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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ PROGRAMA DE MESTRADO EM SAÚDE E GESTÃO DO TRABALHO JURACI MARIA TISCHER VIVÊNCIA DE MULHERES SUBMETIDAS À CESARIANA Itajaí (SC) 2014

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ

PROGRAMA DE MESTRADO EM SAÚDE E GESTÃO DO TRABALHO

JURACI MARIA TISCHER

VIVÊNCIA DE MULHERES SUBMETIDAS À CESARIANA

Itajaí (SC)

2014

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JURACI MARIA TISCHER

VIVÊNCIA DE MULHERES SUBMETIDAS À CESARIANA

Dissertação apresentado ao Programa de Mestrado Profissionalizante em Saúde e Gestão do Trabalho da Universidade do Vale do Itajaí como requisito para obtenção do título de Mestre.

Orientadora: Profa. Dra. Stella Maris Brum Lopes

Coorientador: Prof. Msc. José Roberto Bresolin

Itajaí (SC)

2014

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FICHA CATALOGRÁFICA

T611v TISCHER, Juraci Maria Vivência de mulheres submetidas à cesariana [dissertação] /

Juraci Maria Tischer. – Itajaí, 2014. 137f. ; 30cm.

Orientadora: Profa. Dra. Stella Maris Brum Lopes Dissertação (Mestrado Profissionalizante em Saúde e gestão

do trabalho) – Universidade do Vale do Itajaí.

Inclui referências. 1. Parto. 2. Cesariana. 3. Medicalização. 4. Puerpério. CDD 618.86

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FOLHA DE APROVAÇÃO

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A todas as mulheres que exercem seu protagonismo e sua autonomia

para tomar decisões em relação ao seu próprio corpo.

E a todas que têm a capacidade de, como diz Clarice Lispector,

“jamais perder a sensibilidade, mesmo que às vezes ela arranhe um

pouco a alma”, porque “a vida é para quem é corajoso o suficiente

para se arriscar e humilde o bastante para aprender”.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus por ter iluminado e sustentado a realização deste trabalho.

À minha orientadora, professora doutora Stella Maris Brum Lopes, agradeço por sua

generosidade e capacidade de compreensão. Sua maneira crítica e competente de analisar

minhas ideias e propostas foi fundamental para o desenvolvimento desta dissertação.

Ao professor mestre José Roberto Bresolin, companheiro na jornada de mestrado, por

sua constante disponibilidade para ouvir, discutir e indicar caminhos. Obrigada!

Meu agradecimento e reconhecimento especial à professora doutora Elisete Navas

Sanches Próspero, pela presença sempre iluminada, pela disposição em auxiliar e, sobretudo,

pelas contribuições que suscitaram novos olhares, novos entendimentos.

Minha gratidão a todas as mulheres participantes desta investigação, que, com sua

receptividade, interesse e riqueza de relatos, aceitaram-me em suas vidas e possibilitaram a

construção deste trabalho.

E também a Izabel Cristina Mendes, que me auxiliou no processo de produção e

revisão textual, meu agradecimento pelo poder de ser uma cigarra que transforma

atravessamentos.

Aos colegas do curso de mestrado e de trabalho que compartilharam deste processo de

construção e conquistas. Em especial à enfermeira Josiane Steil, meu carinho e

agradecimento.

À minha filha Elis e ao meu filho Lucas, luzes da minha vida, meus amores, fonte de

inspiração na construção da minha trajetória existencial.

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“O nosso verdadeiro lugar de nascimento

é aquele em que lançamos pela primeira vez

um olhar de inteligência sobre nós próprios.”

Marguerite Yourcenar

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RESUMO

TISCHER, Juraci Maria. Vivência de mulheres submetidas à cesariana. Dissertação (Mestrado em Saúde e Gestão do Trabalho) – Universidade do Vale do Itajaí, Itajaí/SC, 2014.

Durante a gravidez, inúmeras expectativas e sentimentos rondam o cotidiano da gestante, intensificando fantasias e ansiedades frente a um momento muito esperado, mas cercado pelo imprevisível. A vivência do parto marca profundamente a vida das mulheres pelas emoções positivas ou negativas experimentadas, traduzidas pela intensidade dos sentimentos que cercam esse momento. No campo das pesquisas científicas há um intenso debate sobre as questões relacionadas à assistência ao parto, que tende a transformar um evento fisiológico normal em um processo médico-cirúrgico. Este estudo, de abordagem qualitativa, analisou a vivência de 11 mulheres submetidas à cesariana em uma maternidade de referência do estado de Santa Catarina, em relação ao desejo da via de parto, ao atendimento obstétrico e aos sentimentos, dificuldades e problemas vividos no puerpério. Os dados foram coletados em dezembro de 2013, por meio de entrevista realizada no domicílio das participantes da pesquisa, e submetidos a análise de conteúdo. As falas das mulheres entrevistadas indicaram que a assistência ao parto, em grande medida, não esteve descolada do contexto do modelo de saúde hegemônico do país, caracterizado pelo uso excessivo de tecnologia e pela medicalização do corpo feminino. Os resultados obtidos neste estudo apontaram que intervenções desnecessárias no corpo da mulher continuam ocorrendo e transformam o parto em uma experiência de sofrimento, medo e insegurança. Práticas desaconselhadas pela Organização Mundial de Saúde e pelo Ministério da Saúde, como a aceleração de parto com ocitócitos, persistem na assistência ao parto na instituição pesquisada. Em relação à prática de enfermagem, os relatos mostraram que, em muitas situações, ela esteve voltada à dimensão biológica da mulher em detrimento dos aspectos subjetivos que permeiam o processo vivenciado pelas mulheres na maternidade. Identificamos, nas falas das entrevistadas, a necessidade de maior proximidade com os profissionais de enfermagem e o desejo de serem ouvidas e compreendidas. As participantes da pesquisa expressaram a carência de um tratamento pautado em confiança, respeito e atitudes humanitárias. As intervenções cirúrgicas seguiram uma lógica de difícil contestação pelas mulheres em virtude da falta de argumentos capazes de questionar a autoridade do conhecimento médico-científico, dificultando mudança no modelo tecnocrático de assistência ao parto.

Palavras-chave: Parto; Cesariana; Medicalização; Puerpério.

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ABSTRACT

TISCHER, Juraci Maria. Experience of women undergoing cesarean delivery. Dissertation. (Master Degree in Health and Management of Work) – Universidade do Vale do Itajaí, Itajaí/SC, 2014.

During pregnancy, many expectations and feelings surround the daily experience of the pregnant woman, intensifying fantasies and anxieties, faced with a much-anticipated moment, yet surrounded by the unpredictable. The experience of childbirth profoundly marks women's lives, through the positive or negative emotions experienced, as reflected by the intensity of emotions that occurs in this period. In the field of scientific research, there is intense debate on issues related to healthcare during childbirth, which tends to turn a normal physiological event into a medical-surgical process. This study adopts a qualitative approach, analysing the experiences of eleven women undergoing cesarean section at a maternity referral hospital in the state of Santa Catarina. The reports were analyzed in relation to the decision on the type of delivery, the obstetric care received, and the feelings, difficulties and problems experienced in the postpartum period. The data were gathered in December 2013, through interviews in the homes of the research participants, and were submitted to content analysis. The reports of the women interviewed indicated that healthcare during childbirth, in the majority of cases, was not disconnected from the context of the hegemonic health model of the country, characterized through the excessive use of technology and the medicalization of the female body. The results of this study show that unnecessary interventions in the woman’s body continue to occur, turning childbirth into an experience of suffering, fear and insecurity. Practices discouraged by the World Health Organization and the Ministry of Health, such as labor acceleration with oxytocics, persisted in the labor practices of the institution studied. In terms of nursing practice, the reports showed that in many situations, it was focused on the biological dimension of women, at the expense of the subjective factors that permeate women’s experience during childbirth. The interviewees showed a need for greater proximity with the nurses, and the desire to be heard and understood. They expressed a lack of treatment governed by trust, respect and humanitarian attitudes. The surgical interventions followed a logic that the women found hard to dispute, due to the lack of arguments to question of the authority of medical and scientific knowledge, hindering change in the technocratic model of care in childbirth.

Keywords: Labor; Cesarean Section; Medicalization; Postpartum Period.

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LISTA DE SIGLAS

ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar

BBC – British Broadcasting Corporation

BM – Banco Mundial

CFM – Conselho Federal de Medicina

Dapes – Departamento de Ações Programáticas Estratégicas

ENSP – Escola Nacional de Saúde Pública

Febrasgo – Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia

Fiocruz – Fundação Oswaldo Cruz

HIV – Vírus da Imunodeficiência Humana

HPV – Papiloma Vírus Humano

IDH – Índice de Desenvolvimento Humano

Ipea – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada

OMS – Organização Mundial de Saúde

ONG – Organização não governamental

ONU – Organização das Nações Unidas

Opas – Organização Pan-americana de Saúde

PAISM – Programa de Assistência Integral à Saúde da Mulher

PHPN – Programa de Humanização no Pré-natal e Nascimento

PMNC – Parceria para a Saúde Materna, de Recém-nascidos e Crianças

PNDS – Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Criança e da Mulher

PNH – Política Nacional de Humanização

Rehuna – Rede pela Humanização do Parto e Nascimento

Same – Serviço de Apoio Médico e Estatística

Segorj – Associação de Ginecologia e Obstetrícia do Estado do Rio de Janeiro

SUS – Sistema Único de Saúde

UniRio – Universidade Federal do Rio de Janeiro

UTI – Unidade de Terapia Intensiva

WHO – World Health Organization

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO............................................................................................................. 12

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA............................................................................... 15

2.1 POLÍTICAS PÚBLICAS DE ATENÇÃO À SAÚDE DAS MULHERES E AO PARTO E NASCIMENTO NO BRASIL..........................................................................

16

2.2 MEDICALIZAÇÃO DO CORPO FEMININO........................................................... 20

2.3 INDICAÇÕES PARA REALIZAÇÃO DE CESARIANA......................................... 25

2.4 AUMENTO NO NÚMERO DE CESARIANAS NO BRASIL.................................. 28

2.5 CESÁREA “A PEDIDO” E CESÁREA NÃO DESEJADA....................................... 31

2.6 O “PODER” DO MÉDICO.......................................................................................... 35

3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS............................................................... 38

3.1 LOCAL DO ESTUDO................................................................................................. 38

3.2 SUJEITOS DA PESQUISA......................................................................................... 41

3.3 PROCESSO DA PESQUISA...................................................................................... 41

3.4 ASPECTOS ÉTICOS................................................................................................ 45

4 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS...................................................... 46

4.1 AS MULHERES PARTICIPANTES DA PESQUISA............................................... 46

4.2 ASPECTOS QUE INFLUENCIARAM O DESEJO DA VIA DE PARTO................ 51

4.2.1 Desejo de viver a experiência do parto normal......................................................... 51

4.2.2 Recuperação mais fácil após o parto normal............................................................. 53

4.2.3 Conversas com familiares e pessoas conhecidas....................................................... 54

4.2.4 Informações do médico................................................................................................... 56

4.2.5 Sentimento de medo e insegurança diante da imprevisibilidade do parto........ 57

4.3 ATENDIMENTO OBSTÉTRICO................................................................................... 59

4.3.1 Uso constante de tecnologia........................................................................................... 59

4.3.2 Indução do trabalho de parto................................................................................ 61

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4.3.3 Necessidade de apoio durante o processo............................................................. 64

4.3.4 Submissão à autoridade do saber médico............................................................. 68

4.4 SENTIMENTOS, DIFICULDADES E PROBLEMAS VIVIDOS NO

PUERPÉRIO....................................................................................................................

69

4.4.1 Necessidade de descanso depois da cirurgia......................................................... 69

4.4.2 Insegurança e solidão na sala de recuperação...................................................... 71

4.4.3 Complicações puerperais e desconfortos pós-cesariana...................................... 72

4.4.4 Impessoalidade do atendimento de enfermagem................................................. 75

4.4.5 Período de recuperação no domicílio.................................................................... 77

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS....................................................................................... 80

REFERÊNCIAS............................................................................................................... 83

APÊNDICES.....................................................................................................................

ANEXOS...........................................................................................................................

96

134

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1 INTRODUÇÃO

A gravidez, o parto e a maternidade, como outros eventos corporais, são submetidos a

construções simbólicas incorporadas e naturalizadas pelos sujeitos. Constituem temas

antropologicamente relevantes, uma vez que não se esgotam em fatos biológicos, mas

abrangem dimensões que são estabelecidas cultural, social, histórica e afetivamente. É

possível perceber a dimensão social da gravidez a partir dos diferentes modos como ela é

apreendida e vivenciada pelas mulheres em diferentes sociedades e tempos históricos (PAIM,

1998; MIRANDA, 2012).

O nascimento de uma criança é um acontecimento importante na vida das famílias e na

construção das comunidades. Para a mulher, o parto é uma experiência única e um

acontecimento singular no universo feminino, momento transcendente de sua vida. Durante a

gravidez, inúmeras expectativas e sentimentos rondam o cotidiano da gestante, intensificando

fantasias e ansiedades frente a um momento muito esperado, mas cercado pelo imprevisível.

A vivência do parto marca profundamente a vida das mulheres pelas emoções positivas ou

negativas experimentadas, traduzidas pela intensidade dos sentimentos que cercam esse

momento, com possíveis implicações para o relacionamento entre mãe e bebê e para o

desenvolvimento da criança (MALDONADO, 2002; LOPES et al., 2005).

No campo das pesquisas científicas há um intenso debate sobre as questões

relacionadas à assistência ao parto, que tende a “transformar um evento fisiológico normal em

um processo médico-cirúrgico” (OLIVEIRA; MADEIRA, 2002, p. 134). Considerada, no

passado, um procedimento de exceção e indicada apenas em situações de risco de morte para

gestantes, a cesariana representa um avanço na obstetrícia moderna e, quando indicada

corretamente, é benéfica tanto para a gestante quanto para o concepto (FAÚNDES,

CECATTI, 1991; MANDARINO et al., 2009).

A elevação das taxas de cesárea é um fenômeno mundial desde as últimas décadas do

século XX (PATAH; MALIK, 2011). No Brasil, essas taxas têm aumentado desde os anos 80

do século passado, girando em torno de 30% no sistema público e podendo chegar a mais de

70% nos serviços do sistema suplementar (FAÚNDES; CECATTI, 1991; MANDARINO et

al., 2009; FARIA; SAYD, 2013).

Segundo Domingues et al. (2014), em 2009 a proporção de cesarianas superou a de

partos normais do país, atingindo 52% em 2010. Essa prevalência de cesáreas é a mais alta do

mundo, ficando próxima dos valores da China (46,2%), Turquia (42,7%), México (42%),

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Itália (38,4%) e Estados Unidos (32,3%) e muito superior à Inglaterra (23,7%), França (20%)

e Finlândia (15,7%) (OECD, 2011).

Estudos como os de Barbosa et al. (2003), Faúndes et al. (2004), Leal et al. (2007),

Miranda et al. (2008), Melchiori et al. (2009), Pereira (2010) e Iorra (2011) têm demonstrado

que 70 a 80% das mulheres que foram submetidas à cesariana desejavam realizar parto

normal. Essa preferência das mulheres pelo parto vaginal antes do nascimento do bebê

contrasta com os elevados índices de cesáreas ocorridas (IORRA, 2011).

Leal et al. (2014, p. 28) afirmam que “o excesso de cesáreas acomete principalmente

as mulheres brasileiras de mais alto padrão de escolaridade, alcançando 89,9% no setor

privado de saúde”. Importa ressaltar que a recomendação da Organização Mundial da Saúde

(OMS) é de que somente 15% dos partos sejam realizados por meio desse procedimento

cirúrgico (FIOCRUZ, 2014).

Análise do perfil de mulheres submetidas à cesariana, feita por Knupp, Melo e

Oliveira (2008, p. 43), mostrou que “o problema não está centrado exclusivamente na saúde,

não se deve apenas às questões médicas”. Por isso, devemos considerar a influência de outros

aspectos, como sociais, psicológicos, culturais e econômicos que envolvem a mulher inserida

nesse contexto (KNUPP; MELO; OLIVEIRA, 2008; MANDARINO et al., 2009). Os valores,

crenças, sentimentos, percepções e representações de parto são o resultado dessa influência.

“Essa compreensão que gira em torno do parto, que está supostamente cristalizada, determina

as práticas cotidianas, as quais dificultam mudança no modelo vigente, no caso, biomédico e

assistencialista” (MIRANDA et al., 2008, p. 344).

Considerando essa realidade e como enfermeira obstetra, seguidora de uma prática de

cuidados ditos humanizados e contrariando, em certa medida, a dinâmica de serviços de saúde

pautada numa visão mecanicista e reducionista que segue o modelo biomédico, acredito ser

possível realizar um trabalho diferenciado de atendimento integral na arte de partejar.

Atuei longos anos diretamente no cuidado à mulher em maternidades, trabalhando

mais especificamente em centros obstétricos, assistindo inúmeros partos. Há 19 anos transito

nesse ambiente, na condição de docente vinculada a uma escola pública da rede federal de

ensino profissionalizante também na área da saúde da mulher.

Nessa rotina profissional, especialmente no espaço de uma maternidade cuja totalidade

de atendimentos é feito pelo Sistema Único de Saúde (SUS), vivenciei várias experiências,

sentimentos, diálogos paralelos com mulheres no processo parturitivo e observei que, com o

aumento da incorporação de tecnologias, as mulheres estão sujeitas a diferentes formas de

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violência, como a admissão precoce, o uso desmedido de estimuladores da musculatura

uterina e de métodos farmacológicos de diminuição da dor, a permanência prolongada no leito

do pré-parto, a valorização do parto na posição horizontal, a realização frequente da Manobra

de Kristeller, a manutenção de práticas como tricotomia, fleet enema, episiotomia e,

principalmente, a cesariana.

Observei número elevado de cesarianas que culminaram em limitações no pós-parto,

como dor, dificuldades na movimentação, interferência negativa nos cuidados pessoais e do

recém-nascido, dificuldades no acolhimento por alguns profissionais e no retorno às

atividades de rotina e complicações no processo de recuperação no período puerperal com

comprometimento na qualidade de vida — aspectos destacados por Sousa et al. (2009) em

estudo sobre mensuração e características de dor após cesárea e sua relação com limitação de

atividades.

Essas experiências instigaram meu interesse em investigar e analisar as vivências de

mulheres submetidas à cesariana em relação ao desejo da via de parto, ao atendimento

obstétrico e aos sentimentos, dificuldades e problemas vividos no puerpério.

Algumas mulheres abriram o seu universo familiar, em seu domicílio, para narrar

como vivenciaram todo esse processo. A partir da análise desses casos, espero poder

contribuir com reflexões acerca das práticas de cuidado e atenção à mulher no ciclo gravídico-

puerperal, enfatizando a necessidade de discutir questões relativas à vivência de mulheres

submetidas à cesariana, no sentido de repensar o modelo de atendimento que se pretende

humanizado.

Esta dissertação está organizada em cinco capítulos, incluindo este introdutório. O

segundo capítulo apresenta a fundamentação teórica como resultado da interlocução com

diversos autores e suas formulações sobre o tema trabalhado. Foi elaborado a partir da leitura

de múltiplas fontes (livros, revistas especializadas, artigos científicos, teses e dissertações).

O terceiro capítulo se ocupa dos procedimentos metodológicos e o quarto é dedicado à

apresentação, análise e discussão dos resultados da pesquisa. Em seguida são feitas

considerações finais com sugestões para novos estudos.

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2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

A precariedade do atendimento à saúde das mulheres no Brasil é marcada por sérios

problemas de saúde pública: a mortalidade materna e a morbidade grave que afeta expressivo

número de mulheres, denunciando falhas na qualidade da atenção a todo ciclo gravídico-

puerperal (REIS; PEPE; CAETANO, 2011).

O elevado número de cesarianas é apontado como responsável pela manutenção das

altas taxas de mortalidade materna no Brasil por Cesar Victora (apud FORMENTI, 2014) —

professor da Universidade Federal de Pelotas e um dos autores do relatório lançado em junho

deste ano Johanesburgo durante o Fórum da Parceria para a Saúde Materna, de Recém-

nascidos e Crianças (PMNC).

Victora (apud FORMENTI, 2014) ressalta que as melhorias na atenção à saúde da

gestante têm efeitos anulados por consequência do grande número de cesáreas no Brasil.

Também acentua que, quando cesáreas são feitas sem indicação necessária, há um aumento de

risco de mortalidade materna de 20% e o problema é provocado pela falsa ideia, difundida por

parte da classe médica, de que a cesárea é mais segura que o parto normal.

O país apresenta uma das maiores taxas mundiais de cesarianas, alcançando índices

entre 70 e 90% em determinados hospitais, segundo Nascimento et al. (2011), que também

apresentam dados do SUS que revelam haver quatro vezes mais riscos de infecção puerperal

nas cesarianas, em relação ao parto normal, e que a mortalidade materna após cesariana é três

vezes maior do que no parto normal ou no abortamento.

As taxas de cesárea no mundo, e em especial no Brasil, têm sido motivo de intensos

debates nos últimos anos. Essa temática é relevante em várias pesquisas, porém, os resultados

são contraditórios sobre as possíveis complicações para a saúde, sobre os fatores que motivam

a realização de partos cirúrgicos e sobre a análise de custos relacionados às diferentes formas

de parto (PATAH, 2008).

A pesquisa intitulada Nascer no Brasil — apontada como o maior estudo já realizado

sobre parto e nascimento no país —, coordenada pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) em

parceria com diversas instituições científicas do país e divulgada em maio deste ano, revela

que quase 70% das brasileiras desejava parto normal no início da gravidez, mas poucas foram

apoiadas em sua preferência (FIOCRUZ, 2014).

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Segundo a coordenadora da pesquisa, Maria do Carmo Leal (apud FIOCRUZ, 2014), o

número excessivo de cesarianas expõe desnecessariamente as mulheres e os bebês aos riscos

de efeitos adversos no parto e nascimento. Ela afirma que “o índice elevado de cesarianas se

deve a uma cultura arraigada no Brasil de que o procedimento é a melhor maneira de se ter

um filho. Em parte porque, no Brasil, o parto normal é realizado com muitas intervenções e

dor”. Leal comenta que há influência do pré-natal, das amigas e dos familiares na decisão das

mulheres pelo tipo de parto e que “não se pode, entretanto, deixar de destacar que é uma visão

equivocada achar que a cesariana é a forma mais segura para parir” (LEAL apud FIOCRUZ,

2014).

De acordo com Freitas e Savi (2011), a cesariana aumenta o risco de complicações que

podem persistir depois da alta hospitalar, sendo esse um dos importantes desafios enfrentados

para assegurar o direito do cuidado de saúde qualificado de cada mulher. Na pesquisa por eles

realizada, entre as mulheres cujo parto foi pelo SUS, a probabilidade de complicações após

uma cesariana foi mais do que o dobro em comparação com o parto vaginal. Os estudos de

Liu et al. (2007) e Häger et al. (2004) também apontam risco elevado de complicações pós-

cesárea em relação aos associados ao parto vaginal.

Este capítulo se ocupa dessa temática e coloca em evidência as políticas públicas de

atenção à saúde das mulheres e ao parto e nascimento no Brasil, as indicações para cesariana,

o aumento do número de cesarianas no país, a cesárea “a pedido” e a cesárea não desejada e o

“poder” do médico.

2.1 POLÍTICAS PÚBLICAS DE ATENÇÃO À SAÚDE DAS MULHERES E AO PARTO E

NASCIMENTO NO BRASIL

O governo brasileiro direcionou sua preocupação com a saúde das mulheres

especificamente à gestação, ao parto e ao puerpério somente no final da década de 1970

(TYRREL; CARVALHO, 1995). Ao longo dos anos 1980, saúde e direitos reprodutivos

foram privilegiados pelo movimento de mulheres que pressionaram mudanças nas políticas

públicas voltadas para a saúde da mulher que até então estavam dirigidas exclusivamente ao

atendimento da gravidez e do parto. Essa reflexão “levou à discussão entre o modelo [...]

holístico, o modelo médico [...] e o modelo humanista [de parto], problematizando-se os

conflitos filosóficos, corporativos e financeiros envolvidos” (NAGAHAMA; SANTIAGO,

2008, p. 1859).

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Em 1983 ocorreram avanços na organização da assistência com o processo de

reorganização do sistema de saúde e a consolidação dos direitos da mulher com enfoque

epidemiológico e ações básicas para redução da morbimortalidade. Foram lançadas as bases

do Programa de Assistência Integral à Saúde da Mulher (PAISM), que propôs uma

abordagem global de maior atenção à saúde da mulher em todas as fases do seu ciclo vital e

não somente no ciclo gravídico-puerperal (BRASIL, 1984; SERRUYA, 2003).

Segundo Mouta (2009, p. 37), esse “pode ser considerada o primeiro passo na história

das políticas públicas voltadas para a saúde da mulher no processo de desmedicalização e

humanização da assistência”. A iniciativa de questionar a conduta dos profissionais de saúde

no campo obstétrico (nas décadas de 1980 e 1990) deu início ao movimento de humanização

do parto e do nascimento (NASCIMENTO et al., 2010).

A atenção obstétrica passou por importantes mudanças com o lançamento, em 1985,

pela OMS, do documento intitulado Tecnologias apropriadas para o parto e nascimento, que

impulsionou a adoção de boas práticas, com evidências científicas, para atenção à parturiente

(OMS, 1996; BRASIL, 2001). O documento propõe incentivo ao parto vaginal, ao

aleitamento materno no pós-parto imediato e à presença do pai ou acompanhante no processo

do parto, além de alterações de rotinas hospitalares desnecessárias e geradoras de risco e

excessivamente intervencionistas, como episiotomia, amniotomia, enema, tricotomia e

particularmente parto cirúrgico tipo fórceps ou cesáreas.

Tornquist (2002) acentua que o movimento social pela humanização do parto no

Brasil, pelo menos desde o final dos anos 1980, foi marcante do ponto de vista da organização

de associações do tipo não governamental e redes de movimentos identificadas com a crítica

do modelo hegemônico de atenção ao parto, tendo como base consensual a proposta da OMS

de 1985. Entre elas se destaca a Rede pela Humanização do Parto e Nascimento (Rehuna),

constituída em 1993 por representantes de profissionais e usuários dos serviços de saúde e que

tem desenvolvido ações importantes para efetivação dessa nova proposta, como a realização

de campanhas como a que defendeu o direito à presença do pai ou outro acompanhante no

processo de parto e que contribuiu para a criação de uma lei federal garantindo esse direito

(DINIZ, 2005; TORQUINST, 2003; MOUTA, 2009).

Com o objetivo de promover o parto saudável e a prevenção da mortalidade materna,

evitando-se excessos na utilização dos recursos tecnológicos, a OMS instituiu em 1995 o

Projeto Maternidade Segura. Esse movimento a favor de uma nova prática obstétrica teve

importante reforço político e técnico quando, em 1996, a OMS (1996) elaborou e publicou um

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guia prático com um conjunto de recomendações para a assistência ao parto normal,

preconizando um cuidado mais humanizado e seguro por parte dos profissionais (BRASIL,

2001; SERRUYA, 2003).

Mesmo admitindo dificuldades na implantação do PAISM, o Ministério da Saúde

declarou prioridade de governo à saúde da mulher em 1998, retomando o enfoque da saúde

reprodutiva, e adotou medidas para incentivar o parto normal. Foi dado um reajuste no valor

pago pelo parto e criado o Sistema de Referência para Gestação de Alto Risco, constituído por

maternidades que acompanham as parturientes com algum tipo de complicação. Essas

maternidades passaram a receber adicional sobre os valores de tabela dos procedimentos

realizados (SERRUYA, 2003; BRASIL, 2002).

Ainda no mesmo ano, o Ministério da Saúde (BRASIL, 1998) reconheceu

oficialmente a assistência ao parto por enfermeira obstetra nos hospitais conveniados com o

SUS. Cabe ressaltar que a OMS, desde a década de 1970, enfatiza a importância da

enfermeira obstetra na assistência materno-infantil que reconhece as qualificações necessárias

para uma adequada assistência à gestante, além de orientar a família e a comunidade

(CAPARROZ, 2003).

Em 1999 o Ministério da Saúde deliberou pela criação de casas de parto para a

assistência aos partos de baixo risco. Os centros de parto normal surgiram com o objetivo de

resgatar o direito à privacidade e à dignidade da mulher ao dar à luz num local semelhante ao

seu ambiente familiar e ao mesmo tempo garantir segurança à mãe e a seu filho, oferecendo-

lhes recursos tecnológicos apropriados em casos de eventual necessidade, ficando enfermeiros

obstetras responsáveis por todos os cuidados prestados às mulheres e bebês. Desse modo,

esses especialistas da enfermagem tiveram fundamental importância para a reconfiguração do

campo obstétrico com a perspectiva da humanização do parto (PROGIANTI; VARGENS,

2004; DINIZ, 2005).

“O projeto de Casas de Parto, após um início promissor, encontrou limites e

resistências principalmente dos médicos” (DINIZ, 2005, p. 60). Assim, em torno do

significado de “humanização”, no que se refere especificamente à assistência obstétrica, há

um campo de disputas e negociações (DINIZ, 2001).

