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Universidade Estadual do Rio de Janeiro Centro de Educação e Humanidades Instituto de Psicologia A formação em Psicologia e o conceito de integralidade: Relação possível? Monografia apresentada à banca examinadora do Instituto de Psicologia – UERJ como pré-requisito para obtenção do grau de Psicólogo / Bacharel em Psicologia. Orientadora: Heliana de Barros Conde Rodrigues Membros da Comissão Examinadora: Ana Maria Jacó Vilela (E-mail: [email protected]); Deise Mancebo (E-mail: [email protected]) Autora: Vanessa de Araújo Xisto Instituto de Psicologia - UERJ Rio de Janeiro 2005.2

Universidade Estadual do Rio de Janeironewpsi.bvs-psi.org.br/tcc/53.pdf · Universidade Estadual do Rio de Janeiro Centro de Educação e Humanidades Instituto de Psicologia A formação

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Universidade Estadual do Rio de Janeiro Centro de Educação e Humanidades

Instituto de Psicologia

A formação em Psicologia e o conceito de integralidade: Relação possível?

Monografia apresentada à banca examinadora do Instituto de Psicologia – UERJ

como pré-requisito para obtenção do grau de Psicólogo / Bacharel em Psicologia.

Orientadora: Heliana de Barros Conde Rodrigues Membros da Comissão Examinadora:

Ana Maria Jacó Vilela (E-mail: [email protected]); Deise Mancebo (E-mail: [email protected])

Autora: Vanessa de Araújo Xisto

Instituto de Psicologia - UERJ Rio de Janeiro

2005.2

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A formação em Psicologia e o conceito de integralidade: Relação possível?

Resumo

Este trabalho se propõe a problematizar a formação de psicólogos para a atuação nos

serviços públicos de saúde, tomando como referencial a questão da integralidade. Para tanto,

realizaremos uma análise do currículo da UERJ utilizado nos últimos 16 anos, com o objetivo

de identificar as respostas do curso frente às mudanças que aconteciam no campo da saúde

pública brasileira no final da década de 80 e início da década de 90. Desejamos também trazer

à tona os possíveis acertos e falhas decorrentes dessa resposta ao longo desses últimos anos,

bem como as suas conseqüências para a prática profissional dos psicólogos na saúde pública.

Pretende-se também debater a emergência da Psicologia da Saúde como saber relativamente

recente na história da profissão.

Em seguida, realizaremos um exercício de resgate histórico, que buscará pistas sobre a

participação dos psicólogos nas Reformas Sanitária e Psiquiátrica; o contexto do surgimento

do SUS e do conceito de integralidade, seus diversos sentidos, e o porquê da sua importância

na realidade que a saúde vivia naquele momento; mais ainda, a importância que esse conceito

adquire para a formação dos psicólogos e a sua prática. Posteriormente, ainda nessa temática,

veremos algumas articulações já realizadas pelo campo da saúde mental com a integralidade.

Por fim, debatem-se os desafios e as perspectivas relativas a adoção da integralidade

pelos cursos de formação da área, trazendo a experiência de estágio no Espaço Aberto ao

Tempo, serviço de atenção diária em saúde mental situado no IMAS Nise da Silveira, como

uma proposta de formação e prática com base na integralidade da teoria e das ações.

Palavras-chave: Formação; Integralidade; Psicologia

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Sumário

1. Parecer do Professor orientador ............Pág.4

2. Introdução..................... Pág. 5

3. Formação profissional

3.1 - Modos de subjetivação do poder psi ............................. Pág. 7

3.2 - O currículo da UERJ ..............................................................................Pág. 12

3.3 - A interdisciplinaridade nos serviços de saúde – afinal, o Psicólogo é da área de

saúde?............................................................................................................................. Pág. 24

4. Integralidade

4.1– A participação do psicólogo nas Reformas sanitária e Psiquiátrica ....Pág. 28

4.2 - O surgimento do SUS e do conceito de integralidade ...........................Pág. 33

4.3 – A Reforma Psiquiátrica Brasileira e a integralidade ...........................Pág. 37

5. A Integralidade e a formação

5.1 - Desafios à incorporação da integralidade pela formação dos psicólogos. Pág. 40

5.2 - “Linhas de fuga”: A experiência do Espaço Aberto ao Tempo........... Pág. 44

6. Considerações finais ...............................................................................Pág. 46

7. Bibliografia .............................................................................................Pág. 47

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1. Parecer do professor orientador:

A monografia intitulada “A formação em psicologia e o conceito de

integralidade: relação possível?”, de Vanessa de Araújo Xisto, foi por mim orientada,

sendo aprovada em 2006 como um dos requisitos para a conclusão do curso de

graduação em Psicologia da autora, na Universidade do Estado do Rio de Janeiro

(UERJ). Sugiro a indicação do trabalho para concorrer ao “Prêmio Sylvia Lane” por

suas inegáveis qualidades em termos de pesquisa, análise e reflexão crítica, em um

campo no qual a saudosa professora homenageada através do concurso teve

inegável importância e renovadora influência. Através do conceito de integralidade,

Vanessa de Araújo Xisto problematiza e interroga, com entusiasmo e acuidade, o

caráter disciplinador, fragmentado e idealista da formação de psicólogos, levando-

nos a divisar novos possíveis para uma atuação libertária e crítica dos “psis” no

campo da saúde. Para tanto, a autora volta um olhar acurado à formação de

psicólogos na própria universidade em que acaba de concluir o curso de graduação.

Tratando-se de uma universidade pública e bem conceituada, suas análises não

podem ser desconsideradas apelando aos surrados argumentos de “disfunções

passageiras”, trazendo à luz, ao contrário, cristalizações formativas provavelmente

presentes na quase totalidade dos cursos de formação brasileiros. Neste sentido,

reafirmo a indicação do texto para concorrer à premiação, na certeza de que traz

uma bela contribuição aos estudos/debates sobre a formação de psicólogos em

nosso país.

Rio de Janeiro, dezembro de 2006

Heliana de Barros Conde Rodrigues

UERJ, Professora-adjunta, matrícula 7696-8

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2. Introdução

Há muitos anos a formação dos psicólogos está voltada para um certo tipo de clínica,

mostrando que na história da construção de políticas públicas em saúde, e no cotidiano do

atendimento no SUS, existe uma defasagem desses profissionais, que em seus currículos não

possuíram acesso às discussões relacionadas à saúde pública. Podemos verificar que estes

engessam os alunos, fazendo que se apoderem de um discurso hegemônico que insiste em

encaixar o ser humano em modelos pré-determinados de comportamento, criando uma visão

de mundo normatizada e reducionista, evidenciando uma teoria dissociada da prática

reproduzindo, como aponta Cecília Coimbra em “Guardiões da Ordem”, um dispositivo onde

as questões das relações sociais são privatizadas e tudo se torna culpa do sujeito.

Hoje temos o Aprender SUS1 e, com ele, a Integralidade como eixo norteador. Esse

conceito pretende orientar as políticas novas de mudança na graduação dos cursos da área da

saúde. Surgem alguns questionamentos: será que os psicólogos se entendem como

profissionais da área da saúde? Quando, na Faculdade, são preparados para atuar em equipes

multi - profissionais? ; São incentivados a acolher as demandas do indivíduo contextualizando

com os problemas sócio-político-econômicos da sociedade brasileira? a utilizar recursos

alternativos, não limitados ao saber psi, que englobem a cultura popular, por exemplo? ; e que

privilegie também, não só técnicas e competências, mas o saber e a história pessoal dos

próprios estudantes em formação e da população? será que na faculdade é possível encontrar

espaços de reflexão sobre a prática?

Estarei utilizando minha experiência de estágio no Espaço Aberto ao Tempo, serviço

de atenção diária em saúde mental que possui uma história de embate político que precede a

lei da Reforma Psiquiátrica, constituindo um espaço de duras críticas ao modelo manicomial,

1 Objetivos da política nacional do Aprender SUS: “

• Construir uma política nacional de formação e desenvolvimento para o conjunto dos profissionais de saúde: profissionalização técnica, mudança na graduação, mudança e oferta de residências e especializações em serviço, construção da educação permanente em saúde e produção de conhecimento para a mudança das práticas de saúde, bem como implementar a educação popular para a gestão social das políticas públicas de saúde;

• Instituir trabalho intersetorial entre os Ministérios da Saúde e da Educação para orientar programas

conjuntos e decisões relacionadas à formação dos profissionais de saúde;

• Instituir relações orgânicas entre estruturas de gestão da saúde (práticas gerenciais e organização da rede), instituições de ensino(práticas de formação, produção de conhecimento e cooperação), órgãos de controle social em saúde (movimentos sociais e educação popular) e serviços de atenção (profissionais e suas práticas)”.

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hospitalocêntrico e “médico-centrado” existente na década de 80. O EAT faz parte do IMAS

Nise da Silveira, antigo Centro Psiquiátrico Pedro II (CPP II), localizado no Engenho de

Dentro. Possui equipe multidisciplinar visando à interdisciplinaridade.

O objetivo desta monografia é responder a pergunta: é possível uma relação entre a

integralidade e a formação do psicólogo? Esta pergunta engloba os vários questionamentos

realizados acima. Para ocorrerem mudanças na graduação em Psicologia, visando à educação

permanente em saúde, é necessário que a noção de integralidade esteja presente não como

algo novo, mas como algo a ser buscado, construído e colocado permanentemente em análise,

envolvendo alunos, professores e direção.

Será também realizada uma análise do currículo do Instituto de Psicologia da UERJ,

com o objetivo de resgatar sua história, construção, bem como os impactos na formação dos

alunos deste Instituto, a fim de entender a separação da formação dos futuros psicólogos da

construção das políticas públicas de saúde do país, dada a falta de ligação da própria formação

com os princípios do SUS: Universalização, Equidade e Integralidade, este último sendo

nosso foco de análise.

A participação dos psicólogos nos movimentos das Reformas Psiquiátrica e Sanitária

necessita de um foco especial, porque é em sua atuação que encontraremos as repostas da

Psicologia frente aos novos paradigmas que surgiam, e a partir daí entender a conseqüência

dessas respostas para a formação acadêmica e para a atuação profissional.

Os desafios inerentes a uma prática integral pelos psicólogos também não passarão

despercebidos. Assim, no último capítulo, realizamos um levantamento de alguns desses

desafios, apontando já para uma articulação entre a integralidade e a formação. Por fim,

apresentamos o Espaço Aberto ao Tempo, no sentido de trazer à tona uma experiência de

prática integral que certamente marcará nossa atuação profissional daqui por diante.

Fonte: http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/aprendersus2.pdf. Acessado em: 24/02/2006

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3 – Formação profissional

3.1 - Modos de subjetivação do poder psi;

“O Homem é um ser histórico e ele nunca pode ser entendido separado de sua história”

William Barret

Para que seja possível avaliar o impacto da presença de determinadas práticas

profissionais dos psicólogos nos serviços de saúde pública, para que possamos entender a

lacuna causada pela ausência da integralidade na formação psi, é preciso, antes de tudo, um

exercício de resgate histórico. Segundo Jacó Vilela (1994), a Psicologia tende a ver os

indivíduos de nossa época e de determinadas camadas sociais como atemporal. A tendência à

naturalização das ações e das práticas, como se já estivessem dadas de antemão, é a outra face

da ausência de questionamento sobre a maneira como foram construídas historicamente. Mais

ainda, como foram contadas historicamente. Nosso presente é composto pelo que aprendemos

com o passado e pelo que esperamos do futuro; logo, no momento em que tentamos entender

o presente da Psicologia nos serviços de saúde pública, tampouco podemos considerá-lo como

atemporal, como algo flutuante no espaço, no vácuo. É preciso, ao contrário, afirmar como

contar essa história, e situá-la não só no tempo, mas também no espaço.

Pois então, como contá-la? A Análise Institucional nos apresenta algumas ferramentas,

alguns conceitos que certamente servirão como uma orientação. Através de uma Análise

Institucional, espera-se trazer “... à luz o que está escondido e só se revela pela operação que

consiste em estabelecer relações entre elementos aparentemente disjuntos. Trata-se de

reconstruir uma totalidade que se havia rompido.” (Lourau, 2004, p. 68). Por sua vez, para

Lourau: “O que aprendemos, durante esses vinte anos de trabalho, foi conhecer melhor o

instituído e os diversos níveis contraditórios na instituição. E é a isso que visa toda análise

institucional, toda socioanálise” (Lourau, 1993, p. 12).

É a partir dessas referências iniciais que nos voltamos para o Instituto de Psicologia da

UERJ, para o seu curso de formação. Entendê-lo como uma instituição, dotado de uma série

de elementos que permanecem ocultos, não-ditos (e conseqüentemente inquestionáveis,

instituídos e, para seus operadores, tão ocultos quanto, em seus lugares instituintes), nos leva

a uma procura, que é a procura da socioanálise, por problematizar a aceitação do instituído

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como natural, por evitar a manutenção da reprodução de práticas já instituídas, por retirar da

escuridão instituído e instituinte. “As instituições não são somente os objetos ou as regras

visíveis na superfície das relações sociais. Têm uma face escondida. Esta face, que a análise

institucional se propõe a descobrir, revela-se no não dito... Não se trata de construir um

discurso explicativo, mas de trazer à luz os elementos que compõem o conjunto.” (Lourau,

2004, p. 68).

A essas tentativas, somam-se os conceitos de implicação e analisador. Pela noção de

implicação, refiro-me, mais precisamente, à “análise de nossas implicações; ou melhor, a

análise dos lugares que ocupamos, ativamente, nesse mundo.” (Lourau, 1993, p. 14).

