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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO PROTOCOLO DE KYOTO E MERCADO DE CARBONO GYANNI AMÁLIE MARTINS DE OLIVEIRA SANTOS MARTINELLI Itajaí (SC), junho de 2008.

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO

PROTOCOLO DE KYOTO E MERCADO DE CARBONO

GYANNI AMÁLIE MARTINS DE OLIVEIRA SANTOS MARTINELLI

Itajaí (SC), junho de 2008.

UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO

PROTOCOLO DE KYOTO E MERCADO DE CARBONO

GYANNI AMÁLIE MARTINS DE OLIVEIRA SANTOS MARTINELLI

Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como

requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito.

Orientadora: Professora Msc. FRANCELISE PANTOJA DIEHL

Itajaí (SC), junho de 2008.

AGRADECIMENTO

Agradeço principalmente à DEUS, por me ajudar a superar mais esta fase de minha vida;

Agradeço aos meus pais e irmãos por estarem sempre ao meu lado apoiando e incentivando para que conseguisse realizar os meus

sonhos;

Agradeço a meu marido por todo companheirismo e principalmente por toda paciência;

Agradeço a meu filho pelo carinho e compreensão. ;

Agradeço especialmente a minha Orientadora Professora Msc Francelise P. Diehl, por toda paciência, incentivo e dedicação;

Enfim, agradeço de maneira especial a todos que fizeram parte desta conquista.

Carinhosamente Obrigada

DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho a meu filho.

E a todos que fizeram parte deste período da minha vida, me ajudando, apoiando, torcendo,

incentivando.

TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo

aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do

Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o

Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

Itajaí (SC), junho de 2008.

Gyanni Amálie Martins de Oliveira Santos Martinelli Graduando

PÁGINA DE APROVAÇÃO

A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale

do Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Gyanni Amálie Martins De Oliveira

Santos Martinelli, sob o título Protocolo de Kyoto e Mercado de Carbono foi

submetida em [__________] à banca examinadora composta pelos seguintes

professores: [_______________] e aprovada com a nota [_________]

[____________________].

Itajaí (SC), junho de 2008.

Francelise Pantoja Diehl Orientador e Presidente da Banca

Coordenação da Monografia

ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS

IPCC Intergovernmental Panel on Climate Change ONU Organização das Nações Unidas UNCED United Nations Conference for Environment and Development EIA Estudo de Impacto Ambiental RIMA Relatório de Impacto Ambiental ONG Organização Não-Governamental PNUMA Programa das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente UNEP United Nations Environment Programme UNFCCC United Stations Framework Convention on Climate Change NFC Hidrofluorcarbono CIDES Comissão Interministerial para o Desenvolvimento Sustentável CIMGC Comissão Interministerial de Mudança Global do Clima MDL Mecanismo de Desenvolvimento Limpo MBRE Mercado Brasileiro de Reduções de Emissões RCE Redução Certificada de Emissão GEE Gás de Efeito Estufa MME Ministério de Minas e Energia MCT Ministério da Ciência e Tecnologia ONS Operador Nacional do Sistema Elétrico SIN Sistema Integrado Nacional CCEE Câmara de Comercialização de Energia Elétrica

ROL DE CATEGORIAS

Aquecimento global

O Aquecimento global se revela em detalhes como anéis de árvores, sedimentos

de lagos, corais antigos e bolhas presas no gelo, que mostram que o mundo

nunca esteve tão quente e as altas temperaturas duram mais de um milênio. O

planeta jamais se aqueceu tão rápido quanto nos últimos 25 anos1.

CO2 equivalente Media métrica que registra a concentração de dióxido de carbono que causaria a

mesma quantia de radiação que uma mistura de dióxido de carbono e outros

gases de efeito estufa2.

Comércio de Emissões

Instrumento inerente ao Protocolo de Kyoto que permite às partes comercializar,

entre si, unidades de redução das suas permissões de emissão, visando, assim,

que as partes constantes no Anexo I do Protocolo de Kyoto possam cumprir o

assumido no artigo 3 do mesmo. Consiste na transferência ou aquisição de tais

unidades, provenientes de projetos que visem à redução de emissões antrópicas

por fontes ou o aumento das remoções antrópicas por sumidouros de gases de

efeito estufa em qualquer setor da economia, nos ditames da Conferência das

1 PEARCE, Fred. O aquecimento global. Trad. Ederli Fortunato. São Paulo: Publifolha, 2002, p. 4. 2 Disponível em: <www.ipcc.ch>, acessado em 14 de junho de 2008, às 22:50

Partes, mormente no que toca à verificação, elaboração de relatórios e prestação

de contas do comércio de emissões3.

Ecossistema Chamamos de sistema ecológico ou ecossistema qualquer unidade (biossistema)

que abranja todos os organismos que funcionam em conjunto (a comunidade

biótica) numa dada área, interagindo com o ambiente físico de tal forma que um

fluxo de energia produza estruturas bióticas claramente definidas e uma ciclagem

de materiais entre as partes vivas e não vivas.4.

Efeito Estufa

Provoca alterações climáticas devido a emissões de gases pelo homem na

atmosfera. Impede o desenvolvimento sustentável devendo as emissões de gases

causadores desse efeitos serem reduzidos visando a diminuição do aquecimento

global5.

MDL – Mecanismo de Desenvolvimento Limpo

É um mecanismo de flexibilização previsto no artigo 10 do Protocolo de Kyoto que

visa atingir o desenvolvimento sustentável, através do cumprimento dos países

em seus compromissos quantificados de limitação e redução de emissões

assumidos no art. 3 do mesmo protocolo6.

3 Protocolo de Kyoto. Disponível em: <http://www.mct.gov.br/upd_blob/0015/15798.pdf> acessado em 14 de junho de 2008. 4 ODUM,Eugene P.. Ecologia. Rio de Janeiro: Guanabara. 1983 p. 9. 5 Protocolo de Kyoto. Disponível em: <http://www.mct.gov.br/upd_blob/0015/15798.pdf> acessado em 14 de junho de 2008. 6 Protocolo de Kyoto. Disponível em: <http://www.mct.gov.br/upd_blob/0015/15798.pdf> acessado em 14 de junho de 2008.

Meio ambiente A Lei nº 6.938 de 31 de agosto de 1981, que dispõe sobre a Política Nacional do

Meio Ambiente, define o Meio Ambiente como “conjunto de condições, leis,

influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga

e rege a vida em todas as suas formas”7.

Protocolo de Kyoto

O Protocolo de Kyoto à Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança

do Clima, subscrito em 1997, adotado por uma conferência diplomática realizada

paralelamente a uma reunião ordinária da Conferência das Partes. (...) Além dos

gases arrolados na Convenção do Clima, cuja emissão deve reverter aos níveis

de 1990 até os anos de 2008 e 2012, o Protocolo inclui outros três gases

denominados “sintéticos” ou “exóticos” (hidrofluorcarbono-NFC; perfluorcarbono-

PFC e hexafluoreto sulfuroso-SF6), cuja taxa de emissão deve ser reduzida aos

níveis de 1995, até aqueles mesmos anos vindouros (sendo os níveis e prazos

facilitados para países de economia em transição)8.

7 BRASIL. Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981. Disponível em <http://www.brasil.gov.br>. Acesso em 30 abr 2008. 8 SOARES, Guido Fernando Silva. A proteção internacional do meio ambiente. São Paulo: Manole, 2003, p. 151.

SUMÁRIO

RESUMO ............................................................................................ XI

INTRODUÇÃO ...................................................................................... 1

CAPÍTULO 1 ......................................................................................... 3

EFEITOS DO AQUECIMENTO GLOBAL E SEUS REFLEXOS .......... 3 1.1 CONCEITO ....................................................................................................... 3 1.2 ORIGEM DO AQUECIMENTO GLOBAL ......................................................... 4 1.3 IMPACTO DO AQUECIMENTO GLOBAL NA SOCIEDADE ........................... 6 1.4 A POLÍTICA DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL ............................. 33

CAPÍTULO 2 ....................................................................................... 36

PROTOCOLO DE KYOTO ................................................................. 36 2.1 RAIZES HISTÓRICAS DO PROTOCOLO DE KYOTO .................................. 36 2.1.1 PROTOCOLO DE KYOTO .................................................................................. 37 2.1.2 DECLARAÇÃO DE ESTOLCOMO-1972 ............................................................... 38 2.1.3 DECLARAÇÃO DO RIO DE JANEIRO SOBRE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO-1992 ...................................................................................................................... 41 2.1.4 PROTOCOLO DE KYOTO-1997 ......................................................................... 44 2.1.5 O BRASIL DENTRO DO PROTOCOLO DE KYOTO .................................................. 45 2.2 CONTROVERSIAS SOBRE A APLICAÇÃO DO PROTOCOLO DE KYOYO48

CAPÍTULO 3 ....................................................................................... 50

CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE O MERCADO DE CARBONO ............................................................................................................ 50 3.1 O LEGADO DO PROTOCOLO DE KYOTO ................................................... 50 3.2 CRÉDITOS DE CARBONO VALORAÇÃO E COMÉRCIO ............................ 51 3.2.1 EMISSÃO ........................................................................................................ 55 3.2.2 CESSÃO ......................................................................................................... 56 3.2.3 PROMESSA DE CESSÃO FUTURA ....................................................................... 59 3.3 POLUIÇÃO MOEDA DE TROCA: O CRÉDITO DE CARBONO NA ECONOMIA CONTEMPORÂNEA ........................................................................ 61 3.4 PERSPECTIVAS DE FUNCIONALIDADE ..................................................... 66

CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................ 71

REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS ............................................ 74

RESUMO

A presente Monografia tem como objetos o Protocolo de

Kyoto e o Mercado de Carbono. O seu objetivo é trazer à baila um maior número

de informações sobre os objetos, destacando sua aplicação nas economias

brasileira e mundial. Para tanto, o presente trabalho científico se inicia com o

estudo acerca do aquecimento global, trazendo seu conceito, natureza,

características e conteúdo. Após, volta-se para uma abordagem sobre o Protocolo

de Kyoto, o que inclui conceito, histórico, natureza, aplicação e outras

características. Para finalizar, estuda-se o Mercado de Carbono, com uma breve

disposição sobre suas modalidades de operação, sua participação na economia

mundial e sua funcionalidade no Brasil. O presente Relatório de Pesquisa

encerra-se com as Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos

conclusivos destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e

das reflexões que versam sobre o tema.

INTRODUÇÃO

A presente Monografia tem como objetos o Protocolo de

Kyoto e o Mercado de Carbono.

O seu foco principal é fazer uma análise de como estes

podem ser aplicados em nossa realidade, tanto em nível de Brasil quanto de

mundo.

Para tanto, principia–se, no Capítulo 1, uma abordagem

sobre o aquecimento global, com seu conceito, natureza, características e

conteúdo.

No Capítulo 2, por sua vez, tem-se um estudo sobre o

Protocolo de Kyoto, com seu conceito, histórico, características e aplicação.

Finalmente, no Capítulo 3, são abordados o Mercado de

Carbono e assuntos pertinentes, como suas modalidades de operação, sua

participação na economia mundial e sua aplicação no Brasil.

O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as

Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos

destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões

sobre o tema.

Para a realização da presente pesquisa, procedeu-se à

elaboração das seguintes hipóteses.

1) O aquecimento global tem reflexos não somente

ambientais e sociais, mas também políticos e econômicos.

2) O papel que desempenha o Protocolo de Kyoto.

3) O Mercado de Carbono é a solução para conciliar

desenvolvimento sustentável e desenvolvimento econômico.

2

Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase

de Investigação foi utilizado o Método Indutivo, na Fase de Tratamento de Dados

o Método Cartesiano, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente

Monografia é composto na base lógica Indutiva.

Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as

Técnicas, do Referente, da Categoria, do Conceito Operacional e da Pesquisa

Bibliográfica.

CAPÍTULO 1

EFEITOS DO AQUECIMENTO GLOBAL E SEUS REFLEXOS

1.1 CONCEITO

O Protocolo de Kyoto, como se sabe, tem o propósito de ser

uma alternativa viável à conciliação das nações em torno da necessidade de

controle e combate da poluição. Assim sendo, para que se possa tratar com

propriedade o tema deste trabalho, torna-se relevante uma breve abordagem

sobre a figura da prática de poluição da biosfera – a qual se fez inerente à filosofia

de progresso acelerado e da revolução sócio-econômica – e o aquecimento

global, uma de suas muitas conseqüências.

Sobre o aquecimento global, MACHADO traz uma definição

técnica a respeito:

“Os gases dióxido de carbono – co2, dióxido nitroso – n20, metano – ch4, hidrofluorcarbonos (HFCs), perfluorocarbonos (PFCs) e hexafluoreto de enxofre (sf6) têm contribuído para formar uma capa na atmosfera, que funciona como o telhado de uma estufa. O excesso desses gases na atmosfera vem causando um aquecimento anormal do Planeta – o efeito estufa9.”

O aquecimento global, como já foi dito, é um reflexo da

crescente poluição praticada pela humanidade. Sendo assim, mister se faz

apresentar uma definição sobre a mesma. Neste sentido, tem-se o entendimento

de MILARÉ, nos termos seguintes:

“É a adição ou o lançamento de qualquer substância, matéria ou forma de energia (luz, calor, som) ao meio ambiente em quantidades que resultem em concentrações maiores que as naturalmente encontradas. Os tipos de poluição são, em geral,

9 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro, 15 ed., rev., atu. e amp. São Paulo: Malheiros Editores, 2007, p. 555.

4

classificados em relação ao componente ambiental afetado (poluição do ar, da água, do solo), pela natureza do poluente lançado (poluição química, térmica, sonora, radioativa etc.) ou pelo tipo de atividade poluidora (poluição industrial, agrícola etc.)10.

Complementarmente à posição defendida pelo doutrinador,

pode-se obter uma definição mais objetiva, extraindo-a diretamente do teor do art.

3º da Lei n. 6.938, de 31 de agosto de 1981, conhecida também como Lei de

Política Nacional do Meio Ambiente:

Art. 3º - Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por:

(...)

III - poluição, a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente:

a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população;

b) criem condições adversas às atividades sociais e econômicas;

c) afetem desfavoravelmente a biota;

d) afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente;

e) lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos.

Estabelecidos os parâmetros conceituais, passa-se a um

breve relato do histórico do aquecimento global.

1.2 ORIGEM DO AQUECIMENTO GLOBAL

Atribuir uma origem definida ao fenômeno conhecido como

aquecimento global implica correr o risco de incidir em ponto controverso, eis que

10 MILARÉ, Edis. Direito do ambiente: doutrina, prática, jurisprudência glossário, 2 ed., rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001, p. 741.

5

não há uma fonte exclusivamente atribuída como responsável pela elevação de

temperatura no planeta. Há a predominância do fator humano, segundo o qual o

crescimento desenfreado das cidades, aliado ao desenvolvimento acelerado da

economia mundial, traria danos severos à nossa biosfera11.

Há, entretanto, quem discorde desta corrente e os últimos

estudos têm revelado um número cada vez maior de discordantes de tal maioria.

Como exemplo, uma recente pesquisa de opinião entre cientistas do clima na

American Meteorological Society e American Geophysical Union mostra que a

grande maioria duvida que tenha havido qualquer aquecimento identificável

provocado pela ação humana (49% afirmaram que não, 33% não sabiam, 18%

pensavam que houve algum; porém, entre os ativamente envolvidos em

investigação e com contribuições freqüentes de artigos em revistas de

investigação sérias, nenhum acredita em qualquer aquecimento global provocado

por ação humana até hoje conhecida)12.

Independente de tal divergência, o fato é que um número

cada dia maior de cientistas – muitos deles sem qualquer expertise para tecer

opiniões sólidas – alerta a sociedade para a iminência do aquecimento global. De

posse de tais informações, a mídia veicula – muitas vezes de forma distorcida – a

existência do referido fenômeno, atingindo pessoas dos mais variados tipos. E

assim, o que começou como uma simples tese foi alardeado como verdade e

divulgado como catástrofe. Em resposta, políticos surgem com medidas que

asseguram maior remessa de divisas para os tais cientistas. Estes, uma vez que

tenham os recursos, poderão espalhar cada vez mais suas teses, alarmando

ainda mais as pessoas e instigando maiores receios e promovendo maiores

envios de dinheiro, constituindo círculo vicioso13.

11 Disponível em: <http://resistir.info/climatologia/lindzen_rev2.html>, acessado em 25 de maio de 2008, às 20:30. 12 Disponível em: <http://resistir.info/climatologia/lindzen_rev2.html>, acessado em 25 de maio de 2008, às 20:30. 13 Disponível em: <http://resistir.info/climatologia/lindzen_rev2.html>, acessado em 25 de maio de 2008, às 20:30.

6

Feita uma breve análise do círculo vicioso que se configura

em torno da questão do aquecimento global, mister se faz explanar sobre como o

mesmo atinge nossa sociedade, conforme o presente na página seguinte.

1.3 IMPACTO DO AQUECIMENTO GLOBAL NA SOCIEDADE

A extensão dos danos causados pelo aquecimento global se

faz notar à medida que estudos mais conclusivos são efetuados e apresentados à

comunidade científica, bem como ao mundo em geral.

Neste sentido, um dos casos mais recentes é um

levantamento feito pelo Instituto Internacional para Estudos Estratégicos (do

inglês, International Institute for Strategic Studies – IISS), situado em Londres. O

referido estudo, de periodicidade anual e publicado em 12 de setembro de 2007,

alerta que as mudanças no clima podem ter implicações globais na área de

segurança equivalentes a uma guerra nuclear, a menos que sejam tomadas

providências urgentes. Além disso, afirmou que o aquecimento global vai limitar

as safras e a disponibilidade de água em todo o planeta, causando sofrimento e

conflitos regionais14.

Um dos pontos mais destacados pelo documento foi o fato

de que, embora todos tenham começado a reconhecer a ameaça que as

mudanças no clima representam, ninguém assumiu um papel efetivo de liderança

para tratar da questão, e não se sabe exatamente quando nem onde o problema

será mais grave. Finalmente, o relatório aponta que uma das conseqüências da

mudança no clima é diminuir a capacidade do mundo de combater o aquecimento

global, num círculo vicioso. Com isso, aumentaria a distância entre ricos e pobres,

e as tensões étnicas cresceriam, o que por sua vez incentivaria a ocorrência de

ainda mais conflitos. As áreas urbanas tampouco escapariam, eis que a escassez

de água e a queda das safras elevaria muito o preço dos alimentos15.

14 Disponível em: <http://www.iiss.org/whats-new/iiss-in-the-press/september-2007/global-warming-impact-like-nuclear-war>, acessado em 14 de outubro de 2007, às 18:50. 15 Disponível em: <http://www.iiss.org/whats-new/iiss-in-the-press/september-2007/global-warming-impact-like-nuclear-war>, acessado em 14 de outubro de 2007, às 18:55.

