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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO DANO MORAL COLETIVO NO DIREITO DO TRABALHO JUREMA SHEILA HAUSSMANN Itajaí (SC), novembro de 2008.

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO

DANO MORAL COLETIVO NO DIREITO DO TRABALHO

JUREMA SHEILA HAUSSMANN

Itajaí (SC), novembro de 2008.

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO

DANO MORAL COLETIVO NO DIREITO DO TRABALHO

JUREMA SHEILA HAUSSMANN

Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção do título de bacharel em Direito pela Universidade do Vale do Itajaí, Centro de Ciências Sociais e Jurídicas.

Orientadora: Professora MSc. Rosane Maria Rosa

Itajaí (SC), novembro de 2008.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço aos meus pais,

Valmor Haussmann e Cristina Célia Haussmann,

pelo legado da perseverança

e por me fazerem acreditar que sou capaz;

À minha irmã, Julayne Soraya Haussmann,

pelo estímulo nas horas de angústia;

Aos amigos da jornada acadêmica,

pelo apoio e amizade verdadeira;

À orientadora Rosane Maria Rosa,

responsável pela abertura de novos horizontes na

minha vida acadêmica,

agradeço pelos ensinamentos e dedicação.

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho aos meus pais,

Valmor Haussmann e Cristina Célia Haussmann;

Agradeço por todo o amor,

por me incentivarem a ir ao encontro

dos meus próprios sonhos,

mesmo que isso significasse

sacrificar os seus.

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo

aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do

Vale do Itajaí, a Direção do Centro de Ciências Jurídicas e Sociais, a

Coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e a Orientadora de toda

e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

Itajaí, 19 Novembro de 2008.

Jurema Sheila Haussmann Graduanda

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PÁGINA DE APROVAÇÃO

A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do

Vale do Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Jurema Sheila

Haussmann, sob o título DANO MORAL COLETIVO NO DIREITO DO

TRABALHO, foi submetida em 19 de novembro de 2008 à banca examinadora

composta pelos seguintes professores: Rosane Maria Rosa (presidenta), Sonia

Maria Ferreira Roberts (examinadora) e, aprovada com a nota [ ] (

).

Itajaí, 19 novembro de 2008.

MSc. Rosane Maria Rosa Orientadora e Presidenta da Banca

MSc. Antonio Augusto Lapa Coordenação da Monografia

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ABREVIATURAS E SIGLAS

art. Artigo

CC Código Civil

CDC Código de Defesa do Consumidor

CLT Consolidação das Leis do Trabalho

CODEFAT Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador

CPC Código de Processo Civil

CRFB/88 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988

CTPS Carteira de Trabalho e Previdência Social

EC Emenda Constitucional

FAT Fundo de Amparo ao Trabalhador

FGTS Fundo de Garantia do Tempo de Serviço

j. Julgado

LACP Lei da Ação Civil Pública

LOMPU Lei Orgânica do Ministério Público da União

MTE Ministério do Trabalho e Emprego

MPT Ministério Público do Trabalho

n. Número

OIT Organização Internacional do Trabalho

p. Página

Rel. Relator

RO Recurso Ordinário

RR Recurso de Revista

SBDI Subseção de Dissídios Individuais

STJ Superior Tribunal de Justiça

T. Turma

TRT Tribunal Regional do Trabalho

TST Tribunal Superior do Trabalho

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ROL DE CATEGORIAS

Ação Civil Pública: Disciplina-a a Lei nº 7.347 de 24.7.85 e o Código de

Defesa do Consumidor, que prevêem a responsabilização do infrator por danos

causados ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico,

estético, histórico, turístico e paisagístico e a qualquer outro interesse difuso ou

coletivo1.

Dano Moral: Consiste na lesão injusta e relevante ocasionada a determinados

interesses não-materiais, sem eqüipolência econômica, porém concebidos e

assimilados pelo ordenamento como valores e bens jurídicos protegidos,

integrantes do leque de projeção interna (como intimidade, a liberdade, a

privatividade, o bem-estar, o equilíbrio psíquico e a paz) ou externa (como o

nome, a reputação e a consideração social) inerente à personalidade do ser

humano (abrangendo todas as áreas de extensão e tutela da sua dignidade),

podendo também alcançar os valores e bens extrapatrimoniais reconhecidos à

pessoa jurídica ou uma coletividade de pessoas2.

Dano Moral Coletivo: Corresponde à lesão injusta e intolerável a interesses ou

direito titularizados pela coletividade (considerada em seu todo ou em qualquer

de suas expressões – grupos, classes ou categorias de pessoas), os quais

possuem natureza extrapatrimonial, refletindo valores e bens fundamentais

para a sociedade3.

Direito do Trabalho: É o conjunto de princípios, regras e instituições atinentes

à relação de trabalho subordinado e situações análogas, visando assegurar

1 SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico, p. 14. 2 MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo, p. 56. 3 MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo, p. 137.

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melhores condições de trabalho e sociais ao trabalhador, de acordo com as

medidas de proteção que lhe são destinadas4.

Interesses Transindividuais: Correspondem à modalidade dos interesses

com a nota característica básica de se projetarem para além da esfera

individual, posicionando-se na órbita coletiva, cuja titularização (não

determinada individualmente) repousa em um grupo, uma classe, uma

categoria de pessoas ou mesmo em toda a coletividade5.

4 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito processual do trabalho: doutrina e prática forense, p. 02. 5 MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo, p. 107.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .................................................................................. 12

Capítulo 1

INTERESSES TRANSINDIVIDUAIS E SUA TUTELA NO DIREITO DO TRABALHO

1.1 O ATUAL CENÁRIO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO NO BRASIL............................................................................................. 14 1.2 INTERESSES TRANSINDIVIDUAIS E SUA ECLOSÃO NA ESFERA TRABALHISTA ................................................................. 18 1.2.1 Interesses difusos ..................................................................22 1.2.2 Interesses coletivos ...............................................................25 1.2.3 interesses individuais homogêneos ....................................28 1.3 A JURISDIÇÃO TRABALHISTA E O ACESSO COLETIVO À JUSTIÇA........................................................................................... 30 1.3.1 Vantagens da tutela coletiva na jurisdição trabalhista ........34

Capítulo 2

DANOS MORAIS 2.1DANO MORAL: CONCEITUAÇÃO E ABORDAGEM TERMINOLÓGICA............................................................................ 38 2.1.1 Fundamento no ordenamento jurídico brasileiro................. 42 2.2 DANO MORAL DECORRENTE DAS RELAÇÕES DE TRABALHO ...................................................................................... 46 2.2.1 Competência da Justiça do Trabalho ................................... 48 2.3 DANO MORAL COLETIVO......................................................... 50

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2.3.1 Conceito e crítica terminológica............................................52 2.3.2 Reconhecimento constitucional ...........................................53 2.3.3 Previsão infraconstitucional..................................................54 2.3.4 Responsabilidade objetiva.....................................................57 2.3.5 Prova .......................................................................................59 2.3.6 Reparação e preponderância da função sancionatória .......60 2.3.6.1 Reparação dos dano morais em face da tutela a interesses individuais homogêneos ..............................................63

Capítulo 3

DANO MORAL COLETIVO NO DIREITO DO TRABALHO 3.1 CONFIGURAÇÃO E CONCEITO DE DANO MORAL COLETIVO NO DIREITO DO TRABALHO ....................................... 65 3.2 DESTINAÇÃO DA INDENIZAÇÃO ............................................. 67 3.2.1 Redirecionamento da parcela ...............................................69 3.3 AÇÃO CIVIL PÚBLICA TRABALHISTA E LEGITIMIDADE ....... 71 3.3.1 Competência material ............................................................75 3.3.2 Competência territorial e funcional.......................................75 3.3.3 Prescrição ..............................................................................77 3.3.4 Litispendência e coisa julgada entre a ação civil pública e as ações individuais........................................................................78 3.4 HIPÓTESES DE INCIDÊNCIA NO PANORAMA JURISPRUDENCIAL BRASILEIRO.................................................. 81 3.4.1 Trabalho escravo....................................................................81 3.4.2 Desrespeito às normas de proteção à saúde, segurança e do meio ambiente do trabalho........................................................85 3.4.3 Assédio moral.........................................................................88 3.4.4 Terceirização ilícita.................................................................91 3.4.5 Discriminação .........................................................................94 3.4.6 Coação ....................................................................................95 3.4.7 Ofensa à liberdade sindical ...................................................97 3.4.8 Lide simulada..........................................................................99 3.4.9 Outras irregularidades .........................................................100 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................ 103 REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS......................................... 108

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RESUMO

Esta monografia foi elaborada com a finalidade investigativa de demonstrar a possibilidade de condenação por Dano Moral Coletivo na Justiça do Trabalho. Dentro deste contexto, aferiu-se que a massificação dos conflitos deu origem a interesses transindividuais, que se projetam para além da esfera individual. A partir dessa constatação, analisou-se a existência dos interesses transindividuais na seara laboral, bem como a possibilidade e vantagens da tutela coletiva na jurisdição trabalhista. Buscou-se ainda apresentar o conceito mais atual do instituto do dano moral e sua base legal; o dano moral decorrente das relações de trabalho e a competência da Justiça do Trabalho para apreciá-lo. Após essas considerações, conceituou-se o Dano Moral Coletivo, e foram acentuadas suas principais características: fundamento legal constitucional e infraconstitucional; desnecessidade de prova do prejuízo para caracterização do dano; preponderância da função sancionatória da reparação e não cabimento em face da tutela de interesse individual homogêneo. Finalmente verificou-se a possibilidade de configuração do Dano Moral Coletivo no Direito do Trabalho, através de elementos doutrinários e jurisprudenciais, restando confirmada a principal hipótese levantada para esta Monografia. Tratou-se ainda de aspectos relevantes que o instituto estudado assume no Direito do Trabalho, como a destinação específica da indenização ao FAT e questões processuais que devem ser observadas para efetivar a reparação.

Palavras-chave: interesses transindividuais; dano moral; Dano Moral Coletivo;

Direito do Trabalho.

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INTRODUÇÃO

A presente monografia tem por objeto o Dano Moral Coletivo no

Direito do Trabalho e, como objetivos: institucional, produzir uma monografia

para obtenção do grau de bacharel em Direito, pela Universidade do Vale do

Itajaí – UNIVALI; geral, investigar a aplicabilidade do instituto do Dano Moral

Coletivo na Justiça do Trabalho; específico, identificar os interesses

transindividuais tuteláveis no Direito do Trabalho e a possibilidade e vantagens

da tutela coletiva, apontar a atual concepção de dano moral e sua ocorrência

nas relações de trabalho, verificar as características próprias e o meio

processual apto a ser utilizado na busca da indenização por Dano Moral

Coletivo na Justiça do Trabalho.

Vislumbra-se, nesta temática, a importância do estudo, pois o

instituto do Dano Moral Coletivo revela-se como um meio eficaz de atingir a

Justiça, na defesa dos direitos da classe trabalhadora. Desta forma, espera-se

contribuir para a ciência jurídica apontando, com embasamento doutrinário e

jusrisprudencial, quais os conflitos existentes nas relações de trabalho que

ensejam a indenização por Dano Moral Coletivo, ficando assim caracterizada a

relevância social da pesquisa.

Quanto à metodologia empregada, adotou-se o Método Indutivo

na fase de Investigação; o Método Cartesiano na fase de Tratamento dos

Dados, e o Relatório da Pesquisa foi composto na base lógica indutiva1. Foram

acionadas as técnicas do referente, da categoria, dos conceitos operacionais e

da pesquisa bibliográfica.

As hipóteses que nortearam este trabalho são:

a) A globalização e a proliferação dos conflitos de massas

resultaram no surgimento de interesses transindividuais, que podem ser

tutelados coletivamente, inclusive na Justiça do Trabalho.

1 Sobre os métodos nas diversas fases da Pesquisa Científica, vide PASOLD, Cesar Luiz.

Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. p. 99 – 107.

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b) A base legal voltada para a reparação do Dano Moral Coletivo

possui assento constitucional e infraconstitucional.

c) O Dano Moral Coletivo pode ser decorrente das relações de

trabalho.

A pesquisa foi dividida em três capítulos. O primeiro retrata o

atual cenário das Relações de Trabalho no Brasil. Posteriormente, afere-se o

que são Interesses Transindividuais, e verifica-se a existência destes no Direito

do Trabalho. Para encerrar o capítulo, trata-se do acesso coletivo à Jurisdição

Trabalhista, bem como das vantagens deste fenômeno.

No segundo capítulo o instituto do Dano Moral é conceituado,

apontando-se o fundamento legal para a sua utilização. Após essa tarefa,

cuida-se do Dano Moral decorrente das relações de emprego e da competência

da Justiça do Trabalho para apreciá-lo. O Dano Moral Coletivo também é

conceituado neste capítulo, e são abordados: o seu reconhecimento

constitucional, previsão infraconstitucional, a responsabilização objetiva, a

prova do dano, a preponderância da função sancionatória e um breve

esclarecimento acerca da reparação do Dano Moral em face da tutela a

interesses individuais homogêneos.

Por fim, no terceiro capítulo apresenta-se a configuração do Dano

Moral Coletivo no Direito do Trabalho, a destinação da parcela indenizatória e

possibilidade de redirecionamento dessa parcela. Destacam-se ainda os

aspectos processuais mais relevante para efetivar a condenação. Por último,

encontra-se a visibilidade do tema estudado na jurisprudência dos Tribunais do

Trabalho, em rol ilustrativo de hipóteses de ocorrência do Dano Moral Coletivo

no Direito do Trabalho.

As considerações finais destacam, resumidamente, os temas

abordados nos capítulos e demonstram se as hipóteses da pesquisa foram ou

não confirmadas.

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CAPÍTULO 1

INTERESSES TRANSINDIVIDUAIS E SUA TUTELA NO DIREITO DO TRABALHO

1.1 O ATUAL CENÁRIO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO NO BRASIL

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988

estabelece, no caput do artigo 170, que a valorização do trabalho humano é

fundamento da ordem econômica em nosso país. Observa-se, porém, que o

atual fenômeno da globalização vem mitigando as normas protetivas dos

trabalhadores, conferindo papel secundário ao ser humano, considerando que

todo o processo globalizante se fundamenta na elevada produtividade com

baixo custo1.

Apesar de seus efeitos somente terem sido sentidos com maior

intensidade nas últimas décadas, sabe-se que a globalização é tão antiga

quanto a própria história da civilização humana, já que sempre esteve presente

no homem o desejo de conquista e domínio de todo o mundo conhecido.

No entanto, aduz Ferreira2 que a globalização atualmente

praticada implica muito mais que mero intercâmbio de culturas ou apenas

domínio econômico, pois ao romper com as barreiras econômicas, esse

processo atinge o domínio jurídico de cada Estado. Nas relações de trabalho,

as alterações produzidas por esse domínio são ainda mais preocupantes,

principalmente quando se fala em flexibilização de direitos trabalhistas numa

época em que não são respeitadas nem mesmo as mais básicas condições de

trabalho que garantam a dignidade do trabalhador.

1 PÉRISSÉ. Paulo Guilherme Santos. Interesses Tuteláveis por meio da Ação Coletiva. In: RIBEIRO JUNIOR, José Hortêncio et al. (Org.). Ação coletiva na visão de juízes e procuradores do trabalho, p. 119. 2 FERREIRA. Hádassa Dolores Bonilha. Assédio Moral nas Relações de Trabalho. 1 ed. Campinas: Russell Editores, 2005. p. 33.

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A integração de mercados e liberação do comércio internacional é

uma realidade trazendo novas condições para a ordem mundial. Esse novo

modo de produzir e comercializar reflete sobre o trabalho em si. Segundo Reis

e Trindade3:

As mudanças nos processos produtivos são orientadas pela busca do aumento da produtividade e redução dos custos, geralmente, acompanhadas da redução do número de postos de trabalho e nos critérios de remuneração dos trabalhadores, e não são necessariamente seguidas pela melhoria das condições de trabalho.

Tal realidade, segundo observa Ferreira4, acabou gerando uma

supervalorização da técnica, da competitividade e da flexibilidade. Assim,

dentro do contexto globalizado, além da ameaça do desemprego estrutural que

assusta o mundo todo, do subemprego, da demissão, da extinção de postos de

trabalho, os trabalhadores precisam estar preparados para participarem de

uma competição desumana. Não existe garantia de que a sua dignidade será

conservada por seus superiores hierárquicos, nem pelo Estado, uma vez que

toda essa dinâmica do mercado muitas vezes exige a renúncia de direitos.

Sobre os efeitos desse frenético processo produtivo, anota a mencionada

autora:

É evidente que um ambiente de trabalho marcado por tais aspectos é demasiado opressivo para os trabalhadores. A constante pressão na qual se trabalha só tende a gerar empregados estressados, com sua saúde física e psicológica debilitada, além de se tornarem improdutivos.

Se estes são os efeitos da globalização no setor da economia

considerado formal, atentam Reis e Trindade5, principalmente para os reflexos

da globalização na qualidade e nas condições de trabalho e meio ambiente no

3 REIS, José Pedro dos. TRINDADE, Raquel Pinto. Degradação ambiental e humana – O trabalho escravo nas carvoarias. In: FAVA, Marcos Neves. VELLOSO, Gabriel (Coord.). Trabalho escravo contemporâneo: o desafio de superar a negação, p. 99. 4 FERREIRA, Hádassa Dolores Bonilha Ferreira. Assédio Moral nas Relações de Trabalho, p. 32. 5 REIS, José Pedro dos. TRINDADE, Raquel Pinto. Degradação ambiental e humana – O trabalho escravo nas carvoarias. In: FAVA, Marcos Neves. VELLOSO, Gabriel (Coord.). Trabalho escravo contemporâneo: o desafio de superar a negação, p. 99

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invisível setor informal, que traz ainda uma dificuldade adicional para qualquer

tipo de intervenção, seja em razão do ambiente e das condições de trabalho,

seja em virtude dos trabalhadores que estão descobertos de qualquer registro

ou garantias trabalhistas e previdenciárias, para os quais os serviços públicos

de saúde encontram-se inacessíveis.

E é no setor informal que se localiza a pior forma de trabalho e

degradação do meio de ambiente e da dignidade humana: o trabalho escravo.

Passados mais de cem anos da abolição oficial da escravidão, o Brasil do

Século XXI, ainda convive, inacreditavelmente, com a prática do trabalho

escravo. É o que afirma Audi6, coordenadora nacional do Projeto de Combate

ao Trabalho Escravo no Brasil, em artigo intitulado “A Escravidão não abolida”.

Nesse estudo, Audi informa que foi apenas no início dos anos 90 que o

Governo Brasileiro assumiu a existência do trabalho escravo perante o país, a

comunidade internacional e a OIT. A autora especifica em seu estudo quem

são os “escravos modernos” de hoje no Brasil:

A escravidão contemporânea no Brasil então persistia e ainda insiste, de forma mais cruel e sutil que aquela abolida pela princesa Isabel em 1988: os escravos modernos são pessoas descartáveis, sem valor agregado à produção – simplesmente não custam nada, não valem nada e por isso, não merecem segundo uma lógica puramente econômica, nenhum tipo de cuidado ou garantia de suas vidas.

No âmbito do mercado informal de trabalho há, ainda, aqueles

que, condenados pela redução crescente do emprego formal, passam a

trabalhar por conta própria, em geral, prestando serviços ou comercializando

produtos em pequena escala na rua ou em casa, sem registro e sem nenhum

vínculo empregatício. Esse tipo de trabalhador também tem seus direitos

trabalhistas mitigados e, geralmente, seus ganhos são fixados pelo montante

de serviços prestados, o que o leva a trabalhar mais para obter maior renda.

6 AUDI, Patrícia. A escravidão não abolida. In: FAVA, Marcos Neves. VELLOSO, Gabriel (Coord.). Trabalho escravo contemporâneo: o desafio de superar a negação, p. 75.

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Além das transformações apresentadas nas relações trabalhistas

individuais, a globalização tem influência também no âmbito das organizações

sindicais. Isso ocorre, segundo Cavalcanti7, porque:

O medo da perda do emprego tem ocasionado uma preocupante diminuição no poder dos sindicatos e no número de filiados. Isto porque, impulsionados pelo sentimento egoísta de manutenção do emprego, os trabalhadores têm deixado de lado o ânimo coletivo característico das organizações sindicais. Nos sindicatos brasileiros, os reflexos da globalização têm se mostrado ainda mais prejudiciais em virtude da unicidade sindical e da contribuição sindical, duas heranças nefastas do Estado Corporativista na Constituição Federal.

Assim também concluiu Périssé8, ao afirmar que o cenário de

expansão do capitalismo global em que se busca a maximização dos lucros e a

tendência à geração e concentração de renda, acaba influenciando nas

relações sindicais. Assevera o autor que:

Como sinal desse movimento pode-se observar a crise experimentada pelas formas tradicionais de organização dos trabalhadores e seus movimentos de ação coletiva, grandes protagonistas da arena política ao longo do séc. XX considerados, num sentido forte, os artífices da construção do chamado Estado Social. De fato, a distribuição eqüitativa da riqueza, a centralidade conferida ao trabalho, assim como a conquista de direitos mínimos inerentes a qualquer ser humano são devedores dessas formas de ação coletiva, estruturadas principalmente a partir dos laços de solidariedade construídos dentro do movimento sindical.

A fragmentação do tecido social que emergiu no cenário mundial

atingiu diretamente as formas de ação combinada dos trabalhadores e o

sindicalismo passa por uma crise de identidade. Isso acontece também nas

sociedades periféricas como a brasileira, e este cenário permite entender a

7 CAVALCANTI, Ana Karolina Soares . Reflexos da globalização sobre as relações de trabalho, Disponível em: <http://www.juristas.com.br/ mod_revistas.asp?ic=881>. Acesso em: 19 de abril de 2008. 8 PÉRISSÉ. Paulo Guilherme Santos. Interesses Tuteláveis por meio da Ação Coletiva. In: RIBEIRO JUNIOR, José Hortêncio et al. (Org.). Ação coletiva na visão de juízes e procuradores do trabalho, p. 120.

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crise do nosso sistema judicial, já que dissídios coletivos não mais resolvem os

problemas que são de origem comum de vários trabalhadores9.

Assim, em relação ao Direito do Trabalho brasileiro, a adequação

da globalização à proteção do trabalhador constitui um grande desafio visto

que é corrente a opinião de que nossas leis trabalhistas não podem mais ser

consideradas fontes do Direito do Trabalho já transformado10.

� � A reestruturação do Direito Trabalhista, a fim de adaptar os

preceitos normativos a esta nova realidade, tem sido, portanto, apontada pelos

especialistas como solução para a mitigação dos efeitos negativos desse

fenômeno sobre as relações de trabalho. Essa reestruturação se dá com a

efetividade da jurisdição coletiva trabalhista, e será abordada neste Capítulo,

no Título 1.3 desta pesquisa. Antes, porém, observar-se-á no item seguinte que

interesses e direitos trabalhistas devem ser tutelados coletivamente.

1.2 INTERESSES TRANSINDIVIDUAIS E SUA ECLOSÃO NA ESFERA TRABALHISTA

A noção de interesse, segundo anota Medeiros Neto11 sempre

esteve ligada à idéia de proveito que o indivíduo expressa sobre um bem da

vida, material ou imaterial, de valor econômico ou simplesmente moral.

Manifesta o doutrinador que quando o sistema jurídico confere proteção a

determinado interesse, contemplando-o em seu arcabouço normativo, dada a

identificação da sua importância e valor para a organização e convívio social,

surge o interesse jurídico, com a prerrogativa de poder ser invocado pelo

respectivo titular (ou quem a lei legitimar para tal) perante terceiros, e, também,

de tornar-se objeto de tutela jurisdicional.

9 PÉRISSÉ. Paulo Guilherme Santos. Interesses Tuteláveis por meio da Ação Coletiva. In: RIBEIRO JUNIOR, José Hortêncio et al. (Org.). Ação coletiva na visão de juízes e procuradores do trabalho, p. 120-121. 10 DUARTE, Regina Aparecida. O impacto da Globalização nas relações de trabalho. Disponível em <http://www.mundojuridico.adv.br/sis_artigos/artigos. asp?codigo=642>. Acesso em 22 de abril de 2008. 11 MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo, p. 99.

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A clássica divisão dos interesses jurídicos em interesses públicos

e individuais é facilmente observada nas situações em que o Estado confronta

seus interesses com os dos indivíduos, como em matéria penal ou tributária; e

também nas ocasiões em que o Estado apenas disciplina as relações entre os

indivíduos, como em matéria civil.