Trata-se de uma referência à tentativa de não se alegar pretensamente neutro quanto

aos acontecimentos, de retomar a gestão sobre os mesmos. Em relação aos analisadores, por

sua vez, é possível considerá-los como “Aqueles acontecimentos (...) que fazem aparecer, de

um só golpe, a instituição invisível...”. (Idem). Ou seja, espera-se que durante nosso mergulho

também surjam esses analisadores que servirão para “desvelar” os modos como a instituição

IP-UERJ se faz presente.

Prosseguimos, então, com Tânia Ribeiro Catharino, que no artigo “Fragmentos da

história da Psicologia no Brasil”, ressalta a necessidade de se entender em que contexto se

produzem os fenômenos psi, “desde que entendamos a psicologia articulada a uma

materialidade; desde que não queiramos fragmentar subjetividade e objetividade”

(Catharino,1999, p. 169). A problemática teoria-prática e a das práticas frente as demandas

capitalistas são os dois acontecimentos analisados pela autora.

O problema da dicotomia teoria-prática é um velho conhecido, já abordado por vários

autores. Para Catharino, o problema da Psicologia no Brasil estaria em: “... encontrar as

origens de suas dificuldades numa separação entre ciência e técnica. A partir de uma tradição

colonialista, nosso país importaria técnicas de uma forma indiscriminada, com vistas à

aplicação imediata, permanecendo as ciências das quais elas derivam como mero acessório.”

(Catharino,1999, p. 169).

A autora aponta que isso acarretaria ação precedendo a teorização: logo, o problema

residiria em uma prática profissional vista como algo descolado de um aprofundamento

teórico inicial, necessário e fundamental, e que a regulamentação da profissão em 1962 teria

vindo, supostamente para corrigir isso. A partir daí, a graduação se transforma no único meio

de profissionalização, enfatizando áreas como a clínica, escolar e industrial, fazendo do

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psicólogo um profissional liberal. A regulamentação profissional estaria, segundo Catharino,

diretamente ligada: “... à demanda empresarial (privada e/ou estatal) que impulsiona a

institucionalização da formação profissional, vinculada aos interesses de grupos específicos

que, obviamente, possuem problemas também específicos.”

Ou seja, a formação profissional teria por base interesses outros que não o do

desenvolvimento teórico e prático da Psicologia, funcionando em uma lógica mercadológica,

voltada para apreensão de técnicas para aplicação imediata segundo as necessidades desse

mercado, configurando assim: “... a impotência do ensino superior para formar profissionais

que prestarão serviços à comunidade”.

Este é um primeiro analisador que surge, e tem relação direta com a problemática do

presente trabalho. É nesse momento que fica claro, pela primeira vez, que a formação do

psicólogo está afastada das demandas da população, da comunidade. No decorrer do texto,

falaremos de uma mudança, em meados dos anos 1970, que trouxe a noção sintetizável como

“tudo pelo social” e, assim, acabou trazendo, para a prática nos serviços de saúde pública,

psicólogos sem a capacitação e o aprofundamento teórico que seriam necessários, via

formação, para trabalhar nessa área, reatualizando assim o problema teoria-prática colocado

por Catharino.

Simultaneamente (e sem perder de vista o problema teoria-prática, que será retomado

posteriormente), temos a expansão do campo da clínica, ou melhor, de uma concepção

clássica de clinica exercida pelo profissional liberal, realizada em consultórios particulares.

João Leite Ferreira Neto, em sua tese de Doutorado, problematiza este aspecto da seguinte

forma: “O ponto de partida da investigação é a hipótese de que atualmente podemos falar de

uma Psicologia clínica clássica ou tradicional em oposição a novas formas de inserção e

concepções de prática clínica. A clínica tradicional possui um modelo mais homogêneo,

largamente influenciado pelo modelo médico de atendimento. Disso decorre sua preocupação

curativa na resolução de conflitos mentais, bem como a ênfase sobre o psicodiagnóstico e

modos de classificação nosológica. Em se apresenta fundamentalmente como um sistema de

atenção voltado para o indivíduo em que prevalecem as atividades de psicodiagnóstico e

psicoterapia individual, exercidas preferencialmente em consultórios particulares para um

clientela que pode pagar pelos serviços.” (Ferreira neto, 2002, p. 81)

Percebemos, levando em conta as palavras do autor, que a concepção de prática que se

tinha da Psicologia era extremamente restrita, reducionista e frágil, pois ainda se via na figura

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do médico, e no que ela representava no imaginário da sociedade, um modelo de atuação. Ou

seja, a fragilidade da prática psi estaria justamente em não possuir um "corpo próprio": a

descrição das atividades do psicólogo praticamente configura um papel complementar ao

trabalho do médico. Parece que a concepção clássica de clínica, e grande parte dos problemas

que acarreta na prática dos psicólogos até hoje, veio de uma necessidade inicial da Psicologia

de se ancorar em um saber anterior, já estabelecido. Talvez por fragilidade, mas talvez

também, e isso seria o mais assustador, por "escolha". Seja qual for o motivo, porém, é

possível que tenhamos aí a origem de vários problemas encontrados hoje em dia pelos

psicólogos na atuação em serviços de saúde, como por exemplo a atuação freqüentemente

restrita ao atendimento ambulatorial – clínica de consultório dentro da instituição de saúde,

geralmente sendo solicitada através de encaminhamento médico, e ausência de um trabalho

interdisciplinar, já que a figura do médico predomina diante dos demais profissionais de

saúde, encontrando-se no topo de uma cadeia hierárquica de importância.

Retomando a questão do “tudo pelo social” que teve início da década de 1970, voltamos

a consideração de Ferreira Neto que, utilizando pesquisas realizadas pelo CFP em 1987 e

1994, situa como se segue o início das mudanças nas formas de atuação psi: “... não devemos

supor que as mudanças que ocorreram devam sua gênese a essas pesquisas e debates. Na

verdade, esses reverberam o impacto de acontecimentos sociais e políticos, que sacudiram a

vida nacional desde a segunda metade da década de 70, em especial a eclosão dos

movimentos sociais que fizeram resistência ao regime militar e, na década seguinte, a uma

parcial retomada de certas funções do estado brasileiro na chamada área social (saúde,

educação e ação social). No bojo desses eventos, o psicólogo brasileiro, pela primeira vez,

amplia o espectro de sua atuação, até então voltada para as classes média e alta da população,

em direção às demandas das classes populares. Esse encontro será o motor propulsor de uma

série de mudanças na sua atuação e formação, que repercutem até hoje.” (Ferreira neto, 2002,

p.75)

Este parece ser o primeiro momento significativo de mudança nos modelos de formação

e de atuação do Psicólogo, sendo importante destacar que está predominantemente marcado

pela atuação e interferência dos movimentos sociais que exerciam resistência à ditadura. As

transformações propostas a partir das críticas feitas ao modelo de atendimento liberal, voltado

para as camadas mais abastadas da população, descontextualizada de realidade brasileira e

conseqüentemente, homogeneizante, não ocorreram, no entanto, até o final da década de

1980. Somente então, à noção de função social somou-se uma série de mudanças na realidade

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do cotidiano de trabalho dos profissionais psi. Infelizmente, como indica Ferreira neto

através, uma vez mais, das pesquisas do CFP (1987,1994), a maneira como foi abordada a

questão pelas pesquisas - que mostram, através da fala de entrevistados, uma análise do perfil

dos psicólogos (1987) e das práticas emergentes e desafios para a formação (1994) - pode

levar a interpretações erradas ou confusões. “... antes o consultório particular, agora uma

organização pública ou comunitária; antes clientes oriundos das classes média e alta, agora,

uma clientela proveniente das classes populares. Entendido dessa maneira, o novo contexto

obrigaria os psicólogos a adaptarem seu instrumental de trabalho (originalmente ligado ao

consultório liberal) diante das novas condições de atuação. O social aí é tomado ora como

dimensão geográfica, da zona sul para as favelas e a periferia das cidades, ora como dimensão

de classes, das média e alta para as populares, ou seja, o social como sinônimo de pobreza...”

Segundo Ferreira Neto - com o qual concordamos -, o problema do contexto social fica

colocado de uma maneira muito simplista através das falas dos entrevistados. A idéia que

atravessa as alegadas “mudanças” é justamente a noção de "social" como sinônimo de

pobreza, noção ainda elitista que permeia as modificações curriculares do fim dos anos 1980,

mas decerto não produz transformações significativas na formação dos profissionais psi. Para

Ferreira Neto, ligar a transformação dos modelos de formação à simples adequação do

psicólogo a novos campos de trabalho, sem levar em conta a concepção de subjetividade

implicada nessas novas práticas, "acarreta a manutenção de um modelo de clínica consoante à

flexibilização, no sentido liberal recente, mantendo sua função normalizadora de produção de

subjetividades a serviço do controle social”. (Ferreira Neto, 2002, p.86)

As críticas ao modelo liberal (e clássico) de clínica emergiram a partir da segunda

metade da década de 1970, mas só aconteceram as primeiras mudanças curriculares no final

da década de 1980, através do que podemos chamar uma atualização disfarçada da clínica

clássica, que associava o social à pobreza, e logo assumiria um caráter normalizador na

produção de subjetividades. O psicólogo tende assim a tornar-se, de forma mais nítida, um

agente de controle da sociedade; neste sentido, não deixa de acompanhar a Medicina, mas aí

não são os corpos que são controlados e sim as almas... A tendência curativa, esta jamais

criticada, faz com que a Psicologia seja vista como uma forma de salvar as pobres almas, e

almas de pessoas pobres. No momento desta ocorrência, pode-se apreciar, mais uma vez,

completa desconexão com a realidade do país: no final da década de 1980, destacam-se os

movimentos de Reforma Sanitária e Psiquiátrica, a implementação do Sistema Único de

12

Saúde e as discussões acerca do projeto de lei Paulo Delgado2. O que nos preocupa, em

especial, é a maneira como o processo de normalização e produção de subjetividades sobre a

população acaba acontecendo também dentro da instituição formadora, dessa vez sobre os

alunos. Quando o estudante se torna um profissional, ao final da faculdade, leva à sua prática

a reprodução deste processo, o que acabaria criando um círculo vicioso.

Além disso, torna-se também motivo de preocupação o aparente atraso de uma década

para que a discussão e as críticas relativas aos modelos clássicos de atuação alcancem, em

primeira instância, o currículo, e em segunda instância, a formação. O currículo da UERJ

utilizado atualmente, implementado em 1990, ainda corresponde basicamente ao currículo

pleno de 1977, com o simples acréscimo de um conjunto de disciplinas, extinção de outras e a

troca da nomenclatura, corroborando a atualização disfarçada da clínica clássica, permitindo

que ao longo desses anos a reprodução de práticas descoladas dos variados contextos sociais,

das discussões de movimentos como a Reforma Sanitária e a Luta antimanicomial fossem

uma constante na formação dos psicólogos da UERJ nos últimos 16 anos. Essa discussão será

desenvolvida a seguir.

3.2 - Currículo da UERJ

A lei nº 4.119 de 27 de agosto de 1962 veio regulamentar a profissão do Psicólogo no

país, e o Parecer Nº 403/1962, o currículo mínimo para os cursos de Psicologia; desde então,

diversas mudanças curriculares ocorreram no IP-UERJ. A seguir, apresentamos um quadro

comparativo entre o currículo mínimo exigido, o currículo pleno utilizado pelo IP-UERJ até

1990 (implantado em 1977 e revisado em 1985) e o currículo utilizado atualmente,

implantado nesse mesmo ano:

2O projeto Paulo Delgado dispunha sobre a extinção progressiva dos manicômios e sua substituição por outros recursos assistenciais e regulamenta a internação psiquiátrica compulsória (Congresso Nacional, 1989 apud Machado,A.L. 2004)”.

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Currículo Mínimo (Parecer Nº 403/1962) 1- Fisiologia; 2- Estatística; 3- Psicologia Geral e Experimental; 4- Psicologia de Desenvolvimento; 5- Psicologia da Personalidade; 6- Psicologia Social; 7- Psicopatologia Geral. 8- Técnicas de Exame e Aconselhamento Psicológico; 9- Ética Profissional; 10/12- Três dentre as seguintes:

a. Psicologia do Excepcional;

b. Dinâmica de Grupo e Relações Humanas;

c. Pedagogia Terapêutica;

d. Psicologia Escolar e Problemas de Aprendizagem;

e. Teorias e Técnicas Psicoterápicas;

f. Seleção e Orientação Profissional;

Currículo pleno (Resolução 476 de 2229/12/1976; Revisado pela deliberação 122 de 03/07/1985) 1º Período

1. Bioquímica 2. Matemática I 3. Antropologia

BiológicaIII 4. Biologia Geral e

Humana 5. Intr. Met.. à

psicologia I 6. Introdução hist. À

psicologia 7. Sociologia VII 8. Ed. Física I

2º Período 1. Fisiologia III 2. Matemática II 3. Antropologia

Cultural III (tornou-se eletiva)

4. Genética Básica e do comportamento

5. Introd. Met. À psicologia II

6. Introd. Hist. À psicologia

7. Psicologia Comparada

8. Ed. Física II 3º Período

1. Psicofisiologia 2. Estatística VII 3. Psicologia

Experimental I 4. Psicologia do

Desenvolvimento I

5. Psicologia social I 6. Psicologia Geral I

4º Período 1. Estatística VIII 2. Psicologia de

Aprendizagem I 3. Psicologia

Experimental II

Currículo Atual* (Deliberações 221 de 04/12/1989 e 14 e 14/09/1990) 1º Período

1. História da Psicologia I 2. Psicologia: Formação e Profissão 3. Estatística I 4. Introdução ao Pensamento

Psicológico I 5. Psicologia Geral e Experimental I 6. Introdução aos Métodos de Pesquisa

em Psicologia 2º Período

1. História da Psicologia II 2. Neuroanatomia (1) 3. Sociologia 4. Estatística II 5. Introdução ao Pensamento

Psicológico II 6. Psicologia Geral e Experimental II 7. Prática de Pesquisa em Psicologia I

3º Período

1. Teorias e Sistemas Psicológicos I 2. Fisiologia 3. Psicologia Social I 4. Psicometria I 5. Psicologia do Desenvolvimento I 6. Psicologia Geral e Experimental III 7. Prática de Pesquisa em Psicologia II

4º Período

1. Teorias e Sistemas Psicológicos II 2. Psicofisiologia I 3. Psicologia Social II 4. Psicologia da Personalidade I 5. Psicologia do Desenvolvimento II 6. Psicolingüística 7. Psicologia da Aprendizagem I

5º Período

1. Teorias e Sistemas Psicológicos III 2. Psicofisiologia II 3. Psicologia Social III 4. Psicologia da Personalidade II 5. Psicologia do Desenvolvimento III 6. Técnicas de Exame Psicológico 7. Psicologia do Excepcional I

6º Período

14

g. Psicologia da Indústria.