7

Posicionamento similar se verifica em outro estudo, desta

vez proveniente do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (do inglês,

Intergovernmental Panel on Climate Change – IPCC)16, um grupo nascido do

esforço conjunto da Organização Meteorológica Mundial (do inglês, World

Meteorological Organization – WMO17) com o Programa sobre o Meio Ambiente

das Nações Unidas (do inglês, United Nations Enviromental Programee –

UNEP18).

Recém-premiado com o Prêmio Nobel da Paz – juntamente

com Albert Arnold Gore19 –, o IPCC apresentou seu quarto relatório, no qual,

dentre outras coisas, atesta a iminência de uma “nova época climática”. Além

disso, alertou para a possibilidade de um aumento de até 6 graus na temperatura

global até 2099, bem como para os efeitos decorrentes desse aumento (degelo

das calotas, elevação do nível do mar, mortes pelo calor, secas e propagação de

doenças contagiosas em escala muito maior). Por fim, o mesmo relatório aponta o

Protocolo de Kyoto como “uma responsabilidade global contra a mudança

climática" que prepara o campo para "decisões nacionais”20.

O IPCC também tem outros trabalhos sobre aquecimento

global e suas conseqüências, com os quais atua junto a governantes, ministros,

organizações e demais interessados na preservação do meio ambiente. Dentre

eles, destacam-se arquivos como “Global Climate Projections”, um coletivo de

projeções gráficas sobre a emissão de CO2, o aquecimento global e sua

influência no mundo. Embasado nos levantamentos mais recentes do grupo, traz

estimativas sobre efeitos como a presença de CO2 na atmosfera, alteração no PH

dos oceanos e outras conseqüências do gênero, como é o caso do disposto a

seguir21:

16 Disponível em: <http://afp.google.com/article/ALeqM5i35IoGkxv8oaYtaiQgBw5f38pt1A>, acessado em 16 de outubro de 2007, às 22:20. 17 Disponível em: <www.wmo.ch>, acessado em 16 de outubro de 2007, às 22:35. 18 Disponível em: <www.unep.org>, acessado em 16 de outubro de 2007, às 22:45. 19 Disponível em: <www.ipcc.ch>, acessado em 16 de outubro de 2007, às 22:50. 20 Disponível em: <http://www.estadao.com.br/vidae/not_vid64509,0.htm>, acessado em 16 de outubro de 2007, às 23:15 21 Disponível em: <http://www.ipcc.ch/graphics/graphics/ar4-wg1/ppt/figure10.ppt>, acessado em 18 de novembro, às 12:45.

8

(Retirado de http://www.ipcc.ch/graphics/graphics/ar4-

wg1/ppt/figure10.ppt)

Outra referência no estudo sobre o Impacto do Aquecimento

Global é o relatório feito pelo Programa das Nações Unidas para o

Desenvolvimento – PNUD, o qual, entre outras informações levantadas, aponta

que os impactos causados pelas mudanças climáticas “podem trazer reversões

sem precedentes na redução da pobreza e nos avanços alcançados em setores

como saúde e educação”. Tal estudo, denominado “Combater a mudança do

clima: Solidariedade Humana em um mundo dividido”, faz um levantamento das

mudanças de clima e atesta que o mundo caminha para um ponto no qual os

países e os cidadãos mais pobres se verão com dificuldades para garantir sua

sobrevivência e escapar da desnutrição, situação esta que atingirá centenas de

milhões de pessoas, nas palavras de Kemal Dervis, administrador do PNUD:

“Em última instância, a mudança do clima é uma ameaça para o mundo, como um todo. Mas são os pobres, aqueles que não têm responsabilidade pelo débito ecológico em que nos encontramos,

9

que se deparam com os custos humanos mais severos e mais prementes22”.

As palavras de Kemal Dervis condizem com o que se faz

presente já no Sumário Executivo do relatório, nos termos que se fazem

presentes infra:

No mundo de hoje, são os pobres que suportam o maior fardo causado pelas alterações climáticas. Amanhã será a humanidade no seu todo que enfrentará os riscos inerentes ao aquecimento global. A rápida acumulação de gases com efeito de estufa na atmosfera terrestre está a alterar significativamente a previsão meteorológica para as gerações futuras. Aproximamo-nos da beira do abismo, o que se traduz em eventos imprevisíveis e não lineares, que podem abrir a porta a catástrofes ecológicas – como sendo, nomeadamente, o acelerado degelo das calotes glaciares – que irão transformar os padrões de colonização humana e minar a viabilidade das economias nacionais. Talvez a nossa geração não viva para ver as conseqüências. Mas os nossos filhos e os seus netos não terão outra alternativa se não viver com elas. O combate à pobreza e à desigualdade nos dias de hoje, bem como aos riscos catastróficos do futuro, constituem um forte fundamento racional para uma acção urgente.

(...)

O aquecimento global é a prova de que estamos a sobrecarregar a capacidade da atmosfera terrestre. Os stocks de gases com efeito de estufa que retêm o calor. As alterações climáticas recordam-nos vivamente aquilo que todos nós temos em comum: chama--se planeta Terra. Todas as nações e todos os povos partilham a mesma atmosfera na atmosfera terrestre estão a acumular-se a um nível sem precedentes. As concentrações actuais chegaram a 380 partes por milhão (ppm) de equivalente dióxido de carbono (CO2e), excedendo os limites naturais dos últimos 650,000 anos. No decurso do século XXI, ou talvez um

22 Mudança climática pode gerar regresso inédito no desenvolvimento humano. Disponível em <http://www.pnud.org.br/meio_ambiente/reportagens/index.php?id01=2822&lay=mam>, acessado em 08/06/2008, às 21:05.

10

pouco para além disso, as temperaturas globais médias podem aumentar em mais de 5º- C23.

Ainda no Sumário Executivo do dito relatório, é importante

destacar o seguinte:

Por detrás dos valores e medidas esconde-se um facto simples e avassalador. Estamos a gerir mal e imprudentemente a nossa interdependência ecológica. A nossa geração está a cumular uma dívida ecológica insustentável, a qual será herdada pelas gerações futuras. Estamos a perder os fundos do capital ecológico dos nossos filhos. Alterações climáticas perigosas representarão o ajuste a um nível insustentável de emissão de gases com efeito de estufa. As gerações futuras não são o único grupo de eleitores que terá de se adaptar a um problema que não criou. São as populações pobres do mundo que irão sofrer os primeiros e mais prejudiciais impactos. As nações mais ricas e os seus cidadãos são responsáveis pelo pesado volume de gases com efeito de estufa retidos na atmosfera terrestre. Mas os países pobres e os seus cidadãos pagarão o preço mais alto pelas alterações climáticas.

(...)

Embora os povos pobres do mundo caminhem pela Terra deixando apenas uma leve pegada de carbono, são eles que suportam o maior peso de uma gestão insustentável da nossa interdependência ecológica. Nos países ricos, lidar com as alterações climáticas tem sido, até hoje, largamente uma questão de se ajustar os termostatos, lidar com verões mais quentes e longos e com mudanças sazonais. Cidades como Londres e Los Angeles poderão enfrentar o risco de inundação caso o nível do mar suba, mas os seus habitantes estão protegidos por elaborados sistemas de defesa contra cheias. Em contraste, quando o aquecimento global altera os padrões meteorológicos no Corno de África, isso significa que as colheitas serão destruídas e as pessoas passarão fome, ou que mulheres e raparigas precisarão de mais tempo para ir buscar água. E, quaisquer que sejam os riscos que afectem as cidades nos países ricos, hoje as

23 Mudança climática pode gerar regresso inédito no desenvolvimento humano. Disponível em <http://www.pnud.org.br/meio_ambiente/reportagens/index.php?id01=2822&lay=mam>, acessado em 08/06/2008, às 21:05.

11

verdadeiras vulnerabilidades que emergem das alterações climáticas ligadas às tempestades e cheias podem ser detectadas nas comunidades rurais junto aos deltas de grandes rios como o Ganges, o Mekong e o Nilo, e em bairros de lata urbanos que crescem por todo o mundo em vias de desenvolvimento24.

O mesmo relatório, desta vez em seu Capítulo n.1,

apresenta exemplos de como o aquecimento global influencia negativamente no

desenvolvimento humano:

• Produtividade agrícola reduzida. Cerca de três quartos da população mundial que vive com menos de US$1 por dia depende directamente da agricultura. Os cenários das alterações climáticas apontam para grandes perdas na produção de gêneros alimentícios associadas à seca e à variação da precipitação em zonas da África Subsariana e Sul e Este da Ásia. As perdas de rendimento estimadas para zonas áridas na África Subsaria na ascendem aos 26% em 2060, com perdas de rendimentos totais de US$26 mil milhões (mantendo-se a tendência de 2003) – excedendo as transferências de ajuda bilateral à região. Através do seu impacto na agricultura e na produção de géneros alimentícios para consumo interno, as alterações climáticas poderão levar a que 600 milhões de pessoas enfrentem uma subnutrição acentuada na década de 2080, ultrapassando em muito o nível num eventual cenário em que as alterações climáticas não entrassem.

• Maior insegurança quanto aos recursos de água. Ultrapassar o limite dos 2

ºC irá alterar substancialmente a distribuição dos recursos de água no mundo. O derretimento acelerado dos glaciares nos Himalaias envolverá já problemas ecológicos graves ao longo do norte da China, Índia e Paquistão, aumentando inicialmente os níveis do mar e depois reduzindo os cursos de água dos principais sistemas fluuviais vitais para as irrigações. Na América Latina, a acelerada redução dos glaciares tropicais ameaçará o abastecimento de água junto das populações urbanas, na agricultura e na hidroelectricidade, especialmente na região dos Andes. Em 2080, as alterações climáticas poderão aumentar o número de pessoas que enfrenta a escassez de água em todo o mundo em cerca de 1,8 mil milhões.

24 Relatório de Desenvolvimento Humano 2007/2008. Disponível em: <http://www.pnud.org.br/arquivos/Sintese.pdf>, acessado em 10 de junho de 2008, às 22:50.

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• Maior exposição às cheias costeiras e episódios de enchentes. O PIAC prevê

um aumento no número de episódios de enchentes. As secas e as cheias são já os factores principais que actuam no constante aumento no número de desastres climáticos. Em média, cerca de 262 milhões de pessoas foram afectadas todos os anos entre 2000 e 2004, mais de 98% das quais residentes em países em vias de desenvolvimento.

Com um aumento de temperaturas acima dos 2 ºC, os mares mais quentes provocarão ciclones tropicais mais violentos. As áreas afectadas por secas aumentaram em extensão, colocando vidas em perigo e comprometendo o progresso ao nível da saúde e da alimentação. O mundo já assistirá necessariamente à subida dos níveis do mar no século XXI em virtude das anteriores emissões de gases poluentes. Aumentos de temperatura superiores aos 2 ºC acelerariam essa subida, tornando necessária a deslocação generalizada das populações de países como o Bangladesh, o Egipto e o Vietname, e levando à submersão de vários pequenos Estados insulares. A subida dos níveis do mar e a intensificação das tempestades tropicais poderão resultar num aumento do número de pessoas a sofrerem cheias costeiras, entre 180 e 230 milhões.

Dentro do Capítulo 1, é fundamental destacar os aspectos seguintes, por serem os mais relevantes do mesmo:

• O colapso dos ecossistemas. Todas as taxas de extinção de espécies

estimadas sobem rapidamente ao se considerar um aumento de temperaturas superior a 2 ºC, sendo que um aumento na ordem dos 3 ºC corresponderá a uma situação na qual que se prevê que 20 a 30 por cento das espécies estariam em “elevado risco” de extinção. Os recifes de coral, já em processo de declínio, sofreriam uma acentuada e extensa “descoloração”, levando à transformação da ecologia marinha, envolvendo grandes perdas em termos de biodiversidade e ecossistemas. Este panorama afectaria centenas de milhões de pessoas cuja subsistência e alimentação se baseia no peixe.

• Acrescidos riscos para a saúde. As alterações climáticas terão impacto

sobre a saúde humana a diversos níveis. Em termos gerais, mais 200-400 milhões de pessoas poderiam ser colocadas perante um acrescido risco de contraírem malária. Estima-se que as taxas de

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exposição referentes à África Subsariana, as quais correspondem a cerca de 90 por cento das mortes, aumentem em 16-28 por cento25.

O Relatório vai além e, no Capítulo 2, detalha hipóteses nas

quais o aquecimento global prejudica o desenvolvimento humano:

• Projecção do PIAC: Aumentos da precipitação em elevadas latitudes e decréscimos nas latitudes subtropicais, permanecendo o padrão actual de aridez em algumas regiões. Prevê-se que o aquecimento esteja acima da média geral ao longo da África Subsariana, do leste e sul da Ásia. Em muitas regiões marcadas pela escassez hídrica, prevê-se que as alterações climáticas reduzam bastante a disponibilidade da água através do aumento da frequência de secas, da crescente evaporação e das mudanças nos padrões de precipitação e de escoamento.

• Projecção para o desenvolvimento humano: Grandes perdas na produção agrícola, que irão levar a uma crescente subnutrição e a escassas oportunidades para a redução da pobreza. De um modo geral, as alterações climáticas irão baixar os rendimentos e reduzir as oportunidades das populações vulneráveis. Em 2080, o número de pessoas acrescidas em risco de fome poderá atingir 600 milhões – o dobro do número de pessoas que vive, actualmente, na pobreza na África Subsariana.

(...)

Os sistemas agrícolas das zonas áridas irão registrar alguns dos impactos mais devastadores das alterações climáticas. Um estudo observou as potenciais implicações para as zonas áridas na África Subsariana, conjugando uma subida da temperatura de 2,9º C com uma redução de 4 % na precipitação, em 2060. Eis o resultado: uma redução de lucros por hectare de cerca de 25%, em 2060. Nos preços de 2003, as perdas gerais de lucros representariam cerca de US$26 mil milhões em 2060 – um número que representa mais do que a ajuda bilateral à região, em 2005.

25 Relatório de Desenvolvimento Humano 2007/2008. Disponível em: <http://www.pnud.org.br/arquivos/arqui1196121564.zip>, acessado em 10 de junho de 2008, às 22:50.

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(...)

As alterações climáticas irão sobrepor-se a pressões mais amplas sobre os sistemas hídricos. Muitas bacias fluviais e outros recursos hídricos estão já a ser insustentavelmente “explorados”. Actualmente, cerca de 1,4 mil milhões de pessoas vivem em bacias fluviais “fechadas”, onde a utilização da água excede os níveis dos caudais, criando sérios danos ecológicos.

O Capítulo 2 continua a tratar das conseqüências do aquecimento global, no sentido de prejudicar o desenvolvimento humano:

Os sintomas do stress hídrico incluem o colapso de sistemas fluviais no norte da China, a rápida queda dos níveis das águas subterrâneas no sul da Ásia e no Médio Oriente e os crescentes conflitos referentes ao acesso à água. As alterações climáticas irão intensificar muitos destes sintomas. Ao longo do século XXI, estes poderão transformar os caudais de água que sustêm os sistemas ecológicos, a agricultura de irrigação e os abastecimentos domésticos de água. Num mundo que já enfrenta pressões cada vez maiores sobre os recursos hídricos, as alterações climáticas poderão adicionar cerca de 1,8 mil milhões de pessoas à população que vive num ambiente de escassez hídrica – definida em termos de um limite de 1000 metros cúbicos per capita por ano – em 2080.

(...)

Existe uma probabilidade de alta fiabilidade de que a resiliência de muitos ecossistemas será dificultada pelas alterações climáticas, devido ao aumento dos níveis de CO2 a reduzir a biodiversidade, danificando ecossistemas e comprometendo os serviços que estes proporcionam.

O mundo caminha em direcção a perdas de biodiversidade sem precedentes e ao colapso dos sistemas ecológicos ao longo do século XXI. Com subidas das temperaturas a mais de 2º C, as taxas de extinção começarão a subir. A degradação ambiental irá acelerar o ritmo, com os sistemas de corais, florestais e de zonas húmidas a sofrerem rápidas perdas. Os processos estão em andamento. As perdas de ecossistemas e biodiversidade são

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intrinsecamente más para o desenvolvimento humano.

O ambiente é, por seu direito, importante para as gerações actuais e futuras. No entanto, os ecossistemas vitais que fornecem um vasto leque de serviços também se perderão. Os pobres, que dependem mais intensamente desses serviços, suportarão o peso dos custos. Tal como em outras áreas, os processos das alterações climáticas irão interagir com pressões mais vastas sobre os ecossistemas e a biodiversidade. Muito dos grandes ecossistemas do mundo estão já sob ameaça.

Dentro do Capítulo 2, há também a previsão dos efeitos cumulativos da poluição descontrolada:

As perdas da biodiversidade estão a acumular-se em muitas regiões. As alterações climáticas constituem uma das forças que provocam estas tendências. Ao longo do tempo, tornar-se-á uma força mais poderosa O estado de rápida deterioração do ambiente global fornece o contexto para a avaliação do impacto das alterações climáticas futuras. Em 2005, a Avaliação Ecossistemica do Milénio revelou que 60% da totalidade dos serviços de ecossistemas estavam ora degradados ora a ser utilizados de uma forma insustentável.

A perda de pântanos de mangue, sistemas de recifes de corais, florestas e zonas húmidas foi realçada como uma preocupação crucial, com a agricultura, o crescimento da população e o desenvolvimento industrial em acção conjunta para destruir a base dos recursos ambientais. Cerca de um em cada quatro mamíferos encontra-se em grave declínio.

As perdas dos recursos ambientais irão comprometer a resiliência humana face às alterações climáticas. As zonas húmidas são um exemplo. As zonas húmidas do mundo fornecem um esplêndido conjunto de serviços ecológicos. Detêm biodiversidade, fornecem produtos medicinais e madeireiros e sustêm stocks de peixe. Para além disso, protegem as zonas costeiras e as margens dos rios das tempestades e inundações, defendendo as instalações humanas das vagas do mar. Ao longo do século XX, o mundo perdeu metade das suas zonas húmidas devido à drenagem, à conversão à agricultura e à poluição. Actualmente, a destruição permanece a um ritmo acelerado, numa altura em que as

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alterações climáticas ameaçam criar tempestades mais intensas e vagas marítimas.

No Bangladesh, a contínua erosão das áreas de mangue no Sundabarns e em outras regiões, tem dificultado os modos de subsistência, aumentando a exposição à subida dos níveis das águas do mar. As alterações climáticas estão a transformar a relação entre as pessoas e a natureza. Muitos ecossistemas e a maioria das espécies são altamente susceptíveis a mudanças no clima. Os animais e plantas estão adaptados a zonas climáticas específicas. Existe apenas uma espécie capaz de se adaptar ao clima através de termóstatos com aparelhos de aquecimento ou arrefecimento – trata-se da espécie responsável pelo aquecimento global. As plantas e animais têm de se adaptar através da deslocação.

