mamíferos, no contexto de uma paisagem rural cada vez mais

perturbada. Estas áreas actuam como refúgio para a comunidade de pequenos

mamíferos face aos impactos advindos da exploração agrícola, sobretudo aquando da

colheita e lavra no interior dos campos. No entanto, na área de estudo, a Companhia

das Lezírias, os habitats marginais aos campos sob pivot de rega são muitas vezes

geridos de formas que prejudicam os pequenos mamíferos.

Embora não tenha sido possível afirmar de forma conclusiva, os resultados

apontam para uma influência negativa da acção do pastoreio sobre a comunidade de

pequenos mamíferos, como já tinha sido revelado em estudos anteriores. Apesar da

gestão do gado na Companhia das Lezírias incluir um regime de translocação

Page 50: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

41

frequente do gado para diferentes talhões, é possível que esta não esteja a ser feita

de modo compatível com a manutenção da biodiversidade nesses locais. Com efeito,

alguns dos pequenos mamíferos parecem ser especialmente sensíveis a esta

actividade, sendo praticamente excluídos das áreas de pastoreio e demorando a

retomar os efectivos após a saída do gado. Tal é devido à presença de gado que vai

influenciar fortemente a composição da comunidade vegetal, afectando, directa ou

indirectamente, as principais fontes de alimento e a disponibilidade de abrigos.

Tendo em conta que a abundância dos mamíferos carnívoros está fortemente

dependente da abundância de pequenos mamíferos, é expectável que a conservação

dos pequenos mamíferos nestas áreas se reflicta igualmente na comunidade geral de

mamíferos, principalmente pelo incremento da disponibilidade de presas. Toda a

comunidade de mamíferos seria favorecida por uma gestão adequada da exploração

de gado, que deverá passar essencialmente pela moderação da intensidade de

pastoreio. Tal permitiria a existência de um coberto arbustivo mais denso, que é

favorável não só para os pequenos mamíferos como para os seus predadores

(Mangas et al., 2008).

Por outro lado, a diversidade de usos do solo existente na Companhia das

Lezírias, resultante da gestão de múltiplas actividades, revela ser um factor positivo

para a comunidade de pequenos mamíferos e não só, incrementando o número e a

diversidade de nichos ecológicos que as diferentes espécies poderão ocupar e

favorecendo principalmente as espécies mais raras e de maior interesse para a

conservação.

Assim, para uma manutenção eficaz das populações de pequenos mamíferos

e de um ecossistema saudável, é necessária uma gestão consciente de todas as

áreas, incluindo os habitats marginais que são frequentemente ignorados. Uma gestão

sustentável trará benefícios a longo prazo, não só a um nível conservacionista, mas

também a um nível económico, pois possibilitará a exploração de uma maior

diversidade de recursos durante um período de tempo mais prolongado.

Page 51: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

42

5. BIBLIOGRAFIA

Agger P, Brandt J (1988) Dynamics of small biotopes in Danish agricultural landscapes,

Landscape Ecology 1(4): 227-240.

Alves, Rui (s. d.) Companhia das Lezírias - o campo às portas da cidade, Naturlink, página

visitada em Agosto de 2010, <http://naturlink.sapo.pt/article.aspx?menuid=10&cid=20260&bl=1>.

Askew PN, Searle JB, Moore NP (2007) Agri-environment schemes and foraging of barn owls

Tyto alba, Agriculture, Ecosystems and Environment 118: 109-114.

Barbour MG, Burk JH, Pitts WD (1987) Terrestrial Plant Ecology (2nd ed.), Benjamin/Cummings

Publishing Company, Inc., Menlo Park, California, USA.

Bates FS, Harris S (2009) Does hedgerow management on organic farms benefit small

mammal populations?, Agriculture, Ecosystems and Enviroment 129: 124-130.

Bazzaz FA (1975) Plant Species Diversity in Old-Field Successional Ecosystems in Southern

Illinois, Ecology 56(2): 485-488.

Beever EA, Brussard PF (2003) Community- and landscape-level responses of reptiles and

small mammals to feral-horse grazing in the Great Basin, Journal of Arid Environments 59:

271-297.

Beja P, Alcazar R (2003) Conservation of Mediterranean temporary ponds under agricultural

intensification: an evaluation using amphibians, Biological Conservation 114: 317–326.

