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Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP Instituto de Química – IQ Laboratório de Química Ambiental – LQA CADERNO TEMÁTICO VOLUME 04 APLICAÇÃO DA FOTOCATÁLISE HETEROGÊNEA NA DESINFECÇÃO DE ÁGUA E AR Autores: Cassiana C. Montagner Matheus P. Paschoalino Wilson F. Jardim Campinas, Fevereiro de 2005

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Universidade Estadual

Instituto de

Laboratório de Quím

CADERNO

VOLU

APLICAÇÃO DA

HETEROGÊNEA NA

ÁGUA

Campinas, Fev

de Campinas – UNICAMP

Química – IQ

ica Ambiental – LQA

TEMÁTICO

ME 04

FOTOCATÁLISE

DESINFECÇÃO DE

E AR

Autores: Cassiana C. Montagner

Matheus P. Paschoalino

Wilson F. Jardim

ereiro de 2005

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Caderno temático volume 04

LISTA DE SÍMBOLOS E ABREVIATURAS Os símbolos e as abreviaturas estão relacionados abaixo em ordem alfabética:

λ Comprimento de Onda da Radiação

ANVISA Agência Nacional de Vigilância Sanitária

BC Banda de Condução

BV Banda de Valência

CoA Coenzima A

COV Compostos Orgânicos Voláteis

FH Fotocatálise Heterogênea

hν Radiação Eletromagnética

NASA National Aeronautics and Space Administration

OEA Organização dos Estados Americanos

PET Poli Tereftalato de Etileno

POA Processos Oxidativos Avançados

QAI Qualidade do Ar Interno

SED Síndrome do Edifício Doente

SODIS Solar Disinfection

ufc Unidades Formadoras de Colônias

UV Ultravioleta

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Caderno temático volume 04

RESUMO A desinfecção é definida como o processo que reduz a concentração dos

microrganismos até níveis não infecciosos. Para promovê-la, diversos agentes

desinfetantes são utilizados cotidianamente de acordo com o tipo de material a ser

desinfetado, e com o nível de desinfecção necessária. A fração mais energética do

espectro ultravioleta (UV) é comumente usada como agente bactericida em

tratamentos de água e ar, permitindo uma taxa de desinfecção eficiente pelo

emprego de lâmpadas germicidas (254 nm), sem contudo eliminar a massa

microbiana. Uma alternativa que vem sendo estudada para desinfecção é a

fotocatálise heterogênea (FH), que utilizando a radiação UV como coadjuvante,

promove um aumento da eficiência de desinfecção, já que esta acontece por dois

mecanismos sinérgicos, ou seja, pelo UV e pelos sítios altamente oxidantes formados

na superfície do catalisador. Geralmente os fotocatalisadores utilizados na FH são

óxidos de metais de transição, sendo o dióxido de titânio o mais utilizado. Quando

partículas de TiO2, que estão em contato ou muito próximas de microrganismos, são

irradiadas, os radicais hidroxila gerados atacam a superfície microbiana, danificando

componentes importantes das células, como o DNA. A eficiência do processo

fotocatalítico está intimamente relacionada ao preparo da superfície catalisadora,

modo de deposição, tipo de substrato utilizado e mecanismo de contato entre o

microrganismo e o catalisador.

Palavras-chave: desinfecção, fotocatálise heterogênea, dióxido de titânio.

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Caderno temático volume 04

INTRODUÇÃO A desinfecção é definida como o processo que reduz a concentração dos

microrganismos até níveis não infecciosos, enquanto que a esterilização promove a

total eliminação desses, independentemente de serem patogênicos ou não1.

Diversos agentes desinfetantes são utilizados cotidianamente de acordo com

o tipo de material a ser desinfetado, assim como o nível de desinfecção necessária,

como, por exemplo: álcool etílico, hipoclorito, água oxigenada, amônia e ozônio.

Alguns métodos físicos também empregados são: temperatura (pasteurização e

autoclavagem), filtração e exposição à radiação ultravioleta (UV). Este último tem

sido muito utilizado por impedir a replicação dos organismos durante a mitose

celular.