As perdas de biodiversidade estão a acumular-se em muitas regiões. As alterações climáticas constituem uma das forças que provocam estas tendências. Ao longo do tempo, tornar-se-á uma força mais poderosa.

Como é de se imaginar, os efeitos do aquecimento global se

tornarão presentes em escalas ainda maiores, conforme o Capítulo 2 prevê:

Os mapas ecológicos estão a ser reconfigurados. Nas últimas três décadas, as linhas que assinalavam as regiões nas quais prevalecem as temperaturas médias – “isotérmicas” – têm-se deslocado em direcção aos pólos Norte e Sul, a um nível de cerca de 56 km por década.

As espécies tentam seguir as suas zonas climáticas. As mudanças nas estações de florescimento, nos padrões de migração e na distribuição da fauna e flora têm vindo a ser detectadas por todo o mundo. As plantas alpinas estão a ser empurradas em direcção a altitudes mais elevadas, por exemplo. Porém, quando o ritmo do clima se tornar demasiadamente rápido ou quando as barreiras naturais, como os oceanos, bloquearem as rotas de migração, a extinção surgirá no horizonte. As espécies de maior risco são as dos climas polares, uma vez que não têm para onde ir. As alterações climáticas estão, literalmente, a empurrá-las para fora do planeta.

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As alterações climáticas têm já contribuído para a perda de espécies – e o aquecimento global, na mesma linha de conduta, irá contribuir para essa perda. Porém, irão ocorrer impactos bem maiores a 2º C sobre os níveis pré-industriais. Este é o limite para que as taxas de extinção previstas comecem a subir. Segundo o PIAC, prevê-se que 20% a 30% das espécies animais e vegetais estejam em risco acrescido de extinção, caso as subidas das temperaturas médias globais excedam 1,5º C a 2,5º C, incluindo os ursos polares e os peixes que se alimentam nos recifes de corais. Cerca de 277 mamíferos de médio ou grande porte, em África, estariam em risco caso ocorresse um aquecimento de 3º C.

(...)

As alterações climáticas irão afectar a saúde humana através de sistemas complexos que envolvem mudanças na temperatura, exposição a fenómenos extremos, acesso à nutrição, qualidade do ar e outros vectores. Poderá prever-se, com uma fiabilidade bastante alta, que os actuais pequenos efeitos de saúde irão progressivamente aumentar em todos os países e regiões, com os mais adversos efeitos nos países de baixo rendimento.

Dentre todas as circunstâncias elencadas pelo Capítulo 2, a mais desumana – e, por isso mesmo, a mais alarmante – está na forma como, novamente, o desequilíbrio social, com sua distribuição desleal de renda e outros absurdos, se fará sentir quando o descaso com nosso planeta se atingir a seus próprios algozes, quais sejam, os seres humanos:

Os que estão menos capacitados para responder às ameaças de mudanças na saúde – predominantemente os pobres em países pobres – irão suportar o peso dos retrocessos na saúde. A saúde-doença é uma das mais poderosas forças que atrasa o potencial do desenvolvimento humano das famílias pobres. As alterações climáticas irão intensificar o problema.

É provável que as alterações climáticas tenham implicações mais vastas para saúde humana no século XXI. Existem grandes áreas de incerteza à volta das avaliações, reflectindo a complexa interacção entre a doença, o ambiente e as pessoas. No entanto, na saúde, tal como em outras áreas, o reconhecimento da incerteza não é um motivo suficiente para a inacção. A

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Organização Mundial da Saúde (OMS) prevê que o impacto geral será negativo.

Os efeitos da saúde pública associados às alterações climáticas serão modelados por vários factores. A epidemiologia preexistente e os processos locais serão importantes. Com a mesma importância, serão, igualmente, os níveis de desenvolvimento preexistentes e as capacidades dos sistemas de saúde pública. Muitos dos riscos emergentes para a saúde pública estarão concentrados nos países em vias de desenvolvimento, onde a saúde precária constitui já uma enorme fonte de sofrimento humano e de pobreza e cujos sistemas de saúde pública não têm recursos (humanos e financeiros) suficientes para fazer face às ameaças. Um claro perigo existente é o de que as alterações climáticas, sob estas condições, irão agravar as já extremas desigualdades gerais na saúde pública.

Os fenómenos climáticos extremos proporcionam outro conjunto de ameaças. Inundações, secas e tempestades causam resultados ligados ao aumento dos riscos de saúde, como a cólera e a diarréia entre as crianças. Existem já evidências dos impactos das crescentes temperaturas nos países em vias de desenvolvimento. Durante 2005, o Bangladesh, a Índia e o Paquistão enfrentaram temperaturas de 5º a 6º C acima da média regional. Só na Índia, foram registradas 400 mortes, embora as mortes não registradas pudessem multiplicar bastante os números deste quadro.

A saúde pública nos países desenvolvidos não tem estado imune. A onda de calor que se abateu sobre a Europa em 2003 custou entre 22 000 a 35 000 vidas, na sua maioria idosos. Em Paris, a cidade mais afectada, 81% das vítimas registravam mais de 75 anos de idade.

É provável que outros fenómenos desta natureza ocorram. Por exemplo, espera-se que a incidência de ondas de calor, na maioria das cidades dos Estados Unidos, duplique em 205026.

26 Relatório de Desenvolvimento Humano 2007/2008. Disponível em: <http://www.pnud.org.br/arquivos/arqui1196121663.zip>, acessado em 10 de junho de 2008, às 23:50.

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A tudo isso se soma um panorama nitidamente desfavorável

a qualquer redução na emissão de CO2, por força de três grandes fatores –

conforme explanado no Capítulo 1 – a saber:

Tendências demográficas. As projecções actuais apontam para um aumento da população mundial dos actuais 6,5 milhares de milhão para os 8,5 milhares de milhão em 2030. Assim, a nível global, e mesmo que ficássemos parados, só esse facto leva à necessidade de efectuar reduções totais na ordem dos 30% em emissões per capita médias – e não podemos ficar parados se quisermos evitar as alterações climáticas perigosas. Quase todos os aumentos na população terão lugar nos países em desenvolvimento, onde há consideráveis necessidades de energia e níveis mais baixos de eficiência energética.

• Crescimento económico. O crescimento econômico e a presença de carbono no crescimento são dois dos mais poderosos condutores das tendências de emissão. Quaisquer projecções nesta área estarão sujeitas a um dado grau de incerteza. As próprias alterações climáticas poderiam actuar como um travão no crescimento futuro, especialmente no caso de catastróficas subidas do nível do mar ou ‘surpresas desagradáveis’ imprevistas. Contudo, esse travão poderá não se aplicar nas próximas décadas: não é expectável que o clima tenha efeitos significativos nos condutores do crescimento mundial até ao fim do século XXI. De forma mais imediata, a economia global experimenta um dos mais longos períodos de pouco crescimento. O crescimento mundial foi em média mais de 4% ao ano, na última década. A este ritmo, a produção duplica de 18 em 18 anos, aumentando a necessidade de energia, por um lado, e as emissões de CO2, por outro. O montante de CO2 produzido por cada dólar de crescimento na economia mundial – a ‘intensidade de carbono’ do PIB mundial – tem vindo a cair nas últimas duas décadas e meia, enfraquecendo a ligação entre o PIB e as emissões de carbono. Essa tendência reflecte melhorias na eficiência energética, alterações na estrutura económica – com a taxa de produção envolvendo intensos níveis de carbono a cair relativamente aos sectores de serviços em muitos países – e as alterações na combinação de energia. Contudo, o declínio na intensidade do carbono estacionou desde 2000, criando um aumento de emissões.

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• Energia combinada. No passado quarto de século, as emissões de CO2 relacionadas com a energia cresceram menos rapidamente do que a procura de energia primária. Contudo, segundo o cenário da AIE, o período até 2030 poderá assistir a um aumento de emissões de CO2 mais rápido do que o da procura de energia primitiva. A razão: um aumento da taxa do carvão na energia primária. Estima-se que as emissões de CO2 provenientes do carvão irão aumentar em cerca de 2,7% ao ano até 2015 – uma percentagem 50% superior àquela referente ao petróleo27.

Importante notar, também, que o Relatório de

Desenvolvimento Humano 2007/2008 aponta algumas soluções pertinentes ao

aquecimento global, em seu Capítulo 3, conforme se denota a seguir:

A produção de energia eléctrica é a principal fonte de emissão de CO2, sendo responsável por quatro em cada dez toneladas de CO2 despejadas na atmosfera terrestre. Como os países produzem electricidade, quanta produzem e quanto CO2 é emitido por cada unidade de energia produzida, são aspectos essenciais para dar forma às expectativas de severa mitigação das alterações climáticas.

Os cenários apontam em algumas direcções preocupantes. Projecta-se que a procura mundial de electricidade duplique até 2030.59 Mais de metade deste investimento acontecerá em países em vias de desenvolvimento caracterizados por baixos níveis de eficiência energética. Sozinha a China será responsável por um quarto dos investimentos globais projectados. Os investimentos projectados para os Estados Unidos estão estimados em cerca de 1,6 biliões de dólares americanos, reflectindo uma substituição em larga escala do existente stock energético.

Os padrões de investimento emergentes na produção eléctrica apontam numa direcção preocupante. Sugerem que o mundo está muito pouco receptivo à alteração das infra-estruturas de alta intensidade de carbono. O carvão figura com proeminência crescente no abastecimento planeado de energia. Os maiores

27 Relatório de Desenvolvimento Humano 2007/2008. Disponível em: <http://www.pnud.org.br/arquivos/arqui1196121564.zip>, acessado em 10 de junho de 2008, às 22:50.

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aumentos de investimento são planeados na China, Índia e nos Estados Unidos da América – três das maiores fontes de emissão de CO2 da actualidade. Em cada um destes países a rápida expansão da capacidade de produção eléctrica gerada a partir de carvão está já em produção ou a ser fornecida. Em 2006 a China construía aproximadamente duas novas centrais eléctricas de carvão por semana. As autoridades dos Estados Unidos estão a considerar propostas para construir para cima de 150 centrais eléctricas de carvão, com um investimento planeado de 145 mil milhões de dólares até 2030.60 Durante os próximos 10 anos a Índia está a planear aumentar a sua capacidade de produção de electricidade gerada a partir de carvão em mais de 75%. Em cada caso a expansão da capacidade é um dos maiores impulsionadores para um projectável aumento irracional de emissão de CO2.

(...)

Dentre as alternativas de energia renovável, as mais promissoras são as que advêm diretamente da natureza, tais como o uso de energia eólica ou solar, por exemplo. A estas, o Capítulo 3 dedica especial atenção, nos termos seguintes:

A energia renovável proveniente do sol, vento e marés permanece substancialmente inexplorada. Sem contar a hidroelectricidade o sector de energias renováveis é actualmente responsável por apenas aproximadamente 3% da produção de energia nos países da OCDE. Alcançar uma meta de 20% até 2020, tal como visado pela União Européia é um objectivo prático. Com as tecnologias actuais a energia renovável não pode competir com a energia eléctrica gerada por carvão. No entanto, aumentar o imposto aplicável às emissões de carbono para 60 dólares americanos – 100/t CO2 iria alterar radicalmente as estruturas de investimento, dissipando a vantagem actualmente gozada pelos fornecedores de electricidade com alto nível de carbono. Simultaneamente, são requeridas um conjunto de políticas de apoio para estimular o investimento através da criação de previsibilidade e de mercados estáveis de energia renovável.

As tendências actuais realçam o potencial para um rápido crescimento no fornecimento de energias renováveis, tanto a energia solar como a energia eólica estão em expansão. O

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investimento global em energias renováveis aumentou rapidamente de 27 mil milhões de dólares americanos em 2004 para 71 mil milhões de dólares em 2006. Foram registrados ganhos de eficiência fora do comum. Turbinas de vento modernas produzem 180 vezes mais energia a menos de metade do custo por unidade do que as turbinas de há 20 anos. Os investimentos nos Estados Unidos aumentaram a capacidade da energia eólica num factor 6 relativamente ao período de intervenção (...). Mais ou menos o mesmo aconteceu com a energia solar. A eficiência com que as células foto-voltaicas convergem a luz solar em energia eléctrica, subiu de 6% no início dos anos 90 para 15% hoje em dia, ao passo que o seu custo caiu em cerca de 80%.

As políticas públicas têm o potencial para apoiar uma rápida expansão da energia renovável. A intervenção reguladora é um dos instrumentos para a criação de incentivos. Nos Estados Unidos, cerca de 21 estados têm padrões para as energias renováveis que requerem que uma determinada quantidade de energia vendida seja proveniente de fornecedores de energia renovável – na Califórnia a quantidade é de 20% até 2017. Ao garantir mercados e estabelecer tarifas favoráveis ao longo de vários anos os governos podem providenciar um mercado seguro aos fornecedores de energias renováveis para que estes possam planejar investimentos.

(...)

A política fiscal tem também um importante papel a desempenhar no apoio ao desenvolvimento da energia renovável. Os Estados Unidos emergiram como um dos mais dinâmicos mercados mundiais de energia renovável, com estados como a Califórnia e o Texas actualmente estabelecidos como líderes globais em produção de energia eólica. O apoio de mercado tem sido fornecido através de um programa de Crédito de Taxação de Produção com a duração de 3 anos. No entanto, a incerteza acerca da renovação dos créditos de taxação tem dado, no passado, azo a amplas flutuações de investimento e procura. Muitos países têm combinado um amplo alcance de instrumentos de promoção às energias renováveis. Na Dinamarca, o sector de energia eólica tem sido encorajado através de cortes nos impostos aplicáveis ao investimento de capital, preços preferenciais e uma meta obrigatória. Como resultado, no espaço de duas décadas a

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energia eólica aumentou a sua percentagem na produção de electricidade de menos de 3% para 20%.

(...)

Há também espaço para medidas que não exijam tanto investimento, como e o caso dos setores residencial e de serviços:

Algumas formas de reduzir as emissões de CO2 são menos dispendiosas que outras. E algumas acabam por ser nada dispendiosas a longo prazo. O sector residencial e de serviços é um particularmente impressionante exemplo disso. As práticas actuais, à escala global, demonstram rigorosamente o alvo de medidas que irão poupar electricidade, reduzir emissões e cortar nas despesas domésticas e nas das economias nacionais.

Os padrões de uso energético no sector residencial são responsáveis por uma importante parte das pegadas globais de carbono. Nos países da OCDE cerca de um terço da electricidade produzida acaba em sistemas de aquecimento e refrigeração, frigoríficos, fornos, lâmpadas e em outros aparelhos domésticos. O sector residencial é responsável por cerca de 35% a 40% das emissões nacionais de CO2 geradas a partir de combustíveis fósseis, só os electrodomésticos produzem cerca de 12%.

Existe um enorme potencial subaproveitado de poupança energética no sector residencial. Aplicar esse potencial irá gerar um duplo benefício – os esforços de mitigação das alterações climáticas ficam a ganhar com a queda de emissões de CO2 e os consumidores pouparão dinheiro. Estudos recentes revelam a escala deste potencial, um estudo detalhado para países da OCDE examina um vasto número de políticas relativamente a padrões de construção, regulamentação e procura e definição de padrões e obrigações de eficácia energética para garantir os potenciais custos e benefícios de alcançar redução nas emissões. Os resultados apontam para uma poupança de energia na ordem dos 29% em 2020, o que representa uma redução de 3,2 Gt CO2 – um número equivalente a cerca de três vezes as actuais emissões da Índia. A poupança energética resultante irá contrabalançar as despesas. Um outro estima que a média das residências da União Européia pode poupar anualmente entre 200

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a 1000 euros (250 a 1243 dólares americanos) através do uso de uma melhor eficiência energética (preços de 2004).

Os utensílios eléctricos são outra grande fonte de ganhos em eficiência. Alguns utensílios usam energia mais eficientemente, produzindo uma menor pegada de carbono que outros. Se todos os utensílios eléctricos em funcionamento nos países da OCDE forem de 2005 em diante ao encontro dos melhores padrões de utilização poderão ser poupadas qualquer coisa como 322 milhões de toneladas de emissão de CO2 a te 2010. Isto seria o equivalente retirar de funcionamento 100 milhões de automóveis – um número que representa a soma de todos os veículos do Canadá, França e Alemanha. Esses altos padrões evitariam, até 2030, emissões de 572 Mt CO2 por ano, o que seria o equivalente a retirar de funcionamento 200 milhões de automóveis ou a fechar 400 estações eléctricas movidas a gás.

É interessante notar, também, como a relação custo-benefício surpreende, seja sob a ótica econômica, seja sob a esfera ambiental:

Irão estes ganhos em eficiência significar um aumento devastador nos orçamentos domésticos? Antes pelo contrário, irão reduzir o consumo de electricidade doméstica em cerca de ¼ até 2010. Para a América do Norte, onde as residências consomem 2.4 vezes mais electricidade por unidade que a Europa, essa redução iria poupar aos consumidores cerca de 33 mil milhões de dólares americanos no mesmo período. Até 2020, por cada tonelada de CO2 de emissão evitada pouparia aos consumidores cerca de 169 euros (reflectindo o maior custo de electricidade e mais baixos padrões de utilização da Europa).

A iluminação fornece outro exemplo. A iluminação mundial representa cerca de 10% da procura global de electricidade e cria 1,9 Gt CO2 por ano – 7% das emissões totais de CO2. Tal como um olhar sobre qualquer cidade do mundo desenvolvido pode confirmar, muita da electricidade usada de dia ou de noite é desperdiçada. A iluminação é rotineiramente feita em zonas onde ninguém está presente e por meio de fontes ineficientes. A simples instalação de fontes de baixo custo - tal como lâmpadas florescentes poderia reduzir o total de energia usada em iluminação em cerca de 38%.77 Qual é o período do retorno para

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um investimento em iluminação mais eficiente? Em média cerca de 2 anos para os países da OCDE.

(...)

O alargamento da eficiência energética nesta área pode alcançar poupança de emissões com benefícios líquidos. Entre os instrumentos da política pública estão:

• Padrões de uso de electrodomésticos. Estes estão entre as medidas de mitigação de maior relação despesas – eficiência. Um exemplo é proveniente do “Esquema de Agente de Elite” do Japão. Implementado em 1998 para apoiar os esforços nacionais para cumprir os compromissos de redução de Quioto, este esquema requer que todos os nossos produtos vão ao encontro de padrões de eficiência específicos. Ganhos em eficiência superiores a 50% foram registados em alguns produtos, incluindo carros, frigoríficos, arcas congeladoras e televisões. Uma pesquisa efectuada a um considerável número de países aponta largos benefícios advenientes da redução de CO2 através de padrões de energia melhorados. Estas são áreas em que a gestão da procura de eficiência pode cortar nas emissões de carbono e nas despesas de energia, criando situações benéficas tanto para a economia como para o ambiente. A pesquisa na União Européia e nos Estados Unidos aponta uma estimativa de benefícios entre os 65 dólares americanos/t CO2 e os 190 dólares americanos/t CO2.