Bennet AF (1990) Habitat corridors and the conservation of small mammals in a fragmented

forest environment, Landscape Ecology 4(2/3): 109-122.

Bennet AF, Radford JQ, Haslem A (2006) Properties of land mosaics: implications for nature

conservation in agricultural environments, Biological Conservation 133: 250-264.

Blondel J, Aronson J (1999) Biology and Wildlife of the Mediterranean Region, Oxford

University Press, Oxford, UK.

Burel F, Baudry J (1990) Structural dynamic of a hedgerow network landscape in Brittany

France, Landscape Ecology 4(4): 197-210.

Burel F, Baudry J, Alain B, Clergeau P, Delettre Y, Le Cœur D, Dubs F, Morvan N, Paillat G,

Petit S, Thenail C, Brunel E, Lefeuvre JC (1998) Comparative biodiversity along a gradient

of agricultural landscapes, Acta Oecologica 19(1): 47-60.

Butet A, Paillat G, Delettre Y (2006a) Seasonal changes in small mammal assemblages from

field boundaries in an agricultural landscape of western France, Agriculture, Ecosystems

and Environment 113: 364-369.

Page 52: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

43

Butet A, Paillat G, Delettre Y (2006b) Factors driving small rodents assemblages from field

boundaries in agricultural landscapes of western France, Landscape Ecology 21: 449-461.

Cabral MJ (coord.), Almeida J, Almeida PR, Dellinger T, Ferrand de Almeida N, Oliveira ME,

Palmeirim JM, Queiroz AI, Rogado L, Santos-Reis M (eds.) (2005) Livro Vermelho dos

Vertebrados de Portugal, Instituto da Conservação da Natureza, Lisboa.

Companhia das Lezírias (s. d.) Companhia das Lezírias, página visitada em Agosto de 2010,

<http://www.cl.pt/htmls/pt/home.shtml>.

Daily GC, Ehrlich PR, Sánchez-Azofeita GA (2001) Countryside biogeography: use of human-

dominated habitats by the avifauna of Southern Costa Rica, Ecological Applications 11(1):

1-13.

De Miguel JM (1999) Naturaleza y configuración del paisage agrosilvopastoral en la

conservación de la diversidad biológica en Espanã, Revista Chilena de Historia Natural,

72: 547-557.

De Miguel JM, Gómez Sal A (2002) Diversidad y funcionalidad de los paisajes agrarios

tradicionales, in Pineda FD, De Miguel JM, Casado MA, Montalvo J (eds.), La Diversidad

Biológica de España, Prentice Hall, Madrid, pp. 273-284.

Duelli P, Obrist MK (2003) Regional biodiversity in an agricultural landscape: the contribution of

seminatural habitat islands, Basic and Applied Ecology 4: 129-138.

Eccard JA, Walther RB, Milton SJ (2000) How livestock grazing affects vegetation structure and

small mammal distribution in the semi-arid Karoo, Journal of Arid Environments 46: 103-

106.

Eilu G, Obua J, Tumuhairwe JK, NkwineC (2003) Traditional farming and plant species diversity

in agricultural landscapes of south-western Uganda, Agriculture, Ecosystems and

Environment 99: 125-134.

Environmental Systems Research Institute (2006) ArcGIS 9.2 Desktop, Environmental Systems

Research Institute, Redlands, California, USA.

Ferrand de Almeida N, Ferrand de Almeida P, Golçalves H, Sequeira F, Teixeira J, Ferrand de

Almeida F (2001) Guia FAPAS – Anfíbios e Répteis de Portugal, FAPAS, Porto.

Fitzgibbon CD (1997) Small mammals in farmland woodlands: the effects of habitat, isolation

and surrounding land-use patterns, Journal of Applied Ecology 34: 530-539.

Fonderflick J, Lepart J, Caplat P, Debussche M, Marty P (2010) Managing agricultural change

for biodiversity conservation in a Mediterranean upland, Biological Conservation 143: 737-

746.

Page 53: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

44

Gelling M, Macdonald DW, Mathews F (2007) Are hedgerows the route to increased farmland

small mammal density? Use of hedgerows in British pastoral habitats, Landscape Ecology

22: 1019-1032.