1. RADIAÇÃO UV

A radiação UV é absorvida por moléculas de proteínas, RNA e DNA de alguns

microrganismos. O DNA é um polímero de ácidos nucléicos no formato de uma dupla

hélice ligada uma a outra por uma seqüência de quatro bases constituintes (adenina,

citosina, guanina e timina), que formam o código genético e ligadas em pares

(adenina/timina e citosina/guanina), mantém unidas as duas hélices. Destas quatro

bases, a timina sofre uma única reação fotoquímica (Figura 1) – a união de duas

timinas adjacentes por meio da absorção de um fóton UV (dimerização), que quebra

a estrutura do DNA impedindo sua replicação2.

HCN

NH

O

O

CH3

H

HN

NCH

O

CH3

H

O

HN

N

C

C

O

H

OH

CH3

C

CN

NH

O

O

HH

CH3

+ h ν

timina timina dímero

Figura 1: Dimerização fotoquímica de duas timinas. Fonte: Bolton, J. R.; (1999). EPA Newsletter, 66, 33.

A fração mais energética do espectro ultravioleta, correspondente à faixa de

200-290 nm, é comumente usada como agente bactericida em tratamentos de água

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Caderno temático volume 04

e ar, permitindo uma taxa de desinfecção eficiente pelo emprego de lâmpadas

germicidas (254 nm)3. Um inconveniente do uso desta tecnologia está no fato da

radiação UV não eliminar a massa microbiana após sua inativação, já que em

matrizes gasosas, esta pode ser transportada pelo ar e causar reações alérgicas.

A fotocatálise heterogênea (FH) como alternativa para desinfecção tem sido

estudada durante as duas últimas décadas, pois, ao utilizar radiação UV, promove

um aumento da eficiência da desinfecção quando comparado com o processo que

utiliza somente UV devido a dois mecanismos sinérgicos: pelo efeito da radiação UV

e pelos sítios altamente oxidantes formados na superfície do catalisador. Assim, caso

os microrganismos estejam em baixas concentrações nas diferentes matrizes e as

condições do processo estejam ideais, a FH pode promover a completa mineralização

destes, ou seja, conversão completa a CO2 e H2O4,5.

2. FOTOCATÁLISE HETEROGÊNEA

A FH pertence à classe dos Processos Oxidativos Avançados (POA) que se

baseiam na geração do radical hidroxila (•OH) altamente reativo. Estes radicais são

gerados na FH quando um fotocatalisador (sólido semicondutor) é irradiado por

radiação com energia igual ou superior ao seu “band-gap”, provocando a

transferência de um elétron da banda de valência (BV) para a banda de condução

(BC), formando um par elétron/lacuna em sua superfície (Figura 2)6. Esta lacuna

pode oxidar água adsorvida na superfície do catalisador formando radicais hidroxila,

enquanto que o elétron na BC reage com o O2, formando espécies de oxigênio

reativas como peróxido e ânions superóxidos7. Um aspecto crítico da eficiência deste

processo é a alta probabilidade da recombinação elétron/lacuna, que compete com a

separação entre as cargas fotogeradas8.

Geralmente os fotocatalisadores utilizados na FH são óxidos de metais de

transição, tais como Fe2O3, ZnO, ZnS, CdS e TiO29. Entre estes, o dióxido de titânio é

o mais utilizado devido a algumas propriedades, como: (a) alta fotosensibilidade, (b)

natureza não-tóxica, (c) valor de “band-gap” ideal para utilização com radiação UV,

inclusive luz solar, (d) elevada estabilidade química, (e) é normalmente empregado à

temperatura e pressão ambientes, (f) apresenta custo relativamente baixo, (g)

dispensa o uso de reagentes coadjuvantes10,11.

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Caderno temático volume 04

H2O / OH-, R

S

.•OH, R+

olução

O2-, H2O2

O2

hv

BC

BV

Reação de oxidação

Reação de redução

h+

e-

recombinaçãosuperficial

recombinaçãointerna

excitação Energia

de band-gap

Partícula do catalisador

Figura 2: Mecanismo de fotoativação do catalisador.