Analisando as diferenças entre esses campos de interesse

jurídico, aduz Mazzilli12 que é tradicional a distinção entre o Direito Público (no

qual é o Estado o titular do interesse) e o Direito Privado (no qual é o indivíduo

o titular do interesse). Nesse sentido, o jurista explica que o interesse público

consiste na contraposição do interesse do Estado ao do indivíduo (como no

Direito Penal, que opõe o ius puniendi do Estado ao ius libertatis do indivíduo);

de outro lado, o interesse privado consiste na contraposição entre os

indivíduos, em seu inter-relacionamento (como nos contratos celebrados na

forma do Direito Civil). Observa-se, porém, que a sociedade contemporânea

trouxe interesses que não se enquadram entre os interesses públicos e

privados, passando a configurar outra natureza de interesses. Elucidando o

tema, é valiosa a visão de Dantas13:

A evolução da sociedade, com a concentração em centros urbanos, a progressiva industrialização e expansão comercial, o desenvolvimento dos meios de comunicação e de transporte, a adoção do modelo capitalista de produção, a globalização, entre outras questões, fez surgir uma nova espécie de conflito social: os conflitos de massa.

Explica o jurista que esses conflitos de massa, por sua vez, deram

origem a novos interesses e direitos14, os transinviduais15, que têm como

12 MAZZILLI, Hugo Nigro. A Defesa dos Interesses Difusos em Juízo, p. 48. 13 DANTAS, Adriano Mesquita. A prescrição da pretensão relativa a interesses e direitos metaindividuais: enfoques trabalhistas. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto. asp?id= 8171>. Acesso em: 03 de março de 2008. 14 Afirma Elton Venturi que o ordenamento jurídico brasileiro, com o advento da Lei 8.078/1990 (Código de Defesa do Consumidor), passou a adotar como sinônimas as expressões “interesses” e “direitos”. Para ele, o legislador, certamente alertado sobre o possível reducionismo que poderia recair sobre a utilização da expressão “interesses” ou invés de “direitos”, optou por uma solução conciliatória que acabou prestigiando a ambas, tornando-as equivalentes para fins de tutela jurisdicional. (VENTURI, Elton. Processo Civil Coletivo. A tutela jurisdicional dos direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos no Brasil: Perspectiva de um Código Brasileiro de Processos Coletivos, p. 47).

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destinatários não apenas o homem singularmente considerado, mas o homem

socialmente organizado, o próprio gênero humano, a sociedade, a coletividade.

Essa nova espécie de interesses e direitos compreende aqueles que a doutrina

constitucionalista denomina de direitos fundamentais de terceira geração

(direitos de fraternidade ou solidariedade), compreendendo o direito à paz, ao

meio ambiente sadio e ecologicamente equilibrado, a uma saudável qualidade

de vida, à segurança, à educação, ao patrimônio comum da humanidade, ao

progresso, à comunicação, os direitos das crianças, adolescentes e idosos,

entre outros.

Os principais pontos de identificação desses novos interesses

foram abordados na obra de Medeiros Neto16 , e são eles:

a) transinvidualidade: não se conformam à esfera individual de um

ou vários titulares, mas a transcendem para repousar no universo de uma dada

coletividade;

b) indivisibilidade do objeto: não se pode fracioná-los em partes

devidas a cada beneficiário;

c) conflituosidade: já que uma vez na órbita em que estão

inseridos, facilmente se visualizarão outros interesses que lhe estão (ou serão)

contrapostos. Assim, exemplifica-se: aos interesses de uma classe de

trabalhadores em obter condições de trabalho mais salubres erigem-se os

interesses dos empregadores de diminuir o custo operacional e aumentar os

lucros.

Esses direitos transindividuais foram fixados em categorias pelo

Código de Defesa do Consumidor (Lei n. 8.078/90), no parágrafo único do art.

81, da seguinte forma:

I - interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza

15 As expressões interesses ou direitos “transinviduais”, “metaindividuais” ou “supraindividuais” serão utilizadas na presente pesquisa com idêntico sentido. 16 MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo, p. 107.

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indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato;

II - interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base;

III - interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum. (grifou-se)

Sobre os Interesses acima colacionados, importante é o registro

de Simão de Melo17 ao afirmar que “não há duvida de que tais definições

aplicam-se ao direito do trabalho”. Fundamenta o autor que essas definições

são aplicáveis a todas as situações em que é reclamado o exame desses

conceitos e não apenas às lides de consumo.

Tanto se aplicam as disposições do CDC ao Direito do Trabalho,

que ligeiramente adianta-se que é a lesão aos interesses metaindividuais dos

trabalhadores o fato gerador do Dano Moral Coletivo, mostrando assim a

relevância do seu estudo na presente pesquisa. A fim de ilustrar o afirmado,

destacam-se dois julgados, em que a lesão a interesse transindividual gerou o

Dano Moral Coletivo. Numa das decisões, proferida pelo TRT da 15 ª Região,

observa-se:

O dano moral coletivo desponta como sendo a violação em dimensão transindividual dos direitos da personalidade. Se o particular sofre uma dor psíquica ou passa por uma situação vexatória, a coletividade, vítima do dano moral, sofre desapreço, descrença em relação ao poder público e à ordem jurídica. Padece a coletividade de intranqüilidade, insegurança. Assim, acompanhando uma visão mais social do direito, a doutrina e a jurisprudência já se demonstram sensíveis à questão do dano moral coletivo [...]18. (grifou-se)

E o TRT da 3ª Região também proferiu decisão neste sentido:

17 MELO, Raimundo Simão de. Ação civil pública na justiça do trabalho, p. 29. 18 CAUSA: a prática ilícita de simulação de lide perante a Justiça do Trabalho, para obtenção de quitação de rescisões contratuais. TRT 15ª Região. 6ª T. RO n. 00763-20014-107-15-00-00-0. Rel. Juiz Flávio Nunes Campos. j. em 19.08.2003

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Configurada a lesão aos interesses transindividuais, portanto, que é o que se demonstrou e provou, torna-se pertinente a reparação do dano moral coletivo, independentemente do ressarcimento de danos morais individuais a serem perseguidos por cada titular de direito violado. Os danos morais coletivos encontram amparo em diversas leis que tratam da tutela de interesses metaindividuais[...]19. (grifou-se)

Pode-se dizer, assim, que a lesão aos direito transindividuais dos

trabalhadores, categorizados pelo CDC em interesses difusos, interesses

coletivos e interesses individuais homogêneos, pode ser o fato gerador do

Dano Moral Coletivo. Examinar-se-á, a seguir, as características de cada umas

dessas categorias fixadas pelo CDC, bem como sua incidência na seara

trabalhista.

1.2.1 Interesses Difusos

Difusos, de acordo com o CDC, são os direitos ou interesses

“transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas

indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato”20.

Adverte Bezerra Leite21 que a definição legal de interesse difuso

há de ser estendida a todas as situações que reclamem a aplicação conceitual

dessa espécie de interesse supraindividual. No dizer do autor:

[...] dada a inexistência de norma legal específica no direito material do trabalho que disponha conceitualmente sobre interesses difusos, impõe-se a aplicação analógica da regra inserta no art. 81, parágrafo único, inciso I, do CDC, que serve, portanto, de base conceitual a todas as relações

19 CAUSA: a atuação de órgão intersindical com o objetivo de homologar rescisões contratuais prejudiciais aos trabalhadores, que são coagidos a se submeter a tal procedimento. TRT 3ª Região. 4ª T. RO n. 0292-2004-112-03-00-4.Rel. Juiz Fernando Luiz Gonçalves Rios Neto. j. em 27.10.2004. 20 CDC, art. 81, parágrafo único, inciso I. 21 LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Ação civil pública: nova jurisdição trabalhista metaindividual: legitimação do Ministério Público, p. 50.

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metaindividuais em geral, aí compreendidas as relações metaindividuais de trabalho.

Acerca desses interesses difusos, explica Mazzilli22 que:

Os interesses difusos compreendem grupos menos determinados de pessoas (melhor do que pessoas indeterminadas, são antes pessoas indetermináveis), entre as quais inexiste vínculo jurídico ou fático preciso. São como um feixe ou conjunto de interesses individuais, de objeto indivisível, compartilhados por pessoas indetermináveis, que se encontram unidas por circunstâncias de fato conexas.

Ainda no plano conceitual, Grinover, apud Medeiros Neto23,

descreve com autoridade:

Os interesses difusos compreendem interesses que não encontram apoio em uma relação-base bem definida, reduzindo-se o vínculo entre as pessoas a fatores conjunturais ou extremamente genéricos, a dados de fato freqüentemente acidentais e mutáveis: habitar a mesma região, consumir o mesmo produto, viver sob determinadas condições socioeconômicas, sujeitar-se a determinados empreendimentos etc. Trata-se de interesses espalhados e informais à tutela de necessidades, também coletivas, sinteticamente referidas à qualidade de vida. E essas necessidades e esses interesses, de massa, sofrem constantes investidas, freqüentemente também de massas, contrapondo grupo versus grupo, em conflitos que se coletivizam em ambos os pólos.

A doutrina acima citada destaca os pontos essenciais que

caracterizam os interesses difusos: a) indeterminação dos sujeitos; b)

indivisibilidade do objeto; c) conflituosidade; d) inexistência de vínculo

associativo entre os interessados.

22 MAZZILLI, Hugo Nigro. A Defesa dos Interesses Difusos em Juízo, p. 50. 23 MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo., p. 111.

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Na esfera trabalhista, Martins Filho24 cita como exemplo de

interesse difuso a contratação sem concurso público em empresa estatal

(CRFB/88, art. 37, II). Nesse caso, trata-se de direito difuso na medida em que

é transindividual; de natureza indivisível; há indeterminação dos sujeitos, pois,

em tese, todos os brasileiros poderiam concorrer aos cargos ou empregos se

fosse realizado concurso público; e, por fim, os interessados estão ligados por

circunstâncias de fato, inexistindo qualquer relação jurídica-base entre eles.

Esse mesmo exemplo é trazido à baila na obra de Bezerra Leite25,

que explica porque a contratação de servidores para investidura em emprego

público sem observar a regra constitucional do concurso público se caracteriza

como interesse difuso:

O interesse difuso, neste caso, caracteriza-se: por ser indivisível, pois a garantia constitucional de acesso aos cargos, emprego e funções públicas constitui um bem jurídico fruível por todos os brasileiros, ou estrangeiros residente no País, que preencham os requisitos estabelecidos em lei; pela indeterminação dos titulares, é dizer, não é possível precisar os potenciais candidatos interessados no concurso para investidura nos empregos públicos irregularmente ocupados; pela inexistência de relação jurídica entre os potenciais candidatos ao certame público entre si e entre eles e a Administração, pois em ambos os casos as relações são meramente fáticas, circunstanciais; pela conflituosidade entre os potenciais candidatos ao concurso público, uma vez que os interesses entre eles são contrapostos, em função do reduzido número de empregos públicos ofertados pela Administração.

Outro exemplo, agora apontado por Dantas26, seria uma ação

coletiva visando obrigar uma determinada empresa a contratar pessoas

24 MARTINS FILHO, Ives Gandra da Silva. A Importância da Ação Civil Pública no Âmbito Trabalhista. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03 /revista/Rev_25/artigos/Art_ MinistroIves.htm>. Acesso em 19 de abril de 2008.

25 LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Ação civil pública: nova jurisdição trabalhista metaindividual: legitimação do Ministério Público, p. 52. 26DANTAS, Adriano Mesquita. A prescrição da pretensão relativa a interesses e direitos metaindividu-ais: enfoques trabalhistas. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/ texto.asp?id=8171>. Acesso em: 03 de março de 2008.

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portadoras de deficiência, conforme o art. 93 da Lei n. 8.213/91. O interesse é

transindividual; indivisível; há indeterminação dos interessados, uma vez que

todos os deficientes podem, em tese, ser beneficiados; e não há qualquer

relação jurídica unindo os interessados, apenas a circunstância fática de serem

deficientes.

O jurista Simão de Melo27 igualmente cita o interesse difuso numa

ação civil pública contra uma empresa que discrimina, na contratação,

trabalhadores portadores de deficiência. Acrescenta ainda que também há

interesse difuso quando essa discriminação ocorre na contratação de

trabalhadores negros, mulheres grávidas ou ainda na prática de qualquer

discriminação vedada pela CRFB/88. Para explicar porque esses interesses

são difusos, assinala o autor:

Em tais situações é até possível se identificar algumas das pessoas discriminadas, que normalmente apresentam denúncia perante o Ministério Público, mas não é possível identificar todas as pessoas que foram discriminadas e que serão casa não se impeça tal prática, daí serem tais interesses difusos.

Atualmente, observa Medeiros Neto28, que a temática dos direitos

difusos tem sido objeto de renovada atenção, principalmente ao se reconhecer

a importância da respectiva tutela na sociedade atual, diante da consideração

de serem vitais à própria existência – como por exemplo a preservação do

meio ambiente – segundo se observa no campo dos direitos do consumidor,

dos portadores de deficiência, dos trabalhadores, da proteção à criança e ao

adolescente e do combate à improbidade administrativa.

1.2.2 Interesses Coletivos

Os direitos coletivos surgem a partir da identificação de algumas

circunstâncias comuns aos integrantes de certa comunidade organizada, de

forma que os seus interesses transcendem aos interesses individuais,

27 MELO, Raimundo Simão de. Ação civil pública na justiça do trabalho, p. 32 – 33. 28 MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo, p. 110.

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podendo-se dizer que eles somente têm cabida a partir da inclusão em certo

universo previamente delimitado.

É o que se colhe da definição trazida pelo CDC, que preconiza

que são considerados interesses coletivos “os transindividuais de natureza

indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas

entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base” 29.

Observa Chamberlain30 que o CDC, ao trazer a definição de

direitos coletivos o divide em subespécies, quando considerados os diferentes

núcleos que constituem a relação jurídica base. Acerca dessa divisão explana

a autora, com ênfase no âmbito trabalhista:

[...] a coletividade pode ser formada por um grupo, por categoria ou por classe, por grupo se entende uma ligação de pessoas aglomeradas em torno de relação jurídica contingente; já categoria, bem definida pelo art. 511, parágrafos 1º e 2º da CLT, diz respeito à unidade de interesses em torno de uma profissão ou exploração de atividade econômica; e classe, a mais abrangente delas, reúne pessoas em torno de uma família, das quais pode se extrair categorias ou grupos. Exemplo: a classe trabalhadora é comporta por todos os trabalhadores; a categoria diz respeito àqueles que exercem idêntica profissão; e o grupo pode ser restrito aos trabalhadores de um estabelecimento.

Aponta Medeiros Neto31, ao tratar dos interesses coletivos, que a

titularidade do interesse não se apresenta como exclusividade de ninguém,

mas sim do todo formado pelos respectivos indivíduos. E as pessoas

abrangidas nesse universo, em regra, mantêm entre si um liame fundado numa

relação jurídica base ou decorrente da condição de membros que possuem

vinculação com um ente jurídico.

29 CDC, art. 81, parágrafo único, II. 30 CHAMBERLAIN, Marise M. Cavalcanti. Direitos ou interesses metaindividuais e sua classificação. In: LEITE, Carlos Henrique Bezerra (Coord.). Direitos Metaindividuais, p. 48. 31 MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo, p. 113.

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Para diferenciar os direitos coletivos dos direitos difusos vistos no

Subtítulo anterior, importante observar os ensinamentos de França32:

O que distingue os interesses difusos dos coletivos é o elemento subjetivo, porquanto nos primeiros não existe qualquer vínculo jurídico a ligar as pessoas entre si ou com a parte contrária. [...] Já com relação aos titulares dos interesses coletivos, trata-se de grupo, categoria, ou classe de pessoas ligadas por uma relação jurídica base entre si (como acontece, por exemplo para os membros de uma associação) ou com a parte contrária (como ocorre com as relações fiscais múltiplas, em que cada contribuinte é titular de uma relação jurídica com o fisco).

Nos domínios do Direito material do Trabalho, afirma Dantas33

que na hipótese da contratação de servidores sem a realização de concurso

público, verifica-se que a ação coletiva ajuizada visando a anulação das

dispensas (implementadas, por exemplo, sem a observância do contraditório,

da ampla defesa e do devido processo legal) versará sobre interesses coletivos

dos servidores contratados irregularmente, que consiste na manutenção do

vínculo. O interesse, no caso, é transindividual; abrange um número

determinado ou determinável de pessoas (os que foram contratados

irregularmente); é indivisível, pois a anulação atingirá todos que foram

dispensados, indistintamente; e há a relação jurídica base (contratação dos

servidores pelo poder público).

Outros muitos exemplos são encontrados em decorrência dos

ricos fatos da vida diária trabalhista. Simão de Melo34 cita como exemplo de

hipótese de direito coletivo a eliminação ou diminuição dos riscos no meio

32 FRANÇA, Paulo Roberto Mendonça. Ação Civil Pública: litispendência e desistência. In: LEITE, Carlos Henrique Bezerra, (Coord.). Direitos Metaindividuais, p. 154. 33 DANTAS, Adriano Mesquita. A prescrição da pretensão relativa a interesses e direitos metaindividu-ais: enfoques trabalhistas. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/ texto.asp?id=8171>. Acesso em: 03 de março de 2008. 34 MELO, Raimundo Simão de. Ação civil pública na justiça do trabalho, p. 33.

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ambiente de trabalho. Esta hipótese, também observada na obra de Bezerra

Leite35, pode ser mais bem entendida ilustrativamente:

Um exemplo de interesse coletivo de grupo é o dos trabalhadores da empresa Z de terem direito a um meio ambiente de trabalho em condições de salubridade e segurança. Se esse grupo de trabalhadores objetiva a eliminação dos riscos à vida, à saúde e à segurança, emerge aí o interesse coletivo do grupo (transindividual), de natureza indivisível (eliminando-se os riscos, todos serão beneficiados indistinta e simultaneamente), cujos titulares (o grupo dos trabalhadores da empresa Z) estão ligados entre si (empregados da mesma empresa) e com a parte contrária (empregador), através de uma relação jurídica base (vínculos organizacional, no primeiro caso, e relação empregatícia, no segundo).

Em relação às pessoas portadoras de deficiência, Dantas36

aponta outro exemplo de interesse coletivo, que seria uma ação para obrigar

uma determinada empresa a adequar as suas instalações às necessidades dos

seus empregados deficientes, instalando elevadores, rampas de acesso aos

locais de trabalho, banheiros adaptados, etc. O interesse é coletivo, uma vez

que é transindividual e de natureza indivisível, pois diz respeito a todos os

empregados deficientes indistintamente. Esses constituem um grupo que, por

sua vez, está ligado com a parte contrária (o empregador) por uma relação

jurídica-base, o contrato de emprego.

1.2.3 Interesses Individuais Homogêneos

Os interesses individuais homogêneos possuem o conceito mais

simples empregado pelo CDC, que os definiu como “decorrentes de origem

35 LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Ação civil pública: nova jurisdição trabalhista metaindividual: legitimação do Ministério Público, p. 58 - 59. 36DANTAS, Adriano Mesquita. A prescrição da pretensão relativa a interesses e direitos metaindividuais: enfoques trabalhistas. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto. asp?id=8171>. Acesso em: 03 de março de 2008.

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comum” 37. Para Gera38, o Código foi muito econômico na sua definição, tendo

esse conceito gerado algumas divergências doutrinárias e jurisprudenciais, por

exemplo, no que se refere à legitimidade do Ministério Público para a sua

tutela.

A autora que critica essa economia conceitual também aponta em

seu estudo as características que possuem esses interesses: “[...] 1) pessoas

determinadas ou determináveis são seus titulares; 2) prejuízos são divisíveis e

3) prejuízos são de origem comum, sendo decorrentes de uma mesma situação

de fato”.

Essas características também são detalhadamente explicadas por

Medeiros Neto39, que afirma que não obstante a natureza individual dos

interesses individuais homogêneos, ensejam tutela pela via processual coletiva,

em virtude de se originarem de uma situação comum, com a feição

homogênea, a expressar uniformidade qualitativa. Em outras palavras, a

homogeneidade exige identidade e multiplicidade de direitos, sem ser

fundamental se apresentar com precisão o número total de indivíduos titulares.

A compreensão que se tem, portanto, é a de que esses interesses

não possuem a essência do interesse coletivo, mas possuem relevância social

bastante para lhes ser conferida a possibilidade de tutela jurisprudencial pela

via coletiva. O jurista Venturi40 também se posiciona nesse sentido:

A grande dificuldade oposta à intelecção dos direitos individuais homogêneos, para além da tautológica conceituação legal que lhes foi empreendida pelo legislador brasileiro, deve-se ao fato de que, em verdade, não passam de um artifício legislativo destinado à facilitação da tutela processual – e, portanto, sujeito a compreensões mais ou

37 CDC, art. 81, parágrafo único, III. 38 GERA, Renata Coelho Padilha. Interesses individuais homogêneos na perspectiva das “ondas” de acesso à justiça. In: LEITE, Carlos Henrique Bezerra (Coord.). Direitos Metaindividuais, p. 61. 39 MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo, p. 114 - 115. 40 VENTURI, Elton. Processo Civil Coletivo. A tutela jurisdicional dos direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos no Brasil: Perspectiva de um Código Brasileiro de Processos Coletivos, p. 61.

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menos abrangestes, liberais ou reacionárias, a depender da própria concepção que o intérprete tenha do fenômeno relacionado ao acesso à justiça e dos obstáculos que o cercam.

No Direito laboral, afirma Simão de Melo41, que muitas são as

hipóteses que se enquadram como exemplo de direitos individuais

homogêneos:

a) pleitos de pagamento de adicionais de insalubridade, periculosidade e penosidade, por meio de uma ação civil coletiva ou da tradicional ação de substituição processual;

b) pagamento de adicional e/ou horas noturnas em razão de ato único supressivo do empregador com relação, por exemplo, a uma turma de trabalhadores que há vários anos trabalhavam à noite e, em razão daquela supressão, sofreram redução salarial linear;

c) qualquer ato do empregador capaz de provocar lesões de forma coletivizada aos trabalhadores constitui direito individual homogêneo e permite defesa coletiva porque, embora cada um possa, em tese, defender seu direito, este, por ser decorrente de uma origem comum, pode e deve ser defendido também de forma coletiva.

Já Dantas42 demonstra que uma hipótese de tutela de interesse

individual homogêneo ocorreria também na ação visando a anulação da

demissão de empregados portadores de deficiência sem a prévia contratação

de substitutos de condição semelhante, conforme exige o art. 93, §1°, da Lei

n.° 8.213/91. Nesse caso, cada empregado deficiente demitido poderia pleitear

individualmente a reintegração no emprego. Por outro lado, atingindo uma

pluralidade de empregados (grupo) e tendo origem comum (mesma lesão:

demissão; mesmo causador: o empregador), resta caracterizado o interesse

individual homogêneo, tutelável coletivamente.

41 MELO, Raimundo Simão de. Ação civil pública na justiça do trabalho, p. 34. 42 DANTAS, Adriano Mesquita. A prescrição da pretensão relativa a interesses e direitos metaindividuais: enfoques trabalhistas. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto. asp?id=8171>. Acesso em: 03 março de 2008.

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Assim, verifica-se que não é o interesse que se classifica como

coletivo, mas coletiva é a forma de sua defesa em nome de interesse social

maior na proteção e efetivação dos direitos trabalhistas violados.

1.3 A JURISDIÇÃO TRABALHISTA E O ACESSO COLETIVO À JUSTIÇA

A jurisdição é a forma de solucionar os conflitos por meio da

interveniência do Estado, gerando processo judicial. Dessa forma, jurisdição é

o poder que o juiz tem de dizer o direito nos casos a ele submetidos, pois está

investido desse poder pelo Estado. A Justiça do Trabalho fica incumbida de

solucionar os conflitos trabalhistas43.

Durante muitos anos a jurisdição trabalhista foi exercida por meio

de dois sistemas: o primeiro, destinado aos tradicionais dissídios individuais; o

segundo, voltado para os dissídios coletivos, nos quais se busca, através do

Poder Normativo, a criação ou interpretação de normas trabalhistas coletivas

destinadas aos grupos sociais representados pelas partes que figuram tal

espécie de processo coletivo44.

Todavia, observa Leite45 que o surgimento de novos conflitos de

massa no mundo do trabalho exige uma nova postura dos juristas e operadores

do Direito Processual Trabalhista, diversa da adotada nas lides individuais e no

“velho” dissídio coletivo.