• Informação. Esta é uma das chaves para abrir a porta aos ganhos de e_ ciência. Nos Estados Unidos, o programa Estrela de Energia, um esquema de classificação de patrocínios, fornece aos consumidores extensa informação acerca da eficiência energética de mais de 30 produtos. Está estimado que tenha gerado poupanças anuais na ordem dos 5 mil milhões de dólares americanos em 2002.79 Na Austrália, a classificação obrigatória de certos electrodomésticos – inclui arcas congeladoras e maquinas de lavar loiça – tem contribuído para a poupança de CO2 com benefícios estimados em cerca de 30 dólares americanos/t CO2.80.

• Códigos para construção. A regulamentação dos padrões de construção pode gerar grande poupança na emissão de CO2

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associada ao uso de energia. A aplicação das regras é tão importante como elas próprias. No Japão, onde a implementação de padrões de eficiência energética nos edifícios é voluntária, as suas poupanças energéticas têm sido moderadas. Poupanças bastantes mais significativas foram registadas em países como a Alemanha e os Estado Unidos, onde o cumprimento é mais severamente aplicado. A União Européia estima que os ganhos em eficiência de consumo de energia podem ser aumentados um quinto, com potenciais poupanças na ordem dos 60 mil milhões de euros (75 mil milhões de dólares americanos).81 Metade dos ganhos podiam resultar apenas, com a implementação dos padrões de regulamentação existentes, a maioria deles no sector da construção.

(...)

Dentre todas as fontes de poluição, uma das mais presentes – e inerentes à sociedade moderna – é o transporte, mais precisamente o particular:

O transporte particular é o maior consumidor mundial de petróleo – e a sua fonte de emissões possui o mais rápido nível de crescimento. Em 2004 o sector dos transportes produziu 6,3 GtCO2. Ao passo que a percentagem emitida pelos países em vias de desenvolvimento está a aumentar, os países da OCDE são responsáveis por dois terços do total de emissão.82 O sector automóvel nestes países é responsável por cerca de 30% do total das emissões de gases com efeito de estufa, e a percentagem continua a crescer com o passar do tempo.

O ambiente regulador para os transportes é parte fulcral do esforço internacional de mitigação do carbono. O acumular de emissões de gases com efeito de estufa feito por veículos é o resultado de três factores: milhas percorridas, quantidades de combustível usado em cada milha percorrida, e o conteúdo de carbono do combustível. As emissões estão a aumentar em muitos países porque as distâncias percorridas estão a crescer mais rapidamente que a e_ ciência do uso de combustível, e porque os lucros econômicos dos combustíveis foram reduzidos por uma cada vez maior tendência para uso de veículos gradualmente maiores e mais potentes.

(...)

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Os padrões de regulação não podem ser vistos isoladamente. A taxação automóvel é um poderoso instrumento através do qual os governos podem influenciar o comportamento dos consumidores. Uma taxação nivelada que aumente acompanhando os níveis de emissão de CO2 poderia contribuir para o alinhamento entre as políticas energéticas e os objectivos de mitigação das alterações climáticas. Impostos anuais de circulação e impostos de registro de veículos novos poderiam ser meios para atingir o objectivo. Tais medidas iriam apoiar os esforços de produtores automóveis para atingir padrões melhorados de eficiência, em conjunto com os esforços governamentais para alcançar os aclamados objectivos nela relacionados com as alterações climáticas.

(...)

Soluções criativas e que conciliam interesses econômicos, sociais e ecológicos vêm de países cujas economias e mercados muitas vezes estão longe de ser super-desenvolvidos:

Alterar a mistura de combustíveis do sector dos transportes pode desempenhar um importante papel no alinhamento das políticas energéticas com os orçamentos de carbono. O recorte das emissões de CO2 numa viagem média de automóvel pode ser transformado usando menos petróleo e mais etanol produzindo a partir de plantas. Muitos governos vêem agora os biocombustíveis como uma tecnologia que mata dois coelhos de uma só cajadada, ajudando no combate contra o aquecimento global e ao mesmo tempo reduzindo a dependência da importação de petróleo.

Os países em vias de desenvolvimento demonstraram o que pode ser alcançado através de uma perspicaz mistura de incentivos e de regulamentação no sector dos transportes. Um dos mais importantes exemplos vem do Brasil. Ao longo das últimas três décadas, o país tem usado uma mistura de regulamentação e de investimentos de governação directa para desenvolver uma indústria altamente eficiente. Subsídios para combustível à base de álcool, padrões reguladores que requerem que os produtores automóveis produzam veículos híbridos, impostos preferenciais e apoio governamental para uma estrutura de fornecimento de biodiesel, todos desempenham um papel. Hoje em dia os biocombustíveis são responsáveis por cerca de um terço do total dos combustíveis utilizados nos transportes, criando amplos

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benefícios ambientais e reduzindo a dependência de petróleo importado.

Vários países alteraram com sucesso a mistura de combustíveis do sector nacional de transportes, usando um misto de regulamentação e de incentivos de mercado para promover a Compressão de Gás Natural (CGN). Estimulada em parte devido a preocupações acerca da qualidade do ar nos maiores centros urbanos, e também em parte pela preocupação em reduzir a dependência de petróleo importado, tanto a Índia como o Paquistão têm assistido a uma grande expansão do uso do CGN, Na Índia várias cidades têm usado mecanismos reguladores para proibir um conjunto de veículos de usar combustível não-CGN. Por exemplo Nova Deli requer que todos os transportes públicos usem CGN. No Paquistão os incentivos de preço suplementaram as medidas reguladoras. Os preços aplicados à CGN têm sido estipulados cerca de 50%-60% abaixo do preço do petróleo, com apoio dado pelo governo ao desenvolvimento de infra-estruturas destinadas à produção e distribuição. Cerca de 0.8 milhões de veículos usam CGN hoje em dia e percentagem de mercado continua a aumentar rapidamente (figura 3.6). Para Alem de cortar as emissões de CO2 em cerca de 20%, usar gás natural cria amplos benefícios para a qualidade do ar e para a saúde pública.

No mundo desenvolvido o desenvolvimento de biocombustível é uma das indústrias energéticas com maior nível de crescimento nos últimos cinco anos.

(...)

De uma perspectiva de mitigação das alterações climáticas, a prioridade é alcançar um abatimento na emissão de carbono ao mais baixo limite de custo possível. O problema é que as barreiras de transferência e os subsídios estão a fazer subir o custo da mitigação do carbono, enquanto que, simultaneamente, se adiciona o custo da redução da dependência de petróleo

(...)

Desta perspectiva de mitigação, surge a teoria da destruição criativa, a qual possui aplicação no contexto, nos termos seguintes:

29

Joseph Schumpeter cunhou a expressão “destruição criativa” para descrever um “processo de mutação industrial que revoluciona intensamente a economia a partir do interior, incessantemente destruía a velha, criando incessantemente uma nova”. Identificou três fases no processo de inovação: invenção, aplicação e difusão.

Uma mitigação das alterações climáticas bem sucedidas irá requerer um processo de acelerada “destruição criativa”, com as lacunas entre estas fases a encolher o mais rapidamente possível. O preço do carbono irá ajudar a criar incentivos para a emersão dessas tecnologias – mas não será suficiente. Enfrentando avultados custos capitais, condições incertas de mercado e altos riscos, o sector privado não conseguirá sozinho desenvolver e impulsionar tecnologias ao ritmo necessário, mesmo com os apropriados sinais de preço do carbono. Os governos terão que desempenhar um papel central na remoção de obstáculos para a emersão de descobertas tecnológicas.

O caso para acção de políticas públicas é fundamentado na iminência e na escala da ameaça representada pelas alterações climáticas. Tal como mostrado em capítulos anteriores deste relatório, perigosas alterações climáticas conduzirão ao aumento da pobreza nos países pobres, seguida de catastró_ cos riscos para toda a humanidade. Evitar estes desfechos é um desa _ o para o desenvolvimento humano. Mais ainda, é imperativo para a segurança nacional e global.

(...)

Contrastes com os esforços de I&D para alcançar uma transição para baixos níveis de carbono são por demais evidentes. Os gastos em I&D para os sectores energéticos dos países da OCDE é actualmente cerca de metade dos níveis registrados em termos reais no início dos anos 80 (preços de 2004). Medida como percentagem da reviravolta dos respectivos sectores a despesas da I&O na indústria energética é menos de 1/6 da que a indústria automóvel despende e uma trigésima p arte d e despesa da indústria eléctrica. A distribuição de despesas de pesquisa é igualmente problemática. A despesa pública em I&D tem sido dominada pela energia nuclear, o que representa ainda metade do total.

30

(...)

O resultado final é que o sector da energia tem sido caracterizado por um lento ritmo de inovação com muitas das tecnologias centrais para a produção de energia a partir de carvão e gás a terem mais de três décadas de existência.

(...)

Os desenvolvimentos no sector do carvão demonstram tanto o potencial para descobertas tecnológicas como o lento ritmo de progresso. Existem actualmente cerca de 1200 GigaWatts (GW) de capacidade energética mundial accionada por carvão, sendo este responsável por 40% da produção energética mundial e da emissão de CO2. Com o preço do gás natural a subir e com reservas de carvão distribuídas por todo o mundo, é provável que a percentagem de energia gerada a partir de carvão venha a aumentar com o tempo. A energia gerada a partir de carvão pode ser o impulsionador que conduzirá o mundo a ultrapassar o limite no que diz respeito às alterações climáticas. No entanto, também oferece uma oportunidade.

(...)

A essa altura, é natural que surja a pergunta: como pode, então, o carvão ser utilizado sem causar tantos danos? O mesmo Capitulo 3 fornece a resposta:

Qual é a ligação entre as centrais CCGI e a mitigação das alterações climáticas? A potencial verdadeira descoberta de tecnologia para o carvão é um processo conhecido como Captura e Armazenamento de Carbono (CAC). Ao usar tecnologia CAC é possível separar o gás emitido quando ao combustíveis fosseis são queimados, processa-lo para a sua forma liquida ou sólida e transportá-lo através de condutas, ou por via marítima para uma localização – abaixo do nível do mar, em minas desactivadas, poços de petróleo secos ou outros locais – onde possa ser armazenado. Aplicada em fábricas de carvão, a tecnologia CAC oferece o potencial para zero emissões de CO2. Na teoria, qualquer centro de carvão convencional pode ser convertido para uso da tecnologia CAC, que é de longe a opção de mais baixo custo.

31

Nenhuma tecnologia oferece uma solução mágica para o problema das alterações climáticas, e “escolher os vencedores” é trabalho árduo. Mesmo assim, a CAC é amplamente reconhecida como sendo a melhor aposta para uma severa mitigação à produção de energia a partir de carvão. O desenvolvimento e a implantação em larga escala da CAC poderiam conciliar o expansivo uso de carvão com um orçamento sustentável de carbono. No caso de ser bem sucedida, poderia eliminar o carbono da produção eléctrica, não só em centrais eléctricas mas também de outros locais de produção com altos níveis de carbono – tais como fábricas de cimento e instalações petroquímicas.

(...)

Alguns dos obstáculos à transformação tecnológica da produção eléctrica à base de carvão poderiam ser transpostas através da atribuição de preço ao carbono. Actualmente, as centrais energéticas à base de carvão convencionais gozam de vantagens comerciais por um simples motivo: os seus preços não refletem os custos da sua contribuição para as alterações climáticas. Impor um imposto de 60-100 dólares americanos/ t CO2 ou implementar um rígido sistema de limite e negociação, iria transformar as estruturas de incentivo da indústria do carvão, colocando os produtores mais poluentes em desvantagem. Criar condições de mercado para aumentar o investimento de capital através de incentivos fiscais é uma das condições para uma transição para baixos níveis de carbono na política energética.

(...)

As parcerias público-privadas emergentes têm atingido importantes resultados. Mas, de qualquer modo, são necessárias abordagens mais ambiciosas para acelerar as alterações tecnológicas na indústria do carvão. O Centro Pew de Alterações Climáticas Globais tem argumentado o desenvolvimento de um programa de 30 centrais em 10 anos para os Estados Unidos de forma a demonstrar fiabilidade técnica e criar as condições para uma comercialização rápida. Os custos acrescidos estão estimados entre os 23 e 30 mil milhões de dólares americanos.120 O Centro Pew propôs a criação de um fundo de depósito baseado numa modesta taxa aplicada à produção eléctrica para cobrir os custos. Uma vez que existem estruturas de financiamento e de incentivo que podem ser consideradas, a meta

32

de 30 centrais até 2015 é atingível para os Estados Unidos. Com liderança política a União Européia poderia apontar a um equivalente nível de Ambição.

Mas nem tudo é facilidade quando se trata do processo de Captura e Armazenamento de Carbono, podendo o próprio ser humano ser o maior impeditivo para o seu sucesso:

O perigo é que os fracassos da política pública irão criar outro obstáculo ao desenvolvimento e implementação da CAC. Os avultados custos relacionados com as centrais equipadas com os sistemas CAC podem dar azo à não implementação do sistema em resultado das decisões de investimento na troca da actual capacidade de produção baseada em carvão. Na ausência de sinais do preço do carbono a longo prazo e de estruturas de incentivo para recompensar a electricidade com baixos níveis de carbono, os produtores de energia podem vir a tomar decisões que dificultem a transição para a CAC.

Espera-se que isto assinale o desperdício de outra oportunidade. Cerca de um terço da capacidade energética de carvão existente na União Européia alcançará o fim do seu tempo de vida tecnológico nos próximos 10 a 15 anos. Nos Estados Unidos, onde o carvão é ressurgente, foram feitas candidaturas e propostas para o desenvolvimento de cerca de 150 novas centrais energéticas de carvão até 2030 com um investimento projectado de cerca de 143 mil milhões de dólares americanos.

Tanto a União Européia como os Estados Unidos têm oportunidade de usar a desactivação do stock antigo de energia à base de carvão para criar um ambiente que providencie uma mais rápida transição para a CAC. Aproveitar esta oportunidade irá requerer avanços ousados no que respeita a política energética. Aumentar o investimento nos projectos de demonstração, evidenciar intenções claras de taxação das emissões de carbono e/ou introduzir medidas mais rígidas de limite e negociação, assim como usar autoridade reguladora para limitar a criação de centrais energéticas não-CCGI, são algumas das políticas necessárias28.

28 Relatório de Desenvolvimento Humano 2007/2008. Disponível em: <http://www.pnud.org.br/arquivos/arqui1196121774.zip >, acessado em 11 de junho de 2008, às 01:20.

33

Destarte, uma vez esclarecida a gravidade da existência do

aquecimento global, bem como alternativas para sua resolução, convém abordar

as medidas que atendem ao novo ideal de política de crescimento econômico: a

política do desenvolvimento sustentável.

1.4 A POLÍTICA DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

Em tempos de aquecimento global e preocupação com o

equilíbrio entre preservação e progresso tecnológico, ganhou evidência mundial a

necessidade de criação de uma prática de crescimento responsável, qual seja,

uma política de desenvolvimento sustentável. Neste sentido, destaca-se uma

iniciativa da Comissão Mundial da ONU sobre o Meio Ambiente e

Desenvolvimento (do inglês, United Nations Conference for Environment and

Development – UNCED), na época presidida por Gro Harlem Brundtland e

Mansour Khalid. Nos primeiros meses, a UNCED apresentou um documento

chamado “Our Common Future”, mais conhecido por relatório Brundtland.

Publicado em 1987, o relatório traz a seguinte definição de desenvolvimento

sustentável:

“In essence, sustainable development is a process of change in which the exploitation of resources, the direction of investments, the orientation of technological development; and institutional change are all in harmony and enhance both current and future potential to meet human needs and aspirations29.”

Com isso, o relatório aponta o desenvolvimento sustentável

como “um processo de mudança no qual a exploração dos recursos, a direção

dos investimentos, a orientação do desenvolvimento tecnológico e a mudança

institucional estão todas em harmonia e reforçar os potenciais atual e futuro para

encontrar as necessidades e aspirações humanas”.

29 “Our Common Future, Chapter 2: Toward Sustainable Development”, disponível em http://www.un-documents.net/ocf-02.htm#I, acessado em 20 de outubro de 2007, às 10:00, traduzido.

34

Por sua vez, MERICO traz seu próprio conceito de

desenvolvimento, sob uma abordagem mais objetiva, na forma que se faz

presente a seguir:

“Tomando seu significado mais simples, sustentabilidade significa tornar as coisas permanentes ou duráveis. Desenvolvimento sustentável significaria, portanto, discutir a permanência ou durabilidade da estrutura de funcionamento de todo o processo produtivo30.”

Para uma melhor compreensão de seu conceito, convém

observar o modus operandi do paradoxo entre o crescimento e o meio ambiente.

Neste sentido, MILARÉ aborda a prática do desenvolvimento sustentável, in

verbis:

Compatibilizar meio ambiente e desenvolvimento significa considerar os problemas ambientais dentro de um processo contínuo de planejamento, atendendo-se adequadamente às exigências de ambos e observando-se as suas inter-relações particulares a cada contexto sociocultural, político, econômico e ecológico, dentro de uma dimensão tempo/espaço. Em outras palavras, isto implica dizer que a política ambiental não se deve erigir em obstáculo ao desenvolvimento, mas sim em um de seus instrumentos, ao propiciar a gestão racional dos recursos naturais, os quais constituem a sua base material31.

Entre outras características, o desenvolvimento sustentável

pode ser identificado por sua vinculação à manutenção ou aumento do capital

natural32, o qual seria nosso ambiente natural, o estoque de recursos naturais ou

ativos ambientais existentes (tais como florestas e terras agriculturáveis), que

produzem um fluxo de bens e serviços úteis à sociedade. Capital natural,

portanto, fornece toda espécie de funções ambientais (bens e serviços) que a

30 MERICO, Luiz Fernando Krieger. Introdução à economia ecológica. Blumenau: Editora da FURB, 1996, p.141. 31 MILARÉ, Edis. Direito do ambiente: doutrina, prática, jurisprudência glossário, 2 ed., rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001, p. 741. 32 MERICO, Luiz Fernando Krieger. Introdução à economia ecológica. Blumenau: Editora da FURB, 1996, p.142.

35

sociedade humana pode converter em produtos úteis, os quais mantêm ou

elevam seu bem-estar, no presente e no futuro33.