Desde o final da década de 1990, a expressão “humanização do parto” tem sido

utilizada pelo Ministério da Saúde para se referir a uma série de políticas públicas promovidas

com o apoio da OMS, da Organização Pan-americana de Saúde (Opas) e do Banco Mundial

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(BM) e com a colaboração ou parceria de diversos atores sociais, como ONGs e entidades

profissionais.

No ano 2000 foi instituído o Programa de Humanização no Pré-natal e Nascimento

(PHPN) com objetivo primordial de assegurar a melhoria do acesso, da cobertura e da

vinculação do pré-natal à assistência ao parto e puerpério, garantindo a qualidade da

assistência na perspectiva dos direitos de cidadania. Essa iniciativa inaugurou um processo

mais amplo de humanização dos serviços conduzidos pelo Ministério da Saúde (BRASIL,

2000; SILVA; CHRISTOFFEL; SOUZA, 2005; DINIZ, 2005). “Esse período assistiu a uma

mudança de comportamento tanto entre médicos como entre parturientes no Brasil: o

surgimento da adoção da cesariana como principal técnica de parto” (FARIA; SAYD, 2013,

p. 2).

Em 2002, o Brasil, assim como os demais Estados-Membros da Assembleia Geral da

Organização das Nações Unidas (ONU), assumiu como prioridade, até 2015, o compromisso

de empreender esforços em prol do alcance da melhoria da saúde da gestante. E um dos

objetivos de desenvolvimento do milênio é melhorar a saúde materna com redução de três

quartos da mortalidade materna entre 1990 e 2015 (IPEA, 2007). São enormes os desafios que

ainda persistem, a exemplo da redução das altas taxas de cesariana e nascimentos pré-termo e,

no parto vaginal, as rotinas impróprias, tais como intervenções dolorosas (ZORZETTO,

2006).

A Política Nacional de Humanização (PNH), lançada em 2003 pelo Ministério da

Saúde, parte da afirmação de que a falta de percepção dos direitos femininos e de aspectos

fundamentais da humanização eram o pano de fundo da má assistência; procurou, assim,

enfocar a integralidade da assistência, mesmo conhecendo as limitações de uma medida

vertical (BRASIL, 2000).

A I Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres, realizada em 2004 em

Brasília, foi muito importante na afirmação dos direitos da mulher. Teve como objetivos

promover a atenção obstétrica e neonatal e combater a violência de gênero, enfatizando o

empoderamento das mulheres para o exercício da autonomia e protagonismo no parto, o que

contribuiu para a redução da morbidade e da mortalidade feminina no Brasil, especialmente

por causas evitáveis em todos os ciclos de vida (BRASIL, 2005).

Os órgãos de saúde e universidades do Brasil aderiram à proposta do Pacto Nacional

para a Redução da Mortalidade Materna, firmado em março de 2004, tendo em vista que foi

sinalizada a necessidade de um profissional com perfil modificado. Além de competência

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técnica, ele deve ter o compromisso de oferecer à clientela um espaço para o diálogo,

identificando as reais necessidades e expectativas para que a assistência seja planejada e

executada de acordo com a realidade das gestantes no serviço de saúde (BRASIL, 2002;

BRASIL, 2004; SILVA; CHRISTOFFEL; SOUZA, 2005).

Em 2011 foi criada, no âmbito do SUS, a Rede Cegonha, com o objetivo de organizar

a gestão do sistema para a consolidação de redes de atenção materna e infantil, por meio da

elaboração de planos de ação e qualificação, propondo como estratégia a desospitalização do

parto e nascimento de risco habitual, que passaria a ser atendido em centros de parto normal

peri ou intra-hospitalares com a enfermeira obstetra e/ou obstetriz na centralidade do cuidado.

No entanto, dependerá de como as propostas serão transformadas em ações concretas e

chegarão ao cotidiano dos serviços, com a cultura e as práticas institucionalizadas nos

serviços.

Para reverter a tendência crescente das taxas de cesárea no país, serão necessárias

medidas multidimensionais. A Rede Cegonha se propõe a enfrentar esse desafio, mas há

necessidade de atuação específica no setor de saúde suplementar. É importante ter um

componente de comunicação: a informação dirigida às mulheres sobre suas opções e direitos

no parto é uma estratégia a ser resgatada como parte central das ações de saúde (BRASIL,

2011).

São muitos os desafios enfrentados para a concretização das ações e dos programas e

ainda muitos obstáculos identificados, como as dificuldades de acesso aos serviços de saúde, a

falta de leitos, a deficiência de recursos humanos, financeiros e materiais, a atenção centrada

na prática intervencionista, desconsiderando o protagonismo da mulher no momento do parto,

e o despreparo dos profissionais de saúde para a atenção humanizada no processo de

parturição.

2.2 MEDICALIZAÇÃO DO CORPO FEMININO

Nos dias atuais, a medicina se torna cada vez mais parte do cotidiano da maioria das

pessoas, oferecendo uma explicação e também uma intervenção para as mais diversas

situações como o sono, o sexo, a alimentação, as emoções (POLI NETO; CAPONI, 2010).

Em uma busca bibliográfica sobre o significado do termo “medicalização”, Poli Neto e

Caponi (2010) apresentam uma pluralidade de definições, entre elas: crescimento em número

de estabelecimentos médicos e de profissionais médicos, maior produção, variedade e

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distribuição de medicamentos, incorporação de temas pela racionalidade biomédica, controle

dos indivíduos por meio da medicina.

O corpo feminino foi medicalizado ao longo da história e constituído como objeto da

medicina. Embora date do início do século XVI a aproximação dos médicos ao parto, somente

nos séculos XVIII e XIX foi que esse cuidado com o corpo feminino se legitimou. Essa

apropriação “pelo saber médico foi efetivamente marcada pelo desenvolvimento de um

conhecimento cirúrgico e tecnológico promovido pela aproximação da medicina com o

momento do parto” (VIEIRA, 2002, p. 23). No Brasil, até o final do século XIX se discutia

nas academias a quem competia a responsabilidade de cuidar dos partos. Nessa época,

efetivamente quem realizava os partos eram as parteiras ou aparadeiras.

O modelo biomédico, mecanicista, cartesiano, estruturado durante o século XIX,

associa doença à lesão, reduzindo o processo saúde-doença à sua dimensão

anatomofisiológica. O parto passou de um evento social ligado à cotidianidade das mulheres a

um evento médico e hospitalar (MARTINS, 2004) — fato consolidado no século XX. A

mulher foi transferida para o espaço hospitalar, excluindo-se os componentes históricos,

sociais, culturais, políticos e ecônomicos.

De um extremo ao outro, inúmeros avanços e retrocessos podem ser apontados: se por um lado o conhecimento acerca da fisiologia do trabalho de parto, parto e nascimento trouxeram segurança para a mulher e bebê, por outro lado, diversas intervenções praticadas por profissionais médicos, dotados de conhecimentos obstétricos e cirúrgicos, retiraram do binômio a vivência plena desse momento. Essa evolução impôs uma mudança à assistência obstétrica, especialmente pela substituição das parteiras por profissionais médicos e as ações intervencionistas (MIRANDA et al., 2008).

Está estabelecido no Brasil um modelo de atenção ao parto definido como um evento

médico carregado de risco potencial. A gestante é tratada como paciente. Os partos, em sua

maioria, são institucionalizados, sendo o médico o profissional responsável pela assistência,

com utilização abusiva de intervenções obstétricas (DOMINGUES; SANTOS; LEAL, 2004).

É nesse quadro que a ciência apoia a progressiva medicalização do corpo da mulher (BOTI,

2013).

Ao abordar o tema, Leão et al. (2013, p. 2395) consideram que “a medicalização é

uma transformação cultural que influenciou a capacidade de enfrentamento autônomo da

experiência de parir, visto que implica dependência excessiva, heteronomia e consumo

abusivo de cesarianas”.

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Conforme Aguiar (2012), as parturientes saudáveis dispõem de uma fisiologia para a

deflagração do seu parto em condições naturais, não sendo necessárias intervenções externas.

Esse é um aspecto revelador da objetificação feminina perante a prática médica. É a

fragmentação do corpo da mulher representada pelo não respeito à dor física e ao desconforto

por ela manifestado (PEREIRA, 2004).

Cardoso e Barbosa (2012), em investigação com mulheres de classe média que

desejavam partos normais e pariram de cesarianas, observaram que se cristaliza a hegemonia

do modelo de assistência tecnocrático que coloca em risco a autonomia e a satisfação

feminina com a experiência de parir, sendo que a assistência médica na sociedade capitalista

restabelece a desigualdade social dos corpos através da medicina de classes, uma vez que os

resultados ilustram

uma (sutil ou explícita) interferência do obstetra sobre a escolha das mulheres, influenciando o desfecho em cesariana e sugerindo que, para muitas mulheres, não está sendo possível escapar das “armadilhas” de um modelo biomédico mercantilizado, interventor e iatrogênico, institucionalizado e legitimado pela sociedade (CARDOSO; BARBOSA, 2012, p. 35).

Recentemente tem aumentado a visibilidade sobre os problemas que atingem a

população de mulheres e crianças no país, principalmente no tocante a um momento de

grande vulnerabilidade: o do nascimento e correspondente ao parto. Morais (2010) acentua

que vulnerabilidade pressupõe a existência de relações desiguais entre indivíduos ou grupos.

Ela é percebida na medicalização do processo parturitivo, que nega a capacidade da mulher de

parir com segurança sem o seu auxílio e define para ela um papel cada vez mais passivo no

nascimento do bebê (DESLANDES, 2006).

Em pesquisa com dois grupos de gestantes sobre o processo de incorporação de

tecnologia, Miranda (2012) verificou que, no setor privado, o discurso médico durante o pré-

natal, ao invés de reduzir a ansiedade e o medo da gestante e da família, reforçou, por um

lado, as dores e o risco do parto normal e, por outro, a segurança da cesariana; no setor

público, a tecnologia é incorporada por meio de relações hierárquicas e desiguais entre

parturientes e profissionais. Barbosa et al. (2003) afirmam que muitas vezes é transmitida à

gestante, durante o pré-natal, a ideia infundada de que a cesariana é mais segura para a mãe e

para o bebê.

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Para Cardoso e Barbosa (2012, p. 47), “a ‘certeza’ de estarem evitando riscos para o

bebê parece atuar como mecanismo de defesa para uma melhor aceitação da cesariana”.

Segundo as autoras, “a introjeção do resultado ‘positivo’ da cirurgia foi sinalizada pela OMS

como um fator preocupante, pois transforma a cesariana em referência de ‘segurança’”.

(CARDOSO; BARBOSA, 2012, p. 47).

Talamonte et al. (2012) comentam que as indicações para cesariana — antes feitas

notadamente nos casos de distócia mecânica, desproporção cefalopélvica e apresentações

anômalas — ampliaram-se com o aumento da segurança do procedimento e também sob a

alegação de minimizar a morbidade e mortalidade perinatais.

Com referência à institucionalização do parto, Souza et al. (2013) ressaltam que a

hospitalização pode constituir um fator gerador de estresse, pois a mulher se depara com

diferentes normas e rotinas no ambiente hospitalar. As intervenções mais intensas feitas por

imposição médica, no sentido de padronizar e ordenar procedimentos, acontecem no momento

do parto (SERRUYA, 2003).

É sabido que o acompanhamento do trabalho de parto demanda, na maioria das vezes, muito mais horas do que a realização de uma cesariana. [...] A visão do trabalho de parto e do parto como eventos de risco, além da necessidade de conformá-los ao processo de produção do hospital implicam, quase sempre, na tentativa de regulação e controle do parto pelos médicos, levando a inevitáveis interferências (FARIA; SAYD, 2013, p. 2427).

Entre os fatores relacionados às elevadas taxas de cesárea no Brasil está a utilização de

tecnologias inapropriadas na assistência à gestação e ao parto, motivo pelo qual partos de

baixo risco acabam sendo acompanhados de forma excessivamente medicalizada, tendo como

um dos desfechos a cesariana (SALGADO, 2012).

No Projeto de intervenção para melhorar a assistência obstétrica no setor

suplementar de saúde e para o incentivo ao parto normal, a Agência Nacional de Saúde

Suplementar e a Comissão de Parto Normal do Conselho Federal de Medicina (ANS; CFM,

2014) destacam que mais de 90% das cesarianas ocorrem sem que a mulher tenha entrado em

trabalho de parto, aumentando a chance de o feto ser retirado do útero ainda prematuro. Isso é

um reflexo

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da medicalização social, descrita como um processo sociocultural complexo que transforma em necessidades médicas as vivências, os sofrimentos e as dores que antes eram administradas no próprio ambiente familiar ou comunitário. A medicalização transforma culturalmente as populações, com um declínio na capacidade de enfrentamento autônomo das dores e adoecimentos. Esta contribuiu para o declínio da capacidade da mulher em lidar com o fenômeno do parto, sua imprevisibilidade e as dores do trabalho de parto (LEÃO et al., 2013, p. 2396).

Sodré e Lacerda (2007) asseveram que os médicos percebem o parto como um sistema

potencialmente doentio que necessita de intervenções não individualizadas para estabelecer o

domínio sobre a mulher. Essa conduta tem gerado questionamentos sobre “os efeitos da

medicalização excessiva na avaliação e assistência de gestantes, principalmente para as de

baixo risco na assistência ao trabalho de parto e parto” (LOBO et al. 2010, p. 813).

Maia (2008, p. 68) acentua que o “discurso científico adota uma prática de assistência

normativa e domesticadora de corpos percebidos como instáveis e defeituosos” para justificar

a desigualdade de gênero e destaca a imagem do médico com talento tecnológico impregnado

de boas intenções dentro do modelo medicalizado e a imagem da mulher objeto, indefesa,

presa a um corpo fisiopatológico. Para Leão et al. (2013), esse estado contribui para o declínio

da capacidade da mulher em lidar com o fenômeno do parto, sua imprevisibilidade e as dores

do trabalho de parto.

A utilização inadequada da tecnologia na atenção ao pré-parto tem apresentado

resultados maternos e perinatais desfavoráveis e a assistência no modelo de cuidado

intervencionista tem sido uma fonte de insatisfação para as mulheres com efeitos

potencialmente adversos (LOBO et al., 2010). Soma-se a isso “a inserção social

desprivilegiada das(os) usuárias(os) dos serviços públicos de saúde que são obrigadas(os) a

submeter-se ao que lhes é oferecido” (ALMEIDA; SILVA, 2008, p. 349-350).

Muitas vezes, grandes investimentos hospitalares em tecnologias caras estão

diretamente ligados à estabilidade econômica das instituições (MULLAN, 2004). “Neste

sentido, os hospitais podem ver nas cesarianas e noutras técnicas cirúrgicas um modo de

extrair a capacidade instalada, quer de recursos técnicos, quer de profissionais especializados”

(FERNANDES, 2012, p. 85).

Cabral, Hirt e Van der Sand (2013, p. 285-286) constatam que a tendência à

medicalização no parto é reforçada pelo uso indiscriminado de tecnologias biomédicas,

“como se a cesariana fosse a via natural e sempre melhor e mais segura para o parto,

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condicionando as mulheres à escolha do parto cirúrgico, em detrimento do que seria per se

uma preparação em direção à indicação natural e, portanto, lógica, que seria o parto normal”.

2.3 INDICAÇÕES PARA REALIZAÇÃO DE CESARIANA

A cesariana é um procedimento cirúrgico — com incisões feitas na parede abdominal

e na parede uterina (CUNNINGHAM et al., 2012) — desenvolvido com o intuito de reduzir o

risco de complicações maternas e fetais durante a gravidez e o parto (PATAH; MALIK,

2011). É a intervenção cirúrgica mais praticada no mundo, com estimativa de 20 milhões de

cesarianas realizadas anualmente (BETRÁN et al., 2007; GIBBONS et al., 2012).

Ao longo do século XX, os inúmeros avanços da medicina transformaram a cesariana

numa alternativa segura ao parto vaginal quando há algum risco para a mulher ou para o feto

(DIAS; DESLANDES, 2004). O aperfeiçoamento das técnicas cirúrgicas e dos métodos de

anestesia reduziu o risco desse procedimento (PEREIRA; ZUGAIB, 2002), que mudou muito

quanto às suas indicações (MARTINS-COSTA; RAMOS; SALAZAR, 2011).

A cesariana é um procedimento cirúrgico e, como tal, apresenta riscos maternos e

fetais. A decisão pelo nascimento por essa via de parto deve ser tomada em situações

especiais, pelo médico, quando os riscos do procedimento sejam suplantados pelos benefícios

(MARTINS-COSTA et al., 2002).

As principais indicações para cesariana são classificadas em absolutas e relativas.

Entre as absolutas, Montenegro e Rezende (2011) citam placenta prévia total e parcial,

malformações genitais, tumorações prévias e desproporção cefalopélvica com feto vivo.

Martins-Costa, Ramos e Salazar (2011) mencionam cicatriz uterina corporal prévia, situação

transversa, herpes genital ativo, procidência de cordão e morte materna com feto vivo.

As indicações relativas são classificadas em maternas, fetais e materno-fetais. As

primeiras incluem cardiopatias e pneumopatias específicas, dissecação aórtica, condições

associadas à elevação da pressão intracraniana e história de fissura retovaginal. As fetais são

sofrimento fetal, prolapso de cordão, apresentação pélvica ou córmica, gemelidade com

primeiro feto não cefálico, gemelidade monoamniótica, macrossomia, malformações fetais

específicas, herpes genital ativo e vírus da imunodeficiência humana (HIV) com carga viral

acima de 1.000 cópias/ml (MONTENEGRO; REZENDE, 2011).

Fetos com meningomielocele, hidrocefalia e concomitante macrocrania, defeitos de

parede anterior com fígado extracorpóreo, teratomas sacrococcígenos, hidropsia ou

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trombocitopenia aloimune se beneficiam do nascimento por cesariana (MARTINS-COSTA et

al., 2002).

As indicações relativas materno-fetais são cesárea prévia, descolamento prematuro de

placenta com feto vivo, placenta prévia marginal e placenta baixa, distando menos de dois

centímetros do orifício interno do colo (MONTENEGRO; REZENDE, 2011).

Segundo Martins-Costa, Ramos e Salazar (2011), as indicações mais comuns para

cesariana ocorrem nos casos de cesariana prévia, distócia ou falha de progressão do trabalho

de parto, apresentação pélvica e condição fetal não tranquilizadora.

Amorim, Souza e Porto (2010) buscaram na literatura as melhores evidências

disponíveis sobre indicações de cesariana e analisaram aquelas que por eles foram

consideradas principais: distócia ou falha na progressão do parto, desproporção cefalopélvica,

má posição fetal nas variedades de posição posteriores e transversas persistentes, apresentação

pélvica, de face e córmica, cesárea anterior, frequência cardíaca fetal não tranquilizadora,

presença de mecônio e centralização fetal.

Esses pesquisadores concluíram que em nenhuma dessas situações existe indicação

absoluta de cesariana, uma vez que, mesmo na apresentação córmica, o parto normal pode ser

tentado, mediante versão cefálica externa. Nas distócias de progressão, o parto normal pode

ser alcançado mediante correção da contratilidade uterina, porém, a cesariana é indicada

quando a desproporção cefalopélvica é diagnosticada pelo uso judicioso do partograma

(AMORIM; SOUZA; PORTO, 2010).

Para os autores, a apresentação pélvica também pode ser corrigida com versão cefálica

externa a termo, mas a via de parto deve ser discutida com a gestante quando esse

procedimento falha ou não é realizado. Eles concluem que, “embora os riscos relativos

neonatais sejam maiores para o parto vaginal, os riscos absolutos são baixos, e a opinião da

gestante deve ser considerada” (AMORIM; SOUZA; PORTO, 2010, p. 416).

Em investigação complementar, Souza, Amorim e Porto (2010) abordaram indicações

como placenta prévia, descolamento prematuro de placenta, vasa prévia, placenta acreta,

infecção por HIV, herpes genital, hepatites e por papiloma vírus humano (HPV), condiloma

genital, gestação múltipla, prolapso do cordão umbilical, distensão segmentar e ruptura

uterina e observaram que a cesariana está formalmente indicada em algumas situações

particulares, como na placenta prévia total. Em outros casos, segundo os autores, pode haver

indicação de cesárea intraparto, porém, situações como HPV e gemealidade não representam

per se indicações de cesárea (SOUZA; AMORIM; PORTO, 2010).

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Estudo desenvolvido por cientistas de 25 países analisou, ao longo de oito anos, 2,8

mil partos cirúrgicos em grávidas de gêmeos, tentando desmitificar a crença de que há um

risco maior para a mãe e os bebês quando o nascimento ocorre por parto normal. “Provou-se

que era mito”, acentua o obstetra Renato Sá (apud BBC BRASIL, 2014), vice-presidente da

Associação de Ginecologia e Obstetrícia do Estado do Rio de Janeiro (Segorj), que participou

da pesquisa.

Outras situações relatadas por obstetras ouvidos pela BBC Brasil (2014) como

justificativas para indicação de cesárea em consultórios brasileiros se relacionam aos fatos de

“o bebê ser grande ou pequeno demais”, de “a mãe ter bacia estreita” ou de “o bebê virar de

posição durante o parto”. Um dos mitos mais frequentes é o do bebê estar com o cordão

umbilical enrolado no pescoço. “O cordão é como um fio de telefone: para enforcar a criança,

seria necessário muito esforço. De qualquer forma, quando ela desce pelo canal vaginal, o

cordão vai se desenrolando” (SÁ apud BBC BRASIL, 2014).

Para o médico James Cadidé (apud FRANZIN, 2014), da Comissão de Parto da

Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), só existem

duas indicações absolutas para cesariana: a desproporção cefalopélvica e a apresentação

prévia da placenta.

A desproporção ocorre quando a ossatura da bacia da mãe é incompatível com a da

cabeça do bebê. Isso acontece em casos de mães que possuem alguma deformidade ou

desalinho nos ossos, por conta de um acidente ou deficiência física, ou ainda em situações em

que o bebê tem a cabeça maior que o normal, devido a problemas de saúde como hidrocefalia

ou diabetes. No caso da apresentação prévia da placenta, o parto normal não acontece devido

à oclusão da passagem do bebê (FRANZIN, 2014).

Segundo Cadidé (apud FRANZIN, 2014), há indicações relativas, ou seja, que

dependem da avaliação do médico, como: sofrimento fetal, quando a mulher não tem

dilatação completa, descolamento prematuro de placenta, placenta prévia com sangramento

intenso, distócia (complicações que atrapalham ou impedem a passagem do bebê), herpes

vaginal ativa (por conta do risco de desenvolver cegueira no bebê), mãe portadora de HIV. O

médico reforça que há circunstâncias em que a cesárea é recomenda, por exemplo, quando a

mulher apresenta cansaço físico, em casos de posição ruim e situações de distócia.

Outro caso é a hipertensão desenvolvida pela mulher durante gestação: a eclampsia.

“Se a mãe é diabética grave, também é preciso fazer cesárea”, afirma Etevino Trindade (apud

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BBC BRASIL, 2014), presidente da Febrasgo. E quando a gestante tem um problema grave

de coração, a cirurgia deve ser feita.

Ainda estão nessa categoria as grávidas portadoras de HIV que tenham uma carga

viral alta e imunidade baixa ou com uma lesão de herpes genital ativa no fim da gestação (a

cesárea evita o contágio do bebê) e o descolamento prematuro da placenta, que gera risco de

sangramento excessivo (BBC BRASIL, 2014).

Na maioria dos casos, a situação específica deve ser avaliada. “Uma cesárea também

traz riscos, apesar de serem menores do que no passado”, afirma o obstetra Pedro Octávio

Britto Pereira, professor da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UniRio). “É

preciso saber qual é a forma de parto mais segura e optar por ela”, assevera Pereira (apud

BBC BRASIL, 2014).

2.4 AUMENTO NO NÚMERO DE CESARIANAS NO BRASIL

Nos últimos 20 anos houve avanços importantes de praticamente todos os indicadores

da saúde materna no Brasil, assim como ampliação do acesso aos serviços de saúde, além de

significativas mudanças sociodemográficas e econômicas. No entanto, ainda há desigualdades

e indicadores preocupantes (DINIZ, 2009).

No Brasil, segundo Nascimento et al. (2010), um dos fatores que podem ter

contribuído para a medicalização do parto e o aumento do número de cesáreas sem indicação

clínica foi a distribuição de contraceptivos e cirurgias de laqueaduras tubárias dirigidas às

populações pobres nos anos 1970, no regime militar, com o intuito de reduzir o crescimento

populacional que ocorria notadamente entre as populações pobres. Essas informações são

corroboradas no estudo realizado por Faria e Sayd (2013), no qual os autores relatam que, no

período compreendido entre 1970 e 1974, ocorreu uma elevação no número de cesáreas em

relação tanto às mulheres atendidas na categoria particular como quanto às atendidas pelo

sistema previdenciário.

A OMS preconiza que o total de cesarianas em relação ao número total de partos

realizados em um serviço de saúde fique na faixa dos 15%. Essa recomendação está

fundamentada no preceito de que apenas 15% do total de partos apresentam indicação precisa

de cesariana, ou seja, existe uma situação real onde é fundamental para a preservação da

saúde materna e/ou fetal que tal procedimento seja realizado cirurgicamente e não por via

natural (OMS, 1996).

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29

Mas no Brasil os percentuais são bem mais elevados. Estudo realizado em Juiz de Fora

(Minas Gerais) em 1988 identificou aumento da incorporação tecnológica no parto e trouxe

para a discussão o crescente número de cesarianas, superando os índices de parto normal

(FARIA; SAYD, 2013). Dados do Ministério da Saúde revelam que em 1997 o índice de

partos operatórios atingiram 63,3%, porém, com a Portaria nº 2816/1998 (BRASIL, 1998) —

que determina controle sobre o pagamento máximo de cesarianas em relação ao total de

partos financiados pelo SUS por hospital, sendo que, quando os limites determinados são

ultrapassados, não ocorre o pagamento —, foi verificada uma queda percentual das

cesarianas, pelo menos para os partos realizados pelo SUS.

Informações mais recentes revelam que, no Brasil, a cesariana representa 43,8% dos

partos realizados nos setores público e privado. Quando se leva em conta os planos de saúde

privados, constata-se que esse contingente é ainda maior, chegando a 80% do total de partos.

Na rede pública, os partos por cirurgia somam 40%. Dados do Ministério da Saúde mostram

que em 12 anos o número de cesáreas saltou de 599 mil para 747 mil. Enquanto isso, partos

normais estão diminuindo: no ano 2000 foram feitos 1,9 milhão de partos e doze anos depois

o número caiu para 1,2 milhão (IBGE, 2009; GLOBO, 2013; OLIVEIRA; RITTO, 2013).

No ranking da OMS, o Brasil aparece em segunda colocação entre os países com mais

cesarianas em relação ao total de nascimentos no período de 2000 a 2010, ficando atrás

apenas do Chipre, que apresentou índice de 50,9% (OLIVEIRA; RITTO, 2013). “Há uma

epidemia de cesarianas no Brasil”, afirma Dário Pasche (apud OLIVEIRA; RITTO, 2013),

diretor do Departamento de Ações Programáticas Estratégicas (Dapes) do Ministério da

Saúde. Para ele, há um misto de comodismo e questões de mercado por parte dos médicos,

que acabam evitando o parto normal.

Os dados da Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Criança e da Mulher

(PNDS), realizada em 2006, também demonstram elevação no número de cesarianas e

revelam que esse tipo de cirurgia é mais comum no meio urbano que no meio rural (45,7% e

35% respectivamente). É um procedimento que aumenta com a escolaridade e nível

econômico, chegando a 83,2% para as mães com 12 anos ou mais de estudo. Os dados

encontrados para as regiões Sul e Sudeste são muito parecidos: 51,3% e 51,5%

respectivamente. O percentual foi inferior nas regiões Centro-Oeste (48,6%) e nas regiões

Norte e Nordeste atingiu 30,6% e 32%, respectivamente (BRASIL, 2009).

Em análise dos dados de nascidos vivos, realizada por Chiavegatto Filho (2013) na

cidade de São Paulo, em 2001 a taxa de cesarianas era de 48,9%, passando a 56,8% em 2010.

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30

O autor comenta que, no período estudado, foram observadas taxas de nascimento

expressivamente menores aos domingos, dia de natal e dia de finados, quando comparados

aos demais dias do ano.

Cabe ressaltar que, de acordo com Salgado (2012), o uso rotineiro de tecnologias

inadequadas na gestação e no parto conduz a mulher a uma cesárea com impacto no

puerpério, repercutindo na relação do binômio mãe-filho. A OMS propõe mudanças nesse

modelo de atendimento ao parto hospitalar/medicalizado no Brasil, recomenda a modificação

de rotinas hospitalares consideradas desnecessárias, geradoras de risco e excessivamente

intervencionistas, fazendo referência especial ao parto cesariano. A proposta da OMS não é

eliminar tais intervenções, mas reduzi-las apenas às situações de necessidade comprovada,

uma vez que se entende que o modelo de atenção ao parto e ao nascimento hospitalar estaria

abusando de práticas prejudiciais à saúde da mulher e do bebê (TORNQUIST, 2002).