No mesmo sentido é a visão de Cardoso46, ao afirmar que todo o

complexo normativo derivado do Código de Processo Civil e da Consolidação

das Leis do Trabalho foi produzido para dirimir conflitos individuais de

interesses, e esse direito foi positivado numa época em que a ciência jurídica

43 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito processual do trabalho: doutrina e prática forense, p. 70 e 93. 44LEITE, Carlos Henrique Bezerra.Tutela de urgência em Ação Civil Pública no Direito Processual do Trabalho. In: RIBEIRO JUNIOR, José Hortêncio et al. (Org.). Ação coletiva na visão de juízes e procuradores do trabalho, p. 238. 45 LEITE, Carlos Henrique Bezerra.Tutela de urgência em Ação Civil Pública no Direito Processual do Trabalho. In: RIBEIRO JUNIOR, José Hortêncio et al. (Org.). Ação coletiva na visão de juízes e procuradores do trabalho, p. 238. 46CARDOSO, Fábio Leal. Competência na Ação Coletiva Trabalhista. In: RIBEIRO JUNIOR, José Hortêncio et al. (Org.). Ação coletiva na visão de juízes e procuradores do trabalho, p. 46.

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ainda não tinha reconhecido a relevância social dos interesses transindividuais.

Havia a necessidade de superar esse modelo liberal-não-intervencionista,

criando instrumentos eficazes de tutela dos direitos transindividuais, de cuja

preservação efetiva depende a existência da própria coletividade.

Outro elemento fundante e uma das razões para ensejar a busca

de um novo sistema judicial de resolução das lides num plano mais abrangente

e menos individual é apontado pelo Juiz do Trabalho Fava47: o volume intenso

de procura do Poder Público para soluto de litígios oriundos da relação capital-

trabalho. Informa o jurista, através de estatísticas, que atualmente uma das

Regiões decide aproximadamente o mesmo número de dissídios que resolvia

todo o Judiciário Trabalhista há trinta anos. Diante destes fatos, concluiu Fava

que a similaridade entre os processos que se torna evidente a partir da

identidade dos réus, autoriza a ilação de que sua reunião em ações coletivas

ocuparia um lugar na reforma da distribuição da justiça.

Nesse contexto, Bezerra Leite48 aduz que a jurisdição trabalhista

passa a abarcar um terceiro49 sistema, que é vocacionado à tutela preventiva

ou reparatória dos direitos ou interesses metaindividuais. O referido jurista

explica qual a legislação pertinente nesse terceiro sistema:

Para implementar essa nova “jurisdição civil coletiva”, portanto, é condição sine qua non observar, aprioristicamente, o sistema integrado de tutela coletiva instituído conjuntamente pela LACP (art. 21) e pelo CDC (arts. 83 e 90). Noutro falar, somente na hipótese de lacunosidade do sistema integrado de acesso coletivo à justiça (LACP e CDC), aí, sim, poderá o juiz

47 FAVA, Marcos Neve. A Classe No Pólo Passivo da Ação Coletiva. In: RIBEIRO JUNIOR, José Hortêncio et al. (Org.). Ação coletiva na visão de juízes e procuradores do trabalho, p. 70-71. 48 LEITE, Carlos Henrique Bezerra.Tutela de urgência em Ação Civil Pública no Direito Processual do Trabalho. In: RIBEIRO JUNIOR, José Hortêncio et al. (Org.). Ação coletiva na visão de juízes e procuradores do trabalho, p. 238 - 239. 49 O autor aduz que não há mais dúvida em razão da vigência da Constituição de 1988, do CDC, que deu nova redação ao art. 1ª, inciso IV da LACP, alargando o espectro tutelar da ação civil pública, e da LOMPU (Lei Complementar n. 75/93, art. 83, III c/c art. 6º, VII, a e d, que acabou com a antiga polêmica a respeito da competência da Justiça do Trabalho para a referida ação coletiva. (LEITE, Carlos Henrique Bezerra.Tutela de urgência em Ação Civil Pública no Direito Processual do Trabalho. In: RIBEIRO JUNIOR, José Hortêncio et al. (Org.). Ação coletiva na visão de juízes e procuradores do trabalho, p. 238 - 239.)

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do trabalho socorrer-se da aplicação supletória da CLT, do CPC e de outros diplomas normativos pertinentes.

Diante do colacionado, é possível afirmar, portanto, que no Brasil

a defesa dos interesses de grupos começou a ser sistematizada com o advento

da Lei n. 7.347/85 – Lei da Ação Civil Pública (LACP), e, em seguida, com a Lei

n. 8.078/90 – Código de Defesa do Consumidor (CDC), que, como visto

anteriormente, distinguiu os interesses transinviduais em difusos, coletivos, e

individuais homogêneos.

Nesse terceiro sistema, que é regido pelo CDC e LACP, é que

reside o grande entrave à efetivação da tutela coletiva dos direitos

transinviduais trabalhistas. Para operacionalizá-lo, é preciso uma mudança

cultural dos juízes e procuradores do trabalho, bem como dos sindicalistas e

demais operadores do direito laboral, pois a realização do acesso coletivo à

justiça exige, sobretudo, um “pensar coletivo”50.

Essa proposta para a nova realidade do processo de massas e

que necessita da tutela jurisdicional transinvidual, implica, segundo Fava51, em

mudanças profundas de concepção ideológica, de finalidade dos instrumentos

processuais, de hermenêutica, de comportamento prático e de crença na

possibilidade de um ordenamento jurídico plausível, cuja efetivação encontre

guarida na atividade de um Judiciário comprometido com a efetividade de sua

atuação. Brilhantemente, o autor demonstra a relevância desse novo sistema

processual de tutela transindividual:

O perfil do processo transindividual mostra-se desafiador, exigindo – e recebendo – por isto críticas ferozes e apaixonadas, mas sem abdicar da criação de vias de solução para a inanição da intervenção jurisdicional contemporânea, em particular no Brasil. O Novo processo descende da crise de efetividade da justiça e, nesta condição, não deixa opções possíveis, senão a de inserir-se na prática quotidiana do foro, de comparecer às pautas com freqüência, de desenhar nova

50 LEITE, Carlos Henrique Bezerra.Tutela de urgência em Ação Civil Pública no Direito Processual do Trabalho. In: RIBEIRO JUNIOR, José Hortêncio et al. (Org.). Ação coletiva na visão de juízes e procuradores do trabalho, p. 240. 51 FAVA, Marcos Neve. A Classe No Pólo Passivo da Ação Coletiva. In: RIBEIRO JUNIOR, José Hortêncio et al. (Org.). Ação coletiva na visão de juízes e procuradores do trabalho, p. 76.

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jurisprudência, de responder aos reclamos sociais. Mais fácil seria defender a conservazione e l’ordine, o que se tornaria viável apenas se a ciência processual se debruçasse sobre um objeto de teleologia tautológica, um objeto fim-de-si-próprio, como um fóssil, como um exercício de taxidermia, como uma autópsia.

Muito embora não exista uma regulamentação própria da tutela de

direitos transindividuais em matéria trabalhista, observa-se que não há mais

qualquer dúvida quanto à possibilidade de identificação de direitos coletivos,

difusos e individuais homogêneos laborais e a aplicação subsidiária dos

institutos processuais preconizados pela LACP e pelo CDC 52.

1.3.1 Vantagens da tutela coletiva na jurisdição trabalhista

No âmbito trabalhista, afirma Dantas53 que a tutela coletiva possui

aspectos e vantagens próprias. Isso porque os conflitos trabalhistas, na maioria

das vezes, podem ser caracterizados pela complexa e muita vezes conflituosa

relação entre o capital e o trabalho, e a tutela coletiva possibilita a equivalência

processual material entre trabalhadores e empregadores pela

representatividade conferida a determinados órgãos e entidades

(principalmente o Ministério Público do Trabalho e sindicatos). Observa-se que

nas ações coletivas há, portanto, equilíbrio das partes, o que não ocorre nas

ações individuais, em que o trabalhador atua de forma isolada e enfraquecida.

Já Melo54, acredita que a uniformidade de decisões sobre uma

mesma questão no processo coletivo apresenta-se com grande importância,

52 CORDEIRO, Wolney de Macedo. A delimitação procedimental da Liquidação das Sentenças de Tutela de Direitos Individuais Homogêneos no Processo do Trabalho. In: RIBEIRO JUNIOR, José Hortêncio et al. (Org.). Ação coletiva na visão de juízes e procuradores do trabalho, p. 325. 53DANTAS, Adriano Mesquita. A tutela coletiva no âmbito trabalhista após 20 anos da lei da ação civil pública e 15 anos do código de defesa do consumidor: a ineficácia de um instrumento de cidadania. Retirado de: <http://www.amatra13.org.br/ noticia_geral.php?id=392>. Acesso em 26 mar. 2008. 54 MELO, Raimundo Simão. Ação Coletiva de tutela do meio ambiente do trabalho. In: RIBEIRO JUNIOR, José Hortêncio et al. (Org.). Ação coletiva na visão de juízes e procuradores do trabalho, p. 182.

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porque um dos piores resultados da coisa julgada individual é a pulverização

de decisões díspares e contraditórias sobre a mesma questão. Isso leva a um

grande desgaste e desprestígio do Poder Judiciário, pois o cidadão nunca vai

entender a razão de se ter decisões diferentes sobre um mesmo conflito levado

ao Poder Judiciário, o que é muito comum no âmbito trabalhista, diante das

infrações massificadas aos direitos dos trabalhadores. Outra vantagem

apontada por este Procurador Regional do Trabalho é o aumento do poder do

juiz, uma vez que:

[...] na jurisdição coletiva o juiz tem mais liberdade de atuação, destacando-se a permissão para utilização do poder inquisitivo, pelo qual o magistrado pode conceder, de ofício, tutelas cautelares para evitar danos irreversíveis e irreparáveis e aplicar multas/cominações.

Já Procurador do Trabalho Carelli55, ousa ir mais longe, e afirma

que os conflitos trabalhistas deveriam ser resolvidos a princípio de forma

coletiva, sendo que por exceção em sua forma individual. Tal conclusão se

chega após a análise da própria realidade do mundo do trabalho, onde os

trabalhadores não têm qualquer poder de defender-se por si só, pelo grau de

dependência para com o empregador, e principalmente em relação ao posto de

trabalho. Para este autor, é dito popular que a Justiça do Trabalho é a Justiça

dos Desempregados, porque que somente estes demandam por direitos,

quando já finda a relação de emprego, o que é uma realidade inelutável. Assim,

as ações coletivas encontram campo fértil e útil na Justiça do Trabalho,

conforme as palavras do jurista:

Com as ações coletivas, tanto as ajuizadas pelo ministério público do Trabalho como principalmente pelos sindicatos, a Justiça do Trabalho deixa de meramente indenizar em pecúnia direitos, ás vezes fundamentais, como o descanso e férias remuneradas, que já foram lesados. Ela passa a, como deverias ser, ter o poder efetivo de fazer valer os direitos fundamentais do trabalho previstos na Constituição Federal e da legislação infraconstitucional.

55 CARELLI, Rodrigo de Lacerda. As Ações Coletivas e o combate às terceirizações ilícitas. In: RIBEIRO JUNIOR, José Hortêncio et al. (Org.). Ação coletiva na visão de juízes e procuradores do trabalho, p. 210.

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A crise que a Justiça do Trabalho enfrenta, apontada por Carelli56,

está sendo gerada pela sua ineficácia em garantir direitos e se bastando em

indenizá-los. Além disso, as indenizações proporcionadas pela Justiça do

Trabalho são, em sua grande maioria, em valores injustos e ínfimos, devido

burocrata sistema de solução de conflitos trabalhistas. A solução apontada

pelo procurador, ou parte dela, poderia estar nas ações constitucionais

impessoais de natureza coletiva, ou seja, ações civis públicas, que buscam o

efetivo cumprimento e garantia dos direitos trabalhistas enquanto vigente a

relação trabalhista.

Na mesma esteira é o entendimento de Dantas57, aduzindo que

os trabalhadores só pleiteiam seus direitos quando termina a relação laboral,

em função do receio de ter o pacto rescindido na hipótese de demandar contra

o empregador no curso daquela. Quando o contrato de trabalho chega ao fim,

muitas vezes a pretensão do trabalhador tem sido atingida pela prescrição,

ficando o trabalhador no prejuízo por não poder mais pleitear a devida

reparação. Desse modo, o trabalhador geralmente fica diante do seguinte

dilema: demandar no curso da relação empregatícia e correr o risco de perder

o emprego ou esperar pelo fim da relação para demandar e ter parte da

pretensão fulminada pela prescrição. Segundo o jurista, isso não ocorre nas

ações coletivas:

Já a tutela coletiva é pleiteada em juízo pelo substituto processual de forma genérica, sem individualização dos beneficiários e independentemente de autorização destes, evita-se qualquer tipo de represália por parte dos empregadores, garantindo aos trabalhadores uma imediata e efetiva proteção de seus interesses e direitos , inclusive através da tutela inibitória.

56 CARELLI, Rodrigo de Lacerda. As Ações Coletivas e o combate às terceirizações ilícitas. In: RIBEIRO JUNIOR, José Hortêncio et al. (Org.). Ação coletiva na visão de juízes e procuradores do trabalho, p. 212. 57 DANTAS, Adriano Mesquita. A tutela coletiva no âmbito trabalhista após 20 anos da lei da ação civil pública e 15 anos do código de defesa do consumidor: a ineficácia de um instrumento de cidadania. Retirado de: <http://www.amatra13.org.br/ noticia_geral.php?id=392>. Acesso em :26 de março de 2008.

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Afirma, portanto, o autor supra citado, que a principal vantagem

da tutela coletiva no âmbito do direito do trabalho consiste na possibilidade de

prevenção ou reparação imediata da violação aos direitos dos trabalhadores no

curso da relação de trabalho.

Finalmente, no campo processual, Martins58 também trata das

vantagens da tutela coletiva de feição transindividual na Justiça do Trabalho,

elencando as vantagens da ação civil pública:

a) permite que não haja a propositura de várias ações com o mesmo pedido e a mesma causa de pedir, beneficiando várias pessoas ao mesmo tempo ; b) impede a existência de julgados distintos sobre a mesma matéria; c) possibilita que o Judiciário dê uma única solução homogênea; d) diminui a sobrecarga de processos, pois uma única ação beneficiaria várias pessoas ao mesmo tempo; e) a eficácia da coisa julgada será coletiva e não individual

Para que todas as vantagens aqui apresentadas sejam

reconhecidas e a tutela coletiva realmente cumpra sua finalidade na Justiça do

Trabalho,é preciso romper com o tradicional sistema processual individualista,

para abrir espaço ao crescimento do novo sistema coletivo de atuação no

Judiciário, de maneira que os dois mecanismos de solução de conflitos se

complementem.

58 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito processual do trabalho: doutrina e prática forense, p. 553.

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CAPÍTULO 2

DANOS MORAIS

2.1 DANO MORAL: CONCEITUAÇÃO E ABORDAGEM TERMINOLÓGICA

A atual conceituação de dano moral na doutrina apresenta

algumas variações, tendo em vista que a sua denominação expressa relação

com o conceito de moral e, conseqüentemente com valor, essencialmente

variáveis no tempo e espaço59.

Nota-se que muitos doutrinadores concebem a expressão dano

moral no aspecto da dor física, à esfera dos sentimentos. É esse o panorama

apresentado na obra de Domingos de Melo60:

Neste particular a doutrina é pródiga em que pesem pequenas nuances, há uma concordância quanto a classificar a lesão que possa autorizar a indenização por danos morais, como aquela que atinge o âmago do indivíduo, causando-lhe dor (incluindo-se aí a incolumidade física), sofrimento, angústia, vexame ou humilhação, e por se passar no íntimo das pessoas, torna-se insusceptível de valoração pecuniária adequada.

O que se vê hodiernamente, porém, segundo Medeiros Neto61, é

uma tendência no sentido de se abolir o subjetivismo do campo do dano

extrapatrimonial, Por isso, aduz o autor que, atualmente, as definições mais

aceitas pautam-se pelo componente negativo, sendo elaboradas, pois,

59 MORAES, Gardênia Borges. Dano moral nas relações de trabalho, p. 30. 60 MELO, Nehemias Domingos de. Dano moral trabalhista: doutrina e jurisprudência, p. 15. 61 MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo, p. 54.

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considerando moral todo o dano que não seja de índole patrimonial. O tema é

tratado também por Simão de Melo62, ao afirmar que:

O dano moral sempre foi compreendido no nosso sistema jurídico como decorrente da dor em seu sentido moral de mágoa, de pesar e de aflição sofrida pela pessoa física. Porém, a partir da Constituição Federal de 1998, a noção de dano moral não mais se restringe à dor, sofrimento, tristeza, etc., como se infere no disposto nos incisos V e X do artigo 5º, que estendem sua abrangência a qualquer ataque ao nome ou imagem da pessoa física ou jurídica e das coletividades, para assegurar a sua credibilidade e responsabilidade no seio da sociedade.

Nessa linha encontra-se a conceituação de dano moral dada por

Diniz63:

O dano moral vem a ser a lesão de interesses não patrimoniais de pessoa física ou jurídica, provocada pelo fato lesivo. Qualquer lesão que alguém sofra no objeto de seu direito, repercutirá, necessariamente, em seu interesse; por isso, quando se distingue o dano patrimonial do moral, o critério da distinção não poderá ater-se à natureza ou índole do direito subjetivo atingido, mas ao interesse, que é pressuposto desse direito[...].

Complementa ainda a jurista que o dano moral não é a dor, a

angústia, o desgosto, a aflição espiritual, a humilhação, o complexo que sofre a

vítima do evento danoso, pois estes estados de espírito constituem o conteúdo,

ou melhor, a conseqüência do dano e que cada pessoa sente a seu modo.

Assim, o direito não repara qualquer padecimento, dor ou aflição, mas aqueles

que forem decorrentes da privação de um bem jurídico sobre o qual a vítima

teria interesse reconhecido juridicamente.

62 MELO, Raimundo Simão. Ação Coletiva de tutela do meio ambiente do trabalho. In: RIBEIRO JUNIOR, José Hortêncio et al. (Org.). Ação coletiva na visão de juízes e procuradores do trabalho, p. 188. 63 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil, p. 84 - 86.

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Pensamento semelhante se observa na obra de Venosa64, que ao

aduzir que a indenização pelo dano exclusivamente moral não possui o

acanhado aspecto de reparar unicamente o pretium doloris, mas busca

restaurar a dignidade do ofendido. Por isso, não há que se dizer que a

indenização por dano moral é um preço que se paga pela dor sofrida. Para

este autor, indeniza-se também quando a dignidade do ser humano é aviltada

com incômodos anormais na vida em sociedade.

Assinale-se também que o dano moral, compreendido de maneira

restritiva a partir significação terminológica ligada ao sentido único de dor ou

sofrimento, excluiria qualquer possibilidade de reparação de dano não-

patrimonial sofrido pela pessoa jurídica, quando já é consagrada a sua

admissão, de forma pacífica (pelo advento da edição da Súmula n. 227 pelo

STJ65) no Direito brasileiro.

Assim, observa-se que a tendência atual é dar maior amplitude ao

conceito de dano moral, e nessa tarefa merece destaque o conceito de

Belmonte66:

São danos morais as ofensas aos atributos físicos, valorativos e psíquicos ou intelectuais da pessoa, suscetíveis de gerar padecimentos sentimentais ou ainda como decorrência do uso não autorizado da imagem ou da violação do bom nome da pessoa jurídica, e finalmente, os causados aos valores culturais de certa comunidade.

O entendimento externado por Domingos de Melo67 também se

revela completo e atual:

Com advento do novo Código Civil e cotejando os avanços doutrinários e jurisprudenciais, ousamos afirmar que o dano moral é toda agressão injusta àqueles bens imateriais, tanto de pessoa física quanto de pessoa jurídica ou da coletividade, insusceptível de quantificação pecuniária, porém indenizável

64 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: responsabilidade civil, p. 281. 65 Súmula 227 do STJ: “A pessoa jurídica pode sofrer dano moral”. 66 BELMONTE, Alexandre Agra. Danos morais no direito do trabalho – Identificação e composição dos danos morais trabalhistas, p. 94. 67 MELO, Nehemias Domingos de. Dano moral trabalhista: doutrina e jurisprudência, p. 16.

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com tríplice finalidade: satisfativo para a vítima, dissuasório para o ofensor e de exemplaridade para a sociedade.

Finalmente, colhe-se o ensinamento de Medeiros Neto68, que

sustenta:

O dano moral ou extrapatrimonial consiste na lesão injusta e relevante ocasionada a determinados interesses não-materiais, sem eqüipolência econômica, porém concebidos e assimilados pelo ordenamento como valores e bens jurídicos protegidos, integrantes do leque de projeção interna (como intimidade, a liberdade, a privatividade, o bem-estar, o equilíbrio psíquico e a paz) ou externa (como o nome, a reputação e a consideração social) inerente à personalidade do ser humano (abrangendo todas as áreas de extensão e tutela da sua dignidade), podendo também alcançar os valores e bens extrapatrimoniais reconhecidos à pessoa jurídica ou uma coletividade de pessoas.

Acerca dessa concepção mais abrangente de dano moral aqui

apresentada, afirma o referido autor que a expressão “dano moral” tem

recebido críticas, considerando-se que a sua noção, desde a concepção, ligar-

se-ia à esfera da dor e do sofrimento, aspectos puramente subjetivos, referidos

ao campo dos sentimentos. Daí porque não se adequaria tal termo à

compreensão do dano impingido a interesses que, mesmo não refletindo

natureza patrimonial e igualmente postando-se alheios à esfera do sentir, estão

inegavelmente enquadrados como direitos inerentes à projeção de valores e

bens ínsitos à dignidade humana, em sua ampla visualização, a exemplo do

que representa o direito ao respeito ao nome, à consideração e reputação

social, o direito do autor e o direito à imagem.

Martins69 também observa essa crítica ao instituto do dano moral,

afirmando que essa se dá em razão da polissemia da palavra moral, que tem

vários significados num âmbito histórico e cultural. Ocorre que pela força da

ampla utilização restou consagrada na doutrina, na legislação e, por

conseqüência, na seara jurisprudencial a expressão dano moral.

68 MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo, p. 56. 69 MARTINS, Sérgio Pinto. Dano moral decorrente do contrato de trabalho, p. 17

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Conclui-se, portanto, que o dano moral não necessariamente

causa um sofrimento, mas pode causar um inegável prejuízo social, uma vez

que pode afetar um direito inerente à personalidade, que não causa sofrimento,

como, por exemplo, a utilização da imagem da pessoa, sem autorização.

Expostas essas considerações, nesta pesquisa opta-se pela

utilização, como sinônimos, dos termos dano moral, dano extrapatrimonial e

não-patrimonial, uma vez que refletem o sentido mais abrangente possível

quanto às possibilidades de reparação dessas espécies de dano, abstraindo-

se, portanto, a rigidez do enfoque terminológico70.

2.1.1 Fundamento no ordenamento jurídico brasileiro

No Brasil, uma legislação esparsa e fracionária adiantou-se ao

legislador constituinte na aceitação e afirmação da indenização do Dano Moral,

embora tímida. É o que informa Stoco71, exemplificando que existiam alguns

preceitos isolados em nosso revogado Código Civil de 1916 que tratavam

sobre o legítimo interesse moral em casos muito específicos. Informa ainda que

havia previsões estanques na Lei de Imprensa (Lei n. 5250, de 09.02.1967) e

no Código Brasileiro de Telecomunicações (Lei n. 4.117, de 27.08.1962). E

acrescenta:

Mas, avançando além das regras ou normas meramente programáticas, foi com o advento da Constituição Federal de 1988 que a aceitação plena da reparação por dano moral se consagrou e a inviolabilidade dos bens inerentes à personalidade foi afirmada e efetivamente protegida. [...] Desse modo saímos de um prolongado período de obscurantismo, marcado pela supressão de direitos, retornando com a Carta Magna alguns direitos suprimidos, esquecidos ou perdidos no tempo.

70 Essa utilização de expressões como sinônimos é sugerida na obra de Medeiros Neto. MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo, p. 49. 71 STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil, p. 1663.

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Assim, assevera Domingos de Melo72 que a indenização por dano

moral no Brasil encontra-se hoje em plena fase de total aceitação, pois com o

advento da Constituição Federal de 1988 pacificou-se a questão da

aceitabilidade da tese de reparação integral da ofensa moral, pois nos incisos V

e X do art. 5º da Lei Maior, alcançou status constitucional a proteção dos bens

imateriais do indivíduo.