O desenvolvimento sustentável, como se denota, requer um

estoque constante de capital natural. Para tanto, é de suma importância a

manutenção das funções econômicas do ambiente natural – tais como o

suprimento direto de recursos naturais (matérias-primas) para o processo

produtivo (madeira, minerais, água, solo); o fornecimento de serviços ambientais

do sistemas de suporte da vida (ciclos biogeoquímicos, regulação climática,

proteção da camada de ozônio, funcionamento geral dos ecossistemas) a

capacidade assimilativa dos resíduos oriundos do processo econômico

(capacidade assimilativa dos oceanos, rios, atmosfera); e, ainda, como fonte

direta de bem-estar através da utilização da natureza para apreciação, valores

espirituais, recreação, etc.34

Para que se possa alcançar tal fim, é preciso que sejam

adotadas posturas condizentes, tais como a utilização racional dos recursos

renováveis (em quantia que não seja superior à sua capacidade de regeneração)

e a inexistência de despejo residual, na natureza, em quantia maior que sua

capacidade de assimilação. Agindo assim, os estoques de recursos renováveis

não acabarão e a capacidade assimilativa da natureza não será ultrapassada, o

que sustentaria o funcionamento da economia35.

Nestes termos, não se pode olvidar de trazer à baila uma

amostra do que é um mecanismo de compensação ambiental, sendo que esta

possui abrangência mundial e atende pelo nome de “Protocolo de Kyoto”, cuja

natureza e demais aspectos serão abordados no capítulo seguinte.

33 MacDonald, D. V. Applying the concept of natural capital criticality to regional resource management. Ecological Economics, n. 29, 1999, p. 73-87, CAPITAL NATURAL NA PERSPECTIVA DA ECONOMIA. Disponível em: <http://www.anppas.org.br/encontro_anual/encontro1/gt/recursos_hidricos/Valdir%20Frigo%20Denardin.pdf>, 23/10/2007, às 22:40. Valdir Frigo Denardin* Mayra Taiza Sulzbach** 34 MERICO, Luiz Fernando Krieger. Introdução à economia ecológica. Blumenau: Editora da FURB, 1996, p.142-143. 35 MERICO, Luiz Fernando Krieger. Introdução à economia ecológica. Blumenau: Editora da FURB, 1996, p. 143.

36

CAPÍTULO 2

PROTOCOLO DE KYOTO

2.1 RAIZES HISTÓRICAS DO PROTOCOLO DE KYOTO

O Protocolo de Kyoto é fruto de uma sensibilização tardia,

uma vez que a História da humanidade, em sua grande parte, registra uma

negligência ambiental datada de séculos, quando ainda predominava a crença no

sobrenatural, nas chamadas forças da natureza, que dariam fim – sem a

necessidade de intervenção humana – nos resíduos produzidos pela civilização36.

Saliente-se, inclusive, que, a despeito de todo o significativo

desenvolvimento da Física e da Química – ciências notadamente ligadas à

observação da natureza – que se viu nos séculos XVIII e XIX, não há registros de

qualquer manifestação que visasse sensibilizar a comunidade filosófico-científica

acerca dos efeitos danosos do progresso desenfreado37.

A percepção da natureza como um bem perecível – e dos

efeitos gravosos da negligência para com a mesma – começou a ser fomentada

no período entre guerras (1919 a 1945), como o I Congresso Internacional para a

Proteção da Natureza (1923), realizado em Paris; a atuação de diversas ONGs; e

a Convenção para a Regulamentação da Pesca da Baleia e Regulamentação

Anexa à Mesma, adotada em Washington em 1946, oriunda de Convenção

36 SOARES, Guido Fernando Silva. A proteção internacional do meio ambiente. São Paulo: Manole, 2003, p. 15. 37 SOARES, Guido Fernando Silva. A proteção internacional do meio ambiente. São Paulo: Manole, 2003, p. 15.

37

homônima de 1931 – adotada em Genebra – e vigente até hoje38. Mas nada disso

foi mais relevante que o Caso da Fundação Trail39.

Razão de uma arbitragem internacional entre EUA e

Canadá, o Caso da Fundação Trail (em inglês, Trail Smelter) veio das queixas de

inúmeras pessoas situadas em Washington/EUA, pelos efeitos da fumaça tóxica –

dióxido de enxofre – de uma fábrica de fundição de cobre e zinco lotada na cidade

de Trail/Canadá, cuja extensão ultrapassava o limite da fronteira canadense e

trazia prejuízos à saúde, bem como ao bem-estar de pessoas, animais e

propriedades situados em território estadunidense40.

Após várias negociações e ações judiciais, que não

bastaram para frear a poluição, o governo dos EUA levou o caso a um tribunal

arbitral ad hoc. A sentença proferida para tal caso – que declarou que nenhum

Estado poderia usar seu território de forma que viesse a danificar território de

outrem – foi a base para um dos Princípios da Declaração de Estocolmo, de 1972,

vindo a ser mencionado novamente na Declaração do Rio de Janeiro sobre Meio

Ambiente e Desenvolvimento, em 199241. Sendo assim, convém explanar a

respeito destes dois eventos, como ser fará a seguir.

2.1.1 Protocolo de Kyoto

O Protocolo de Kyoto consiste em medida adotada para

gerar acordos e discussões internacionais para conjuntamente estabelecer metas

de redução na emissão de gases-estufa na atmosfera, principalmente no tocante

aos países industrializados, além de criar formas de desenvolvimento que não

causem tanto impacto aos países em desenvolvimento42. Criada por uma

conferência diplomática, realizada paralelamente a uma reunião ordinária da

38 SOARES, Guido Fernando Silva. A proteção internacional do meio ambiente. São Paulo: Manole, 2003, p. 19. 39 SOARES, Guido Fernando Silva. A proteção internacional do meio ambiente. São Paulo: Manole, 2003, p. 21. 40 SOARES, Guido Fernando Silva. A proteção internacional do meio ambiente. São Paulo: Manole, 2003, p. 21-22. 41 SOARES, Guido Fernando Silva. A proteção internacional do meio ambiente. São Paulo: Manole, 2003, p. 22-23. 42 Disponível em: < http://www.brasilescola.com/geografia/protocolo-kyoto.htm> acessado em 29 de junho de 2008.

38

Conferência das Partes, reunião esta composta pelos países-integrantes da

Convenção-Quadro de 1992, que disciplina a redução na emissão de vários

gases. Estes consistem nos gases expostos na Convenção-Quadro, além de

outros três, denominados sintéticos ou exóticos, a saber: hidrofluorcarbono –

NFC; perfluorcarbono – PFC; e hexafluoreto sulfuroso – SF43.

A melhor compreensão do Protocolo de Kyoto está

condicionada a uma análise de sua estrutura legal e organizacional, bem como

dos termos nos quais o Brasil se insere junto ao mesmo. Entretanto, para que se

possa efetuar tal abordagem, mister se faz observar o contexto histórico no qual

se originou o Protocolo de Kyoto, conforme se fará a seguir.

2.1.2 Declaração de Estolcomo-1972

A origem da Declaração de Estocolmo remonta à

Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, ocorrida entre

os dias 5 a 16 de junho de 1972. Esta, por sua vez, foi precedida de um Painel de

Peritos em Desenvolvimento e Meio Ambiente (conhecido como Relatório de

Founex em homenagem à cidade que sediou tal estudo), bem como por diversas

reuniões preparatórias, nas quais se evidenciou a oposição entre países

desenvolvidos e em desenvolvimento (estes queriam o desenvolvimento sem

interferências ou políticas internacionais que os onerassem, enquanto aqueles

queriam a preservação a todo custo, contanto que o mesmo ficasse com os

países em desenvolvimento) 44.

Diante de tal contexto e uma vez findas as reuniões

preparatórias, o governo sueco ofereceu sua capital como sede do evento que se

avizinhava. Surgia, então, a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio

Ambiente Humano, a qual teve como marco uma maturação do direito ambiental

43 SOARES, Guido Fernando Silva. A proteção internacional do meio ambiente. São Paulo: Manole, 2003, p. 151-152. 44 Disponível em: <http://www.ecclesia.com.br/ekklisia/biblioteca/fe_meio_ambiente/entendendo_o_meio_ambiente.htm> acessado em 29 de junho de 2008.

39

internacional, perceptível por seu legado, composto não apenas pela Declaração,

mas também pelos feitos a saber45:

• Um Plano de Ação para o Meio Ambiente (conjunto

de 109 recomendações centradas em políticas de

avaliação do meio ambiente mundial, de gestão do

meio ambiente e de medidas de apoio, como a

educação e formação de especialistas);

• Uma Resolução sobre Aspectos Financeiros e

Organizacionais no âmbito da ONU;

• O Programa das Nações Unidas sobre o Meio

Ambiente – PNUMA (em inglês, UNEP), composto por

um conselho de administração de 58 membros,

delegados, dos Estados, e de um secretariado,

integrado por 181 administradores, funcionários

internacionais, com sede em Nairóbi, no Quênia.

O surgimento da Declaração de Estocolmo teve sua razão

ao fim da Segunda Guerra Mundial. Diante do significativo dano causado por esta

em escala mundial, surgiu uma preocupação no sentido de criar uma política de

defesa internacional que pudesse prever soluções para a totalidade dos assuntos

políticos da época e futuros. Desta forma, deu-se início ao denominado sistema

da segurança coletiva, sob a regência da ONU, com a presença de todos os

Estados soberanos e independentes da atualidade, composta por duas formas de

organização: uma Assembléia Geral e um Conselho de Segurança46.

A Assembléia Geral permite a participação de todos os

Estados-membros, com igual valor de voto. Já o Conselho de Segurança, peça-

chave para as negociações de paz, tem participação restrita, uma vez que esta se

limita aos Membros Permanentes – Estados Unidos, República da China, França,

45 SOARES, Guido Fernando Silva. A proteção internacional do meio ambiente. São Paulo: Manole, 2003, p. 44. 46 SOARES, Guido Fernando Silva. A proteção internacional do meio ambiente. São Paulo: Manole, 2003, p. 24.

40

Reino Unido, Irlanda do Norte e a então União Soviética – e aos demais

membros, eleitos pela Assembléia Geral para mandatos rotativos de dois anos,

num total de dez membros eleitos desta forma, distribuídos conforme

representação geográfica (cinco da África e da Ásia, um da Europa Oriental, dois

da Europa Ocidental e dois da América Latina) 47.

Tamanha importância vem do fato de ter sido o berço de

várias discussões internacionais, principalmente a partir de 1960, quando

inúmeros países africanos e asiáticos, recém-independentes de seus

colonizadores europeus, tornaram-se membros plenos da ONU, o que modificou

radicalmente a forma com que as discussões internacionais doravante se

desenrolaram, de forma que em 1964 foi convocada a Unctad – United Nations

Conference on Trade and Development (em português, Conferência das Nações

Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento), que se tornou relevante no cenário

internacional pelo abandono da teoria da igualdade de tratamento entre Estados

soberanos em prol de uma nova concepção, reconhecendo a necessidade de

tratamento desigual entre os Estados, a fim de que se pudesse favorecer os

menos desenvolvidos48.

Situações como essa tornaram indispensável medidas como

a Declaração sobre o Meio Ambiente Humano, a qual viria a marcar todo o

desenvolvimento posterior do direito internacional do meio ambiente49, inclusive

no Brasil, quando a consciência ambiental provocada pela Declaração permitiu a

origem de uma legislação interna desenvolvida e a preservação do meio ambiente

como bem tutelado pela norma suprema pátria: a Constituição Federal de 198850.

47 SOARES, Guido Fernando Silva. A proteção internacional do meio ambiente. São Paulo: Manole, 2003, p. 24-25. 48 SOARES, Guido Fernando Silva. A proteção internacional do meio ambiente. São Paulo: Manole, 2003, p. 26-27. 49 SOARES, Guido Fernando Silva. A proteção internacional do meio ambiente. São Paulo: Manole, 2003, p. 45. 50 SOARES, Guido Fernando Silva. A proteção internacional do meio ambiente. São Paulo: Manole, 2003, p. 48.

41

Como conseqüência de tais eventos, 20 anos depois, uma

nova Conferência ocorreria, desta vez no Rio de Janeiro51, conforme se verá a

seguir.

2.1.3 Declaração do Rio de Janeiro sobre meio ambiente e desenvolvimento-1992

Os anos que se seguiram à Conferência de Estocolmo viram

grandes catástrofes ambientais que, embora fossem localizadas, obtiveram

grande repercussão nas relações internacionais. O número constante de

acidentes e o nível cada vez maior de destruição e crueldade de tais episódios,

aliados a uma divulgação de proporções globais, desencadearam uma busca

desesperada pelas soluções normativas globais52. Como reflexo disso, a

Assembléia Geral da ONU convocou uma grande conferência internacional para

discutir a preservação do meio ambiente, sem prejuízo do desenvolvimento53.

Visando a realização de tal evento, designou-se um Comitê

Preparatório para a Assembléia Geral da ONU, em nome da qual se realizaram

diversas sessões entre 1990 e 1991, ano no qual o Brasil se ofereceu como sede,

dando origem a um acordo bilateral entre este e a ONU, estipulando a realização

do evento no Rio de Janeiro, com duração de 10 a 22 de junho de 1992. Nascia,

então, a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e

Desenvolvimento, mais conhecida como ECO-9254.

Além do enfoque privilegiado sobre o desenvolvimento da

economia internacional dentro dos preceitos de defesa do meio ambiente55, a

ECO-92 também protagonizou outro fato histórico: o maior número de

participantes em uma conferência das Nações Unidades até então, com 178

51 SOARES, Guido Fernando Silva. A proteção internacional do meio ambiente. São Paulo: Manole, 2003, p. 48. 52 SOARES, Guido Fernando Silva. A proteção internacional do meio ambiente. São Paulo: Manole, 2003, p. 48. 53 SOARES, Guido Fernando Silva. A proteção internacional do meio ambiente. São Paulo: Manole, 2003, p. 52. 54 Disponível em: <http://www.ecclesia.com.br/ekklisia/biblioteca/fe_meio_ambiente/entendendo_o_meio_ambiente.htm> acessado em 29 de junho de 2008. 55 SOARES, Guido Fernando Silva. A proteção internacional do meio ambiente. São Paulo: Manole, 2003, p. 52.

42

governos e a presença de mais de 100 chefes de estado ou de governos, além de

organizações não-governamentais. Como síntese do que ocorrera em tal

conferência, foi emitido o Relatório da Delegação Brasileira/1992, o qual, além de

ser um retrato da Conferência, constituiu uma base para as futuras ações

diplomáticas do Brasil, tanto na política quanto no direito internacional do meio

ambiente56.

Em que pese o evento em tela, destacam-se três grandes

resultados, quais sejam: a assinatura de duas convenções multilaterais –

Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima e a Convenção

sobre a Diversidade Biológica – que já se encontravam em andamento; a

subscrição de três documentos – Declaração do Rio de Janeiro sobre Meio

Ambiente e Desenvolvimento, Declaração de Princípios sobre as Florestas e a

Agenda 21 – que fixaram os princípios normativos do direito internacional do meio

ambiente para o futuro; e a adoção de compromissos dos Estados, relativos à

determinação da pauta de próximas reuniões diplomáticas multilaterais, com

enfoque para temas como a proteção da biodiversidade e aquecimento da

temperatura global da Terra57.

No caso da Agenda 21 em específico, vale ressaltar que é

um documento normativo de normatividade reduzida, uma vez que não possui a

efetividade de uma declaração e muito menos de um tratado ou convenção

internacional. Trata-se tão somente de uma lista de prioridades, adotada pelos

Estados. Porém, não se trata de meras intenções políticas, uma vez que há o

acompanhamento por um órgão das Nações Unida e com possibilidade de

financiamento a ações isoladas dos Estados ou do conjunto das relações

internacionais58.

Sobre a Agenda 21, SOARES apresenta em sua obra uma

interpretação sobre a tal figura normativa, como se denota logo abaixo:

56 SOARES, Guido Fernando Silva. A proteção internacional do meio ambiente. São Paulo: Manole, 2003, p. 56. 57 SOARES, Guido Fernando Silva. A proteção internacional do meio ambiente. São Paulo: Manole, 2003, p. 56-57. 58 SOARES, Guido Fernando Silva. A proteção internacional do meio ambiente. São Paulo: Manole, 2003, p. 67.

43

A nosso ver, a Agenda 21 é uma das novas formas

de atos normativos típicos do século XX, resultante

da predominância da diplomacia multilateral, exercida

nas organizações internacionais, sob a égide de um

dever geral de cooperação entre os Estados. Na

teoria moderna, pode-se configurar como uma soft

law, ou seja, atos normativos que criam obrigações

menos impositivas aos Estados (portanto,

acompanhados de sanções brandas, com o objetivo

de se tornar mais suscetíveis de adoção pelos

Estados), em tudo assimiláveis às tradicionais

obrigações naturais do velho direito civil da família,

do direito romano-germânico59.

As prioridades delimitadas pela Agenda 21 podem se

resumir nas seguintes: atingir um crescimento sustentável, pela integração dos

conceitos de meio ambiente e desenvolvimento, dentro dos processos decisórios;

prepugnar pelo fortalecimento de um mundo de eqüidade, pelo combate à

pobreza e pela proteção da saúde humana; tornar o mundo habitável, por meio da

disciplina relativa a questões de suprimento de água às cidades, de administração

de rejeitos sólidos e da poluição urbana; encorajar o eficiente uso dos recursos,

categoria que inclui o gerenciamento de recursos energéticos, o cuidado e uso de

água doce, o desenvolvimento florestal, a administração de ecossistemas frágeis,

a conservação da biodiversidade e a administração dos recursos da terra;

proteger os recursos regionais e globais, incluindo a atmosfera, os oceanos e

mares e os recursos vivos marinhos; e propiciar um efetivo gerenciamento dos

resíduos químicos e perigosos e de resíduos nucleares60.

Os progressos obtidos junto a ECO-92 se fizeram sentir ao

redor do mundo, mormente por conta de três aspectos: primeiramente, a

reafirmação do princípio da necessidade de se construir as condições para

estabelecer-se uma igualdade jurídica entre os Estados, a partir do

59 SOARES, Guido Fernando Silva. A proteção internacional do meio ambiente. São Paulo: Manole, 2003, p. 67. 60 SOARES, Guido Fernando Silva. A proteção internacional do meio ambiente. São Paulo: Manole, 2003, p. 68-69.

44

reconhecimento de uma desigualdade de fato entre eles; secundariamente, o

dever de os Estados fortalecerem a noção de cooperação internacional, no

tocante às medidas de preservação ambiental, independente de alcance, que

gera deveres jurídicos e obrigatórios; e, por fim, a introdução do conceito de

sustentabilidade, que deverá influenciar quaisquer decisões, políticas

governamentais ou normas votadas pelos Estados, seja no ordenamento jurídico,

seja nas relações internacionais, gerando deveres para os próprios Estados e dos

particulares a eles submetidos61.