O TiO2 possui três formas alotrópicas: anatase, rutilo e brookita. A anatase é

a forma que apresenta a maior fotoatividade, sendo a componente principal do

material mais empregado em FH, o TiO2 P-25 da Degussa, constituído basicamente

de 70 % anatase e 30 % rutilo (Figura 3), com partículas muito pequenas e área

superficial alta (~50 m2/g)12-14.

ba

Figura 3: Formas alotrópicas do TiO2: a) anatase, b) rutilo. Fonte: Candal, R. J.; Bilmes, S. A.; Blesa, M. A.; (2001). Em Eliminación de Contaminantes por

Fotocatálisis Heterogênea, Blesa, M., ed.; Red CYTED VIII-G, Argentina, cap. 4.

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Caderno temático volume 04

O catalisador pode ser utilizado suportado ou em suspensão. No caso do

catalisador suportado, os métodos normalmente utilizados para o preparo são os

processos sol-gel15-17, a partir de alcóxidos de titânio, ou ainda a simples diluição do

catalisador em água e outros solventes, seguida da deposição num substrato,

finalizando, com a remoção do solvente6,11,18. Novos estudos também têm reportado

a incorporação do catalisador em matrizes poliméricas, onde geralmente é necessário

um pós-tratamento da superfície antes do uso.

Quando partículas de TiO2 que estão em contato ou muito próximas a

microrganismos, são irradiadas, os radicais hidroxila gerados atacam a superfície

microbiana. A ação biocida do TiO2 foi primeiramente reportada em 1985 em um

estudo que mostrou um decréscimo na concentração de coenzima A (CoA) em

células tratadas com o semicondutor. Assim, foi proposto que a oxidação direta de

CoA inibe a respiração celular, causando a morte do microrganismo19.

A ação oxidativa exercida pelo processo UV/TiO2 ocasiona danos na parede

celular e na membrana citoplasmática. A ação fotocatalítica aumenta

progressivamente a permeabilidade celular, permitindo o efluxo livre do conteúdo

intracelular, que conduz finalmente à morte celular20. Jacoby (1998) reportou pela

primeira vez a mineralização completa de microrganismos (E. coli) em ar por FH

utilizando TiO2 P-25 (Degussa), o que foi comprovado por experimentos de

microscopia eletrônica de varredura5.

De acordo com Sökmen (2001), o primeiro alvo dos radicais são os ácidos

graxos insaturados (lipídios), levando à formação do malondialdeído (MDA) durante o

último estágio da quebra das endoperoxidases que são formadas nos rearranjos

intramoleculares na estrutura dos ácidos graxos insaturados21.

Estudos revelaram que os vírus são os microrganismos mais sensíveis ao

processo, seguidos pelas células e esporos bacterianos, o que sugere que diferentes

microrganismos respondem diferentemente ao fotocatalisador, devido às suas

diferenças estruturais, como a espessura de sua parede celular20.

A atividade catalítica pode ser otimizada pelo uso de dopantes como Ag, Au,

Pt e Pd. Isto pode ser explicado pelo fato de metais de transição poderem diminuir o

“band-gap” do semicondutor favorecendo a transferência do elétron da BV para a

BC. A dopagem do catalisador é comumente empregada em trabalhos de

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desinfecção, pois alguns dopantes como a Ag apresentam, por si só, propriedades

biocidas22,23.

O processo de desinfecção também pode ser realizado por fotocatálise

homogênea proporcionando, geralmente, maior atividade catalítica que a FH. Uma

possível explicação para este fato está relacionada com a disposição do catalisador,

já que na FH o catalisador é suportado e na fotocatálise homogênea o catalisador

encontra-se em suspensão, apresentando assim maior área superficial disponível,

parâmetro que deve ser considerado, pois para ocorrer a degradação microbiana, os

microrganismos devem estar em contato com a superfície do catalisador. O

inconveniente de se utilizar o TiO2 em suspensão é a necessidade de remoção e

recuperação do mesmo após a realização do tratamento, o que torna o projeto do

sistema muito complexo24. Para obter mais informações sobre POA, consulte o

Caderno Temático n° 3.

DESINFECÇÃO DE ÁGUA Há uma crescente preocupação com a qualidade da água que é consumida,

tendo em vista a freqüente deterioração dos corpos aquáticos. Com isso muitos

estudos têm sido realizados visando desenvolver novas tecnologias na purificação e

preservação de águas, associadas a uma legislação cada vez mais restritiva,

procurando atender as necessidades específicas de cada região.