O dispositivo citado dispõe que:

Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

[...]

V – é assegurado o direito de respostas, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem.

[...]

X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.

Quando efetivamente assegura o direito à indenização por danos

morais, Piccolotto73 afirma que a norma constitucional está a fazê-lo de forma

ampla e irrestrita, não impondo qualquer restrição ou limites. Há que se

entender, então, que essa indenização deve ser a mais ampla e abrangente

possível. Assim, conclui o autor que todo cidadão que tenha sofrido qualquer

moléstia ao seu patrimônio imaterial – vale dizer aos seus direitos de

personalidade – pode buscar a devida indenização ou compensação,

ancorando seu pedido diretamente na CRFB/88, já que seu direito está erigido

à categoria de norma constitucional.

72 MELO, Nehemias Domingos de. Dano moral trabalhista: doutrina e jurisprudência, p. 25. 73 PICCOLOTTO, Neltair. Dano moral: caracterização e reparação, p. 61-62.

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Nota-se, porém, que determinar se as hipóteses previstas da

Constituição são taxativas ou meramente exemplificativas gera discussão entre

os doutrinadores. Prevalece o entendimento aqui explicitado por Moraes74:

A enumeração é meramente exemplificativa, sendo lícito à jurisprudência e à lei ordinária aditar outros casos. Aludindo a determinados direitos, a constituição estabeleceu o mínimo. Não se trata, obviamente, de “numerus clausus”, ou enumeração taxativa. Esses mencionados na alíneas constitucionais, não são os únicos direitos cuja violação sujeita o agente a reparar. Não podem ser reduzidos, por via legislativa, porque inscritos na Constituição. Podem, contudo, ser ampliados pela legislatura ordinária, como podem ainda receber extensão por via de interpretação.

Tendo a CRFB/88 enunciado um princípio geral, pode-se afirmar,

sem sombra de dúvida, que a admissibilidade do dano moral é hoje matéria

pacífica nos pretórios e nos escritos dos estudiosos do Direito, tornando as

discussões acerca da existência dessa espécie de dano apenas referências

históricas. 75

Para Martins76 também não há mais dúvida da reparabilidade do

dano moral, já que atualmente o art. 186 do Código Civil de 2002 é claro:

“aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar

direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato

ilícito”.

Já na visão de Stoco77, o Código Civil de 2002, lamentavelmente,

nesta quadra, postou-se na contramão da história, pois é extremamente tímido

com relação ao dano moral ao fazer menção a ele apenas no art. 186, e ainda

de passagem. No momento em que afirma tal preceito, o jurista conclui que

não obstante a omissão do Código Civil de 2002, a ênfase que os aspectos

morais mereceram na CRFB/88 terá de produzir:

74 MORAES, Gardênia Borges. Dano moral nas relações de trabalho, p. 62. 75 MORAES, Gardênia Borges. Dano moral nas relações de trabalho, p. 62. 76 MARTINS, Sérgio Pinto. Dano moral decorrente do contrato de trabalho, p. 62-63. 77 STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil, p. 1664.

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[...] conseqüências no âmbito dos direitos obrigacionais, na teoria dos contratos, na teoria da responsabilidade civil, no relacionamento familiar [...] no plano dos direitos intelectuais e em outros campos da vida privada.

No plano do direito material, Belmonte78 cita, ainda, quanto à

questão dos danos morais:

- O Código de Processo Civil, de 1973, que estabelece disposição genérica a respeito do interesse (art. 3º), não o restringindo ao patrimonial e que com base na atual redação da Lei da Ação Civil Pública, conforme modificação imposta no caput e inciso IV do art. 1º pelo art. 88 da Lei n 8.884/94, os danos morais podem ser postulados inclusive pelo Ministério Público em ação de responsabilidade civil reparadora de interesses difusos e coletivos ofendidos;

- O Código de Proteção e Defesa do Consumidor (Lei n. 8.078/91), que dispõe que são direitos básicos do consumidor a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos (art. 6º, VI); e o acesso aos órgão judiciários e administrativos, com vistas à prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais (art. 6º, VII);

- Quanto à jurisprudência, a Súmula 37 do Superior Tribunal de Justiça, que consolidou o entendimento de que “São cumuláveis as indenizações por dano material e dano moral oriundos do mesmo fato”. Neste item observa-se que ao admitir a cumulação, admite-se então não só a existência como a autonomia do dano moral.

Verifica-se, portanto, que a possibilidade de reparação dos danos

morais no Brasil restou sedimentada com o advento da CRFB/88, bem como

com os dispositivos infraconstitucionais citados.

78 BELMONTE, Alexandre Agra. Danos morais no direito do trabalho – Identificação e composição dos danos morais trabalhistas, p. 100-101.

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2.2 DANO MORAL DECORRENTE DAS RELAÇÕES DE TRABALHO

Pode-se definir o dano moral decorrente das relações de trabalho,

segundo anota Domingos de Melo79, como sendo:

[...] o agravo ou o constrangimento moral infligido quer ao

empregado, quer ao empregador, mediante violação a direitos

ínsitos à personalidade, como conseqüência da relação de

emprego.

De sua vez, Belmonte80 define o dano moral decorrente da

relação de trabalho como:

[...] as ofensas aos atributos físicos, valorativos e psíquicos ou intelectuais decorrentes da relação de trabalho, suscetíveis de gerar padecimentos sentimentais ou ainda como decorrência do uso não autorizado da imagem ou da violação do bom nome da pessoa jurídica e, finalmente, os causados aos valores culturais de certa comunidade.

Até o advento da CRFB/88, segundo registra Domingos de

Melo81, é possível afirmar que praticamente não se falava em dano moral

trabalhista. Mesmo após a Constituição e até meados dos anos noventa, aduz

o autor que poucos eram os trabalhos doutrinários sobre a matéria, postos à

disposição dos operadores do direito. O mesmo é dito com relação à

jurisprudência, que era extremamente rarefeita. Porém, a partir de 1995

diversos autores renomados passaram a defender a possibilidade de que o

trabalhador pudesse ser vítima de dano moral e indenizado com fundamento

na responsabilidade civil, independentemente das indenizações tarifárias,

reguladas no Direito do Trabalho.

79 MELO, Nehemias Domingos de. Dano moral trabalhista: doutrina e jurisprudência, p. 21. 80 BELMONTE, Alexandre Agra. Danos morais no direito do trabalho – Identificação e composição dos danos morais trabalhistas, p. 117-118. 81 MELO, Nehemias Domingos de. Dano moral trabalhista: doutrina e jurisprudência, p. 21-22.

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O que se observa é que o Direito do Trabalho também é chamado

a contribuir para com o respeito entre os homens, e a conseqüente e

sintonizada evolução do Direito brasileiro, posto que as relações de trabalho,

indiscutivelmente, também são palco das ofensas que afetam a personalidade

da pessoa humana, acarretando intranqüilidade nas relações jurídicas 82.

Se na vida em sociedade de uma forma geral, nas constantes

interações existentes entre os sujeitos, podem surgir controvérsias e conflitos,

nas relações de trabalho tal assume um caráter especial. Segundo anota

Moraes83, isso ocorre porque:

[...] na relação de trabalho, os seres humanos, inicialmente iguais, passam a ser desiguais na medida em que uma parte se apresenta como possuidora do capital e a outra da força de trabalho, relacionando-se, pois, com uma parte subordinada à outra, restando ao Direito, em especial o Direito do Trabalho, a tarefa de buscar a restauração da igualdade entre os sujeitos.

Nessa linha, constata-se que apesar de o Dano Moral nas

relações de trabalho poder ser praticado pelo empregado contra o empregador,

quanto por este contra aquele, em razão da subordinação a que está

submetido, é o trabalhador quem mais está exposto a esta possibilidade. Com

muito maior freqüência, se pode identificar a prática de atos ilícitos perpretados

pelo empregador contra o empregado, em razão da própria hierarquia interna

em que o empregado se submete à sua direção, a qual o vê, na maioria das

vezes, como alguém submisso às suas ordens, de forma arbitrária84.

Em relação à previsão do dano moral na legislação trabalhista, o

jurista Martins85 observa que o Direito do Trabalho não trata exatamente do

dano moral ou da sua responsabilidade, uma vez que a CLT nada dispõe sobre

o tema. Invoca, porém, o parágrafo único do artigo 8º da CLT, que reza: “o

direito comum será fonte subsidiária do direito do trabalho, naquilo em que não

82 FLORINDO, Valdir. Dano moral e o direito do trabalho, p. 75. 83 MORAES, Gardênia Borges. Dano moral nas relações de trabalho, p. 67-68. 84 MELO, Nehemias Domingos de. Dano moral trabalhista: doutrina e jurisprudência, p. 22-23. 85 MARTINS, Sérgio Pinto. Dano moral decorrente do contrato de trabalho, p. 62.

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for incompatível com os princípios fundamentais deste”. Após apresentar este

artigo, o autor afirma:

O dano moral é compatível com os princípios fundamentais do Direito do Trabalho, que também visa proteger a intimidade do trabalhador. Direito comum é o Direito Civil. É desnecessário que a norma pertença ao campo do Direito do Trabalho para ser aplicada na justiça laboral, podendo pertencer ao Direito Civil e ter incidência na relação de emprego.

De acordo com o que se colhe do artigo 186 do Código Civil,

“aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar

direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato

ilícito”. Assim, aplica-se esse preceito às relações de trabalho, e não há dúvida

a respeito da reparabilidade do dano moral no âmbito trabalhista.

Após aferir-se que o dano moral ocorrido na seara trabalhista

independe de previsão expressa na CLT para ser indenizado, observa-se no

próximo item desta pesquisa a competência para julgar o dano moral

trabalhista.

2.2.1 Competência da Justiça do Trabalho

Segundo Belmonte86, anteriormente à Emenda Constitucional n.

45 de 2004, era possível separar em grupos os posicionamentos relacionados

ao tema da configuração de dano moral de natureza especificamente

trabalhista. Assim, havia os que admitiam a reparação do dano moral nas

relações de trabalho e a competência da Justiça do Trabalho para a apreciação

dos conflitos a ele relacionados; bem como aqueles que entendiam ser de

natureza civil eventual dano moral entre empregado e empregador e a absoluta

incompetência da Justiça do Trabalho para solução dos conflitos relacionados

ao tema.

86 BELMONTE, Alexandre Agra. Danos morais no direito do trabalho – Identificação e composição dos danos morais trabalhistas, p. 107-108.

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Porém, a aprovação da EC n. 45 de 2004 promoveu diversas

mudanças no Poder Judiciário, especialmente no que diz respeito à

competência da Justiça do Trabalho, que restou significativamente ampliada,

atendendo assim aos justos reclamos da comunidade jurídica nacional 87.

O disposto no art. 114 da Constituição teve sua redação dada

pela referida emenda, e no tocante à competência da Justiça do Trabalho

frente ao dano moral, reza que: “Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho

processar e julgar: [..] VI - as ações de indenização por dano moral ou

patrimonial, decorrentes da relação de trabalho;”.

Com esta redação, fica nítida a competência da Justiça do

Trabalho para dirimir as questões que tratem acerca da reparação do dano

moral oriundo das relações de trabalho. Nesse norte é a lição de Martins88:

O inciso VI do art. 114 da Constituição, de acordo com a redação da Emenda Constitucional n. 45/2004, dirimiu a dúvida, ao estabelecer que as ações de indenização por dano moral ou patrimonial são da competência da Justiça do Trabalho, desde que decorrentes da relação de trabalho. Exige-se como requisito que a questão decorra da relação de trabalho, que abrange a relação de emprego. Dessa forma, nas questões de empreitada envolvendo dano moral ou material também serão da competência da Justiça do Trabalho.

E, nessa mesma linha de pensamento, colhem-se também as

eficientes palavras de Carrion89 sobre o dano moral na Justiça do Trabalho:

Pensamos que a circunstância de ter-se que recorrer ao direito civil para fundamentá-lo não afasta a competência da Justiça do Trabalho, quando a relação material a ela pertença; inclusive na relação de trabalho sem relação de emprego. E parece evidente a conveniência de que o juiz laboral, experiente em despedimentos motivados e imotivados, seja competente para distinguir a atuação legítima da abusiva, quando da fixação da indenização.

87 MELO, Nehemias Domingos de. Dano moral trabalhista: doutrina e jurisprudência, p. 171. 88 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito processual do trabalho: doutrina e prática forense, p. 119. 89 CARRION, Valentim. Comentários à consolidação das leis do trabalho, p. 371-372.

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No campo jurisprudencial o entendimento de que a Justiça do

Trabalho é competente para julgar questões que envolvam a reparação de

dano moral decorrente da relação de trabalho também já foi fixado. É o que

colhe da Súmula 392 do TST: “Nos termos do artigo 114 da CF/88, a Justiça do

Trabalho é competente para dirimir controvérsias referentes à indenização por

dano moral, quando decorrente da relação de trabalho”.

Conclui-se, diante da lente do art. 114 da CRFB/88, do

posicionamento doutrinário e jurisprudencial, que é da Justiça do Trabalho a

competência para apreciar o dano moral que tenha se originado na relação de

trabalho.

2. 3 DANO MORAL COLETIVO

A proteção jurídica a interesses titularizados por coletividades de

pessoas e caracterizados pela natureza extrapatrimonial foi propiciada,

conforme registra Medeiros Neto90, por duas ordens de fatores. Ensina o jurista:

A primeira delas identifica-se com o movimento de abertura do sistema jurídico visando à plena proteção aos direitos inerentes à personalidade e também referidos à dignidade humana, em todo o alcance possível, a propiciar o surgimento de novos campos de tutela. Veja-se, nessa quadra, a aceitação da hipótese de dano moral objetivo (ferimento do direito ao nome, à consideração e à reputação social), abarcando, inclusive, a esfera extrapatrimonial peculiar às pessoas jurídicas.

Repise-se que é importante fazer referência à pessoa jurídica

porque só foi possível cogitar-se do Dano Moral Coletivo a partir do momento

em que houve um alargamento da aceitação da tese de reparação por danos

morais para permitir figurar no pólo passivo um ente jurídico, diferente da

pessoa física individualmente considerada91.

90 MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo, p. 125. 91 MELO, Nehemias Domingos de. Dano moral trabalhista: doutrina e jurisprudência, p. 26.

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Registra, a propósito, Cahali92 que esvaindo-se paulatinamente o

dano moral, na sua versão mais atualizada, de seus contingentes

exclusivamente subjetivos de “dor”, “sofrimento”, “angústia”, para projetar

objetivamente os seus efeitos de modo a compreender também as lesões à

honorabilidade, ao respeito, à consideração e ao apreço social, ao prestígio e à

credibilidade nas relações jurídicas do cotidiano, de modo a afirmar-se a

indenizibilidade dos danos morais infligidos às pessoas jurídicas ou coletivas, já

se caminha, com fácil trânsito, para o reconhecimento da existência de danos

morais reparáveis.

Já o segundo aspecto apontado por Medeiros Neto93, se vê

estampado no fenômeno da coletivização do direito, que é fruto de uma

sociedade de massas, de relações e conflitos multiformes e amplificados no

universo social, geradores de interesses próprios atinente a coletividades de

pessoas (grupos, categorias ou classes), exigindo uma estrutura jurídica,

material e processual necessária e adequada à sua defesa, como já foi

demonstrado no primeiro capítulo desta pesquisa.

A renovação que se impôs nos sistemas jurídicos associa o

acesso coletivo à Justiça ao caráter de direito fundamental, que além de

oportunizar a proteção jurisdicional evita a vulgarização de sua fragmentação,

conferindo maior importância política à ações destinadas à extinção dos

conflitos coletivos. Essas são as ponderações feitas no estudo de Lyra94, que

acertadamente conclui:

Surge, assim, uma nova tendência de não mais proteger o direito a algumas pessoas determinadas ou grupos, mas uma proteção a interesses de grupos integrados por uma pluralidade de pessoas indeterminadas, embora vinculadas sobre um mesmo interesse comum.

92 CAHALI, Yussef Said.Dano Moral, p. 387. 93 MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo, p. 125. 94LYRA, Bruna. Os direitos metaindividuais analisados sob a ótica dos direitos fundamentais. In: LEITE, Carlos Henrique Bezerra (Coord.). Direitos Metaindividuais, p. 35.

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É em meio a esse contexto de coletivização de direitos e

reconhecimento da importância dos direitos transindividuais, portanto, que cabe

se falar em Dano Moral Coletivo.

2.3.1 Conceito e crítica terminológica

Observa-se que a doutrina pátria tem se esforçado para definir

adequadamente o Dano Moral Coletivo. Bittar Filho apud Domingos de Melo95

procurou defini-lo afirmando ser:

[...] a injusta lesão da esfera moral de uma dada comunidade, ou seja, é a violação antijurídica de um determinado círculo de valores coletivos. Quando se fala em dano moral coletivo, está-se fazendo menção ao fato de que o patrimônio valorativo de uma certa comunidade (maior ou menor), idealmente considerado, foi agredido de maneira absolutamente injustificável do ponto de vista jurídico: que isso dizer, em última instância, que se feriu a própria cultura, em seu aspecto imaterial.

Já na lição de Medeiros Neto96 colhe-se:

O dano moral coletivo corresponde à lesão injusta e intolerável a interesses ou direito titularizados pela coletividade (considerada em seu todo ou em qualquer de suas expressões – grupos, classes ou categorias de pessoas), os quais possuem natureza extrapatrimonial, refletindo valores e bens fundamentais para a sociedade.

Ainda nesse passo é o conceito trazido à baila por Belmonte97:

Dano moral coletivo é a lesão aos valores culturais de uma sociedade ou a agressão aos valores extrapatrimoniais de uma certa comunidade, como ocorre, por exemplo, com a ofensa

95 BITTAR FILHO, Carlos Alberto apud MELO, Nehemias Domingos de. Dano moral trabalhista: doutrina e jurisprudência, p. 16. 96 MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo, p. 137. 97 BELMONTE, Alexandre Agra. Danos morais no direito do trabalho – Identificação e composição dos danos morais trabalhistas, p. 165.

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aos valores e credos de determinada religião e a discriminação de determinada sociedade.

Assim, conclui-se que toda vez que se vislumbrar o ferimento a

interesse extrapatrimonial de uma coletividade, configurar-se-á dano possível

de reparação, abrangendo não só o abalo, a repulsa, a indignação, mas

também a diminuição da estima infligida e apreendida em dimensão coletiva.

Essa espécie de dano aqui conceituada foi consagrada com a

expressão Dano Moral Coletivo. Para Medeiros Neto98 o uso dessa expressão

é passível de crítica. Isso porque, conforme já abordado no início deste

capítulo, o termo moral sempre esteve mais próximo de uma tradução de dano

relacionado com o sentimento e a dor física ou psíquica, a revelar, sem dúvida,

no atual estágio da evolução da responsabilidade civil, uma posição teórica

incompleta e ultrapassada.

Diante dessa ponderação, mais apropriado seria adotar-se a

terminologia dano extrapatrimonial coletivo, uma vez que o dano

extrapatrimonial é, em qualquer caso, aquele que não se faz suscetível de ser

avaliado ou quantificado pecuniariamente, não se vinculando por lógico,

exclusivamente à observação de sofrimento demonstrado pela vítima. Porém,

faz-se necessária a utilização da expressão Dano Moral Coletivo, uma vez que

restou consagrada pelo uso, inclusive no ordenamento jurídico 99.

2.3.2 Reconhecimento constitucional

No Brasil, durante um longo período, a aceitação da tese da

reparabilidade do dano moral esteve restrita exclusivamente às pessoas

naturais e individualmente consideradas100. Contudo, esta questão foi sendo

superada após o advento da CRFB/88, com a adoção do princípio basilar da

reparação integral previsto no art. 5º, incisos V e X (conforme já explanou-se

98 MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo, p. 123. 99 MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo, p. 124-125. 100 MELO, Nehemias Domingos de. Dano moral trabalhista: doutrina e jurisprudência, p. 26.

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no Título 2.1 deste Capítulo) que reafirma a primazia da tutela jurídica em toda

a extensão e alcance de danos.

Como se vê, a Constituição abarcou toda espécie de dano moral.

Acertadamente, nesse sentido, encontram-se os apontamentos de Schiavi101:

O fundamento da reparação do dano moral coletivo está no artigo 5º, X, da CF assim redigido: [...] Ora, a Constituição menciona pessoas no plural, denotando que o dano moral pode transcender o interesse individual e atingir a esfera coletiva. Como é regra de hermenêutica: a lei não contém palavras inúteis e, em se tratando de direitos fundamentais, a Constituição deve ser interpretada à luz do princípio da máxima eficiência (Canotilho). Além disso, a reparação coletiva do dano moral prestigia os princípios alinhavados no próprio artigo 1º da Constituição Federal: cidadania (inciso II), dignidade da pessoa humana (inciso III); do artigo 3º, da Constituição Federal: construção de uma sociedade livre, justa e solidária (inciso I), garantia do desenvolvimento nacional (II) e promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor idade e quaisquer outras formas de discriminação (IV) e artigo 4º: prevalência dos direitos humanos ( II).

Seguindo a visão constitucional, observa Medeiros Neto102 que o

art.129, inciso III, conferiu legitimação qualificada ao Ministério Público para o

manuseio da ação civil pública na tutela de qualquer interesse difuso ou

coletivo. Assim, a ação civil pública tornou-se instrumento de alçada

constitucional apto a ser utilizado pelo Parquet para a proteção de todo e

qualquer interesse de natureza transindividual, inclusive os de feição

extrapatrimonial.

Em vista dos dispositivos citados, é certo afirmar, portanto, que o

reconhecimento do Dano Moral Coletivo e a possibilidade de sua reparação

alcançaram, explícita e indiscutivelmente, fundamento e respaldo

constitucional.

101 SCHIAVI, Mauro. Dano moral coletivo decorrente da relação de trabalho. Disponível em: <www.la cier.com.br/artigos.htm>. Acesso em 04 de setembro 2008 102 MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo, p. 138.

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2.3.3 Previsão infraconstitucional

Segundo as palavras do professor Medeiros Neto103, foi em 1990,

com o advento do CDC, que se sedimentou, de maneira explícita, no plano

infraconstitucional, a base legal para a tutela efetiva do Dano Moral Coletivo.

Informa o jurista que isso se deu pelos motivos que serão expostos a seguir.

A primeira razão se observa no art. 110 desse Código, que

acrescentou o inciso IV ao art. 1º da LACP, estendendo a sua utilização, a

partir de então, a qualquer interesse difuso ou coletivo, ficando com a seguinte

redação:

“Art. 1º. Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da ação popular, as ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados:

l - ao meio-ambiente;

ll - ao consumidor;

III - a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico;

IV - a qualquer outro interesse difuso ou coletivo;

V - por infração da ordem econômica e economia popular;

VI - à ordem urbanística. “ (grifou-se)

O segundo motivo fica evidente diante da integração de ambos os

diplomas legais (CDC e LACP), constituindo um novo sistema, próprio à tutela

coletiva. O art. 117 do CDC acrescentou o art. 21 à LACP: “Art. 21 Aplicam-se

à defesa dos direitos e interesses difusos, coletivos e individuais, no que for

cabível, os dispositivos do Título III da lei que instituiu o Código de Defesa do

Consumidor." A saber, o título III do Código consumerista trata da defesa do

consumidor em juízo.

A terceira razão apontada é observada na redação do parágrafo

único do art. 2º do CDC, que equiparou ao consumidor a “coletividade de

103 MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo, p. 140.

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pessoas, ainda que indetermináveis”, para efeito da sua proteção nas relações

em que intervier, com o que se reconheceu, legalmente, à coletividade, a

condição de titular de direitos.

O quarto motivo pelo qual o CDC sedimentou a base legal para a

tutela do Dano Moral Coletivo, colhe-se, segundo indica Medeiros Neto104, da

redação dos incisos VI e VII do art 6º daquele Código:

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

[...]

VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos;

VII - o acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vistas à prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou difusos, assegurada a proteção Jurídica, administrativa e técnica aos necessitados;

Porém, além do CDC, o autor105 registra que outros diplomas

legais foram importantes para sedimentar a base legal do Dano Moral Coletivo,

como a Lei Complementar n. 75/93 (LOMPU):

Faz-se alusão, também, no que se refere à amplíssima possibilidade de defesa de interesses transindividuais – reforçando, assim, a viabilidade da tutela ao dano moral coletivo --, ao advento da Lei Complementar n.75/93 (Lei Orgânica do Ministério Público da União), que previu o manejo da ação civil pública com vistas à proteção dos direitos constitucionais; do patrimônio público e social; do meio ambiente; dos bens e direitos de valor artístico; estético; histórico; turístico e paisagístico; dos interesses individuais indisponíveis, difusos, coletivos, relativos às comunidade indígenas, à família, à criança, ao adolescente, ao idoso, às minorias étnicas e ao consumidor; além de outros interesses individuais indisponíveis, homogêneos, sociais, difusos e coletivos (art. 6º, VII, a a d).

104 MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo, p. 141. 105 MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo, p. 141.

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De igual forma, deve-se invocar a Lei n. 8.625/93 (Lei Orgânica do

Ministério Público dos Estados), que assegura, sem restrições, a destinação da

ação civil pública aos interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos

(art. 25, inciso IV, alínea “a”).

Diante dos diplomais legais colacionados, extrai-se da obra de

Medeiros Neto106 a seguinte convicção:

Enfim, cabe asseverar que a coletividade, em qualquer de suas expressões, é titular de interesses de natureza extrapatrimonial – reconhecidos e amparados pelo sistema jurídico --, e que são passíveis de defesa pelos instrumentos processuais adequados à tutela jurisdicional coletiva nessa seara: a ação popular, em sua específica, e a ação civil pública, em todas as esferas de incidência de danos coletivos.

É assim que se assenta, portanto, a base legal voltada para a

reparação do Dano Moral Coletivo.

2.3.4 Responsabilidade objetiva

Nos moldes estabelecidos no atual Código Civil, a

responsabilidade ainda se funda, em regra, na culpa, de tal sorte que surgirá o

dever de indenizar a partir de uma ação que tanto pode ser comissiva quanto

omissiva, desde que contenha em seu bojo um ato ilícito, que se provará

mediante a demonstração de culpa do agente107.

Porém, informa Medeiros Neto108 que, em face da caracterização

do Dano Moral Coletivo, o ofensor responderá pela respectiva reparação,

independentemente da configuração da culpa, com fundamento no parágrafo

único do art. 927 do Código Civil:

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

106MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo, p. 143. 107 MELO, Nehemias Domingos de. Dano moral trabalhista: doutrina e jurisprudência, p. 43. 108 MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo, p. 144.

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Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

Ao ilustrar o tema, o referido jurista observa que a administração

de determinada empresa que desconhecia, e mesmo jamais permitiria, no

âmbito das respectivas atividade, a existência de situações caracterizadoras de

práticas ilícitas (discriminatórias, abusivas ou fraudulentas), em detrimento da

coletividade de empregados ou grupos específicos de trabalhadores, arcará

com a responsabilidade decorrente de tais irregularidades, dentre elas se

destacando a reparação pelo Dano Moral Coletivo, em face da só

demonstração dos fatos antijurídicos identificados em seu estabelecimento.

Nesse norte são as palavras de Carvalho109:

[...] surge o recém-denominado dano moral coletivo. O dano moral, portanto, deixa a concepção individualista caracterizadora da responsabilidade civil para assumir uma outra mais socializada, preocupada com valores de uma determinada comunidade e não apenas com o valor da pessoa individualizada. A transformação, portanto, da responsabilidade por dano individual para a responsabilidade por dano difuso, e também para o dano coletivo, impõe a adoção da responsabilidade objetiva para a reparação de todos os direitos difusos lesados.

Esse autor consigna ainda que o critério da culpa, na

responsabilidade civil, foi concebido para relações jurídicas intersubjetivas,

quando aos juristas ainda não se havia revelado o fenômeno da coletivização

do direito. Evidente que tal sistema não pode ser estendido a um direito

coletivo, em que o dano não atinge apenas um único personagem, mas

potencialmente todos os integrantes da coletividade.

Assim se fundamenta, portanto, o abandono da regra geral da

responsabilidade subjetiva pelo critério objetivo nas relações jurídicas coletivas. 109 CARVALHO, Luiz Gustavo Grandinetti de. Informação como bem de consumo. Disponível em: <http://www.estacio.br/graduacao/direito/publicacoes/dir_infbe mcons.asp>. Acesso em: 15 de setembro de 2008.

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2.3.5 Prova

Muitos autores têm afirmado que o dano moral dispensa

necessidade de prova do prejuízo, conformando-se a ordem jurídica com a

demonstração do ilícito, porquanto o dano moral estaria configurado desde que

demonstrado o fato ofensivo. Um deles é Florindo110, que adverte:

Certamente, o dano moral, ao contrário do material, não reclama prova específica do prejuízo objetivo, porque o gravame decorre do próprio resultado da ofensa. Daí, não há falar-se em prova do dano moral, mas sim certeza sobre o fato, desde que haja inequívoca relevância jurídica na ofensa, obviamente.

Idênticos, neste aspecto, são os apontamentos de Belmonte111,

ao aduzir que a prova se revela absolutamente desnecessária, pois, provado o

fato, provado está o dano, como no caso de uso não autorizado da imagem e

da ofensa à honra.

Segundo Medeiros Neto112, o Dano Moral Coletivo, por sua vez,

também é observado in re ipsa, ou seja, é perceptível e verificado em

decorrência da conduta ilícita presente, que viola de maneira injusta e

intolerável interesses de natureza transindividual. Assim, não se cogita, com

vistas à sua demonstração, de prova do prejuízo, considerando-se que o dano

se evidencia do próprio fato da violação, este sim passível de comprovação.

O supra citado autor informa ainda, sobre o tema, que o STJ

mantém remansosa jurisprudência nessa linha de entendimento, sempre a

firmar que a presunção de existência do dano moral decorre in re ipsa,

bastando a constatação do ato ilícito para concretizar o direito à reparação.

110 FLORINDO, Valdir. Dano moral e o direito do trabalho, p. 351. 111 BELMONTE, Alexandre Agra. Danos morais no direito do trabalho – Identificação e composição dos danos morais trabalhistas, p. 104. 112 MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo, p. 146.

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Reitere-se, portanto, que a caracterização do Dano Moral Coletivo

exige uma conduta antijurídica atribuída ao ofensor e lesiva a direito

transindividual, não necessitando da prova do prejuízo, já que os efeitos do

dano na coletividade, como insegurança, menosprezo e indignação, não

podem ser objeto de prova.

2.3.6 Reparação e preponderância da função sancionatória

É inegável a importância, para a sociedade, da previsão e certeza

quanto a uma condenação efetiva, em casos de violação intolerável à

interesses transindividuais, frente à proteção e tutela constitucional de tais

direitos.

Observa-se, no entanto, que a reparação do Dano Moral Coletivo

ocorre diferentemente da reparação do dano individual. Assim ensina Medeiros

Neto113:

Está-se a cuidar, nesta quadra, de uma modalidade peculiar de resposta possível e eficaz do sistema jurídico, imprescindível à garantia da sua respeitabilidade, e que é direcionada ao ofensor, em face da violação de direitos coletivos de natureza extrapatrimonial. Portanto, o que se concebe como reparação de dano moral coletivo constitui uma espécie de reação jurídica necessária diante da intolerável lesão de direitos transindividuais, guardando especificidade e congruência com a lógica e a racionalidade inerentes à tutela desses interesses, aceitando-se, pois, denominá-la, para fins didáticos, de reparação.

[...] Assim, a condenação consistente na fixação de uma parcela pecuniária importa ao ofensor corresponde à forma de resposta concebida pelo sistema jurídico, equivalente ao que se convencionou chamar de reparação em sede de dano moral coletivo, e que constitui uma espécie de indenização punitiva. (grifou-se)

113MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo, p. 156.

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A previsão legal para tal reparação, que constitui uma espécie de

indenização punitiva, encontra-se na LACP, que já em seu art. 1º faz referência

às ações de responsabilidade por danos morais causados a qualquer interesse

ou direito difuso ou coletivo. Prevê, ainda, o art. 13 dessa lei a possibilidade de

ser fixada a indenização em dinheiro, a título de indenização por dano causado:

Art. 13. Havendo condenação em dinheiro, a indenização pelo dano causado reverterá a um fundo gerido por um Conselho Federal ou por Conselhos Estaduais de que participação necessariamente o Ministério Público e representantes da comunidade, sendo seus recursos destinados à reconstituição dos bens lesados.

A relevância dessa previsão legal é apontada por Medeiros

Neto114, ao informar que a não-admissão de uma forma própria de reparação

representaria fator de incentivo à prática de certas condutas gravosas em que o

ofensor aufere vantagem econômica, atingindo bens fundamentais da

sociedade. Assim, essa realidade traduziria um estado de indignação e

descrédito da coletividade para com o sistema jurídico.

Nessas situações que envolvem interesses e direitos

transindividuais, apenas exigir do ofensor o ajustamento da sua conduta aos

ditames legais, seguido da simples indenização pelos danos materiais,

refletiria, no plano da responsabilização, uma resposta débil, sem força

sancionatória para o autor ou mesmo para obstar novas violações 115.

Faz-se necessário, portanto, pontuar que a condenação

pecuniária em sede de Dano Moral Coletivo, prevista como o equivalente a

uma espécie de reparação punitiva, apresenta natureza preponderantemente

sancionatória, em relação ao ofensor, com pretensão dissuasória, também,

diante de terceiros. É o que explica Carvalho116, afirmando ainda que afasta-se,

portanto, da função típica que prevalece na seara dos danos individuais, onde

114 MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo, p. 157. 115MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo, p. 157. 116 CARVALHO, Luiz Gustavo Grandinetti de. Informação como bem de consumo. Disponível em: <http://www.estacio.br/graduacao/direito/publicacoes/dir_infbe mcons.asp.>. Acesso em: 15 de setembro de 2008

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se confere maior relevância à finalidade compensatória da indenização

estabelecida em prol da vítima, e, apenas secundariamente, visualiza-se a

função punitivo-pedagógica.

Outra observação importante afere-se na obra de Medeiros

Neto117, ao consignar que:

Nas hipóteses de configuração de dano moral coletivo, não há que se falar propriamente em reparação direta em favor da coletividade, como se se visasse a recompor ou mesmo a compensar integralmente a lesão, porque tal situação é inconcebível no campo dos interesses transindividuais, de natureza extrapatrimonial, uma vez que é inviável alcançar e apreender toda a dimensão e extensão da lesão coletiva, também não se podendo identificar precisamente os indivíduos integrantes da coletividade, pela sua indeterminabilidade.

Não obstante tenha sido demonstrada a função sancionatória da

reparação em face do Dano Moral Coletivo, é possível conceber, segundo nos

informa o autor citado anteriormente, de forma secundária, uma finalidade

compensatória indireta, considerando que é a coletividade um sujeito passivo

da violação , e a lei prevê que a parcela da condenação será destinada a um

fundo, cujo objetivo se volta para a “reconstituição dos bens lesados” (parte

final do art. 13 da LACP) 118.

Já em relação aos critérios para quantificação da parcela da

condenação, essa deve ser arbitrada pelo juiz, sob o norte da equidade e do

bom senso. É o que ensina Medeiros Neto119, ao enumerar os seguintes

aspectos principais, a serem levados em conta pelo órgão judicial, para a

quantificação do valor da condenação em sede de Dano Moral Coletivo:

(I) a natureza, a gravidade e a repercussão da lesão;

(II) a situação econômica do ofensor;

117 MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo, p. 160. 118 Adianta-se, a esse respeito, que no Direito do Trabalho há uma destinação específica para a parcela indenizatória, que será oportunamente demonstrada no Capítulo 3, subcapítulo 3.2, desta pesquisa. 119 MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo, p. 161.

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(III) o eventual proveito obtido com a conduta ilícita;

(IV) o grau da culpa ou do dolo, se presentes, e a verificação de reincidência;

(V) o grau de reprovabilidade social da conduta adotada.

Observou-se, portanto, a garantia de uma condenação em face do

Dano Moral Coletivo, introduzida expressamente no ordenamento jurídico

brasileiro pelo disposto nos arts. 1º e 13 da LACP. Ainda em linha conclusiva,

cumpre assinalar que a conduta lesiva aos interesses transindividuais deve ser

combatida mediante a fixação de uma parcela pecuniária, que terá função

sancionatória em face do ofensor e compensatória indireta em face da

coletividade atingida, uma vez que a condenação visará a reconstituição dos

bens lesados.

2.3.6.1 Reparação dos danos morais em face da tutela a interesses

individuais homogêneos

Diante da hipótese de caracterização de dano moral em situação

que verse sobre a tutela de interesses individuais homogêneos, a reparação

das lesões dar-se-á em benefício dos titulares do direito violado, porquanto a

demanda coletiva terá por objeto responsabilizar o ofensor por danos

individualmente sofridos pelas pessoas atingidas, conforme reza o art. 91 do

CDC. É o que registra Medeiros Neto120, para concluir que é incongruente falar-

se, nesse caso, em indenização por Dano Moral Coletivo.

Relembre-se que a categoria dos interesses individuais

homogêneos, conforme abordou-se no Capítulo 1, Subtítulo 1.2.3, apresenta

divisibilidade em relação a cada um dos titulares dos direitos. São interesses

que não possuem natureza coletiva, mas pela origem comum da lesão, podem

e devem ser tutelados coletivamente, segundo previsto em lei.

120 MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo, p. 171.

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Tenha-se presente, contudo, conforme assinala Bezerra Leite121,

que um mesmo fato trabalhista pode desencadear lesões a direitos ou

interesses difusos, coletivos ou individuais homogêneos, surgindo a ação

coletiva como meio apto e eficaz para a proteção de todos eles. Medeiros

Neto122 também prevê essa possibilidade, e ensina que ocorrendo a

configuração de Dano Moral Coletivo em face de interesse difuso ou coletivo, e,

em razão da mesma situação fática verificar-se a causa de dano moral a

interesses individuais homogêneos, a ação coletiva irá abarcar as duas

pretensões, com tratamentos diversos.

À vista dos pontos explanados, tem-se estabelecido, portanto,

que, embora seja possível a reparação do dano moral decorrente da lesão a

interesse individual homogêneo pela via coletiva, essa reparação ocorrerá

individualmente, não sendo possível, nesse caso, falar-se em Dano Moral

Coletivo, que por sua vez, será sempre resultado da ofensa a interesses

indivisíveis.

121 LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Ação civil pública: nova jurisdição trabalhista metaindividual: legitimação do Ministério Público, p. 71. 122 MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo, p. 171-172.

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CAPÍTULO 3

DANO MORAL COLETIVO NO DIREITO DO TRABALHO

3.1 CONFIGURAÇÃO E CONCEITO DE DANO MORAL COLETIVO NO

DIREITO DO TRABALHO

No âmbito trabalhista, pode-se afirmar, segundo Domingos de

Melo123, que configura o Dano Moral Coletivo o descumprimento, por parte dos

empregadores, dos direitos sociais trabalhistas difusos ou coletivos.

Verifica-se que os doutrinadores que analisaram o assunto têm

oferecido alguns exemplos de configuração do Dano Moral Coletivo no Direito

do Trabalho. Assim o fez Domingos de Melo124, que enumera em sua obra, de

forma exemplificativa, em que hipóteses a violação dos direitos trabalhistas

pode configurar o Dano Moral Coletivo no Direito do Trabalho:

a) Descumprimento do direito ao piso salarial normativo da

categoria;

b) Descumprimento do direito à realização periódica de exames

médicos;

c) Descumprimento do direito à saúde, higiene e segurança do

trabalho;

d) Descumprimento do direito à jornada de trabalho estabelecida

em lei (8 horas diárias ou 44 semanais);

123 MELO, Nehemias Domingos de. Dano moral trabalhista: doutrina e jurisprudência, p. 27. 124 MELO, Nehemias Domingos de. Dano moral trabalhista: doutrina e jurisprudência, p. 27-28.

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e) Manter em seu quadro funcionários empregados sem registro;

f) Discriminações que envolvam gênero, idade, saúde e ideologia

na admissão ao emprego ou na vigência do contrato de trabalho;

g) Assédio moral coletivo, ou seja, naquelas situações em que a

empresa venha a expor seus trabalhadores a situações constrangedoras,

vexatórias ou humilhantes.

Belmonte125 igualmente aduz que são inúmeras as hipóteses em

que o empregador pode agredir a moral de grupo de trabalhadores, e também

cita em sua obra as ofensas colacionadas acima. Além dessas hipóteses de

configuração citadas anteriormente, este autor prevê ainda as seguintes

hipóteses de configuração:

a) Quando promove trabalho escravo, forçado ou ainda de

menores de 16 anos;

b) Quando promove causas simuladas para acordos de rescisão;

c) Quando obtém, por ocasião e como condição da contratação,

assinatura em pedidos de demissão ou em termos de quitação assinados em

branco;

d) Quando o empregador pratica atos atentatórios da liberdade

sindical ou do direito de greve.

Entende-se, portanto, que a prática das condutas destacadas

geram Dano Moral Coletivo, cuja certeza (consoante abordou-se no Capítulo 2,

Subtítulo 2.3.5, que trata da prova do Dano Moral Coletivo), nasce

concomitantemente com a própria ocorrência do fato lesivo.

Registre-se ainda que o Dano Moral Coletivo deve ser aferido nas

exatas proporções ao desrespeito às condições mínimas de proteção ao

trabalho digno. Uma vez verificada uma injusta lesão na esfera moral da

125 BELMONTE, Alexandre Agra. Danos morais no direito do trabalho – Identificação e composição dos danos morais trabalhistas, p. 168.

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coletividade, com a violação – antijurídica – de determinados valores

protegidos pelo ordenamento, caracterizado estará o Dano Moral Coletivo,

passível de reparação civil 126.

À vista dos aspectos enfocados no plano da configuração do

Dano Moral Coletivo no Direito do Trabalho, autoriza-se, pois, a tentativa de

empreender a formulação do seu conceito. Para esta tarefa, cite-se o atual

conceito externado por Domingos de Melo127:

Assim, o dano moral coletivo trabalhista pode ser conceituado como a atitude antijurídica de empresas ou grupos de empresas que, por ação ou omissão, lesam uma determinada coletividade de trabalhadores, seja lhes subtraindo direitos assegurados legalmente, seja expondo-os a situações de risco em face do descumprimento de normas básicas de segurança e higiene do trabalho.

Nesse passo, diversas decisões têm sido prolatadas pela Justiça

Trabalhista com o objetivo de impedir a perpetuação de situações que

prejudiquem uma determinada coletividade de trabalhadores. Cuida-se, assim,

no Título 3.4 da pesquisa, do registro de decisões judiciais que versem sobre o

Dano Moral Coletivo no Trabalho. Antes, porém, é oportuno esclarecer, no

Título seguinte, sobre a destinação da reparação do Dano Moral Coletivo no

âmbito trabalhista, bem como as questões processuais que devem ser

observadas na busca dessa reparação.

3.2 DESTINAÇÃO DA INDENIZAÇÃO

Rememore-se que a reparação do Dano Moral Coletivo e a sua

preponderância sancionatória foram abordados no Capítulo 2, Subtítulo 2.3.6

da pesquisa, sem, porém, adentrar-se especificamente na destinação da

parcela indenizatória na Justiça do Trabalho.

126 RIBEIRO JÚNIOR, José Hortêncio. Tutela inibitória na Ações Coletivas – Instrumento eficaz na preservação da dignidade da pessoa humana e na erradicação do trabalho escravo ou degradante. In: RIBEIRO JUNIOR, José Hortêncio et al. (Org.). Ação coletiva na visão de juízes e procuradores do trabalho, p. 155. 127 MELO, Nehemias Domingos de. Dano moral trabalhista: doutrina e jurisprudência, p. 28.

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No que diz respeito à regra geral acerca da indenização oriunda

da condenação judicial por Dano Moral Coletivo, é explícita a regra do art. 13

da LACP ao preceituar que:

Art. 13. Havendo condenação em dinheiro, a indenização pelo dano causado reverterá a um fundo gerido por um Conselho Federal ou por Conselhos Estaduais de que participação necessariamente o Ministério Público e representantes da comunidade, sendo seus recursos destinados à reconstituição dos bens lesados.

Afirma Medeiros Neto128 que hoje este fundo é denominado de

Fundo de Defesa de Direitos Difusos, cujo objetivo principal reside na

reconstituição de bens lesados. A regulamentação do fundo em comento

encontra-se efetivada pelo Decreto Federal n. 1.306 de 9.11.1994, e pela Lei n.

9.008 de 21.3.1995. Nesses diplomas estatuiu-se que o fundo tem por

finalidade a reparação dos danos causados ao meio ambiente, ao consumidor,

a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico, paisagístico, por

infração à ordem econômica e a outros interesses difusos e coletivos.

Há, porém, conforme ensina o autor supra citado, áreas em

relação às quais foram instituídos fundos próprios com objetivos específicos, e,

por isso, mais autorizados a serem destinatários da parcela pecuniária da

condenação judicial referente à indenização por danos a interesses coletivos. É

o que ocorre no âmbito trabalhista, conforme as seguintes palavras de

Medeiros Neto129:

Observa-se, assim, na seara trabalhista, o Fundo de Amparo ao Trabalhador – FAT, criado pela Lei n. 7.998/90 com a finalidade de custear o Programa de Seguro-Desemprego, o pagamento do abono salarial e o financiamento de programas de desenvolvimento econômico (art. 10).

Esse também é o entendimento externado por Martins Filho130, ao

preceituar que a utilização do FAT como destinatários da indenização imposta

128 MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo, p. 166. 129 MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo, p. 166. 130 MARTINS FILHO, Ives Gandra da Silva. Processo coletivo do trabalho, p. 217 – 218.

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no caso de lesão a interesses difusos e coletivos na órbita trabalhista decorre

da inadequação do fundo previsto no art. 13 da LACP para a reparação dos

danos causados nas relações laborais. Como o objetivo do fundo é gerar

recurso para a reconstituição dos bens lesados, deve ser usado com certa

flexibilidade, e deve-se buscar, portanto, um fundo compatível com o interesse

lesado.

O FAT é um fundo especial, de natureza contábil-financeira,

vinculado ao Ministério do Trabalho e Emprego - MTE, destinado ao custeio do

Programa do Seguro-Desemprego, do Abono Salarial e ao financiamento de

Programas de Desenvolvimento Econômico. A Lei que o instituiu (7.998/90),

também instituiu o Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador

- CODEFAT.

O CODEFAT é um órgão colegiado, composto por representantes

dos trabalhadores, dos empregadores e do governo, que atua como gestor do

FAT. Montou-se, portanto, em torno do fundo, um arranjo institucional que

procura garantir a execução de políticas publicas de emprego e renda de

maneira descentralizada e participativa. Isto permite a aproximação entre o

executor das ações e o cidadão que delas se beneficiará, e dá a esse cidadão

a possibilidade de participar e exercer seu controle, por meio dos canais

adequados131.

Afere-se, portanto, que em caso de condenação judicial por Dano

Moral Coletivo Justiça do Trabalho, a destinação da parcela pecuniária será

revertida para o FAT, que se apresenta como o seu melhor destino.

3.2.1 Redirecionamento da Parcela

Admite-se, ainda, conforme leciona Medeiros Neto132, a

possibilidade de redirecionamento da parcela indenizatória objeto da

131 Informações obtidas na página do Ministério do Trabalho e Emprego – MTE. Disponível em: http://www.mte.gov.br/fat/historico.asp. Acesso em: 02 de outubro de 2008. 132 MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo, p. 168 – 170.

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condenação por Dano Moral Coletivo, mediante destinação a outra aplicação

que não seja o fundo específico em lei. Informa o juslaborista que é o caso de

conciliação judicial, no âmbito da ação civil pública, em que as partes, tendo

em vista a condenação relativa ao Dano Moral Coletivo, acordem sobre a

transformação do respectivo valor na realização de determinadas obrigações

pelo réu, que venham a contribuir para a proteção e promoção dos bens

jurídicos lesados.

Cita o referido autor, como exemplo, o seguinte caso concreto,

ocorrente na seara trabalhista: na ação civil pública n. 166/2006 (2ª Vara do

Trabalho de Teresina – Piauí), em que requerida a indenização no valor de R$

100.000,00 (cem mil reais), em virtude da publicação de anúncios

discriminatórios de emprego e estágio por um veículo de comunicação,

efetivou-se conciliação convertendo-se tal parcela em campanha publicitária

educativa sobre o tema discriminação.