Sobre a sustentabilidade, convém ressaltar que a mesma

possui um sinônimo de natureza política e, por vezes, jurídica, que é o conceito

de desenvolvimento sustentável, segundo o qual a proteção ao meio ambiente

deve necessariamente ser associada a todas as áreas do desenvolvimento pleno

do homem, de forma que a preservação do ambiente local ou global deve se

relacionar às condições políticas, econômicas e culturais dos povos62.

Finalmente, a ECO-92 também tem importância por ter sido

berço das primeiras manifestações do que viria a se tornar o Protocolo de Kyoto,

o qual terá seu contexto histórico melhor explanado no próximo subtítulo63.

2.1.4 Protocolo de Kyoto-1997

Como já mencionado, o Protocolo de Kyoto teve sua origem

na Conferência conhecida como ECO-92, mais precisamente com a Convenção-

Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (United Stations Framework

Convention on Climate Change – UNFCCC), primeiro instrumento internacional a

versar sobre as alterações no clima. Tendo sua primeira projeção na Cúpula da

Terra (Earth Summit), ocorrida na ECO-92, a Convenção-Quadro foi de fato

61 SOARES, Guido Fernando Silva. A proteção internacional do meio ambiente. São Paulo: Manole, 2003, p. 73-74. 62 SOARES, Guido Fernando Silva. A proteção internacional do meio ambiente. São Paulo: Manole, 2003, p. 76-77. 63 SISTER, Gabriel. Mercado de Carbono e Protocolo de Quioto. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007, p. 7.

45

concebida em Nova York, em 9 de maio do mesmo ano, passando a viger desde

1994 até 2006, sendo retificada inúmeras vezes64.

Desde quando se iniciou a vigência da Convenção-Quadro,

treze encontros foram realizados, sendo o mais importante desses o datado de

1997, ocorrido em Kyoto, pois a partir deste passou-se a enfatizar a utilização de

mecanismos de mercado, visando tanto a redução dos custos de mitigação do

efeito estufa quanto o estabelecimento do desenvolvimento sustentável em países

subdesenvolvidos. Uma evidência de tal característica foi a consolidação de

princípios e mecanismos em um documento, conhecido como Protocolo de Kyoto.

Com a entrada deste, os países-membros se viram obrigados a reduzir suas

emissões de gases em, no mínimo, 5% do emitido em 199065.

Até 28 de setembro de 2006, 166 países e bloco

econômicos – Brasil inclusive – haviam ratificado, aceitado, aprovado ou aderido

ao Protocolo de Kyoto, o qual passou a vigorar em 16 de fevereiro de 2005,

mediante a ratificação de 55 países-partes da Convenção-Quadro sobre Mudança

do Clima e, também, por países que representam, pelo menos, 55% das

emissões globais de dióxido de carbono em 199066.

Encerrada a análise sob o contexto histórico do Protocolo de

Kyoto, convém analisar seu conceito e estrutura legal e organizacional, a ser feita

nos termos seguintes.

2.1.5 O Brasil dentro do protocolo de kyoto

O ingresso do Brasil no Protocolo de Kyoto se deu com sua

promulgação em 23 de agosto de 2002, por meio do Decreto n. 5.445, de 12 de

maio de 2005. Entretanto, antes mesmo de sua ratificação, datada de 23 de

agosto de 2002, o governo brasileiro já fazia uso de suas atribuições para

64 SISTER, Gabriel. Mercado de Carbono e Protocolo de Quioto. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007, p. 7. 65 SISTER, Gabriel. Mercado de Carbono e Protocolo de Quioto. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007, p. 8. 66 SISTER, Gabriel. Mercado de Carbono e Protocolo de Quioto. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007, p. 9.

46

promover mudanças que viabilizassem a aplicação de parte do teor do

Protocolo67.

Neste sentido, em 21 de junho de 1994 – menos de dois

anos após a Cúpula da Terra no Rio de Janeiro – o governo brasileiro criou a

Comissão Interministerial para o Desenvolvimento Sustentável (CIDES), com o

propósito de assessora o Presidente da República em decisões pertinentes a

estratégias e políticas relacionadas ao desenvolvimento sustentável, sendo

chefiada pelo Ministrado de Estado Chefe da Secretaria de Planejamento,

Orçamento e Coordenação da Presidência da República e integrada pelos outros

Ministros de Estado68.

Em 26 de fevereiro de 1997, a CIDES foi substituída pela

Comissão de Políticas de Desenvolvimento Sustentável, presidida pelo Ministério

do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal e que tem como

integrantes o Ministério do Planejamento e Orçamento; o Ministério das Relações

Exteriores; o Ministério da Ciência e Tecnologia; a Secretaria de Assuntos

Estratégicos da Presidência da República; a Secretaria de Coordenação da

Câmara de Políticas Sociais; e cinco integrantes da sociedade civil, de livre

escolha do Ministro de Estado do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da

Amazônia Legal69.

A despeito do fato de, até então, não ter ratificado o

Protocolo de Kyoto, em 7 de julho de 1999 o governo brasileiro criou a Comissão

Interministerial de Mudança Global do Clima (CIMGC) para, entre outras funções,

emitir pareceres sobre propostas de políticas setoriais, instrumentos legais e

normas que contenham componente relevante para a mitigação da mudança

global do clima e para adaptação do País aos seus impactos; assessorar o

Governo nas negociações perante a Convenção-Quadro e demais instrumentos

de que o Brasil seja parte; definir critérios de elegibilidade adicionais aos

67 SISTER, Gabriel. Mercado de Carbono e Protocolo de Quioto. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007, p. 27. 68 SISTER, Gabriel. Mercado de Carbono e Protocolo de Quioto. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007, p. 27. 69 SISTER, Gabriel. Mercado de Carbono e Protocolo de Quioto. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007, p. 28.

47

considerados pelos Organismos encarregados do Mecanismo de

Desenvolvimento Limpo, segundo estratégias nacionais de desenvolvimento

sustentável; e articular com entidades da sociedade civil no cumprimento aos

compromissos assumidos perante a Convenção-Quadro e demais instrumentos

de que o Brasil seja parte70.

Tal Comissão expediu três Resoluções até o momento: a

primeira data de 11 de setembro de 2003 e disciplinou os requisitos e

procedimentos para a apreciação de projeto de Mecanismo de Desenvolvimento

Limpo – MDL – por parte da Secretaria Executiva da CIMGCC, com base no

Acordo de Marrakesh; a segunda data de 10 de agosto de 2005 e alterou certos

dispositivos da primeira Resolução, aprovando ainda os procedimentos relativos

às atividades de projetos de (re)florestamento no âmbito do MDL; e a terceira data

de 24 de março de 2006 e estabeleceu – em linhas gerais – os procedimentos

para aprovação das atividades de projetos de pequena escala no âmbito do

MDL71.

O ingresso do País no Protocolo de Kyoto fez com que

surgisse um crescente interesse no mercado brasileiro pela estruturação de

projetos de geração e redução de emissão de gases de efeito estufa, mormente

no que se refere ao setor energético, indústria energética e energia renovável72.

Aliada às outras iniciativas, tem-se por destaque a criação

de um Mercado Brasileiro de Reduções de Emissões (MBRE) com o propósito de

desenvolver um sistema eficiente de negociação de certificados ambientais, em

concordância com os princípios subjacentes ao Protocolo de Kyoto. Tal proposta

se dá por meio da criação de uma base de ativos do mercado de redução de

emissões de gases de efeito estufa (RCEs)73.

70 SISTER, Gabriel. Mercado de Carbono e Protocolo de Quioto. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007, p. 28. 71 SISTER, Gabriel. Mercado de Carbono e Protocolo de Quioto. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007, p. 29. 72 SISTER, Gabriel. Mercado de Carbono e Protocolo de Quioto. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007, p. 29-31. 73 SISTER, Gabriel. Mercado de Carbono e Protocolo de Quioto. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007, p. 32.

48

2.2 CONTROVERSIAS SOBRE A APLICAÇÃO DO PROTOCOLO DE KYOYO

O Protocolo de Kyoto é uma medida de cunho econômico e

que tem seus méritos, dentro os quais se destaca o fato de estar de acordo com o

objetivo máximo da UNFCCC (United Nations Framework Convention on Climate

Change, ou Convenção-Quadro das Nações Unidas para Mudança do Clima),

qual seja, a estabilização da concentração de gases de efeito estufa na

atmosfera. Outras virtudes incluem a transferência de tecnologias e fundos para a

adaptação de países mais vulneráveis, o impulsionamento do desenvolvimento

sustentável, entre outros74.

Há, entretanto, os que se oponham ao Protocolo, cada frente

com seus próprios motivos. Um dos aspectos apontados é que a proposta original

seria modesta demais: muitos dos opositores afirmam que uma redução de 5,2%

até 2012 não será suficiente75. Outros afirmam que o mesmo se limita à redução

da emissão de gases, ignorando outros aspectos que poderiam afetar o

aquecimento global, como o crescimento populacional, por exemplo. Desta forma,

o Protocolo de Kyoto seria mais um planejamento anti-industrial que um esforço

para conter o aquecimento global76. Finalmente, há quem aponte que seu teor

não baste para reduzir a emissão dos gases, chegando a questionar a eficácia de

práticas como o plantio de florestas para produzir créditos de carbono, aos quais

tantos países estão se dedicando para cumprir suas metas77.

Inobstante a existência de pontos negativos, o Protocolo de

Kyoto é uma forma de impor metas quantitativas de redução das emissões e

prover o comércio de créditos para diminuir o custo de se atingir tais metas. Não é

a única – e nem a melhor – forma de se mitigar as emissões de gases do efeito

estufa (há outras alternativas, como ações voluntárias de países e grandes

74 Disponível em: <http://www.carbonobrasil.com/news.htm?id=121428&section=18> acessado em 20 de maio de 2008. 75 Disponível em: <http://www.carbonobrasil.com/news.htm?id=121428&section=18> acessado em 20 de maio de 2008. 76 Disponível em: <http://environment.about.com/od/kyotoprotocol/i/kyotoprotocol_2.htm> acessado em 20 de maio de 2008.acessado em 20 de maio de 2008. 77 Disponível em: <http://environment.about.com/od/kyotoprotocol/i/kyotoprotocol_2.htm> acessado em 20 de maio de 2008.

49

geradores de emissões), mas é inegável que sua iniciativa tem promovido

mudanças no cenário ambiental mundial78.

Sobre as mudanças causadas pelo Protocolo de Kyoto,

convém dedicar especial atenção ao Mercado de Carbono, a ser analisado no

terceiro – e último – capítulo deste estudo.

78 Disponível em: <http://www.carbonobrasil.com/news.htm?id=121428&section=18> acessado em 20 de maio de 2008.

50

CAPÍTULO 3

CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE O MERCADO DE CARBONO

3.1 O LEGADO DO PROTOCOLO DE KYOTO

O Protocolo de Kyoto surgiu da necessidade dos países de

reverter o crescimento das emissões iniciadas nos países desenvolvidos e, assim,

evitar os efeitos decorrentes das mudanças climáticas, já perceptíveis

atualmente79. Para tanto, incumbiu os Países-Membros de, no período de 2008 a

2012, reduzir suas emissões em relação aos níveis de 1990, conforme art. 3º, § 1º

da Convenção-Quadro:

As partes incluídas no Anexo I devem, individual ou

conjuntamente, assegurar que suas emissões antrópicas agregadas, expressas

em dióxido de carbono equivalente, dos gases de efeito estufa listados no Anexo

A não excedam suas quantidades atribuídas, calculadas em conformidade com

seus compromissos quantificados de limitação e redução de emissões descritos

no Anexo B e de acordo com as disposições deste Artigo, com vistas a reduzir

suas emissões totais desses gases em pelo menos 5 por cento abaixo dos níveis

de 1990 no período de compromisso de 2008 a 2012.

Tal proposta, aliada ao limite de aumento de 15% nas

emissões dentro do período de compromisso, acarreta dificuldades para certos

Países-membros – mormente alguns países europeus, como Portugal, Espanha e

França – atenderem à demanda80, mas sua vigência – e devida obediência –

pode melhorar a situação atual, apesar da falta de apoio de países com alto

79 SISTER, Gabriel. Mercado de Carbono e Protocolo de Quioto. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007, p. 8. 80 Disponível em: <http://politicaedireito.tripod.com/id117.html> acessado em 20 de maio de 2008.

51

índice, de emissão, como os EUA, que respondem por cerca de 25% da emissão

de gases poluentes do planeta81. Sua importância também se denota ao

estabelecer linhas gerais para futuras negociações sobre o clima82.

Além disso, há ainda os que defendem o tratado por este ter

feito com que vários países transformassem em lei a meta de reduções das

emissões e que, sem o protocolo, políticos e empresas tentando implementar

medidas ecológicas teriam dificuldades ainda maiores83.

Mas os efeitos do Protocolo de Kyoto não se fazem sentir

apenas no período de compromisso: iniciaram-se os debates para aprovar as

bases do acordo que substituirá a Convenção-Quadro. Com previsão de um plano

de ação até 2009, terá o papel de dar continuidade aos progressos obtidos com o

Protocolo de Kyoto84.

Finalmente, dentre tudo que faz parte da herança do

Protocolo de Kyoto, há que se destacar o Mercado de Créditos de Carbono, o

qual será melhor explanado a seguir.

3.2 CRÉDITOS DE CARBONO VALORAÇÃO E COMÉRCIO

O termo crédito de carbono – do inglês, carbon credits; do

francês, crédits de carbone; do italiano, accreditamento del carbonio85 – é utlizado

para se referir à moeda utilizada no Mercado de Carbono, o qual consiste no

comércio de Reduções Certificadas de Emissões – RCEs –, as quais resultam de

atividades de projetos implementados pelos países para contribuir com o

cumprimento de parte de seus compriomissos quantificados de limitação e

redução. De posse das mesmas, os países em desenvolvimento podem vendê-las

81 Disponível em: <http://www.politicaedireito.com/id274.html> acessado em 20 de maio de 2008. 82 Disponível em: <http://www.bbc.co.uk/portuguese/reporterbbc/story/2007/12/071204_entanda_kyoto_dez_2007.shtml> acessado em 20 de maio de 2008. 83 Disponível em: <http://www.bbc.co.uk/portuguese/reporterbbc/story/2007/12/071204_entanda_kyoto_dez_2007.shtml> acessado em 20 de maio de 2008. 84 Disponível em: <http://radio.un.org/por/detail/5693.html> acessado em 20 de maio de 2008 85 SISTER, Gabriel. Mercado de Carbono e Protocolo de Quioto. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007, p. 48.

52

para os países que não conseguirem reduzir suas emissões de gases de efeito

estufa – GEE86.

Convém ressaltar, porém, que o uso de tal denominação –

crédito de carbono – para designar o comércio das RCEs não cumpre com

exatidão o seu papel, conforme o apontado por SISTER, a seguir:

Em momento oportuno relevei que o uso do simples

termo “Mercado de Carbono” não é apropriado quando

se deseja referir-se à operações com RCEs realizadas

no âmbito do Protocolo de Quioto, uma vez que o

mercado criado à partir do MDL inserido pelo

Protocolo de Quioto não é o único existente no mundo

com o fito de reduzir emissões de gases que causam o

efeito estufa. A lógica é exatamente a mesma no que

diz respeito ao uso da expressão “créditos de carbono”

quando nos referimos às RCEs geradas por atividades

de projeto de MDL implementado no âmbito do

Protocolo de Quioto. Isso porque, muito antes de

existirem as RCEs, ou mesmo o Protocolo de Quioto,

alguns países já haviam introduzido mecanismos de

geração de créditos de emissão de gases poluentes,

os quais já eram tratados como “créditos de

carbono”.87

Pelas razões supra, o doutrinador justifica ser inadequado e

desaconselhável o uso de referida locução com o intuito de referir-se às RCEs88.

Independente de terminologia, o Mercado de Carbono do

Protocolo de Kyoto compreende três formas de operações com RCEs, a saber:

emissão, cessão e promessa de cessão futura89.

86 SISTER, Gabriel. Mercado de Carbono e Protocolo de Quioto. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007, p. 13. 87 SISTER, Gabriel. Mercado de Carbono e Protocolo de Quioto. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007, p. 49. 88 SISTER, Gabriel. Mercado de Carbono e Protocolo de Quioto. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007, p. 49.

53

A modalidade da emissão é a principal forma de operação

com RCEs e, como o nome sugere, consiste na emissão das RCEs pelo

Conselho Executivo do MDL ao titular do projeto de MDL90, a qual compreende

seis etapas consecutivas, quais sejam: elaboração do Documento de Concepção

do Projeto – DCP; validação/aprovação; registro; monitoramento;

verificação/certificação; emissão e aprovação das RCEs91.

Por sua vez, a cessão consiste na negociação entre a parte

geradora das RCEs e a que pretende obtê-las em momento posterior ao

desenvolvimento e implementação do projeto de MDL, bem como da emissão de

RCEs decorrentes de tal projeto92.

Finalmente, tem-se a promessa de cessão futura, tida até

pouco tempo como a modalide de operação mais comum. Como o nome já indica,

funda-se negociação de RCEs entre a parte que gera e aquele interessado na sua

aquisição em momento anterior a sua emissão por parte do Conselho Executivo

do MDL e, em alguns casos, antes mesmo da implementação do projeto de MDL

que deverá gerar tais instrumentos93.

Conforme se denota, as operações com RCEs citadas acima

se fundamentam em relações estabelecidas entre duas parte em que se fixam

obrigações de cumprimento imediato ou diferido. Indo além, pode-se dizer que as

mesmas, ao trazê-las à luz dos institutos basilares do Direito, constituem

verdadeiros negócios jurídicos com características próprias e individuais e

capazes de gerar conseqüências no campo do direito. Neste sentido, tem-se a

explanação de VENOSA:

89 SISTER, Gabriel. Mercado de Carbono e Protocolo de Quioto. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007, p. 50. 90 SISTER, Gabriel. Mercado de Carbono e Protocolo de Quioto. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007, p. 50. 91 SISTER, Gabriel. Mercado de Carbono e Protocolo de Quioto. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007, p. 14. 92 SISTER, Gabriel. Mercado de Carbono e Protocolo de Quioto. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007, p. 50. 93 SISTER, Gabriel. Mercado de Carbono e Protocolo de Quioto. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007, p. 50.

54

“(...) quando existe por parte da pessoa a intenção

específica de gerar efeitos jurídicos ao adquirir,

resguardar, transferir, modificar ou extinguir

direitos, estamos diante do negócio jurídico”94.

Consonante ao conceito supra, tem-se a disposição do art.