Estágio supervisionado

4. Psicologia do desenvolvimento II

5. Psicologia Social II

6. Psicologia Geral II 5º Período

1. Estatística IX 2. Téc. de pesquisa

psicológica I 3. Psicologia do

Desenvolvimento III

4. Psicologia Social III

5. Psicologia Geral III

6. Técnica de exame psicológico I

7. Estágio Supervisionado em Psicologia I

8. Teorias e sistemas em Psicologia I

6º Período

1. Estatística X 2. Téc. de pesquisa

psicológica II 3. Psicologia do

desenvolvimento IV

4. Psicologia Social IV

5. Psicologia Geral IV

6. Técnica de exame psicológico II

7. Estágio Supervisionado em Psicologia II

8. Teorias e sistemas em Psicologia II

7º Período

1. Psicopatologia Geral

2. Psicometria I 3. Psicologia da

Personalidade I 4. Técnica de exame

psicológico III 5. Estágio

supervisionado

1. Teorias e Técnicas Psicoterápicas 2. Psicopatologia Geral 3. Psicologia Organizacional 4. Ética Profissional 5. Técnicas de Exame Psicológico II 6. Técnicas de Exame Psicológico III 7. Estágio Básico

7º Período

1. Psicopatologia Especial (7) 2. Psicologia nas Instituições Escolares I

(10/12 – d) 3. Psicologia nas Instituições de Saúde I 4. Psicologia do Trabalho I 5. Técnicas de Exame e Aconselhamento

Psicológico 6. Estágio Supervisionado em Psicologia

I 8º Período 1. Terapia Psicanalítica I 2. Terapia Comportamental I 3. Terapia Existencial Humanista I 4. Gestalt-Terapia I 5. Estágio Supervisionado em Psicologia II 9º Período

1. Monografia I 2. Estágio Supervisionado em Psicologia

III 10º Período

1. Monografia II 2. Estágio Supervisionado em Psicologia

IV

• Prática de Pesquisa em Psicologia III • Psicologia Jurídica • Tópicos Especiais em Psicologia • Técnicas em Psicologia do Trabalho I • Psicologia do Trabalho II • Orientação Vocacional (10/12 – f) • Escola Francesa • Psicopedagogia • Escola Inglesa

*Disciplinas oferecidas nos últimos cinco anos.

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em Psicologia III 6. Psicologia

organizacional 7. Fundamentos

Epistemológicos em Psicologia

8. Tópicos especiais em Psicologia

8º Período

1. Psicometria II 2. Psicologia da

Personalidade II 3. Técnica de Exame

psicológico IV 4. Estágio

supervionado em psicologia IV

5. Psicologia Jurídica 6. Lógica Simbólica* 7. Psicolingüística 8. Psicologia da

Comunidade 9º Período

1. Psicopatologia Especial

2. Psicologia da Industria I

3. Psicologia do Excepcional

4. Dinâmica de grupo e relações humanas I

5. Técnica de exame e aconselhamento em Psicológico I

6. Estágio supervisionado em Psicologia V

7. Teorias e Técnicas psicoterápicas I

8. Psicologia Escolar e problemas de aprendizagem I

10º Período

1. Técnica de exame e aconselhamento em Psicológico II

2. Psicologia da

*Disciplinas eletivas oferecidas nos últimos cinco anos * As disciplinas sublinhadas correspondem ao currículo mínimo

16

Indústria II 3. Pedagogia

terapêutica 4. Dinâmica de grupo

e relações humanas II

5. Ética profissional 6. Estágio

Supervisionado em psicologia VI

7. Teorias e Técnicas psicoterápicas II

8. Psicologia Escolar e problemas de aprendizagem II

*Disciplinas eletivas *Disciplinas extintas em 1990 *Disciplinas que se tornaram eletivas em 1990

Realizando uma análise preliminar do currículo do IP-UERJ, tendo em vista a

experiência da aluna nos últimos cinco anos, podemos perceber as seguintes questões:

- A mudança do currículo é caracterizada marcantemente pela extinção de disciplinas

que em grande parte seriam “heranças” da passagem do curso de Psicologia pelo Instituto de

Biologia (de 1968 até 1971); pela inclusão da monografia como pré- requisito para a

formação; pelo acréscimo de disciplinas relacionadas à formação do Psicólogo, como :

Gestalt-Terapia, Terapia Psicanalítica, Psicoterapia Existencial Humanista e Terapia cognitivo

– comportamental, obrigatórias para a formação de Psicólogo, bem como as disciplinas

Psicologia do Trabalho, Psicologia nas Instituições escolares, e Psicologias nas Instituições de

saúde. Esta última incluída como obrigatória ainda no bacharelado, e não só na formação, o

que significou, ao que parece, uma preocupação em fazer do conteúdo dessa disciplina algo

comum aos bacharéis e/ ou Psicólogos que estariam se formando. Isso chama muito atenção,

já que seria um reflexo da questão colocada anteriormente, relacionada à necessidade

17

emergente de se incluir essa discussão no currículo, devido a ampliação da atuação dos

Psicólogos nos serviços de saúde no final da década de 80 apontada pelas pesquisas do CFP.

- Predominância de um enfoque tradicional de prática clínica. Considerando um total de

49 disciplinas obrigatórias (Departamento de Fundamentos: 24; Departamento de Psicologia

Social: 8; Departamento de Psicologia Clínica: 12; Departamentos de outras unidades

acadêmicas: 5), podemos perceber que excetuando-se o departamento de Psicologia Social

(por apresentar conteúdos voltados para os diferentes contextos sociais da prática profissional)

e a disciplina Psicologia do Excepcional (por ter como característica um enfoque da clínica

associado a prática e aos desafios característicos encontrados na área), as demais disciplinas

encontram-se voltadas para uma instrumentação teórica e técnica mínima, que apesar de

fundamental, mostra-se insuficiente para abarcar a complexidade da atuação exigida do

Psicólogo nos dias de hoje.

- Ao longo desses anos, apesar de algumas disciplinas remeterem, teoricamente, a áreas

de atuação mais voltadas para a realidade social, como Psicologia Social, Psicologia nas

Instituições escolares e Psicologia nas Instituições de saúde, a articulação com o contexto fica

na dependência da orientação teórica do professor. Ou seja, depende do que ele entende por

Psicologia Social, por exemplo, e qual linha segue dentro desta. Assim, é possível ir desde um

discurso técnico-científico, voltado para discussões teóricas (necessárias, mas desarticuladas

da realidade) até o debate sobre atuação em comunidades - o que poderia ser extremamente

enriquecedor se estivesse dentro de um planejamento conjunto entre os professores, o que não

acontece. Em Psicologia em Instituições de Saúde, é possível em um semestre ter uma

orientação mais voltada para a visão da análise institucional, que conseqüentemente

problematiza as questões das instituições de saúde, por exemplo, e em outro semestre um

psicanalista, mais preocupado em discorrer sobre a Psicose, sem uma discussão sobre o que

seja saúde de maneira ampla e integral, considerando todos os aspectos da vida da sociedade

em que vivemos.

- A existência de somente uma disciplina que pode trazer a discussão sobre saúde

publica (Psicologia nas Instituições de Saúde) no que diz respeito ao funcionamento do SUS

em nosso país, o contexto em que surge, os avanços que representa na área da saúde e os

entraves que encontra para sua efetiva implementação, assim com a discussão sobre como

seria a atuação do Psicólogo nesses serviços, qual seria seu papel. Entendendo saúde de uma

forma ampla, como uma discussão intersetorial, que engloba as condições de vida de uma

população, por mais que a discussão sobre saúde perpasse algumas outras disciplinas, o

18

conteúdo ainda fica restrito às áreas destas (ex. Psicologia do trabalho e Psicologia nas

instituições escolares), não sendo suficiente para o entendimento do que é o trabalho no

sistema de saúde do nosso país, o que é o trabalho do psicólogo neste sistema.

- Disciplinas desarticuladas, já que os conteúdos de uma quase sempre se repetem em

outras quando a orientação teórica é a mesma, demonstrando a falta de articulação entre os

professores que oferecem as disciplinas, até mesmo sendo do mesmo departamento. Isso

ocorre, por exemplo, no caso das disciplinas de orientação psicanalítica, ou com professores

de orientação psicanalítica. No 5º período, enquanto a professora de TSPIII ensina a 1ª e a 2ª

tópica do trabalho de Freud, a professora de Personalidade II ensinava o mesmo conteúdo. No

caso da orientação comportamentalista, ao mesmo tempo que a professora de Psicologia da

Aprendizagem ensinava a questão da aprendizagem por Skinner, o professor de TSP II

ensinava exatamente a mesma coisa.

- Essa falta de articulação também fica evidente quando professores de linhas teóricas

completamente diferentes, até mesmo opostas, oferecem as disciplinas de Psicologia Social I,

II e III. Concepções mais clássicas de Psicologia social se chocam com a de professores de

orientação mais críticas, baseadas em referenciais como o da análise institucional, por

exemplo;

- Disciplinas de psicoterapias (Gestalt-Terapia, Terapia Existencial, Terapia Cognitivo-

comportamental e Terapia Psicanalítica) são ministradas somente após a entrada doa aluno

para estágio no SPA;

- Entrada tardia no SPA, somente no 7ºP. No 6ºP as atividades do estágio básico

limitam-se a procurar diminuir o “buraco” que ficou na formação, levando os alunos a

pesquisarem sobre as diversas áreas de estágio do SPA. Dependendo do supervisor, é

recomendada a pesquisa fora do contexto institucional também, já que o modelo de formação

não oferece oportunidade de conhecer essas áreas curricularmente antes disso. (No segundo

semestre de 2004, foi somada à atividade do estágio básico a triagem, que minimiza em um

período o início da realização de alguma atividade prática.).

Começam a surgir alguns atravessamentos a partir desta primeira análise: o que se torna

mais evidente é a orientação teórica do professor, a visão que ele tem de determinada

disciplina, quando muito, da possível aplicação prática de determinada disciplina. Essa

questão coloca em evidência o poder instituído dos professores, expondo uma outra dimensão

da formação, mostrando os aspectos ocultos desta, “... que revelam um papel socializador:

19

dizem respeito as experiências que são vividas, mas que não se encontram registradas em

nenhuma grade curricular. São práticas que nos remetem a relações de saber-poder e a

aspectos (re) produtivos do contexto social onde o currículo se inscreve. Assim vai se

afirmando o currículo real – aquilo que efetivamente ocorre em sala de aula – cuja

materialidade é expressão dessa dinâmica, deste processo e deste movimento.” (Catharino,

1998, p. 10). Esta dimensão – a forma como acontece a manutenção desse saber-poder - se

encontra para além de qualquer reforma curricular que tenha acontecido, ou que esteja

acontecendo, no caso do IP-UERJ. Poderíamos transformá-la em uma pergunta: Como se dá o

currículo real? Pois, por mais que se mude a ementa de determinada disciplina, ou que se

criem disciplinas, o professor decidirá como acha melhor ensiná-la, e esse como quase sempre

tem a ver com a área de atuação /teórica que ele domina melhor, o que não significa,

necessariamente, uma correspondência com a proposta da ementa. Muitas vezes, a opção por

não seguir a ementa pode ser extremamente “saudável”, quando existe uma avaliação por

parte do professor de que o conteúdo nela proposto não condiz com uma visão atual de

determinado conteúdo, ou então por não possuir a perspectiva crítica que seria necessária para

seu entendimento e sua utilização. Mas quando essa escolha ocorre (principalmente em

disciplinas que têm como princípio apresentar diversas teorias acerca de um tema, como

Psicologia da Personalidade; Teorias e Técnicas Psicoterápicas; Técnicas de Exame e

Aconselhamento Psicológico) porque o professor entende que a sua orientação teórica é

superior às demais orientações, ou porque possui fragilidade teórica em outras linhas que não

a sua, isso acaba por configurar o currículo real, ou seja, coloca em evidência os

atravessamentos da formação instituída no Instituto de Psicologia.

Outra questão séria é a falta de diálogo entre os professores dentro de alguns

departamentos. Como as disciplinas são oferecidas aos alunos de acordo com a preferência

dos professores, não existe sequer algum tipo de acordo para que certos conteúdos não se

repitam durante a graduação, obrigando os alunos a uma “overdose” dos mesmos. Pensar em

interdisciplinaridade então...

Logo, voltando ao nosso problema específico, podemos concluir que uma disciplina

(Psicologia nas Instituições de saúde) não é o suficiente para trazer a discussão acerca do

sistema de saúde público, muito menos para problematizar a atuação dos psicólogos nas

instituições, principalmente estando tal disciplina à mercê das preferências eventuais do

professor. É possível que em um determinado período o professor da disciplina mude, e de

acordo com o seu entendimento desta, uma turma passe mais da metade do semestre

20

estudando a clínica das psicoses, como já aconteceu. Some-se o fato desse conteúdo já estar

sendo ensinado na disciplina de Psicopatologia Especial, no mesmo período, o que nos leva à

“pergunta que não quer calar”: qual a relação da Psicose com a disciplina Psicologia nas

Instituições de saúde? Segundo o professor, à época: “Vocês vão encontrar muito psicóticos

nos hospitais”.