Outro caso em que houve redirecionamento da parcela

indenizatória foi julgado pelo TRT da 2ª Região133, que condenou a Companhia

Siderúrgica Paulista (Cosipa) a pagar indenização de R$ 4.000.000,00 (quatro

milhões de reais) para reparação de Dano Moral Coletivo causado ao meio

ambiente do trabalho. A ação citava os trabalhadores que adquiriram

leucopenia (redução do número de glóbulos brancos do sangue) em contato

com benzeno no desenvolvimento de suas atividades. Observou-se que 154

trabalhadores apresentaram, no período investigado, alterações hematológicas

que deveriam ter sido investigadas, e entre esses, 52 trabalhadores

apresentaram alterações hematológicas persistentes que significam intoxicação

por benzeno já instalada.

Nesse caso, para a destinação da indenização, levou-se em conta

a reconstituição dos bens lesados, destinando-se 87,5%, equivalente a R$

3.500.000,00 (três milhões e quinhentos mil reais), para a Irmandade da Santa

Casa de Misericórdia de Santos, objetivamente para a aquisição de

medicamentos e equipamentos destinados ao tratamento de pessoa portadoras

133 TRT 2ª Região. 6ª T.RO n. 01042-1999-255-02-00-5. Rel. Valdir Florindo. .j. em 19.06.2007.

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de leucopenia. O restante, 12,5 %, equivalente a R$ 500.000,00 (quinhentos

mil reais), destinou-se ao FAT.

Averbe-se, portanto, que é possível a adequação da parcela

indenizatória, através de conciliação judicial entre as partes, com vistas a

melhor atender aos objetivos almejados pelo sistema jurídico: sancionar o autor

da lesão, em medida de alcance pedagógico, e também proporcionar à

coletividade uma forma de recomposição da ordem jurídica violada, por meio

da realização de condutas adequadas, em favor dos bens lesados.

3.3 AÇÃO CIVIL PÚBLICA TRABALHISTA E LEGITIMIDADE

Abordou-se, no Capítulo 1, Título 1.3 desta pesquisa, que no

Brasil a defesa dos interesses coletivos é sistematizada pela LACP e pelo

CDC, inclusive no âmbito da Justiça do Trabalho. Observa-se, assim, que a

ação civil pública é a via processual adequada para buscar a reparação dos

Danos Morais Coletivos ocorridos na seara laboral.

É o que ensina Domingos de Melo134, ao afirmar que a LACP,

com os acréscimos que recebeu pelas disposições finais do CDC, prevê, entre

os objetos da referida ação, a lesão de ordem patrimonial ou moral a qualquer

interesse difuso ou coletivo (LACP, art. 1º, caput, inciso IV), encontrando-se aí

a fundamentação legal para propositura de ação civil pública em nome da

defesa dos interesses difusos ou coletivos dos trabalhadores, cuja ofensa pode

gerar o Dano Moral Coletivo.

Porém, para propor ou contestar uma ação, deve ter a parte

interessada reconhecida sua legitimidade, que é pertinência subjetiva colocada

como condição da ação. Se assim é no plano individual, preceitua Lima135 que

no trato de interesses transindividuais a questão assume ainda maior

relevância, porquanto não pode sua titularidade ser atribuída a um sujeito

134 MELO, Nehemias Domingos de. Dano moral trabalhista: doutrina e jurisprudência, p. 29. 135 LIMA, Amarildo Carlos de. A ação civil pública e sua aplicação no processo do trabalho, p. 59.

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determinado, na medida em que atrelada a uma comunidade dispersa ou

classe de pessoas.

Nesse plano, tratando especificamente dos interesses de

trabalhadores, valiosa é a lição de Domingos de Melo136:

Preceitua a Lei de Ação Civil Pública, em seu art. 5º, que são legitimados para propositura da ação coletiva visando à proteção dos interesses difusos e coletivos dos trabalhadores, o Ministério Público; a União, os Estados, os municípios e o Distrito Federal; as entidades e órgão da Administração Pública, Direta ou Indireta, e as associações legalmente constituídas há pelo menos 1 (um) ano e que incluam entre seus fins institucionais a defesa do meio ambiente, do consumidor, da ordem econômica, da livre concorrência, ou do patrimônio artístico, estético, histórico e paisagístico. (grifou-se)

Após elencar os legitimados para a propositura da ação, informa o

jurista que não há exclusividade desses órgãos ou entidades no tocante à

legitimidade para propositura da ação civil pública visando a compelir o infrator

a promover a devida reparação por danos, sendo certo que há legitimidade

concorrente, e a iniciativa tomada por um daqueles legitimados não inibe

qualquer outro que venha a participar da ação, na qualidade de litisconsórcio.

Em relação aos sindicatos, apesar de não constarem

expressamente no rol dos legitimados da LACP, informa Simão de Melo137 que

com o advento da CRFB/88, os sindicatos não mais são controlados pelo

governo, de sorte que têm natureza e personalidade jurídica de associação,

podendo, igualmente, promover ações coletivas, observados os demais

requisitos para que se reconheça essa legitimidade.

Porém, de acordo com Martins Filho138, os sindicatos não podem

instaurar inquérito prévio ao ajuizamento da ação, prerrogativa apenas do

Ministério Público (LACP, art. 8º, § 1º; CRFB/88, art. 129, inciso III; LOMPU,

136 MELO, Nehemias Domingos de. Dano moral trabalhista: doutrina e jurisprudência, p. 29. 137 MELO, Raimundo Simão de. Ação civil pública na justiça do trabalho, p. 117. 138 MARTINS FILHO, Ives Gandra da Silva. Processo coletivo do trabalho, p. 210.

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art. 84, inciso III). Tal impossibilidade legal dificulta, para os sindicatos, o

ajuizamento das ações, na medida em que o procedimento prévio do inquérito

é fundamental para a coleta de elementos de convicção para a instrução da

ação civil pública. Diante desse fato, informa o autor que:

Na prática, o que tem ocorrido é os sindicatos oferecerem denúncia perante o Ministério Público do Trabalho, para que seja apurada a possível existência de lesão a direitos trabalhistas no âmbito de determinada empresa, de forma genérica. Dão, assim, cumprimento ao dispositivo legal que faculta a qualquer pessoa a possibilidade de provocar iniciativa do Ministério Público nesse campo, ministrando-lhe informações sobre fatos que constituam objeto de ação civil pública (Lei n. 7.347/85, art. 6º).

Não obstante qualquer um dos legitimados pelo art. 5º da LACP

possa promover uma Ação Civil Pública com pedido de condenação à

indenização por Dano Moral Coletivo, observa-se, portanto, que o Ministério

Público do Trabalho se destaca entre eles. É o que também observou

Domingos de Melo139:

Dentre todos os legitimados, aquele que reúne os melhores instrumentos para a defesa coletiva dos trabalhadores é, a nosso ver, o Ministério Público do Trabalho, que por destinação Constitucional deve ser o guardião dos interesses difusos da sociedade (CRFB/88, art. 127) bem como o legitimado para a propositura não só do inquérito civil, como tambem da ação civil pública para a defesa, dentre outros, dos interesses difusos e coletivos (CRFB/88, art. 129, inciso III).

No que concerne especificamente à legitimação do Ministério

Público do Trabalho em tema de interesses metaindividuais, deve-se observar

o disposto no art. 83, inciso III da LOMPU:

Art. 83. Compete ao Ministério Público do Trabalho o exercício das seguintes atribuições junto aos órgãos da Justiça do Trabalho:

[...]

139 MELO, Nehemias Domingos de. Dano moral trabalhista: doutrina e jurisprudência, p. 29 - 30.

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III - promover a ação civil pública no âmbito da Justiça do Trabalho, para defesa de interesses coletivos, quando desrespeitados os direitos sociais constitucionalmente garantidos;

Aduz Martins Filho140 que com o surgimento dessa lei, que incluiu

no artigo colacionado entre atribuições institucionais do Parquet trabalhista a

competência do mesmo para ajuizar ações civis públicas, consolidou-se

definitivamente a atuação do MPT no campo da defesa dos interesses difusos

e coletivos da sociedade no âmbito trabalhista.

No mesmo sentido é o entendimento de Bezerra Leite141, ao

afirmar que deve-se interpretar a referida norma da LOMPU conforme a

CRFB/88, chegando-se à conclusão de que a expressão “interesses coletivos”

há de ser compreendida em sentido amplo, isto é, “interesses coletivos lato

sensu”, que são todos os interesses transindividuais. Aduz ainda que outro

entendimento redundaria em inexplicável limitação do MPT para defender os

interesses fundamentais, o que não teria sentido, em virtude do princípio da

unidade, que norteia a atuação da Instituição como um todo (CRFB/88, art.

127, §1º).

Conclui-se, portanto, que é pacífica, desde o advento na referida

lei, a aplicação da Ação Civil Pública para a defesa de lesões de ordem moral

aos interesses difusos e coletivos que geram Dano Moral Coletivo no âmbito

trabalhista, figurando entre os legitimados para sua propositura aqueles

colacionados anteriormente, cuja previsão legal está assentada no art. 5º da

LACP, destacando-se o Ministério Público do Trabalho como legitimado mais

apto.

140 MARTINS FILHO, Ives Gandra da Silva. Processo coletivo do trabalho, p. 210. 141 LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Ação civil pública: nova jurisdição trabalhista metaindividual: legitimação do Ministério Público, p. 162.

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3.3.1Competência material

Ensina Bezerra Leite142 que a efetividade da utilização da ação

civil pública na Justiça especializada do Trabalho se deu com a previsão

expressa da permissão para seu o ajuizamento no art. 83, inciso III da LOMPU.

Esse artigo, já colacionado no item anterior da pesquisa, dispõe que compete

ao Ministério Público do Trabalho promover a ação civil pública no âmbito da

Justiça do Trabalho.

Além da referida disposição legal, informa Simão de Melo143 que

“a competência para apreciar a ação civil pública é da Justiça do Trabalho, por

força do que dispõe o art. 114 da CF, alterado pela EC 45/2004”.

Tem-se, portanto, que compete à Justiça do Trabalho julgar as

ações civis públicas, inclusive as que versem acerca do Dano Moral Coletivo,

uma vez que, reitere-se, não há mais dúvidas nem quanto à possibilidade de

ajuizamento desse tipo de ação na Justiça do Trabalho, tampouco quanto à

possibilidade dessa Justiça especializada de apreciar e julgar ações de

indenização por Dano Moral.

3.3.2 Competência territorial e funcional

Reconhecido o cabimento da ação civil pública que verse sobre

Dano Moral Coletivo na Justiça do Trabalho, faz-se necessário esclarecer qual

a competência territorial (no juízo de que localidade deve ser apreciada), bem

como a competência funcional (se é competente a Vara do Trabalho ou o TRT)

para apreciar a ação.

No que diz respeito à competência funcional da Justiça do

Trabalho, afirma Martins144 que:

142 LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Ação civil pública: nova jurisdição trabalhista metaindividual: legitimação do Ministério Público, p. 98. 143 MELO, Raimundo Simão de. Ação civil pública na justiça do trabalho, p. 151. 144 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito processual do trabalho: doutrina e prática forense, p. 552.

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A ação civil pública é de competência da Vara do Trabalho, pois a Constituição ou a lei não estabelecem que a competência é do órgão de segundo grau ou de um tribunal superior. Logo, só pode ser a regra geral, de competência do primeiro grau, visto que não existe regra de exceção.

Afere-se o mesmo entendimento na obra de Simão de Melo145, ao

entender que atribuir aos Tribunais do Trabalho a competência originária para a

apreciação e julgamento da ação civil pública, por mera analogia com o

procedimento da ação de dissídio coletivo, de competência destes, por

determinação legal, não tem qualquer pertinência. Isso porque embora em

ambas ações se defendam interesses coletivos, na ação dissidial, regida por

peculiaridades próprias, criam-se, modificam-se ou interpretam-se direitos,

enquanto que na ação civil pública aplica-se o direito preexistente.

Já no tocante à competência territorial, informa Martins146 que

deve se observar o disposto no art. 2º da LACP: “As ações previstas nesta Lei

serão propostas no foro do local onde ocorrer o dano, cujo juízo terá

competência funcional para processar e julgar a causa”. Assim, o dano de

âmbito local147 será julgado no foro do lugar que ocorreu.

Porém, se a extensão do dano for observada em mais de uma

localidade, não se limitando ao âmbito local ou até mesmo regional, aduz o

supra mencionado autor que é preciso pautar-se no entendimento já pacificado

pelo TST, na Orientação Jurisprudencial n. 130 da SBDI-2, cujo texto

colaciona-se:

Para a fixação da competência territorial em sede de ação civil

pública, cumpre tomar em conta a extensão do dano causado

ou a ser reparado, pautando-se pela incidência analógica do

art. 93 do Código de Defesa do Consumidor. Assim, se a

extensão do dano a ser reparado limitar-se ao âmbito regional,

145 MELO, Raimundo Simão de. Ação civil pública na justiça do trabalho, p. 157 - 158. 146 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito processual do trabalho: doutrina e prática forense, p. 552. 147 “Dano de âmbito local: assim entendido aquele que está confinado aos limites territoriais de um único e determinado foro”. EVANGELISTA, Márcio Roberto de Freitas. Competência territorial em ação civil pública. Disponível em: <http://www.amatra13.org.br/noticia_geral.php? id=1022>. Acesso em: 10 de outubro de 2008.

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a competência é de uma das Varas do Trabalho da Capital do

Estado; se for de âmbito supra-regional ou nacional, o foro é o

do Distrito Federal.

Depreende-se, desse modo, que se a extensão do dano a ser

reparado limita-se ao âmbito regional148, a competência é de uma das Varas do

Trabalho da capital do Estado; se for de âmbito supra-regional ou nacional149, o

foro é o do Distrito Federal.

3.3.3 Prescrição

Em linhas iniciais, saliente-se que “prescrição é a perda do direito

à ação, pelo transcurso do tempo, em razão de seu titular não o ter

exercido”150. Porém, com amparo na lição de Medeiros Neto151, faz-se evidente

a impossibilidade da prescrição no âmbito da tutela dos direitos

transindividuais, envolvendo obrigações de indenizar. Nas palavras do autor:

Ora, como imaginar-se a ocorrência de inércia quanto à postulação relativa a uma pretensão de natureza coletiva, imputada aos indivíduos abrangidos pela coletividade (que é titular do direito), se não possuem eles legitimação para reivindicar, diretamente, a tutela? Como, pois, poder-se-ia infligir a um grupo, categoria ou classe de pessoas a perda de uma pretensão, quando não se faz possível, no plano jurídico, assegurar a possibilidade de acesso ao poder Judiciário, por meio de iniciativa própria e individualizada, exatamente por estar o interesse dimensionado em um universo coletivo de titularização? O paradoxo externado em tais questionamentos

148 “Dano de âmbito regional: o que, em sua dimensão ou em seus reflexos, atinge localidades abarcadas pela competência territorial de foros diversos, mas pertencentes a um mesmo Estado da Federação”. EVANGELISTA, Márcio Roberto de Freitas. Competência territorial em ação civil pública. Disponível em: <http://www.amatra13.org.br/noticia_geral.php? id=1022>. Acesso em 10 de outubro de 2008. 149 “Dano de âmbito nacional: aquele que se projeta sobre localidades situadas em dois ou mais Estados da Federação ou que afeta todo o território do País”. EVANGELISTA, Márcio Roberto de Freitas. Competência territorial em ação civil pública. Disponível em: <http://www.amatra13.org.br/noticia_geral.php? id=1022>. Acesso em: 10 de outubro de 2008. 150 CARRION, Valentim. Comentários à consolidação das leis do trabalho, p. 75. 151 MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo, p. 186 - 187.

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é bastante para realçar a inaplicabilidade, em casos tais, do instituto prescricional.

Aduz ainda o autor, que os interesses titularizados pela

coletividade, por serem indisponíveis, não poderiam submeter-se, quanto à

possibilidade de tutela judicial, a uma limitação extintiva de natureza temporal.

Ressalte-se, também, que a LACP, que regula o sistema

processual coletivo, não faz nenhuma referência sobre prescrição, o que,

segundo Medeiros Neto152, deve ser interpretado como um silêncio eloqüente,

de maneira a afastar a sua aplicação ao campo da proteção aos direitos

transindividuais.

Consigna-se, portanto, que em caso de inércia do ente legitimado

para buscar a reparação do Dano Moral Coletivo em sede de ação civil pública,

não há que se falar em prescrição dos direitos metaindividuais.

3.3.4 Litispendência e coisa julgada entre a ação civil pública e as ações

individuais

Há litispendência quando se repete a ação, que está em curso,

com as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo objeto (§ 3º do

art. 301 do CPC)153.

Ao tratar do tema litispendência entre a ação civil pública e as

ações individuais, Venturi154 aduz que o novo sistema de tutela jurisdicional

coletiva surgiu com o intuito de somar-se ao sistema de tutela individual. É o

que se colhe da redação do art. 104 do CDC, que dispõe: “as ações coletivas,

previstas nos incisos I e II do parágrafo único do art. 81, não induzem

litispendência para as ações individuais [...]”.

152 MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo, p. 188. 153 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito processual do trabalho: doutrina e prática forense, p. 289. 154 VENTURI, Elton. Processo Civil Coletivo. A tutela jurisdicional dos direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos no Brasil: Perspectiva de um Código Brasileiro de Processos Coletivos, p. 344.

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Apressadamente, poder-se-ia concluir que se está autorizando o

processamento concomitante de ações coletivas para a tutela de direitos

difusos e coletivos e de ações individuais com idêntico objeto, uma vez que

expressamente é dito que aquelas “não induzem litispendência” para estas. Já

para Venturi155:

Todavia, em verdade, jamais haverá litispendência na hipótese versada, não porque a norma assim o diz, mas porque não há sequer viabilidade de serem admitidas ações individuais que tenham como pretensão a tutela de direitos difusos e coletivos, em face da falta de legitimação ativa ad causam individual para a proteção dos mencionados direitos supra-individuais. Assim sendo, não será possível objetar nem a ocorrência de litispendência nem da coisa julgada material entre ambas.

Nesse passo, não é difícil concluir que quando uma lesão à

interesse difuso ou coletivo gerar Dano Moral Coletivo, nada impede que

busque-se em juízo a reparação por dano moral individualmente sofrido em

face da mesma situação fática. Não haverá litispendência porque o autor da

ação individual não estará buscando a reparação de lesão aos interesses

coletivos ou difusos, pois estes são indivisíveis. Na tentativa de ilustrar o

afirmado, aponta-se a jurisprudência do TRT da 13ª Região156:

EMENTA: “PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL COLETIVO. ATOS DISCRIMINATÓRIOS E ANTISINDICAIS DIRIGIDOS A APENAS UM INDIVÍDUO. REPERCUSSÃO SOCIAL. PROCEDÊNCIA. Ainda que um único trabalhador tenha sido o destinatário dos atos discriminatórios, sua repercussão social é inegável, na medida em que materializou ofensa à liberdade sindical. A extensão coletiva da conduta decorre da própria natureza do direito à liberdade sindical, e os atos praticados pelo empregador tiveram repercussão, no mínimo, em toda a categoria, na medida em que representaram desestimulo para filiação e/ou atuação sindical de outros trabalhadores”.

155 VENTURI, Elton. Processo Civil Coletivo. A tutela jurisdicional dos direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos no Brasil: Perspectiva de um Código Brasileiro de Processos Coletivos, p. 345 - 346. 156 TRT 13ª Região – RO 01028-2005-003-13-00-5 – Rel. Carlos Coelho de Miranda Freire – d.j. – 29.03.2007. MPT x Banco SUDAMERIS BRASIL S/A.

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Nesse caso, os atos praticados pela ré representaram, segundo a

fundamentação do acórdão, grave afronta ao interesse de toda a coletividade,

na medida em que despertou desapreço em todos os membros da categoria e

em todos aqueles trabalhadores que desempenham atividade sindical. Diante

dos fatos, fixou-se a indenização por Danos Morais Coletivos em R$

500.000,00 (quinhentos mil reais), atentando-se para a função punitivo-

pedagógica da indenização.

Porém, apesar de os atos discriminatórios e anti-sindicais contra

apenas um empregado terem gerado o Dano Moral Coletivo, esse empregado

que sofreu individualmente por esses atos poderia ter buscado a reparação

individual dos danos em juízo, sem que houvesse litispendência. Isso porque

teve um interesse individual lesado, e não estaria buscando um

“desmembramento” do Dano Moral Coletivo.

Já a coisa julgada dá-se quando é repetida ação que já foi

decidida por sentença, da qual não caiba mais qualquer recurso (§ 3ºdo art.

301 do CPC)157.

Acerca da coisa julgada, quando houver condenação por Dano

Moral Coletivo, informa Belmonte que “a indenização fixada não impede a

postulação de indenização de natureza individual, acaso cabível e acaso

devida”158.

Observa-se, assim, que após o julgamento de ação civil pública

que condene o empregador ao pagamento de indenização por Dano Moral

Coletivo, pode ser buscada a reparação por danos individuais, não podendo o

empregador alegar coisa julgada.

157 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito processual do trabalho: doutrina e prática forense, p. 289. 158 BELMONTE, Alexandre Agra. Danos morais no direito do trabalho – Identificação e composição dos danos morais trabalhistas, p. 169.

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3.4 HIPÓTESES DE INCIDÊNCIA NO PANORAMA JURISPRUDENCIAL BRASILEIRO

Tem-se observado, nestes últimos anos, conforme assinala

Medeiros Neto159, o incremento do número de questões julgadas pelos órgãos

judiciários pátrios – inclusive de instâncias superiores –, respeitantes à

condenação por Danos Morais Coletivos, de maneira a poder-se afirmar que a

matéria, antes timidamente abordada, despertou crescente interesse em seu

enfrentamento.

Mostra-se essencial, portanto, com intuito de se oferecer maior

visibilidade ao tema do Dano Moral Coletivo do Trabalho, o registro de

decisões que sobre ele versaram, proferidas em ações civis públicas. Para

isso, destacam-se a seguir as mais recorrentes hipóteses de incidência de

configuração desses danos no Direito do Trabalho, observadas principalmente

nos Tribunais Regionais do Trabalho.

As hipóteses de configuração foram divididas em Subtítulos,

apresentados a seguir, e fez-se um pequeno registro introdutório sobre cada

uma das hipóteses de configuração do Dano Moral Coletivo no Direito do

Trabalho, sempre que possível. Objetiva-se, assim, concretizar e ilustrar, pelas

hipóteses, a teoria até aqui desenvolvida.

3.4.1 Trabalho Escravo

Pode-se definir o trabalho em condições análogas à

condição de escravo como o exercício do trabalho humano em que há

restrição, em qualquer forma, à liberdade do trabalhador, e/ou quando não são

respeitados os direitos mínimos para o resguardo da dignidade do

trabalhador160.

159 MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo, p. 198 - 199. 160 BRITO Filho, José Cláudio Monteiro. Trabalho com redução à condição análoga à de escravo: análise a partir do trabalho decente e de seu fundamento, a dignidade da pessoa humana. In: FAVA, Marcos Neves. VELLOSO, Gabriel (Coord.). Trabalho escravo contemporâneo: o desafio de superar a negação, p. 133.

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Para Audi161, a escravidão contemporânea no Brasil ainda

persiste, e mais cruel que aquela abolida pela Princesa Isabel em 1988: os

escravos modernos são pessoas descartáveis, sem valor agregado à

produção. De acordo com a lição da autora, o fenômeno acontece com mais

freqüência nos rincões distantes do meio rural brasileiro, sem que a sociedade

tenha conhecimento e acredite na perversidade de sua prática. Persistem

situações em que brasileiros vivem sem liberdade, longe de seus municípios de

origem, sem que tenham possibilidade de deixar as fazendas, rompendo,

assim, essa relação fraudulenta de trabalho.

Juntamente com o Cadastro Nacional de empregadores

que submeteram trabalhadores a condições análogas à de escravo (Portaria n.

540/04), o Dano Moral Coletivo é apontado como uma das grandes vitórias da

sociedade brasileira no combate ao trabalho em condições análogas à de

escravo, com reconhecimento internacional. É o que aduz Prado162, com base

no Relatório Global do Seguimento da OIT sobre Princípios e Direitos

Fundamentais no Trabalho, do ano de 2005.