É um modelo de saúde hegemônico, orientado pela lógica de mercado e pelo uso

abusivo da tecnologia, que, de acordo com Silva (2006), prevalece na assistência ao parto no

Brasil — concentrado nas mãos do médico, que muitas vezes opta pela forma mais

conveniente para a resolução do parto —, resultando em elevada taxa de cesáreas encontrada

nos serviços de saúde.

As diferenças existentes na realização dos partos cirúrgicos, de acordo com as categorias de financiamento hospitalar, escolaridade da mãe e horas de realização do procedimento, reforçam que a indicação tem muito mais a interferência da comodidade e remuneração dos profissionais do que as necessidades de saúde das mulheres e seus filhos (SILVA, 2006, p. 163).

Nesse contexto, as maternidades são instituições que têm forte poder de decisão sobre

a vida da mulher, controlam como e quando será o parto, como deve ser o comportamento das

pessoas envolvidas no processo (GAÍVA; TAVARES, 2002). A mulher não tem o direito de

decidir sobre a sua saúde. Ao investigar a percepção dos profissionais de saúde que atuam na

atenção ao parto, Souza, Gaíva e Modes (2011) constataram que

a humanização da assistência ao parto ainda não é uma prática comum na maioria dos hospitais estudados e que a equipe não está preparada para prestar um serviço humanizado e com qualidade tanto para a mãe quanto para o recém-nascido [...] é essencial mudar o modelo biomédico, essencialmente técnico, para um modelo que valorize os aspectos sociais e culturais da gestação e parto (SOUZA; GAÍVA; MODES, 2011, p. 479).

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De acordo com Wagner (2001), permanece subjacente à prática médica de assistência

ao parto um modelo intervencionista de organização a fim de otimizar o tempo do profissional

e não retardar o fluxo de atendimentos. Pereira (2010, p. 137) enfatiza que os principais

fatores que levam à indicação médica da cesárea sem embasamento clínico são os de “ordem

econômica e de organização da agenda do médico, bem como o modelo intervencionista da

assistência obstétrica no Brasil”.

Sobre esse assunto, Nascimento et al. (2011) entendem que a justificativa para os altos

números desse tipo de intervenção está relacionada a fatores não-clínicos, como os

socioeconômicos (alta escolaridade materna, maior poder econômico, seguro de saúde

privado), às características demográficas e reprodutivas (idade materna, primiparidade,

cesárea prévia) e aos serviços de saúde (maior frequência ao pré-natal, nos partos realizados

em serviços privados, por conveniência médica, falta de capacitação médica, quando há

admissão precoce da gestante, cesárea a pedido, fatores institucionais e mudanças nas práticas

obstétricas).

2.5 CESÁREA “A PEDIDO” E CESÁREA NÃO DESEJADA

As tecnologias se apresentam como escolhas para democratizar as relações entre os

vários atores no processo da assistência à saúde (ARAÚJO; CARDOSO, 2007). No entanto, a

assistência baseada na suposta segurança dos procedimentos médicos intervencionistas, com a

marca de um tipo de serviço cujo prestígio está associado à incorporação de tecnologia,

transformou o parto normal em um parto passível de risco. A tecnologia médica surge como

uma resposta necessária para o controle desse risco, justificando a legitimação social da

cesariana como um procedimento rápido, seguro, indolor, moderno e ideal para qualquer

grávida, adaptando-o para que se insira no imaginário moderno, ocidentalmente construído,

de isentar a mulher da dor. Essa assistência à saúde aparece destacadamente nas

representações sociais (MANDARINO et al., 2009; CARNEIRO, 2013).

Uma das justificativas apontadas por diversos autores como explicação para o número

elevado de cesarianas é a cesárea “a pedido” da mulher. Cesárea a pedido, cesárea por escolha

ou solicitação da paciente é sinônimo de cesariana eletiva na ausência de indicação médica

(PATAH, 2008). Sabatino (2007, p. 482) afirma que a cesárea geralmente denominada “a

pedido” da mãe “se justifica em parte porque as mulheres têm informações erradas ou

incompletas sobre o processo do parto. Relatam medo da dor do parto”.

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Profissionais de saúde apontam como motivos ligados à paciente as percepções

associadas a eventos físicos, como o medo da dor no momento do trabalho de parto e parto e a

possibilidade de evitar dores após a cirurgia com a utilização de analgésicos, assim como a

ideia de que a cesárea permite à mulher manter a função sexual, o que seria importante para o

coito vaginal, noção de maior risco para o feto no parto vaginal e ainda a possibilidade de

marcar uma data para laqueadura (WHO, 1985; FAÚNDES; CECATTI, 1991; SABATINO,

2007; VELHO et al., 2012).

Conforme Mazzoni et al. (2011), o incremento nas taxas de cesariana vem sendo

atribuído em parte ao pedido da mãe. Em uma revisão sistemática sobre a preferência das

mulheres pela via de parto em uma série de países de média e alta renda, os resultados

apontaram que apenas uma minoria de mulheres de uma ampla variedade de países

manifestou preferência pela cesariana. Esses estudos demonstram que há distorções que

parecem refletir mais uma cultura médica do que uma preferência pela gestante. O termo de

solicitação tem sido utilizado como um dos principais argumentos por parte dos profissionais

médicos para justificar a elevada incidência das cesarianas (MAZZONI et al., 2011).

Em um estudo comparativo entre uma maternidade pública e outra privada no

município de São Luís, estado do Maranhão, Mandarino et al. (2009) verificaram que 79,1%

das mulheres consultadas na maternidade pública preferiam o parto vaginal e 46% das

gestantes realizaram cesariana. Na maternidade privada, 67,4% das mulheres manifestaram

preferência pela cesariana e 97,8% das gestantes realizaram o procedimento cirúrgico.

Na investigação de Salgado (2012), a maioria das mulheres consultadas relatou não ter

participado na decisão pela cesariana e muitas foram induzidas ou levadas a pedir a cesárea,

com a identificação de uma comunicação coerciva entre o profissional de saúde e a mulher,

sendo esse um fator relevante na experiência indesejada.

A cesariana é tida por muitas mães como parto ideal porque ela não causa a angústia

do trabalho de parto, quer dizer, o medo do sofrimento imposto pela dor de parto

(FAÚNDES; CECATTI, 1991). As repercussões disso são bastante sérias: as cesáreas

acarretam quatro vezes mais risco de infecção puerperal em comparação com o parto normal,

geram três vezes mais risco de mortalidade e morbidade materna por complicações pós-

cesárea, elevados riscos de prematuridade e mortalidade neonatal, dificuldade de recuperação

da puérpera, maior período de separação entre mãe e bebê — o que interfere na amamentação

—, e o aumento de gastos para o sistema de saúde. Mas isso ainda não é assumido pela

maioria dos obstetras brasileiros, em parte porque esse tipo de operação decreta o modelo

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tecnocrático do nascimento no qual esses obstetras foram treinados (CFM, 1987;

SABATINO, 2007).

O modelo da cesariana como alternativa superior e mais moderna em termos de

conforto materno com proteção de danos sexuais e contra as potenciais lesões do parto

vaginal sobre o bebê tem sido defendido pelos profissionais como paradigma de assistência

para mulheres brancas e de alta renda. Para viabilizar esse modelo, a cirurgia deve ser

agendada antes que a mulher entre em trabalho de parto (DINIZ, 2009).

A cesárea a pedido ou indicada é um fenômeno profundamente mais complexo, com

diferentes razões, mas que evidencia a falta de informações e a ansiedade em relação ao parto,

gerada, ora pelo desconhecimento, ora pelo temor do cuidado. A escolha do parto natural está

muito relacionada com as expectativas das mulheres a respeito da maternidade e com as

informações que as mulheres têm de todos os tipos, sobretudo quando estão a par das

evidências científicas e das informações que circulam nos meios ligados à humanização do

parto, nas conversas com profissionais, nos diálogos informais, depoimentos e livros

(SALGADO, 2012).

Além do medo de sentir dor como motivo para a preferência da cesárea, Melchiori et

al. (2009) identificaram, no relato de gestantes, a experiência negativa vivenciada por outras

mulheres na justificativa de opção de escolha pela cesariana. Oliveira et al. (2002) e Barbosa

et al. (2003) apontam essas e outras razões, como a condição financeira privilegiada das

mulheres, a laqueadura tubária, a ideia de que o parto vaginal irá alterar a estrutura da

genitália, a carência de enfermeiras obstétricas nas maternidades, problemas com o bebê e no

preparo no pré-natal para o parto vaginal.

Para algumas mulheres, o bom parto é o “previsível”, ou seja, uma cesárea agendada

com tudo organizado, permitindo todo tipo de preparo: dirigir-se à instituição, realizar a

cirurgia, ter o bebê, retornar ao seu lar e dar sequência à vida. Porém, para outras mulheres

que desejam a via de parto normal, seus desejos não são respeitados pelos profissionais de

saúde e elas se resignam por saber que sua experiência de submissão à cesárea foi uma

“fatalidade” (SALGADO, 2012).

Quando o médico acata de imediato o pedido de cesárea, deixa de oferecer à sua

paciente a melhor ajuda que poderia prestar para o empoderamento da mulher: a chance de

examinar o contexto, analisar e fundamentar as suas razões e assim poder entender vantagens

e desvantagens da cesárea, além de criar mecanismos para superar seus medos

(MALDONADO, 2002). “Verifica-se, portanto, que a cultura da cesárea como parto rápido e

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sem dor se encontra bastante difundida na sociedade, apresentando-se como sustentáculo para

a prática médica atual, que se utiliza dessa concepção para justificar essa conduta para si e

para os outros” (OLIVEIRA et al., 2010, p. 36). Como assevera Davis-Floyd (1994, p. 152), a

cesárea é conceitualmente útil para a obstetrícia:

ao transformar o nascimento em um procedimento cirúrgico de rotina, legitima-se a obstetrícia enquanto ato médico, pois se incorpora à sua prática um elemento central da medicina moderna e uma das formas mais elaboradas de manipulação do corpo-máquina humana — a cirurgia.

Muitas mulheres insistem na cesariana, desconsiderando o parto normal, por causa de

temores como “não estar preparada”, “não aguentar”, “não dar conta do parto”, o que torna a

cesariana uma representação simbólica de evitar a concretização desses medos e suas

repercussões (MALDONADO, 2002). Há outro aspecto importante a ser considerado nesse

contexto:

A cristalização sociocultural da ideologia da cesariana pode estar afetando também os homens, que parecem ter assimilado os mesmos medos que as mulheres — medo da dor, do sofrimento, da imprevisibilidade —, desempenhando, assim, uma influência desfavorável sobre suas companheiras (CARDOSO; BARBOSA, 2012, p. 44).

Ao abordar esse assunto, Pereira (2010) supõe que, para não manifestar seus medos e

fraquezas, a mulher desenvolve uma “sutil parceria (talvez inconsciente) com o seu médico”,

sinalizando que prefere abdicar do parto normal para não sentir dor, delegando ao médico a

tomada de decisão, ou seja, “fornecendo um aval [...] ao modelo intervencionista da

assistência obstétrica” (PEREIRA, 2010, p. 86-87).

A pesquisa de Salgado (2012) evidenciou o uso rotineiro de práticas inadequadas e

desrespeitosas, como o convencimento para realizar a cesárea com base em informação

distorcida e ameaçadora, o descaso com o bem-estar físico e emocional da mulher e do bebê e

o uso de medicamentos para sedar as mulheres. Os resultados encontrados pela autora

revelaram que, no processo que conduz as mulheres a uma cesárea indesejada “está a marca

de uma assistência que virtualmente inviabiliza a possibilidade do protagonismo feminino e

de escolha informada, priorizando as conveniências e necessidades da equipe de profissionais

e da instituição que as acompanha” (SALGADO, 2012, p. 8).

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2.6 O “PODER” DO MÉDICO

Com a transferência da assistência ao parto para o âmbito hospitalar e com toda a

evolução tecnológica, o parto intervencionista passou a representar, dentro da área médica, a

vitória da ciência sobre a natureza. Nesse contexto, a perda do poder da mulher em relação à

gestação e ao parto surge do encontro de duas forças dominadoras: “a primeira trata da

dominação masculina e a segunda da apropriação do parto pelo projeto científico denominado

obstetrícia” (BOTI, 2013, p. 650).

Macedo et al. (2005, p. 309), fazendo referência aos resultados de pesquisa

desenvolvida por Progianti (2001), enfatizam que

o processo de medicalização e a dominação do corpo da mulher por parte dos médicos fizeram com que algumas delas aceitassem e acreditassem que a realização de procedimentos invasivos fosse benéfica para a evolução do parto, embora fosse também causa de dor e sofrimento.

O médico exerce influência sobre a mulher e sua decisão sobre a via de parto porque a

autoridade médica exibe uma poderosa onipresença, baseada na legitimidade que lhe confere

seu saber e na dependência de quem ele atende. “Por essa razão, a ‘boa paciente’ é sempre

vista como aquela que obedece sem questionar e a paciente difícil é aquela que duvida,

questiona e não abre mão de seu julgamento pessoal, expressa sua vontade” (AGUIAR, 2010,

p. 123).

Pereira (2010, p. 109) busca apoio teórico em Maldonado (2002) para afirmar que,

“quanto mais o médico se considere onipotente, mais se considerará também um deus, vendo

o paciente como fraco, indefeso e dependente. A pessoa capta isso e passa a responsabilidade

do tratamento para o médico”. No caso das gestantes, seus temores são tão grandes que elas

preferem a passividade, ou seja, que o bebê seja extraído.

Em verdade, as mulheres, de modo geral, ocupam, quase sempre, em nossa sociedade, uma posição de subalternidade, resultante das relações de gênero que se estendem às relações com os profissionais de saúde, marcadas, elas próprias, por situações desiguais, nas quais a supremacia do saber científico adjudica a quem o exerce o lugar de dominante ou opressor (ALMEIDA; SILVA, 2008, p. 350).

A mulher que recorre à instituição pública de saúde já espera que ao ser internada

passe a ser um caso, recebendo um número de registro para sua identificação, deixando de ser

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sujeito, tornando-se, então, mais uma na hora de parir (BEZERRA; CARDOSO, 2005). Essa é

uma área sobre a qual a mulher passa a não ter mais controle e mostra uma das faces da

dominação que se exerce a partir da transformação do sujeito em objeto (PEREIRA, 2004).

Pereira (2004) afirma que a medicina exerce a sua prática, ora de forma exagerada,

intervindo demais, ora de maneira negligente, simplesmente não agindo, e salienta que os

médicos “foram treinados para reprimir a consciência dos danos que provocam”

(BOURDIEU, 1996, p. 38).

A desinformação e o tecnicismo que envolvem o processo de hospitalização do parto

favorecem um comportamento passivo da mulher, a partir da leitura do sistema simbólico da

sociedade de que essa etapa do processo da parturição deve ter um comando técnico,

colaborando assim para delegar ao médico a decisão sobre o alívio ou não da dor no trabalho

de parto a partir de regras e preceitos (PEREIRA, 2010).

A participação do profissional médico como promotor de uma cultura intervencionista

foi destacada em estudo nacional realizado com puérperas de clínicas privadas e públicas. De

acordo com a pesquisa, três em quatro das primíparas do setor privado e oito em dez do setor

público que tiveram o parto cirúrgico gostariam de ter tido partos vaginais. O estudo traz

situações éticas e polêmicas como a de que o obstetra promoveria os medos da parturiente

associados ao parto e superestimaria a segurança da cesariana em função de seus interesses

(FAISAL-CURY; MENEZES, 2006).

A raiz do problema está na reprodução do modelo de parto orientado para a cesárea na

formação médica; portanto, o profissional que realiza o parto tem uma enorme parcela de

responsabilidade na preferência pela cesárea (FAÚNDES et al., 2004).

Mesmo com políticas de humanização do parto e incentivo ao parto vaginal, pode estar havendo um bloqueio de ordem cognitivo-psicomotora (da habilidade clínica) associada com a ordem atitudinal (ética), além da ordem econômica, que impede a redução do volume de cesáreas, mesmo nas instituições que são “favoráveis” ao parto vaginal. A transformação no saber-fazer e na postura ética correntes nos círculos obstétricos e seu aprendizado, principalmente na sua habilidade clínica, podem estar tendo papel importante, se não determinante (TESSER et al., 2011, p. 8).

É comum os médicos considerarem que as mulheres com baixa escolaridade são

incapazes de entender informações e, portanto, a tentativa de explicação sobre procedimentos

por eles adotados representaria perda de tempo (NAGAHAMA; SANTIAGO, 2008). Essa

negação ou omissão de informações pode ser entendida como expressão da violência

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institucional contra a parturiente, como abuso cometido em virtude das relações de poder

desiguais entre profissionais e usuários dos serviços de saúde (BOTI, 2013). Nesses casos,

a questão do saber vem atrelada ao mandar e, por outro lado, ao obedecer. Quem manda e quem sabe no campo da saúde é o médico, só ele tem legitimidade para definir a situação da paciente até para ela mesma [...] quem manda e quem sabe está identificado a quem produz o sentido, a quem o arbitra, e define o que vai circular, pois ele é o produtor, e quem se submete e reproduz esses conteúdos é identificado ao dominado (PEREIRA, 2004, p. 395).

O desencontro de informações sobre as expectativas, temores e escolhas de parto entre

as gestantes e médicos pode sugerir que há uma deficiente comunicação no pré-natal da

gestante com profissionais da saúde em geral, nas representações a respeito do parto e

nascimento relacionadas ao universo sociocultural de cada uma dessas mulheres

(MELCHIORI et al., 2009).

Pereira (2004, p. 399) constata que a demanda por “determinadas tecnologias médicas

nos períodos de gestação, parto e puerpério é construída pelos médicos que as utilizam para

manter o poder simbólico e também para recriar a própria mítica, de serem os únicos a dar

conta de todos os aspectos da vida e do adoecer”.

Para Boti (2013), a prática do poder do profissional de saúde, notadamente do médico,

é consequência da visão da patologização do parto e da utilização do conhecimento que ele

tem sobre o corpo como instrumento para elevação de seu status. Isso está diretamente

associado ao fato de que, segundo Moreira et al. (2006), no ambiente de pré-parto, a

exposição e a intrusão alheia no corpo são considerados normais e aceitáveis, sendo a mulher

vista apenas sob o enfoque biológico.

Mesmo que seja difícil saber qualquer coisa dos médicos, mesmo que eles não estabeleçam uma relação que satisfaça as pacientes, são somente eles que detêm o saber e o instrumental tecnológico para dar conta do que ocorre no corpo e é dentro dos hospitais que se situam os instrumentos por eles utilizados para perscrutar o corpo que sofre ou que tem necessidade de ser examinado (PEREIRA, 2004, p. 395).

Nesse processo, embora a mulher tente buscar sua autonomia, acaba assumindo uma

postura de passividade quando deixa que o médico tome decisões por ela. “Seu protagonismo,

portanto, carece de autonomia, uma vez que ela segue o script ditado pelo modelo biomédico

e cultuado pela mídia e pela sociedade” (PEREIRA, 2010, p. 147).

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3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Este estudo se configura como uma pesquisa descritiva de abordagem qualitativa,

pautada no propósito de conhecer e interpretar a realidade, sem nela interferir para modificá-

la (RUDIO, 2008), descrevendo suas características e estabelecendo relações entre variáveis

(GIL, 1999).

Bogdan e Biklen (1994, p. 49) enfatizam que os estudos desenvolvidos a partir dessa

abordagem exigem “que o mundo seja examinado com a ideia de que nada é trivial, que tudo

tem potencial para constituir uma pista que nos permite estabelecer uma compreensão mais

esclarecedora de nosso objeto de estudo”.

Gaskell (2002, p. 65) afirma que a pesquisa qualitativa “fornece os dados básicos para

o desenvolvimento e a compreensão das relações entre os atores sociais e sua situação. O

objetivo é uma compreensão detalhada das crenças, atitudes, valores e motivação, em relação

aos comportamentos das pessoas em contextos sociais específicos”.

O enfoque qualitativo considera a existência de uma relação dinâmica entre o mundo

real e o pesquisador (HAGUETTE, 2003), permitindo a articulação de múltiplas abordagens e

métodos “em um conjunto de práticas materiais e interpretativas que dão visibilidade ao

mundo” (DENZIN; LINCOLN, 2006, p. 17), e se afasta da generalização, pois não se baseia

em um conceito teórico e metodológico unificado (FLICK, 2009).

Esse tipo de pesquisa lida com informações mais subjetivas e permite representação

verbal dos dados. Nela podem ser empregadas descrições detalhadas de fenômenos e

comportamentos, citações diretas de pessoas sobre suas experiências, utilização de trechos de

documentos, registros, gravações ou transcrições de entrevistas e discursos, interações entre

indivíduos, grupos e organizações (DIAS, 2000).

Considera-se, a partir desses pressupostos, que a opção pela pesquisa descritiva de

abordagem qualitativa é coerente para cumprir os objetivos estabelecidos para este estudo e

também adequada para o tema pesquisado, que é de natureza social e demanda um estudo

fundamentalmente interpretativo.

3.1 LOCAL DO ESTUDO

Esta pesquisa foi desenvolvida na cidade de Joinville, localizada no norte de Santa

Catarina. Joinville é a maior cidade do estado, contando com mais de 515 mil habitantes

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(49,63% de homens e 50,37% de mulheres). É o mais importante polo econômico,

tecnológico e industrial do estado e abriga o maior parque fabril de Santa Catarina, com cerca

de 1.600 indústrias e 13.400 unidades de comércio (PERINI BUSINESS PARK, 2013).

O município apresenta o 13º melhor Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do

Brasil (0,857). O índice de mortalidade infantil é de 9,3 para cada 1000 nascidos vivos. A

capacidade física instalada da rede hospitalar para obstetrícia é de 77 leitos (SUS) e 37

privados (PERINI BUSINESS PARK, 2013).

Cadastrada no Programa de Humanização do Pré-Natal e Nascimento e conveniada ao

SUS, a instituição pesquisada — Maternidade Darcy Vargas (MDV) — foi fundada em 1947

e, por se apresentar envolvida com o movimento de incentivo ao parto humanizado, acumula

títulos importantes, conferidos pelo Ministério da Saúde: Hospital Amigo da Criança (por ter

cumprido os dez passos do aleitamento materno), Maternidade Segura, Mãe Canguru, Prêmio

Galba de Araújo, conferidos àquelas maternidades que prestam uma assistência humanizada a

partir de critérios como: estímulo à amamentação e ao vínculo precoce, incentivo ao parto

normal e vertical, presença de acompanhante escolhido pela mulher para o processo do parto

(MDV, 2014).

A Maternidade funciona como hospital-escola, inclusive com residência médica em

ginecologia e obstetrícia. Recebe gestantes de baixo risco, mas também é instituição de

referência regional para gestações de alto risco. Logo, atende a uma demanda mista quanto a

esse aspecto. Em 65 anos de serviços prestados à população de Joinville, a Maternidade Darcy

Vargas presta atendimento emergencial em ginecologia e obstetrícia, acompanhamento pré-

natal para gestantes de alto risco de Joinville e região, acompanhamento ambulatorial de alto

risco neonatal, assistência de alta complexidade aos recém-nascidos prematuros e de baixo

peso na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) neonatal, além de oferecer curso de gestantes e

manter serviço especializado de banco de leite (MDV, 2014).

A instituição presta atendimento 100% pelo SUS e conta com equipe formada por 525

funcionários, 82 médicos e 67 profissionais terceirizados que prestam serviços de zeladoria e

vigilância. Nessa maternidade estão institucionalizadas várias rotinas que fazem parte do

ideário da humanização: cursos de preparação para o parto, direito da parturiente a um

acompanhante de sua escolha (durante todo o processo do parto), opção de parto de cócoras,

alojamento conjunto, estímulo a técnicas mecânicas de alívio da dor (massagens, banhos,

deambulação), uso cauteloso de indução intravenosa (ocitocina), analgesia e episiotomia, bem

como abolição das práticas de enema e tricotomia (MDV, 2014).

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Disponibiliza 87 leitos obstétricos de internação e 75 berços para alojamento conjunto.

Os leitos estão assim distribuídos: 31 no setor de pós-cirúrgicos, 16 no setor de parto normal,

33 no setor para gestantes e puérperas de alto risco e 11 leitos de permanência de longa

duração para mães que têm seus bebês internados no berçário. Todos os setores possuem

posto de enfermagem. Além disso, dispõe de três leitos para o projeto Mãe Canguru (MDV,

2014).

Ainda com referência à estrutura física dos serviços, no período da investigação se

verificou que as parturientes tinham à disposição um ambulatório de baixo risco (com plantão

médico e de enfermagem 24h) e um ambulatório de alto risco com total de sete salas: duas de

atendimento de pediatria (uma delas com aparelho para ultrassonografia), quatro de

obstetrícia e ginecologia e uma para triagem de enfermagem, e mais área específica para o

laboratório de análises clínicas (MDV, 2014).

A maternidade tem salas de cardiotocografia fetal, curativos, vacina para os recém-

nascidos de BCG e hepatite, área do banco de leite, área de pronto atendimento do recém-

nascido com cinco leitos de fototerapia, sala de atendimento da assistente social, terapia

ocupacional, fonoaudiologia, chefia de enfermagem, registro dos recém-nascidos,

controladoria, capela, almoxarifado, farmácia, rouparia, lavanderia, serviço de nutrição, dois

auditórios, Serviço de Apoio Médico e Estatística (Same), laboratório de análises clínicas e

centro de estudos (MDV, 2014).

O Centro Obstétrico mantém uma sala para realizar o preparo da gestante com maca,

material de tricotomia e fleet enema, banheiro para higienização. O espaço de pré-parto tem

sete leitos com divisórias laterais e cortinas. A maioria possui espaço restrito para o leito da

parturiente, possibilitando a presença do acompanhante com limitado espaço para

movimentação. Todos os ambientes têm à disposição detectores fetais para controle eletrônico

dos batimentos cardiofetais e um monitor de cardiotocografia para todo o setor, posto de

enfermagem e quarto de repouso médico. Há também duas salas para realização de parto e

uma sala para recuperação para o período puerperal imediato com capacidade para cinco

macas dispostas uma ao lado da outra sem divisórias. No ambiente circulam médicos,

profissionais da área de enfermagem, residentes de obstetrícia, neonatologia e anestesia,

doutorandos, estagiários de cursos técnicos de graduação e pós-graduação em enfermagem

(MDV, 2014).

O Centro Cirúrgico é amplo, com duas salas de cirurgia, sala de recuperação pós-

anestésica e ambientes anexos, centro de material e esterilização e uma sala para curetagem.

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Possui berçário, inclusive para atender casos de alto risco. Conforme a Controladoria da

Maternidade, em outubro de 2013 ocorreram 406 nascimentos, sendo 224 de parto normal e

182 por cesariana (MDV, 2014).

3.2 SUJEITOS DA PESQUISA

Na definição dos sujeitos que comporiam a amostra, adotamos, como critérios de

inclusão: ter idade superior a 18 anos, ter sido submetida à cesariana sem ter sido internada

com esse objetivo durante o período do estudo (dezembro de 2013), estar internada no setor

de alojamento conjunto pós-cirúrgico da Maternidade Darcy Vargas, residir na cidade de

Joinville e aceitar o convite, feito na maternidade, para participar da investigação.

O tamanho da amostra foi estabelecido a partir do critério de saturação teórica ou

recorrência dos dados, ou seja, a inclusão de novos participantes foi suspensa quando os

dados obtidos apresentaram, em nossa avaliação, certa redundância ou repetição, não sendo

considerado relevante persistir na coleta de dados (FONTANELLA; RICAS; TURATO,

2008).

Segundo Minayo (2008, p. 102), em pesquisa qualitativa, a “amostra ideal é aquela

capaz de refletir a totalidade [...] privilegiando os sujeitos sociais que detêm os atributos que o

investigador pretende conhecer [...] o número de participantes deve ser suficiente para

permitir certa reincidência das informações”.

3.3 PROCESSO DA PESQUISA

Após a seleção das mulheres, no primeiro contato foram explicadas as condições da

pesquisa, feito o convite para participação e solicitada permissão para a visita domiciliar entre

o 5º e o 30º dia pós-parto a fim de realizar entrevista para a coleta dos dados.

O primeiro contato foi realizado no alojamento conjunto pós-cirúrgico da maternidade.

Durante o período de internação, a pesquisadora conversou com as mulheres e obteve dados

socioeconômicos (nome, idade, formação, estado civil, situação profissional, número de

filhos) e falaram sinteticamente sobre pré-natal, trabalho de parto e limitações pós-cirúrgicas.

Esses dados se encontram reunidos no item 4.1 desta dissertação.

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Nesse momento, elas foram informadas dos objetivos e dos procedimentos

metodológicos da pesquisa. As entrevistas em domicílio foram agendadas de acordo com a

disponibilidade de tempo das participantes e o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

(Apêndice A) foi assinado por ocasião da visita domiciliar antes de iniciar a entrevista..