Diante dessa formação fragmentada, a indagação que se apresenta é se a forma como

são estabelecidas as formas de saber-poder dentro do curso serão reproduzidas na sociedade,

quando os profissionais se formarem, reforçando, no cotidiano de trabalho, a ausência de

diálogo com outros profissionais de saúde, a ausênca de interdisciplinaridade e a manutenção

do status quo. De um saber-poder, em suma, que se impõe diante do outro (cliente, paciente,

usuário...), como um dia foi imposto sobre ele: “... o aspecto produzido como oculto na

formação do psicólogo começou a se mostrar, apontando para a cristalização de muitos

papéis, como os de professor e aluno, psicólogo e cliente, supervisor e estagiário, que são

cotidianamente reproduzidos e / ou fortalecidos através da divisão social de trabalho no

capitalismo, afirmando as relações de saber-poder. Ao naturalizar e sacralizar instituições

como a ciência, o homem, a supervisão e o estágio, os personagens da trama da formação

perderiam a noção de que as práticas sociais, particularmente as práticas profissionais, nas

quais nos incluímos, forjariam, além de conceitos e objetos, novas subjetividades, novos

sujeitos.” (Lima, 1999, p. 161). Como personagens, somos conduzidos a contar uma história

que não foi escrita por nós, a qual não nos é permitida a aproximação. E essa história estaria

fadada a ser recontada, reproduzida no decorrer da formação, e a saltar do “papel” em que foi

escrita, para ser lida e entendida (tal como ela é) por nossos “clientes”. E assim se tornariam

também personagens dessa história, criando um círculo vicioso, que confere sempre os

mesmos papéis aos mesmos personagens, anulando qualquer possibilidade de processos

novos de singularização “... através dos quais os sujeitos se reapropriam dos componentes de

subjetividade...” (Catharino,1998, p. 11)

Este currículo, da maneira como existe hoje, só começou a existir dentro da

Universidade através da criação, em 1986, da Faculdade de Comunicação Social, fazendo

com que o Instituto passasse de Instituto de Psicologia e Comunicação Social (criado em

1971), para Instituto de Psicologia. O Serviço de Psicologia Aplicada foi criado em 1969,

antes da criação do Instituto e, segundo Yonne Moniz Reis, “A supervisão como atividade

didática ganhou significado na prática da Psicologia. A figura do professor psicólogo

apareceu, e muito para preservar a vinculação da sala de aula ao estágio, ou seja, da teoria à

21

prática, prevenindo possíveis distanciamentos entre trabalhos de classe e SPA”. (Reis,

1988, p. 28)

Temos a volta, então, do problema teoria-prática, já abordado anteriormente. Dando

prosseguimento a essa questão, cabe destacar outros aspectos da mesma, como a articulação

teoria-prática dentro do instituto, ou seja: a prática oferecida pelo SPA está articulada com o

currículo oferecido? E mais: até que ponto a prática oferecida pelo SPA e o currículo estão

articulados com a realidade do sistema de saúde público carioca? Este se mostra como campo

de atuação que possui crescente demanda de profissionais psi, e é caracterizado pela

estabilidade oferecida pelo concurso público, configurando uma opção de atuação profissional

extremamente procurada nos últimos anos. Diante da realidade de saúde da população hoje e

da qualidade dos serviços que são oferecidos, esse tipo de atuação pede um diálogo constante

com as outras categorias profissionais, ou seja, uma visão intersetorial no que diz respeito a

certas áreas que se relacionam com a saúde, como a de meio ambiente, habitação; a

interdisciplinaridade, no que diz respeito ao trabalho das equipes de saúde; e a integralidade,

em relação ao entendimento da totalidade do ser humano, e também ao entendimento da

totalidade dos serviços de saúde, para isso sendo necessário e urgente uma ampliação do que

seja o conceito de saúde3.

Para que seja feita uma análise das questões colocadas anteriormente, segue-se o quadro

atual de supervisores do SPA com as respectivas áreas de atuação:

Supervisores Áreas de atuação 1 - Ademir Ferreira Pacelli Clínica institucional (Psiquiatria/HUPE) 2 - Ângela Donato Oliva Psicologia do Desenvolvimento (HUPE) 3 - Ana Paula Uziel Psicologia Jurídica 4 - Ariane Patrícia Ewald Psicoterapia Fenomenológica Existencialista 5 - Celso Lugão de Veiga Psicoterapia estratégica 6 - Cléa Soares Cerqueira (PSICANÁLISE) Clínica psicanalítica: Criança, Adolescente e

Adulto.

3 Segundo a 8º Conferência Nacional de Saúde, entende-se por saúde: “a resultante das condições de alimentação, habitação, educação, renda, meio ambiente, trabalho, transporte, emprego, laser, liberdade, acesso e posse da terra e acesso a serviços de saúde.”(Brasil, 1988)

22

7 - Deise Mancebo Pesquisa 8 - Denise Ferreira Werneck (PSICANÁLISE)

Estágio Básico / Clínica infantil

9 - Elena Maria R.V. Milmam (PSICANÁLISE)

Estágio Básico / Psicologia Comunitária

10 - Eliane Falcone Terapia Cognitiva - Comportamental 11 - Ester Susan Guggenheim (PSICANÁLISE)

Psicologia Hospitalar/ pré-natal/ UNATI

12 - Fernando Freitas (PSICANÁLISE) Psicanálise aplicada às toxicomanias 13 - Heloísa Helena Ferraz Ayres Psicologia Organizacional e do trabalho 14 - Maria da Glória de S. Baptista (PSICANÁLISE)

Estágio básico/ Clínica infantil, adolescente, adulto (individual e em grupo) – Psicanálise.

15 - Maria das Graças Paiva Psicopedagogia/ Psicodiagnóstico 16 - Maria do Carmo C. de A. Prado (PSICANÁLISE).

Psicodiagnóstico diferencial (Psiquiatria/HUPE)

17 - Maria Lúcia Seidl de Moura Psicologia do Desenvolvimento 18 - Maria Luíza Bustamente P. de Sá (PSICANÁLISE)

Psicodiagnóstico/ Psicoterapia infantil e adolescente (pediatria/ HUPE)

19 - Marisa Lopes da Rocha Psicologia Institucional (Escolar) 20 - Mariene Campos Cardoso Orientação Vocacional 21 - Márcia Mello de Lima (PSICANÁLISE)

Clínica psicanalítica

22 - Rita Maria Manso de Barros (PSICANÁLISE)

Psicanálise com crianças

23 - Roberto Araújo Bello (PSICANÁLISE)

Terapia de família

24 - Sheila Orgler Gestalt-Terapia Supervisores responsáveis por estágio na área clínica tradicional

Como foi assinalado anteriormente, a criação do SPA e a figura do Psicólogo supervisor

tiveram como objetivo assegurar a vinculação da sala de aula ao estágio, para que possíveis

distanciamentos fossem prevenidos entre o que era trabalhado em sala de aula e o SPA.

Diante disso, podemos levantar as seguintes questões:

- Com o início da atividade prática somente a partir do 7º período, o distanciamento

entre o que é visto em sala de aula e a prática que será exercida (muito depois) é evidente, já

que o aluno vê a teoria, nos três primeiros anos, separadas de qualquer aplicação prática, uma

teoria separada da realidade, de um outro que ainda é somente uma imagem, uma suposição,

um estudo de caso, um nome no papel, um número em uma pesquisa. Um outro que é

pequeno ou grande Outro, que é sujeito, indivíduo, paciente, cliente. Esse outro que nos é

apresentado no papel nos distancia, no decorrer da faculdade, da Dona Maria, do Seu João,

que trabalham o dia inteiro, convivem constantemente com a violência e possuem uma família

23

para cuidar. O acesso ao serviço de saúde é difícil, a qualidade do atendimento é diferente em

relação a quem tem plano de saúde, e pagar terapia é o último de seus problemas. Se necessita

dos grandes hospitais públicos, seu contato com o psicólogo é mínimo, pois a quantidade de

profissionais é reduzida, mal paga, e esse psicólogo, na sua formação, não teve contato com

todos esses problemas que colocados acima, pois sua graduação se restringiu ao que se espera

do fazer clássico: Psicodiagnóstico, atendimento clínico ambulatorial, área segura e

assegurada pelos psicólogos, para os psicólogos que, no entanto, precisam no dia-a-dia do

cotidiano de trabalho implorar pela atenção do médico, pois os dois, em sua formação, nunca

debateram acerca da importância do diálogo entre as profissões, de um trabalho em parceria;

- A presença de áreas de estágio no SPA mais próximas da realidade que os psicólogos

encontrarão nos serviços de saúde, como por exemplo: pré – natal, Psicologia aplicada às

toxicomanias, mas que não possuem uma disciplina correspondente no currículo que as

englobe, como por exemplo uma disciplina que discutisse, de forma ampliada, e não

especializada como no campo de estágio, Psicologia e Saúde da Mulher, e incluísse, entre

outros temas, o pré-natal.

- Dos 24 supervisores do SPA, 16 também são professores, 15 ministram disciplinas no

currículo obrigatório e 1 professor possui uma disciplina eletiva4. Apesar de 2/3 dos

supervisores do SPA serem também professores, não existe nenhum dispositivo que promova

a articulação entre o que os professores ensinam em sala de aula e as demandas apresentadas

pelos alunos através da prática exercida no SPA, que não seja a própria experiência do

supervisor em sua atividade no SPA aplicada em sala de aula, bem como sua própria

experiência profissional fora da Universidade. Em alguns casos, não existe uma disciplina que

corresponda à área de estágio que o aluno encontrará no SPA, o que não é necessariamente

ruim, mas fará com que o aluno entre completamente despreparado, sem nenhuma noção

prévia da área que estará encontrando. Por exemplo, se fosse realizada algum tipo de

avaliação ou levantamento com os alunos das dificuldades encontradas no atendimento aos

clientes, provavelmente seria possível identificar quais falhas na formação estariam ocorrendo

e como, através das disciplinas e /ou da supervisão, isso poderia ser solucionado;

4 A disciplina Psicologia do Trabalho II e o estágio oferecidos pela professora só tiveram início no primeiro semestre de 2005.

24

- Das 24 áreas de estágio, somente 5 oferecem algum tipo de inserção em Hospital, em

campos de atuação especializados;

- Predominância de estágios na área clínica tradicional (corresponde a 50% da oferta de

estágios no SPA);

- Predominância da Psicanálise.

O modelo de formação oferecido aponta para uma visão de pessoa naturalizada,

normatizada, descontextualizada da realidade dos serviços de saúde, das condições de vida da

população, e mais, da realidade dos próprios alunos. A sala de aula parece estar muito mais

ligada ao que o professor espera que o aluno saiba, do que ao que espera o aluno ao entrar no

SPA. E o que o espera ao entrar no SPA está longe, em muitos aspectos, do que a sociedade

espera dele ao tornar-se profissional.

3.3 - A interdisciplinaridade nos serviços de saúde – afinal, o Psicólogo

é da área de saúde?

A emergência da Psicologia da saúde como novo campo do saber é discutida por Spink5

(2003) que inicia sua argumentação dizendo que a Psicologia como disciplina chega

tardiamente à área da saúde, buscando ainda seu referencial teórico, “tateando”, tentando

romper com a visão da clínica tradicional, através da qual que estava acostumado a ver o

homem como ser a – histórico, como indivíduo abstrato.

Até esse momento, a atuação principal dos psicólogos estaria calcada em duas

dimensões, a primeira sendo o modelo de clínica liberal, de consultório, pouco acessível às

camadas menos abastadas da população e não inserida no contexto dos serviços de saúde, e a

segunda, as atividades desenvolvidas em hospitais e ambulatórios de saúde mental. Como

afirma a autora, trabalhando de forma isolada, os psicólogos acabavam por adotar a

perspectiva médica hegemônica, o que resultava numa prática acessória à “verdadeira”

intervenção médica que viria a seguir, ou seja, as atividades da psicologia se resumiam a

assegurar que o paciente permanecesse em seu lugar de passividade para que o médico

pudesse exercer sua função sem maiores aborrecimentos.

5 Texto originalmente publicado em 1992. Título: “Psicologia da Saúde – Estruturação de um novo campo do saber”.

25

Em seguida, Spink apresenta três problemas referentes ao marco teórico que seria

adequado à Psicologia da saúde. O primeiro diz respeito ao predomínio de um “modelo

psicodinâmico” no ensino em nível da graduação, com ênfase nas aplicações clínicas na área

da saúde mental e total ausência de temáticas relacionadas a saúde pública, deixando o

contexto de atuação, ou seja, a organização dos serviços de saúde, totalmente ignorada no

curso básico. O segundo problema colocado é a predominância de enfoques do indivíduo

como ser abstrato e a-histórico, desvinculado do contexto social. A autora afirma ser pouco

freqüente, na formação, uma discussão acerca dos determinantes econômicos e sociais dos

fenômenos psicológicos. E, por fim, traz à cena novamente a hegemonia do saber médico e a

ausência de paradigmas verdadeiramente psicológicos para o estudo do processo saúde /

doença.

Esses problemas se refletiriam na forma de inserção dos psicólogos no setor saúde,

configurando, na prática, ausência de autonomia e subordinação ao saber do médico. A

formação recebida na graduação pouco contribuiria para a compreensão da organização dos

serviços de saúde e da dinâmica da práticas das diversas profissões e, conseqüentemente, para

o entendimento do processo saúde / doença, das políticas setoriais e suas implicações para os

usuários dos serviços.

Por fim, Spink aponta a necessidade de se adotar uma perspectiva mais global e

dinâmica que possibilite entender a saúde e a doença como processos multideterminados e

históricos.