No Brasil, a Portaria 518 (Ministério da Saúde, de 25 de março de 2004)

estabelece os procedimentos e responsabilidades relativas ao controle e vigilância da

qualidade da água para consumo humano e o seu padrão de potabilidade. No capítulo 2, artigo 4º, define-se água potável como água destinada ao consumo

humano cujos parâmetros microbiológicos, físicos, químicos e radioativos atendam

ao padrão de potabilidade e que não ofereça riscos à saúde. Dentre os parâmetros

microbiológicos são controlados Coliformes totais e termotolerantes, Escherichia coli,

bactérias heterotróficas, cianobactérias, cianotoxinas, etc.

O padrão microbiológico para água potável estabelece a ausência de E. coli e

Coliformes25. Pertencente ao grupo dos coliformes totais, a E. coli é considerada o

indicador mais específico de contaminação fecal recente e de eventual presença de

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organismos patogênicos, sendo um dos microrganismos mais resistentes do grupo,

motivo pelo qual sua degradação por FH é estudada por vários pesquisadores dessa

área.

A atividade biocida (para bactérias e algas) da FH usando TiO2 P-25 é

investigada usando tanto lâmpadas UV (em reatores com as mais diferentes

geometrias) como luz solar, o que é uma grande vantagem do processo em termos

de economia de energia. Desinfecção Solar de Águas (SODIS) é o nome dado ao

processo de desinfecção baseado na exposição ao sol, por aproximadamente 8

horas, de garrafas PET transparentes contendo água contaminada, onde a ação

bactericida ocorre devido ao aumento da temperatura da água, até 55º C,

proveniente da combinação das radiações UV e infravermelho26. Este processo foi

desenvolvido visando melhorar a qualidade da água consumida por populações que

não possuem água tratada, tais como as de zonas rurais.

A eficiência do processo fotocatalítico está intimamente relacionada à maneira

de preparo da superfície catalisadora, modo de deposição e tipo de substrato

utilizado. Duffy e colaboradores (2004) obtiveram melhores resultados na

degradação de E. coli K12, com o TiO2 incorporado em vidro comparado à

incorporação em plásticos27.

Alguns parâmetros experimentais devem ser otimizados a fim de aumentar a

eficiência fotocatalítica como: (a) intensidade e tempo de exposição à radiação:

quanto maior a dose de exposição melhor a taxa de desinfecção7; (b) concentração

do catalisador: (c) avaliação da lixiviação e saturação do catalisador imobilizado a fim

de garantir alta durabilidade e reprodutibilidade do processo; (d) composição da

amostra de água contaminada: amostras com grande concentração de matéria

orgânica são mais dificilmente degradadas; (e) nível de contaminação: amostras com

baixas concentrações iniciais de microorganismos pode apresentar mineralização

completa dos mesmos28.

Durante os processos fotocatalíticos, a geração de espécies oxidantes diminui

o tempo de vida da bactéria, portanto é preciso determinar o tempo necessário para

completar a reação de desinfecção da água, além de verificar se não ocorre

recrescimento microbiano após o término do processo. Rincón e Pulgarin (2004)

estudaram a inibição de E.coli e descrevem que após 24 horas da desinfecção ocorre

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Caderno temático volume 04

um recrescimento bacteriano, o qual é mais acentuado na fotólise que na FH28. Isto

não se faz necessário quando utiliza-se cloro na desinfecção de águas, pois a

presença de um oxidante residual garante a ação bactericida durante o transporte e

armazenamento da água.

No Laboratório de Química Ambiental (LQA) IQ-UNICAMP está sendo

desenvolvido um projeto financiado pela Organização dos Estados Americanos (OEA)

que visa aprimorar o processo SODIS, utilizando-se de garrafas PET com catalisador

suportado para promover a desinfecção de águas contaminadas por FH usando luz

solar. Nos experimentos realizados comprovou-se que a FH utilizando TiO2 P-25

incorporado em baguetas de vidro pelo método sol-gel, e inseridas nas garrafas com

água contaminada, após 5 horas de exposição solar apresentou eficiência frente a

SODIS 23 vezes melhor na inibição microbiológica (coliformes totais), e em média,

20% a mais de eficiência em ensaios algicidas, não apresentando recrescimento de

algas após 48 horas da desinfecção.