Com relação às técnicas de coleta de dados, optou-se pela entrevista narrativa que,

segundo Flick (2009), permite ao pesquisador abordar, de modo abrangente, o mundo

empírico até então estruturado do entrevistado. A entrevista narrativa se compõe de três

etapas: na inicial é formulada uma questão — denominada pergunta gerativa — que instigue o

entrevistado a desenvolver uma narrativa. Ele não deve ser interrompido, mesmo que cometa

digressões, até que esteja evidente que não há mais nada a falar. Em uma segunda fase há

questionamentos a fim de esclarecer possíveis inconsistências, detalhando informações. Na

terceira fase, chamada de equilíbrio, pode-se fazer um número maior de perguntas abstratas,

cujo objetivo é a descrição e a argumentação (FLICK, 2009).

Nas entrevistas foi utilizada a seguinte pergunta gerativa para estimular as

participantes a contarem sua experiência em relação ao parto cirúrgico: Você pode me contar

a história de tudo sobre o que você esperava do seu parto? A melhor maneira de fazer isso

seria você começar pela sua gestação e então passar a contar todas as coisas que aconteceram,

uma após a outra, até hoje. Você pode levar o tempo que for preciso para isso, podendo

também dar detalhes, pois tudo que for importante para você me interessa.

As entrevistas realizadas em domicílio foram tranquilas, com as mulheres

participantes da pesquisa falando sobre suas percepções e seus sentimentos em relação à

vivência do parto e do pós-parto. Elas transcorreram de forma acolhedora, tanto por parte da

pesquisadora quanto das mulheres entrevistadas. Foram momentos importantes de escuta e

diálogo, com relatos muitas vezes emocionados, que marcaram o estabelecimento de uma

relação de confiança mútua que proporcionou liberdade de expressão às entrevistadas e à

pesquisadora.

As entrevistas foram gravadas, transcritas na íntegra e submetidas à análise de

conteúdo, que constitui, segundo Bardin (2011, p. 47),

um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando a obter, por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção (variáveis inferidas) destas mensagens.

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Para Franco (2005), a análise de conteúdo é uma técnica de pesquisa cujo objetivo é a

busca do sentido ou dos sentidos de um texto, que se amplia para a interpretação da

mensagem, “seja ela verbal (oral ou escrita), gestual, silenciosa, figurativa, documental ou

indiretamente provocada” (FRANCO, 2005, p. 20). A autora assevera que esse tipo de análise

está balizada nos pressupostos de uma concepção crítica e dinâmica da linguagem que, por

sua vez, é entendida como forma de expressão de representações sociais historicamente

constituídas acerca da realidade social vivida por determinado grupo.

Segundo Vygotsky (2003), a análise de conteúdo possibilita que uma “leitura

profunda” das comunicações ocorra, indo além da “leitura aparente”. O autor defende que a

afetividade é indissociável do pensamento e que,

para compreender a fala de outrem não basta entender as suas palavras — temos que compreender o seu pensamento. Mas nem mesmo isso é suficiente — também é preciso que conheçamos a sua motivação. Nenhuma análise psicológica de um enunciado estará completa antes de se ter atingido esse plano (VYGOTSKY, 2003, p. 188).

Nesta investigação foram seguidas as três etapas referenciadas por Bardin (2011): a

pré-análise, a exploração do material e o tratamento dos resultados, que inclui inferência e

interpretação.

A pré-análise pode ser identificada como uma fase de organização. Nela se estabelece

um esquema de trabalho que deve ser preciso, com procedimentos bem definidos, embora

flexíveis. A primeira atividade dessa etapa correspondeu a um período de associações feitas a

partir da leitura “flutuante”, que “consiste em estabelecer contato com os documentos a

analisar e em conhecer o texto, deixando se invadir por impressões e orientações” (BARDIN,

2011, p. 126), além da elaboração dos indicadores que orientaram a interpretação e a

preparação formal do material.

Nessa fase, procurou-se seguir os seguintes critérios indicados por Bardin (2011):

exaustividade (esgotar a totalidade da comunicação, não omitir nada); representatividade (os

textos selecionados devem conter informações que representem o universo pesquisado);

homogeneidade (os dados devem referir-se ao mesmo tema e ser obtidos por técnicas iguais);

pertinência (o material selecionado precisa ser condizente ao conteúdo e ao objetivo da

pesquisa) e exclusividade (um elemento não deve ser classificado em mais de uma categoria).

Na segunda etapa, de exploração do material, foram averiguados os tópicos de estudo

e confirmadas as hipóteses especulativas, o que correspondeu à codificação e à categorização.

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A codificação corresponde a uma transformação [...] dos dados em bruto do texto, transformação essa que, por recorte, agregação e enumeração, permite atingir uma representação de conteúdo, ou da sua expressão; susceptível de esclarecer o analista acerca das características do texto, que podem servir de índices (BARDIN, 2011, p. 133).

A categorização tem por objetivo oferecer uma representação simplificada dos dados

brutos e “se refere a um conjunto que abrange elementos ou aspectos com características

comuns ou que se relacionam entre si” (MINAYO, 2001, p. 70).

Neste estudo, três categorias emergiram das falas das entrevistadas: “aspectos que

influenciaram o desejo da via de parto”, “atendimento obstétrico” e “sentimentos, dificuldades

e problemas vividos no puerpério”. Na etapa de categorização foram selecionadas unidades de

registro (extraídas das entrevistas) caracterizadas por frases com significado temático em

relação ao objeto de pesquisa e que são aqui definidas como subcategorias.

Nessa perspectiva, foram destacadas, nas falas das mulheres entrevistadas, as palavras

e expressões mais frequentes, considerando aquelas captadas nas entrelinhas, no conteúdo

subentendido ou conotado. A organização do material deu origem às categorias e

subcategorias descritas no quadro a seguir.

CATEGORIA SUBCATEGORIAS

ASPECTOS QUE

INFLUENCIARAM O

DESEJO DA VIA DE PARTO

- Desejo de viver a experiência do parto normal

- Recuperação mais fácil após o parto normal

- Conversas com familiares e pessoas conhecidas

- Informações do médico

- Sentimento de medo e insegurança diante da imprevisibilidade

do parto

ATENDIMENTO

OBSTÉTRICO

- Uso constante de tecnologia

- Indução do trabalho de parto - Necessidade de apoio durante o processo

- Submissão à autoridade do saber médico

SENTIMENTOS,

DIFICULDADES E

PROBLEMAS VIVIDOS NO

PUERPÉRIO

- Necessidade de descanso depois da cirurgia

- Insegurança e solidão na sala de recuperação

- Complicações puerperais e desconfortos pós-cesariana

- Impessoalidade no atendimento de enfermagem

- Período de recuperação no domicílio

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Após concluída a exploração do material, partiu-se para a terceira etapa: o tratamento

dos resultados. Os dados foram confrontados com a fundamentação teórica para compreender

e avaliar todas as informações, utilizando-os de forma a agrupar os depoimentos e organizá-

los de acordo com os objetivos da pesquisa. Importa considerar que a relação entre os dados

obtidos e a fundamentação teórica

é que dará sentido à interpretação. As interpretações a que levam as inferências serão sempre no sentido de buscar o que se esconde sob a aparente realidade, o que significa verdadeiramente o discurso enunciado, o que querem dizer, em profundidade, certas afirmações, aparentemente superficiais (CÂMARA, 2013, p. 189).

Para discussão dos resultados se tomou como base os aspectos levantados nas

entrevistas e a fundamentação teórica. Na redação final foram utilizados trechos dos

depoimentos das entrevistadas para dar suporte às interpretações. As participantes da pesquisa

tiveram sua identidade preservada, sendo identificadas pela letra “P” seguida de um numeral

(de 1 a 11).

3.4 ASPECTOS ÉTICOS

Em atendimento ao que determina a Resolução 466/12 do Conselho Nacional de

Saúde (BRASIL, 2012), que estabelece diretrizes e normas para pesquisas com seres

humanos, o projeto foi encaminhado ao Comitê de Ética de Pesquisa em Seres Humanos da

Univali para análise, sendo aprovado pelo Parecer 457.125, de 29 de novembro de 2013

(ANEXO A).

Após a aprovação do Comitê de Ética, foi explicado às mulheres o detalhamento da

pesquisa, uma vez que já tínhamos resposta positiva da instituição por meio do Termo de

Anuência para Coleta de Dados de Pesquisa (Anexo B) e da Declaração de Exequibilidade de

Projeto de Pesquisa (Anexo C). Às participantes da pesquisa foi apresentado, no domicílio, o

Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Apêndice A) para aprovação e assinatura.

Os resultados deste estudo serão informados pela pesquisadora durante reunião pública

a ser realizada nas dependências da Maternidade Darcy Vargas, para a qual serão convidadas

as mulheres participantes da pesquisa e seus familiares, bem como a equipe de enfermagem,

médicos e a diretoria da instituição. Também serão prestadas informações aos sujeitos da

pesquisa em visitas agendadas a seus domicílios.

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4 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

Iniciamos este capítulo com a identificação das mulheres participantes da pesquisa e

informações sintetizadas sobre o processo de atendimento pré-parto, indicação para cesariana

e puerpério. Em seguida apresentamos, analisamos e discutimos os resultados de nossa

pesquisa, utilizando-nos dos relatos das entrevistadas e da fundamentação teórica deste

estudo. Para concluir, reunimos partes desta análise em artigo científico encaminhado à

revista Estudos Feministas e está inserido nesta dissertação como Apêndice B.

A análise do conteúdo das falas reúne três categorias. A primeira — “aspectos que

influenciaram o desejo da via de parto” — está dividida em cinco subcategorias: desejo de

viver a experiência do parto normal, recuperação mais fácil após o parto normal, conversas

com familiares e pessoas conhecidas, informações do médico, sentimento de medo e

insegurança diante da imprevisibilidade do parto.

Na segunda categoria — “atendimento obstétrico” — a análise destaca as

subcategorias: uso constante de tecnologia, indução do trabalho de parto, necessidade de

apoio durante o processo e submissão à autoridade do saber médico.

No que se refere à categoria “sentimentos, dificuldades e problemas vividos no

puerpério”, a análise está centrada nas subcategorias: necessidade de descanso depois da

cirurgia, insegurança e solidão na sala de recuperação, complicações puerperais e

desconfortos pós-cesariana, impessoalidade no atendimento de enfermagem e período de

recuperação no domicílio

4.1 AS MULHERES PARTICIPANTES DA PESQUISA

O estudo foi realizado com 11 mulheres residentes na cidade de Joinville, com idade

superior a 18 anos, que foram submetidas à cesariana e estiveram internadas no setor de

alojamento conjunto pós-cirúrgico da Maternidade Darcy Vargas. Para apresentar os sujeitos

desta pesquisa e garantir seu anonimato, foram utilizados numerais (de 1 a 11) antecedidos

pela letra “P” (de puérpera) para identificar as participantes.

P1 – Primípara, 23 anos, solteira, cursando ensino superior, dependente financeiramente de

seus pais. Realizou nove consultas do pré-natal. A cesárea ocorreu com 39 semanas e seis

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dias. A gravidez não foi planejada, mas foi tranquila. Sempre teve o sonho de ser mãe.

Inicialmente foi um susto; considerava que não era o momento. Dividia residência com outras

colegas. Na faculdade foi rescindido o contrato de estagiária. Na entrevista já estava instalada

em nova residência com o bebê. Recebeu apoio da família. Ao longo da gestação buscou

informações relativas à gestação na internet e participou de curso para gestante. No sexto mês,

em exame de ultrassom, foi diagnosticada artéria umbilical única, mas no exame de Doppler

não foi confirmado. Mesmo assim, permaneceu a incerteza. No final da gestação ficou ansiosa

por não entrar em trabalho de parto. Após algumas idas à maternidade, foi informada de que

havia redução do líquido amniótico e o feto poderia não resistir ao parto vaginal, segundo a

médica. Foi conduzida à intervenção cirúrgica. No pós-operatório apresentou sangramento

intenso, desmaiou, apresentou grande dificuldade no aleitamento, mas se mostrou mais

tranquila no momento da entrevista.

P2 – Primípara, 23 anos, casada, com ensino médio completo, renda familiar de dois salários

mínimos e meio. Realizou sete consultas do pré-natal e teve vários episódios de náuseas na

gestação. Não entrou em trabalho de parto e a cesárea ocorreu com 39 semanas. Realizou

ultrassom com sete semanas, 14, 20, 35 e com 37 semanas. A gestação foi tranquila e ao

longo desse período foi verificada apresentação pélvica, sendo esta a razão da intervenção

médica com cesariana. No centro cirúrgico apresentou náuseas no momento da aplicação da

anestesia. Disse que não identificou quem foi o obstetra cirurgião e falou de

descontentamentos no período puerperal. Falou sobre a dificuldade de relação com o bebê e

que somente se sentiu segura para pegá-lo após sete dias. Queixou-se de intenso desconforto

na ferida operatória.

P3 – Secundípara, com um parto normal, 24 anos, solteira, dependente de pensão. Realizou 10

consultas do pré-natal e passou a gestação muito tranquila. A cesárea ocorreu com 40 semanas

e três dias. Ao realizar a primeira avaliação na maternidade, o batimento cardíaco fetal

apresentou aceleração, mas ela foi liberada, retornando após dois dias. Ao realizar novos

exames foi identificada a permanência de aceleração cardíaca fetal e ela foi questionada pelo

plantonista se desejava realizar o parto normal ou a cesariana porque o feto poderia entrar em

sofrimento na tentativa do parto vaginal. A cesariana foi aceita. O bebê nasceu bem. O pós-

operatório foi muito doloroso.

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P4 – Primípara, 24 anos, casada, ensino médio completo, renda de três salários mínimos.

Realizou sete consultas de pré-natal no sistema privado e na rede pública porque realizaria o

parto na instituição pública. A cesárea ocorreu com 38 semanas e sete dias. A gestação foi

planejada e transcorreu de forma tranquila. Foi à maternidade após rompimento de

membranas às seis horas da manhã e admitida com um centímetro de dilatação na fase latente.

Iniciou a indução com prostaglandina e ocitocina endovenosa, frustrando o desencadear da

fase ativa de trabalho de parto. Com três centímetros de dilatação, a indução foi interrompida.

Sua decisão pela cesárea foi motivada pelo medo da dor, agravado por sua permanência no

ambiente no qual outras parturientes estavam em trabalho de parto. Estava satisfeita com a

recuperação, apesar do desconforto que ainda sentia na ferida operatória.

P5 – Tercípara, 30 anos, solteira, ensino médio completo, renda de um salário mínimo. A

gestação ocorreu por uma aventura, apesar de tomar a pílula do dia seguinte. Confirmou que

estava grávida com três meses. Realizou nove consultas de pré-natal, desenvolveu anemia e

infecção urinária. Teve apoio da mãe e do irmão. Com 39 semanas e quatro dias apresentou

rompimento de membranas. Na primeira avaliação da maternidade foi liberada, apesar de ter

informado sobre a perda de líquido amniótico. Na segunda avaliação foi admitida com dois

centímetros de dilatação. Após indução, sentiu contrações e dores. No dia seguinte, à tarde,

apresentava quatro centímetros de dilatação e foi conduzida à cesariana por apresentar ruptura

prolongada das membranas. Como já passou pela experiência de dois partos normais com

rápida recuperação, desejava o mesmo desfecho. No puerpério apresentou fissura mamilar e

muita dor na ferida operatória.

P6 – Secundípara, 33 anos, casada, com ensino médio completo e renda de três salários

mínimos. Realizou dez consultas de pré-natal e apresentou muito edema. A gestação atual não

havia sido planejada, mas foi bem aceita, foi tranquila, queria mais filhos. Com 39 semanas

foi admitida na maternidade às 19 horas com poucas contrações. Foi medicada e se

intensificaram as contrações e as dores. No exame do colo ocorreu o rompimento das

membranas. Quando conduzida ao pré-parto, outro médico reavaliou e questionou o motivo

da realização da primeira cesariana (ocorrida há seis anos). Na sua narrativa, poderiam ter

aguardado para fazer o parto, pois faltavam ainda 14 dias e foi na maternidade apenas para

avaliar e retornar. Como vinha apresentando contrações no final da gestação, entendia que

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tinha possibilidade e queria realizar parto vaginal. Ficou preocupada com a recuperação pós-

operatória.

P7 – Primípara, 24 anos, casada, ensino médio completo, renda familiar de três salários

mínimos e meio. Realizou doze consultas de pré-natal. A cesárea ocorreu com 40 semanas e

dois dias A gravidez foi planejada e tranquila. Foi orientada para procurar a maternidade ao

completar quarenta semanas. Ao ser examinada, foi admitida às 10 horas. Na avaliação, o

colo estava esvaecido. Iniciaram indução e às 16 horas apresentou quatro centímetros de

dilatação. Às 21 horas foi orientada a deambular. Às 23 horas a enfermeira retirou a solução

de ocitocina e disse que não estava sendo benéfica para o feto. Solicitou que repousasse. Ao

ser reavaliada, apresentou bradicardia fetal, sendo conduzida imediatamente para cesariana.

Disse que ficou temerosa. O bebê nasceu chorando e bem. Escutou o comentário do cirurgião

de que o útero inverteu. O pós-operatório foi muito doloroso; desmaiou. Desejou parto

normal. Fez severas críticas de negligência pelo uso indiscriminado de ocitocina, colocando o

feto em risco. Considerou que deveriam ter esclarecido o motivo da emergência.

P8 – Primípara, 18 anos, união estável, ensino fundamental completo, renda familiar de dois

salários mínimos e meio. A gravidez não foi planejada, foi descoberta por ocasião de exames

para cirurgia. Realizou nove consultas de pré-natal e trabalhou até o último dia de gestação. A

cesariana ocorreu com 41 semanas. Na admissão apresentava poucas contrações uterinas. O

trabalho de parto foi induzido com prostaglandina via vaginal. Após internação, por volta de

23 horas, apresentou contrações dolorosas e, no exame de toque, a médica rompeu as

membranas. Depois permaneceu no pré-parto. Às oito horas da manhã apresentou seis

centímetros. Acompanhada por familiares, procurou o plantão para obter explicações sobre a

demora do nascimento. Foi reavaliada e o médico explicou que o feto estava alto, que ia

demorar para ter parto vaginal e a conduziu para a cesariana. A criança nasceu bem, chorou.

O desejo era de parto vaginal por um histórico familiar favorável, mas ficou tranquila com o

desfecho. Na avaliação do pediatra, o bebê nasceu de trinta e nove semanas.

P9 – Secundípara, 32 anos, união estável, ensino médio completo, renda familiar de cinco

salários mínimo. Realizou cinco consultas de pré-natal. A cesárea ocorreu com 38 semanas e

cinco dias. Foi uma gestação planejada. Após a primeira consulta de pré-natal, acompanhou o

marido (caminhoneiro) em viagens pelo Brasil. Realizou outras consultas em diferentes

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cidades e sempre estava tudo bem. No final da gestação realizou exames e resolveram retornar

a Joinville. O primeiro parto foi vaginal. No pré-parto, as contrações, as dores e os pavores

foram intensificando. Pediram sua autorização para aplicar analgesia, informando que estava

na hora. Ela aceitou e se arrependeu muito. A experiência foi estressante, diminuiu a pressão

arterial, ficou nervosa, não conseguiu ficar na posição, enfim, retornou ao pré-parto com

dores, com sensação de mal-estar. Tiveram dificuldade para auscultar o coração do feto.

Todos ficaram apreensivos. Com dez centímetros, fez atividades na bola suíça e na

reavaliação foi conduzida à cesariana porque a apresentação fetal não progredia. O bebê

nasceu bem. O pós-operatório foi doloroso.

P10 – Secundípara, 33 anos, união estável, ensino fundamental completo, renda familiar de

três salários mínimos e meio. Realizou nove consultas de pré-natal. A cesárea ocorreu com 39

semanas e cinco dias. Nas avaliações, o feto permaneceu em apresentação pélvica. Temeu ter

que entrar em trabalho de parto para então realizar a cesariana. O pré-natalista a alertou dessa

possibilidade. Decidiu antecipar sua jornada à maternidade. Foi admitida e encaminhada ao

centro cirúrgico para se submeter à cesariana. Apesar do desejo de realizar parto vaginal,

considerou a experiência tranquila e gratificante; não sentiu dores. Ocorreram divergências

com a enfermagem no puerpério imediato acerca dos cuidados da ferida operatória, o que a

deixou bem perturbada.

P11 – Primípara, 23 anos, casada, com ensino médio incompleto, não informou o rendimento

familiar. Realizou nove consultas de pré-natal. A cesárea ocorreu com 40 semanas e seis dias.

A gestação foi, de certa forma, planejada, parou de tomar o anticonceptivo para tratamento de

disfunção gástrica e, na sequência, constatou a gravidez. No final do período gestacional,

procurou várias vezes a maternidade. Na última avaliação foi admitida por causa da redução

do líquido amniótico. Apresentava três centímetros de dilatação do colo uterino. Iniciaram a

indução com ocitocina. A evolução foi benéfica, a dor foi intensificando e foi submetida à

analgesia. Veio a frustração: anestesiou somente um lado do corpo. Com oito centímetros,

expressou que não tinha mais força. Na avaliação do médico, o feto estava insinuado. Ele

advertiu que ia demorar mais umas duas horas e pediu se desejava aguardar ou realizar

cesariana. Ela aceitou imediatamente realizar a intervenção médica. O bebê nasceu bem,

deixando a mãe aflita pelo fato de não chorar logo após o nascimento.

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4.2 ASPECTOS QUE INFLUENCIARAM O DESEJO DA VIA DE PARTO

A vivência da parturição é um momento único, de muitas expectativas e sentimentos,

especialmente por ser um processo de espera e incertezas. O parto constitui um evento que

“perpassa todo o processo de gestação e puerpério, marcando profundamente a história das

mulheres. Ele já é antecipado na gravidez sob a forma de expectativas, e continua sendo

referido posteriormente, na forma de lembranças e sentimentos que acompanham a mãe”

(LOPES et al., 2005, p. 252).

Entre os aspectos que influenciaram o desejo das mulheres participantes desta

pesquisa em relação à via de parto, o desejo de viver a experiência do parto normal foi

colocado como um dos principais motivos, ao lado da recuperação mais fácil após o parto

normal. Apareceram com frequência na fala das entrevistadas as referências a conversas com

familiares e pessoas conhecidas, informações do médico, sentimentos de medo e insegurança

diante da imprevisibilidade do parto.

4.2.1 Desejo de viver a experiência do parto normal

O desejo de viver uma experiência especial e única e a qualidade da relação no

cuidado com o bebê são fatores que levaram algumas mulheres a dar preferência ao parto

normal, como no caso de P6 e P2:

Nesse primeiro momento que estava sentido as contração, já comecei a me preparar pro parto normal, já achei que ia ter parto normal, me acostumei com a ideia, de querer o parto normal [...] gostaria de ter tido a experiência do parto normal, porque é uma coisa natural da vida, né? E eu acho que a criança nasce de parto normal ela nasce mais preparada (P6).

Acho que quando o neném dá o sinal de que quer nascer, ele, né, como posso dizer, ele solta aquele amor dele, aquela vontade de conhecer a mãe. Então a cesárea eu acho que é uma crueldade com a criança [...] o parto normal tu passa pela ali pela dor que está sentindo (P2).

Os relatos de P6 e P2 remetem às considerações de Domingues, Santos e Leal (2004) e

de Miranda et al. (2008), que acentuam que o parto vaginal é cercado de componentes

otimistas, permeados por valores emocionais e afetivos. Ao relatarem seu estudo acerca das

representações e experiências das mulheres sobre a assistência ao parto vaginal e cesárea em

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maternidades públicas e privadas, Gama et al. (2009) informam que as mulheres apontaram,

como vantagens do parto normal, maior autonomia no cuidado com o bebê, o protagonismo

da mulher e a recuperação no pós-parto.

A experiência de dois partos vaginais anteriores com rápida recuperação levou P5 a

alimentar a expectativa para a mesma via de parto na terceira gestação. Ela enfatizou que

queria ter um parto normal mesmo, sentir toda aquela dor e depois não sentir mais [...] eu tava disposta a qualquer coisa pra ver minha filha bem, até mesmo sacrificar, porque o parto normal é bem mais rápido (P5).

A entrevistada narrou sua experiência anterior sob vários aspectos positivos. Destacou

a riqueza da relação com o bebê e a satisfação de desfrutar com segurança o nascimento da

criança, enfatizando que acreditava que, com o parto normal, garantiria menos riscos à saúde

da filha.

Esse entendimento de P5 corrobora dados obtidos em pesquisa por Barbosa et al.

(2003), Carniel, Zanolli e Morcillo (2007), dando conta de que o parto normal ainda é

prioridade na escolha da maioria das mulheres, tanto entre as atendidas no sistema privado

quanto entre as que utilizam o serviço de saúde público, como P3 e P6, que revelaram sua

expectativa por essa via de parto:

O pensamento a minha gravidez toda de ter parto normal que como eu já tive parto normal o médico também, estava tudo encaixado, tava com dois dedos de dilatação e depois fui para o quarto [...] a gestação nunca teve nenhum problema [...] e do meu parto eu esperava que fosse parto normal, como eu já tinha tido parto normal da minha filha eu esperava que seria parto normal né? Estava tudo encaminhado para parto normal, tava os exames tudo certinho [...] todo mundo fala que cesárea é um pouco complicado (P3).

[...] no final da noite, eu cheguei dei entrada [internação] às 19 horas e 22 horas já fizeram minha cesárea; não rompeu minha bolsa, não tive contração nada, e por isto eu me preparei pro parto normal dela, porque o dela foi diferente, o dele [filho que nasceu por parto vaginal] eu não tive contração, não estourou a bolsa. Faltava 14 dias pro prazo, então eu fui só por ir, né, porque tava com uma dor chatinha, e lá ele já me examinou e já me botou pra cesariana, entendeu? (P6).

Apesar de o parto normal ser desejado por muitas mulheres, ao serem hospitalizadas,

muitas delas vivem outra experiência, essencialmente intervencionista, como no caso de P3 e

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também de P6, que se sentia emocionalmente preparada para o parto vaginal, mas foi

conduzida pelo médico para cesariana.

4.2.2 Recuperação mais fácil após o parto normal

Dois importantes motivos da preferência por parto normal, apontados pelas

entrevistadas, são a recuperação mais rápida e maior autonomia no cuidado com o bebê e no

autocuidado — razões também constatadas por Oliveira et al. (2002), Strapasson e Nedel

(2010) — como fica demonstrado na fala de P11: “eu queria parto normal mesmo, não queria

cesárea, eu sabia que depois a recuperação é bem difícil, eu queria normal”, e também na

narrativa de P10:

Eu na minha cabeça era de parto normal, não tinha por que ser cesárea né? Como já ganhei de parto normal, eu achei que ia ser de parto normal [...] baseada na recuperação [...] porque na cesárea [...] tem ficar de repouso [...] eu queria parto normal, eu podia sofrer a dor que fosse para ganhar de parto normal (P10).

A expectativa de P10 estava baseada na experiência favorável da recuperação que teve

quando do nascimento do primeiro filho, o que confirma os achados de Miranda et al. (2008)

que indicam forte associação entre a preferência pela via de parto normal e a experiência de

partos anteriores.

O relato de P10 permite inferir que, apesar de alguns aspectos considerados negativos

do parto normal, principalmente a dor, ele é fortemente desejado por algumas mulheres.

Observamos convergência com a pesquisa de Iorra (2011) que apontou, como razões que

influenciaram a preferência por parto normal, recuperação mais fácil, menor dor e

padecimento e procedimento mais rápido, e também com os depoimentos de P8, P7 e P5:

Até eu pensei que seria mais fácil, porque no histórico da minha família foi tudo parto normal, e são tudo aqueles partos assim, bem rápidos, sabe? (P8).

Eu queria muito parto normal, porque a recuperação é melhor e quando eu cheguei de manhã que o médico examinou lá de manhã na maternidade ele disse assim pra mim: “teu útero tá bom, teu útero é um útero fino [colo] é bom! Tem tudo pra ser um parto bom e rápido”. Aí quando entrei foi estas as palavras do médico que me internou, então eu estava assim, esperando né? (P7).

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[...] porque nem a analgesia eu não queria, porque queria ter um parto normal mesmo [...] é bem mais rápido, a cicatrização [...] preferia o parto normal, porque você sente dor ali, mas depois passa (P5).

Com referência à dor do parto, a narração de P5 evidenciou que ela pode ser suportada

sem uso de métodos farmacológicos e pode, segundo Lopes et al. (2005), até ser

experimentada, ou pelo menos referenciada, como algo positivo. O interessante é que, mesmo

com a possibilidade de ser submetida à medicação para alívio da dor desde o início das

contrações — procedimento bastante difundido atualmente pelo mundo —, P5 recusou

analgesia, procurando ter “um parto natural”.

4.2.3 Conversas com familiares e pessoas conhecidas

Ao comentar sobre as pessoas que influenciam a gestante no seu desejo da via de

parto, Melchiori et al. (2009) destacam aquelas de convívio cotidiano, com quem a mulher

mantém relações de afeto e confiança, seja por parentesco ou amizade. P1, por exemplo,

relatou que

todo mundo que a gente conversa, assim, minha mãe, as outras pessoas que já têm parto normal falam que é muito melhor, porque a gente tem o bebê e já pode fazer as coisas, não fica parada, é melhor porque cesárea precisa ficar deitada, repousar, tem um monte de coisas, aí eu achei, então, o melhor possível é de eu poder fazer as coisas, cuidar do bebê (P1).