Como dissemos anteriormente, o Instituto de Psicologia (UERJ) possui em sua grade

curricular uma disciplina e cinco campos de estágio no SPA que possuem alguma vinculação

à discussão sobre saúde - o que, em um universo de 47 disciplinas obrigatórias e 24 áreas de

estágio, vem se mostrando insuficiente, já que, como também vimos anteriormente, o

conteúdo a que o aluno terá acesso dependerá quase que exclusivamente do professor. Ao

passar por disciplinas como Psicologia Geral e Experimental, Psicologia da Personalidade,

Psicologia da Aprendizagem, Introdução aos métodos de pesquisa - para citar só algumas -

fica mais fácil entender o que Spink situa como um dos problemas para a Psicologia da saúde:

a noção de indivíduo abstrata e a-histórica, desvinculada do contexto social. É possível

perceber, em várias disciplinas, a ausência de reflexão sobre os determinantes sociais,

políticos, econômicos, que possuem relação com os fenômenos psicológicos estudados, o que

significa, para o aluno, uma completa fragmentação e desconexão entre os conteúdos

oferecidos período após período, além de total “descolamento” do contexto social.

26

A partir disso, a ausência de discussão sobre o processo saúde / doença durante a

formação, apesar de extremamente grave, faz um certo sentido. Com uma visão de indivíduo

abstrata, a-histórica, um currículo descontextualizado e completamente fragmentado, e sem a

discussão sobre políticas de saúde, que sentido teria a discussão sobre o que é saúde, o que é

doença, como a psicologia os vê, ou deveria vê-las, como podem ser entendidas em relação,

como são estabelecidas as relações entre elas e assim por diante? Um psicólogo que sai de sua

instituição formadora sem qualquer reflexão sobre o processo saúde / doença provavelmente

se tornará um profissional, no mínimo, restrito ao paradigma cartesiano, à dicotomia mente-

corpo, legitimando a atuação biologicista da Medicina, baseando sua própria atuação

profissional nessa visão.

Em um artigo, relativamente recente, Dimenstein (2001) realiza as seguintes

observações: “... a entrada do psicólogo nas instituições públicas de saúde, apesar de ter

ampliado seu campo de trabalho, parece não ter alterado os modelos teóricos e práticos que

fundamentam sua atuação. Ou seja, não houve uma contextualização, revisão, ou até mesmo

mudança nas suas formas tradicionais de atuar”. Seria nesse processo de transferência acrítica

que o psicólogo funcionaria como instrumento para manutenção do status quo. A autora

aponta, assim, a necessidade de expansão dos referenciais teóricos para o trabalho no contexto

institucional. Entender o cliente e seu problema sem entender a problemática mais ampla que

o tornou cliente da instituição, para a autora, seria um disparate. Em outro artigo, Spink6

(2003) discute a formação para a inserção dos psicólogos nos serviços de saúde. Como a

atuação privilegia a prática clínica centrada no consultório, a autora diz que é comum a mera a

transferência dos referenciais teóricos aprendidos na graduação para o contexto institucional.

Ao olharmos para o SPA, e verificarmos novamente as áreas de atuação, perceberemos

que o estágio em clínica tradicional representa 50% das áreas de estágio, com predominância

da Psicanálise; perceberemos igualmente os poucos estágios que possuem alguma inserção no

HUPE. Considerando que poucos psicólogos conseguirão estabelecer a prática de consultório

como sua única fonte de renda, parece justificado pensar que esses profissionais acabarão

investindo em outros campos, para os quais possam levar a “experiência” da prática clínica

aprendida na graduação. Geralmente é através das escolas, bem como dos concursos públicos

para as áreas jurídicas e as unidades de saúde municipal, estadual e federal, que se encontram

as maiores e as melhores oportunidades, que oferecem mais estabilidade. Neste último caso,

6 Inicialmente publicado na integra nos anais da XX Reunião anual da Sociedade de Psicologia de Ribeirão Preto, 23-27/10/1990. Título: “A formação do psicólogo para atuação em instituições de saúde”.

27

temos a chegada desse profissional à instituição de saúde pública sem qualquer referencial

teórico da graduação para o trabalho numa instituição de saúde.

Spink assinala, em seguida, a necessidade de referenciais interdisciplinares para atuar

em situações complexas. Falar em interdisciplinaridade e em equipes multiprofissionais é

também falar em disputa de poder sobre um determinado saber, de disputa de espaço com

outros saberes, ou seja, de um campo de forças dinâmico, em constante mutação, de um

território em que, ao invés de se privilegiarem o trabalho em equipe e o diálogo entre diversos

saberes, o que acontece é a tentativa constante de reafirmação da hierarquia entre as

profissões, representada, atualmente, pelo projeto de lei do ato médico7, por exemplo. A

noção de interdisciplinaridade, ausente do currículo, das atividades de estágio, a auto-

suficiência das profissões da área da saúde, como saberes que bastam a si próprios, acarretam

várias barreiras para a prática profissional e o trabalho no cotidiano, mas as pessoas que saem

mais prejudicadas desse processo são os usuários. Os psicólogos, acostumados a

simplesmente reproduzir, dentro da instituição, as clássicas atividades de clínica aprendidas

durante a formação, acabam por perpetuar essa situação, reafirmando o poder médico e a

fragilidade teórica da psicologia para trabalhar na área da saúde. A afirmação da Psicologia

como pertencente a área da saúde só será possível quando os aparelhos formadores decidirem

produzir conhecimento sobre o assunto, e isso só é possível com a realização de pesquisas,

debates, estágios e outros instrumentos que possam produzir reflexões contextualizadas e

regionalizadas sobre as questões de saúde que envolvem a população. E quem sabe, assim,

transformar esse profissional segundo o conceito de “operador” (Rotelli, 1990):

“Pessoas capazes de reconstruir a história de vida dos usuários para além do diagnóstico

e do sintoma, trabalhadores ativos no processo de reelaboração do sofrimento e reinvenção da

vida. O operador nessa perspectiva, volta-se para a qualidade do cuidado, a qual pressupõe

acolhida e responsabilidade pela atenção integral da saúde coletiva e individual, e para a

criação de estratégias de modificação da realidade dos usuários.” (Rotelli, 1990 apud

Dimenstein,2001)

7 O Projeto de Lei 025/2002, que institui o Ato Médico, é de autoria do ex-senador Geraldo Althoff (PFL/SC). O texto da matéria, que já sofreu algumas modificações, ainda condiciona à autorização do médico o acesso aos

28

4 – Integralidade

4.1– A participação do psicólogo nas Reformas sanitária e Psiquiátrica.

Diante da emergência de um novo campo de atuação, o da Psicologia da saúde, surge a

necessidade de reavaliação dos paradigmas até então presentes na formação e na prática dos

psicólogos, já que os modelos convencionais do fazer psi começam a se mostrar insuficientes.

Ao mesmo tempo, no final da década de 70 e durante a década de 80 já eclodiam os

movimentos sanitarista e pela Reforma Psiquiátrica, que ressaltavam ainda mais a necessidade

de se repensar paradigmas maiores, como os próprios conceitos de saúde, doença e cura,

assim como o modelo de assistência em saúde. Que percurso teria feito a Psicologia para

acompanhar tantas mudanças sociais, culturais e políticas que estavam acontecendo, e que

ainda estavam para acontecer?

Em seu texto “O psicólogo e a saúde mental”, Spink (2003), nos relata como a

psicologia moderna se encaixa nos processos de disciplinarização da sociedade, através de

técnicas de individualização. Ela nos fala também de um processo de subjetivação que

fundamentaria a psicologia como disciplina do individual e que, ao mesmo tempo, seria uma

forma de interiorização das formas de poder por todos enquanto, paradoxalmente, se

caracterizaria como uma busca por uma verdade interna - o que nos levaria a “tomar como

universal aquilo que é cultural e historicamente determinado” (Spink,2003, p. 153).

A partir das questões colocadas, Spink afirmará que o psicólogo, ao realizar o

movimento de saída da clínica privada, “um mundo de iguais”, tradicionalmente normatizante

e produtor desses processos de subjetivação, e enfrentar a alteridade – a realidade brasileira –

enfrentará barreiras que para alguns seriam intransponíveis, e para outros, um desafio. Temos

ai uma primeira grande quebra de paradigma. A psicologia sai do seu mundinho, o mundo de

dentro, para buscar o mundo de fora, o que comporta a diferença.

Spink nos oferece outro aspecto, referente às transformações que ocorreram entre as

décadas de 70 e 90, que também se apresenta como uma quebra de paradigma: “Antes de mais

nada, houve uma ressignificação da causalidade na explicação da doença, passando esta a ser

vista como processo e, especialmente como um fenômeno complexo e transdisciplinar que

precisa ser abordado de forma integradora, emglobando as dimensões bio - psico - social.”

serviços de saúde e estabelece uma hierarquia entre a medicina e as demais profissões da área. (Fonte: http://www.naoaoatomedico.com.br)

29

(Spink, 2003, p. 155). A partir dessa mudança significativa, a presença dos psicólogos tornou-

se cada vez maior não só a nível terciário, como também em nível primário. Ao debruçar-se

sobre o outro, a diferença e o complexo processo saúde –doença, não só a Psicologia, como

todas as outras profissões da saúde se vêem diante da importância de se ter uma perspectiva

integradora de todos os aspectos que envolvem o ser humano e sua saúde. Isto levou alguns

setores de algumas dessas profissões a iniciarem movimentos como a Reforma Psiquiátrica e

Sanitária. Ainda assim, essa perspectiva integradora demorou para atingir a maioria das

profissões da saúde, tendo como conseqüências a pouca inserção dessa discussão na formação

e também, no caso da Psicologia, a participação pouco significativa dos psicólogos nos

debates acerca das políticas públicas em saúde, como se verá a seguir.

Vasconcelos (1999) historiciza as principais transformações ocorridas no campo da

saúde mental nos últimos anos, assim como os desafios que surgiram e ainda surgem diante

dos profissionais envolvidos com a área. Esses desafios promoveriam discussões ainda

ligadas ao nível de pós-graduação, das entidades corporativas e dos novos serviços, não

fazendo parte ainda da formação básica do psicólogo, ou seja, a graduação, e tampouco do

imaginário da população em geral, que ainda seria muito resistente a propostas como

descentralização e desinstitucionalização.

O autor situa um primeiro período, no Rio de Janeiro, entre os anos de 1978 e 1980,

caracterizando-o como um momento de : “Mobilização na sociedade civil contra o asilamento

genocida e a mercantilização da loucura; Proto-formas das Ações Integradas em Saúde”.

Nesse momento, temos o surgimento do Movimento dos Trabalhadores de Saúde Mental

(MTSM), totalmente autônomo quanto ao Estado e grande propulsor da Reforma Psiquiátrica

brasileira. Formado predominantemente por médicos, e com amplo apoio da imprensa, teve

como principais lutas: a denúncia do surgimento desregulado de clínicas privadas que se

mantinham através de convênios com o INAMPS (Instituto Nacional de Assistência Médica

da Previdência Social), com seus pacientes completamente abandonados; reivindicação por

melhores condições de trabalho, e pela expansão da rede ambulatorial entre outros.

Ao mesmo tempo, surge a primeira tentativa de mudança no sistema de saúde de uma

forma geral, através do plano PREV-SAÚDE. Esse projeto incorporava pressupostos como a

participação comunitária, a hierarquização, integração dos serviços, regionalização e extensão

de cobertura, apontando para um “modelo sanitarista ... que, no início dos anos 80, iria

configurar o que foi chamado de Ações Integradas em Saúde” (Vasconcelos, 1999, p. 123).

Cabe ressaltar que as Ações Integradas em Saúde tiveram uma importância significativa no

30

processo de reforma das políticas públicas de saúde, uma grande vitória do movimento

sanitarista.

Por fim, a criação do PISAM (Plano Integrado de Saúde Mental) aponta para a

“formação das primeiras equipes multiprofissionais de saúde mental nas coordenações

estaduais de saúde. Visavam a formação de médicos generalistas para atender a clientela de

saúde mental e o estímulo a formação de equipes ambulatoriais multiprofissionais de saúde

mental... Principalmente no Rio de Janeiro, a estrutura dos postos de atendimento médico

(PAM´s) já possuía atendimento psiquiátrico ambulatorial, embora centrado quase que

exclusivamente na figura do psiquiatra.” (Vasconcelos, 1999, p. 123).

A contextualização do início dos movimentos de reforma sanitária e psiquiátrica

realizada por Vasconcelos é extremamente valiosa para que possamos entender o contexto em

que se encontra a saúde no Brasil no início da década de 80, e a forma como se dá a

participação da Psicologia nesse processo de mudança.

Em relação a este assunto, o autor assinala que: “A Psicologia enquanto profissão

ainda tinha uma participação insignificante e bastante marginal nos hospitais psiquiátricos e

nos serviços ambulatoriais públicos de saúde mental. Para se ter uma idéia, nos 23 PAM´s do

Rio de Janeiro, em 1980, havia 269 psiquiatras e apenas 6 psicólogos.” (Vasconcelos, 1992ª,

pág. 155 apud in Vasconcelos, 1999, p. 123). O PISAM já apontava para a formação de

equipes multiprofissionais, mas, mesmo assim, os novos modelos de atenção em saúde mental

ainda não possuíam um grande número de profissionais das outras categorias engajados

também. No que diz respeito à Psicologia, por que o engajamento não acontece?

Posteriormente, Vasconcelos aponta para um fato já mencionado aqui anteriormente. Nesse

momento, “O modelo hegemônico entre os psicólogos brasileiros já era a clínica centrada nos

consultórios particulares (Conselho Federal de Psicologia, 1988), com forte difusão da cultura

psicanalítica e de outras abordagens ligadas a um intenso processo de psicologização

individualização...” (Vasconcelos, 1999, p. 123). É muito interessante como a prática da

clínica tradicional aparece repetidamente como fator determinante para a falta de preparo dos

psicólogos para trabalhar na saúde pública, causada pela formação voltada para esse modelo

de atendimento. A Psicologia encontrava-se dentro de um círculo vicioso.