DESINFECÇÃO DE AR

Os principais locais onde a FH pode ser útil para desinfecção de ar são

atmosferas confinadas, ou seja, ambientes enclausurados resfriados ou aquecidos

por sistemas de ar condicionado que geralmente não proporcionam trocas de ar

adequadas para a saúde humana. Estes sistemas favorecem a sobrevivência de

organismos patogênicos, pois apresentam componentes de difícil acesso, que quando

sujos e úmidos proporcionam a proliferação de microrganismos29. Quando estes são

transportados pelo ar formam bioaerosóis, que podem causar males aos seres

humanos como reações alérgicas ou até infecções graves, que apesar de raras,

podem ocorrer e serem fatais30. Mais de 60 bactérias, vírus e fungos são

documentados como agentes patogênicos transportados pelo ar, alguns deles são

apresentados na Tabela 131:

O conjunto de sintomas provocados pelas baixas trocas de ar nestes

ambientes é denominado de Síndrome do Edifício Doente (SED), muito conhecida no

mundo todo por causar mal estar e perda de desempenho no trabalho de ocupantes

de edifícios climatizados32. Os principais agentes causadores destes sintomas são

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Caderno temático volume 04

microrganismos, compostos orgânicos voláteis (COV) provenientes de diferentes

fontes (mobília, matérias de construção, equipamentos eletrônicos) e CO2. Assim,

legislações foram criadas em vários países para determinar parâmetros de qualidade

do ar interno, surgindo a necessidade de métodos de desinfecção adequados.

Tabela 1: Organismos infecciosos transportados pelo ar.

Organismo Tipo

Corynebacterium diphtheriae Bactéria

Legionella pneumophila Bactéria

Mycobacterium tuberculosis Bactéria

Pseudomonas aeruginosa Bactéria

Serratia Marcescens Bactéria

Staphylococcus aureus Bactéria

Staphylococcus epidermidis Bactéria

Adeno Vírus Tipo III Vírus

Coxsackie A2 Vírus

Influenza Vírus

Fonte: http://www.ultraviolet.com

No Brasil, a legislação que trata da qualidade do ar interno (QAI) em

ambientes climatizados é a Resolução RE n° 9 da Agência Nacional de Vigilância

Sanitária (ANVISA) de 16 de Janeiro de 2003. Esta resolução determina que o valor

máximo recomendável (VMR) para contaminação microbiológica deve ser menor que

750 ufc/m3 de fungos, para a relação I/E ≤ 1,5, onde I é a quantidade de fungos no

ambiente interior e E é a quantidade de fungos no ambiente exterior. Esta relação é

exigida como forma de avaliação frente ao conceito de normalidade, representado

pelo meio ambiente exterior e a tendência epidemiológica de amplificação dos

poluentes nos ambientes fechados33.

Segundo a RE n° 9 da ANVISA é inaceitável a presença de fungos

patogênicos e toxigênicos no ar de ambientes internos, sendo apresentadas normas

de coleta e quantificação destes microrganismos no ar, indicando também as fontes

mais prováveis de se encontrar estes organismos:

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Caderno temático volume 04

Tabela 2: Possíveis fontes de poluentes microbiológicos.

Agentes microbiológicos Principais fontes em ambientes interiores

Bactérias

Reservatórios com água estagnada, torres de resfriamento,

bandejas de condensado, desumidificadores, umidificadores,

serpentinas de condicionadores de ar e superfícies úmidas e

quentes.

Fungos

Ambientes úmidos e demais fontes de multiplicação fúngica,

como materiais porosos orgânicos úmidos, forros, paredes e

isolamentos úmidos, ar externo, interior de condicionadores e

dutos sem manutenção, vasos de terra com plantas.

Protozoários Reservatórios de água contaminada, bandejas e umidificadores

de condicionadores sem manutenção.

Vírus Hospedeiro humano.

Fonte: ANVISA, RE n° 9 de 13/01/2003.

Para saber mais sobre QAI, consulte o site http://www.brasindoor.com.br.