A fala de P1 enfocou situações próprias da influência de valores básicos da cultura

familiar e de outras pessoas, com narrações positivas sobre a rapidez na recuperação que,

segundo ela, contribuiria de modo favorável para o seu bem-estar e para os cuidado com o

filho.

Outros relatos, além desse, apontaram o medo dos riscos da cesariana e de suas

implicações e a recuperação da mulher como elementos que contribuem para que o desejo

recaia sobre o parto vaginal, demonstrado na fala de P1.

Almeida e Silva (2008) comentam a influência das informações dos familiares e de

outras mulheres que são geralmente buscadas pelas gestantes para confirmar ou minimizar os

medos e temores presentes nas histórias e vivências, característicos nesse período da gravidez.

Segundo Pereira (2010, p. 106), “as mulheres, inclusive as que nunca gestaram, emitem suas

opiniões, ainda que infundadas, sobre o processo fisiológico” e o mais importante é que “o

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peso dessas opiniões valem quase tanto ou mais que a opinião médica” (PEREIRA, 2010, p.

108).

A mesma autora observa uma representação fragilizada pela manipulação das

informações médicas, ou pela confiança na medicina, ou ainda pelas vivências de outras

mulheres e parentes. Essa constatação se evidenciou no relato de P2:

É que assim, as pessoas colocam na cabeça, até a própria mãe falou: Deus o livre; ter parto normal acaba com tudo; ela já falou para o meu primo para pagar uma cesárea porque ela tem pavor do parto normal. Às vezes a influência da mãe, às vezes a do médico, daí! Isso vai mexendo com o psicológico da grávida, aí, chega na hora e ela não quer o parto normal, é por causa do medo (P2).

Os resultados de pesquisa realizada por Miranda (2012) com um grupo de gestantes se

aproximam do relato de P1 e se contrapõem à fala de P2 porque, nesse estudo, a maioria das

mulheres manifestou desejo em ter parto normal por considerá-lo mais saudável para a mãe e

para o bebê, destacando a influência de familiares.

No caso de P8, as expectativas sustentadas em relação à vivência do parto durante a

gestação influenciaram a preferência pelo parto normal, confirmando a teoria de Maldonado

(2002):

[...] em relação ali, se eu queria cesárea ou se eu queria parto normal, queria parto normal. Até eu pensei que seria mais fácil, porque no histórico da minha família foi tudo parto normal, e são tudo aqueles partos assim, bem rápidos, sabe? Então eu pensei que como a gravidez foi toda calma, eu pensei que perto de ali 39 semanas ia estourar a bolsa eu ia pra maternidade ia ganhar e ia ser aquela coisa fácil né? E foi aquela coisa [cesárea] bem, bem diferente ! (P8)

Percebemos que a narrativa de P8 é carregada de influências culturais e histórias

ouvidas de parentes que criaram nela a expectativa de parto normal. Sua fala denotou que ela

estava tranquila e preparada para esse tipo de parto. Contudo, viveu experiência distinta da

expectativa inicial, sendo submetida à cesariana.

Ressaltamos que a maioria das entrevistadas declarou que a cesariana não foi

solicitada por elas ao médico. Observamos, nesses casos, o que foi constatado em estudo de

Iorra et al. (2011, p. 267): “por não perceberem terreno propício para a manifestação de

opiniões e tomadas de decisões, as mulheres muito pouco [opinaram] e [questionaram] sobre

a via de parto” (IORRA et al., 2011, p. 267).

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4.2.4 Informações do médico

A mulher bem informada atravessa a gestação mais segura, preparada e confiante e

elabora a maternidade com plenitude e prazer, considerando ser uma experiência única que

espera vivenciar de modo mais natural possível (MIRANDA et al., 2008; GAMA et al.,

2009). De acordo com Iorra et al. (2011), as expectativas da mulher quanto à via de parto são

consequência de como as informações estão disponíveis ou são acessíveis a ela.

Sobre a possível influência do conhecimento acumulado sobre a parturição, poucas

gestantes afirmaram buscar uma fonte de informação para lhes orientar sobre as modificações

gravídicas, sinais e sintomas de trabalho de parto, entre elas P1:

[...] foi um mês de curso [gestante] né? Quatro aulas. Muita coisa que eu não sabia assim! Além da internet! [...] Eu faço parte de um grupo no site “baby center”. Um tem um monte de tópicos, em que todas as mulheres que estão passando a mesma situação que você. Lá tu coloca a tua idade gestacional e lá, já aparece um fórum [...] lia “ene” coisas! (P1).

Como se pode verificar no relato de P1, atualmente a mulher têm acesso e interage

com a comunidade virtual, buscando informações sobre o processo parturitivo — fato também

destacado por Salgado (2012) —, mas nem sempre ela obtém informações suficientes e

detalhadas. P1, por exemplo, percebeu sinais fisiológicos na fase latente, com manifestação

uterina, sem ter conhecimento sobre isso:

Eu não sentia nada, daí, eu comecei a me sentir estranha, diferente das outras! [...] mas era sintomas que eu não conhecia, e não conheci, só fui conhecer no dia, assim, aquelas fisgadas eu senti um dia antes (P1).

Além do contato com narrativas das redes sociais, a preferência pela via de parto sofre

principalmente a influência de informações e indicações do médico (MELCHIORI et al.,

2009). Em alguns casos, o comportamento do médico causa receio nas mulheres. P2, por

exemplo, contou que assistiu a um vídeo contendo mensagens que a amedrontaram:

Esse vídeo conta isso, que os médicos para ganhar dinheiro eles tentam vão lá e marcam, eles já colocam desde o começo do pré-natal na cabeça da mãe: “Ah, você é muito pequena, você não vai dar conta, vai te rasgar toda” (P2).

Ela também relatou, com certa indignação, a experiência de uma parente:

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Como a minha cunhada é pequena, baixinha, aí o médico desde o começo dizia: “Ah, tu é baixinha, tu é pequena”, e começa desde o início, e ela queria parto normal também. Quando ela foi para ganhar ela desistiu de tanto ele colocar na cabeça dela. Aí, isso que mexeu comigo muito (P2).

A escolha da via de parto costuma gerar discussão clínica, mas geralmente a

parturiente não participa dessa discussão, sendo apenas informada a respeito da decisão, como

aconteceu com P5, que já havia passado pela experiência de dois partos normais com rápida

recuperação e desejava o mesmo desfecho:

A médica fez exame de toque e não dilatou [...] continuou os quatro dedos e a médica falou: “Olha mãezinha, acho que vamos ter que fazer a cesárea porque o nenê já tá muito tempo sem o líquido” [...] eu preferia o parto normal, mas já que eles falaram que era melhor pro bebê que era cesárea eu aceitei fazer a cesárea (P5).

O fato dessa decisão ser tomada de forma exclusiva pelo médico sem considerar a

aceitação da gestante tem sido apontado como um dos fatores que contribui para o aumento

do parto cirúrgico (PEREIRA; FRANCO; BALDIN, 2011b).

4.2.5 Sentimento de medo e insegurança diante da imprevisibilidade do parto

Algumas mulheres desejam o parto normal, mas o medo não permite a concretização

desse desejo, induzindo-as para a cesárea (PEREIRA, 2010). Mas com P2 e P9 verificamos o

contrário. O medo das entrevistadas era em relação à intervenção cirúrgica:

Não queria cesárea, queria ganhar de parto normal [...] estava morrendo de medo (P2).

[...] tive a primeira filha com parto normal, queria que fosse igual, nem me passava pela cabeça ter uma cesárea, outra que eu tenho medo, a infecção, parece que eu vou pegar uma infecção, qualquer coisa no gênero, fico apavorada! Então, optei por parto normal (P9).

A fala de P9 vai ao encontro da informação de Nomura, Alves e Zugaib (2004) de que

a cesariana é apontada como fator que predispõe a infecções puerperais, responsável por 25%

dos óbitos de puérperas. Miranda et al. (2008) acentuam que, na cesariana, os efeitos

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indesejados inicialmente estão ausentes, mas, num segundo momento, podem aparecer como

consequência e ou complicação do procedimento.

Em relação à preferência pela cesariana, Melchiori et al. (2009) afirmam que ela é

representada, na maioria dos casos (80%), pela categoria menor sofrimento. Barbosa et al.

(2003), ao estudarem 909 puérperas submetidas à cesariana, verificaram que a maioria (75%)

solicitou a cirurgia durante o trabalho de parto ou parto em razão da dor. P4 faz parte dessa

estatística. Ela declarou que o seu medo era de

sentir dor e não ter dilatação, porque se eu tivesse dor e dilatação aí tudo bem, que nem tinha umas meninas lá que tinham muita dor e não tinham dilatação, esse era meu medo, aí que eu já não queria parto normal, eu quero cesárea, quero cesárea, quero cesárea, aí falei pra médica e ela falou: “meu Deus, todo mundo quer parto normal e tu quer cesárea?” Ai, eu não quero, tenho medo [...] (P4).

P6 também fez referência à dor quando relatou que preferia o parto normal à cesariana

porque

a primeira experiência de parto cesariana não foi boa, né, foi muito dolorida a recuperação [...] então tive esta experiência negativa, e queria ter experiência positiva que todo mundo falava que é o parto normal (P6).

A opção pela cesárea por medo de sentir dor foi apontada por P4, que vivenciou, no

ambiente do pré-parto, a experiências de outras parturientes que se encontravam em estágio

ativo do trabalho de parto:

[...] que nem tinha umas meninas lá que tinham muita dor e não tinham dilatação, esse era meu medo, aí que eu já não queria parto normal, eu quero cesárea, quero cesárea, quero cesárea. No começo queria parto normal. Depois comecei a me assustar com aquelas mulheres berrando e berrando, aí fiquei com medo e falei: “não quero mais, quero cesárea” (P4).

O comentário de P4 confirma o que dizem Pereira, Franco e Baldin (2011a, p. 382):

que a dor se revela como “um dos principais construtores das atuais representações femininas

sobre parturição e contribui para a curva ascendente de cesárea no Brasil”.

A dor no trabalho de parto consiste em um fenômeno subjetivo difícil de ser

mensurado e varia enormemente entre as mulheres (MOREIRA, 2008). A respeito disso,

Melo (2003) acentua que a dor do parto se tornou sinônimo de sofrimento para mulheres

submetidas a situações constrangedoras que envolveram as pessoas que as assistiam. “[...] as

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dores pouco compreendidas, as intervenções hospitalares [...] foram ao longo do tempo

elaborando mitos de que o nascimento já não poderia ser tão natural assim, tornando-se

centrado em intervenções, com a adesão da mulher a esse novo modelo” (MOREIRA, 2008,

p. 24).

Aguiar (2010, p. 116) é enfático ao afirmar que o círculo vicioso de “‘medo – tensão –

dor’ que envolve a parturição encontra sustentação se considerarmos o clima de medo que

domina a experiência de parir na maioria das maternidades públicas”.

A experiência do parto é dominada por um clima de medo crescente para a parturiente:

medo da dor, medo da morte ou do que pode acontecer a ela ou a seu filho, medo de ser

maltratada (MCCALLUM; REIS, 2006). Há também a visão da maternidade pública como

palco de medos e incertezas, um lugar no qual já se espera ser maltratada (AGUIAR, 2010).

4.3 ATENDIMENTO OBSTÉTRICO

Em nossa pesquisa com mulheres submetidas à cesariana, o uso constante de

tecnologia, a indução do trabalho de parto, a necessidade de apoio durante o processo e a

submissão à autoridade do saber médico se destacaram como subcategorias inseridas na

categoria “atendimento obstétrico”.

4.3.1 Uso constante de tecnologia

A tendência à medicalização no parto, segundo Cabral, Hirt e Van der Sand (2013), é

reforçada pelo uso indiscriminado de tecnologias biomédicas. Confirmamos isso em nossa

pesquisa, a partir dos relatos das mulheres entrevistadas:

É! Eu fiz ultrassom com sete semanas, com 14, com 20, 35 [...] eu tinha um ultrassom mesmo que eles fizeram com 37 (P2).

[...] ele agendou a ultrassom para terça-feira que vem, para outra terça no caso, foi o dia que ela nasceu, para as 7 horas da manhã (P1).

Me pediu um ultrassom [final da gestação] para ver o líquido da bolsa, aí fiz o ultrassom, eles falaram que o líquido estava bom (P9).

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[...] fiz o exame do coração, deu alterado. O médico veio e me perguntou se eu queria parto normal ou cesárea, aí explicou o risco que teria no parto normal de ele não aguentá [...] estava muito acelerado o coração dele (P3).

Esses depoimentos confirmaram a informação de Rugolo et al. (2004) de que o

monitoramento eletrônico fetal e o ultrassom são apontados como importantes recursos

tecnológicos usados na assistência materno-infantil. Também indicaram a exposição frequente

do bebê na vida intrauterina por ultrassom, como já observado por Odent (2003) em estudo

que revelou excessiva solicitação de exames de imagem no pré-natal.

Ressaltamos o caso específico de P2, que fez várias ultrassonografias em espaços de

tempo bem próximos — procedimento que, segundo Odent (2004), tornou-se símbolo do

cuidado pré-natal de rotina, constituindo exemplo do uso inapropriado de tecnologias na

assistência ao parto. Vale lembrar da afirmação de D’Orsi et al. (2005) de que a cultura de

uso abusivo de tecnologias médicas no parto é apontada como responsável por grande parte

das cesarianas

Quanto à cardiotocografia, no caso de P3, salientamos que, de acordo com Souza e

Amorim (2008) e com Odent (2003), estudos sugerem não haver melhores resultados do

método em relação à auscultação fetal intermitente em termos de melhora do prognóstico

neonatal e que o aumento do número de cesarianas foi o único efeito significativo em termos

estatísticos.

De acordo com Rugolo et al. (2004, p. 424), a introdução, nas últimas décadas, de

novas práticas e tecnologias “trouxe a preocupação com seu uso abusivo, desnecessário e

indevido, bem como gerou questionamento sobre a efetividade delas e sobre o modelo

‘médico’ de assistência ao parto”.

Um impacto negativo do uso excessivo de tecnologias é que “o parto vaginal,

fortemente associado à ideia de imprevisibilidade e sofrimento, vem sendo ressignificado pela

biomedicina como um processo fisiologicamente “perigoso”. A cesariana, ao contrário, é

associada [...] à ideia de segurança e de controle sobre os riscos” (CARDOSO; BARBOSA,

2012, p. 37).

Interessa lembrar que na década de 1970, médicos e mídia divulgavam que todos os

riscos de parto poderiam ser eliminados graças ao monitoramento eletrônico fetal, como se

um processo involuntário pudesse ser controlado. Mas, como assevera Odent (2005, p. 41),

“se as necessidades de uma mulher em trabalho de parto tivessem sido reconhecidas há meio

século, a história do parto teria, indutivamente, tomado outra direção” ou seja, o parto não

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teria entrado na era eletrônica, na qual o processo de nascimento é gradativamente dominado

por tecnologias e intervenções e mais bebês necessitam ser salvos pela cesariana.

4.3.2 Indução do trabalho de parto

Ficou evidenciado, ao longo da pesquisa, o descaso com a condução do processo

fisiológico e o desrespeito para com as necessidades e escolhas da parturiente ao elevar-se o

limiar de dor com intervenções realizadas rotineiramente, como o uso da ocitocina sintética,

que transformam um evento normal fisiológico em patológico. Foi um cuidado conduzido

com práticas dolorosas, causando marcas psicológicas nas mulheres, a exemplo de P11 e P5,

que relataram ter sentido fortes dores, e de P7, que vivenciou uma situação na qual a

qualidade do cuidado foi limitada pela escassa atenção às evidências científicas sobre a

segurança na assistência:

[...] foram induzir o parto né? Botar no soro [...] a dor veio bem forte, daí me deram uma anestesia (P11).

[...] daí tentaram induzir meu parto [...] e começou a ter a contração, aquela dor, dor, entrei com um dedo [...] foi pro quarto dedo, aí era duas e meia da tarde, a médica mandou eu tomar um banho pra ver se dilatava mais e não dilatou (P5).

[...] aí as enfermeiras colocaram aquela soro na veia pra aumentar a dor, lá, né? Aí eu fiquei lá, a tarde inteira em jejum, com aquele negócio na veia pra tentar induzir o parto. Aí, era umas 4 horas da tarde, eu acho, quando fizeram o exame de toque de novo, eu estava com quatro dedos de dilatação, ou seja, nada de dilatação e o remédio na veia, e fiquei, fiquei o dia inteiro, aí era umas nove e trinta, 10 horas da noite ela mandou caminhar [...] e o soro na veia direto (P7).

Apesar de o protocolo da OMS (WHO, 2011) dizer claramente que não é

recomendável indução antes de 41 semanas, P8 e P4 foram submetidas a esse procedimento:

[...] já tava com umas contrações de cinco em cinco minutos [...] no começo da tarde foi induzido o parto, foi colocado aquele comprimido, só aquele comprimido [...] me mandaram pro quarto [...] mais um comprimido mas as contrações não aumentaram [...] onze da noite foi, aí as contrações tavam pior [...] Na carteirinha e nos papéis que vieram do hospital estava com 39 semanas (P8).

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Estourou minha bolsa, às seis e meia da manhã, não tinha dor, não tinha nada. Aí, fui pra maternidade, cheguei lá, fizeram o exame de toque e só tinha um dedo de dilatação. Aí, fui pro soro, colocaram um comprimido que era pra dilatar, aí me deram um soro que era pra dar dor, mas aí não senti nada, nem uma dor nem nada, ainda bem [...] Me deram um monte de soro, perdi as contas e eu não tinha dor, não tinha dor, dilatação nada, então acho que não que era pra ser mesmo [...] quando ganhei eles colocaram que eu estava de 38 semanas (P4).

É importante salientar que várias indicações para a indução do parto têm sido

propostas, entre elas a ruptura prematura das membranas. Souza et al. (2010) afirmam que,

em casos de ruptura prematura das membranas amnióticas em gestações a termo, a maioria

das diretrizes recomenda a indução imediata ou por uma conduta expectante por um período

de tempo não maior que 96 horas. Essa recomendação é baseada no aumento das

complicações associadas a essa ruptura, como infecção materna e neonatal, prolapso de

cordão e frequência cardíaca fetal não-tranquilizadora, resultando em cesarianas.

Sobre esse assunto, Souza, Amorim e Porto (2010) enfatizam que a ruptura uterina

sintomática associa-se a taxas elevadas de morbimortalidade materna e perinatal, informando

que estudos sugerem uma mortalidade materna de 15,1% e perinatal entre 42,4 a 75%.

Segundo os autores, a cesariana é indicada na maioria dos casos que visam minimizar os

riscos de morbimortalidade materna e perinatal associados com a ruptura, exceto se o

diagnóstico é feito durante o período expulsivo, com a cabeça fetal profundamente insinuada

e presentes as condições de aplicabilidade para parto instrumental.

Acentuamos que a adoção de práticas para a indução do trabalho de parto pode ser

prejudicial, mas é procedimento comum entre profissionais de saúde que desconsideram as

recomendações da OMS. Isso inclui, segundo Souza et al. (2010) e Lobo et al. (2010), o

rompimento de membranas com o objetivo de acelerar as contrações uterinas e reduzir a

duração do período de dilatação, como aconteceu com P7 e P8:

[...] a médica [...] disse assim: “conforme for, mãe, a gente vai romper a bolsa, pra ajudar na dilatação” (P7).

[...] foi fazer o exame de toque, só terminou de estourar a bolsa (P8).

Chama a atenção o fato de P6 ter expressado na entrevista que a conduta adotada não

alcançou o resultado esperado e mesmo assim ela ficou satisfeita porque não queria sofrer:

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[...] só que ela [médica] mandou eu fazer um ultrassom, e uma medicação e nesta medicação começou bastante dor, as contrações não pararam [...] daí ela me chamou de novo [...] fez um exame de toque, viu que não tinha aumentado nada minha dilatação só com um dedo, daí fui já pra sala de pré-parto né? [...] Daí o médico [outro] me examinou e viu que eu não ia poder ter um parto normal (P6).

A partir dos relatos das mulheres entrevistadas e da fundamentação teórica, podemos

afirmar que a indução do trabalho de parto realizada nos casos estudados contribuiu para os

crescentes índices de cesarianas (ODENT, 2004) e que intervenções como aceleração com

ocitócitos, prostaglandinas e rotura de membranas amnióticas continuam sendo utilizadas

rotineiramente no hospital, muitas vezes sem evidências científicas, como atestam Santos e

Shimo (2008) e Narchi (2009).

As considerações de Lobo et al. (2010) e da OMS (1996) nos permitem inferir que o

uso indiscriminado de ocitocina está relacionado a uma experiência mais dolorosa durante o

trabalho de parto e tende a produzir resultados maternos e perinatais desfavoráveis, podendo

culminar em uma cesariana iatrogênica.

Com a utilização de indutores uterinos ocorre o aumento das contrações em frequência

e intensidade e a dor pode tornar-se iatrogênica, sendo um dos principais motivos de medo no

processo da parturição. Nesse contexto de subjetividade, o medo da dor no trabalho de parto

recebeu um forte componente sociocultural sobre a parturição. A utilização rotineira de

indutores como a ocitocina, além de interferir no curso natural do parto, esteve relacionada a

uma experiência mais dolorosa durante o trabalho de parto.

Outro ponto a destacar é a conduta de admissão da gestante na fase latente, apontada

como um complicador no atendimento às mulheres, porque implica um tempo mais ou menos

longo de permanência no ambiente do pré-parto até a fase ativa e eleva os riscos para

intervenções para correção de distócias, como o uso de ocitocina, rotura precoce de

membranas e analgesia de parto com grande tendência de evoluir para cesariana. Isso se

confirmou nas experiências narradas pelas participantes da pesquisa:

[...] não sei tem, se tivesse esperado mais [...] e eu não tava com contração nada, nada, só senti uma dorzinha à tarde e depois já fui pra maternidade e no final da noite, eu cheguei dei entrada às sete horas e dez horas da noite já fizeram minha cesárea (P6).

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[...] cheguei nas 40 semanas, fui lá na maternidade [...] depois de três dias voltei lá e fiz os exames de volta [...] estava tudo bem [...] fui dois dias após [...] eu completei quarenta e uma semanas, eu fiquei internada [...] já tava com umas contrações de cinco em cinco minutos [...] no começo da tarde foi induzido o parto, foi colocado aquele comprimido, só aquele comprimido [...] me mandaram pro quarto [...] mais um comprimido mas as contrações não aumentaram [...] onze da noite foi, aí as contrações tavam pior [...] Na carteirinha e nos papéis que vieram do hospital estava 39 semanas (P8).

[...] o médico [...] perguntou: “Você esta com quarenta semanas? Vou te internar!”. Cheguei lá com dois dedos de dilatação (P7).

Estourou minha bolsa, às seis e meia da manhã, não tinha dor, não tinha nada, então acho que não que era pra ser mesmo [...] quando ganhei ele colocaram que eu estava de 38 semanas (P4).

[...] daí internaram né, por causa do líquido [...] foram induzir o parto né! Botar no soro [...] a dor veio bem forte, daí me deram uma anestesia (P11).

Os resultados dessas intervenções não foram favoráveis. No caso de P7, o feto entrou

em sofrimento fetal pelo uso excessivo de indutores e, no de P4, não foi desencadeado o

trabalho de parto, o que corrobora a afirmação de Silva et al. (2008) de que um grande

problema na prática hospitalar é a internação precoce antes do início do trabalho de parto da

gestante, porque pode levar à estafa materna, trazendo riscos para a mãe e o bebê, pois resulta

em intervenções desnecessárias e potencialmente danosas, como a infusão endovenosa de

ocitocina.

4.3.3 Necessidade de apoio durante o processo

A gestação e o parto constituem uma das experiências humanas mais significativas e

impactantes na vida da mulher, mas a falta de humanização na assistência à parturiente pode

resultar em uma experiência traumática, como revela a fala de P11:

[...] a dor veio bem forte, daí me deram uma anestesia [...] sentia dor só de um lado [...] tava com oito dedos de dilatação. [...] No pré-parto eu fiz os exames ali de toque, de tudo, no começo me jogaram, me colocaram na sala e depois [...] eu tava com três dedos quando eu entrei e só foram me examinar depois quando eu estava com oito dedos [...] fiquei meio de lado (P11).

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A evolução do trabalho de parto foi positiva, segundo percepção da puérpera, mas ela

se sentiu abandonada, sem amparo e conforto. Relatou sua aflição e seu ressentimento por não

ter recebido o que ela qualificou como “bom atendimento” da equipe de profissionais de

saúde, que iniciou uma série de intervenções com as quais se buscou, usando as palavras de

Narchi, Cruz e Gonçalves (2013), correções do processo por meio da medicalização.

No caso de P11, faltou uma assistência voltada para o cuidar, com atitudes de atenção

e carinho que contribuíssem para o que Moreira (2008) considera uma experiência de parto

positiva, segura e eficaz. Observamos que não existiu um relacionamento terapêutico

favorável, com produção de vínculo e identificação de necessidades de cuidado para além de

um simples atendimento — aspecto destacado em estudos de Cabral, Hirt e Van der Sand

(2013). Outra situação que demonstra esse problema no atendimento foi vivida por P3:

[...] mas como ele tinha passado o prazo para nascer, estava sendo acompanhado [...] na maternidade tava muito acelerado o coração dele [...] mandou ir para casa [...] voltei no domingo [...] fez o ultrassom que estava normal [...] voltei na segunda-feira e estava bem acelerado, daí os médicos ficaram bem preocupados e já me encaminharam para a cesárea (P3).

A entrevistada foi informada sobre alterações com o feto na primeira avaliação, mas,

somente na terceira vez que retornou à maternidade, o problema se tornou preocupante.

Aconteceu com P3 o que Faúndes e Cecatti (1991) apontam como ineficiente preparo no

cuidado ao parto frente à incerteza de trauma fetal que contribui para o aumento da frequência

de cesariana.

Ficou evidente a fragilidade no discurso emocional das mulheres, que falaram sobre

seus temores e expectativas à medida que se aproximava o momento da parturição, a exemplo

de P4 e P9 e P5:

Eu tinha um receio do SUS! [...] No começo queria parto normal, aí depois, comecei a me assustar com aquelas mulheres berrando e berrando, aí, fiquei com medo e falei não quero mais, quero cesárea (P4).

[...] eu já com as dores fortes, já meio apavorada (P9). [...] não sei nem como explicar, porque eu poderia ter tido o parto normal, e só fizeram o parto cesárea porque eu tava com muita contração, muita dor e muito tempo ali [...] chegava mãe e ia mãe e eu ali, e eu ficava ali, com o soro induzindo, mas eu ficava ali, eu achei supernegligência deles, eles poderiam ter uma salinha pra deixar em observação a mãe (P5).

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Constatamos, nesses três relatos, que não foram seguidas as recomendações da OMS e

do Ministério da Saúde quanto à adequação, tanto na estrutura dos serviços quanto nas

relações entre trabalhadores e usuárias, para prestar uma assistência humanizada, preconizada

pelos dois órgãos.

O que verificamos, a partir da verbalização das mulheres acerca de sua insatisfação

com a impessoalidade dos cuidados recebidos, foi que se manteve a tradição de uma

assistência biológica, marcada pela insensibilidade em relação à necessidade de acolhimento e

pela não preocupação dos médicos e da equipe de enfermagem em prestar informações sobre

o sofrimento comum ao trabalho de parto. Importa acentuar que, como no caso específico de

P4, a ansiedade pode levar a mulher a solicitar a cesariana.

Os relatos das mulheres indicaram que não houve, para a maioria delas, o suporte de

profissional de saúde referido por Brüggemann, Parpinelli e Osis (2005) e Rugolo et al.

(2004), tampouco a adesão da equipe de enfermagem para dar segurança às parturientes. Em

síntese, elas não usufruíram dos benefícios do atendimento humanizado enfatizados por

Nagahama e Santiago (2008). Ao contrário, não houve envolvimento dos profissionais no

cuidado com as pacientes, mostrando o que Wolff e Waldow (2008) apontam como

desatenção em relação a elas.

A única exceção nesse contexto de assistência foi o de P7. Ela notou que a enfermeira

que a atendeu se mostrou sensibilizada com sua aflição:

[...] dez horas da noite, a enfermeira disse: “vou tirar isto [ocitocina] da tua veia porque isto não tá fazendo bem pro bebê! E a mãe deita, descansa um pouquinho [...] vamos ver como vai ficar” (P7).

Confirmando o que constataram Santos et al. (2013) em seu estudo sobre o

relacionamento entre profissionais de saúde e parturientes, ao perceber a atenção da

enfermeira às suas expressões de dor e medo e a compreensão da profissional ao momento

que vivenciava, P3 se sentiu mais tranquila, conforme seu próprio relato.

Mas quando o profissional de saúde se mostra indiferente e insensível em relação à

parturiente, configura-se o não-cuidado, levando-a a sentir-se desvalorizada como pessoa

(WOLFF; WALDOW, 2008). Por isso é fundamental que a mulher esteja inserida num

contexto em que se sinta cuidada, com oferta de afeto, atenção e carinho, o que irá favorecer a

segurança, o bem-estar e o alívio das sensações dolorosas do trabalho de parto e parto

(OLIVEIRA et al., 2010).