No período seguinte, caracterizado pelo autor como “Expansão e formalização do

modelo sanitarista (Ações Integradas de Saúde e Sistema Único de Saúde); Montagem das

equipes multiprofissionais ambulatoriais de saúde mental; Controle e humanização do setor

hospitalar; Ação a partir do Estado – 1980 – 1987”, acontece a entrada do Movimento dos

31

Trabalhadores de Saúde Mental em algumas esferas dos governos principalmente do Rio de

Janeiro, São Paulo e Minas Gerais, permitindo que algumas das lutas do MTSM entrassem na

agenda dessas secretarias estaduais de saúde. Nesse período é também lançado o plano

CONASP (Conselho Consultivo da Administração de Saúde Previdenciária), que tornou

possível a implementação das Ações Integradas em Saúde (1983-1986), que mais tarde

resultou no surgimento do Sistema Único de Saúde.

O MTSM trouxe como plataforma política uma verdadeira reforma do modelo de

atenção em saúde mental, como a não criação de novos leitos em hospitais psiquiátricos e sua

diminuição quando possível, e também a expansão da rede ambulatorial, visando à criação de

equipes multiprofissionais. O autor vem questionar então qual teria sido a participação dos

diferentes setores da Psicologia frente ao chamado pela atuação na reorientação da assistência

em saúde mental.

Por parte dos Conselhos Federal e Regionais de Psicologia, além de sindicatos e outros

órgãos de classe, houve uma resposta favorável, havendo apoio e até mesmo participação nas

iniciativas do MTSM. Mas, novamente em relação a graduação, Vasconcelos aponta que “...

os cursos universitários de Psicologia, particularmente os de graduação, se mostraram

geralmente inertes frente aos desafios dos novos campos de atuação profissional na área

pública, repetindo os padrões hegemônicos de formação voltados para a prática clínica nos

consultórios privados. Temáticas como saúde pública, saúde mental, psiquiatria social,

psicologia comunitária (Vasconcelos, 1985), epidemiologia psiquiátrica (Almeida Filho et. al.

,1989), antropologia voltada paras questões da saúde mental, entre outras, tiveram

pouquíssima repercussão nos cursos de Psicologia.” (Vasconcelos, 1999, p. 125).

Diante desse constatação, existem alguns questionamentos a serem feitos. Como era

possível haver apoio dos órgãos de classe como os conselhos (Federal, Regional), havendo até

a participação desses em algumas secretarias de saúde, sem que os seus integrantes levassem

essa discussão para os cursos de graduação, seja através dos conselheiros também professores

universitários, ou então através do próprio conselho como um todo? Não estariam os órgãos

de classe muito afastados dos cursos de graduação nesse momento? Como possibilitar uma

formação voltada para as novas diretrizes de atenção a saúde, com a graduação, os

movimentos sociais, e os órgãos de classe desconectados?

Para Vasconcelos (1999), a realidade do processo de formação profissional dos

psicólogos não se alterou muito da década de 80 para a década de 90. As principais entidades

corporativas dos psicólogos e alguns cursos de pós graduação demonstraram algum interesse

32

em investir nessa área, mas a formação oferecida pela graduação, básica para a prática

profissional, teria mudado muito pouco nas Universidades, que ainda estariam priorizando a

clínica clássica e tradicional, de consultório particular, dentro da lógica liberal.

Mesmo assim, o autor identifica uma mudança efetiva: ”A única mudança efetiva, a

meu ver, parece ter sido o aumento da demanda por estágios nos serviços de saúde mental,

tanto por iniciativa individual do estudante quanto através de convênios formais com os

cursos de graduação, possibilitando aos futuros profissionais alguma experiência dentro do

campo durante o curso.” (Vasconcelos, 1999, p. 140). Isso pode ser notado até hoje, já que um

dos motivos principais que me leva a escrever essa monografia é justamente o fato de que

durante a minha formação, tive o “impulso” de procurar estágio nos serviços de saúde mental

sem esperar o momento em que a Faculdade me ofereceria essa experiência (ou não), o que se

daria um ano depois. Isto me proporcionou, entre outras coisas, o contato com a saúde

pública, com a saúde mental pública, e todas as problematizações que derivariam desta área.

Mas por que essa cultura profissional hegemônica ainda existiria? Vasconcelos levanta

algumas hipóteses possíveis:

• Aprofundamento, nas camadas médias, do processo de individualização psicologizante

como componente da cultura pós – moderna e neo – liberal (Galende, 1997 apud

Vasconcelos, 1999);

• Condições de salário e de trabalho na rede pública de saúde pouco atrativas aos

estudantes e profissionais, levando-os a insistir e idealizar o consultório privado,

mesmo com o aumento da concorrência;

• Por fim, existiria uma resistência para modificar a estrutura curricular por parte

daqueles professores que se identificam com a cultura profissional hegemônica.

Essa “inércia” dos cursos de graduação frente às mudanças que aconteciam

rapidamente teve como conseqüências (que repercutem até hoje) a reprodução da clínica

tradicional, privativista e individualista dentro dos serviços públicos, que privilegiava, de

maneira desigual, aquela parte da população “confortável” economicamente, atuando também

de forma acrítica frente as demandas que surgiam da instituição que estavam inseridos.

Vasconcelos denuncia, ainda, o que chama de pacto de mediocridade, “... pelo qual os baixos

33

salários e más condições de trabalho justificavam menor compromisso, diminuição da carga

horária, etc”. (Vasconcelos, 1999, p. 126)

De posse dessas informações, já podemos entender o descompasso da Psicologia

diante da conjuntura em que se encontrava a saúde pública no Brasil, e a partir daí, passar ao

debate sobre o surgimento do SUS e à importância do conceito de integralidade para a

formação profissional e o trabalho na área da saúde.

4.2- O surgimento do SUS e do conceito de integralidade

Avançando na história, em 1986 temos a VIII Conferência Nacional de Saúde, um

marco significativo e chave na implementação do SUS. Segundo Guedes (2001), é nesse

momento que são consolidadas, no plano “virtual”, as propostas da frente sanitária para a

implantação do SUS. No plano “operacional”, temos a implantação, em 20 de Julho de 1987

do novo Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde (SUDS), que integrava as estruturas

administrativas do INAMPS nos estados com as Secretarias Estaduais de Saúde. Essa é uma

conquista relevante em direção à unificação do sistema de saúde, já que desde a década de 70

vigorava o antigo Sistema Nacional de Saúde (SNS), que, segundo Mattos (2001):

“consolidou uma antiga divisão entre as instituições responsáveis pela saúde pública e pela

assistência médica – a primeira era pensada como sendo da alçada do Ministério da Saúde,

enquanto a segunda ficava na alçada do Ministério da Previdência Social (...) Assim, os

técnicos da previdência deveriam processar a demanda por atendimento médico, buscando

viabilizar seu atendimento. Já os técnicos do Ministério da Saúde deveriam identificar aquelas

necessidades mais típicas da saúde pública, não diretamente demandadas pela população, e

organizar propostas de intervenção.” (Mattos, 2001, págs. 52 – 53). Com o SNS, pensava-se a

saúde pública e a assistência médica independentemente, gerando uma enorme dicotomia, que

acabou resultando na luta pela unificação do sistema de saúde, inicialmente através do SUDS.

Outra bandeira também defendida na VIII Conferência é a universalização do

atendimento, entendendo que a saúde é direito de todos. Para isso, seria necessário que a

assistência médica não fosse condicionada aos trabalhadores segurados pela Previdência

Social, ou seja, que a assistência médica não fosse unicamente oferecida àquela parte da

população pertencente a alguma categoria profissional, bem como a seus dependentes. Assim,

toda a população, independente de status social, financeiro etc possuiria acesso irrestrito aos

serviços de saúde.

34

Em relação à VIII Conferência, Luz (2001) afirma a importância da participação da

sociedade civil no processo de reformulação das políticas públicas, através da sua organização

em grupos para a participação nas Conferências de Saúde. Foi isto que caracterizou pela

primeira vez a participação popular nos processos decisórios, resultando numa maior

aceitação política de proposta como descentralização e desconcentração, além do controle

social do cidadão através da criação dos Conselhos estaduais, municipais e locais de saúde.

(Luz, 2001, p. 18).

Por fim, em 1988 é outorgada a nova Constituição Brasileira conhecida como

“Constituição cidadã”, e, com ela, prevista a criação do Sistema Único de Saúde (SUS).

Assim, a saúde é reconhecida como um dever do Estado e como um “direito de cidadania”.

Com a criação do SUS, temos os seguintes princípios doutrinários: Universalização,

Eqüidade e Integralidade. E como princípios organizativos, a participação popular,

regionalização e hierarquização, e descentralização e comando único.

Diante da temática desse trabalho, enfocarei o princípio doutrinário da Integralidade

daqui em diante, deixando a análise dos outros princípios para uma próxima oportunidade.

A Integralidade já seria citada ainda na nova Constituição Federal de 1988, art. 198:

“As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e

constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes: (...) II –

atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos

serviços assistenciais...” (Brasil, 1988).

Poderíamos também buscar uma definição de Integralidade na lei 8.080, de 19 de

Setembro de 1990, que regula o Sistema Único de Saúde: “Integralidade da assistência,

entendida como conjunto articulado e contínuo das ações e serviços preventivos e curativos,

individuais e coletivos, exigidos para cada caso em todos os níveis de complexidade do

sistema.” (Brasil, 1990).

Ao nos depararmos com o texto da lei, vemos que apesar de constituir um marco sem

precedentes, existiria ainda uma possibilidade de sentidos que poderiam ser atribuídos à

Integralidade.

Rubem Mattos, em seu artigo: “Os sentidos da Integralidade: algumas reflexões acerca

de valores que merecem ser defendidos” (2001) dirá que a Integralidade não é apenas uma

diretriz do SUS definida constitucionalmente. “Ela é uma bandeira de luta, parte de uma

imagem objetivo, um enunciado de certas características do sistema de saúde, de suas

instituições e de suas práticas que são consideradas por alguns (diria eu, por nós) desejáveis.

35

Ela tenta falar de um conjunto de valores pelos quais vale lutar, pois se relacionam a um ideal

de uma sociedade mais justa e mais solidária”. (Mattos, 2001, p. 41). O autor aponta para a

necessidade de se enxergar para além de uma única definição instituída constitucionalmente, e

assim poder deparar-se com o desejo de luta dos movimentos reformistas, com a mudança em

direção a um paradigma holístico de saúde, com uma pluralidade de sentidos.

O autor logo em seguida enfatiza que diante desse pluralidade de sentidos, fechar um

conceito de Integralidade de uma vez por todas poderia limitar as possibilidades de seu

entendimento, ocultando alguns de seus sentidos.

Mattos, então, nos apresenta um primeiro sentido para a integralidade, que se relaciona

com um movimento que ficou conhecido como Medicina Integral. “Em linhas gerais, a

medicina integral criticava o fato de os médicos adotarem diante de seus pacientes uma

atitude cada vez mais fragmentária ... os médicos tendiam a recortar analiticamente seus

pacientes, atentando tão somente para os aspectos ligados ao funcionamento do sistema ou

aparelho no qual se especializaram. Isso significava ao mesmo tempo a impossibilidade de

apreender as necessidades mais abrangentes de seus pacientes ... aquela atitude

freqüentemente adotada por médicos era vista como reducionista ...” (Mattos, 2001, p. 45). Os

adeptos da medicina integral enxergavam nas escolas médicas, ou seja, na graduação desses

profissionais um currículo que viria a imprimir nestes essa visão fragmentária, reducionista e

dicotômica. Os currículos, de base flexneriana, eram por si só dicotômicos: no início havia o

ciclo básico, voltado para o aprendizado das ciências básicas, realizado predominantemente

em laboratório e em seguida o ciclo profissional, voltado para a clínica e o modo de se lidar

com os pacientes. O que os levou a propor reformas curriculares, que visassem a formação de

médicos “que fossem capazes de apreender seus pacientes e suas necessidades de modo mais

integral.” (Mattos, 2001, p. 45). Dentre as propostas de mudanças curriculares, destaco o ato

de enfatizar o ensino no ambulatório e nas comunidades, como forma de buscar apreender

melhor o contexto de vida dos pacientes e assim da demanda pela procura de cuidados.

Assim, segundo Rubem Mattos, para a medicina integral a integralidade teria a ver como uma

atitude por parte dos médicos em que estes se recusariam a uma postura reducionista sobre o

paciente, atitude que deveria ser produzida pelas escolas médicas. Entendendo esses esforços

dentro de uma lógica maior, a integralidade seria entendida como um valor “que se expressa

na forma como os profissionais respondem aos pacientes que os procuram.” (Mattos, 2001, p.

48). Uma outra característica importante dentro desse entendimento de integralidade seria

buscar compreender o “conjunto de necessidades de ações e serviços de saúde”. Dessa forma,

36

a integralidade então não seria prerrogativa unicamente da medicina, e sim de todas as

profissões da saúde. Nesse sentido, a integralidade estaria ou não configurada na forma como

se dá o encontro do profissional com o usuário, e em entender de forma abrangente as

necessidades de saúde, bem como o contexto de vida em que está inserido.