O principal método utilizado na desinfecção de ar são filtros especiais para

microrganismos. Estes materiais têm sido utilizados devido ao seu baixo custo e fácil

manuseio, apresentando, entretanto, a desvantagem de não destruírem os

microrganismos, e sim transferi-los para outro meio, sendo necessário um descarte

adequado deste material, o que encarece o processo6. Diferentemente dos filtros, o

processo fotocatalítico visa a eliminação completa dos microrganismos.

Em fase gasosa é comum ocorrer a perda da atividade catalítica,

principalmente por adsorção, na superfície do catalisador, de diferentes substâncias,

tais como intermediários de degradação, pois os materiais adsorvidos não são

lavados como ocorre em fase aquosa.

Ao utilizar-se uma lâmpada germicida como fonte de radiação em FH, a

eliminação dos microrganismos se dá por dois mecanismos, UV e FH,

complementando a ação biocida do UV20. Outro aspecto positivo de se usar tal

lâmpada é que o sistema torna-se autolimpante, já que fornecendo-se tal iluminação

por determinado tempo, os microrganismos serão praticamente eliminados da

superfície do catalisador, permitindo o reuso do mesmo.

As figuras abaixo ilustram a destruição da bactéria E. coli por FH em ar:

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Caderno temático volume 04

Figura 4: Mineralização de E. coli por fotocatálise heterogênea. Fonte: Jacoby, W. A.; Maness, P. C.; Wolfrum, E. J.; Blake, D. M.; Fennel, J. A.; (1998)

Environ. Sci. Technol., 32, 2651.

Sistemas comerciais que utilizam FH com TiO2 como catalisador já são

realidade, como é o caso do Bio-KES e o AiroCide TiO2, resultantes de 2 projetos

financiados pela agência espacial americana (NASA) e desenvolvido na Universidade

de Wisconsin-Madison nos EUA. O Bio-KES foi projetado para eliminar gás etileno de

locais para armazenamento de frutas e vegetais, e o AiroCide para eliminar

microrganismos patogênicos do ar, principalmente os utilizados para bioterrorismo,

como o Anthrax34. No Japão, uma das aplicações mais importantes da tecnologia

fotocatalítica é o uso de azulejos auto-esterilizantes para salas cirúrgicas. Ao

contrário dos bactericidas comuns, os azulejos revestidos com TiO2 são

continuamente ativos, enquanto houver iluminação35.

CONCLUSÃO

E. coli + luz UV (254 nm)

E. coli + TiO2 luz UV (254 nm)

TiO2 +E. coli E. coliTiO2

A FH é muito promissora para ser utilizada em desinfecção de água e ar, já

que seu mecanismo de ação ocorre por duas vias, UV e radicais OH, um

complementando o outro, possibilitando um poder de desinfecção tão grande quanto

ao dos agentes químicos já amplamente utilizados. Além disto, está técnica

possibilita a utilização de luz solar como fonte de radiação, o que é uma grande

vantagem em termos energéticos. A tendência de utilização da FH em sistemas de

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Caderno temático volume 04

desinfecção comerciais pode ser observada, pelo grande número de publicações na

área, assim como pelo aumento significativo na quantidade de patentes produzidas

no mundo todo envolvendo FH.

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Caderno temático volume 04

REFERÊNCIAS

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http://www.technolamp.com.br/uvfatosemitos.htm, Acesso em 20/01/2005.

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3. Ibáñez, J. A.; Litter, M. I.; Pizarro, R. A.; (2003). J. Photochem. Photobiol., A,

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4. Blake, D. M; Maness, P.; Huang, Z.; Wolfrum, E. J.; Huang, J.; Jacoby, W. A.;

(1999) Sep. Purif. Methods, 28 (1), 1-50.

5. Jacoby, W. A.; Maness, P. C.; Wolfrum, E. J.; Blake, D. M.; Fennel, J. A.; (1998)

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7. Rincón, A. G.; Pulgarin, C.; (2004). Solar Energy, 77, 635-648.

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9. Bahnemann, D.; (2004). Solar Energy, 77, 445-459.

10. Sakthivel, S.; Shankar, M. V.; Palanichamy, M.; Arabindoo, B.; Bahnemann, D.

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12. Candal, R. J.; Rodríguez, J.; Colón, G. Gelover, S. Santos, E. V.; (2001). Em

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