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O apoio contínuo intraparto é uma ferramenta preciosa que está ao alcance da equipe

de profissionais que assistem a parturiente; em especial, é um recurso da enfermagem que,

quando empregado, minimiza vários aspectos que são danosos à mulher nesse período que

exige mais empenho. Esse esteio é um recurso não medicamentoso para controle da dor do

parto e, segundo Hodnett et al. (2011), é capaz de reduzir em cerca de 17% a necessidade de

qualquer tipo de analgesia e em 28% a necessidade de cesariana.

Mas não é isso que acontece em parte expressiva das instituições hospitalares do país,

como constataram Nagahama e Santiago (2008) ao investigarem as práticas de atenção ao

parto e analisarem os desafios para humanização do cuidado em dois hospitais vinculados ao

SUS num município da região Sul do Brasil. As pesquisadoras levantaram dados que

“apontaram para um modelo assistencial marcado pelo peso da herança higienista nas rotinas

hospitalares e nas práticas profissionais, centrado no profissional médico como condutor do

processo” (NAGAHAMA; SANTIAGO, 2008, p. 1866).

Quanto à prática de enfermagem, Rodrigues et al. (2007, p. 198) consideram que ela é

“fortemente centralizada na esfera biológica da mulher e distanciada cada vez mais do sujeito

que é cuidado”. Nesse sentido, verifica-se pouco interesse em participar e oferecer suporte

emocional a “um evento ímpar de celebração de vida, que tem conotação social e psicológica:

o processo normal e fisiológico do nascimento” (RUGOLO et al., 2004, p. 424). Essa conduta

faz com que o profissional se preocupe mais com a eficiência no ato a ser realizado do que

envolver-se com o ser humano para o qual está desenvolvendo a ação (MILBRATH et al.,

2010).

Ficou evidente, nos relatos das participantes da pesquisa, a insatisfação com um

modelo de atendimento impessoal que as desrespeitou como sujeitos ativos, deixando

flagrante a desigualdade intragêneros entre as mulheres internadas na unidade de alojamento

conjunto e as profissionais de enfermagem, indicando, como acentuam Almeida e Silva

(2008), que o modo de pensar e agir dos(as) profissionais que atuam junto às usuárias do

serviço de saúde está impregnado pelo referencial de saber e poder masculino e médico que se

mantém hegemônico e orienta as relações no interior das instituições de saúde.

É por esse e outros motivos que Milbrath et al. (2010, p. 467) evidenciam a

necessidade de se rever a assistência prestada à mulher durante o processo de parturição e

enfatizam que as ações devem centrar-se “nas necessidades do ser mulher gestante e não em

um objeto em que será realizado um procedimento. Humanizar a assistência implica modificar

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a cultura assistencial tecnicista que se encontra impregnada, por vezes até inconscientemente

nos indivíduos que prestam o cuidado”.

4.3.4 Submissão à autoridade do saber médico

Como explicitado na fundamentação teórica, persiste no Brasil um modelo de atenção

ao parto no qual a gestante é tratada como paciente e o médico exerce influência sobre a

mulher e seu desejo sobre a via de parto com a autoridade conferida a ele pelo seu

conhecimento científico. Esse saber costuma justificar “a utilização abusiva de intervenções

obstétricas” (DOMINGUES; SANTOS; LEAL, 2004). É nesse contexto que a “‘boa paciente’

é sempre vista como aquela que obedece sem questionar” (AGUIAR, 2010, p. 123), como no

caso de P1:

[...] eu já estava meio que esperando, porque ela [médica] já tinha falado para mim: “vou conversar com o doutor”. Então, eu tava assim, que seja o que Deus quiser! O que for melhor, eles vão saber, porque eles são médicos. Aí, quando ela falou vai fazer cesárea, então tá bom! Esta ótimo! Não fiquei tensa nem preocupada (P1).

A avaliação positiva de P1 sobre o desfecho do nascimento chama a atenção pela

serenidade com que ela aceitou a decisão médica em relação ao seu primeiro parto,

demonstrando confiança no profissional que a assistia sem duvidar nem questionar o

procedimento cirúrgico. O mesmo aconteceu com P6, que já havia tido uma cesariana,

recebeu indutor, mas não questionou o procedimento pela falta de conhecimento sobre as

possíveis implicações:

[...] contei o histórico do meu primeiro filho, que o médico me examinou e viu que eu não ia poder ter um parto normal, porque eu tinha feito uma cauterização há uns anos atrás [...] até aquele momento achei que ia conseguir parto normal, que eles iam induzir [...] me senti assim bem [...] a bolsa estourou às sete da manhã [...] a cesárea foi às onze (P6).

Ao contrário dessas duas mulheres, P7 relatou uma experiência que, para ela, foi

traumática, começando pela indicação médica de internação:

[...] na maternidade o médico fez o cardiotoque [...] já era umas duas horas da tarde [...] disse: “Ó! Aqui deu uma baixada no batimento do neném” [...] perguntou: “Você está com quarenta semanas? Vou te internar!” Cheguei lá com dois dedos de dilatação [...] (P7).

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Chorando no momento da entrevista, P7 demonstrou insatisfação com o

encaminhamento do processo parturitivo determinado pelo médico:

[...] foi erro deles tentarem induzir, sem necessidade, e foi assim muito bem difícil pra mim, pro meu marido porque ele tava ali junto e acompanhou tudo. Chegou outro médico e ele [marido] olhou pra mim e disse: “Ó! Não vamos ter outro filho né?” [...] não sei, tem, se tivesse esperado mais [...] e eu não tava com contração nada, nada, só senti uma dorzinha à tarde e depois já fui pra maternidade e no final da noite, eu cheguei, dei entrada às sete horas e dez horas da noite já fizeram minha cesárea (P7).

Os relatos apresentados confirmam as colocações de Pereira (2010) de que a

desinformação e o tecnicismo que envolvem o processo de hospitalização do parto favorecem

um comportamento passivo da mulher e essa situação, segundo Leão et al. (2013), contribui

para o declínio da capacidade da mulher em lidar com a imprevisibilidade do fenômeno do

parto.

4.4 SENTIMENTOS, DIFICULDADES E PROBLEMAS VIVIDOS NO PUERPÉRIO

Nesta categoria de análise, destacaram-se as seguintes subcategorias: necessidade de

descanso após a cirurgia, insegurança e solidão na sala de recuperação, complicações

puerperais e desconfortos pós-cesariana, insatisfação com o atendimento de enfermagem e

período de recuperação no domicílio.

4.4.1 Necessidade de descanso depois da cirurgia

As mulheres entrevistadas expressaram temores em relação a complicações e

desconfortos dolorosos, com debilidade física por causa da intervenção cirúrgica, e

consideraram que estes podem ser minimizados com repouso.

No caso de P9, as condições físicas pós-cesariana que dificultavam a movimentação

foram desconsideradas pelos profissionais de enfermagem, que a orientaram a realizar uma

atividade para a qual ela não se sentia capaz naquele momento por causa da dor:

[...] queriam que eu levantasse da cama [...] eu não queria de jeito nenhum, estava bem dolorida [...] para mim levantar. Meu Deus! (P9)

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É sabido que o puerpério é vivenciado pela mulher como uma experiência marcada

por profundas mudanças emocionais, tornando-a mais emotiva, sensível, promovendo

desordem e desequilíbrio. Por isso é fundamental o descanso, muitas vezes atrapalhado pela

movimentação de visitantes e de profissionais, como relatou P11:

Meu! Eu estava no quarto recuperando, é um entra e sai, é pra lá e para cá, é correria, é bem complicado, você só pensa em ir para casa e cuidar do neném, porque lá é difícil; eu fiquei duas noites e estava pedindo para Deus para ir para casa já, eu não aguentava mais (P11).

Nas falas de P9 e P11, o puerpério significa um momento que requer tranquilidade e

cuidados, especialmente após procedimento cirúrgico, quando é comum a exaustão física.

Nessa situação, é importante o repouso, que facilita a recuperação, como afirmam Acosta et

al. (2012), Santos, Brito e Mazzo (2013).

Há que se considerar também, como incômodo para o descanso dessas mulheres no

período de recuperação puerperal, o fato de elas estarem internadas em uma maternidade-

escola, onde são intensos os diálogos e as relações interpessoais, o que dificulta o repouso no

ambiente institucionalizado.

Embora o alojamento conjunto da maternidade — lugar de permanência da mãe e do

filho até a alta — seja um espaço para instrumentalizar a mulher para seu autocuidado,

Almeida e Silva (2008, p. 348) constatam que “os profissionais desenvolvem ações

fragmentadas, orientadas por um referencial em que o saber-fazer em saúde dá-se sob formas

institucionalizadas de violência simbólica, predominando posturas autoritárias e um cuidado

que subestima as necessidades das mulheres”, o que evidencia a cobertura deficiente e a

assistência de enfermagem precária e distante da preconizada pelos órgãos oficiais de saúde.

Em estudo desenvolvido por Rodrigues et al. (2006, p. 285), a maioria das puérperas

referiu insatisfação com o cuidado dispensado pela equipe de enfermagem durante a

hospitalização e a permanência no alojamento conjunto, traduzidas por elas como “lugar de

abandono, equipe de enfermagem grosseira e antiética, que fazem prevalecer o aspecto

burocrático na administração do cuidado às pacientes”.

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4.4.2 Insegurança e solidão na sala de recuperação

Verificamos que o período em que as puérperas ficaram sozinhas na sala de

recuperação ou no quarto foi considerado de grande desconforto e permeado por falta de

informação, insegurança e solidão:

Lá [na sala de recuperação] tu fica sozinha, fiquei sozinha lá, e é horrível porque tu não sabe o que está acontecendo, não sabe aonde teu bebe tá, não sabe de ninguém [...] e eu fiquei bastante tempo, bastante tempo ali na salinha (P3).

Na sala recuperação [...] senti sozinha lá, eu queria ter alguém do meu lado, queria tá me sentindo segura [...] no quarto [...] então, foi assim bem complicado, eu achei que me senti abandonada (P5).

Confirmando o que foi observado por Almeida e Silva (2008), o depoimento das

puérperas apontou para um cuidado de enfermagem que não valorizou o contexto

sociocultural e a história pessoal delas, nem as ansiedades e a necessidade de se sentirem

seguras quanto às suas condições de saúde no pós-parto.

Cabe destacar que o puerpério é descrito como o período do ciclo grávido-puerperal

em que as modificações provocadas pela gravidez e pelo parto no organismo da mulher

retornam ao seu estado pré-gravídico (GONÇALVES, 2005; BRASIL, 2001). Envolve,

segundo Patine e Furlan (2006), modificações de adaptação psico-orgânicas com involução

dos órgãos reprodutivos, o estabelecimento da lactação e a ocorrência de intensas alterações

emocionais e elevada vulnerabilidade frente à insegurança, ansiedade e dúvidas que permeiam

o cuidado do bebê e o autocuidado.

Esse período é associado a profundas transformações na vida da mulher, o que insinua

um contexto problemático (KALINOWSKI et al., 2012; CARVALHO et al., 2007). Acosta et

al. (2012) entendem que o puerpério é considerado, por muitas mulheres, como um período

difícil, pois exige readaptações, sendo necessárias ações de autocuidado especiais que visam à

proteção e manutenção da saúde.

O suporte oferecido pela equipe de saúde é essencial, uma vez que a puérpera precisa

de alguém que esclareça as dúvidas e lhe transmita autoconfiança, o que é indispensável ao

desempenho materno (OLIVEIRA; QUIRINO; RODRIGUES, 2012). Daí a importância de

conhecer cada cliente em sua individualidade a fim de promover intervenções adequadas e

condizentes com cada caso (RODRIGUES et al., 2007) e a necessidade de modificações na

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prática e no modo de cuidar da enfermagem, não somente nos procedimentos técnicos, mas

também na incorporação de valores e iniciativas humanizadoras do cuidado (ALMEIDA;

SILVA, 2008).

4.4.3 Complicações puerperais e desconfortos pós-cesariana

Durante as primeiras horas e nos primeiros dias pós-cesariana, a maioria das mulheres

experimentou dores e desconfortos, a exemplo do que foi informado por P1:

E teve aquele sofrimento, que eu não tive aquele sofrimento antes, mas eu tive pós, na recuperação, né, eu tive um sangramento [...] foi bem intenso; daí colocaram um tipo de um cimento em cima da minha barriga para controlar [...] eu fiquei bem fraca, debilitada, né, mas as horas que eu fiquei na recuperação eu via mulheres chegando, saindo, e eu ainda ali [...] aquela troca de lençóis toda hora, umas quatro ou cinco vezes trocaram meu lençol, vinha vários médicos me ver, como estava meu sangramento [...] não lembro muitas coisas, em alguns momentos eu tava, praticamente estava apagada [...] depois que eu fui para o quarto umas duas horas da manhã, eu desmaiei,] quando acordei tava umas três enfermeiras no meu lado assim [...] nos primeiros dois dias mesmo que eu fiquei bem debilitada (P1).

P1 descreveu um quadro aflitivo, agravado por hemorragia pós-cesariana com a troca

frequente de absorventes, a presença constante de profissionais na supervisão do estado geral,

a obnubilação referida nos sinais de diminuição da volemia com a diminuição da oxigenação

em áreas vitais e medidas de assistência para conter o avanço do problema. Esses aspectos

são muito preocupantes, principalmente no que se refere à hemorragia, responsável por alta

taxa de mortalidade materna que pode ocorrer por falta de condição hospitalar adequada, de

observação médica e de cuidados de enfermagem mínimos (BRASIL, 2000).

Consideramos importante citar aqui o conceito de near miss (“quase-perda”), que faz

referência à situação na qual mulheres que apresentam complicações potencialmente letais

durante a gravidez, parto ou puerpério, somente sobrevivem devido ao acaso ou ao cuidado

hospitalar. As definições baseadas em condições clínicas estão, em geral, centradas nas

maiores causas de morte materna: hipertensão, hemorragia e sepse (SOUZA et al., 20o6).

Morse et al. (2011) afirmam que essa condição de morbidade materna grave ou near

miss pode ser um indicador mais útil na análise da assistência obstétrica que a mortalidade

materna, por sua maior incidência e maior possibilidade de informação, já que a própria

mulher pode ser uma fonte de dados. O estudo da morbidade materna grave ou near miss é

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importante para a ampliação dos conhecimentos sobre fatores de risco na gestação, como é

também uma ferramenta valiosa para o monitoramento da rede e do processo de atenção no

atendimento obstétrico.

Em relação à importância dos meios de prevenção de infecção, como a higiene e o

conforto, com trocas frequentes de roupas e manutenção do leito limpo e confortável, neste

estudo, a narrativa das mulheres mostrou a necessidade de eficiência nesse serviço.

Esse dado se assemelha ao encontrado por Rodrigues et al. (2007), que publicaram

depoimentos de mulheres que se referiram ao atendimento de enfermagem dispensado durante

o pós-parto, apontando a necessidade de cuidados mais técnicos nas situações de emergência,

suprindo as necessidades biológicas com presteza, competência técnica e disponibilidade para

ajudar. Portanto, como enfatizam Almeida e Silva (2008), são essenciais cuidados de

enfermagem qualificados que tenham como base a prevenção de complicações e ações que

amenizem os desconfortos físicos, como os causados pela ferida operatória da intervenção por

cesárea, e emocionais das mulheres, como os apresentados por P2:

[...] eu ali com aqueles pontos [...] nem roupa eu podia botar, de tanta dor [...] a recuperação que para mim foi horrível [...] não vinha a urina, mexe com todo o psicológico [...] aqueles gases presos, a barriga inchada, aquela dor e não passava; [em casa] infeccionou um ponto, começou a sangrar, aí ele ficou dolorido (P2).

A puérpera se viu envolvida por uma série de transtornos físicos e psicológicos

características do puerpério, como dor na ferida operatória e dificuldade de movimentos —

aspectos também relatados no estudo de Strapasson e Nedel (2010). Nesses casos, é

imprescindível o acompanhamento da enfermagem no que se refere ao apoio e à atenção às

necessidades das mulheres na área da reorganização psíquica, familiar e social (SOUZA;

AMORIM, 2008).

A situação vivenciada por P3 incluiu dificuldades nos movimentos, desconforto e dor

devido à cicatriz cirúrgica, além de fraqueza e cansaço, de várias limitações para lidar com o

bebê e com o cotidiano de suas necessidades de atenção nos aspectos físicos:

[no quarto] o ruim é que tu não poder fazer nada, não pode colocar a roupa, não pode se mexer [...] reclamei bastante porque doía muito, dói bastante [...] depois que eu fiz a cesárea, doía muito, me sentia muito mal, muito fraca, queria levantar da cama, queria fazer as coisas e não dava muito bem, pegar no colo essas coisas, não dava para fazer né? (P3).

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Kalinowski et al. (2012) identificaram, entre os aspectos negativos do puerpério, os

sentimentos dolorosos e desconfortáveis da ferida operatória da intervenção por cesárea, o que

foi confirmado na experiência de P7:

Mas assim, foi bem ruim a cesárea, doeu, incomodou [...] a recuperação, foi mais ruim [...] anestesia demora passar, depois dá uma coceira no corpo insuportável por causa da anestesia, eu não sabia se eles costuraram certo, se não costuraram, se a bexiga estava no lugar, porque daí eu sentia dor pra urinar eu não sabia se tinham mexido na bexiga também, é bem complicado assim [...] quando a enfermeira veio e já mandou sentar, aí fiquei ruim [...] aí na terça-feira de manhã desmaiei [...] mandou [enfermagem] tirar a proteção dos pontos e acho que foi isto também que, porque eu fiquei muito tempo com a cabeça baixo do banho, aí desmaiei [...] eu tava sentindo muita dor na cirurgia (P7).

Nervosismo e ansiedade estiveram presentes na maioria das narrativas relativas a essa

fase de transição, quando se impuseram novas responsabilidades. Os sinais de dor no período

de recuperação, as dificuldades decorrentes da anestesia, a dificuldade de retorno aos

movimentos normais, o questionamento e as incertezas acerca da incisão cirúrgica, a

enfermagem que mandou retirar o curativo da ferida operatória quando a mulher ainda se

sentia desconfortável foram transtornos experenciados pelas puérperas, como é o caso de P7 e

também de P9:

Aí, com muito custo, com muita dor, conseguiram. [...] Meu Deus! Que coisa horrível! [...] e eu aí, naquela dificuldade toda de me locomover e, nem pegar o neném conseguia, me virar e pegar ele do outro lado da cama [...] eu mesma tirei o curativo né, até então eu achei que as enfermeiras iam me ajudar; [em casa] as minhas pernas começaram a inchar, estava bem inchada e começou a amortecer também minhas pernas, à noite eu fiquei em pânico [...] está um pouco vermelho os pontos [...] ainda dói se eu me movimento durante o dia, à noite dói bastante (P9).

As narrativas das mulheres entrevistadas coincidem com as observações de Strapasson

e Nedel (2010), que afirmam que, nesse período, elas se encontram inseguras e totalmente

dependentes, com dor na ferida operatória e dificuldade de mobilização. Em grande parte dos

relatos das participantes desta pesquisa foram mencionadas sensações de desconforto físico

inerente à intervenção — “não tem como explicar a dor da anestesia, mas é bem

desconfortável, mas é uma coisa bem desconfortável” (P4) —, incertezas e temores,

debilidade física e dificuldades para realizar os cuidados de si e responder às necessidades do

bebê.

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P7 e P9 ressaltaram a necessidade de mais apoio por parte das enfermeiras,

especialmente no que diz respeito à remoção de curativo da ferida operatória, pois

apresentaram dificuldades e grande desconforto justamente pela falta de assistência e

orientação. Para Oliveira, Quirino e Rodrigues (2012), o suporte oferecido pela equipe de

saúde é essencial, uma vez que a puérpera precisa de alguém que esclareça dúvidas e lhe

transmita autoconfiança, o que é indispensável ao desempenho materno.

De acordo com Almeida e Silva (2008), a submissão à institucionalização gera

insegurança nas mulheres, que não se veem em condições de fazer constantes solicitações de

conforto, tanto por se sentirem dependentes daquele serviço como por estarem vivenciando

um momento em que se sentem temerosas e fragilizadas emocionalmente.

As autoras criticam o modelo de atendimento biomédico de enfermagem, “que

fragmenta seres humanos e dirige ao corpo biológico ações técnicas ao lado de relações

autoritárias” (ALMEIDA; SILVA, 2008, p. 349), e se referem à inserção social

desprivilegiada das usuárias dos serviços públicos de saúde que são obrigadas a se

submeterem ao que lhes é oferecido. Ao abordar essa questão, Freitas e Savi (2011) destacam

a probabilidade de aumento nas complicações pós-cesárea entre as puérperas no sistema

público.

Apesar da crescente preocupação com a humanização dos cuidados à saúde da mulher,

é visível a pouca valorização dada às demandas que surgem da vivência da mulher no período

puerperal, com ênfase às relativas à subjetividade feminina, que se modificam com a chegada

do bebê, segundo o contexto sociocultural e emocional em que se inserem a gravidez, o parto

e o pós-parto (BRASIL, 2001).

Almeida e Silva (2008) acentuam a importância da atenção humanizada no período

gravídico-puerperal com procedimentos que variam com as especificidades de cada mulher e

incluem prevenção, avaliação e tratamento da dor. Afirmam que é preciso “investir no

acompanhamento pós-parto, pois, além de possibilitar conforto e segurança às mulheres,

permitem identificar e debelar precocemente as complicações comuns no puerpério”

(ALMEIDA; SILVA, 2008, p. 351).

4.4.4 Impessoalidade no atendimento de enfermagem

Almeida e Silva (2008) verificaram, em sua pesquisa, a necessidade de maior

proximidade das mulheres com os profissionais de saúde, de modo que elas sejam escutadas,

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compreendidas e atendidas. As puérperas entrevistadas expressaram a necessidade de serem

tratadas com confiança e respeito, havendo a expectativa de que as enfermeiras entendessem

as suas necessidades e tivessem para com elas uma atitude humanitária.

No período de recuperação pós-cirúrgica, P10 experenciou momentos de indesejáveis

discussões com a equipe de enfermagem. Seu intuito era colher informações sobre o cuidado

com a ferida operatória. Ela teve uma vivência bem perturbadora, indicando a desumanização

no cuidado e a desvalorização de suas queixas:

[...] aconteceu nos dias que eu estive lá, os três dias, divergência entre as enfermeiras [...] “Não! Tu não podes molhar esses pontos, porque não sei o quê” [...]. Eles me deixaram quase louca dentro do quarto. Aí eu disse assim: “Tá! Mas me fale o que realmente está acontecendo comigo, porque umas falam que a minha cesárea” [...] (P10).

A situação relatada por P10 tem correspondência direta com os resultados obtidos no

estudo de Rodrigues et al. (2006, p. 285), que revelaram que “a maioria das puérperas referiu

insatisfação com o cuidado dispensado pela equipe de enfermagem” durante a hospitalização

e a permanência no alojamento conjunto, caracterizando o ambiente hospitalar como “lugar de

abandono” e a equipe de enfermagem com os adjetivos “grosseira e antiética”. Tais aspectos

conduzem à inferência de que prevaleceu o aspecto burocrático na administração do cuidado

às pacientes, sinalizando violência institucional.

Confirmando o que foi constatado por Almeida e Silva (2008, p. 350), os relatos das

entrevistadas apontaram para “um modelo de atendimento impessoal que desrespeita as

mulheres como sujeitos ativos” e para a “desigualdade intragêneros” que se manifestou na

relação entre as mulheres internadas no alojamento conjunto e as enfermeiras, “indicando um

escalonamento e hierarquização do poder, dirigida às mulheres que, presumidamente,

pertencem a nível social inferior”, como já havia sido observado por Coelho (2005).

Pudemos perceber que o atendimento de enfermagem prestado a P10 e a outras

mulheres durante o puerpério foi desenvolvido por meio de ações orientadas por um

referencial em que o saber-fazer em saúde se dá sob formas institucionalizadas de violência

simbólica, subestimando as necessidades das mulheres (ALMEIDA; SILVA, 2008).

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4.4.5 Período de recuperação no domicílio

Passados alguns dias da cesárea, no período da recuperação, as mulheres participantes

desta pesquisa citaram as mudanças vivenciadas como uma experiência positiva, durante a

qual viveram um período tranquilo:

É complicado assim, só nessa parte, mais foi tranquilo... (P3).

[...] daí não senti mais [...] eu tô gostando bastante da minha recuperação (P4). [...] bem tranquilo! Mas, tipo agora assim, que já passou bastante dias, já faz seis dias hoje, né, já tá bem melhor, já caminho pra lá e pra cá, já faço umas coisa aqui umas ali... (P8).

E a recuperação, também tranquila né? Eu só fiquei meio preocupada com a recuperação da minha cesárea, ainda continuo (P10).

Na investigação de Kalinowski et al. (2012), as puérperas também avaliaram o pós-

parto de forma positiva. Um dos sentimentos afirmativos referidos foi o aspecto da

tranquilidade materna.

Também foram apontadas intercorrências por P10 e P4, quando expressaram

preocupação com a ferida operatória e sensações dolorosas. O desconforto físico foi

considerado um aspecto negativo:

[...] sinto um pouco de dor nos pontos por dentro (P4).

[...] tem um lado assim do meu ponto que está doendo bastante (P10).

Os sentimentos de insegurança e temor despertados surgiram não somente em

decorrência do receio pelas complicações obstétricas, mas também pelas recordações de

experiências não exitosas em parturição anterior, como demonstrado na fala de P6:

[...] dela já foi um pouco melhor, eu já consegui levantar, já andava um pouco melhor, mesmo assim com um pouco de medo, porque o trauma não tinha passado, mas assim foi tranquilo pra mim (P6).

Porém, passados alguns dias, P6 enfatizou a tranquilidade no período de sua

recuperação. Nessa perspectiva, as mulheres adquiriram conhecimento sobre a recuperação

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também em suas vivências. Após perceberem diferentes transformações (pessoais, físicas,

comportamentais) em suas vidas e nas suas rotinas, as puérperas visualizaram,

principalmente, os aspectos positivos da maternidade e, na sequência, os negativos.

Ressaltamos a necessidade de orientação que favoreça a adaptação das mulheres às

mudanças físicas, de modo especial no pós-parto, de acompanhamento para prevenção de

complicações como infecções e de medidas de conforto (KALINOWSKI et al., 2012;

CARVALHO et al., 2007), já que várias puérperas disseram experenciar desconfortáveis

sensações dolorosas, especialmente na região da incisão cirúrgica. Cabe ainda enfatizar a

importância da revisão pós-parto como uma das medidas preventivas de complicações

puerperais, como acentuam Santos, Brito e Mazzo (2013).

O fornecimento de informações claras e objetivas que orientem as mulheres sobre os

cuidados com seu corpo é fundamental para a saúde materna, mas não constitui uma prática

frequente nas maternidades e nos serviços de saúde. A informação negada, confusa ou omitida

propositadamente, ou ainda aquela dada de forma inacessível, usando termos técnicos de

difícil compreensão, insinuam que a mulher é incapaz de entender o que é explicado e

constituem violência institucional, pois negam às mulheres “elementos importantes que lhes

possibilitem o exercício do poder e a autonomia para decidirem sobre elas mesmas”

(ALMEIDA; SILVA, 2008, p. 351).

O contrário disso, segundo Almeida e Silva (2008), seria o desenvolvimento de ações

voltadas a informar e orientar com base nas necessidades individuais, a partir de iniciativas

humanizadoras e de novas posturas, visando ao acolhimento solidário.

Outro aspecto interessante para análise nesse contexto são os significados populares

do puerpério. Algumas mulheres submetidas à cesariana acreditavam que, por causa desse

tipo de procedimento cirúrgico, deveriam adotar certos cuidados com o corpo materno, como

repousar, não realizar tarefas domésticas e pegar peso — cuidados estes prescritos pela

cultura da família. Conforme a narrativa de P7, a fase do puerpério — popularmente

conhecido como quarentena ou resguardo — veio permeada por crenças, práticas, costumes

que guiam as ações da puérpera e são passadas de geração em geração:

Aí, quando cheguei em casa foi a hora da família dizer: “agora tu vai descansar, tu tá de resguardo, vai pra cama” [...] minha mãe disse: “Não! Não! Tu tá de resguardo e tem que descansar, não pode pegar na vassoura de jeito nenhum, porque tá tudo solto por dentro, não pode fazer o serviço” [...] não posso passar pano, não posso estender roupa [...] é perigo romper tudo por dentro [...] disse que eu não posso pegar peso (P7).

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No estudo de Kalinowski et al. (2012), as puérperas também relataram mudanças

comportamentais orientadas por familiares, como evitar esforço físico e manusear peso. A

fragilidade evidenciada pela família — “tá tudo solto” — remete à crença na necessidade de

respeito à quarentena e, caso haja transgressão durante esse período, pode predispor a

puérpera a complicações que ameaçam a saúde. Essas condutas reafirmam que algumas

tradições relacionadas ao resguardo ainda persistem, como identificado por Acosta et al.

(2012).

Nessa perspectiva de cuidado, importa observar que é no espaço doméstico que se

operam saberes, decisões e práticas que, por vezes, são conflitivos com os cuidados

necessários à saúde materna. Desse modo, é fundamental que os profissionais de saúde

estabeleçam relação com as mulheres e conheçam e discutam as práticas populares,

incentivando o autocuidado de ações benéficas e problematizando as condutas que põem em

risco a saúde (ACOSTA et al., 2012).