Um segundo sentido que poderia ser atribuído à integralidade diz respeito à

organização dos serviços. Como colocado anteriormente, com a criação na década de 70 do

Sistema Nacional de Saúde, consolidou-se uma estrutura dicotomizada dos serviços de saúde,

no qual a saúde pública era alçada do Ministério da Saúde, enquanto a assistência médica era

responsabilidade do Ministério da Previdência Social, resultando nas duas sendo pensadas

independentemente. O modelo de assistência médica da previdência era centrado nos

hospitais, enquanto a saúde pública era exercida nos centros de saúde, através de atividades

preventivas, como imunização dos programas de Tuberculose e Hanseníase. Os programas

existiam dentro das unidades como práticas completamente dissociadas umas das outras: “...

não é admissível que um homem diabético, com tuberculose e hérnia inguinal tenha que dar

entrada em três pontos distintos do sistema de saúde para ter encaminhada a resolução de seus

problemas.” (Mattos, 2001, p. 54).

A aplicação de um dos sentidos da integralidade estaria justamente na crítica à

dissociação das práticas de saúde pública e de assistência médica, e na proposta de integração

dos dois serviços. Para tanto, seriam necessárias “transformações de duas ordens”: Superar a

fragmentação dentro da unidade de saúde, através, por exemplo da introdução de prontuários

unificados. E introdução de práticas assistenciais com a abertura das unidades de saúde

pública à demanda espontânea. Dessa última transformação, resultou por exemplo o

desenvolvimento da epidemiologia, que a visava apreender melhor quais as necessidades de

saúde de determinada localidade em que a unidade de saúde se encontrava, não só atenta para

a resposta à doenças, mas também para uma visão ampliada das necessidade da população que

procura o serviço Assim, a integralidade se transforma numa diretriz para a organização do

trabalho.

Não se pretende aqui esgotar todos os sentidos atribuídos a integralidade, nem chegar

a uma definição fechada. O que se efetuou foi e tentativa de buscar aqueles sentidos da

integralidade que mais carecem na formação e na prática dos psicólogos hoje em dia. Será que

a nossa formação combate a postura reducionista e individualista, a dicotomia prática-teoria,

levando o futuro profissional a assumir diante da comunidade uma escuta abrangente das reais

necessidades de atenção a saúde? A oferta de estágios dentro de comunidades e serviços de

37

saúde pública é suficiente ao ponto de permitir a esse futuro profissional o entendimento do

contexto de vida dessas pessoas, e conseqüentemente, das demandas por cuidados? O

psicólogo é capaz hoje, de no serviço de saúde em que está inserido, contribuir para que exista

uma visão integral do usuário que o procura, recorrendo a outros profissionais para entender

melhor sua história, bem como quaisquer outras pessoas ou instituições e / ou outros saberes

que possam contribuir para melhor atendimento, sem preconceitos e corporativismo?

Infelizmente, a resposta tende muito mais para o não do que para o sim, de acordo com

o que foi visto até agora. Daí ressaltamos a necessidade urgente de se levar até os cursos de

graduação essas e outras noções de integralidade, e mais ainda, que essas possam fazer parte

da reestruturação dos currículos, permeando as reformas curriculares, para que as futuras

gerações de profissionais tenham a chance de possuir uma formação dentro de uma

perspectiva realmente integral.

4.3- A Reforma Psiquiátrica Brasileira e a integralidade

Após a VIII Conferência Nacional de Saúde, a Reforma Psiquiátrica no país viveria

uma período de grandes avanços. Em seguida, um resumo da ordem cronológica das fatos

marcantes dessa época (Alves e Valentini, 2003, pág. 113 apud Alves e Guljor, 2004, pág.

226):

• I Conferência Nacional de Saúde Mental – Rio de Janeiro, 1987;

• Encontro Nacional do Movimento dos Trabalhadores de Saúde Mental -

Bauru, 1987;

• Intervenção na Casa de Saúde Anchieta – Santos, 1989;

• Apresentação, na Câmera Federal, do Projeto do Deputado Paulo Delgado –

Brasília, 1989;

• Declaração de Caracas – Venezuela, 1990;

• Publicação das primeiras portarias no Ministério da Saúde, em dezembro/1991

e janeiro/ 1992, no sentido de viabilizar financeiramente a mudança do modelo

assistencial, além de regulamentar o funcionamento dos serviços de saúde

mental.

38

Acima, estão alguns dos marcos decisivos que já apontavam para a reorientação da

assistência psiquiátrica, indicando uma quebra do paradigma do fazer psiquiátrico clássico,

hospitalocêntrico, dentro de um modelo falido e corrupto como o INAMPS, que comprava

leitos na assistência privada, iniciativa que provocou grande aumento no número de leitos

psiquiátricos – o que acabou resultando num grande aumento no número de hospitais

psiquiátricos sem qualquer estrutura de atendimento para seus pacientes, e de trabalho para

seus técnicos.

Nesse momento (final da década de 70 e década de 80) em que o país está passando

por um momento de redemocratização, com o fim da ditadura, os movimentos sociais

começam a ganhar voz cada vez mais, culminando com sua participação na VIII Conferência

Nacional de Saúde. No campo da saúde mental, há claramente um movimento de

trabalhadores, familiares e posteriormente de usuários se fortalecendo, nas figuras do MTSM,

SOSINTRA e da Luta Antimanicomial, respectivamente, com suas lutas voltadas para a

descentralização e a territorialização do atendimento, entendendo a descentralização, aqui, na

desconcentração dos investimentos em novos hospitais e até mesmo nos já existentes,

responsáveis por um “atendimento” subumano, e sim o investimento crescente nos serviços

substitutivos como os CAPS e os NAPS, e a territorialização como forma de entender o

usuário dentro da sua comunidade. Assim: “A Reforma Psiquiátrica consiste no progressivo

deslocamento do centro de cuidado para fora do hospital, em direção à comunidade, e os

CAPS são os dispositivos estratégicos desse movimento.” (Brasil, 2004, p. 25).

O novo paradigma de atenção em saúde mental está voltado para a formação de redes

como estratégia para a desinstitucionalização. Em 2004, o Ministério da Saúde lança o manual

“Saúde Mental no SUS: Os Centros de Atenção Psicossocial”, documento que vem para

corroborar o CAPS como principal estratégia em direção a territorialização, a

desinstitucionalização e à formação de redes. Segundo o manual, “Para construir essa rede,

todos os recursos afetivos (relações pessoais, familiares, amigos, etc.). sanitários (serviços de

saúde), sociais (moradia, trabalho, escola, esporte, etc.), econômicos (dinheiro, previdência),

culturais, religiosos e de lazer estão convocados para potencializar as equipes de saúde nos

esforços de cuidado e reabilitação psicossocial.” (Brasil, 2004, p. 11).

Diante dessa perspectiva, a integralidade se faz presente mais do que nunca. A

formação de redes, por si só, já é um exercício da integralidade, pois, para tanto, é necessária

a integração de vários aspectos da vida do usuário, de forma abrangente, e de uma atitude do

profissional de saúde que busque essa visão.

39

Ao discutir a questão da integralidade em relação aos “novos paradigmas de atenção

em saúde mental”, Alves (2001) trabalha a natureza do cuidar e duas questões em relação a

essa natureza: “oferta/seleção” e “inclusão/exclusão”.

O autor coloca que exclusão e seleção caminham juntas, já que com um modelo de

classificação nosológica fortemente arraigado como base das intervenções de saúde, temos a

tendência a levar em conta somente “um” problema, fazendo com que aquele cliente que

possui mais de um não seja selecionável para determinado programa e / ou serviço. “Se o

paciente é psicótico e, além disso, está em cadeira de rodas, conseqüentemente não tem

possibilidade de acompanhar os diversos programas existentes nos ambulatórios – em geral,

estes têm escadas ou não têm banheiros adaptados, pois, afinal, é um serviço para psicóticos.”

(Alves, 2001, p. 167).

Segundo o autor, é no final da década de 80 e início da década de 90 que ao trabalhar

novos paradigmas em relação a atenção em saúde mental, é que se substitui a palavra “tratar”

pela palavra “cuidado”, por entender que esta última incorpora os vários aspectos do

sofrimento psíquico trazido pelo usuário, ao invés de reduzir a demanda a alguma nomeação

diagnóstica. Assim, segundo autor, a integralidade lidaria necessariamente com os conceitos:

inclusão, exclusão, seleção e cobertura.

Em seguida, Alves recorre rapidamente ao surgimento da Psiquiatria clássica. No

século XVIII o positivismo está em seu auge, e também ocorre a identificação da bactéria por

Pasteur. Jean Tenon aplicaria aos portadores de transtornos mentais a mesma idéia aplicada às

bactérias: “é preciso isolar para conhecer e conhecer para intervir”. Assim fundava-se o

hospício e a Psiquiatria. É com essa idéia que se passa acreditar que no sentido de conhecer

melhor a loucura, para estudá-la cientificamente, é necessário isolar essas pessoas do convívio

com a sociedade.

A partir disso, o autor afirmará que a integralidade trará questões de natureza

ideológica e técnica: “A primeira diz respeito à condenação da segregação, por ferir direitos à

convivência e ao livre arbítrio, e a segunda, ao negar o isolamento como instrumento

terapêutico, paradigma essencial à sobrevivência do hospício.” (Alves,2001, p. 170).

A negação do isolamento e o cuidado ao usuário como um todo, levando em conta as

suas singularidade, determinam um olhar integral. Seria necessária a promoção de autonomia

do usuário, facilitando o processo que restabeleceria o seu poder contratual. Esse

entendimento leva ao desenvolvimento de políticas de reabilitação psicossocial, bem como à

criação da rede substitutiva e todo o projeto de Reforma Psiquiátrica no Brasil.

40

Outros componentes indispensáveis a integralidade seriam a intersetorialidade e a

diversificação: “Se nos propusermos a lidar com problemas complexos, há que se diversificar

ofertas, de maneira integrada, e buscar em outros setores aquilo que a saúde não oferece, pois

nem sempre lhe é inerente.” (Alves, 2001, p. 171).

A intersetorialidade é algo que certamente se apresentaria como um grande desafio,

junto com a interdisciplinaridade e a formação de equipes multiprofissionais. Em comum, a

dificuldade de diálogo e de troca entre as diversas profissões da área da saúde e até mesmo de

outras áreas, em reconhecer os limites de suas próprias áreas e de seu próprio conhecimento.

A diversificação dos serviços teria a ver com a diversidade de aspectos que pode

assumir o sofrimento humano, necessitando de uma gama variada de estratégias para o

acolhimento deste. Dessa forma, reconhecendo o usuário da saúde mental como um sujeito de

direitos, essa diversificação da oferta se dará com a da criação dos CAPS, dos programas de

desospitalização – residências terapêuticas ou lares abrigados - capacitação profissional e

organização de cooperativas e o acesso à cultura bem como opções de lazer aliados ao

cuidado, entre outros.

Ou seja, a integralidade nos exige todo o tempo um exercício contínuo de luta pela a

vida. E de reconhecimento do outro como alguém que tem direito ao mesmo que eu. Desde o

seu surgimento, a noção de integralidade tem sido amplamente debatida na área da saúde

mental, através por exemplo da formação de equipes multiprofissionais de saúde, que também

seriam compostas por psicólogos. Apesar disso, a entrada dessa discussão na formação, como

se constatou anteriormente, ainda hoje não se deu de forma satisfatória. Buscar a superação da

distância entre técnico e usuário; formação acadêmica e prática; visando a sua integração – eis

o grande desafio.

5- A Integralidade e a formação

5.1– Desafios à incorporação da integralidade pela formação dos

psicólogos.

A partir de agora, gostaria de levantar alguns desafios, que se apresentam em alguns

momentos como problemas, que existem e devem ser superados, e em outros como estratégias

41

e possíveis soluções desejáveis, mas que ainda apontam para um longo caminho a ser

percorrido.

O primeiro problema decorre da “localização” dos cursos de graduação em Psicologia

na estrutura das Universidades, ou melhor, do que se convencionou como a grande área de

atuação da Psicologia – no caso, as Ciências Humanas. Ao procurar, em algumas das

principais universidades do Rio de Janeiro, os centros em que se encontram os cursos de

Psicologia, temos o seguinte resultado:

Universidades Centros nos quais se encontram os

cursos de Psicologia UERJ Centro de Educação e Humanidades

(Faculdade de Educação, Instituto de Artes,

Instituto de Letras, Instituto de Psicologia,

Faculdade de Comunicação Social,

Faculdade de Formação de Professores de

São Gonçalo, Faculdade de Educação da

Baixada Fluminense, Colégio de Aplicação,

Instituto de Educação Física e Desportos).

UFF Instituto de Ciências Humanas e Filosofia

(Antropologia, Ciência Política, Filosofia,

História e Psicologia) – Centro de Estudos

Gerais (Arquivologia, Biblioteconomia,

Ciências Biológicas, Ciências Sociais,

Comunicação Social, Estudos de Mídia,

Física, Geofísica, Geografia, História,

Letras, Matemática, Produção Cultural,

Psicologia, Química, Química Industrial).

UFRJ Centro de Filosofia e Ciências Humanas

(Escola de Comunicação, Escola de Serviço

Social, Faculdade de Educação, Instituto de

Filosofia e Ciências Sociais, Instituto de

Psicologia e Colégio de Aplicação).

PUC Centro de Teologia e Ciências Humanas

42

(Educação, Filosofia, Letras, Psicologia,

Teologia, Artes e Design)

Antes de mais nada é preciso que se diga que esta não é uma crítica da Psicologia

entendida enquanto disciplina pertencente ao campo das Ciências Humanas. É, sim, uma

tentativa de problematização da sua não interlocução, dentro da universidade, com os centros

da área da saúde, restringindo, assim, as possibilidades de inserção do estudante de graduação

da Psicologia em uma discussão sobre saúde minimamente multiprofissional.

Como vimos anteriormente, o surgimento da Psicologia da Saúde enquanto um novo

campo do saber se deu recentemente (Spink, 2003), mas a Psicologia que fazemos, ainda hoje,

“tem um desenho determinado por uma constituição, no tempo, nas fronteiras com a Filosofia,

as modernas ciências do comportamento e das medidas psicológicas e a Psicanálise. Uma

disciplina do conhecimento e uma prática profissional que acabou não fazendo escolhas, e

acabou ficando “com todas”. A Psicologia, já se sabe, é, hoje, várias. E isso acaba, de alguma

forma, interferindo na “cara” que o curso vai ter” (Guirado, 1999, p. 126). Assim, parece fazer

muito sentido o arranjo dos cursos de Psicologia como está configurado hoje na estrutura das

Universidades.