104 do Código Civil de 2002, in verbis:

Art. 104. A validade do negócio jurídico requer:

I - agente capaz;

II - objeto lícito, possível, determinado ou determinável;

III - forma prescrita ou não defesa em lei.

Desta forma, sabendo-se que as RCEs são instrumentos

plenamente lícitos, enquanto não contrários à moral, à ordem pública e aos bons

costumes; possíveis, uma vez que não dizem respeito a prestações fisicamente

ou juridicamente impossíveis; determinados ou determináveis, na medida em que

é possível determinar todos os caracteres que as individualizam e identificam na

ocasião em que se celebra o negócio jurídico; e com forma prescrita em lei, como

se observa nos instrumentos legais internacionais e domésticos que já foram

citados; resta apenas a capacidade legal dos agentes envolvidos para que reste

caracterizada a validade plena do negócio jurídico que trata da negociação de

RCEs95.

A seguir, tem-se uma explanação mais detalhada das três

modalidades de operações com RCEs no Mercado de Carbono do Protocolo de

Kyoto, com características e natureza jurídica.

94 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: parte geral, v. 1, 6ª ed., São Paulo: Atlas, 2006, p. 338 e 339. 95SISTER, Gabriel. Mercado de Carbono e Protocolo de Quioto. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007, p. 51-52.

55

3.2.1 Emissão

Por força do Protocolo de Kyoto, muitos dos integrantes se

viram obrigados a reduzir suas emissões de acordo com as metas individuais

prescritas no Anexo B do referido diploma. Não tardou até que se percebesse a

dificuldade que certos países teriam para cumprir com os compromissos de

redução assumidos, razão pela qual surgiu como alternativa a utilização de

mecanismos de flexibilização, como é o caso do Mecanismo de Desenvolvimento

Limpo – MDL.

De forma resumida, pode-se dizer que o MDL previu a

possibilidade dos países que não constassem no Anexo I – dentre eles o Brasil –

implementarem projetos baseados em atividades que resultariam na redução das

emissões de GEE ou no seqüestro de carbono96. Sendo assim, uma vez

apresentado o projeto e concluídas todas as etapas de certificação, estando o

titular com suas emissões abaixo do estipulado, o titular pode solicitar ao

Conselho Executivo do MDL a emissão de RCEs em número respectivo à

quantidade reduzida e/ou seqüestrada – saliente-se que cada unidade de RCE

equivale a uma tonelada métrica de dióxido de carbono (CO2) – e este, por sua

vez, deve creditar o número de RCEs a que faz jus o titular do projeto de MDL em

conta escritural mantida pelo próprio órgão, comunicando tal fato àquele e

disponibilizando a informação em endereço eletrônico na internet97.

A emissão de RCEs, embora um processo razoavelmente

simples, possui aspectos que podem trazer dúvidas, como o fato de que, por um

lado, tem-se o Conselho Executivo do MDL, que assume o compromisso de

conferir ao país não incluído no Anexo I da Convenção-Quadro algo que pode vir

a apresentar valor traduzido em expressão monetária – RCEs/bens intangíveis –

como recompensa pelo preenchimento de determinada condição, qual seja,

96 SISTER, Gabriel. Mercado de Carbono e Protocolo de Quioto. Rio da Janeiro: Elsevier, 2007, p. 52. 97 SISTER, Gabriel. Mercado de Carbono e Protocolo de Quioto. Rio da Janeiro: Elsevier, 2007, p. 52-53.

56

implementação de projeto cuja atividade resulte na redução de emissões de GEE

ou seqüestro de carbono98.

Destarte, convém apontar que, em análise comparativa com

as espécies de contratos e atos unilaterais previstos no ordenamento jurídico

pátrio, constata-se que, a despeito de eventuais semelhanças, nenhuma das

formas descritas em nosso direito compreende com perfeição a figura da emissão

de RCEs, o que a torna uma forma atípica de negócio jurídico99, ao contrário da

modalidade de cessão, a próxima modalidade a ser analisada.

3.2.2 Cessão

Diferentemente da emissão, esta modalidade consiste em

verdadeiro negócio jurídico e se dá por meio da transferência das RCEs

depositadas na conta do titular do projeto de MDL – neste caso, localizado no

Brasil – para a conta daquele que possui o compromisso de reduzir suas

emissões mediante o pagamento de uma contraprestação – lembrando-se que a

operação de transferência de RCEs entre conta é realizada pelo Conselho

Executivo do MDL em seu escritório em Bonn, Alemanha: portanto, fora do

território brasileiro100.Em suma, consiste na negociação entre a parte que gerou

as RCEs e aquela interessada na sua aquisição no momento em que as RCEs já

foram emitidas, ou seja, quando referidos documentos já existem101.

Cumpre ressaltar que as RCEs, por serem bens incorpóreos

ou intangíveis, em razão de sua natureza imaterial, não estão sujeitas aos

98 SISTER, Gabriel. Mercado de Carbono e Protocolo de Quioto. Rio da Janeiro: Elsevier, 2007, p. 53. 99 SISTER, Gabriel. Mercado de Carbono e Protocolo de Quioto. Rio da Janeiro: Elsevier, 2007, p. 53. 100 SISTER, Gabriel. Mercado de Carbono e Protocolo de Quioto. Rio da Janeiro: Elsevier, 2007, p. 53-54. 101 SISTER, Gabriel. Mercado de Carbono e Protocolo de Quioto. Rio da Janeiro: Elsevier, 2007, p. 54.

57

negócios jurídico de compra e venda, podendo se sujeitar apenas à forma jurídica

de cessão102.

Neste sentido, tem-se o entendimento de VENOSA, in

verbis:

As coisas corpóreas podem ser objeto de

compra e venda, enquanto as incorpóreas

prestam-se à cessão. As coisas incorpóreas

não podem ser objeto de negócios jurídicos de

usucapião nem de transferência pela tradição,

a qual requer a entrega material da coisa103.

Desta forma, as RCEs tão-somente se sujeitam à forma

jurídica das tradicionais operações de cessão de bens intangíveis ou direitos104,

conforme, inclusive, atesta RIZZARDO:

(...) é um negócio pelo qual o credor transfere a outrem o seu direito. Substitui-se o credor originário por outra pessoa, mantendo-se, porém, os demais elementos do contrato. Trata-se, aqui, da transferência de créditos, e não de bens materiais, ou de contratos propriamente ditos105.

Em assim sendo, por se estar diante de negócio jurídico cujo

objeto se reduz à obtenção de bens imateriais – ou intangíveis – mediante

pagamento, é natural concluir que as operações que tenham como propósito a

negociação de RCEs devem atender as mesmas formalidades, devendo, também,

seguir o mesmo tratamento legal-tributário conferido às cessões de bens

intangíveis ou cessões de direitos106, devendo atender a todas as solenidades

102 SISTER, Gabriel. Mercado de Carbono e Protocolo de Quioto. Rio da Janeiro: Elsevier, 2007, p. 54. 103 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil. Parte geral, v1, 6 ed., São Paulo: Atlas, 2006, p. 305. 104 SISTER, Gabriel. Mercado de Carbono e Protocolo de Quioto. Rio da Janeiro: Elsevier, 2007, p. 54. 105 RIZZARDO, Arnaldo. Direito das Obrigações, 2 ed., Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 251. 106 SISTER, Gabriel. Mercado de Carbono e Protocolo de Quioto. Rio da Janeiro: Elsevier, 2007, p. 55.

58

típicas de um contrato – art. 421 e seguintes –, devendo-se, ainda, atentar ao

risco de se incorrer o previsto no art. 288 do Código Civil de 2002, disposto infra:

Art. 288. É ineficaz, em relação a terceiros, a transmissão de um crédito, se não celebrar-se mediante instrumento público, ou instrumento particular revestido das solenidades do § 1º, do art. 654.

Complementarmente, mister se faz trazer à baila o teor do §

1º do art. 654 do Código Civil de 2002, in verbis:

Art. 654. Todas as pessoas capazes são aptas para dar procuração mediante instrumento particular, que valerá desde que tenha a assinatura do outorgante.

§ 1o O instrumento particular deve conter a indicação do lugar onde foi passado, a qualificação do outorgante e do outorgado, a data e o objetivo da outorga com a designação e a extensão dos poderes conferidos.

Por estes termos, verifica-se que a transmissão de RCEs

somente terá efeito em relação a terceiros se for celebrada mediante instrumento

público ou particular107. Não por menos, merece destaque o art. 585, II, do Código

de Processo Civil, nos termos infra:

Art. 585. São títulos executivos extrajudiciais:

(...)

II – a escritura pública ou outro documento público assinado pelo devedor; o documento particular assinado pelo devedor e por duas testemunhas; o instrumento de transação referendado pelo Ministério Público, pela Defensoria Pública ou pelos advogados dos transatores.

107 SISTER, Gabriel. Mercado de Carbono e Protocolo de Quioto. Rio da Janeiro: Elsevier, 2007, p. 55.

59

Tendo dito, passa-se a focar a última das modalidades de

operação com RCEs, qual seja, a promessa de cessão futura

3.2.3 Promessa de cessão futura

Referida modalidade era, até pouco tempo, a forma mais

comum de negócio jurídico no Mercado de Carbono do Protocolo de Kyoto, na

qual potenciais geradores de RCEs e aqueles interessados na sua aquisição

negociavam a aquisição de RCEs antes mesmo de sua própria concepção formal

por meio do Documento de Concepção do Projeto – DCP – que as geraria108.

Dentro da referida modalidade, uma das partes, localizada

no país, compromete-se a desenvolver e implementar um projeto de MDL

segundo as normas do Protocolo de Kyoto, bem como ceder as RCEs geradas

por tal projeto a uma outra parte, localizada no exterior, mediante o pagamento de

uma contraprestação. Enquanto em certas situações os recursos são adiantados

pelo futuro adquirente das RCEs, em outras o valor somente é pago após a sua

efetiva cessão109. Independente da forma, a cessão efetiva se dá por meio de

transferência escritural entre a conta mantida pelo Conselho Executivo do MDL

em nome do titular do projeto e aquela mantida em nome daquele que possui o

compromisso de redução de emissões110.

O Código Civil trata dos elementos acidentais,

principalmente a condição, o termo e o encargo, nos arts. 121 a 137. Destes, o

que tem pujante correspondência com os contratos de promessa de cessão futura

de RCEs é o estabelecido no art. 121 do referido diploma, qual seja, a

condição111.

Neste sentido, RODRIGUES traz uma explanação sobre o

conceito de condição, in verbis:

108 SISTER, Gabriel. Mercado de Carbono e Protocolo de Quioto. Rio da Janeiro: Elsevier, 2007, p. 56. 109 SISTER, Gabriel. Mercado de Carbono e Protocolo de Quioto. Rio da Janeiro: Elsevier, 2007, p. 56. 110 SISTER, Gabriel. Mercado de Carbono e Protocolo de Quioto. Rio da Janeiro: Elsevier, 2007, p. 57. 111 SISTER, Gabriel. Mercado de Carbono e Protocolo de Quioto. Rio da Janeiro: Elsevier, 2007, p. 57.

60

Um negócio, portanto, é condicional quando sua eficácia depende de um acontecimento futuro e incerto. Assim, a condição não afeta a existência do negócio, mas apenas sua eficácia. O contrato existe desde logo, porque houve a manifestação válida da vontade de ambas as partes: apenas sua eficácia fica dependendo do advento da condição. Por exemplo: alguém ajusta com um pintor a compra de sua tela, se ela for aceita em uma exposição internacional. O negócio está completo, não havendo dúvida sobre sua existência, porém sua eficácia fica dependente de um evento futuro e incerto, ou seja, do fato de ser ou não a tela recebida pelo júri da exposição aludida. Em caso afirmativo, o negócio gera seus efeitos, independentemente de nova manifestação de vontade. Frustrada a condição, o negócio se desfaz, por não ter ocorrido aquele pressuposto acidental, que, em virtude das partes, foi transformado em relevante112.

Como se verifica supra, a condição pressupõe que a eficácia

do negócio jurídico celebrado entre partes – ou parte, no caso de negócios

unilaterais – dependa de acontecimento futuro e incerto. Ademais, é cristalino

que, uma vez acordada entre as partes, a condição passa a fazer parte do

negócio jurídico de modo indissociável, figurando como elemento essencial para

sua existência113.

Assim sendo, resta evidente que, enquanto não concretizada

a condição de implementação do projeto de MDL e obtenção das RCEs, o ato de

cessão de tais instrumentos não pode ser exigido114.

Convém, também, esclarecer que, pelo fato de os contratos

de promessa de cessão futura de RCEs protelarem temporariamente a eficácia do

negócio jurídico até a ocorrência do acontecimento futuro e incerto – isto é, a

112 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. Parte Geral, v. 1, 32ª Ed., São Paulo: Saraiva, 2002, p. 240-241. 113 SISTER, Gabriel. Mercado de Carbono e Protocolo de Quioto. Rio da Janeiro: Elsevier, 2007, p. 59. 114 SISTER, Gabriel. Mercado de Carbono e Protocolo de Quioto. Rio da Janeiro: Elsevier, 2007, p. 59.

61

obtenção das RCEs pela parte que apresentará o projeto de MDL – será a

condição relativa a tais instrumentos considerada suspensiva115.

Percebe-se, então, que o que diferencia a promessa de

cessão futura da cessão pura e simples é tão-somente a condição suspensiva

que protela temporariamente a eficácia do negócio jurídico. Até a ocorrência do

acontecimento futuro e incerto, qual seja, a obtenção das RCEs pela parque

apresentará o projeto de MDL. Fora isso, são dois instrumentos semelhantes,

inclusive no tocante aos requisitos e formalidades116.

Esclarecidas as modalidades de operação no Mercado de

Carbono, convém analisar o crédito de carbono sob a ótica do atual cenário

econômico, o que será feito a seguir.

3.3 POLUIÇÃO MOEDA DE TROCA: O CRÉDITO DE CARBONO NA ECONOMIA CONTEMPORÂNEA

Como se sabe, os índices de poluição têm crescido em ritmo

cada vez mais alarmante. Estima-se que o ser humano lance na atmosfera – por

ano – a quantia de CO2 superior a 35,5 bilhões de toneladas. Em resposta a tais

números, surgiram projetos de redução de emissões de gases que causassem o

efeito estufa. Uma vez aprovados, podem gerar créditos de carbono e serem

utilizados para alcançar metas de redução das emissões de gases do efeito

estufa, o que constitui o Mercado de Carbono 117.

As negociações são guiadas pelas regras comuns de

mercado, podendo ser efetuadas em bolsas, através de intermediários ou

diretamente entre as partes interessadas. À transação dos créditos se dá o nome

de CO2 equivalente, que é uma medida usada para comparar as emissões de

115 SISTER, Gabriel. Mercado de Carbono e Protocolo de Quioto. Rio da Janeiro: Elsevier, 2007, p. 59-60. 116 SISTER, Gabriel. Mercado de Carbono e Protocolo de Quioto. Rio da Janeiro: Elsevier, 2007, p. 60. 117 Disponível em: <http://www.carbonobrasil.com/mercado.htm?id=125605> acessado em 28 de maio de 2008.

62

vários gases de efeito estufa baseado no potencial de aquecimento global de

cada um118.

O comércio de créditos de carbono tem-se provado um nicho

com elevado rendimento e altíssimo crescimento. Segundo um levantamento feito

por especialistas, o valor do mercado global de carbono cresceu 80%, alcançando

40 bilhões de Euros – o correspondente a 59 bilhões de dólares. Tal índice se

deve aos novos participantes no mercado e ao reforço dos limites sobre as

emissões para o segundo período de compromisso do Esquema de Comércio de

Emissões (2008-2012) na União Européia. O mesmo estudo avaliou o MDL em 12

bilhões de euros em 2007119.

Uma das características mais marcantes do Mercado de

Carbono é sua acessibilidade perante os mais diversos tipos de países. Prova

disso é que o Brasil, outrora líder neste mercado, caiu para o 3º lugar, ficando

atrás de países como Índia e China, os quais, junto com Austrália, Coréia do Sul e

Japão, somam quase metade dos gases causadores do efeito estufa120. No caso

da Austrália, é interessante apontar que a mesma realizou recentemente sua

primeira venda de permissões de emissão. Na ocasião, a companhia de energia

AGL vendeu 10 mil permissões por meio de um contrato para entrega futura com

o banco Westpac, embora o esquema de comércio de emissões da Austrália deva

ter início somente a partir de 2010121.

Sobressai-se um fato que destaca não somente a

acessibilidade do Mercado, mas também o rendimento e a dinamicidade do

mesmo, qual seja: a empresas especializadas em Mercado de Carbono presentes

dentro de território estrangeiro. A título de exemplo, tem-se o caso da

Ecoprogresso, consultora portuguesa que negocia créditos de carbono, a qual se

instalou no mercado chinês e já tem planos de expansão para países como

118 Disponível em: <http://www.carbonobrasil.com/glossario.htm?letter=c> acessado em 28 de maio de 2008. 119 Disponível em: <http://www.carbonobrasil.com/mercado.htm?id=125605> acessado em 28 de maio de 2008. 120 Disponível em: <http://www.carbonobrasil.com/mercado.htm?id=125605> acessado em 28 de maio de 2008. 121 Disponível em: <http://www.carbonobrasil.com/news.htm?id=504975&section=7> acessado em 28 de maio de 2008.

63

Tailândia e Indonésia. Com um investimento que, segundo o presidente do

Conselho de Administração da Ecoprogresso, Ricardo Moita, não passou de

“algumas centenas de milhares de euros”, a empresa tem planos de abrir uma

carteira de 53 milhões de euros122.

Até mesmo os Estados Unidos da América, país que se

opôs ao Protocolo de Kyoto – sendo o único grande país industrializado a ficar de

fora do mesmo – , tem investido pesado neste mercado, a ponto de já ter dado

sinais de adotar metas para as emissões de gases do efeito estufa. Tal intenção

mexeu com o mercado de carbono e seus investidores: um estudo revela que,

caso os EUA criem um esquema próprio de comércio de emissões, o mercado

global de carbono pode vir a valer a soma de 2 trilhões de euros em 2020, com os

EUA respondendo por 67% (ou 1,25 trilhões de euros).

Diante de tantas oportunidades, o Brasil também tem

investido no setor. Criada a partir da fusão entre a Bola de Mercadorias e Futuros

e a Bolsa de Valores de São Paulo, a BM&F Bovespa pretende ser a maior Bolsa

do mundo, com a liderança no setor de papéis relacionados a créditos de

carbono, segundo o ex-presidente da BM&F e membro do grupo de transição,

Manoel Felix Cintra Neto. Na mesma ocasião, este sintetizou as pretensões do

País para o mercado ao afirmar que “temos a responsabilidade de fazer do Brasil

o grande centro de liquidez desses certificados de carbono”123.