Há que se considerar que o puerpério é um período cercado de crenças e tabus e que,

portanto, “as experiências prévias das mulheres são decisivas para considerar ou não a revisão

pós-parto significativa no seu processo de saúde/doença” (SANTOS; BRITO; MAZZO,

2013).

Em estudo sobre crenças no puerpério provenientes da orientação familiar realizada

em âmbito doméstico, Acosta et al. (2012) constataram que o conhecimento de práticas

populares é respeitado pelas mulheres. “São histórias e vivências que, muitas vezes,

despertam tanta confiança, que acabam sendo percebidas como verdades absolutas e, assim,

são seguidas sem questionamentos” (ACOSTA et al., 2012, p. 1328), muitas vezes

prevalecendo sobre o saber científico. Os autores acentuam a importância de os profissionais

de saúde reconhecerem a quarentena como herança cultural e dialogarem com as puérperas

acerca de benefícios e de possíveis transtornos advindos das práticas populares.

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao analisar a vivência de mulheres submetidas à cesariana em relação aos aspectos

que influenciaram o desejo da via de parto, ao atendimento obstétrico e aos sentimentos,

dificuldades e problemas vividos no puerpério, concluímos este trabalho, considerando que o

objeto escolhido foi pleno de possibilidades para compreensão da realidade vivenciada em

três importantes momentos da história de vida dessas mulheres.

Uma das principais conclusões a que chegamos, a partir dos relatos das entrevistadas,

é que a assistência ao parto no contexto pesquisado, em grande medida, não esteve descolada

do modelo de saúde hegemônico do país, caracterizado pelo uso excessivo de tecnologia e

pela medicalização do corpo da mulher.

Um momento que deveria ser natural para a maioria das mulheres, considerando que,

com raras exceções, a gravidez e o parto são processos naturais que acontecem sem

necessidade da intervenção de outros, pois a natureza os resolve sem artifícios, como enfatiza

Besio (1999), transformou-se, para a maioria das participantes desta pesquisa, em uma

experiência traumática.

Como afirma Odent (2002, p. 135), “todas as sociedades humanas conhecidas

perturbam, mais ou menos, o processo fisiológico” e foi isso o que observamos neste estudo:

um modelo de cuidado intervencionista que causou insatisfação para a maioria das mulheres,

principalmente na maternidade.

Os resultados obtidos neste estudo apontaram que intervenções desnecessárias no

corpo da mulher continuam ocorrendo e transformam o parto em uma experiência de

sofrimento, de insegurança, e superam toda e qualquer vivência positiva ocorrida no parto.

Práticas desaconselhadas pela OMS e pelo Ministério da Saúde, como a aceleração de parto

com ocitócitos, foram realizadas na assistência ao parto na instituição pesquisada.

Com referência ao desejo por determinada via de parto, observamos que os aspectos

que mais influenciaram as mulheres nesse sentido foram o desejo de viver a experiência do

parto normal, com a expectativa de recuperação mais rápida após o parto e maior autonomia

no cuidado com o bebê e no autocuidado. Conversas com familiares e pessoas conhecidas e

informações do médico também exerceram influência, mas em menor medida.

Verificamos que a maioria das mulheres tinha o parto normal como primeira opção,

mas sua capacidade natural de adaptação fisiológica e psicológica a essa realidade foi

desafiada por medidas impositivas de submissão a procedimentos padronizados e à indicação

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do médico para realização de cesariana. O sentimento de medo e a insegurança levaram

algumas parturientes a não questionar a decisão médica pela cesariana como forma de evitar a

dor do parto normal e preservar a saúde do bebê.

A nosso ver, faltou, a essas mulheres, durante todo o período de gestação, orientações

adequadas que possibilitassem a elas conhecer alternativas de cuidados em situações de

trabalho de parto fisiológico e no caso de surgirem fatores adversos. Entendemos que o acesso

a informações sobre gestação e parturição, sobretudo a respeito dos benefícios e riscos das

diferentes vias de parto, é fundamental no sentido de romper tabus e mitos e sustentar maior

empoderamento das mulheres.

Observamos o que já foi constatado por Zorzan (2013, p. 196): que, “se o acesso às

informações para as negociações sobre o tipo de parto foi restrito, o referente às intervenções

na assistência quase desapareceu”, induzindo algumas mulheres desta pesquisa a “falsas

crenças sobre os benefícios e a necessidade de intervenções, silenciando o diálogo para o

exercício da escolha informada na dinâmica das negociações”.

Em relação ao atendimento obstétrico, foram evidenciados o uso constante de

tecnologia — com maior frequência a ultrassonografia e o monitoramento cardíaco fetal — e

a indução do trabalho de parto com ocitocina e rompimento de membranas amnióticas. As

intervenções cirúrgicas seguiram uma lógica de difícil contestação pelas mulheres em virtude

da falta de argumentos capazes de questionar a autoridade médica. De certa maneira, as

participantes desta pesquisa demonstraram estar sob forte influência do que Zorzan (2013, p.

198) entende como “cultura da alta valorização da tecnologia e da submissão feminina diante

do conhecimento médico-científico” — aspecto verificado na análise do conteúdo das

entrevistas e interpretado como submissão à autoridade do saber médico.

Constatamos que não existiu um relacionamento terapêutico favorável, com produção

de vínculo, e a assistência foi, com raras exceções, mecanicista e impessoal por parte de

médicos e enfermeiros. O cuidado se distanciou das necessidades e expectativas das gestantes

e de suas famílias, que desejavam ser auxiliados e que o atendimento fosse humanizado.

Quanto à prática de enfermagem, os resultados desta pesquisa apontaram que ela esteve

voltada à dimensão biológica da mulher em detrimento dos aspectos subjetivos que

permearam as experiências do processo vivenciado pelas mulheres na maternidade. As

puérperas expressaram a carência de um tratamento pautado em confiança, respeito e atitudes

humanitárias.

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Foram frequentes nos relatos as referências à insegurança e à solidão num momento de

vulnerabilidade para a puérpera, o que aumentou seus medos e incertezas em relação à sua

saúde e ao bem-estar do bebê. Os significados populares e as crenças passadas de geração a

geração sobre o puerpério estiveram presentes nesse período vivido pelas mulheres

submetidas à cesariana na maternidade pesquisada.

Em relação às complicações puerperais, nos primeiros dias do pós-cesariana, a maioria

das mulheres experimentou desconfortos e dores na área da cicatriz cirúrgica, relatando

dificuldades de movimentação e limitações para lidar com o bebê. Passados alguns dias da

cesariana, no período de recuperação em domicílio, a maioria das mulheres citou as mudanças

vivenciadas como uma experiência positiva, durante a qual viveu um período mais tranquilo.

Toda a trajetória deste estudo foi relevante na medida em que ampliou nossos

conhecimentos e nos fortaleceu nos aspectos profissional e intelectual. Apontamos como

limitação desta investigação o tempo insuficiente para analisar outros aspectos importantes,

como o vínculo materno-fetal, a analgesia de parto, a liberdade de movimentação da

parturiente e o aleitamento materno — temas que sugerimos para novas pesquisas.

A formação dos profissionais de saúde é outro assunto que merece reflexão e

pesquisas, pois é a partir dela que estratégias e programas recomendados pela OMS e pelo

Ministério da Saúde podem ser disseminados e se concretizarem na assistência ao parto e

nascimento, de forma a reduzir as taxas de cesáreas. Estudos sobre a relação entre médicos,

enfermeiros e mulheres atendidas em maternidades devem ser incentivados a fim de

contribuir na elaboração de políticas públicas que contemplem o respeito à mulher com foco

na vivência de suas experiências, nos aspectos socioeconômicos, culturais e afetivos, na

subjetividade da gestação, do parto e do nascimento.

Consideramos interessante o desenvolvimento de estudos que ampliem nossa

investigação, enfocando as repercussões da experiência da cesariana e do puerpério na

qualidade de vida das mulheres submetidas a esse procedimento cirúrgico e de seus filhos.

Enfatizamos a importância de se olhar, de se aproximar, de falar com e ouvir mulheres

que, mais do que simplesmente “mulheres de carne e osso” (BRAIDOTTI, 2000), são seres

dotados de sentimentos e desejos que não podem ser ignorados pelo saber médico-científico,

mulheres com experiências e vivências que precisam ser consideradas para que haja

transformação da realidade de atendimento ao parto vivida pelas mulheres participantes deste

estudo.

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APÊNDICES

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APÊNDICE A - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ

PROGRAMA DE MESTRADO PROFISSIONALIZANTE EM SAÚDE E GESTÃO DO TRABALHO

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Você está sendo convidada para participar, como voluntária, em uma pesquisa. Após ser esclarecida sobre as informações a seguir, no caso de aceitar fazer parte do estudo, rubrique todas as folhas e assine ao final deste documento, com as folhas rubricadas pelo pesquisador, e assinadas pelo mesmo, na última página. Este documento está em duas vias. Uma delas é sua e a outra é do pesquisador responsável. Em caso de recusa você não será penalizada de forma alguma.

INFORMAÇÕES SOBRE A PESQUISA:

Esta pesquisa tem como título VIVÊNCIA DE MULHERES SUBMETIDAS À CESARIANA e tem como objetivos conhecer a vivência das mulheres submetidas à cesariana em relação ao desejo da via de parto, ao atendimento obstétrico e aos sentimentos e problemas vividos no puerpério. Ao participar desta pesquisa você ajudará a entendermos as experiências vividas pelas mulheres que realizaram cesariana. Nesse sentido, estudos acerca da temática em questão se fazem necessários para que se possa entender os fatores que influenciam na escolha da via de parto e analisar a repercussão desta via de parto na vida cotidiana. Sua participação nesta pesquisa consistirá em responder a um questionário socioeconômico e a uma pergunta gerativa. Sua resposta será gravada para posterior transcrição e análise. Nenhuma pesquisa é isenta de risco, portantom para esta pesquisa os riscos identificados são: o constrangimento ou desconforto diante da pergunta gerativa a que será submetida. Caso você não se sinta à vontade pode deixar de responder ou até mesmo encerrar a entrevista, sem que isto cause qualquer prejuízo para você. Ainda como risco possível pode ser citado o extravio (roubo ou perda) dos instrumentos de pesquisa (entrevista gravada) o que pode, desta forma, gerar a divulgação dos dados confidenciais. Realizaremos nossa pesquisa no período de dezembro de 2013 a janeiro de 2014 e garantiremos o sigilo de seu nome e das suas informações. Somente os pesquisadores terão acesso ao instrumento respondido. Para a presente pesquisa não haverá remuneração. Também não haverá qualquer custo para você relacionado a este estudo. Você pode, a qualquer tempo, solicitar a retirada de seu nome da pesquisa, sem prejuízo algum.

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Ao término desta pesquisa, faremos a devolução dos dados em uma apresentação pública, para a qual você será convidada, bem como em encontro domiciliar com dia e horário de sua preferência. O pesquisador responsável por este pesquisa é o professor José Roberto Bresolin, que pode ser contatado pelo telefone (47) 3341-7540 e ainda o contato pode ser realizado com a pesquisadora Juraci Maria Tischer pelo telefone (47) 91086081. O contato ainda pode ser realizado com o Comitê de Ética em Pesquisa da Univali pelo telefone (47) 3341-7738 ou pelo email é[email protected] CONSENTIMENTO DE PARTICIPAÇÃO DO SUJEITO Eu, _____________________________________, RG_____________, CPF ____________ abaixo assinado, concordo em participar do presente estudo como sujeito. Fui devidamente informado e esclarecido sobre a pesquisa, os procedimentos nela envolvidos, assim como os possíveis riscos e benefícios decorrentes de minha participação. Foi-me garantido que posso retirar meu consentimento a qualquer momento, sem que isto leve a qualquer penalidade ou interrupção de meu acompanhamento/assistência/tratamento. Local e data: ________________________________________________________________

Nome: _____________________________________________________________________

Assinatura do Sujeito de Pesquisa: _______________________________________________

Telefone para contato: _________________________________________________________

Pesquisador Responsável: ______________________________________________________

Pesquisadores Participantes: ____________________________________________________

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APÊNDICE B – Artigo enviado à revista Estudos Feministas

Medicalização e cesariana: controle sobre o corpo, a autonomia feminina

e o protagonismo das mulheres na experiência de parir

Medicalization and cesarean section: control over the body, female autonomy

and the role of women in the experience of giving birth

Juraci Maria Tischer

Stella Maris Brum Lopes

José Roberto Bresolin

Elisete Navas Sanches Próspero

Resumo

Este estudo, de abordagem qualitativa, aborda a vivência de onze mulheres submetidas à

cesariana em uma maternidade de referência do estado de Santa Catarina em relação à

experiência do parto. O uso constante de tecnologia, a indução do trabalho de parto,

complicações puerperais e desconfortos pós-cesariana, a submissão à autoridade do saber

médico e a necessidade de apoio durante o processo se destacaram como categorias de

análise. As falas das participantes da pesquisa indicaram que a assistência recebida, em

grande medida, não esteve descolada do modelo de saúde hegemônico do país, caracterizado

por uma atenção centrada na prática intervencionista, domesticadora de corpos, que coloca em

risco a autonomia feminina e o protagonismo da mulher na experiência de parir.

Palavras-chave: Parto; cesariana; medicalização; autonomia feminina, protagonismo.

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Abstract

This study adopted a qualitative approach addresses the experiences of eleven women

undergoing cesarean section in a maternity in the state of Santa Catarina in relation to the

experience of childbirth. The categories were found were the constant use of technology,

induction of labor,puerperal complications and post-cesarean discomforts , submission to the

authority of medical knowledge and and the need for support during the process. The reports

of the survey participants indicated that the care received, in most cases, was not decoupled

from the hegemonic model of healthcare in the country, characterized by focused attention on

interventionist practice of domesticating bodies, which endangers women's autonomy and the

role of women in experience of giving birth.

Keywords: Labor; cesarean section; medicalization; female autonomy, leading figure.

No campo das pesquisas científicas há um intenso debate sobre as questões relacionadas à

assistência ao parto, que tende a “transformar um evento fisiológico normal em um processo

médico-cirúrgico”.1 A Organização Mundial de Saúde (OMS)2 preconiza que o total de

cesarianas em relação ao número total de partos realizados em um serviço de saúde fique na

faixa dos 15%, mas, no Brasil, as taxas de nascimento por meio de cesáreas chegam a 40% no

sistema público e mais de 70% na rede privada.3

São muitos os obstáculos encontrados para a concretização de programas que assegurem o

direito do cuidado de saúde qualificado de cada mulher, como a dificuldade de acesso aos

serviços de saúde, a atenção centrada na prática intervencionista, com uso rotineiro de

1 Zuleyce OLIVEIRA e Anézia MADEIRA, 2002, p. 134.

2 OMS, 1996.

3 Pâmela OLIVEIRA e Cecília RITTO, 2013.

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tecnologias inadequadas, desconsiderando o protagonismo da mulher no momento do parto, e

o despreparo de profissionais para assistência humanizada no processo de parturição.

Nesse contexto, as maternidades exercem forte poder de decisão sobre a vida da mulher,

controlam como e quando será o parto, como deve ser o comportamento das pessoas

envolvidas no processo.4 E geralmente é o médico quem decide a via de nascimento, sendo

que os principais fatores que levam à indicação da cesárea são os de “ordem econômica e de

organização da agenda do médico, bem como o modelo intervencionista da assistência

obstétrica no Brasil”.5

Uma das razões do número elevado de cesarianas no Brasil é a cesárea “a pedido” da mulher

– sinônimo de cesárea eletiva na ausência de indicação médica6 –, justificada em parte porque

“as mulheres têm informações erradas ou incompletas sobre o processo do parto”.7

Quando o médico acata de imediato o pedido de cesárea, deixa de oferecer à sua paciente a

melhor ajuda que poderia prestar para o empoderamento da mulher: a chance de examinar o

contexto, analisar e fundamentar as suas razões e assim poder entender vantagens e

desvantagens da cesárea, além de criar mecanismos para superar seus medos.8

Muitas vezes, para não manifestar seus medos e fraquezas, a mulher desenvolve uma “sutil

parceria (talvez inconsciente) com o seu médico”, sinalizando que prefere abdicar do parto

normal para não sentir dor, delegando ao médico a tomada de decisão, ou seja, “fornecendo

um aval [...] ao modelo intervencionista da assistência obstétrica”.9

4 Maria GAÍVA e Celina TAVARES, 2002.

5 Raquel PEREIRA, 2010, p. 137.

6 Luciano PATAH, 2008.

7 Hugo SABATINO, 2007, p. 482.

8 Maria MALDONADO, 2002.

9 PEREIRA, 2010, p. 86 e 87.

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Em investigação realizada por Heloísa Salgado10, a maioria das mulheres consultadas relatou

não ter participado na decisão pela cesariana e muitas foram induzidas ou levadas a pedir a

cesárea, com a identificação de uma comunicação coerciva entre o profissional e a mulher,

sendo esse um fator relevante na experiência indesejada. O estudo evidenciou o uso rotineiro

de práticas inadequadas e desrespeitosas, como o convencimento para realizar a cesárea com

base em informação distorcida e ameaçadora. Isso revela que, no processo que conduz as

mulheres a uma cesárea indesejada “está a marca de uma assistência que virtualmente

inviabiliza a possibilidade do protagonismo feminino e de escolha informada, priorizando as

conveniências e necessidades da equipe de profissionais e da instituição que as acompanha”.11

Como assevera Robbie Davis-Floyd12, a cesárea é conceitualmente útil para a obstetrícia

porque, ao transformar o nascimento em um procedimento cirúrgico de rotina, legitima-se a

obstetrícia como ato médico, incorporando-se à sua prática um elemento central da medicina

moderna e uma das formas mais elaboradas de manipulação do corpo-máquina humana: a

cirurgia.

Medicalização do corpo feminino

O corpo feminino foi medicalizado ao longo da história e constituído como objeto da

medicina. Essa apropriação “pelo saber médico foi efetivamente marcada pelo

desenvolvimento de um conhecimento cirúrgico e tecnológico promovido pela aproximação

da medicina com o momento do parto”.13 O modelo biomédico, mecanicista, cartesiano,

10 Heloísa SALGADO, 2012.

11 SALGADO, 2012, p. 8.

12 Robbie DAVIS-FLOYD, 1994.

13 Elisabeth VIEIRA, 2002, p. 23.

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estruturado durante o século XIX, associa doença à lesão, reduzindo o processo saúde-doença

à sua dimensão anatomofisiológica.

O parto passou de um evento social ligado à cotidianidade das mulheres a um evento médico e

hospitalar14 – fato consolidado no século XX. A mulher foi transferida para o espaço

hospitalar, excluindo-se os componentes históricos, sociais, culturais, políticos e ecônomicos.

Esse é um aspecto revelador da objetificação feminina perante a prática médica. É a

fragmentação do corpo da mulher representada pelo não respeito à dor física e ao desconforto

por ela manifestado.15

Junia Cardoso e Regina Barbosa16, em investigação com mulheres de classe média que

desejavam partos normais e pariram de cesarianas, observaram que se cristaliza a hegemonia

do modelo de assistência tecnocrático que coloca em risco a autonomia e a satisfação

feminina com a experiência de parir, sendo que a assistência médica na sociedade capitalista

restabelece a desigualdade social dos corpos através da medicina de classes, uma vez que os

resultados ilustram

uma (sutil ou explícita) interferência do obstetra sobre a escolha das

mulheres, influenciando o desfecho em cesariana e sugerindo que, para

muitas mulheres, não está sendo possível escapar das “armadilhas” de um

modelo biomédico mercantilizado, interventor e iatrogênico,

institucionalizado e legitimado pela sociedade.17

Essa vulnerabilidade, que pressupõe a existência de relações desiguais entre indivíduos ou

grupos18 e envolve o nascimento e o parto, é percebida na medicalização do processo

14 Ana MARTINS, 2004.

15 Wilza PEREIRA, 2004.

16 Junia CARDOSO e Regina BARBOSA, 2012.

17 CARDOSO e BARBOSA, 2012, p. 35.

18 Inês MORAIS, 2010.

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parturitivo, que nega a capacidade da mulher de parir com segurança sem o seu auxílio e

define para ela um papel cada vez mais passivo no nascimento do bebê.19

Thelma Sodré e Rúbia Lacerda20 acentuam que os médicos percebem o parto como um

sistema potencialmente doentio que necessita de intervenções não individualizadas para

estabelecer o domínio sobre a mulher. Soma-se a isso “a inserção social desprivilegiada

das(os) usuárias(os) dos serviços públicos de saúde que são obrigadas(os) a submeter-se ao

que lhes é oferecido”.21 Muitas vezes, grandes investimentos hospitalares em tecnologias

caras estão diretamente ligados à estabilidade econômica das instituições.22. “Neste sentido,

os hospitais podem ver nas cesarianas e noutras técnicas cirúrgicas um modo de extrair a

capacidade instalada, quer de recursos técnicos, quer de profissionais especializados”.23

O “poder” do médico

A perda do poder da mulher em relação à gestação e ao parto surge do encontro de duas

forças dominadoras: a dominação masculina e a “apropriação do parto pelo projeto científico

denominado obstetrícia”.24 O médico exerce influência sobre a mulher e sua decisão sobre a

via de parto porque a autoridade médica exibe uma poderosa onipresença, baseada na

legitimidade que lhe confere seu saber e na dependência de quem ele atende.

19 Suely DESLANDES, 2006.

20 Thelma SODRÉ e Rúbia LACERDA, 2007.

21 Mariza ALMEIDA e Isília SILVA, 2008, p. 349 e 350.

22 Fitzhugh MULLAN, 2004.

23 Raul FERNANDES, 2012, p. 85.

24 Maria Luciana BOTI, 2013, p. 650.

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Mônica Maia25 enfatiza que o “discurso científico adota uma prática de assistência normativa e

domesticadora de corpos percebidos como instáveis e defeituosos” para justificar a desigualdade

de gênero e destaca a imagem do médico com talento tecnológico impregnado de boas intenções

dentro do modelo medicalizado e a imagem da mulher objeto, indefesa, presa a um corpo

fisiopatológico. Isso contribui para o declínio da capacidade da mulher em lidar com o fenômeno

do parto, sua imprevisibilidade e as dores do trabalho de parto.26

Em verdade, as mulheres, de modo geral, ocupam, quase sempre, em nossa

sociedade, uma posição de subalternidade, resultante das relações de gênero

que se estendem às relações com os profissionais de saúde, marcadas, elas

próprias, por situações desiguais, nas quais a supremacia do saber científico

adjudica a quem o exerce o lugar de dominante ou opressor.27

A mulher que recorre à instituição pública de saúde já espera que ao ser internada passe a ser

um caso, recebendo um número de registro para sua identificação, deixando de ser sujeito,

tornando-se, então, mais uma na hora de parir.28 Essa é uma área sobre a qual a mulher passa

a não ter mais controle e mostra uma das faces da dominação que se exerce a partir da

transformação do sujeito em objeto, com o agravante de que a medicina exerce a sua prática,

ora de forma exagerada, intervindo demais, ora de maneira negligente, simplesmente não

agindo.29

A desinformação e o tecnicismo que envolvem o processo de hospitalização do parto

favorecem um comportamento passivo da mulher, a partir da leitura do sistema simbólico da

sociedade de que essa etapa do processo da parturição deve ter um comando técnico,

25 Mônica MAIA, 2008, p. 68.

26 Míriam LEÃO et al., 2013.

27 ALMEIDA e SILVA, 2008, p. 350.

28 Maria Gorette BEZERRA e Maria Vera CARDOSO, 2005.

29 PEREIRA, 2004.

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colaborando assim para delegar ao médico a decisão sobre o alívio ou não da dor no trabalho

de parto a partir de regras e preceitos.30 A demanda por “determinadas tecnologias médicas

nos períodos de gestação, parto e puerpério é construída pelos médicos que as utilizam para

manter o poder simbólico e também para recriar a própria mítica, de serem os únicos a dar

conta de todos os aspectos da vida e do adoecer”.31

Para Maria Luciana Boti32, a prática do poder do profissional de saúde, notadamente do

médico, é consequência da visão da patologização do parto e da utilização do conhecimento

que ele tem sobre o corpo como instrumento para elevação de seu status. Isso está diretamente

associado ao fato de que, no ambiente de pré-parto, a exposição e a intrusão alheia no corpo

são considerados normais e aceitáveis, sendo a mulher vista apenas sob o enfoque biológico.33

Nesse processo, embora a mulher tente buscar sua autonomia, acaba assumindo uma postura

de passividade quando deixa que o médico tome decisões por ela. “Seu protagonismo,

portanto, carece de autonomia, uma vez que ela segue o script ditado pelo modelo biomédico

e cultuado pela mídia e pela sociedade”.34

Análise e discussão dos resultados

Na pesquisa com mulheres submetidas à cesariana (identificadas pela letra P seguida de um

numeral), o uso constante de tecnologia, a indução do trabalho de parto, complicações

puerperais e desconfortos pós-cesariana, a submissão à autoridade do saber médico e a

30 PEREIRA, 2010.

31 PEREIRA, 2004, p. 399.

32 BOTI, 2013.

33 Karla MOREIRA et al., 2006.

34 PEREIRA, 2010, p. 147.

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necessidade de apoio durante o processo se destacaram como temas que emergiram na análise

de conteúdo das entrevistas.

Uso constante de tecnologia

A tendência à medicalização no parto é reforçada pelo uso indiscriminado de tecnologias

biomédicas.35 Isso foi confirmado nos relatos das mulheres entrevistadas: “É! Eu fiz ultrassom

com sete semanas, com quatorze, com vinte, trinta e cinco [...] eu tinha um ultrassom mesmo

que eles fizeram com trinta e sete” (P2); “[O médico] agendou o ultrassom para terça-feira

que vem, para outra terça, no caso, foi o dia que ela nasceu, para as sete horas da manhã”

(P1); “Fiz o exame do coração, deu alterado. O médico veio e me perguntou se eu queria parto

normal ou cesárea, aí explicou o risco que teria no parto normal de ele não aguentá [...] estava

muito acelerado o coração dele” (P3).

Esses depoimentos confirmaram a informação de que o monitoramento eletrônico fetal e o

ultrassom são apontados como importantes recursos tecnológicos usados na assistência

materno-infantil. 36 Também indicaram a exposição frequente do bebê na vida intrauterina por

ultrassom, como já observado por Michel Odent37 em estudo que revelou excessiva

solicitação de exames de imagem no pré-natal.

Ressalta-se o caso específico de P2, que fez várias ultrassonografias em espaços de tempo

bem próximos – procedimento que se tornou símbolo do cuidado pré-natal de rotina,

constituindo exemplo do uso inapropriado de tecnologias na assistência ao parto.38 Vale

35 Fernanda CABRAL, Leila HIRT e Isabel VAN DER SAND, 2013.

36 Lígia RUGOLO et al., 2004.

37 Michel ODENT, 2003.

38 ODENT, 2004.

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lembrar que a cultura de uso abusivo de tecnologias médicas no parto é apontada como

responsável por grande parte das cesarianas.39

Quanto ao monitoramente cardíaco fetal, no caso de P3, salienta-se que, de acordo Odent40 e

com Alex Souza e Melania Amorim41, estudos sugerem não haver melhores resultados do

método em relação à auscultação fetal intermitente em termos de melhora do prognóstico

neonatal e que o aumento do número de cesarianas foi o único efeito significativo em termos

estatísticos.

Indução do trabalho de parto

Ficou evidenciado, ao longo da pesquisa, o descaso com a condução do processo fisiológico e

o desrespeito para com as necessidades e escolhas da parturiente ao elevar-se o limiar de dor

com intervenções realizadas rotineiramente, como o uso da ocitocina sintética, que

transformaram um evento normal fisiológico em patológico. Foi um cuidado conduzido com

práticas dolorosas, causando marcas psicológicas nas mulheres, a exemplo de P5 e P11, que

relataram ter sentido fortes dores: “Daí tentaram induzir meu parto e começou a ter a

contração, aquela dor, entrei com um dedo; foi pro quarto dedo, aí era duas e meia da tarde, a

médica mandou eu tomar um banho pra ver se dilatava mais e não dilatou” (P5); “Foram

induzir o parto, botar no soro; a dor veio bem forte, daí me deram uma anestesia” (P11).

O mesmo procedimento foi aplicado à P7, que vivenciou uma situação na qual a qualidade do

cuidado foi limitada pela escassa atenção às evidências científicas sobre a segurança na

assistência:

39 Eleonora D’ORSI et al., 2005.

40 ODENT, 2003.

41 Alex SOUZA e Melania AMORIM, 2008.

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Aí as enfermeiras colocaram aquela soro na veia pra aumentar a dor, lá, né?

Aí eu fiquei lá, a tarde inteira em jejum, com aquele negócio na veia pra

tentar induzir o parto. Aí, era umas quatro horas da tarde, eu acho, quando

fizeram o exame de toque de novo, eu estava com quatro dedos de dilatação,

ou seja, nada de dilatação e o remédio na veia, e fiquei, fiquei o dia inteiro,

aí era umas nove e trinta; dez horas da noite ela [a enfermeira] mandou

caminhar, e o soro na veia direto (P7).