Como podemos perceber diante da tabela acima, os cursos de Psicologia dessas

universidades somente em duas situações se encontram em um centro que possua, dentro de

sua estrutura, um curso da área da saúde. Na UERJ, o Instituto de Educação Física e

Desportos também se encontra no CEH, e na UFRJ, a Escola de Serviço Social também se

encontra no CFCH. Os cursos de Psicologia estão agrupados com áreas como Ciências

Sociais, Comunicação Social e Educação, por exemplo. Partindo do princípio que a Psicologia

certamente não pertence somente a área da saúde, mas faz parte dela também8, não é difícil

imaginar que a articulação de estágios e outras atividades de ensino, pesquisa e extensão, no

que diz respeito à Psicologia e outras profissões da área da saúde, acabará sendo bem limitada

no que depender da estrutura da Universidade. Com isso, um objetivo da integralidade, como

por exemplo, a interdisciplinaridade, fica muito mais distante de ser alcançado. Por outro lado

8 “Considera-se profissões da saúde aquelas assim definidas em resolução do Conselho Nacional de Saúde, acrescidas de mais duas: biologia, biomedicina, educação física, enfermagem, farmácia, fisioterapia, fonoaudiologia, medicina, medicina veterinária, nutrição, odontologia, psicologia, terapia ocupacional e serviço social, mais administração hospitalar e saúde coletiva (administração de sistemas e serviços de saúde)”. Fonte: http://portal.saude.gov.br/saude/visualizar_texto.cfm?idtxt=19910 Acessado em 24/02/2006.

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entendemos também que, ao inserir o curso em um centro pertencente à área da saúde, corre-

se o risco de “biologizar” seu conteúdo.

Isto nos leva ao ponto seguinte. Em relação ao curso de Psicologia da UERJ, podemos

dizer que faltam espaços de produção de conhecimento sobre o assunto – a construção,

estruturação e consolidação de espaços acadêmicos como pesquisas, projetos de extensão e

ensino (este último podendo ser pensado através da reestruturação curricular, de congressos,

seminários, oficinas, etc.) que desenvolvam o tema “Psicologia e saúde pública”.

Outro desafio que se impõe, dessa vez como algo desejável, é a formação de redes

entre o curso de graduação e o sistema de saúde local, não centralizando toda a oferta de

estágio na área da saúde somente no hospital-escola, no caso, o Hospital Universitário Pedro

Ernesto (HUPE) - o que evitaria o encastelamento do curso de Psicologia no décimo andar da

UERJ e uma visão hospitalocêntrica, voltando o olhar do aluno para os postos de saúde e

CAPS (entre outros) ao redor da Universidade. Isso facilitaria muito a construção de um olhar

integral sobre as necessidades de saúde da região em que a universidade se encontra, e

facilitaria a produção de pesquisas que derivariam da problematização dessa prática. Nesse

mesmo sentido, a busca pela formação de redes com as associações de moradores,

movimentos sociais, etc, daria ao aluno a oportunidade de entrar em contato com a realidade

de diversas comunidades e a luta e os ideais de movimento sociais como, por exemplo, a Luta

Antimanicomial, um dos atores fundamentais no processo da Reforma Psiquiátrica no país.

Com tudo isto, apontamos para a necessidade de diversificação dos cenários de estágio, em

direção a novos espaços para além dos muros da Universidade. E também a busca por

convênios que ofereçam estágios com características diversificadas, que possibilitem o

questionamento e o embate entre as diversas teorias e correntes psicológicas e/ ou da saúde.

É importante também reconhecer não somente a perspectiva de inserção dos

Psicólogos em equipes de saúde multiprofissionais como objetivo, mas também a

interdisciplinaridade e até mesmo a transdisciplinaridade como algo a ser alcançado. Ou seja,

entendemos o surgimento e o grande “alarde” em torno dos conceitos de multidisciplinaridade

e a interdisciplinaridade como resultado de uma ampla discussão que vem sendo feita antes

mesmo das Reformas Sanitária e Psiquiátrica, no sentido de flexibilizar as fronteiras entre as

disciplinas: “Esta flexibilização se realiza através de diferentes procedimentos: o movimento

de disciplinas que se somam na tarefa de dar conta de um objeto que, pela sua natureza

multifacetada, exigiria diferentes olhares (multidisciplinaridade), ou, de outra forma, o

movimento de criação de uma zona de interseção entre elas, para a qual um objeto específico

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seria designado (interdisciplinaridade). Mas o que vemos como efeito, seja da

multidisciplinaridade, seja da interdisciplinaridade, é a manutenção das fronteiras

disciplinares, dos objetos e, especialmente, dos sujeitos desses saberes” (Barros & Passos,

2000, pág. 74).

Mas da maneira como se apresentam, esses conceitos não representariam uma quebra

de paradigma real, já que as fronteiras entre as disciplinas continuariam erguidas, ou seja, os

saberes continuariam intactos. Desse modo, a transdisciplinaridade se apresenta como desafio.

Nela, “os limites entre as disciplinas é perturbado quando se colocam em questão as

identidades do sujeito que conhece e do objeto conhecido. A noção de transdisciplinaridade

subverte o eixo de sustentação dos campos epistemológicos, graças ao efeito de

desestabilização tanto da dicotomia sujeito/objeto quanto da unidade das disciplinas e dos

especialismos.” (Barros & Passos, 2000, pág. 76). Munidos da idéia de transdisciplinaridade,

podemos caminhar em direção a construção de um conhecimento sobre as práticas

profissionais que possa se auto-questionar, indagando as necessidades das fronteiras

instituídas entre os saberes que fazem parte dessa prática. Diante dessa perspectiva da

transdisciplinaridade é que passo ao relato de minha experiência no serviço de atenção diária

Espaço Aberto ao tempo.

5.2- “Linhas de fuga”: a experiência do Espaço Aberto ao Tempo.

O Espaço Aberto ao Tempo é um serviço de atenção diária em saúde mental, situado

no IMAS Nise da Silveira9 que possui uma história de embate político que precede a lei da

Reforma Psiquiátrica, constituindo um espaço de duras críticas ao modelo manicomial,

hospitalocêntrico e “médico-centrado” existente até então, na década de 80. O EAT tem sua

origem em uma enfermaria tradicional fechada, M1.

O processo de transformação da enfermaria M1 em EAT passa pela tentativa de

romper com a relação clínica hierarquizada e dessa forma poder construir um espaço de

existência, de encontros, de afetos, onde aqueles que cuidamos nos mostram o caminho.

Nesse momento, acontece uma confluência de profissionais dispostos a acabar com o tipo de

clínica psiquiátrica que estava sendo realizada, na qual a figura do médico predominava sobre

as demais profissões – conseqüência da relação que se estabelecia na Psiquiatria na qual se

presume que o médico detém todo o saber sobre a doença do paciente, que nada saberia sobre

9 Antigo Centro Psiquiátrico Pedro II, localizado no Engenho de Dentro.

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si, pois suas palavras seriam amontoados de coisas sem sentido. Acabar com as portas

fechadas, que mantinham as pessoas trancadas dentro das enfermarias, também foi outra

providência extremamente significativa à época.

Estratégias foram criadas: grupo de recepção, o terapeuta-base. Outro momento

significativo é a criação da EPA (Enfermaria de portas abertas). Partindo de uma postura

“rebelde” que se chocava completamente com o modelo de clínica predominante da

instituição, e descrito anteriormente, a equipe resolve quebrar as fechaduras e cortar as

amarras que continham as pessoas na cama. No início, o hospital tentava repor as fechaduras

“danificadas”, mas a equipe continuou insistindo, até que não fossem mais repostas e a

enfermaria permanecesse aberta. Ao adotar essa atitude, reafirma sua postura de luta contra o

modelo de assistência manicomial, abrindo-se às possíveis conseqüências desse ato. O dentro

e o fora da instituição estavam agora abertos à circulação dos pacientes e dos técnicos

também, que,a partir desse momento, se viram diante do compromisso de questionar, repensar

e construir um outro tipo de cuidado para os usuários de serviço, com um novo olhar.

Atuar no EAT permite ao aluno de Psicologia contato com profissionais de outras

áreas da saúde. Por ser um estágio integrado em saúde mental, permite que alunos de diversas

áreas da saúde e Pedagogia trabalhem juntos, em parceria com a equipe do próprio serviço,

composta por médicos, artista plástico, psicólogos, assistentes sociais, terapeutas ocupacionais

e auxiliares de enfermagem. Com uma proposta interdisciplinar de atendimento, na qual as

ações realizadas são pensadas por todos e não ficam à mercê da aprovação ou não de outros

profissionais, é possível verificar um movimento no EAT que privilegia a construção conjunta

do conhecimento sobre os clientes e o serviço, além de problematizações acerca da rede de

saúde mental do município, e o fortalecimento das relações pelo afeto. Também é realizado

atendimento à família, através de grupo as quartas e visitas domiciliares, buscando

acompanhamento do cliente no ambiente familiar, dado que não é possível entender este no

contexto amplo e variado em que vive sem entender a realidade familiar na qual está inserido,

e também as condições de moradia.

Além do grupo de família, existem as oficinas: (Centro Cultural, Bijuteria, Costura,

Atividade Expressiva, Papel, Marcenaria, Silk Screen, Cantina Arte Paladar e Padaria) e os

grupos: de recepção, no qual vários integrantes da equipe conversam tanto com a família

quanto com o próprio cliente que está começando no serviço; o grupo de reflexão, onde um

tema é retirado da demanda do grupo, desenvolvido através da produção de texto e discutido,

se o cliente estiver disposto, com as outras pessoas; o grupo de música, no qual os clientes

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escolhem uma música que é tocada e depois são discutidas todas as emoções que foram

provocadas; o grupo de corpo, no qual são utilizados exercícios envolvendo a

psicomotricidade, expressão corporal e Ioga. E por fim, o Cooperança, junção das palavras

cooperação + esperança. Este constitui um grupo de egressos que se formou na época da

antiga enfermaria de portas abertas, composto de clientes que logo após a alta retornavam ao

serviço para visitar seus técnicos, e contar as novidades.

No EAT, a prática teórica vem sendo construída a partir das experiências vivenciadas

no cotidiano – muitas vezes a partir do encontro com alguns pressupostos teóricos já

existentes, e outras vezes, não. O estágio permite ao aluno de Psicologia experiência em

outras áreas que não a sua. A liberdade de criar grupos, oficinas e outras atividades

terapêuticas nos dá a possibilidade de articular diferentes saberes que têm a ver com a história

de vida de cada um da equipe, visando tanto o bem-estar desta quanto dos usuários -

colaborando para o desenvolvimento da autonomia dos alunos e para a formação de um

profissional consciente da complexidade dos serviços, das relações profissionais e da

realidade atual.

A experiência apresentada é importante porque oferece contato com a integralidade em

vários sentidos que ainda não são encontrados na Academia – a interdisciplinaridade, o olhar

que abrange vários aspectos da vida do usuário, estímulo a autonomia dos estudantes durante

a formação, etc. Atuar no EAT nos dá a oportunidade de desenvolver as várias dimensões do

cuidado, e ter humildade para admitir os limites das nossas ações, seja por falta de

disponibilidade técnica, de infra-estrutura, ou até mesmo interna. E a partir daí valorizar o que

nos ensina o cotidiano e o outro. A experiência relatada traz um desafio a seus participantes:

que saiam de seu papel de legitimadores desse discurso tradicional, hegemônico e

manicomial, que é dado e esperado pela sociedade, e rompam com as barreiras das salas de

aula, dos consultórios e de outros paradigmas estabelecidos, em busca da ampliação de

fronteiras, em direção à vida.

6. Considerações finais

Chegamos ao final desse percurso com a certeza de não estar concluindo nem

esgotando a discussão que, na verdade, só se inicia. O que foi exposto e desenvolvido neste

trabalho é o resultado de cinco anos de olhos e coração voltados para a formação dos

Psicólogos, com a preocupação constante em questionar o meu papel em quanto estudante na

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instituição em que estive. E também em questionar qual seria meu papel ao tornar-me

profissional; não me deixar enredar pela trama que sempre explicitou os lugares instituídos

aos mesmos personagens. A trama que atribui aos alunos um certo tipo de subjetividade, e que

os leva a serem reprodutores – disseminadores desta, ao saírem da faculdade.

Há aqui a preocupação em batalhar pela Psicologia enquanto saber que também se

encontra na área da saúde e, como tal, merece ter seu campo desenvolvido, construído e

pensado em uma “via de mão dupla” – da universidade aos serviços de saúde, dos serviços à

universidade, através da formação de redes que não restrinjam a atuação profissional.

Batalhar também por uma formação libertadora, que estimule a autonomia do aluno,

onde exista espaço para a crítica e para a produção de conhecimento desde os primeiros

semestres da faculdade.

Entender e poder discutir alguns dos sentidos atribuídos à integralidade e o seu

surgimento com o SUS, se torna uma prerrogativa, já que os reflexos possíveis dessa

discussão podem resultar numa formação visando a integralidade tanto em seu “interior” -

durante o processo de formação – quanto em seu “exterior” – quando esse profissional chega

ao serviço de saúde público. De posse da discussão sobre a integralidade, e como ela se aplica

dentro da universidade e dos serviços, estaremos preparados a oferecer um tipo de cuidado

diferenciado à população, que priorize a qualidade da atenção oferecida ao outro, e que tenha

a capacidade de se auto-questionar e repensar constantemente, contribuindo para a efetiva

implementação do SUS.

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