Glue DE (1974) Food of the Barn Owl in Britain and Ireland, Bird Study 21(3): 200-210.

Gonçalves P, Alcobia S, Santos-Reis M (2008) Diversidade e abundância de mamíferos na

Companhia das Lezírias – Resposta ao multi-uso e às práticas de gestão, Relatório de

progresso.

Hosmer D, Lemeshow S (2000) Applied logistic regression (2nd ed.), John Wiley and Sons, New

York, USA.

Jacob J (2003) Short-term effects of farming practices on populations of common voles,

Agriculture, Ecosystems and Environment 95: 321-325.

Jongman RHG (2002) Homogenisation and fragmentation of the European landscape:

ecological consequences and solutions, Landscape and Urban Planning 58: 211-221.

Khidas K, Khammes N, Khelloufi S, Lek S, Aulagnier S (2002) Abundance of the wood mouse

Apodemus sylvaticus and the Algerian mouse Mus spretus (Rodentia, Muridae) in different

habitats of Northern Algeria, Mammalian Biology 67: 34-41.

Klempa B, Fichet-Calvet E, Lecompte E, Auste B, Aniskin V, Meisel H, Denys C, Koivogui L, ter

Meulen J, Krüger DH (2006) Hantavirus in African wood mouse, Guinea, Emerging

Infectious Diseases 12(5): 838-840.

Kutiel P, Peled Y, Geffen E (2000) The effect of removing shrub cover on annual plants and

small mammals in a coastal sand dune ecosystem, Biological Conservation 94: 235-242.

Laundré JW, Reynolds TD (1993) Effects of soil structure on burrow characteristics of five small

mammal species, Great Basin Naturalist 53(4): 358-366.

LeCœur D, Baudry J, Burel F, Thenail C (2002) Why and how we should study field boundary

biodiversity in an agrarian landscape context, Agriculture, Ecosystems and Environment

89: 23-40.

Lourenço N, Pinto-Correia T, Jorge MR, Machado CR (1998) Farming strategies and land use

changes in Southern Portugal: land abandonment or extensification of the traditional

systems?, Mediterrâneo 12/13: 191-208.

Macdonald D, Barret P (1993) Mammals of Britain and Europe, HarperCollins, London, UK.

Magnusson WE, Lima AP, Luizão R, Luizão F, Costa FRC, Castilho CV, Kinupp VF (2005)

RAPELD: A modification of the Gentry method for biodiversity surveys in long-term

ecological research sites, Biota Neotropica 5(2).

Page 54: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

45

Mangas JG, Lozano J, Cabezas-Díaz, Virgós E (2008) The priority value of scrubland habitats

for carnivore conservation in Mediterraneae ecosystems, Biodiversity and Conservation 17:

43-51.

Marshall EJP, Moonen AC (2002) Field margins in northern Europe: their functions and

interactions with agriculture, Agriculture, Ecosystems and Environment 89: 5-21.

Mathias ML (coord.) (1999) Guia dos Mamíferos Terrestres de Portugal Continental, Açores e

Madeira, Instituto da Conservação da Natureza, Centro de Biologia Ambiental da

Universidade de Lisboa, Lisboa.

McLaughlin A, Mineau P (1995) The impact of agricultural practices on biodiversity, Agriculture,

Ecosystems and Environment 55: 201-212.

Meyer WB, Turner II BL (1992) Human Population Growth and Global Land-Use/Cover Change,

Annual Review of Ecology and Systematics 23: 39-61.

Michel N, Burel F, Butet A (2006) How does landscape use influence small mammal diversity,

abundance and biomass in hedgerow networks of farming landscapes?, Acta Oecologica

30: 11-20.

Michel N, Burel F, Legendre P, Butet A (2007) Role of habitat and landscape in structuring

small mammal assemblages in hedgerow networks of contrasted farming landscapes in

Brittany, France, Landscape Ecology 22: 1241-1253.

Millán de la Peña N, Butet A, Delletre Y, Paillat G, Morant P, Le Du L, Burel F (2003) Response

of the small mammal community to changes in western French agricultural landscapes,

Landscape Ecology 18: 265-278.

Merriam G, Lanoue A (1990) Corridor use by small mammals: field measurements for three

experimental types of Peromyscus leucopus, Landscape Ecology 4(2/3): 123-131.