Prado163 informa como deu-se o início das ações com pretensões

relativas ao Dano Moral Coletivo, decorrente do trabalho em condições

análogas à de escravo:

Na esteira da evolução doutrinária e jurisprudencial sobre o tema, pode-se afirmar que, no tocante às ações civis públicas que tratam do trabalho em condições análogas à de escravo, as primeiras pretensões relativas a dano moral coletivo foram deduzidas a partir do ano de 2001, influenciadas por debates havidos na cidade de Belém – PA, por ocasião do “Seminário

161 AUDI, Patrícia. A escravidão não abolida. In: FAVA, Marcos Neves. VELLOSO, Gabriel (Coord.). Trabalho escravo contemporâneo: o desafio de superar a negação , p. 76 - 77. 162 PRADO, Erlan José Peixoto do. A Ação Civil Pública e sua eficácia no combate ao trabalho em condições análogas à de escravo: o Dano Moral Coletivo. In: FAVA, Marcos Neves. VELLOSO, Gabriel (Coord.). Trabalho escravo contemporâneo: o desafio de superar a negação, p. 195. 163 PRADO, Erlan José Peixoto do. A Ação Civil Pública e sua eficácia no combate ao trabalho em condições análogas à de escravo: o Dano Moral Coletivo. In: FAVA, Marcos Neves. VELLOSO, Gabriel (Coord.). Trabalho escravo contemporâneo: o desafio de superar a negação, p. 195.

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Internacional Trabalho Forçado – Realidade a ser Combatida”, realizado em novembro de 2000.

O supra citado autor indica que o primeiro pedido

formalizado pelo Ministério Público do Trabalho e julgado procedente em sede

de Dano Moral Coletivo decorrente do trabalho em condições análogas às de

escravo, ocorreu no Estado do Pará, no âmbito da 8ª Região. Segue abaixo

trecho da decisão, que merece destaque:

[...] Pelo que destes autos consta, a reclamada imputou a um conjunto de trabalhadores que não se pode quantificar, o exercício de atividade profissional em condições sub-humanas, pois o ambiente de trabalho não tinha a menor salubridade, sem instalações higiênicas, sem água potável, com trabalho a céu aberto e não eram fornecidos os equipamentos de proteção. Essa atitude da ré abala o sentimento de dignidade, falta de apreço e consideração, tendo reflexos na coletividade, pois as normas que regem a matéria envolvendo a saúde, segurança, higiene e meio ambiente do trabalho e do trabalhador são de ordem pública. Todos os procedimentos adotados contra os trabalhadores conduzem a que se reconheça o dano moral coletivo, porque atingido o complexo social em seus valores íntimos, em especial a própria dignidade humana164.

Desde a referida condenação, outras ocorreram, e algumas

serão apontadas a seguir, de forma que não será difícil perceber o relevante

papel que a evolução do pensamento jurisprudencial assume a respeito do

tema.

Apresenta-se abaixo decisão exemplar proferida pelo TRT

da 3ª Região, ao julgar Recurso Ordinário em sede de Ação Civil Pública

proposta pelo Ministério Público do Trabalho, que majorou o valor da

condenação por Danos Morais Coletivos atribuído pelo juízo a quo de R$

200.000,00 (duzentos mil reais), para R$ 400.000,00 (quatrocentos mil reais):

EMENTA: TRABALHO EM CONDIÇÕES ANÁLOGAS À DE ESCRAVO. DANO MORAL COLETIVO. Dadas as condições degradantes em que se encontravam os trabalhadores,

164 TRT 8ª Região. 1ª T. RO 5309/2002. Rel. Luis José de Jesus Ribeiro. j. em 17.12.2002.

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restaram violados os direitos humanos, violação essa que o Brasil comprometeu- se a reprimir em decorrência de Tratados Internacionais165.

Na decisão, realçou o órgão julgador que restaram

evidenciadas a aliciação de trabalhadores e a redução destes a condição

análoga à de escravo, mediante a dependência econômica caracterizada pelo

não pagamento de salários, mas labor em troca de casa e comida apenas.

Reconheceu-se a existência de Dano Moral Coletivo por violação a direitos

metaindividuais, e definiu-se que o valor da condenação deve ser revertida ao

Fundo de Amparo ao Trabalhador, nos termos do art. 13 da Lei 7.347/85 e art.

100, parágrafo único do CDC.

Também merece realce a posição e os fundamentos

adotados pelo TRT da 8ª Região, em questão que diz respeito à submissão de

trabalhadores a condições de escravidão, conforme se vê:

EMENTA: DANO MORAL COLETIVO. TRABALHO EM CONDIÇÕES DEGRADANTES. CARACTERIZAÇÃO . Afigura-se perfeitamente possível a ocorrência de dano moral coletivo proveniente de perversas relações de trabalho, quando em detrimento da dignidade da pessoa humana e de sua liberdade, na hipótese de restar configurado o trabalho em condições análogas à escravidão, em razão de sua ampla repercussão perante a sociedade mundial e o transtorno social causado: “... se o trabalhador presta serviços exposto à falta de segurança e com riscos a sua saúde, temos o trabalho em condições degradantes. Se as condições de trabalho mais básicas são negadas ao trabalhador, como o direito de trabalhar em jornada razoável e que proteja sua saúde, garanta-lhe descanso e permita o convívio social, há trabalho em condições degradantes. Se, para prestar o trabalho, o trabalhador tem limitações na sua alimentação, na sua higiene, e na sua moradia, caracteriza-se o trabalho em condições degradantes. Se o trabalhador não recebe o devido respeito que merece como ser humano, sendo, por exemplo, assediado moral ou sexualmente, existe trabalho em condições degradantes” (José Cláudio Monteiro de Brito Filho, in Trabalho com Redução do

165 TRT 3ª Região. 3ª T. RO 00227-2005-129-03-00-1. Rel. Maria Lúcia Cardoso de Magalhães. j. em 28.06.2006.

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Homem a Condição Análoga à de Escravo e Dignidade da Pessoa Humana)166.

In casu, não foram anotadas as CTPS dos trabalhadores,

muito embora tenham sido contratados para desenvolver serviço indispensável

à realização da atividade-fim da Fazenda; não foram realizados exames

médicos; os trabalhadores dormiam em barracos, sem proteção lateral e de

chão batido; não havia banheiro próximo à área de trabalho, e de qualquer

forma, havia um único banheiro localizado na sede da Fazenda (distante) para

os 38 trabalhadores. A instrução processual também demonstrou que os

trabalhadores desempenhavam jornadas exaustivas de até doze horas,

inclusive sendo obrigados a prestar serviços no dia destinado ao repouso.

Todos os elementos acima descritos fizeram com que a 2ª

Turma do TRT da 8ª Região, por maioria de votos, reformasse a sentença

recorrida para fixar a indenização por dano moral coletivo em R$ 76.000,00

(setenta e seis mil reais).

Observa-se, assim, um crescente número de indenizações

por Danos Morais Coletivos, impostas pela Justiça do Trabalho, decorrentes do

trabalho em condições análogas à de escravo. Essas condenações são

importantes, ao passo que viabilizam uma tutela judicial efetiva voltada para a

defesa do trabalho decente, auxiliando na erradicação do trabalho escravo,

realidade que ainda marca negativamente a sociedade brasileira.

3.4.2 Desrespeito às normas de proteção à saúde, segurança e do meio ambiente do Trabalho

Afigura-se como coisa de todos o meio ambiente do

trabalho, quando considerado que umbilicalmente ligado ao mesmo estão os

166 TRT 8ª Região. 2ª T. RO 00611-2004-118-08-00-2. Rel. Herbert Tadeu Pereira De Matos. j. em 14.12.2005.

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direitos à saúde, segurança e qualidade de vida do trabalhador. É o que afirma

Melo167:

[...] o equilíbrio do meio ambiente de trabalho e a plenitude da saúde do trabalhador constituem direito essencialmente difuso, inclusive porque a tutela tem por finalidade a proteção da saúde, que sendo direito de todos, de toda a coletividade, caracteriza-se como um direito eminentemente individual.

Esse direito está assegurado nos dispositivos da CRFB/88,

que prevê, já em seu art. 1º, a dignidade da pessoa humana como um dos

fundamentos da República. O caput do art. 5º fala do direito à vida e à

segurança e o caput art. 6º, qualifica como direito social o trabalho, o lazer e a

segurança. Já o art. 7º, preconiza, em seu inciso XXII, que a redução dos

riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e

segurança é um direito dos trabalhadores.

No caput do art. 255, a Carta Magna garante a todos o

direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado. Por fim, o inciso VIII,

do art. 200 da CRFB/88 assevera que ao Sistema Único de Saúde compete,

além de outras atribuições, “colaborar na proteção do meio ambiente, nele

compreendido o do trabalho”.

Melo168 afirma que se extrai, da análise sistemática de

todos os dispositivos constitucionais colacionados, que o Estado não tolerará

atividade que ponha em risco a vida, a integridade e a segurança dos

indivíduos.

Os inúmeros julgados pela Justiça do Trabalho revelam

que não estão sendo toleradas as condutas dos empregadores que põem em

risco a vida do trabalhador, desrespeitando as normas de proteção ao meio

ambiente de trabalho, à saúde e a segurança. Essas ofensas são geradoras

de Dano Moral Coletivo, conforme vêm entendendo os Tribunais da Justiça do

Trabalho.

167 MELO, Sandro Nahmias. Meio ambiente do trabalho: direito fundamental, p. 33. 168 MELO, Sandro Nahmias. Meio ambiente do trabalho: direito fundamental, p. 33.

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O TRT da 12ª Região assim julgou:

DANO MORAL COLETIVO. DESCUMPRIMENTO DE NORMAS TRABALHISTAS BÁSICAS DE SEGURANÇA E SAÚDE DO TRABALHADOR. A instituição do regime de banco de horas mediante acordo individual com os trabalhadores, consubstancia medida desfavorável à saúde e à segurança do trabalhador, e por conseqüência configura dano moral coletivo e impõe a reparação pecuniária demandada pelo Ministério Público do Trabalho (Violação ao disposto no art. 7º, inc. XIII, da Constituição Federal e na Lei nº 9.601/98) 169.

Verificou-se, nessa demanda, que a ré adotava o sistema

de banco de horas por meio de acordo individual, violando o disposto na Lei n.

9.601/98 (que autorizou a instituição de banco de horas) e no art. 7º, inciso XIII,

da CRFB/88.

A ilustríssima relatora do julgado entendeu manifesta a

conduta antijurídica da ré ao fazer tábula rasa das disposições legais atinentes

aos acordos de compensação e prorrogação de jornada, implicando

descumprimento de normas trabalhistas básicas de segurança e saúde do

trabalhador. A empresa ré foi condenada ao pagamento de indenização por

Dano Moral Coletivo, fixada em R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais), a ser

revertida ao FAT.

Ainda no âmbito da 12ª Região, houve decisão mais

recente no mesmo sentido. Segue a ementa:

DANO MORAL COLETIVO. CONFIGURAÇÃO. Para além da moral individual, isto é, das características imateriais que marcam a existência de cada ser humano perante seus semelhantes, existe uma moral coletiva, que não pode ser atribuída a um ou outro integrante da comunidade, mas somente ao grupo. Ela a todos pertence e sua violação implicará numa perda coletiva. Nesse passo, não há negar a possibilidade de responsabilização de quem adota conduta

169 TRT 12ª Região. 1ª T. RO 03988-2005-019-12-00-0. Rel. Juíza Viviane Colucci. j. em 06.07.2007.

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contrária ao interesse comunitário pela reparação do prejuízo daí decorrente170.

O referido entendimento merece destaque, ao aduzir a

relatora que o dano moral é evidente no caso em tela, já que a empresa não

fornecia banheiros higienizados e os equipamentos básicos de segurança, o

que ultrapassa todos os limites de razoabilidade. Afirma a magistrada que,

nesta seara do dano moral coletivo, o ônus probatório recai sobre os fatos

ensejadores da ocorrência do dano — como o descumprimento de normas

básicas de segurança ou a sujeição a um ambiente laboral decadente —, e

nunca sobre o prejuízo moral efetivamente experimentado, que é presumido a

partir daquelas circunstâncias.

3.4.3 Assédio Moral

Não existe previsão específica sobre assédio moral em

nosso ordenamento jurídico. É por esse motivo que se observa entre os

doutrinadores a busca de sua conceituação na psicologia ou sociologia. É o

que faz a jurista Alkmin171, para compor o conceito de assédio moral:

O assédio moral, também conhecido como terrorismo psicológico ou “psicoterror”, é uma forma de violência psíquica praticada no local de trabalho, e que consiste na prática de atos, gestos, palavras e comportamentos vexatórios, humilhantes, degradantes e constrangedores, de forma sistemática e prolongada, cuja prática assediante pode ter como sujeito ativo o empregador ou superior hierárquico (assédio vertical), um colega de serviço (assédio horizontal), ou um subordinado (assédio ascendente), com clara intenção discriminatória e perseguidora, visando eliminar a vítima da organização do trabalho.

170 TRT 12ª Região. 3ª T. RO 04066-2006-014-12-00-0. Rel. Juíza Mari Eleda Migliorini – j. 26.03.2008. 171 ALKIMIM, Maria Aparecida. Assédio moral na relação de emprego, p. 36.

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Sobre o assunto, informa Ferreira172 que a ausência de

uma lei específica não impede os tribunais do trabalho de reconhecer a

gravidade do fenômeno e coibi-lo com os instrumentos fornecidos pela

legislação vigente, gerando direito à indenização por dano moral. No dizer da

autora:

Não pairam dúvidas de que o contrato de trabalho, por envolver a típica relação pessoal e de submissão, constitui-se em terreno fértil para a prática do assédio moral, entretanto, tal prática caracteriza flagrante violação contratual, encontrando enquadramento legal no art. 483 e no art. 482, ambos da CLT, além de ferir bem jurídico extrapatrimonial da vítima, ou seja, gerar o dano moral e conseqüente responsabilização civil do agente causador, havendo no ordenamento jurídico brasileiro ampla proteção legal contra o dano moral, seja no âmbito constitucional (art. 5º, incisos. V e X), seja no âmbito infraconstitucional (CC, art. 186).

No mesmo sentido é o entendimento de Rufino173, ao

preceituar que o assédio moral, como ilícito trabalhista, dá direito à indenização

extrapatrimonial, por atingir interesses da personalidade, da liberdade e da

dignidade da pessoa.

Além das indenizações por Dano Moral individualmente

sofrido, o que já se observa em alguns julgados é que o assédio moral pode

atingir uma coletividade de trabalhadores, gerando assim o direito à

indenização por Dano Moral Coletivo. Para elucidar tal assertiva, colaciona-se

julgado do TRT da 21ª Região, que manteve a sentença proferida pelo Juízo da

1ª Vara do Trabalho de Natal/RN, que condenou a empresa AMBEV ao

pagamento de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais) por Dano Moral Coletivo

decorrente de Assédio Moral:

EMENTA: [...] Assédio Moral. Ocorrência. Indenização. Cabimento. Comprovado o cometimento, pelo empregador, de atos de constrangimento a seus empregados, consistentes na submissão destes a situação vexatória, com utilização de camisetas, pelos vendedores, com apelidos jocosos, além de

172 FERREIRA, Hádassa Dolores Bonilha. Assédio moral nas relações de trabalho, p. 127. 173 RUFINO, Regina Célia Pezzuto. Assédio Moral no âmbito da empresa, p. 95.

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brincadeiras humilhantes, está patente o assédio moral autorizador do deferimento de indenização por danos morais174.

Segundo os trabalhadores da empresa, em testemunho no

processo, receber e ouvir insultos, pagar flexões de braço, dançar na boquinha

da garrafa, assistir à reuniões em pé, desenhar caricaturas no quadro, virar a

mesa da equipe que não batia as metas, fantasiar-se e sair andando pelas

dependências da empresa, atribuir apelidos, inclusive, reveladores de certo

grau de discriminação, e mais outras tantas prendas, eram práticas impostas

aos empregados que não atingiam as metas de vendas exigidas pelos

supervisores da empresa. No dizer na relatora:

Como se vê, a situação constrangedora a que foram submetidos os empregados da recorrente é, por si só, suficiente para justificar a intervenção do Ministério Público do Trabalho, a fim de coibir tais procedimentos, bem como para o deferimento da indenização por dano moral postulada, não havendo que se falar em reforma da sentença que reconheceu o assédio moral autorizador da imputação de indenização por dano moral.

Outro julgado, este no âmbito do TRT da 14ª Região,

demonstra também perfeitamente possível a condenação à indenização por

Dano Moral Coletivo decorrente do Assédio Moral:

EMENTA: [...] DANO MORAL COLETIVO. FIXAÇÃO DO VALOR. Na fixação do dano moral, seja ele coletivo ou individual, deve ser levada em consideração a natureza e a extensão do dano, o grau de culpa do agente, o porte da empresa, o caráter pedagógico, a dor e a tristeza das vítimas, sem se esquecer, todavia, de evitar o enriquecimento sem causa. Mantém-se, porquanto, o valor arbitrado em primeiro grau, onde o Juiz do feito, a par dos critérios acima, fixou razoavelmente o valor da indenização175.

174 TRT 21ª Região. RO n. 01034-2005-001-21-00-6. Rel. Juíza Joseane Dantas dos Santos. j. em 15.08.2006. 175 TRT 14ª Região. RO n. 00014.2005.003.14.00-9. Rel. Juiz Mário Sérgio Lapunka. j. em 27.03.2007.

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Neste caso, afirma o magistrado prolator que restou

demonstrada exaustivamente nos autos a prática reiterada de condutas imorais

por parte dos representantes da ré em relação a seus empregados. Os

empregadores tratavam mal os funcionários, gritando e chamando-os de

incompetentes. Dirigiam-se às funcionárias com termos pejorativos de cunho

sexual, na frente de outros funcionários. Diante destes fatos, manteve-se a

condenação no importe de R$ 100.000,00 (cem mil reais) fixada pela Vara de

origem, uma vez entendido que o referido valor respeitou aos princípios da

proporcionalidade e razoabilidade, não ensejando qualquer reforma nesse

aspecto.

Diante dos julgados, afere-se que a condenação ao

pagamento de indenização por Dano Moral Coletivo mostra-se eficiente no

combate ao Assédio Moral nas empresas, desestimulando essa prática que

atinge os trabalhadores em sua dignidade.

3.4.4 Terceirização Ilícita

Informa Delgado176 que:

Para o Direito do Trabalho terceirização é o fenômeno pelo qual se dissocia a relação econômica de trabalho da relação justrabalhista que lhe seria correspondente. A terceirização provoca uma relação trilateral em face da contratação de serviços, que realiza suas atividades materiais e intelectuais junto á empresa tomadora de serviços; a empresa terceirizante, que contrata esse obreiro, firmando com ele os vínculos jurídicos trabalhistas pertinentes; a empresa tomadora de serviços, que recebe a prestação do labor, mas não assume a posição clássica de empregadora desse trabalhador envolvido.

As situações lícitas de terceirização estão, hoje, assentadas pelo

texto da Súmula 331 do TST e dividem-se, segundo o citado autor, em quatro

grandes grupos: o primeiro, são as situações empresarias que autorizem

contratação de trabalho temporário, especificadas pela Lei n. 6.019/74; o

176 DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho, p. 774.

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segundo, as atividades de vigilância, regidas pela Lei n. 7.102/83; o terceiro,

as atividades de conservação e limpeza; e o quarto e último grupo, os serviços

especializados ligados à atividade meio do tomador.

Excluindo-se as citadas formas de terceirização lícita previstas na

referida Súmula, Delgado177 afirma que não há na ordem jurídica do país

preceito legal a dar validade trabalhista a contratos mediante os quais uma

pessoa física preste serviços não-eventuais, onerosos, pessoais e

subordinados a outrem (artigos 2º e 3º da CLT) , sem que esse tomador

responda, juridicamente, pela relação laboral estabelecida.

O Procurador do Trabalho Carelli178, ao discorrer sobre o tema,

observa que no combate às terceirizações ilícitas mais se fazem prementes as

ações coletivas. Isto porque nas ações individuais, são realizados pedidos de

pagamento de verbas trabalhistas, sem conseguir impedir que a contratante,

real beneficiária pela atitude irregular, continue a realizar a prática danosa aos

trabalhadores. Os pedidos realizados nessas ações têm, geralmente, natureza

inibitória e difusa, alcançando todos os atuais e futuros trabalhadores que se

encontrarem na situação relatada nos processos. Nas palavras do autor:

Além das obrigações de fazer e não fazer, normalmente, são realizados pedidos de pagamento de indenização por dano moral coletivo (ou dano genérico), que revertem para o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), na falta de um fundo mais adequado. Serve também tal indenização para evitar o enriquecimento ilícito dos empresários que lucraram com a falta de pagamento dos direitos trabalhistas.

Colhe-se, ainda, da obra do mencionado autor, que a ação civil,

pública vem sendo a principal arma, com sucesso, no combate às

terceirizações ilícitas. Mencionam-se, a seguir, situações em que algumas

empresas foram condenadas ao pagamento de indenização por Dano Moral

177 DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho, p. 775. 178 CARELLI, Rodrigo de Lacerda. As ações coletivas e o combate às terceirizações ilícitas. In: RIBEIRO JUNIOR, José Hortêncio et al. (Org.). Ação coletiva na visão de juízes e procuradores do trabalho, p. 216 - 217.

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Coletivo, pela prática de terceirizações ilícitas, ilustrando-se, dessa forma, o

benefício que tal condenação pode trazer no âmbito trabalhista.

Traz-se à baila um recente exemplo da seara jurisprudencial com

a decisão do Recurso Ordinário n. 01261-2006-013-03-00-0179,�do TRT da 3ª

Região, que deferiu um pedido indenização por Dano Moral Coletivo, em favor

do FAT, no valor de R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais), julgado

improcedente pelo juízo de 1º grau. Os julgadores constataram que a empresa

condenada praticou ato ilícito ao terceirizar sua atividade-fim, permitindo, em

conseqüência, que trabalhadores que deveriam ter sido por ela contatados

tivessem seus direitos violados, especialmente no que tange ao direito

fundamental ao meio ambiente de trabalho saudável e equilibrado. Segue a

ementa da decisão:

EMENTA: AÇÃO CIVIL PÚBLICA - VIOLAÇÃO A DIREITOS TRANSINDIVIDUAIS - DANO MORAL COLETIVO - CABIMENTO- Demonstrada a violação a direitos coletivos, difusos e individuais homogêneos, torna-se pertinente a reparação do dano coletivo, porquanto configurada a lesão a interesses transindividuais, independentemente de eventual ressarcimento de danos morais e materiais a serem postulados individualmente pelos titulares dos direitos violados. O ordenamento jurídico brasileiro admite a indenização por danos morais para a reparação de lesão extrapatrimonial causada não só às pessoas físicas, como também às pessoas jurídicas, assim como à coletividade genericamente considerada, mormente tendo-se em vista a massificação das relações de trabalho e suas repercussões na sociedade[...].

Verificou-se, nesse caso, que a intermediação de mão-de-

obra teve nítido intento de transferir a terceiros, ilegalmente, atividade-fim da

reclamada, mostrando-se a condenação à indenização por Dano Moral Coletivo

um instrumento efetivo para atenuar, em parte, as conseqüências da lesão e

também como sanção pelo ato ilícito praticado e conseqüente transgressão ao

ordenamento jurídico vigente.

Deste entendimento não diverge a jurisprudência do TRT

179 TRT 3ª Região. 7ª T. RO n. 01261-2006-013-03-00-0. Rel. Emerson José Alves Lage. j. em 28.08.2008.

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da 23ª Região que entendeu haver Dano Moral Coletivo em conseqüência da

conduta ilícita da empresa ré de contratar mão-de-obra por empresa interposta,

para utilização em atividade-fim da empresa, em prejuízo dos trabalhadores.

Dessa decisão, destaca-se:

EMENTA: [...] DANO MORAL COLETIVO. Restou demonstrado nos autos que houve violação a preceito constitucional, em razão da desvalorização da pessoa humana praticada pelo recorrente contra os trabalhadores que lhe prestaram serviços, sobre os quais lhe sobejaram benefícios. Portanto, mostra-se presente a culpa e o dolo nesta atitude, bem como o nexo de causalidade em face do dano, razão pela qual não merece qualquer reparo a sentença de origem que condenou a ré ao pagamento de indenização no importe de R$ 100.000,00, pois a razão da indenização do dano moral reside no próprio ato ilícito180.

Assim, mostra-se a condenação por Dano Moral Coletivo

fator desmotivante para a prática de terceirizações ilícitas, quando estas

denotam ofensa direta aos interesses coletivos e difusos dos trabalhadores.