Apesar de o protocolo da OMS42 dizer claramente que não é recomendável indução antes de

41 semanas, P4 e P8 foram submetidas a esse procedimento:

Estourou minha bolsa, às seis e meia da manhã, não tinha dor, não tinha

nada. Aí, fui pra maternidade, cheguei lá, fizeram o exame de toque e só

tinha um dedo de dilatação. Aí, fui pro soro, colocaram um comprimido que

era pra dilatar, aí me deram um soro que era pra dar dor, mas aí não senti

nada, nem uma dor nem nada, ainda bem [...] Me deram um monte de soro,

perdi as contas e eu não tinha dor, não tinha dor, dilatação nada, então acho

que não que era pra ser mesmo [...] quando ganhei eles colocaram que eu

estava de 38 semanas (P4).

[...] já tava com umas contrações de cinco em cinco minutos [...] no começo

da tarde foi induzido o parto, foi colocado aquele comprimido, só aquele

comprimido [...] me mandaram pro quarto [...] mais um comprimido mas as

contrações não aumentaram [...] onze da noite foi, aí as contrações tavam

pior [...] Na carteirinha e nos papéis que vieram do hospital estava com 39

semanas (P8).

Acentua-se que a adoção de práticas para a indução do trabalho de parto pode ser bastante

prejudicial, mas é procedimento comum entre profissionais de saúde que desconsideram as

recomendações da OMS. Isso inclui o rompimento de membranas com o objetivo de acelerar

42 WHO, 2011.

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as contrações uterinas e reduzir a duração do período de dilatação43-44, como aconteceu com

P7: “A médica disse assim: ‘conforme for, mãe, a gente vai romper a bolsa, pra ajudar na

dilatação’”, e P8: “Foi fazer o exame de toque, só terminou de estourar a bolsa”.

Chama a atenção o fato de P6 ter expressado na entrevista que a conduta adotada não

alcançou o resultado esperado e mesmo assim ela ficou satisfeita porque não queria sofrer:

[...] só que ela [médica] mandou eu fazer um ultrassom, e uma medicação e

nesta medicação começou bastante dor, as contrações não pararam [...] daí

ela me chamou de novo [...] fez um exame de toque, viu que não tinha

aumentado nada minha dilatação só com um dedo, daí fui já pra sala de pré-

parto [...] Daí o médico [outro] me examinou e viu que eu não ia poder ter

um parto normal (P6).

A partir dos relatos das mulheres entrevistadas, pode-se afirmar que a indução do trabalho de

parto realizada nos casos estudados contribuiu para os crescentes índices de cesarianas e que

intervenções como aceleração com ocitócitos, prostaglandinas e rotura de membranas

amnióticas continuam sendo utilizadas rotineiramente no hospital, muitas vezes sem

evidências científicas.45-46

Complicações puerperais e desconfortos pós-cesariana

Durante as primeiras horas e nos primeiros dias do pós-parto, a maioria das mulheres

experimentou dores e desconfortos, a exemplo do que foi informado por P1:

43 Alex SOUZA et al., 2010.

44 Sheila LOBO et al., 2010.

45 Nádia NARCHI, 2009.

46 Jaqueline SANTOS e Antonieta SHIMO, 2008.

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[...] e teve aquele sofrimento, que eu não tive aquele sofrimento antes, mas

eu tive pós, na recuperação, né, eu tive um sangramento [...] foi bem intenso

[...] daí colocaram um tipo de um cimento em cima da minha barriga para

controlar [...] eu fiquei bem fraca, debilitada, né, mas as horas que eu fiquei

na recuperação eu via mulheres chegando, saindo, e eu ainda ali [...] aquela

troca de lençóis toda hora, umas quatro ou cinco vezes trocaram meu lençol,

vinha vários médicos me ver, como estava meu sangramento [...] não lembro

muitas coisas, em alguns momentos eu tava, praticamente estava apagada

[...] depois que eu fui para o quarto umas duas horas da manhã eu desmaiei

[...] quando acordei tava umas três enfermeiras no meu lado assim [...] nos

primeiros dois dias mesmo que eu fiquei bem debilitada (P1).

P1 descreveu um quadro aflitivo, agravado por hemorragia pós-parto com a troca frequente de

absorventes, a presença constante de profissionais na supervisão do estado geral, a

obnubilação referida nos sinais de diminuição da volemia com a diminuição da oxigenação

em áreas vitais e medidas de assistência para conter o avanço do problema. Esses aspectos

são muito preocupantes, principalmente no que se refere à hemorragia pós-parto, responsável

por alta taxa de mortalidade materna que pode ocorrer por falta de condição hospitalar

adequada, de observação médica e de cuidados de enfermagem mínimos.47

Em relação à importância dos meios de prevenção de infecção, como a higiene e o conforto,

com trocas frequentes de roupas e manutenção do leito limpo, arrumado e confortável, neste

estudo, a narrativa das mulheres mostrou a necessidade de eficiência nesse serviço. Esse dado

se assemelha ao encontrado por Dafne Rodrigues et al.48, que publicaram depoimentos de

puérperas que se referiram ao atendimento de enfermagem dispensado durante o pós-parto,

apontando a necessidade de cuidados mais técnicos nas situações de emergência, suprindo as

47 BRASIL, 2000.

48 Dafne RODRIGUES et al., 2007.

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necessidades biológicas com presteza, competência técnica e disponibilidade para ajudar.

Portanto, são essenciais cuidados de enfermagem qualificados que tenham como base a

prevenção de complicações e ações que amenizem os desconfortos físicos, como os causados

pela ferida operatória da intervenção por cesárea, e emocionais das mulheres49, como os

apresentados por P2:

[...] eu ali com aqueles pontos [...] nem roupa eu podia botar, de tanta dor

[...] a recuperação que para mim foi horrível [...] não vinha a urina, mexe

com todo o psicológico [...] aqueles gases presos, a barriga inchada, aquela

dor e não passava; [em casa] infeccionou um ponto, começou a sangrar, aí

ele ficou dolorido (P2).

A puérpera se viu envolvida por uma série de transtornos físicos e psicológicos característicos

do período pós-cesárea, como dor na ferida operatória e dificuldade de mobilização – aspectos

também relatados no estudo de Márcia Strapasson e Maria Noêmia Nedel.50 Nesses casos, é

imprescindível o acompanhamento da enfermagem no que se refere ao apoio e à atenção às

necessidades das mulheres na área da reorganização psíquica, familiar e social.51

A situação vivenciada por P3 incluiu dificuldades nos movimentos, desconforto e dor devido

à cicatriz cirúrgica, além de fraqueza e cansaço, de várias limitações para lidar com o bebê e

com o cotidiano de suas necessidades de atenção nos aspectos físicos:

[No quarto] o ruim é que tu não poder fazer nada, não pode colocar a roupa,

não pode se mexer [...] reclamei bastante porque doía muito, dói bastante [...]

depois que eu fiz a cesárea, doía muito, me sentia muito mal, muito fraca [...]

queria levantar da cama, queria fazer as coisas e não dava muito bem, pegar

no colo essas coisas, não dava para fazer né? (P3).

49 ALMEIDA e SILVA, 2008.

50 Márcia STRAPASSON e Maria Noêmia NEDEL, 2010.

51 SOUZA e AMORIM, 2008.

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Luísa Kalinowski et al.52 identificaram, entre os aspectos negativos do puerpério, os

sentimentos dolorosos e desconfortáveis da ferida operatória da intervenção por cesárea, o que

foi confirmado na experiência de P7:

Mas assim, foi bem ruim a cesárea, doeu, incomodou [...] a recuperação, foi

mais ruim [...] anestesia demora passar, depois dá uma coceira no corpo

insuportável por causa da anestesia, eu não sabia se eles costuraram certo, se

não costuraram, se a bexiga estava no lugar, porque daí eu sentia dor pra

urinar eu não sabia se tinham mexido na bexiga também, é bem complicado

assim [...] quando a enfermeira veio e já mandou sentar, aí fiquei ruim [...] aí

na terça-feira de manhã desmaiei [...] mandou [enfermagem] tirar a proteção

dos pontos e acho que foi isto também que, porque eu fiquei muito tempo

com a cabeça baixo do banho aí desmaiei [...] eu tava sentindo muita dor na

cirurgia (P7).

Nervosismo e ansiedade estiveram presentes na maioria das narrativas relativas a essa fase de

transição, quando se impuseram novas responsabilidades. Os sinais de dor no período de

recuperação, as dificuldades decorrentes da anestesia, a dificuldade de retorno aos

movimentos normais, o questionamento e as incertezas acerca da incisão cirúrgica, a

enfermagem que mandou retirar o curativo da ferida operatória quando a mulher ainda se

sentia desconfortável foram transtornos experenciados pelas puérperas, como é o caso de P7 e

também de P9:

Aí, com muito custo, com muita dor, conseguiram. [...] Meu Deus! Que

coisa horrível! [...] e eu aí, naquela dificuldade toda de me locomover e, nem

pegar o neném conseguia, me virar e pegar ele do outro lado da cama [...] eu

mesma tirei o curativo, né, até então eu achei que as enfermeiras iam me

ajudar; [em casa] as minhas pernas começaram a inchar, estava bem inchada

52 Luísa KALINOWSKI et al., 2012.

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e começou a amortecer também minhas pernas, à noite eu fiquei em pânico

[...] está um pouco vermelho os pontos [...] ainda dói se eu me movimento

durante o dia, à noite dói bastante (P9).

As narrativas das mulheres entrevistadas coincidem com as observações de Strapasson e

Nedel53, que afirmam que, nesse período, elas se encontram inseguras e totalmente

dependentes, com dor na ferida operatória e dificuldade de mobilização. Em grande parte dos

relatos das participantes desta pesquisa foram mencionadas sensações de desconforto físico

inerente à intervenção – “não tem como explicar a dor da anestesia, mas é uma coisa bem

desconfortável” (P4) –, incertezas e temores, debilidade física e dificuldades para realizar os

cuidados de si e responder às necessidades do bebê.

P7 e P9 ressaltaram a necessidade de mais apoio por parte dos profissionais, especialmente no

que diz respeito à remoção de curativo da ferida operatória, pois apresentaram dificuldades e

grande desconforto justamente pela falta de assistência e orientação. O suporte oferecido pela

equipe de saúde é essencial, uma vez que a puérpera precisa de alguém que esclareça dúvidas

e lhe transmita autoconfiança, o que é indispensável ao desempenho materno.54

A submissão à institucionalização gera insegurança nas mulheres, que não se veem em

condições de fazer constantes solicitações de conforto, tanto por se sentirem dependentes

daquele serviço como por estarem vivenciando um momento em que se sentem temerosas e

fragilizadas emocionalmente.55 Além disso, o modelo de atendimento biomédico de

enfermagem “fragmenta seres humanos e dirige ao corpo biológico ações técnicas ao lado de

relações autoritárias”.56

53 STRAPASSON e NEDEL, 2010.

54 Juliana OLIVEIRA, Gualberto QUIRINO e Dafne RODRIGUES, 2012.

55 ALMEIDA e SILVA, 2008.

56 ALMEIDA e SILVA, 2008, p. 349.

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Apesar da crescente preocupação com a humanização dos cuidados à saúde da mulher, é

visível a pouca valorização dada às demandas que surgem da vivência da mulher no período

puerperal, com ênfase às relativas à subjetividade feminina, que se modificam com a chegada

do bebê, segundo o contexto sociocultural e emocional em que se inserem a gravidez, o parto

e o pós-parto.57

Almeida e Silva58 acentuam a importância da atenção humanizada no período gravídico-

puerperal com procedimentos que variam com as especificidades de cada mulher e incluem

prevenção, avaliação e tratamento da dor. Afirmam que é preciso “investir no

acompanhamento pós-parto, pois, além de possibilitar conforto e segurança às mulheres,

permitem identificar e debelar precocemente as complicações comuns no puerpério”.59

Submissão à autoridade do saber médico

Alimenta-se no Brasil um modelo de atenção ao parto no qual a gestante é tratada como

paciente e o médico exerce influência sobre a mulher e sua decisão sobre a via de parto com a

autoridade conferida a ele pelo seu conhecimento científico. Esse saber costuma justificar a

utilização abusiva de intervenções obstétricas.60 É nesse contexto que a “‘boa paciente’ é

sempre vista como aquela que obedece sem questionar”61, como no caso de P1:

[...] eu já estava meio que esperando, porque ela [médica] já tinha falado

para mim: “vou conversar com o doutor”. Então, eu tava assim, que seja o

que Deus quiser! O que for melhor, eles vão saber, porque eles são médicos.

57 BRASIL, 2001.

58 ALMEIDA e SILVA, 2008.

59 ALMEIDA e SILVA, 2008, p. 351.

60 Rosa Maria DOMINGUES, Elizabeth SANTOS e Maria do Carmo LEAL, 2004.

61 Janaína AGUIAR, 2010, p. 123.

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Aí, quando ela falou vai fazer cesárea, então tá bom! Esta ótimo! Não fiquei

tensa nem preocupada (P1).

A avaliação positiva de P1 sobre o desfecho do nascimento chama a atenção pela serenidade

com que ela aceitou a decisão médica em relação ao seu primeiro parto, demonstrando

confiança no profissional que a assistia sem duvidar nem questionar o procedimento cirúrgico.

O mesmo aconteceu com P6, que já havia tido uma cesariana, recebeu indutor, mas não

questionou o procedimento pela falta de conhecimento sobre as possíveis implicações:

Contei o histórico do meu primeiro filho, que o médico me examinou e viu

que eu não ia poder ter um parto normal, porque eu tinha feito uma

cauterização há uns anos atrás [...] até aquele momento achei que ia

conseguir parto normal, que eles iam induzir [...] me senti assim bem [...] a

bolsa estourou às sete da manhã [...] a cesárea foi às onze (P6).

Ao contrário dessas duas mulheres, P7 relatou uma experiência que, para ela, foi traumática,

começando pela indicação médica de internação: “Na maternidade o médico fez o

cardiotoque; já era umas duas horas da tarde; ele disse: ‘Ó! Aqui deu uma baixada no

batimento do neném’ [...] perguntou: ‘Você está com quarenta semanas? [...] Vou te internar!’

Cheguei lá com dois dedos de dilatação”.

Chorando no momento da entrevista, P7 demonstrou insatisfação com o encaminhamento do

processo parturitivo determinado pelo médico:

Foi erro deles tentarem induzir, sem necessidade, e foi assim muito bem

difícil pra mim, pro meu marido porque ele tava ali junto e acompanhou

tudo. Chegou outro médico e ele [marido] olhou pra mim e disse: “Ó! Não

vamos ter outro filho né?” [...] dei entrada às sete horas e dez horas da noite

já fizeram minha cesárea.

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Os relatos confirmam que a desinformação e o tecnicismo que envolvem o processo de

hospitalização do parto favorecem um comportamento passivo da mulher62 e essa situação

contribui para o declínio da capacidade da mulher em lidar com a imprevisibilidade do

fenômeno do parto.63

Outro ponto a destacar é a conduta de admissão da gestante na fase latente, apontada como

um complicador no atendimento às mulheres, porque implica um tempo mais ou menos longo

de permanência no ambiente do pré-parto até a fase ativa e eleva os riscos para intervenções

para correção de distócias, como o uso de ocitocina, rotura precoce de membranas e analgesia

de parto com grande tendência de evoluir para cesariana.

Isso se confirmou nas experiências narradas pelas participantes da pesquisa: “Estourou minha

bolsa, às seis e meia da manhã, não tinha dor, não tinha nada, então acho que não que era pra

ser mesmo [...] quando ganhei ele, colocaram que eu estava de 38 semanas” (P4); “O médico

perguntou: ‘Você está com quarenta semanas? [...] Vou te internar!’. Cheguei lá com dois

dedos de dilatação” (P7); “Daí internaram né, por causa do líquido [...] foram induzir o parto,

botar no soro; a dor veio bem forte, daí me deram uma anestesia” (P11).

Cheguei nas 40 semanas, fui lá na maternidade [...] depois de três dias voltei

lá e fiz os exames de volta; estava tudo bem [...] fui dois dias após [...] eu

completei quarenta e uma semanas, eu fiquei internada; já tava com umas

contrações de cinco em cinco minutos [...] no começo da tarde foi induzido o

parto, foi colocado aquele comprimido, só aquele comprimido [...] me

mandaram pro quarto [...] mais um comprimido mas as contrações não

aumentaram [...] onze da noite foi, aí as contrações tavam pior [...] Na

carteirinha e nos papéis que vieram do hospital estava com 39 semanas (P8).

62 PEREIRA, 2010.

63 LEÃO et al., 2013.

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Os resultados dessas intervenções não foram favoráveis. No caso de P7, o feto entrou em

sofrimento fetal pelo uso excessivo de indutores e, no de P4, não foi desencadeado o trabalho

de parto, o que confirma que um grande problema na prática hospitalar é a internação precoce

antes do início do trabalho de parto da gestante, porque pode levar à estafa materna, trazendo

riscos para a mãe e o bebê, pois resulta em intervenções desnecessárias e potencialmente

danosas, como a infusão endovenosa de ocitocina.64

Necessidade de apoio durante o processo

A gestação e o parto constituem uma das experiências humanas mais significativas e

impactantes na vida da mulher, mas a falta de humanização na assistência à parturiente pode

resultar em uma experiência traumática, como revela a fala de P11:

A dor veio bem forte, daí me deram uma anestesia [...] sentia dor só de um

lado; tava com oito dedos de dilatação. No pré-parto eu fiz os exames ali de

toque, de tudo. No começo me jogaram, me colocaram na sala e depois [...]

eu tava com três dedos quando eu entrei e só foram me examinar depois

quando eu estava com oito dedos; fiquei meio de lado (P11).

A evolução do trabalho de parto foi positiva, segundo percepção da puérpera, mas ela se

sentiu abandonada, sem amparo e conforto. Ela relatou sua aflição e seu ressentimento por

não ter recebido o que ela qualificou como “bom atendimento” da equipe de profissionais de

saúde, que iniciou uma série de intervenções com as quais se buscou fazer correções do

processo por meio da medicalização.65

64 Flora Maria SILVA et al., 2008.

65 Nádia NARCHI, Elizabete CRUZ e Roselane GONÇALVES, 2013.

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No caso de P11, faltou uma assistência voltada para o cuidar, com atitudes de atenção e

carinho que contribuíssem para o que Karla Moreira66 considera uma experiência de parto

positiva, segura e eficaz. Observou-se que não existiu um relacionamento terapêutico

favorável, com produção de vínculo e identificação de necessidades de cuidado para além de

um simples atendimento – aspecto destacado em estudos de Cabral, Hirt e Van der Sand.67

Outra situação que demonstra esse problema no atendimento foi vivida por P3:

Ele tinha passado o prazo para nascer, estava sendo acompanhado [...] na

maternidade tava muito acelerado o coração dele [...] mandaram ir para casa

[...] voltei no domingo [...] fiz o ultrassom e estava normal [...] voltei na

segunda-feira e estava bem acelerado, daí os médicos ficaram bem

preocupados e já me encaminharam para a cesárea (P3).

A entrevistada foi informada sobre alterações com o feto na primeira avaliação, mas, somente

na terceira vez que retornou à maternidade, o problema se tornou preocupante. Aconteceu

com P3 o que Aníbal Faúndes e José Guilherme Cecatti68 apontam como ineficiente preparo

no cuidado ao parto frente à incerteza de trauma fetal que contribui para o aumento da

frequência de cesariana.

Ficou evidente a fragilidade no discurso emocional das mulheres, que falaram sobre seus

temores e expectativas à medida que se aproximava o momento da parturição, a exemplo de

P9: “[...] eu já com as dores forte, já meio apavorada”, de P4: “Eu tinha um receio do SUS!

No começo queria parto normal, aí, depois, comecei a me assustar com aquelas mulheres

berrando e berrando, aí fiquei com medo e falei não quero mais, quero cesárea”, e de P5:

Não sei nem como explicar, porque eu poderia ter tido o parto normal, e só

fizeram o parto cesárea porque eu tava com muita contração, muita dor e

66 Karla MOREIRA, 2008.

67 CABRAL, HIRT e VAN DER SAND, 2013.

68 Aníbal FAÚNDES e José Guilherme CECATTI, 1991.

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muito tempo ali [...] chegava mãe e ia mãe e eu ali, e eu ficava ali, com o

soro induzindo, mais eu ficava ali, eu achei supernegligência deles, eles

poderiam ter uma salinha pra deixar em observação a mãe (P5).

Constatou-se, nesses relatos, que não foram seguidas as recomendações da OMS e do

Ministério da Saúde quanto à adequação, tanto na estrutura dos serviços quanto nas relações

entre trabalhadores e usuárias, para prestar uma assistência humanizada, preconizada pelos

dois órgãos.

O que se verificou, a partir da verbalização das mulheres acerca de sua insatisfação com a

impessoalidade dos cuidados recebidos, foi que se manteve a tradição de uma assistência

biológica, marcada pela insensibilidade em relação à necessidade de acolhimento e pela não

preocupação dos médicos e da equipe de enfermagem em prestar informações sobre o

sofrimento comum ao trabalho de parto. Importa acentuar que, como no caso específico de

P4, a ansiedade pode levar a mulher a solicitar a cesariana.

Os relatos das mulheres indicaram que não houve, para a maioria delas, o suporte de

profissional de saúde, tampouco a adesão da equipe de enfermagem para dar segurança às

parturientes.69-70 Em síntese, elas não usufruíram dos benefícios de um atendimento

humanizado. Ao contrário, não houve envolvimento dos profissionais no cuidado com as

pacientes, mostrando o que Leila Wolff e Vera Waldow71 consideram desatenção em relação

a elas.

A única exceção nesse contexto de assistência foi o de P7. Ela notou que a enfermeira que a

atendeu se mostrou sensibilizada com sua aflição: “[...] dez horas da noite, a enfermeira disse:

69 RUGOLO et al., 2004.

70 Odaléa BRÜGGEMANN, Mary Ângela PARPINELLI e Maria José OSIS, 2005.

71 Leila WOLFF e Vera WALDOW, 2008.

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‘vou tirar isto da tua veia [ocitocina] porque isto não tá fazendo bem pro bebê! E a mãe deita,

descansa um pouquinho; vamos ver como vai ficar’”.

Confirmando o que constataram Luciano Santos et al.72 em seu estudo sobre o relacionamento

entre profissionais de saúde e parturientes, ao perceber a atenção da enfermeira às suas

expressões de dor e medo e a compreensão da profissional ao momento que vivenciava, P3 se

sentiu mais tranquila, conforme seu próprio relato.

Mas quando o profissional de saúde se mostra indiferente e insensível em relação à

parturiente, configura-se o não-cuidado, levando-a a sentir-se desvalorizada como pessoa.73

Por isso é fundamental que a mulher esteja inserida num contexto em que se sinta cuidada,

com oferta de afeto, atenção e carinho, o que irá favorecer a segurança, o bem-estar e o alívio

das sensações dolorosas do trabalho de parto e parto.74

O apoio contínuo intraparto é uma ferramenta preciosa que está ao alcance da equipe de

profissionais que assistem a parturiente; em especial, é um recurso da enfermagem que,

quando empregado, minimiza vários aspectos que são danosos à mulher nesse período que

exige mais empenho. Esse esteio é um recurso não medicamentoso para controle da dor do

parto e é capaz de reduzir em cerca de 17% a necessidade de qualquer tipo de analgesia e em

28% a necessidade de cesariana.75

Quanto à prática de enfermagem, os relatos apontaram que ela esteve fortemente centralizada

na esfera biológica da mulher, numa conduta que mostrou estarem os profissionais dessa área

72 Luciano SANTOS et al., 2013.

73 WOLFF e WALDOW, 2008.

74 Andressa OLIVEIRA et al., 2010.

75 Ellen HODNETT et al., 2011.

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preocupados mais com a eficiência dos procedimentos médico-hospitalares do que envolver-

se com o ser humano para o qual se estava desenvolvendo a ação.76

Foi revelada, em grande parte dos relatos das participantes da pesquisa, a insatisfação com um

modelo de atendimento impessoal que as desrespeitou como sujeitos ativos, deixando

flagrante a desigualdade intragêneros entre as mulheres internadas na unidade de alojamento

conjunto e as profissionais de enfermagem, indicando que o modo de pensar e agir das

profissionais que atuam junto às usuárias do serviço de saúde está impregnado pelo

referencial de saber e poder masculino e médico que se mantém hegemônico e orienta as

relações no interior das instituições de saúde.77 O que se observou foi “um modelo assistencial

marcado pelo peso da herança higienista nas rotinas hospitalares e nas práticas profissionais,

centrado no profissional médico como condutor do processo”.78

Considerações finais

As falas das mulheres participantes desta pesquisa indicaram que, em grande medida, a

assistência ao parto por elas recebida não esteve descolada do modelo de saúde hegemônico

do país, caracterizado pelo uso excessivo de tecnologia e por pouca humanização. Um

momento que deveria ser natural para a maioria das mulheres, considerando que, com raras

exceções, a gravidez e o parto são processos naturais que acontecem sem necessidade da

intervenção de outros, pois a natureza os resolve sem artifícios79, transforma-se muitas vezes

em uma experiência traumática porque “todas as sociedades humanas conhecidas perturbam,

76 Viviane MILBRATH et al., 2010.

77 ALMEIDA e SILVA, 2008.

78 Elizabeth NAGAHAMA e Sílvia SANTIAGO, 2008, p. 1866.

79 Maurício BESIO, 1999.

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mais ou menos, o processo fisiológico”.80 Isso se confirma pelo modelo de cuidado

intervencionista, principalmente na maternidade, onde o sistema reprodutor feminino é tratado

como produto, como mero objeto de assistência.

Os resultados obtidos neste estudo apontam que intervenções desnecessárias no corpo da

mulher, como a aceleração de parto com ocitócitos, continuam ocorrendo e transformam o

parto em uma experiência de sofrimento. No atendimento às mulheres que realizaram

cesariana, prevaleceu o modelo tecnocrático, no qual o profissional de saúde, notadamente o

médico, é o ator principal. A assistência foi, com raras exceções, mecanicista e impessoal.

Observou-se o que já foi constatado por Bianca Zorzan81: que, “se o acesso às informações

para as negociações sobre o tipo de parto foi restrito, o referente às intervenções na assistência

quase desapareceu [...] silenciando o diálogo para o exercício da escolha informada na

dinâmica das negociações”.

As intervenções cirúrgicas seguiram uma lógica de difícil contestação pelas mulheres em

virtude da falta de argumentos capazes de questionar a autoridade médica. De certa maneira,

elas demonstraram estar sob forte influência de uma “cultura da alta valorização da tecnologia

e da submissão feminina diante do conhecimento médico-científico que as entendeu

infantilizadas, por vezes, diante de suas vivências reprodutivas e ‘instáveis’ no corpo e na

experiência com seus partos”.82

Quanto ao uso excessivo de tecnologia, interessa destacar que, “se as necessidades de uma

mulher em trabalho de parto tivessem sido reconhecidas há meio século, a história do parto

teria, indutivamente, tomado outra direção”83, ou seja, o parto não teria entrado na era

80 ODENT, 2002, p. 135.

81 Bianca ZORZAN, 2013.

82 ZORZAN, 2013, p. 198.

83 ODENT, 2005, p. 41.

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eletrônica, na qual o processo de nascimento é gradativamente dominado por tecnologias e

intervenções e mais bebês necessitam ser salvos pela cesariana.

Este estudo confirmou o suposto de Karla Moreira84 de que o desafio na atual tendência no

processo de nascimento consiste no entendimento do que realmente as mulheres sentem e a

mudança da atitude dos profissionais de saúde, centrada no tecnicismo, sem escutar a

protagonista à sua frente com necessidades diferenciadas de cuidado. Também evidenciou a

necessidade de se rever a assistência prestada à mulher durante o processo de parturição,

sendo que “as ações devem centrar-se nas necessidades do ser mulher gestante e não em um

objeto em que será realizado um procedimento”.85

Essa postura implica democratização das relações entre profissionais e pacientes, o

compartilhamento de saberes, o reconhecimento, respeito e valorização da multiplicidade, da

diversidade e das singularidades. Esses elementos constroem um caminho possível para ações

de encorajamento para o exercício da autonomia e do empoderamento da mulher no sentido

de exercer seu protagonismo e sua capacidade de tomar decisões em relação ao parto e ao seu

próprio corpo.

Enfatiza-se a importância de se olhar, de se aproximar, de falar com e ouvir mulheres que,

mais do que simplesmente “mulheres de carne e osso”86, são seres dotados de sentimentos e

desejos que não podem ser ignorados pelo saber médico-científico, mulheres com

experiências e vivências que precisam ser consideradas para que haja transformação da

realidade de atendimento ao parto vivida pelas mulheres participantes deste estudo.

Referências

84 MOREIRA, 2008.

85 Viviane MILBRATH et al., 2010, p. 467.

86 Rosi BRAIDOTTI, 2000.

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ANEXOS

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ANEXO A – Parecer Consubstanciado do Comitê de Ética da Univali

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ANEXO B – Termo de Anuência para Coleta de Dados de Pesquisa

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ANEXO C - Declaração de Exequibilidade de Projeto de Pesquisa