Moro D, Gadal S (2007) Benefits of habitat restoration to small mammal diversity and

abundance in a pastoral agricultural landscape in mid-Wales, Biodiversity and

Conservation 16: 3543-3557.

Olea L, San Miguel-Ayanz A (2006) The Spanish dehesa. A traditional Mediterranean

silvopastoral system linking production and nature conservation, 21st General Meeting of

the European Grassland Federation.

Pereira PM, Pires da Fonseca M (2003) Nature vs. Nurture: the making of the montado

ecosystem, Conservation Ecology 7(3): 7.

Pinto-Correia T (1993) Threatened Landscape in Alentejo, Portugal: the ‘montado’ and other

‘agro-silvo-pastoral’ systems, Landscape and Urban Planning 24: 43-48.

Page 55: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

46

Pinto-Correia T (2000) Future development in Portuguese rural areas: how to manage

agricultural support for landscape conservation?, Landscape and Urban Planning 50: 95-

106.

Pinto-Correia T, Mascarenhas J (1999) Contribution to the extensification/intensification debate:

new trends in the Portuguese montado, Landscape and Urban Planning 46: 125-131.

Pio CA, Silva PA, Cerqueira MA, Nunes TV (2005) Diurnal and seasonal emissions of volatile

organic compounds from cork oak (Quercus suber) trees, Atmospheric Environment

39(10): 1817-1827.

Pires da Fonseca M (2005) Os Montados e a Biodiversidade, Jornadas Técnicas sobre la

Gestión Ambiental y Económica del Ecosistema Montado/Dehesa en la Península Ibérica.

Pita R, Mira A, Beja P (2006) Conserving the Cabrera vole, Microtus cabrerae, in intensively

used Mediterranean landscapes, Agriculture, Ecosystems and Environment 115: 1-5.

Pita R, Mira A, Mathias ML (2003) Small mammal community structure in two successional

stages of a Mediterranean ecosystem, Galemys 15: 67-79.

Pita R, Mira A, Moreira F, Morgado R, Beja P (2009) Influence of landscape characteristics on

carnivore diversity and abundance in Mediterranean farmland, Agriculture, Ecosystems

and Environment 132: 57-65.

Plieninger T (2006) Habitat loss, fragmentation, and alteration – quantifying the impact of land-

use changes on a Spanish dehesa landscape by use of aerial photography and GIS,

Landscape Ecology 21: 91-105.

Plieninger T, Wilbrand C (2001) Land use, biodiversity conservation, and rural development in

the dehesas of Cuatro Lugares, Spain, Agroforestry Systems 51: 23-34.

Pounds C (1981) Niche overlap in sympatric populations of stoats (Mustela erminea) and

weasels (Mustela nivalis) in North-east Scotland, PhD thesis, University of Aberdeen,

Aberdeen.

R Development Core Team (2010) R: A language and environment for statistical computing, R

Foundation for Statistical Computing, Vienna, Austria, <http://www.R-project.org>.

Reidsma P, Tekelenburg T, van den Berg M, Alkemade R (2006) Impacts of land-use change

on biodiversity: an assessment of agricultural biodiversity in the European Union,

Agriculture, Ecosystems and Environment 114: 86-102.

Renjifo LM (2001) Effect of natural and anthropogenic landscape matrices on the abundance of

Subandean bird species, Ecological Applications 11(1): 14-31.

Ricklefs RE, Miller GL (2000) Ecology (4th ed.), W. H. Freeman and Company, New York.

Page 56: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

47

Robinson RA, Sutherland WJ (2002) Post-war changes in arable farming and biodiversity in

Great Britain, Journal of Applied Ecology 39: 157–176.

Sala OE, Chapin III FS, Armesto JJ, Berlow E, Bloomfield J, Dirzo R, Huber-Sanwald E,

Huenneke LF, Jackson RB, Kinzig A, Leemans R, Lodge DM, Mooney HA, Oesterheld M,

Poff NL, Sykes MT, Walker BH, Walker M, Wall DH (2000) Global Biodiversity Scenarios

for the Year 2100, Science 287: 1700-1774.