A proposta da BM&F Bovespa não é a única iniciativa

brasileira do gênero. Duas medidas corroboram com a já notória potencialidade

do Brasil para crescer no mercado: a primeira delas consiste na recente adoção

de um fator único de emissão de CO2 pelos projetos de energia renovável do

MDL (com a pretensão de aprovar em breve uma resolução com os novos

valores)124; e uma proposta, em trâmite na Câmara dos Deputados, que disciplina

o comércio de créditos de carbono resultantes de programas contratados pelo

122 Disponível em: <http://www.carbonobrasil.com/news.htm?id=514046&section=7> acessado em 28 de maio de 2008. 123 Disponível em: <http://www.carbonobrasil.com/news.htm?id=514047&section=7> acessado em 28 de maio de 2008. 124 Disponível em: <http://www.carbonobrasil.com/news.htm?id=495960&section=7> acessado em 28 de maio de 2008.

64

Governo para incentivar o uso de energia elétrica gerada por fontes alternativas

no país125.

A adoção do fator único criou expectativas entre os

desenvolvedores de projetos, uma vez que, anteriormente, havia complicações na

aprovação de projetos por conta de fatores diferenciados para as quatro sub-

regiões do País. Neste sentido, a Comissão Interministerial de Mudança Global do

Clima (CIMGC) divulgou carta manifestando a decisão de adotar o fator único,

bem como apresentando as conclusões do Grupo de Trabalho composto pelo

MME, o Ministério da Ciência e Tecnologia – MCT – e a NOS:

Foi consenso entre os membros do Grupo que as restrições de transmissão existentes atualmente entre os submercados do SIN não são suficientes para diminuir substancialmente o benefício global do projeto, em função da região em que seja implantado, sendo, portanto, recomendável que se adote a configuração de um único sistema elétrico no Brasil.

Ressaltou-se que a adoção desta configuração será válida apenas para efeitos de cálculo dos fatores de emissão de CO

2 em projetos de MDL que utilizem a

metodologia ACM0002 para estimar suas reduções de emissão de gases de efeito estufa. Em nenhum momento esta decisão deverá afetar a atual configuração utilizada pelo ONS para o planejamento e a programação da operação, bem como a contabilização de energia e definição de preços realizada pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica – CCEE, a qual adota a subdivisão do SIN em quatro subsistemas. Ressaltou-se que o respaldo técnico fornecido pelas simulações realizadas é que permite que sejam feitas abordagens diferentes, em cada um dos casos126.

125 Disponível em: <http://www.carbonobrasil.com/news.htm?id=495979&section=7> acessado em 28 de maio de 2008. 126 Protocolo de Kyoto. Disponível em: <http://www.mct.gov.br/upd_blob/0024/24385.pdf> acessado em 05 de junho de 2008.

65

Por fim, destacou-se que o processo de evolução do SIN apenas deverá confirmar a decisão de se adotar um único sistema para o cálculo do fator de emissão de CO

2, uma vez que a ampliação dos reforços da

transmissão de energia elétrica entre os subsistemas promoverá diminuições progressivas nas restrições de transmissão, e permitirá que um projeto implantado em um determinado subsistema produza benefícios nos demais subsistemas do SIN.

Por sua vez, o Projeto de Lei para créditos de carbono de

energia alternativa define que os empreendedores passam a se apropriar

exclusivamente dos direitos ou benefícios financeiros de comercialização dos

certificados de redução de emissões, que atualmente ficam em poder da

Eletrobrás. Ademais, o documento autoriza que órgãos ou agentes financiadores

de projetos e de empreendimentos de energia renovável recebam ou vinculem os

créditos de carbono como garantia (total ou parcial) das operações de crédito.

Para fins de aplicação deste projeto, consideram-se fontes alternativas de energia

as seguintes: solar, eólica, térmica, das marés e das pequenas centrais

hidrelétricas, quais sejam, as que têm capacidade entre 0,5 e 30 megawatts127.

Tal realidade carece, porém, de uma análise crítica, tendo

em vista a pouca participação que o Brasil tem no montante das emissões de

carbono, diante da impressionante quantidade emitida por países notoriamente

poluentes. Sob esta ótica, é mais que oportuna a ponderação feita por RIBEIRO,

em análise que faz sobre obra do escritor Jacques Marcovitch, in verbis:

A maior polêmica atual sobre o Protocolo de Kyoto envolve a fase pós-2012, chamado de segundo período de compromisso. Ou seja, será que países como Brasil, Índia e China ficarão fora daquele grupo que deve reduzir emissões? O inventário brasileiro permite afirmar que o País emite 3% do total mundial, o que é muito pouco se comparado a países

ricos da Europa e da América. Por isso, a redução de emissões no Brasil depende mais de um programa de contenção do

127 Disponível em: <http://www.carbonobrasil.com/news.htm?id=495979&section=7> acessado em 28 de maio de 2008.

66

desmatamento do que da alteração do modelo energético adotado no País. O que não quer dizer que não se devam realizar pesquisas para alternativas energéticas, uma necessidade que se impõe diante do anúncio do esgotamento da era do petróleo e da alteração do regime de chuvas, o que vai afetar a disponibilidade hídrica para

gerar energia128.

Tendo-se analisado a participação do crédito de carbono,

passa-se a um estudo sobre como funcionam os projetos de MDL em território

brasileiro, a ser feito nos termos vindouros.

3.4 PERSPECTIVAS DE FUNCIONALIDADE

A utilização dos Mecanismos de Desenvolvimento Limpo é

que ainda carece de uma metodologia mais concisa e objetiva. Considerando isso

e com o propósito de agilizar o processo de análise das atividades dos projetos,

foi elaborado um manual para o desenvolvimento de projetos de desenvolvimento

limpo para possibilitar a criação dos mesmos129.

Denominado “Manual para Submissão de Projetos de MDL

para aprovação da Comissão Interministerial de Mudança Global do Clima”, o

mesmo regulamenta como os interessados em desenvolver um projeto devem

agir, quais documentos juntar, além de descrever as etapas legais a serem

seguidas para a realização de um projeto bem sucedido. Ficou estabelecido,

então que o interessado em registrar um projeto deve protocolar uma carta de

encaminhamento, que deverá ser enviada à Secretaria Executiva da Comissão

Interministerial de Mudança Global do Clima, junto com outros 10 documentos, a

128 Disponível em: <http://www.fea.usp.br/mudarfuturo/PDF/Resenha%20Wagner%20Ribeiro.pdf> acessado em 28 de maio de 2008. 129 Protocolo de Kyoto. Disponível em: <http://www.mct.gov.br/upd_blob/0015/15798.pdf> acessado em 05 de junho de 2008.

67

saber: Documento de Concepção de Projeto (em inglês – via original – e

português – traduzido em cima do original); Anexo III (com as contribuições que o

projeto em tela trará ao ideal de desenvolvimento sustentável); Cartas-Convite

(enviadas aos seguintes órgãos: Prefeitura, Câmara dos Vereadores, Órgãos

Ambientais Estadual e Municipal, Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos

Sociais para o Meio Ambiente e Desenvolvimento, Associações Comunitárias e

Ministério Público); Relatório de Validação (vias em inglês e português);

Declaração dos Participantes do Projeto (em folha timbrada, seguindo modelo

pré-definido); Declaração de conformidade com as leis ambientais e trabalhistas;

Declaração da entidade operacional designada (comprovando seu cadastro junto

à Comissão Interministerial de Mudança Global do Clima) e outros documentos

que comprovem as contribuições para o desenvolvimento sustentável alegadas

no Anexo III130.

O primeiro deles, que também atende por sua denominação

em inglês (PDD – Project Design Document), é o principal documento a ser

apresentado ao Conselho Executivo do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo,

na ocasião da solicitação de registro do projeto. O documento deve ser

apresentado na versão mais atualizada, original em inglês e que foi enviada à

Entidade Operacional Designada para validação. Dependendo do tipo de projeto,

pode requerer formulários distintos: redução de emissões (normal e pequena

escala) e projeto de florestamento e reflorestamento (normal e pequena

escala)131.

Sobre o Anexo III, o § I do art. 3º da Resolução 1ª da

Comissão Interministerial de Mudança Global do Clima assim o descreve:

O documento de concepção do projeto na forma determinada pelo

Conselho Executivo do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, estabelecido no âmbito da

Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima e, para fins de aprovação da

atividade de projeto pela Comissão, na forma do Anexo II. Adicionalmente, como elemento

informativo à Comissão Interministerial de Mudança Global do Clima, deve constar no documento

130Protocolo de Kyoto. Disponível em: <http://www.mct.gov.br/upd_blob/0015/15798.pdf> acessado em 5 de junho de 2008. 131 Protocolo de Kyoto. Disponível em: <http://www.mct.gov.br/upd_blob/0015/15798.pdf> acessado em 5 de junho de 2008.

68

de concepção do projeto uma descrição da contribuição da atividade de projeto para o

desenvolvimento sustentável de acordo com o Anexo III à esta resolução e em conformidade com

o Artigo. 12.2 do Protocolo de Quioto à Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do

Clima.

É importante ressaltar que a análise deve enfatizar as

contribuições da atividade de projeto para todos os aspectos listados no Anexo III.

Convém dar foco às contribuições que podem ser de fato atribuídas à implantação

da atividade de projeto adicionalmente a outras atividades das empresas

proponentes do projeto. Sua contribuição para o desenvolvimento sustentável

será analisada a partir do Anexo III, desconsiderando-se as informações contidas

em outros documentos132.

Por sua vez, a Carta-Convite deve ser endereçada a um dos

agentes acima listados, devendo ser enviada por correio – pois não se aceita

nenhuma outro tipo de meio de comunicação com os mesmos) e, na cópia

enviada à Comissão deverá constar o comprovante de recepção pelo destinatário.

Não havendo algum dos atores (órgão ambiental municipal ou associações

comunitárias), deve ser anexada uma carta justificando a ausência. Na carta

devem constar, também, o nome do projeto, localização e objetivo principal, bem

como toda a informação necessária para que os agentes tenham acesso aos

relatórios técnicos, sociais e ambientais do projeto, bem como toda a informação

relevante para que se possa pronunciar a respeito133.

Outro documento importante é o Relatório de Validação,

também conhecido por sua denominação em inglês, Validation Report. É o

relatório de validação elaborado pela Entidade Operacional Designada, que será

apresentado ao Conselho Executivo do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo

por ocasião da solicitação de registro do projeto. O documento deve ser

132 Protocolo de Kyoto. Disponível em: <http://www.mct.gov.br/upd_blob/0015/15798.pdf> acessado em 5 de junho de 2008. 133 Protocolo de Kyoto. Disponível em: <http://www.mct.gov.br/upd_blob/0015/15798.pdf> acessado em 5 de junho de 2008.

69

apresentado na versão original em inglês, assim como o PDD, devendo-se fazer

referência ao mesmo134.

Como último dos documentos, tem-se a Declaração dos

Participantes do Projeto, consistindo em uma Declaração assinada por todos os

participantes do projeto, estipulando o responsável e o modo de comunicação

com a secretaria executiva da Comissão Interministerial de Mudança Global do

Clima e termo de compromisso do envio de documento de distribuição das

unidades de redução certificada de emissões que vierem a ser emitidas a cada

verificação das atividades do projeto para certificação135.

Uma vez elaborado o DCP e obtida a validação, a próxima

etapa consiste na condução e respectivo acompanhamento do processo junto à

Autoridade Nacional Designada, qual seja, o Ministério da Ciência e Tecnologia –

MCT –, para aprovação. Concluída tal etapa, passa-se à remessa (do documento

original, que está em inglês) para registro no Conselho Executivo da ONU,

seguido de seu monitoramento e, tão logo se obtenha a aprovação, geração das

RCEs (Reduções Certificadas de Emissões) e conseqüente negociação, seja em

nível nacional (ex: BM&F Bovespa) ou internacional (Kyoto, CCX, etc)136.

Dentro de um país com tanto potencial para o Mercado de

Carbono quanto o Brasil, não surpreende o fato de já haver casos de sucesso

neste nicho, dentre os quais alguns serão destacados pelo presente estudo. Para

fim de exemplo, pode-se iniciar com o caso do financiamento de uma usina

elétrica movida a biomassa, com potencial de 8 MW de energia, gerada a partir da

queima da casca de arroz no Rio Grande do Sul. A Bioheat International (trader

holandesa) negociou créditos de carbono com uma empresa brasileira e com a

Cooperativa Agroindustrial de Alegrete, no valor de cinco dólares por tonelada de

carbono. Valendo-se desta e de outras iniciativas, a Holanda, país presente no rol

134 Protocolo de Kyoto. Disponível em: <http://www.mct.gov.br/upd_blob/0015/15798.pdf> acessado em 5 de junho de 2008. 135 Protocolo de Kyoto. Disponível em: <http://www.mct.gov.br/upd_blob/0015/15798.pdf> acessado em 5 de junho de 2008. 136 Protocolo de Kyoto. Disponível em: <http://www.mct.gov.br/upd_blob/0015/15798.pdf> acessado em 5 de junho de 2008.

70

dos maiores poluidores e pretende atingir metade das metas de reduções

internamente e a outra metade no exterior137.

Também merecem destaque os dois primeiros projetos

aprovados pelo governo brasileiro sob as regras do MDL: Em 2004, duas

empresas entraram com projetos de aproveitamento do gás metano liberado por

lixões de empresas. O gás metano é canalizado e aproveitado para gerar energia,

deixando de ser liberado na atmosfera naturalmente pela decomposição do lixo.

Sua redução de emissões é calculada em dióxido de carbono, sendo 14 milhões

de toneladas de CO2 para cada empresa, uma em 16 anos e a outra em 21138.

Finalmente, convém trazer à baila uma breve definição sobre

o Projeto Plantar, o primeiro projeto brasileiro do Fundo Protótipo de Carbono.

Com cunho comercial, essa empresa de reflorestamento nasceu com incentivos

de plantação de eucalipto ao final dos anos sessenta e, mais tarde, para

aproveitar a matéria prima, entrou para o setor siderúrgico. Seus créditos são

provenientes da substituição de uso do carvão mineral para vegetal, melhoria dos

fornos de carvão pela redução da emissão do metano e reflorestamento de

23.100 hectares com eucalipto, totalizando 3,5 milhões de toneladas de CO2139.

Com isso, chega-se ao final do terceiro – e último – capítulo

deste estudo, o qual visou o aprendizado e melhor entendimento sobre o

Protocolo de Kyoto, o Mercado de Carbono e os rumos que nosso mundo vem

tomando.

137 Disponível em: <http://www.carbonobrasil.com/mercado.htm?id=125633> acessado em 28 de maio de 2008. 138 Disponível em: <http://www.carbonobrasil.com/mercado.htm?id=125633> acessado em 28 de maio de 2008. 139 Disponível em: <http://www.carbonobrasil.com/mercado.htm?id=125633> acessado em 28 de maio de 2008.

71

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao término do presente trabalho, verificou-se acerca de

aspectos predominantes a respeito não somente do Protocolo de Kyoto e do

Mercado de Carbono, como também de vários pontos pertinentes à manutenção

da boa saúde de nosso planeta.

Quando concluído o Primeiro Capítulo, foi possível auferir

um entendimento mais apurado da figura do aquecimento global e sua influência

no panorama sócio-político-econômico que se desenhou nos últimos anos. É

inegável que tal influência se deve, principalmente, ao tom alarmista com que se

vem tratando certos estudos pertinentes ao meio ambiente, conseqüência esta

natural, quando se vem de uma cultura de desenvolvimento acelerado e absoluta

falta de zelo para com a sustentabilidade. Ironicamente, a busca descontrolada

pelo progresso acaba por trazer o regresso.

O Segundo Capítulo, por sua vez, permitiu analisar o

Protocolo de Kyoto não apenas por seu valor comercial, mas também por seu

contexto histórico e sua importância política, mormente no tocante à forma como

as metas de redução de emissões do dióxido de carbono trouxeram novos

cenários no relacionamento político-econômico entre os países.

Falando em redução de emissões, o Terceiro – e último –

Capítulo deste trabalho viabilizou o conhecimento sobre as operações dentro do

mercado de crédito de carbono, incluindo suas modalidades, sua participação na

economia global e aspectos pertinentes sobre sua funcionalidade no meio em que

se encontra inserido.

Na ocasião da Introdução deste estudo, levantaram-se três

hipóteses, as quais viriam a ser respondidas ao longo do mesmo. Desta forma,

com base em tudo o que fora exposto, pode-se fazer os seguintes apontamentos:

• O aquecimento global, comprovadamente, não

apenas afeta o mundo em seus aspectos sociais e

72

ambientais, mas também na política e na economia

mundiais. Tal fenômeno acaba trazendo

complicações para os países, sendo os mais pobres

os primeiros a senti-los. Os estragos causados pelos

efeitos da poluição e do aquecimento global

acarretam prejuízos econômicos vultuosos, pois

trazem perdas à agricultura e, indiretamente, a todos

os setores que, de uma forma ou de outra, dependem

dela. Com isso, aliado a outros fatores, prejudica-se o

desenvolvimento dos países, forçando-os, em muitos

casos, a se valer empréstimos, subsídios e outras

práticas econômicas específicas que acabam

mobilizando recursos de variadas naturezas, que

poderiam ser utilizadas em políticas necessárias ao

desenvolvimento e aprimoramento de novas

tecnologias, além de impossibilitar os investimentos

nas áreas de educação, saúde e segurança.

• Conseqüentemente, percebe-se que o Protocolo de

Kyoto tem a finalidade de tentar conciliar o

desenvolvimento econômico e sustentável, tentando

reduzir ou amenizar as agressões ao meio ambiente.

Agindo diretamente sobre as alterações climáticas

que se devem em grande parte ao crescimento sócio

econômico, que provoca o crescimento acelerado da

emissão de gases causadores do efeito estufa. Tendo

assim como principal objetivo reduzir a emissão anual

global de CO2.

• Finalmente, surge o Mercado de Carbono como um

dos possíveis meios de tentar desacelerar a emissão

de CO2, sendo uma das maneiras de se conciliar

desenvolvimento sustentável e desenvolvimento

econômico, sendo que um necessita do outro para

73

que se alcance o equilíbrio ecológico. Nestes termos,

denota-se que, sendo ou não ou melhor, trata-se de

uma iniciativa cujo potencial não pode ser

desprezado.

Por fim, entende-se que o objeto deste trabalho é de suma

importância, seja para o cenário de hoje, seja para toda e qualquer projeção que

se faça com o intuito de concretizar um desenvolvimento limpo e compromissado

com a preservação da vida, em toda e qualquer uma de suas instâncias.

74

REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS

BRASIL. Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981. Disponível em

<http://www.brasil.gov.br>. Acesso em 30 abr 2006.

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