3.4.5 Discriminação

Por discriminação, entende-se que é a conduta pela qual se nega

à pessoa, em face de um critério injustamente desqualificante, tratamento

compatível com o padrão jurídico assentado para a situação concreta por ela

vivenciada181.

As condutas discriminatórias praticadas por empregadores no

momento da contratação de trabalhadores podem gerar, induvidosamente,

Dano Moral Coletivo. Aponta-se, nesse sentido, no campo doutrinário, Manoel

Jorge e Silva Neto, citado na obra de Medeiros Neto182, que entende

caracterizado o Dano Moral Coletivo nos casos em que o empregador, em

180 TRT 23ª Região. RO n. 00316-2005-006-23-00-7. Rel. Juiz Bruno Weiler. J. em 09.08.2006. 181 DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho, p. 774. 182 MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo, p. 153.

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postura discriminatória, não contrata trabalhadores portadores de deficiências,

em razão apenas dessa circunstância.

Acresça-se do posicionamento defendido pelo referido autor, o

entendimento jurisprudencial, que tem mostrado a configuração do Dano Moral

Coletivo em casos de discriminação. O TRT da 9ª Região assim decidiu:

EMENTA: AÇÃO CIVIL PÚBLICA. OFERTA DE EMPREGO. DISCRIMINAÇÃO RELATIVA A IDADE, SEXO E TIPO DE DEFICIÊNCIA. PREENCHIMENTO DA COTA SOCIAL. LEI Nº 8.213/91. DANO MORAL COLETIVO. [...] Assim, em que pese ter sido cumprida a cota social prevista na Lei 8.213/91, inegável o efeito deletério produzido com a conduta da empresa em retardar o cumprimento legal e em formular ofertas de emprego com inserção de requisitos discriminatórios referentes a sexo, idade e tipo de deficiência, criando óbice a determinados indivíduos que, por critérios vis, ficaram excluídos da obtenção de emprego perante a empresa, a qual incorreu em dano moral coletivo que deve ser reparado, em virtude de sua conduta transgredir a ordem jurídica e social183.

Colhe-se ainda da referida decisão, que os prejuízos causados

não se restringiram aos indivíduos que desde logo tiveram negado acesso a

emprego na empresa por critérios discriminatórios. Antes, alcançaram toda a

coletividade que, se submetendo aos mais variados, e nem sempre equânimes

e justos, critérios para obtenção de emprego, sofreu a estigmatização das

diferenças e a exclusão injustificada, em manifesto prejuízo ao bem estar e paz

sociais. Tal proceder importou em gerar ao ofensor a obrigação de reparar o

dano causado à coletividade, conforme base legal existente.

3.4.6 Coação

Em casos de coação à vários trabalhadores também pode se

afigurar o Dano Moral Coletivo. Nesse sentido se assenta a jurisprudência,

como no julgado pelo TRT da 17ª Região, em que a ré cometia a conduta ilícita

183 TRT 9ª Região. 2ª T.RO n. 98906-2005-001-09-00-6. Rel. Rosemarie Diedrichs Pimpão j. em 18.04.2008.�

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de coagir trabalhadores a desistirem de ações trabalhistas. Segue abaixo e

ementa da decisão:

EMENTA: DANO MORAL COLETIVO. CARACTERIZAÇÃO. A conduta perpretada pela ré ao compelir seus empregados a desistirem de sesu diretos trabalhistas julgados procedentes em ação coletiva pelo sindicato da categoria, lesionou os trabalhadores, no plano coletivo, e até mesmo difuso (trabalhadores em geral), ao violar os princípios fundamentais da dignidade da pessoa humana e do valor social do trabalho (art. 1º, incisos II e IV, da CF), bem como o princípio constitucional insculpido no art. 5º, inciso XXXV, da CF. Assim, caracterizada a ocorrência do dano e do nexo causal aptos a ensejar a indenização pleiteada, impõe-se a condenação da ré ao pagamento de indenização em pecúnia decorrente do dano moral coletivo sofrido pelos empregados, com fulcro no art. 5º, V e X, da carta magna de 1988 e no art. 186 do CC184.

Outro caso de coação que gerou Dano Moral Coletivo foi

apreciado pelo TRT da 12ª Região:

EMENTA: AÇÃO CIVIL PÚBLICA. COMPROVAÇÃO DA ILICITUDE DOS ATOS PRATICADOS PELA RÉ, CONSISTENTES NO ABUSO DO PODER DIRETIVO, NA COAÇÃO, NO CONSTRANGIMENTO E NA INTENÇÃO DE LESAR TRABALHADORES. CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DE DANO MORAL COLETIVO. POSSIBILIDADE. Demonstrado que a ré praticou atos consistentes no abuso do poder diretivo, na coação, no constrangimento e na intenção de lesar trabalhadores, além da obrigação de não-fazer que lhe foi imposta, cujo descumprimento acarreta a aplicação de multa diária, a ser revertida ao Fundo de Amparo ao Trabalhador - FAT (art. 13 da Lei nº 7.347/85), cabe a condenação da demandada ao pagamento da indenização por dano moral coletivo (art. 1º, inc. IV, da Lei nº 7.347/85), dado o reconhecimento de que a lesão repercutiu coletivamente entre os empregados e ex-empregados envolvidos na mesma situação jurídica-base185.

184 TRT 17ª Região. RO n. 01832-2002-001-1-00. Rel. Gerson Fernando da Sylveira Novais. j. em 29.06.2005. 185 TRT 12ª Região. 3ª T. RO n. 01192-2005-029-12-00-0.Rel. Lília Leonor Abreu. j. em 31.07.2006.

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Nesse caso, a conduta ilícita da ré consistia em coagir

trabalhadores a assinar documentos em branco, e o Tribunal manteve a

condenação do juízo de origem, arbitrada em R$ 30.000,00 (trinta mil reais).

3.4.7 Ofensa à liberdade sindical

Ensina Delgado186, que o princípio da liberdade sindical,

assegurado pela CRFB/88 no art. 8º, incisos I e V, abrange a liberdade de

criação de sindicatos e a prerrogativa de livre vinculação a um sindicato, assim

como a livre desfiliação de seus quadros. Informa o autor que, por outro lado,

há sistemáticas de desestímulo à sindicalização, que entram em claro choque

com o referido princípio, chamadas de práticas anti-sindicais.

Percebe-se facilmente que as práticas anti-sindicais podem

causar o Dano Moral Coletivo, uma vez que representam um desestímulo para

a atuação sindical de outros trabalhadores. Nesse sentido destaca-se um

julgado pelo TRT da 3ª Região, em que a causa do Dano Moral Coletivo foi a

prática de impor aos trabalhadores a assinatura de documento impeditivo da

participação sindical, em qualquer nível hierárquico. Da decisão destaca-se o

seguinte trecho:

A conduta anti-sindical está sujeita à sanção porque viola a liberdade sindical, um bem jurídico que a Constituição Federal assegura como elemento fundante da organização sindical.Sem liberdade sindical não se pode falar em negociação coletiva, que é o cerne de todas as demais instituições de Direito Coletivo do Trabalho, ou seja, convenção coletiva, dissídio coletivo, greve e co-gestão187.

Diante dos fatos desse caso, fixou-se a indenização por Danos

Morais Coletivos em R$ 300.000,00 (trezentos mil reais), reversível ao FAT,

considerados a extensão do dano e sua repercussão social.

186 DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho, p. 1306. 187 TRT 3ªRegião.RO 00515-2005-007-03-00-0. Rel. Antônio Álvares da Silva. j. em 10.05.2006.

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Em outra situação, também apreciada pelo TRT da 3ª Região, a

empresa Sadia S/A praticou a conduta anti-sindical que consistia em coagir os

trabalhadores, sob ameaças de demissão, a aderir à proposta de acordo

coletivo, em desrespeito à representatividade da atuação do sindicato

profissional. Destacam-se os seguintes trechos da decisão:

EMENTA: AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONDUTA ANTI-SINDICAL. CARACTERIZAÇÃO. O comportamento do empregador é anti-sindical todas as vezes que esteja em confronto com normas imperativas destinadas a tutelar de forma direta e imediata o exercício da atividade do sindicato da categoria profissional e ofenda os direitos de representação conferidos à entidade, seja qual for o meio utilizado pela empresa que revele o propósito de coibir a atuação livre e legal do sindicato.

DANO MORAL COLETIVO . A conduta ilícita pratica pela ré violou e desprezou o direito do sindicato de ver e ter reconhecida a sua existência, a representatividade e as prerrogativas de que é investido pela Convenção 98 da Organização Internacional do Trabalho, pela própria Constituição da República (art. 8º, caput e incisos I, II e V) e pela Consolidação das Leis do Trabalho ( artigos 511 e 513) ao valor social do trabalho, à igualdade, à não-discriminação, à inafastabilidade da tutela jurisdicional, à proteção ao emprego, os quais encontram-se constitucionalmente assegurados nos arts. 1º, incisos II, III e IV; 5º, caput e incisos XIII, XXXV, XLI; 7º, incisos I, XXX, XXXI e art. 170, inciso VIII da CF/88188.

In casu, após frustradas as negociações entre a ré e o sindicato

da categoria, e já declarado o "estado de greve", a proposta da empresa foi

submetida ao crivo dos empregados, em assembléia, que a rejeitaram. No dia

seguinte, os supervisores dos postos de serviço da reclamada, promoveram

um abaixo assinado pela realização de nova assembléia para a votação da

mesma proposta anteriormente rejeitada. Como o sindicato se recusou a

atender essa exigência, os responsáveis pelos setores da ré, coordenaram

uma nova listagem, cujo objetivo era manifestar a concordância com a

proposta da empresa e nomear uma comissão interna de empregados (cuja

188 TRT 3ª Região. 2ª T. RO 001628-2006-104-03-00-3. Rel. Juiz Márcio Flávio Salem Vidigal. j. em 19.06.2007.

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formação encontrava-se pré-estabelecida no documento), que negociaria

diretamente com a empresa.

Para o relator que proferiu a decisão, a ré desprezou que o

sindicato é o representante dos empregados, não só propondo e adotando

essa nova comissão à parte do sindicato, como também celebrando o acordo

nos termos desejados. Daí a configuração do Dano Moral Coletivo, fixado pela

Turma em R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais).

3.4.8 Lide simulada

Ao tratar da decisão judicial dos processos e da sua eficácia, a

CLT preceitua, no art. 831, que “a decisão será proferida depois de rejeitada

pelas partes a proposta de conciliação”, e complementa no parágrafo único do

mencionado artigo: “no caso de conciliação, o termo que for lavrado valerá

como decisão irrecorrível”. Informa Carrion189 que essa conciliação, de que

trata o parágrafo único, pode consistir em transação, em submissão do réu à

pretensão do autor ou em desistência do direito pelo autor.

Observa-se na jurisprudência dos Tribunais trabalhistas, que

muitos empregadores têm forçado trabalhadores a propor lides simuladas

perante a Justiça do trabalho, mesmo quando não há conflito entre as partes,

com o objetivo de obter o termo de conciliação que valerá como decisão

irrecorrível. Essa prática ilícita, quando ocorrer de forma reiterada, atingindo

assim uma coletividade de trabalhadores, pode ser ocasionar o Dano Moral

Coletivo. Assim já se posicionou o TST, ao julgar recurso de revista interposto

pelo Ministério Público do Trabalho da 3ª Região:

EMENTA: RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO DA 3ª REGIÃO. DANO MORAL COLETIVO. REPARAÇÃO. POSSIBILIDADE. AÇÃO CIVIL PÚBLICA VISANDO OBRIGAÇÃO NEGATIVA. ATO ATENTATÓRIO À DIGNIDADE DA JUSTIÇA. RESCISÃO

189 CARRION, Valentim. Comentários à consolidação das leis do trabalho, p. 642.

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DE CONTRATO ATRAVÉS DE ACORDOS HOMOLOGADOS NA JUSTIÇA. LIDE SIMULADA.

Resta delineado nos autos que a postura da empresa, em proceder ao desligamento dos empregados com mais de um ano de serviço, através de acordos homologados na justiça, atenta contra a dignidade da Justiça. A ação civil pública buscou reverter o comportamento da empresa, na prática de lides simuladas, com o fim de prevenir lesão a direitos sociais indisponíveis dos trabalhadores. Incontroverso o uso da Justiça do Trabalho como órgão homologador de acordos, verifica-se lesão à ordem jurídica a possibilitar aplicação de multa em razão do dano já causado à coletividade. [...] Tal cominação não impede que o dano moral coletivo infligido em face da prática lesiva, homologação de acordos trabalhistas, utilizam-se do aparato judiciário com o fim fraudulento, seja reparado, com multa a ser revertida ao FAT, pelos danos decorrentes da conduta da empresa190.

O Ministro Aloysio Corrêa da Veiga afirmou ainda na

decisão que não há qualquer dúvida de que o interesse coletivo foi atingido, em

face da atitude da empresa, que levou mais de 90% das rescisões de contratos

de trabalho ao judiciário, com o fim de obter homologação de acordo na Justiça

do Trabalho, em lides simuladas que não podem ser aceitas ante a fraude

operacionalizada. Assim, foi restabelecida a sentença de primeiro grau que

condenou a empresa a pagar o valor de R$ 30.000,00 a título de indenização a

ser revertida ao FAT.

3.4.9 Outras irregularidades

Observa-se ainda na jurisprudência dos Tribunais Regionais do

Trabalho que outras irregularidades podem ocasionar a ocorrência do Dano

Moral Coletivo. O TRT da 24ª Região julgou pertinente a condenação num caso

de simulação de rescisão sem justa causa dos contratos de trabalho, visando o

saque dos depósitos do FGTS e a percepção do seguro desemprego:

190 TST. 6ª T. RR n. 1156/2004-004-03-00 Rel. Ministro Aloysio Corrêa da Veiga. j. em 04.10.2006.

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EMENTA: AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO MORAL COLETIVO COMPROVADO. INDENIZAÇÃO DEVIDA. Comprovada a fraude perpretada pelas rés, traduzida na simulação de dispensa imotivada, com o intuito de saque dos depósitos de FGTS e a percepção do benefício do seguro desemprego, fica evidenciado o dano a toda a coletividade de trabalhadores, que são os destinatários de ambos os fundos, voltados à sua proteção nas situações de desemprego, devendo atender a finalidade social para a qual foram criados191.

Também concebendo a hipótese de ser a coletividade de

trabalhadores sujeito passivo do dano moral, o TRT da 18ª Região manteve a

condenação arbitrada à ré na sentença de primeiro grau, no montante de R$

300.000,00 (trezentos mil reais), por fazer uso abusivo do poder de comando,

ao limitar a 5 minutos diários, o tempo dos trabalhadores do setor de

“teleatendimento”, ao atendimento das suas necessidades fisiológicas:

EMENTA: AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO. USO ABUSIVO DO COMANDO PATRONAL. [...] A limitação e o controle excessivo do tempo que o empregado dispõe para o atendimento a suas necessidades fisiológicas constituem ofensa á dignidade do trabalhador, podendo gerar medida judicial capaz de fazer cessar a arbitrariedade patronal, além da aplicação das cominações legais pertinentes. [...] O desrespeito ao trabalhador provocado pela ré violou direitos sociais e ocorreu de forma genérica e não individual, tendo em vista que não se refere a apenas um ou alguns empregados, constituindo uma prática reiterada da empresa, atingindo, portanto, interesses sociais de uma coletividade192.

Há, ainda, na jurisprudência, conforma explicita Medeiros Neto193,

a ocorrência de outras irregularidades que geram o Dano Moral Coletivo no

Direito do Trabalho, como a exigência de carta de fiança dos trabalhadores

191 TRT 24ª Região. RO n. 00178-2006-002-24-00-6. Rel. Juiz Ricardo G. M. Zandona. j. em 23.01.2007. 192 TRT 18ª Região. RO 00891-2005-001-18-00-5. Rel. Juiz Gentil Pio de Oliveira. j. em 29.11.2005. 193 MDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo, p. 260.

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para admissão na empresa; a conduta ilegal de manter trabalhadores sem

vínculo formalizado; a exigência de devolução pelos trabalhadores da parcela

da multa de 40 % incidente sobre o FGTS, como condição para nova

contratação, entre outras.

Diante de todos os julgados trazidos à baila, de maneira

exemplificativa, nesta pesquisa, observaram-se condutas que geraram o Dano

Moral Coletivo no Direito do Trabalho. Afere-se, portanto, que a concepção

correta do Dano Moral Coletivo não se vincula aos elementos e racionalidade

que informam a responsabilidade civil nas relações de cunho individual e

privado. 194

Mostrou-se, enfim, que é incontroverso o reconhecimento e a

efetiva reparação dos Danos Morais Coletivos no Direito do Trabalho, por meio

da ação civil pública, mediante o sancionamento do ofensor, desestimulando e

prevenindo novas lesões, em decorrência da ofensa aos valores e bens mais

elevados de um agrupamento de trabalhadores, constituindo assim uma das

formas de alicerçar o Estado Democrático de Direito.

194 MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo, p. 149.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A presente pesquisa teve como objetivo investigar, à luz da

legislação, doutrina e jurisprudência, a possibilidade da utilização do instituto

do Dano Moral Coletivo no Direito do Trabalho.

A intenção foi de instigar o leitor a verificar se existe fundamento

legal para o Dano Moral Coletivo, e se ele pode ocorrer em decorrência de

situações oriundas da relação de trabalho.

Para uma melhor abordagem, o trabalho foi dividido em três

capítulos:

O primeiro versou sobre os interesses transindividuais e sua tutela

no Direito do Trabalho. Demonstrou-se que do atual cenário das relações de

trabalho, marcado pela massificação de conflitos, emergem Interesses

Transindividuais. Esses Interesses, que se dividem em difusos, coletivos e

individuais homogêneos devem ser tutelados coletivamente.

Verificou-se que a jurisdição trabalhista passou a abarcar um

sistema que é vocacionado à tutela preventiva ou reparatória dos interesses

citados anteriormente. Esse sistema de tutela coletiva foi sistematizado com o

advento da Lei n. 7.347/85 – Lei da Ação Civil Pública (LACP), e, em seguida,

com a Lei n. 8.078/90 – Código de Defesa do Consumidor (CDC). Observou-

se, ainda, que a utilização da tutela coletiva para defesa dos interesses

transindividuais possui vantagens próprias, como a reparação da imediata da

violação aos direitos dos trabalhadores no curso da relação de trabalho.

Porém, para sua efetiva utilização, é preciso uma mudança cultural dos

operadores do direito laboral, já que o acesso coletivo à justiça exige,

sobretudo, um pensar coletivo.

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No segundo capítulo estudou-se o Dano Moral; O Dano Moral

decorrente das relações de trabalho e o Dano Moral Coletivo. Acerca do Dano

Moral, tem-se que atualmente a sua noção não está mais ligada unicamente à

dor ou tristeza, e a base legal que permite sua reparação encontra-se na

CRFB/88, no Código Civil, entre outros diplomas legais. Em relação ao Dano

Moral decorrente das relações de trabalho, este não depende de previsão

expressa na CLT para ser indenizado, bem como não há mais dúvidas quanto

à competência da Justiça do Trabalho, para julgá-lo, após a Emenda

Constitucional n. 45 de 2004.

Acerca do Dano Moral Coletivo, constatou-se que corresponde à

lesão injusta e intolerável a interesses titularizados pela coletividade, os quais

possuem natureza transindividual, refletindo valores e bens fundamentais para

a sociedade. Seu reconhecimento e possibilidade de sua reparação atingiram

respaldo constitucional e infraconstitucional; a responsabilidade nesse tipo de

dano é objetiva; não há necessidade de demonstrar a lesão em si, pois o dano

se evidencia no próprio fato da violação, este sim, passível de comprovação; a

parcela pecuniária oriunda da condenação deve atender à finalidades

sancionatória e preventiva. No final deste capítulo, destacou-se ainda que não

é possível falar-se em Dano Moral Coletivo decorrente da lesão a interesse

individual homogêneo, já que nesses casos a reparação ocorrerá

individualmente.

No terceiro e último capítulo tratou-se do Dano Moral Coletivo no

Direito do Trabalho. Demonstrou-se que no Direito do Trabalho, configura o

Dano Moral Coletivo o descumprimento, por parte dos empregadores, dos

direitos sociais trabalhistas difusos ou coletivos. Em tais casos, a parcela

pecuniária correspondente à condenação deve ser revertida para o FAT,

admitindo-se ainda a adequação da parcela indenizatória, revertendo-a para

outros fins, sempre tentando proporcionar à coletividade uma forma de

recomposição da ordem jurídica violada.

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Alguns aspectos processuais importantes foram destacados, para

uma melhor compreensão da aplicabilidade do instituto em estudo. Assim,

aferiu-se que a Ação Civil Pública é o instrumento eficaz para buscar a

indenização pelos danos causados, restando o Ministério Público do Trabalho o

legitimado mais apto para buscar tal reparação. Em relação à prescrição dos

direitos metaindividuais, não há que se falar nesse tema, por serem

indisponíveis e não haver previsão legal. Também não há que se falar em

litispendência entre a Ação Civil Pública e uma eventual ação individual, haja

vista que tratariam de interesses diferentes. Finalmente, as hipóteses de

incidência do Dano Moral Coletivo no Direito do Trabalho foram apresentadas

exemplificativamente, e ilustradas com situações reais já julgadas pelos

Tribunais do Trabalho no Brasil.

Retoma-se, para encerrar esta pesquisa, as três hipóteses

lançadas na introdução:

a) A globalização e a proliferação dos conflitos de massas

resultaram no surgimento de interesses transindividuais, que podem ser

tutelados coletivamente, inclusive na Justiça do Trabalho.

Esta hipótese restou confirmada, pois como aferiu-se no Título 1.2

da pesquisa, a sociedade contemporânea e os efeitos da globalização

trouxeram interesses que não se enquadram entre os interesses públicos e

privados, passando a configurar os interesses transindividuais.

Os interesses transindividuais, que se dividem em difusos,

coletivos e individuais homogêneos, são também observados na seara laboral,

e é possível identificá-los. Esse interesses podem ser tutelados coletivamente,

conforme viu-se no Título 1.3 da pesquisa, aplicando-se os institutos

processuais preconizados pela Lei de Ação Civil Pública e o Código de Defesa

do Consumidor.

b) A base legal voltada para a reparação do Dano Moral Coletivo

possui assento constitucional e infraconstitucional.

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Essa hipótese também restou confirmada, uma vez que a

CRFB/88 abriu um novo horizonte quanto ao Dano Moral Coletivo, adotando o

princípio da reparação integral (art. 5º, incisos V e X), reafirmando a primazia

da tutela jurídica em toda a extensão dos direitos transindividuais, e

valorizando, destacadamente, o instrumento apto à sua proteção, no art. 129,

inciso III.

No plano infraconstitucional também restou sedimentada, de

maneira explícita, a base legal de proteção em face do Dano Moral Coletivo,

por força do disposto nos artigos 1º e 21, da LACP e dos artigos 2º, parágrafo

único; 6º, incisos VI e VII; 110 e 117 do CDC. Além desses diplomas legais, o

Dano Moral Coletivo encontra assento na Lei n. 8.625/93 (Lei Orgânica do

Ministério Público dos Estados) e na LOMPU, tudo conforme explicou-se nos

Subtítulos 2.3.2 e 2.3.3 da pesquisa.

Dessa maneira, as referências legais mencionadas afirmam o

reconhecimentos da titularização dos direitos coletivos, passíveis de proteção

em caso de lesão.

c) O Dano Moral Coletivo pode ser decorrente das relações de

trabalho.

Esta última hipótese igualmente restou confirmada, pois ficou

claro no Título 3.1 da pesquisa que configura o Dano Moral Coletivo no Direito

do Trabalho o descumprimento, por parte dos empregadores, dos direitos

sociais trabalhistas difusos ou coletivos.

O Dano Moral Coletivo pode ocorrer, por exemplo, quando houver

discriminações que envolvam gênero, idade, saúde e ideologia na admissão ao

emprego ou na vigência do contrato de trabalho; quando há promoção do

trabalho escravo, forçado ou ainda de menores de 16 anos; no

descumprimento do direito à saúde, higiene e segurança do trabalho, entre

outros exemplos que foram apresentados.

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Além do posicionamento doutrinário trazido à baila nesse sentido,

colacionou-se também o entendimentos dos TRTs de todo o país, que

concretizam por meio de exemplos a teoria de que o Dano Moral Coletivo pode

ocorrer na seara laboral.

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