Santos-Reis M, Correia AI (1999) Caracterização da Flora e da Fauna do Montado da Herdade

da Ribeira Abaixo (Grândola- Baixo Alentejo), Centro de Biologia Ambiental, Lisboa.

Schmidt NM, Olsen H, Bildsøe M (2005) Effects of grazing intensity on small mammal

population ecology in wet meadows, Basic and Applied Ecology 6: 57-66.

Schmidt NM, Olsen H, Leirs H (2009) Livestock grazing intensity affects abundance of Common

shrews (Sorex araneus) in two meadows in Denmark, BMC Ecology 9: 2.

Schmucki R, De Blois S, Bouchard A (2002) Spatial and temporal dynamics of hedgerows in

three agricultural landscapes of Southern Quebec, Canada, Environmental Management

30(5): 651-664.

Simões L (2009) Factores determinantes da diversidade e abundância de mamíferos num

sistema agro-silvo-pastoril mediterrânico, Tese de Mestrado, Universidade de Lisboa,

Lisboa.

Sotherton NW (1997) Land use changes and the decline of farmland wildlife: an appraisal of the

set-aside approach, Biological Conservation 83(3): 259-268.

StatSoft, Inc. (2004) STATISTICA (data analysis software system), version 7,

<http://www.statsoft.com>.

Stoate C, Báldi A, Beja P, Boatman ND, Herzon I, van Doorn A, de Snoo GR, Rakosy L,

Ramwell C (2009) Ecological impacts of early 21st century agricultural change in Europe –

a review, Journal of Environmental Management 91: 22-46.

Stoate C, Boatman ND, Borralho RJ, Rio Carvalho C, de Snoo GR, Eden P (2001) Ecological

impacts of arable intensification in Europe, Journal of Environmental Management 63:

337–365.

Tapper S (1979) The effect of fluctuating vole numbers (Microtus agrestis) on a population of

weasels (Mustela nivalis) on farmland, Journal of Arid Environment 59: 271-297.

Temere T, Slater FM (2007) Ground flora, small mammal and bird species diversity in

miscanthus (Miscanthus x giganteus) and reed canary-grass (Phalaris arundinacea) fields,

Biomass and Energy 31: 20-29.

Page 57: UNIVERSIDADE DE LISBOA Faculdade de Ciênciasrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/2423/1/ulfc090515_tm_Filipa... · 2.3 Caracterização da vegetação ... (aumento da produção por

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM HABITATS MARGINAIS NUMA PAISAGEM RURAL

48

Tews J, Brose U, Grimm V, Tielbörger K, Wichmann MC, Schwager M, Jeltsch F (2004) Animal

species diversity driven by habitat heterogeneity/diversity: the importance of keystone

structures, Journal of Biogeography 31: 79-92.

Tilman D, Fargione J, Wolff B, D’Antonio C, Dobson A, Howarth R, Schindler D, Schlesinger

WH, Simberloff D, Swackhamer D (2001) Forecasting agriculturally driven global

environmental change, Science 292: 281-284.

Torre I, Díaz M, Martínez-Padilla J, Bonal R, Viñuela J, Fargallo JA (2007) Cattle grazing, raptor

abundance and small mammal communities in Mediterranean grasslands, Basic and

Applied Ecology 8: 565-575.

Valone TJ, Sauter P (2005) Effects of long-term cattle exclosure on vegetation and rodents at a

desertified arid grassland site, Journal of Arid Environments 61: 161-170.

Verdú JR, Crespo MB, Galante E (2000) Conservation strategy of a nature reserve in

Mediterranean ecosystems: the effects of protection from grazing on biodiversity,

Biodiversity and Conservation 9: 1707-1721.

Vieira MV, Olifiers N, Delciellos AC, Antunes VZ, Bernardo LR, Grelle CEV, Cerqueira R (2009)

Land use vs. fragment size and isolation as determinants of small mammal composition

and richness in Atlantic Forest remnants, Biological Conservation 142: 1191-1200.

Zamora J, Verdú JR, Galante E (2007) Species richness in Mediterranean agroecosystems:

Spatial and temporal analysis for biodiversity conservation, Biological Conservation 134:

113-121.

Zar JH (1999) Biostatistical Analysis, Prentice Hall, Inc., Upper Saddle River, New Jersey, USA: