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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE DIREITO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO ANDRÉ BARRETO LIMA A BANALIZAÇÃO NAS DEMANDAS JUDICIAIS RELATIVAS A DANOS MORAIS INDIVIDUAIS JULGADAS NO BRASIL Salvador 2017

UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE ......- 7 - LIMA, André Barreto. A banalização nas demandas judiciais relativas a danos morais individuais julgadas no Brasil. 110 f

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE DIREITO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO

ANDRÉ BARRETO LIMA

A BANALIZAÇÃO NAS DEMANDAS JUDICIAIS RELATIVAS A DANOS MORAIS INDIVIDUAIS JULGADAS NO BRASIL

Salvador 2017

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ANDRÉ BARRETO LIMA

A BANALIZAÇÃO NAS DEMANDAS JUDICIAIS RELATIVAS A DANOS MORAIS INDIVIDUAIS JULGADAS NO BRASIL

Dissertação apresentada como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Direito pelo Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal da Bahia - UFBA. Orientador: Prof. Dr. Ricardo Maurício Freire Soares

Salvador 2017

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P834

Lima, André Barreto. A banalização nas demandas judiciais relativas a danos morais individuais julgadas no Brasil. – 2017.

110 f..

Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal da Bahia, 2017.

Orientador: Prof. Dr. Ricardo Maurício Freire Soares.

1. Danos Morais. 2. Banalização. I. Título. II. Título: a banalização nas demandas judiciais relativas a danos morais individuais julgadas no Brasil.

.

CDD 342.085

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ANDRÉ BARRETO LIMA

A BANALIZAÇÃO NAS DEMANDAS JUDICIAIS RELATIVAS A DANOS MORAIS INDIVIDUAIS JULGADAS NO BRASIL

Dissertação apresentada como requisito para obtenção do grau de mestre em

Direito, Programa de Pós-Graduação em Direito, da Universidade Federal da Bahia.

Aprovada 30 de março de 2017

Banca Examinadora

Ricardo Maurício Freire Soares – (Orientador) _____________________________________ Doutor em Direito pela Universitá del Salento

Mônica Neves Aguiar da Silva__________________________________________________ Doutora em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

Charles Silva Barbosa ____________________________________________________

Doutor em Direito pela Universidade Federal da Bahia

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Ao meu amado filho Filipe e minha querida esposa Cristiane. Também a meus pais Avacy e Maria das Graças e irmãos Luciano e Fábio.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço imensamente à Universidade Federal da Bahia, instituição na qual sempre tive o grande interesse em poder um dia estudar no curso de Mestrado em Direito e que tanto contribuiu para o meu crescimento. Ao Professor Dr. Ricardo Maurício Freire Soares, meu orientador, à Professora Dra. Roxana Cardoso Brasileiro Borges por me aceitar no Tirocínio Docente Orientado, passando-me seus conhecimentos e direcionamento para avançar nessa nova experiência da vida acadêmica. Obrigado ao Professor Dr. Nelson Cerqueira, pelos debates que pudemos vivenciar bem como os conselhos que me ajudaram a avançar em meus estudos descortinando horizontes que anteriormente nunca havia explorado. À Doutora Mônica Aguiar por todo apoio dado para concretização deste trabalho. Agradeço a todos os demais professores do Programa de Pós-Graduação em Direito da UFBA, em especial aos professores, Doutores Saulo José Casali Bahia, Heron José de Santana Gordilho e Wilson Alves de Souza. Também aos servidores da Secretaria do Programa de Pós-Graduação da UFBA pela paciência em nos atender, em especial à funcionária Luiza que com toda gentileza nunca se absteve em esclarecer as dúvidas apresentadas. Agradeço aos meus amados pais, Avacy e Graça, por todos os valores morais que me passaram na vida e os ensinamentos que me trouxeram para ter garra e força e sempre lutar pelo que quero na vida e mesmo nos momentos mais difíceis continuar lutando em busca do que objetivo: Obrigado pais pelos princípios que me passaram e por todo amor que me deram na vida cuidando de mim nos momentos que tive mais dificuldades. Também aos meus irmãos Fábio e Luciano pela paciência e companheirismo entendendo meus defeitos, que não são poucos, e compreendendo minhas faltas sendo os irmãos mais completos que alguém poderia ter nessa vida. Obrigado à minha amada esposa e companheira Cristiane, pela paciência que sempre teve comigo, em especial nesses momentos difíceis nos quais tive que me dedicar à pesquisa e aos estudos tornando-me ausente nos poucos momentos que nos sobravam para poder contemplar a beleza que é a vida e criar nosso filho. Obrigado a Deus, pela luz que coloca a cada dia no meu caminho e quando meus horizontes parecem obscuros, sempre irradia seu amor me ensinando o melhor caminho a seguir. Meu obrigado especial ao meu filho Filipe, a quem amo com todas as minhas forças e que se tornou minha maior motivação de vida bem como ao nosso próximo filho ou filha que planejamos receber de Deus com muito amor: que com esse esforço eu possa vir a contribuir para seu crescimento intelectual e moral ensinando-lhes como seguir o caminho certo na vida e servindo-lhes como um bom exemplo.

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Na vida, não vale tanto o que temos, nem tanto importa o que somos. Vale o que realizamos com aquilo que possuímos e, acima de tudo, importa o que fazemos de nós! (Chico Xavier)

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LIMA, André Barreto. A banalização nas demandas judiciais relativas a danos morais individuais julgadas no Brasil. 110 f. 2017. Dissertação (Mestrado) – Faculdade de Direito, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2017.

RESUMO

O presente trabalho objetiva demonstrar a existência de banalização nas ações por danos morais no Brasil por parte daqueles que demandam judicialmente desconhecendo o que realmente é um dano que fere a honra individual. Busca-se evidenciar uma visão histórica acerca dos danos morais, demonstrando a existência da busca pelo ressarcimento por danos morais na antiguidade de Roma, bem como se deu a interpretação desse tipo de dano ao longo da idade média e nos conflitos das grandes guerras que avançaram ao longo da idade moderna até a contemporaneidade. Posteriormente, demonstra-se a criação da legislação civil com o código civil que garante a proteção aos direitos individuais privados, tendo como marco o código de Napoleão verificando-se a inauguração da referida codificação no Brasil através do código civil de Clóvis Beviláqua, evoluindo nos tempos atuais com a codificação civil de 2002. Em seguida verifica-se a proteção ao direito à integridade moral individual através dos diversos ramos do direito que buscam proteger a condição moral do indivíduo através da Constituição Federal de 1988, da codificação civil, bem como do código penal. Posteriormente verifica-se que pode existir dano material fruto de um dano moral. Mais adiante, analisa-se a importância da dignidade da pessoa humana, relacionando-a com a honra individual explicitando que os princípios são vetores que devem ser seguidos norteando a legislação pátria, descrevendo como deve ser o papel do Estado nesse contexto buscando a garantia da dignidade humana. Nesse diapasão, traz-se à baila, que na busca pela concretização da dignidade humana, foram criadas organizações internacionais visando a garantia desse importante direito, a exemplo da Organização das Nações Unidas – ONU, bem como a celebração de tratados internacionais. Em seguida observa-se a valorização do ser humano no Brasil após várias lutas travadas no período de ditadura militar e que com o Neoconstitucionalismo, garantias foram conseguidas para valorizar os direitos relativos à honra individual. Nessa esteira, verifica-se a questão da banalização nas ações por danos morais no Brasil fruto do excesso de demandas desnecessárias pleiteando a reparação dos referidos danos, buscando evidenciar que os danos morais diferenciam-se de acontecimentos cotidianos, bem como que algumas pessoas não adentram o poder judiciário em busca de justiça, mas sim de uma oportunidade financeira, inchando a máquina judiciária de demandas e criando por parte desse Poder uma visão banal acerca de um instituto que merece a devida atenção no que tange à sua reparabilidade. Após a visão que era dada aos danos morais antes da Constituição Federal de 1988, verifica-se qual a visão jurisprudencial nos tempos atuais. Mais adiante, traz-se como exemplo a experiência dos Estados Unidos da América com o julgamento dos danos morais pela Suprema Corte Americana analisando a influência desses julgados nas soluções adotadas no Brasil. Por fim, observa-se o panorama das medidas que hoje são adotadas no Brasil, se são positivas ou não, e que impactos podem trazer para as gerações futuras.

Palavras-chave: Danos Morais. Dignidade da Pessoa Humana. Dano Material. Suprema Corte Americana. Banalização.

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LIMA, André Barreto. The trivialization in litigation concerning individual deemed moral damages in Brazil. 110 f. 2017. Dissertation (Master) – Scholl of Law, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2017.

ABSTRACT

The present work aims to demonstrate the existence of trivializing the actions for damages in Brazil by those who demand judicially unaware of what really is a damage that hurts the individual honor. We seek to highlight a historical view about the moral damage, demonstrating the existence of the quest for compensation for moral damage in ancient times of Rome, as well as the interpretation of this kind of damage throughout the middle ages and the conflicts of the great wars that advanced along the modern age to the contemporaneity. Subsequently, the aim is to demonstrate the creation of civil legislation with the civil code which guarantees the protection of private rights of the individual, having as the Napoleon code by checking the opening of that coding in Brazil through the civil code of Clóvis Beviláqua, evolving nowadays with the encoding of 2002. Then there is the protection of the right to individual moral integrity through the various branches of law that seek to protect the moral condition of the individual through the 1988 Federal Constitution, civil, as well as encoding of the penal code. Then it turns out that there may be damage as a result of a moral damage. Subsequently, the importance of human dignity, relating it to the honor, explaining that the individual vectors are principles that must be followed guiding the country legislation, describing how should the role of the State in this context seeking to guarantee human dignity. In this tuning fork, brings up, that in the quest for fulfillment of human dignity, international organizations have been set up in order to guarantee this important right, the example of the United Nations Organization– ONU, as well as the conclusion of international treaties. Then there is the valorization of the human being in Brazil after several battles fought in the period of military dictatorship and that with the Neoconstitucionalismo, guarantees were achieved to promote rights relating to the honor of the human person. Then there is the issue of trivialization in actions for damages in Brazil as a result of the excess of unnecessary demands compensation for such damages lawsuit, seeking evidence that the punitive damages differ from everyday events, as well as some people don't enter the judiciary in pursuit of Justice, but a financial opportunity, swelling the judicial machine demands and creating by this power a more commonplace about an Institute that deserves the due caution with respect to his. After the vision that was given to moral damages before the Federal Constitution of 1988, which the majority of vision nowadays. Then, if for example the experience of the United States of America with the trial of the damages by the Supreme Court. Analyzing the influence of these American tried in the solutions adopted in Brazil. Finally, there is the panorama of the measures that are adopted in Brazil, whether they are positive or not, and what impacts can bring to future generations. Keywords: moral damages. Dignity of the human person. Material Damage.

American Supreme Court. Trivialization.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 11

1.1 DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO ................................................................. 13 1.2 METODOLOGIA........................................................................................................ 16 2

O DANO MORAL AO LONGO DA HISTÓRIA ........................................................

17

2.1 AS EXPERIÊNCIAS PRIMORDIAIS ACERCA DA HONRA INDIVIDUAL ............ 17 2.1.1 A honra no período da Antiguidade Romana ...................................................... 18 2.1.2 Panorama dos danos morais ao longo da Idade Média ..................................... 20 2.1.3 Conflitos Mundiais como marcos para valorização do ser humano.................. 23

2.2 O SURGIMENTO DA CODIFICAÇÃO CIVIL E A VALORIZAÇÃO DO INDIVÍDUO 28 2.2.1 O Código Napoleônico ........................................................................................... 29 2.2.2 O Código Civil de Clóvis Beviláqua ..................................................................... 30 2.2.3 O Código Civil de 2002................................................................................. 32 3

O DIREITO À HONRA NAS PERSPECTIVAS DOS DANOS MORAL E MATERIAL ...............................................................................................................

34

3.1 A INTEGRIDADE MORAL DO INDIVÍDUO ............................................................ 34 3.1.1 O direito a honra na perspectiva Constitucional ................................................ 35 3.1.2 O Direito Civil Constitucionalizado ...................................................................... 36 3.1.3 Perspectiva Penal do dano moral ......................................................................... 39

3.2 O DANO MATERIAL ............................................................................................... 44 3.2.1 O dano material fruto do dano moral ................................................................... 44 3.2.2 A indenização por danos morais .......................................................................... 47 3.2.3 A proteção aos direitos personalíssimos ............................................................ 49 4

A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA .................................................................

50

4.1 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS E PRESERVAÇÃO DA DIGNIDADE HUMANA...................................................................................................................

50

4.1.1 Princípios: vetores a serem seguidos .................................................................. 52 4.1.2 O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana ..................................................... 54 4.1.3 O papel do Estado na garantia de uma vida digna ............................................. 56 4.2 A BUSCA PELA REALIZAÇÃO DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA

HUMANA ..................................................................................................................

58 4.2.1 A criação da Organização das Nações Unidas e os Tratados Internacionais... 59 4.2.2 A valorização da Honra e do Ser Humano no Brasil .......................................... 62

4.2.3 O Neoconstitucionalismo e as conquistas voltadas para Honra ..................... 65

5

DIREITO A HONRA – BANALIZAÇÃO BILATERAL ...........................................

68

5.1 DEMANDAS JUDICIAIS PLEITEANDO DANOS MORAIS ................................... 68 5.1.1 A honra individual nos acontecimentos cotidianos ........................................... 69 5.1.2 Processos judiciais: uma oportunidade financeira ou a busca pela justiça ... 73 5.1.3 Excesso de demandas judiciais acerca de danos morais ................................. 76 5.2 PANORAMA DO PODER JUDICIÁRIO BRASILEIRO ............................................. 78 5.2.1 Visão do Poder judiciário acerca das demandas pleiteando danos morais .... 79 5.2.2 Análise de julgados anteriores à Constituição de 1988 ..................................... 81 5.2.3 Visão jurisprudencial nos tempos atuais ............................................................ 83 6

BREVE VISÃO DO DANO MORAL EM OUTRAS PERSPECTIVAS .................

86

6.1 A EXPERIÊNCIA DOS ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA .................................. 86 6.1.1 A Suprema Corte Americana ................................................................................. 87 6.1.2 Punitive Damage .................................................................................................... 90

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6.1.3 Julgados acerca de Danos Morais nos E.U.A ..................................................... 91

6.2 PERSPECTIVAS PARA AS NOVAS GERAÇÕES ................................................ 94 6.2.1 Influências da Corte Norte-Americana nas soluções brasileiras ..................... 95

6.2.2 Brasil: as medidas adotadas pelo judiciário Brasileiro são positivas? .......... 97

6.2.3 Alternativas para valoração do direito a honra .................................................. 99

7

CONCLUSÃO...........................................................................................................

101

REFERÊNCIAS ........................................................................................................

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1 INTRODUÇÃO

A inquietação que gerou o desenvolvimento do presente trabalho surge com o

questionamento acerca do panorama das demandas judiciais acerca de danos

morais no Brasil. Desta forma, indaga-se acerca da existência de banalização nas

demandas judiciais relativas a danos morais julgadas no país.

Diante do problema proposto, examina-se a hipótese de que se existe um

excesso desnecessário de demandas por danos morais, existe também menosprezo

na análise das referidas demandas por parte do Poder Judiciário brasileiro. Desta

forma, objetiva-se demonstrar a existência de demandas desnecessárias por danos

morais, o que gera uma análise fria por parte de quem as julga.

No que tange às suas origens, e conforme será explicitado no presente

trabalho, observa-se que não é de agora que se fala em direito à honra, mas sim,

desde a antiguidade, em escritos religiosos e códigos antigos.

Observam-se exemplos no Alcorão e na Bíblia Sagrada. Em Roma, também

havia uma preocupação com a reparação da honra ferida e também ao longo de

toda Idade Média, até adentrar-se aos períodos de guerras na Idade Moderna em

que o indivíduo era tratado em campos de concentração como se fosse um animal

ou menos do que isto.

No Brasil, essa preocupação foi maior com as atrocidades realizadas no

período de Ditadura Militar, em que o respeito à dignidade humana era pouco ou

quase inexistente, e foi então com a codificação civil, introduzida inicialmente na

Europa por Napoleão Bonaparte e posteriormente concebida no Brasil com artigos

próprios por Clóvis Beviláqua, que os direitos privados foram resguardados. Hoje

contamos com uma legislação mais atualizada que é o Código Civil de 2002 além de

legislações esparsas como o Código de Defesa do Consumidor e a própria

Constituição Federal de 1988 protegendo-se a condição moral da pessoa humana.

Nas lutas pela valorização do ser humano no Brasil, a dignidade da pessoa

humana tornou-se um princípio constitucional com irradiação para toda a legislação

pátria, de forma que, qualquer lei infraconstitucional que vá contra esse princípio, é

tida como inconstitucional.

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Nessa esteira, na década de 40 o Código Penal também já trazia em si

figuras como a calúnia, injúria e a difamação como forma de resguardar a honra do

indivíduo de ser maculada, de forma que, quando cometidos quaisquer desses

crimes o sujeito ativo é passível a uma punição.

Além disso, a questão dos danos morais ganhou tanto valor que o mesmo

pode ter uma repercussão inclusive na esfera material. É o caso do médico que tem

um consultório onde atende seus pacientes e tem ventilada contra o seu nome uma

acusação que vem a ferir sua honra fazendo com que os pacientes deixem de

buscar seus serviços, tendo assim lucros cessantes derivados da sua honra atingida

no meio social em que ocupa.

Com o passar dos anos, os direitos personalíssimos ganharam cada vez mais

força e a busca pela valorização do indivíduo cresceu cada vez mais. Observa-se

então um esforço grande em buscar a valorização da honra individual protegendo a

dignidade da pessoa a cada dia, de forma que, tratados, convenções e a criação de

organizações foram pontos cruciais para evolução dessa causa, criando-se

inclusive, a título de exemplo, a Organização das Nações Unidas – ONU que atua

internacionalmente e diversos países fazem parte da mesma.

Mas com os direitos também vêm os abusos, e a garantia legal por uma

indenização por dano moral acabou servindo de meio para que indivíduos que

sofreram danos materiais adentrassem ao Poder Judiciário para pleitear

indenizações por danos morais, mesmo sem ter direito, como uma forma de buscar

um enriquecimento ilícito.

Por sua vez, o Poder Judiciário acaba por não suprir essa crescente demanda

não somente pelo inchaço no numero de pleitos por danos morais, mas também

pelo despreparo e pela desmotivação de funcionários públicos que acabam por não

dar a devida celeridade nas demandas internas, todavia, há também a falta de

servidores para atender proporcionalmente a crescente demanda por danos morais.

Ao juiz, cabe a tarefa de poder analisar o caso em concreto para poder

arbitrar, não só a existência do dano, como também o quantum deve ser indenizado,

isto é, analisando a condição social da vítima e do autor, tentando não criar uma

situação de enriquecimento ilícito, mas também não desvalorizando a causa, a ponto

de incentivar a reincidência por parte do autor.

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Na análise do magistrado, ele deve considerar que os danos morais estão

distantes de serem tidos como os acontecimentos cotidianos a que todos são

submetidos. Seria como adentrar em um transporte público em horário de pico e

levar um empurrão ou uma pisada no pé. O dano moral configura-se por uma

situação vexatória que causa um desconforto excessivo à pessoa, ou objetivamente

perante os outros, ou subjetivamente para consigo mesmo.

Vale ressaltar que no Brasil, mesmo antes da Constituição Federal de 1988,

já se protegia o indivíduo de lesões no seu âmbito moral, com base em clausula

geral da Codificação Civil datada de 1916.

O direito estrangeiro traz situações nas quais o Brasil pode mirar-se em

decisões adotadas em outros países, ou seja, objetivando dar solução ao conflito,

muitas decisões são miradas em decisões da Suprema Corte Americana, que

influenciam alguns de nossos julgados nesta seara.

Face a todo exposto, tem-se um panorama a ser explorado, no que tange aos

danos morais e às consequências da forma pela qual os mesmos são vistos hoje,

trazendo enfrentamentos para as gerações futuras. É o que será abordado no

presente trabalho.

1.1 DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO

A presente pesquisa parte do estudo dos danos morais individuais, que hoje

acabam sofrendo uma banalização em virtude do excesso desnecessário de

demandas por danos morais junto ao Poder Judiciário. Com as liberdades

conquistadas na Constituição Federal do Brasil, a exemplo do acesso gratuito à

justiça e o direito à celeridade processual, as demandas por danos morais

cresceram desarrazoadamente.

No capítulo 02 observam-se as origens dos danos morais, os quais não

vieram a ser concebidos nos tempos atuais, mas sim, desde os primórdios da

humanidade. Buscava-se uma punição ou um lenitivo para aplacar o desejo de

vingança daquele que fora atingido moralmente.

Ainda nesse capítulo observa-se um panorama histórico, partindo de Roma,

uma vez que o direito privado tem suas fontes nascidas naquela civilização, e

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também na Idade Média, quando havia uma acentuada distinção de classes, ou

seja, entre a nobreza e o clero nos mais altos escalões, enquanto que a plebe era

maltratada e humilhada de todas as formas.

Posteriormente, avança-se no estudo das guerras mundiais, que perduraram

até a Idade Moderna, quando em 26 de agosto de 1789, foi proclamada a

Declaração dos Direitos do Homem que buscou transformar o homem comum em

um cidadão, passando as leis a serem dirigidas não apenas a uma nação, mas aos

cidadãos.

Em seguida, a pesquisa traz em tela a questão da codificação civil, iniciada na

França por Napoleão Bonaparte com o intuito de organizar todas as leis civis

daquele país, o que posteriormente serviu de modelo para o Código Civil brasileiro

implementado em 1916 e futuramente modificado em 2002, trazendo artigos

importantes que preservam a dignidade humana e a honra do indivíduo.

No capítulo 03, tem-se que o direito a honra é protegido não só pela

legislação civil, mas, acima dela, pela própria Constituição Federal de 1988, e ao

seu lado, pelo Código Penal, que também traz previsões legais que objetivam

proteger a honra da pessoa humana maculada.

Por conseguinte os estudos voltam-se para a questão do dano material fruto

de um dano moral, uma vez que este, em determinadas situações pode trazer

resultados mais gravosos na esfera material individual.

Assim, tem-se que a reparação por um dano moral efetivado não tem o intuito

de definir um preço, mas sim, uma satisfação compensatória, pois, por exemplo,

uma pessoa que sofreu uma cirurgia plástica no rosto e que ficou com uma cicatriz

irreparável fruto de um mal procedimento cirúrgico, não terá a sua beleza física

recomposta, nem por todo dinheiro do mundo.

No capítulo 04, observa-se a importância dos princípios na legislação pátria e

que os mesmos são capazes de solucionar situações nas quais haja conflitos ou

lacunas na lei. Na aplicação de um princípio deverá ser analisada uma situação

concreta verificando o comportamento repetitivo da mesma, para daí então criar-se

um norte a ser seguido no julgamento de um determinado contexto fático.

Por conseguinte, tem-se que o princípio da dignidade da pessoa humana é o

mais importante da Constituição Federal do Brasil de 1988, não só por ser fruto dos

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esforços de um povo que sofreu no período de ditadura militar, e que conseguiu

conquistar uma Constituição voltada para as aspirações e fatores reais de poder de

um povo, como também pela valorização que o referido princípio traz ao ser

humano, que deve ser respeitado em sua integridade na esfera social.

Ainda nessa linha de pesquisa, tem-se o papel do Estado na busca de

garantir uma vida digna à população, mas cabe também à população saber escolher

os seus governantes que vão lhe representar politicamente. Um esforço grande para

busca da preservação da dignidade do ser humano foi a criação da ONU –

Organização das Nações Unidas - e de tratados e convenções internacionais as

quais diversos países fizeram parte no intuito de resguardar a dignidade do ser

humano que fora massacrado nos períodos de guerras e revoluções.

No capítulo 05, observa-se o papel do magistrado na tarefa de julgar e

identificar a existência ou não de um dano moral, uma vez que, este não pode ser

confundido com aborrecimentos cotidianos que todos os seres humanos estão

submetidos. O dano moral é algo que fere o individuo intrinsecamente, na forma que

o mesmo se sente ferido em sua honra perante a sociedade, ou no meio social em

que está inserido, pela ótica desta, fazendo-se sentir humilhado pela ofensa ou

situação vexatória a qual foi exposto.

Em seguida, o referido capítulo aborda a questão do tabelamento e do

arbitramento na sentença, este último que é adotado em nosso país e que reflete o

papel que o magistrado deve adotar durante a sentença a ser proferida, identificando

a existência, gravidade, repercussão do dano e condição financeira do autor e da

vítima.

O referido capítulo traz à baila a questão do excesso de demandas propostas

no judiciário, que tem um contingente de funcionários incapaz de suprir esta

demanda crescente devido à banalização por parte de quem adentra as portas da

justiça. Existe falta de comprometimento por parte da justiça, em relação às referidas

ações, pelo fato de, em alguns casos, não serem demandas que deveriam existir,

mas sim uma forma de se buscar um dinheiro extra na sentença.

Analisa-se, ainda, alguns julgados anteriores à Constituição Federal de 1988,

constatando que os danos morais são uma garantia existente mesmo que de forma

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geral no código civil de 1916, finalizando com a análise de alguns julgados recentes

sobre o tema.

Por fim, tem-se a questão dos processos julgados pela Suprema Corte

Americana e a repercussão dos mesmos na justiça brasileira, explicitando o punitive

damages e enfatizando quais medidas positivas podem ser adotadas para melhorar

a questão do julgamento de danos morais no Brasil, bem como qual a previsão para

as gerações futuras. Apresentado, então, o desenvolvimento do trabalho,

conheçamos a metodologia da pesquisa.

1.2 METODOLOGIA

Na busca por uma conclusão mais abrangente possível, utiliza-se inicialmente

o método histórico com o intuito de buscar identificar a evolução do dano moral ao

longo da histórica, de forma que, mesmo com as mutações relativas à cultura,

economia, política, religião e pensamento sociológico o dano moral sempre esteve

presente, mudando apenas a maneira como o mesmo era visto e como era tratado

ao longo da história.

De acordo com Marconi e Lakatos1 observa-se que as formas de vida em

sociedade atuais derivam de uma evolução do passado, desta forma, faz-se

importante o estudo das raízes de determinados institutos para um maior

entendimento de sua natureza e de sua função.

O método histórico consiste na investigação de acontecimentos, processos e

instituições passadas, observando como as mesmas influenciam nas sociedades

atuais, vez que existe sobre elas uma influência derivada do contexto cultural de

cada época.

Observa-se também o método comparativo como forma de edificar a pesquisa

demonstrando que a realidade de outro país pode vir a influenciar nas decisões do

nosso país nas ações de danos morais. No que tange aos procedimentos adotados

para o desenvolvimento da pesquisa tem-se a pesquisa documental disponibilizada

por livros, artigos, textos e arquivos digitais a disposição online.

1 MARCONI, Maria de Andrade; LAKATOS, Eva Maria. Fundamentos de metodologia científica. 5. ed.

São Paulo: Atlas, 2003. p. 106.

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- 17 -

2 O DANO MORAL AO LONGO DA HISTÓRICA

2.1 AS EXPERIÊNCIAS PRIMORDIAIS ACERCA DA HONRA INDIVIDUAL

A honra não é nascida em tempos atuais e acompanha o indivíduo desde os

primórdios da civilização, de forma que, aquele que pudesse ter sua integridade

moral atingida, poderia reivindicar sua reparação.

Assim, têm-se exemplos claros de normas que defendiam a honra do

indivíduo desde antes de Cristo, a exemplo do Código de Hamurabi (1792-1750

a.C.), que possuía 282 dispositivos legais e que tinha como ideia central a defesa do

mais fraco que pudesse ser prejudicado pelo mais forte e quando um fraco era

ofendido por um mais forte, havia ali o direito a uma reparação.

Desta forma, o dano causado deveria ser reparado de forma proporcional, e é

nesse panorama que se buscava uma reparação equivalente ao dano sofrido, o que

gerou o conhecido axioma “olho por olho, dente por dente” representado pela Lei do

Talião que consta dos parágrafos 196, 197 e 200 do Código de Hamurabi.

Nesse sentido, tem-se que outros povos já tratavam da ofensa à honra, de

forma que, na Suméria, na Babilônia (situada na Mesopotâmia) e na antiga Índia já

havia uma codificação que tratava da honra mitigada. Entretanto, de acordo com

Américo Luís Martins da Silva2, a codificação mais antiga que trata da defesa dos

direitos oriundos dos danos morais é o Código de Ur-Nammu

Segundo o referido autor, o mencionado código foi colocado em vigor por Ur-

Nammu, quem fundou a terceira dinastia de UR, país primitivo dos povos sumérios.

O código é mais antigo que o código de Hamurabi em aproximadamente trezentos

anos tendo sido descoberto em 1952 pelo assirólogo e professor da Universidade da

Pensilvânia Samuel Noah Kram.

No código de Ur-Nammu é possível identificar dispositivos que já abordavam

a reparabilidade do que hoje é tido como um dano moral, ou seja, desde os tempos

mais remotos da civilização humana, já se tratava do tema danos morais, que foi, ao

longo dos tempos, abordado no meio social.

2 SILVA, Américo Luís Martins da. O Dano Moral e Sua Reparação Civil. 2ª ed. Rio de Janeiro:

Editora Revista dos Tribunais, 2002. p. 75.

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Nessa esteira, o autor menciona que haviam registros no Código de Manu

acerca da proteção à honra. De forma que, o Código de Manu trouxe um avanço em

relação ao Código de Hamurabi, uma vez que a reparabilidade deixa de ser auferida

por outro dano de igual potencial ofensivo e passa agora a ser feita através de uma

quantificação pecuniária.

Observa-se também, o disciplinamento da reparabilidade por danos morais

tanto no Alcorão, a exemplo da intolerância ao adultério, bem como na Bíblia

Sagrada, conforme consta do Velho Testamento, onde aquele que repudia-se a

mulher difamando-a por não ser virgem, quando oferecida a ele pelos pais em

casamento, se provado o contrário, o homem era castigado pelos anciãos, tendo

uma multa pecuniária e ele nunca mais poderia se separar dela pelo resto da vida

nem a desprezar.

Face o exposto, observa-se que desde os povos mais antigos já existiam

discussões e normatizações que tratavam da proteção á honra do indivíduo, de

forma que a evolução das tratativas voltadas à proteção da honra avançou no

período Romano, na Idade Média até o período dos grandes conflitos mundiais e

tempos atuais.

Com as grandes guerras, quando a dignidade humana era totalmente

menosprezada, passou-se a ter uma preocupação maior com a valorização dos

danos morais que pudessem vir a atingir os indivíduos, conforme será explicitado a

seguir.

2.1.1 A honra no período da Antiguidade Romana

Outro marco histórico que merece atenção é o período da antiguidade romana

uma vez que, de acordo com Cahali3, “a reparação por dano moral, como a maior

parte das instituições de direito privado, encontra suas fontes no Direito Romano”, o

que fundamenta um estudo a parte do direito à honra nesse período.

A lenda da fundação de Roma diz que a mesma foi criada por Rômulo e

Remo em 753 a.C.. Eles cresceram amamentados por uma loba e, futuramente,

após a fundação de Roma, um deles matou o outro por discordância de pontos de

vista. De acordo com Costa, Roma teve como sua principal característica a

3 CAHALI, Yussef Said. Dano Moral. 4ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p.26.

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dominação e ficou conhecida como um dos maiores impérios que a humanidade

conheceu, uma vez que nós séculos II e III d. C. seus domínios já se espalhavam

por boa parte do mundo4.

Para concretização da tomada de posse em terras alheias, eles não

poupavam agressões e humilhações àqueles que eram dominados que, quando não

mortos, eram escravizados. Os escravos eram tidos como coisas. As mulheres, por

sua vez, tinham função pró-criativa e eram tidas como propriedade dos pais e dos

maridos.5

Além disso, o Império Romano era divido em classes sociais e havia um

distanciamento muito grande de uma classe para outra. Os patrícios tinham direitos

civis, religiosos e políticos, contudo os plebeus, não tinham esses direitos, e em

caso de contratação de matrimônio entre patrícios e plebeus, tal direito não era

reconhecido.

Quanto á legislação em si, Costa6 expõe que a Lei das XII Tábuas foi a

primeira legislação escrita naquele país e que na mesma, observa-se que nos seus

§2º e §9º já existia, primariamente, a possibilidade de reparação por dano moral.

A Lei das XII tábuas foi editada por causa da diferenciação de classes que,

segundo Wolkmer7, gerou uma série de instituições políticas e jurídicas, assim como

um ambiente de conturbação e de conflitos de classe, fruto das desigualdades

sociais, principalmente entre patrícios e plebeus: “esta situação se manifestou, por

exemplo, na rebelião plebeia que gerou a elaboração da famosa Lei das XII

Tábuas.”

4 Costa conceitua Império Romano como um império que se estende à Inglaterra, da Gália à Ibéria,

da África ao Oriente, até os confins do Império Persa, tendo sido considerado um dos maiores impérios de toda a humanidade de todos os tempos. Para maior aprofundar conferir COSTA, Elder Lisbôa Ferreira da. História do Direito: De Roma à História do Povo Hebreu e Mulçumano. A Evolução do Direito Antigo à Compreensão do Pensamento Jurídico Contemporâneo. Belém: Unama, 2009. p. 40. 5 Ibid., p.51.

6 COSTA, Elder Lisbôa Ferreira da. História do Direito: De Roma à História do Povo Hebreu e

Mulçumano. A Evolução do Direito Antigo à Compreensão do Pensamento Jurídico Contemporâneo. Belém: Unama, 2009. p. 61. 7 WOLKMER, Antônio Carlos. Fundamentos de História do Direito. 3ª ed. 2 tir. Belo Horizonte: Del

Rey, 2006, p. 138.

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Nesse sentido, Silva8 acrescenta que na Lei das XII Tábuas verificavam-se

casos relativos ao malum carmen ou famosum carmem (versos infames), bem como

a occentatum (injúrias), demonstrando que a injúria era para os antigos romanos um

ato ofensivo à honra ou boa reputação do indivíduo.

Conforme ensinamentos de Santos, a honra era venerada em Roma e vários

são os exemplos disso, como na oração contra Catilina de Marco Túlio Cícero, onde

o mesmo afirmava que “a honra é o princípio dos grandes homens”. Referido autor,

deixa claro que bastava haver o dano à honra que este deveria ser reparado, não

importando a que título o dano era cometido9.

No tocante à aplicabilidade da justiça criminal, Costa destaca que havia a

diferenciação entre vingança privada e vingança divina e que somente

posteriormente, a vingança divina foi separada, criando-se então a distinção entre

direito e religião, e que nenhum outro direito influenciou tanto o mundo ocidental

como direito romano10.

2.1.2 Panorama dos danos morais ao longo da Idade Média

Com o passar dos tempos, o Império Romano atingiu sua decadência, que na

visão de Wolkmer11, foi fruto de colapsos na economia escravagista e crescimento

do exército de desocupados. Ademais, acrescenta-se à sua decadência, o Estado,

que passou a ser insolvente e falsário reduzindo o quantitativo de prata na cunha de

moedas, morte de mais de 15 mil soldados de legiões, bem como a ascensão da

Igreja que acompanhou o novo modelo, baseado na propriedade de terras,

(conhecidas como feudos).

No modelo feudal, o Senhor Feudal criava a lei dentro de sua unidade de terra

e o sistema escravagista deu lugar ao sistema de servidão. A queda do Império

Romano em 476 d.C. constituiu apenas o último passo no processo de

desintegração dando lugar ao novo sistema.

8 SILVA, Américo Luís Martins da Silva. O Dano Moral e Sua Reparação Civil. 2ª ed. Rio de Janeiro:

Editora Revista dos Tribunais, 2002. p. 75. 9 SANTOS, Enoque Ribeiro dos. O Dano Moral da Dispensa do Empregado. 3ª ed. São Paulo: 2002.

p.62. 10

COSTA, op. cit. 45. 11

WOLKMER, op. cit.105 .

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Na idade média, os abusos contra os indivíduos de classes inferiores

continuaram e perduraram ao longo de todo esse período, de forma que, abusos

contra honra individual eram cometidos principalmente contra a plebe.

Nesse sentido, de acordo com Lassale12 “a nobreza ocupava um lugar de

destaque”, todavia, segundo Silva13, a igreja também exercia um poder muito forte

sobre a sociedade naquele período através do Direito Canônico, assim, mesmo com

todos os abusos cometidos àquela época, o Direito Canônico reprovava lesões

relativas a calúnias e injúrias.

Como exemplo, tem-se um casamento a ser realizado e a referida promessa

é rompida às vésperas do mesmo, o que de acordo com a Igreja é uma vulneração

aos preceitos cristãos, sendo assim passível de uma punição indenizatória.

O poder da igreja sobre as pessoas na época era oriundo da religiosidade,

que na visão de Byington14, exercia um uma força psicológica separando, na visão

social, o bem do mal buscando estimular no indivíduo suas potencialidades e

desenvolvimento dentro da sociedade em busca de sua realização voltada ao seu

potencial pleno.

Nesse contexto, a figura de Deus buscava criar uma imagem de medo e

punição para aqueles que desviavam-se dos ditames católicos. De acordo com

Passos15, para os cristãos a natureza origina-se de Deus e a única portadora da

palavra de Deus era a igreja Romana. A Igreja católica se impunha como a única

portadora da ética de Deus e única autorizada a revelar os ideais cristãos.

Entretanto com o poder que exercia na época, a Igreja Católica também

cometia abusos à honra individual, em muitos casos, realizando diversas

12

LASSALLE, Ferdinand. A Essência da Constituição. 9ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p.34. 13

Que era chamado de “Corpus Juris Canonici”, e regulava a organização da Igreja Católica bem como os deveres de seus fiéis e que também abordava vários casos que constituíam essencialmente danos morais, atribuindo-lhes a correspondente reparação. Para maior aprofundar ver em SILVA, Américo Luís Martins da. O Dano Moral e Sua Reparação Civil. 2ª ed. Rio de Janeiro: Editora Revista dos Tribunais, 2002. p.85. 14

BYINGTON, Carlos Amadeu Botelho. A Moral, a Lei, a Ética e a Religiosidade na Filosofia, no

Direito e na Psicologia. Palestra proferida no II Encontro “Ética para o Juiz – Um Olhar Externo”. Evento da Corregedoria do Tribunal de Justiça de São Paulo. Escola Paulista de Magistratura, São Paulo, 22 de novembro de 2013. Disponível em <http://www.carlosbyington.com.br/site/wp-content/themes/drcarlosbyington/PDF/pt/A_Moral,_a_Lei,_a_Etica_e_a_Religiosidade_na_Filosofia,_no_Direito.pdf> . Acesso em: 17 nov. 2016, p.03. 15 PASSOS, José Joaquim Calmon de. Direito, Poder, Justiça e Processo. Rio e Janeiro: Forense, 2000, p.56.

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atrocidades, respaldada no poder divino que a ela era supostamente atribuído.

Assim, Lopes16 explica que a inquisição era uma espécie de centralização do poder

no Papa e que muitos abusos foram cometidos pela igreja católica se utilizando do

processo inquisitório.

Nesse prisma, a tortura tornou-se um ato formal do processo de inquisição

podendo ser aplicada quando houve-se indícios de atos atentatórios aos ditames da

igreja católica, todavia, nesse processo de tortura, havia uma espécie de prova

irracional, vez que, acreditava-se que o justo era capaz de superar as torturas

resistindo sem confessar o erro.

De acordo com Lopes17, a Igreja Católica disputava o poder com o imperador

e aqueles que pertenciam à nobreza eram respeitados enquanto os que não

pertenciam a essa classe eram tratados como posse em relações de soberania, de

forma que, haviam dois sistemas em vigor, um era o sistema feudal propriamente

dito, relativo a vassalagem e tenência da terra enquanto que o outro era o senhorial,

que dizia respeito à apropriação da terra impondo uma relação entre servo e senhor.

De acordo com Passos18, o poder sempre é dominador, mesmo sendo

usufruído pela burguesia ou pelas classes trabalhadoras, ou por militares, etc. se

governam, oprimem, ou seja, mesmo que supostamente fundamentados na vontade

de Deus, esse poder acaba por ser uma forma de dominar.

Dentro de cada feudo, o senhor feudal ditava as regras e aqueles que

desobedeciam eram punidos, muitas vezes, até com a morte. Os servos eram

tratados como posse ou como animais, não havia respeito, e a valorização à

propriedade de terra era tamanha, que aqueles que possuíam maior feudo, segundo

Lopes, eram mais respeitados que os outros19.

A autoridade da Igreja Católica era incontestável e a mesma impunha seus

ditames explorando a fé alheia e, como no período feudal quem detinha maiores

16

LOPES, José Reinaldo de Lima. O Direito na História. 3ª ed. São Paulo: Atlas, 2011, p.92. 17

Ibid, p. 59. 18 PASSOS, José Joaquim Calmon de. Direito, Poder, Justiça e Processo. Rio e Janeiro: Forense, 2000.p. 55. 19

Havia no sistema feudal uma valorização extrema à propriedade de terras e a referida posse absolvia dois poderes para nós muito distintos: o direito de jurisdição (julgar as disputas dentro do território respectivo e o que chamaríamos hoje de um direito de propriedade na verdade algumas parcelas de poder de exploração da terra). Haviam serviços que eram ligados a terra e outros ao direito sobre a mesma. Para maior entendimento ver em LOPES, José Reinaldo de Lima. O Direito na História. 3ª ed. São Paulo: Atlas, 2011. p. 59.

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participações de terra detinha maior poder, a igreja sobressaia-se uma vez que, de

acordo com Magnoli20, através das indulgências e do confisco de bens nas

inquisições ela era grande detentora de terras.

Além disso, o movimento das cruzadas representou, não só a expansão de

feudos para igreja, como também um conjunto de atrocidades que eram cometidos

em nome da cruz católica cristã, que espalhava o medo através da fé cega.

As cruzadas representaram um movimento que resultou em um longo período

de enfrentamento militar especialmente nas regiões da Síria e Palestina entre os

séculos XI e XIII, também na Península Ibérica, entre os séculos VIII e XV. Era um

movimento fundamentado na necessidade de expansão das fronteiras da

Cristandade21.

Segundo Wolkmer22, o poder da igreja era fruto das grandes propriedades

adquiridas por ela em troca de “uma vaga no reino dos céus”, outra forma de

explorar a fé de pessoas ignorantes para angariar riquezas.

2.1.3 Os Conflitos Mundiais como marcos para valorização do ser humano

Guerras e conflitos mundiais marcaram a história da humanidade,

demonstrando que a valorização do indivíduo, em sua esfera moral, ficou muito a

desejar ao longo dos tempos, de forma que, humilhações, violências e atrocidades

eram cometidas contra os indivíduos que, em muitos casos, não recebiam nenhum

tipo de respeito.

Dentre os grandes conflitos que assolaram o mundo, segundo Hecht e

Servent23, alguns deles deixaram a marca do sangue da guerra, com a Primeira

Guerra Mundial (1914-1918), a Guerra Civil Russa (1918-1920), a Guerra Civil

Espanhola (1936-1939), a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), a Guerra da

Indochina (1946-1954), a Guerra da Argélia (1954-1962), a Guerra do Vietnã

20

MAGNOLI, Demétrio. História das Guerras. São Paulo: Editora Contexto, 2006, p.106. 21

Ibid, loc. cit. 22

“Nesse sentido a Igreja também poderia ser classificada como Senhor Feudal, pois detinha vastas propriedades de terra e, por seu poder espiritual e temporal abranger toda a Europa durante o período medieval, foi certamente a única instituição sólida existente”. Para aprofundar o assunto ler WOLKMER, Antônio Carlos. Fundamentos de História do Direito. 3ª ed. 2 tir. Ver. E ampl. Belo Horizonte: Del Rey, 2006. p. 177. 23

HECHT, Emmanuel e SERVENTE Pierre. O Século de Sangue. 1914 a 2014. As Vinte Guerras que Mudaram o Mundo. São Paulo: Contexto, 2015, p. 5-6.

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(1964,1975), a Guerra do Golfo (1990-1991), a Guerra do Afeganistão (2001), a

Guerra do Iraque (2003), dentre outras.

A humanidade ao longo dos séculos buscou a valorização de seus atributos

morais em virtude de guerras e movimentos que refletiram o sofrimento humano.

Como exemplo, ao findar da Idade Média, houve a Revolução Francesa, que

buscava quebrar o Absolutismo vigente à época, que segundo Grespan24

“representa a centralização do poder realizada nesta época em diversas dimensões

da vida pública”, com o intuito de alcançar a Liberdade, Igualdade e Fraternidade,

slogan da Revolução.

Na visão de Byington25, foi na época do Iluminismo em que se demandava um

entendimento racional da ciência fugindo da ciência da natureza para ciência da

razão resultante da política da Revolução Francesa.

Buscava-se eliminar Deus e a Igreja como fontes de direito e substituir os

mesmos pela razão. Em conformidade com os dizeres de Magnoli, a burguesia

buscava o livre comércio, além de outros interesses26.

Quando ocorreu a invasão da França, por austríacos e ingleses, na tentativa

de salvar Luís XVI, guilhotinado no período de Terror, despertou-se nos franceses

um espírito patriótico que os ajudou não só a defender sua pátria, mas os incentivou

a iniciar um processo de exportação dos ideais da Revolução pelas armas, mais

adiante, sob a liderança militar de Napoleão.

O Terceiro Estado era constituído por plebeus desejosos de extinguir as

vantagens usufruídas por nobres e alto clero através da igualdade civil, em 26 de

agosto de 1789, foi proclamada a Declaração dos Direitos do Homem que buscava

24

GRESPAN, Jorge. Revolução Francesa e Iluminismo. São Paulo: Contexto, 2008, p.22. 25 BYINGTON, Carlos Amadeu Botelho. A Moral, a Lei, a Ética e a Religiosidade na Filosofia, no Direito e na Psicologia. Palestra proferida no II Encontro “Ética para o Juiz – Um Olhar Externo”. Evento da Corregedoria do Tribunal de Justiça de São Paulo. Escola Paulista de Magistratura, São Paulo, 22 de novembro de 2013. Disponível em <http://www.carlosbyington.com.br/site/wp-content/themes/drcarlosbyington/PDF/pt/A_Moral,_a_Lei,_a_Etica_e_a_Religiosidade_na_Filosofia,_no_Direito.pdf> . Acesso em: 17 nov. 2016, p.02. 26 “A França vivenciou simultaneamente no final da década de 1780: a) uma “revolução aristocrática”

que objetivava a descentralização além da autonomia local; b) uma “revolução burguesa” que visava extirpar os obstáculos existentes para a produção e afirmar o direito inalienável à propriedade privada; c) uma “revolução popular”, de um lado urbana, voltada para a imediata melhoria das condições de existência e da situação do trabalho, e de outro lado rural, direcionada para a conquista da posse da terra e a erradicação da servidão”. Para maiores informações verificar em MAGNOLI, Demétrio. História das Guerras. São Paulo: Editora Contexto, 2006. p.195.

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transformar o homem comum em um cidadão passando as leis a serem dirigidas não

a uma nação, mas aos cidadãos.

De acordo com Siey’es27, é impossível que a nação viesse a ser livre se o

Terceiro Estado não fosse livre, pois estes mereciam direitos pertinentes a todos os

cidadãos, ou seja, a igualdade era imprescindível em um período em que o povo

viveu com coações e humilhações.

Nesse prisma, mesmo com o avanço das tecnologias e das ciências, o

prestígio moral individual sempre continuou relevantemente desprezado e apesar

das conquistas ao longo dos séculos, os indivíduos nunca tiveram a plenitude do

respeito à sua condição moral, de forma que, tem-se como exemplo da Revolução

Industrial.

Segundo Hobsbaw28, havia nesse período uma exploração da mão de obra,

que vivia em níveis de subsistência proporcionando aos ricos ficarem cada vez mais

ricos acumulando lucros e criando conflitos com os proletariados.

Conforme bem explicita Martins29, a Revolução Industrial teve seu marco com

o aparecimento da máquina a vapor e, posteriormente, com o avanço das

tecnologias, foi criado o tear mecânico, que demandava a utilização de pessoas para

manipular os referidos equipamentos.

Entretanto, o trabalho era feito de forma a explorar pessoas que chegavam a

trabalhar 16 horas diárias (ficando conhecidos como proletários), não distante, o

menosprezo pelo ser humano era tamanho que mulheres e crianças eram obrigados

a trabalhar, por ate 16 horas e recebendo metade do que era devido aos homens.

Durante a Revolução Industrial demonstrou-se uma série de abusos

cometidos contra os trabalhadores que buscaram se libertar dos excessos

27

SIEY’ES, Emmanuel Joseph. A Constituinte Burguesa. Qu’est-ce que le Tiers État?. 4ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Iuris, 2001, p. 7. 28

HOBSBAWM, Eric J.. A ERA DAS REVOLUÇÕES. 1789-1848. 34ª ed. São Paulo: Paz e Terra, 2014, p. 75. 29

“Tudo começou com o surgimento da máquina a vapor, Indústrias se instalaram onde existia carvão, como ocorreu na Inglaterra. Os trabalhadores eram explorados com trabalhos abusivos em minas. O trabalhador prestava serviços e condições insalubres, sujeito a incêndios, explosões, intoxicação por gases, inundações, desmoronamentos, prestando serviços por baixos salários e as horas trabalhadas extrapolavam 8 horas por dia. Ocorriam vários acidentes de trabalho, além das várias doenças decorrentes dos gases, da poeira, principalmente a tuberculose, a asma e a pneumonia”. Para maiores informações verificar em MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do Trabalho. 24ª ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 5-6.

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cometidos pelos seus empregadores, na ótica de Hobsbawm30, na década de 1780

pela primeira vez na história da humanidade foram retirados os grilhões do poder

produtivo da sociedade humana.

Além de revoluções, quando o ser humano buscava a igualdade, a liberdade

e direitos justos, o contexto de guerras demonstrou que a honra era um valor que

era totalmente desprezado em tempos de batalhas, a exemplo das duas Grandes

Guerras Mundiais.

Como exemplo, nos campos Nazistas, durante a Segunda Guerra Mundial, se

um soldado matasse um Judeu, ele não estaria cometendo um crime, uma vez que o

mesmo estava cumprindo a lei, assim, valores morais eram desprezados naquela

época.

De acordo com Hecht e Servent a Primeira Grande Guerra Mundial inicia-se

em 1914 quando Paris é atacada por três bombas lançadas por um avião alemão.

Os habitantes refugiavam-se nas estações de metrô e, mesmo descumprindo as

convenções de Haia de 1899 e 1907, o ataque direcionado a militares não poupava

civis, culminando em 200 mortes31.

Nesse mesmo período, os alemães passaram a utilizar gases asfixiantes, e,

no fim, segundo Magnoli, na Primeira Grande Guerra houve o maior índice histórico

de abatimento de seres humanos em combate, o que se estimou em torno de 10

milhões e o número de feridos foi a 20 milhões32.

Na visão de Moraes33, esse foi um período de horrores praticados pelo Estado

nazista, onde foram implementadas políticas racistas, de destruição e morte, tudo

assegurado por lei.

Mas até essa conquista, muito desprezo e humilhação aos indivíduos foram

cometidos ao longo da Segunda Grande Guerra, e o aspecto moral foi rebaixado a

nada. De acordo com Hecht e Servent34, os arianos deviam dominar os povos, em

função da suposta hierarquia superior que eles ocupavam em relação à escala

30

HOBSBAWM, op. cit. 59. 31

HECHT, Emmanuel e SERVENTE Pierre. O Século de Sangue. 1914 a 2014. As Vinte Guerras que Mudaram o Mundo. São Paulo: Contexto, 2015. p. 15-16. 32

MAGNOLI, Demétrio. História das Guerras. São Paulo: Editora Contexto, 2006. p. 344. 33 MORAES, Maria Celina Bodin de. Danos à Pessoa Humana: Uma Leitura Civil-Constitucional dos Danos Morais. 1ª ed. Rio de Janeiro: Editora Renovar, 2003, p.66. 34

HECHT e SERVENTE, op. cit. p. 16.

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racial, de forma que, Judeus e Eslavos eram vítimas de desapropriações e

escravidões.

Para Hitler, a guerra era tanto um meio como um fim35, buscava-se a

expansão territorial a ferro e sangue. Na visão de Hitler, o estrondo de armas

eliminaria os mais fracos assegurando o triunfo à raça mais forte.

No panorama da Segunda Guerra, os Judeus eram tratados da forma mais

desumana do mundo e não existia sequer sombra de valorização do aspecto moral

daquele povo. Os alemães pretendiam extinguir aquela raça, que era massacrada,

muitas vezes com apoio da população polonesa e, de acordo com Hecht e

Servent36, houve uma matança de judeus em Babi Yar, nos subúrbios de Kiev, onde

cerca de 33 mil judeus foram assassinados em alguns dias, o que no final totalizou a

morte de 1,4 milhão de homens, mulheres e crianças.

Centros de extermínio foram implantados pelo Reich, e segundo Magnoli37, os

mesmos visavam destruir em quantidade os judeus na Europa, assim, se na

Primeira Guerra o objetivo era o combate ao inimigo para impor condições de paz,

na Segunda Guerra não se aplicava essa teoria, pois a Alemanha de Hitler pretendia

dominar a Europa e transformar os países do ocidente em estados vassalos,

buscando também a transformação da União Soviética em colônia tomando sua

população como serviçais germânicos.

A política nazista na época contava com sofisticados sistemas de

investigação, concentração e extermínio de judeus nos campos de concentração,

denominado como Holocausto. Em 1945, americanos jogaram bombas atômicas em

Hiroshima e Nagasaki. O ser humano era tratado desprezado em seus valores

morais durante as guerras.

Contudo, com o fim da Segunda Grande Guerra Mundial, os direitos da

personalidade ganharam destaque, com o advento da nova Declaração Universal

dos Direitos Humanos, através da qual o respeito à dignidade humana passou a ser

35

Vale ressaltar que os Judeus não foram os únicos a serem dominados por um Reich nazista, que perseguia objetivos tanto econômicos quanto ideológicos, visto que os territórios conquistados deviam servir em seu esforço de guerra. Com base no autoritarismo, os nazistas se utilizavam de violência (pilhagens, requisições, taxas de câmbio abusivas) para conseguirem seus objetivos. Para aprofundar, verificar em HECHT, Emmanuel e SERVENTE Pierre. O Século de Sangue. 1914 a 2014. As Vinte Guerras que Mudaram o Mundo. São Paulo: Contexto, 2015. p. 62 e 69. 36

Ibid., p. 68. 37

MAGNOLI, Demétrio. História das Guerras. São Paulo: Editora Contexto, 2006, p.355.

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a tônica dos sistemas constitucionais e a partir de então, vários códigos passaram a

dedicar um capítulo aos direitos da personalidade.

2.2 O SURGIMENTO DA CODIFICAÇÃO CIVIL E A VALORIZAÇÃO DO INDIVÍDUO

A evolução humana foi o laboratório perfeito para a identificação das

necessidades de proteção aos direitos individuais e a preservação de valores como

a honra, e, para tanto, as relações privadas acabaram por ganhar uma legislação

própria no intuito de proteger o indivíduo em diversos aspectos, tais como

patrimoniais, contratuais, familiares e sucessórios, direitos de personalidade, a

defesa da honra, dentre outros.

De acordo com Venosa38, nasce então o Direito Civil buscando disciplinar as

relações entre particulares conferindo-lhes proteção especial desde a concepção até

o post morte. Analisando-se a importância da criação de uma codificação, tem-se

que a mesma busca agrupar um conjunto de normas que tratam da mesma matéria

em um único diploma.

Nesse sentido, o Código Civil surge abarcando todas as normas relativas às

relações privadas e comerciais com o intuito de dar estabilidade às leis que tratam

das matérias relativas ao direito privado.

Assim, na visão de Venosa39 codificação nada mais é que um processo de

organização, que reduz a um único diploma diferentes regras jurídicas da mesma

natureza, agrupadas segundo um critério sistemático.

Mas a Codificação Civil não nasceu em tempos atuais. Em Roma já se falava

em codificação do Direito Civil, o que não foi mais tão comentado na idade média

considerando a preponderância do Direito Canônico àquela época e a proteção e

punição divina. Contudo, na idade moderna nascem as Universidades e os grandes

centros de estudos científicos e a necessidade de se criar diplomas unificados

regentes das relações privadas.

Entretanto, três Codificações merecem atenção especial e devem ser tratadas

a parte buscando retratar o nascimento do Direito Civil, bem como, a recepção do

38 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil – Teoria Geral das Obrigações e Teoria Geral dos Contratos. v. II, 11ª ed. São Paulo: Atlas, 2011, p.64. 39 Ibd., p.89.

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mesmo no Brasil, enfatizando direitos nas relações privadas inclusive no que tange

ao direito a honra, são elas: o Código de Napoleão, o Código Civil de 2016

(demonstrando a recepção da legislação civil por parte do Brasil e as suas diversas

influências) e o novo Código Civil de 2002, conforme será abordado a seguir .

2.2.1 O Código Napoleônico

Na antiguidade Romana, o direito civil possuía uma abrangência macro,

agregando em si outros ramos do direito como o direito administrativo e o direito

penal, mas foi com o passar dos tempos que houve uma segregação e o referido

direito passou a ser parte do direito privado, como é o direito comercial e o direito do

trabalho. De acordo com Garcia e Pinheiro40, o Direito Civil passou a ganhar então

um conjunto de regras específicas41 a partir do século XIX, ficando mais estrito a

designar apenas o que estava disciplinado num diploma específico, ou seja, no

código civil.

O direito passou a sofrer repartições e determinadas matérias passaram a ser

regidas por diplomas específicos, a exemplo do código penal, enquanto que outras

por outros códigos, tendo a Constituição Federal como carta magna irradiando-se

por todo direito.

Do ponto de vista de Moraes42 a codificação veio trazer estabilidade e

segurança aos indivíduos e, no período da Grande Revolução Francesa, quando a

burguesia ascendeu ao poder, esta tornou-se a portadora da tabua de valores a qual

a sociedade foi chamada a reconhecer, de forma que, o mundo dos códigos é o

mundo que trás a segurança através da ordenada sequencia de artigos.

Mas o grande passo para Codificação Civil foi dado na França com o Código

de Napoleão, editado em 1804 fruto da constituição francesa de 03 de setembro de

1791, que dispôs que seria feito um código com todas as leis civis do país e que

40

GARCIA, Wander e PINHEIRO, Gabriela R.. Manual Completo de Direito Civil – V. único. São Paulo: Editora Foco Jurídico, 2014, p. 38. 41

Isso ganhou destaque depois que a França, em 1807, publicou o Código Comercial. O Direito Privado, mais do que nunca, ficava com dois grandes ramos, o Direito Civil (regulado pelo Código Civil) e o Direito Comercial (regulado pelo Código Comercial). 42 MORAES, Maria Celina Bodin de. Danos à Pessoa Humana: Uma Leitura Civil-Constitucional dos Danos Morais. 1ª ed. Rio de Janeiro: Editora Renovar, 2003, p.64.

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teve dispositivos tão aplicáveis à realidade civil que continuam sendo aplicados até

hoje na França, mesmo que com alguns dispositivos alterados.

Todavia, com o passar dos tempos o referido código sofreu diversas críticas

em virtude de imperfeições, que para alguns o titularizavam como legislação

atrasada, o que ensejou alterações no mesmo. Cabe salientar, entretanto, que a

cultura é mutável no tempo e no espaço o que de fato traz essa necessidade de

adaptação do direito aos anseios de uma sociedade que marcha rumo ao progresso.

De acordo com Venosa43, o Código de Napoleão era dividido em três livros

com títulos subdivididos em capítulos compostos por diversas seções havendo

sempre um título preliminar antes do Livro Primeiro contendo livros que tratavam

“Das Pessoas”, “Dos Bens e as Diferentes Modificações da Propriedade” e os

“Diversos Modos pelos quais se adquire a Propriedade” englobando neste último,

regimes matrimoniais, direitos reais e obrigações.

2.2.2 O Código Civil de Clóvis Beviláqua

No Brasil, a implantação do Código Civil foi fruto de uma imposição

Constitucional, uma vez que, segundo Venosa44, a Carta Magna de 1824 tratava da

organização de um Código Civil baseado em justiça e equidade, representando

assim um passo importante no reconhecimento dos direitos do indivíduo

preservando seus valores a exemplo da ordem com os parâmetros necessários de

justiça.

Entretanto, foi apenas um primeiro passo para resguardar os direitos dos

indivíduos que, só posteriormente, puderam desfrutar de uma codificação que

atendesse aos valores morais.

A sociedade daquela época estava ansiosa pela implementação de uma nova

codificação, uma vez que, até então vigorava a legislação portuguesa que não

refletia a cara do país, de forma que, o próprio governo imperial impunha a

legislação portuguesa até que a nova codificação nacional fosse implantada.

43 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil – Teoria Geral das Obrigações e Teoria Geral dos Contratos. v. II, 11ª ed. São Paulo: Atlas, 2011, p.94. 44

Ibid. P.100

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Segundo Venosa45, a tarefa de criação dessa codificação foi incumbida em

1865 a Teixeira de Freitas, que outrora já havia apresentado um trabalho de

consolidação das leis civis, todavia, somente após a Proclamação da República,

Clóvis Beviláqua elaborou e apresentou o projeto de Código Civil à Presidência da

República, entretanto algumas alterações foram sofridas no projeto fruto da análise

da comissão que o aprovou em 1916, buscando-se um acentuado rigor científico.

O código apresentado por Beviláqua sofreu grandes retaliações por parte de

Ruy Barbosa, entretanto toda argumentação crítica girava em torno do cunho

linguístico apresentado, recomendando assim revisão gramatical ao projeto.

Depois de ser revisado e serem introduzidas inúmeras inovações o projeto foi

remetido à Presidência da República, e posteriormente ao Congresso Nacional. O

projeto estagnou anos no Senado voltando para a Câmara com diversas emendas

(relativas a questões de redação) convertendo-se posteriormente na lei 3.071 de 1-

1-1916 entrando em vigor em 1-1-1917 sofrendo posterior alteração pela Lei 3.725

de 15-1-1919.

O Código Civil de 1916 era composto por 1.807 artigos, sendo antecedido de

uma Lei de Introdução ao Código Civil. Entretanto, com o processo evolutivo,

referido código acabou por abrir caminho para que leis esparsas que trataram de

temas que a evolução social exigia disciplinamento entrassem em vigor46.

Como pontos positivos, tem-se que o código de 1916 trouxe inovações para o

Direito Civil que, segundo Venosa47, contribuíram para o avanço legal daquela época

como exemplo a locação que deu ensejo aos contratos de trabalho, a inserção dos

direitos concernentes à separação e divórcio no direito de família, o direito

obrigacional que exigia alargamento das noções de responsabilidade civil bem como

abusos de direito, dentre outros.

45 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil – Teoria Geral das Obrigações e Teoria Geral dos Contratos. v. II, 11ª ed. São Paulo: Atlas, 2011, p.100. 46

A exemplo da Lei nº 4.121/62 (Estatuto da Mulher Casada), a Lei 6.515/77 (Lei do Divórcio), a Lei nº 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente), as leis que reconheceram direitos aos companheiros e conviventes (Leis 8.971/94 e 9.278/96), a Lei dos Registros Públicos (Lei nº 6.015/73), as diversas leis de locação, o Código de Defesa do Consumidor, o Código de Águas, o Código de Minas e outros diplomas revogaram vários dispositivos e capítulos do Código Civil, uma tentativa de atualizar nossa legislação civil. 47 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil – Teoria Geral das Obrigações e Teoria Geral dos Contratos. v. II, 11ª ed. São Paulo: Atlas, 2011, p.103.

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Nessa esteira, mesmo sendo um primeiro passo para a busca da garantia

jurídica dos direitos privados, o Código Civil de 1916, apesar de sua perfeição

técnica, era essencialmente patrimonialista, não buscando ainda a visualização dos

direitos voltados para a dignidade humana e enxergando o indivíduo como pessoa e

titular de direitos personalíssimos.

Face o exposto, verifica-se a necessidade de renovação e de adaptação da

legislação civil aos novos anseios da população, assim, um Código Civil com o perfil

do Código de 1916 não poderia mais ser o espírito dessa nova época fruto das

conquistas sociais e da Constitucionalização do Direito.

2.2.3 O Código Civil de 2002

À luz da nova Constituição Federal de 1988, a qual tem como princípio

norteador a dignidade da pessoa humana, o Código Civil de 2002, assim como todas

as demais leis editadas a partir de então, passaram a valorar o ser humano

deixando assim de priorizar as relações contratuais e patrimoniais sem nelas

enxergar a condição humana.

A partir de então, os direitos personalíssimos passam a ter maior valor na

nova Codificação Civil, e a função social agora é aplicada aos contratos e à

propriedade mirando-se agora no direito alheio e não somente no individual; os

contratos, que segundo Nader, agora passam a ser vistos de forma a contemplar as

partes mais fracas como portadoras de proteção maior, bem como a boa-fé é

instrumento que deve ser sempre aplicado nas lides48.

Nesse prisma, o Código de 2002, é fruto da implantação de uma comissão

criada para rever o código de 1916 que apresentou o anteprojeto do Código em

1972.

48

“O novo Código Civil expressa, genericamente, os impulsos vitais, formados nos tempos atuais, tendo por parâmetro a justiça social e o respeito à dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III). Mira-se no princípio da socialidade, refletindo a prevalência do interesse coletivo sobre o individual, dando ênfase à função social da propriedade e do contrato e à posse-trabalho, e ao mesmo tempo, contém não só o princípio da eticidade, fundado no respeito à dignidade humana, priorizando a boa fé subjetiva e objetiva, a probidade e à equidade, como também o princípio da operabilidade, na busca de solução mais justa, a norma possa, na análise de caso por caso, ser efetivamente aplicada.” Para aprofundar os estudos verificar em NADER, Paulo. Introdução ao Estudo do Direito. 30ª ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2008. p.363.

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Em 1973, após várias emendas, foi publicada uma segunda edição revisada

do referido anteprojeto e só após inúmeros debates na câmara foi provado o projeto

de lei nº 634/75 em 1984, que ficou adormecido durante anos no senado, sendo

levado à votação somente no ano de 2001, sendo aprovado através da Lei nº 10.406

de 10 de janeiro de 2002.

Uma vez aprovado entre as décadas de 70 e 80, o Código Civil refletia a

realidade daquela época. De lá para cá varias inovações foram implementadas,

como por exemplo, os avanços na tecnologia e na velocidade de informações,

criando assim novas situações merecedoras de tutela do direito.

Na visão de Nader acerca do novo Código Civil de 2002, o mesmo explicita

que o estudo do Direito Civil é composto por dois setores distintos a serem

observados, sendo um relacionado a matérias de interesse comum aos diversos

ramos do direito (exemplo dos direitos privados, penal, administrativo) enquanto que

o outro define a temática específica do direito civil49.

Outro ponto importante que merece ser observado no novo código civil é que

o mesmo deixa questões polêmicas pendentes de discussões jurisprudenciais para

serem disciplinadas por legislações específicas, como, por exemplo, a bioética,

contratos eletrônicos, experiências em seres humanos, clonagem humana.

Fica claro que o novo código civil traz uma carga constitucional voltada para

valoração do ser humano que o diferencia do Código de 1916, de forma que,

questões como a boa-fé e a função social passam a valorar a dignidade humana do

indivíduo e da coletividade nessa nova legislação50.

Na visão de Pereira51, o ser humano agora passa a ser valorado seguindo os

ditames de um novo direito civil conhecido como direito civil constitucional, de forma

que, as relações humanas não podem ser tratadas pelo sistema jurídico como se

49

“O objeto do estudo do direito civil apresenta dois setores distintos. Um deles se refere à matéria de interesse comum aos diversos ramos do jurídicos e que abrange o estudo sobre as pessoas, bens e fatos jurídicos. O outro setor constitui propriamente a temática do Direito Civil e compreende as seguintes matérias, conforme a ordem fixada pelo Código Civil de 2002: Obrigações, Empresas, Coisas, Família e Sucessões, que expressam os interesses fundamentais das pessoas.” Para aprofundar os estudos verificar em NADER, Paulo. Introdução ao Estudo do Direito. 30ª ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2008. p.364. 50

Cláusula geral que exige um comportamento condizente com a probidade e a boa-fé objetiva (CC, art. 422) e a que proclama a função social do contrato (art. 421). 51

PEREIRA,Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. 25ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012. p.18.

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fossem apenas determinadas pelo mundo da objetividade. Outras ciências indicam

novos rumos ao Direito.

Já no que diz respeito ao seu aspecto da solidariedade, a mesma está ligada

à quebra da priorização de valores individuais e patrimoniais tão valorizados no

Código de 1916, abrindo valoração aos interesses coletivos e, em alguns casos,

sacrificando interesses individuais, como é o caso da função social da propriedade.

Já na sua operabilidade, traduz-se a mesma pela concessão de mais poderes

ao magistrado no julgamento das causas analisando o caso em concreto. Feitas

essas ponderações tem-se agora a necessidade de abordagem acerca do que é o

direito a honra e o dano moral proveniente da honra ferida na visão constitucional,

civil, penal e suas consequências práticas na vida do indivíduo, conforme será

abordado no capítulo a seguir.

3 O DIREITO À HONRA NAS PERSPECTIVAS DOS DANOS MORAL E

MATERIAL

3.1 A INTEGRIDADE MORAL DO INDIVÍDUO

Com o passar dos anos, observou-se que o Direito Civil adquiriu uma nova

roupagem e, ao contrário do Código Civil de 1916 - este de cunho essencialmente

patrimonialista - tem-se que a nova configuração do direito privado finca-se,

principalmente, na valoração do indivíduo.

Nesse prisma, o chamado Direito Civil Constitucional traz em si a visão do

indivíduo respaldado nas conquistas sociais efetivadas na Constituição da República

Federativa do Brasil de 1988, esta fruto do alcance das aspirações sociais que

fincaram em dita Carta Magna os ditames oriundos dos Fatores Reais de Poder, que

segundo Lassale52, quando incorporados a uma folha de papel, adquirem expressão

escrita, deixando de serem Fatores Reais de Poder, tornando-se então o verdadeiro

direito.

52

LASSALLE, Ferdinand. A Essência da Constituição. 9ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 20.

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Face o exposto, questiona-se acerca da visão na Carta Magna de 1988 no

que tange à honra do indivíduo bem como qual a visão do novo Direito Civil, pós-

codificação de 2002, no que diz respeito à integridade moral do indivíduo, uma vez

que a honra de uma pessoa (tal qual protegida como direito fundamental pelo art. 5º,

X da CF), consiste num bem tipicamente imaterial, vinculado à noção de dignidade

da pessoa humana, pois diz respeito ao bom nome e à reputação dos indivíduos.

A dignidade humana, bem como a integridade pessoal do indivíduo,

representam valores fundamentais para o convívio em sociedade, considerando que

nos tempos modernos o direito constitucional ilumina todos os outros ramos do

direito com os referidos valores preservando a dignidade humana.

Desta forma, o direito à honra merece uma proteção especial que, conforme

será explicitado a seguir, é defendido nas esferas Constitucional, Civil e inclusive

Penal.

3.1.1 O direito à honra na perspectiva Constitucional

A Constituição Federal de 1988 aponta em seu art. 5º, inciso X a

inviolabilidade à honra sob pena de indenização fruto do dano material ou moral

decorrente de sua violação 53.

Nesse diapasão, tem-se que a Carta Magna cria uma barreira protetora à

honra dos indivíduos fruto, historicamente, de uma conquista da sociedade, que

vivenciou, anos antes da Constituição de 1988, um período de ditadura militar no

Brasil.

A honra, de acordo com Castro 54, é o conjunto de qualidades que

caracterizam a dignidade da pessoa, o respeito dos concidadãos, o bom nome, a

reputação, sendo assim, um direito fundamental da pessoa a ser resguardado,

preservando assim sua dignidade.

53

X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o

direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação. 54 CASTRO, Mônica Neves Aguiar da Silva. Honra, Imagem, Vida Privada e Intimidade, em Colisão com Outros Direitos. 1ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p.05

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Ressalte-se que os direitos fundamentais estão elencados na Constituição

Federal de 1988 em seu art. 5º, no qual o legislador constituinte buscou defesa dos

direitos à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.

A honra deve ser entendida não só na consideração social, mas no bom

nome, na imagem, na boa fama, e também como o sentimento íntimo, a consciência

da própria dignidade pessoal. Isso é, honra é a dignidade pessoal refletida na

consideração alheia e no sentimento da própria pessoa.

Nessa nova perspectiva, tem-se não só que a honra deve ser protegida, mas,

se lesada, pode ser objeto inclusive de reparação através do direito de resposta ou

por indenização.

Ou seja, a honra pode ser analisada pelo enfoque subjetivo, englobando

valores intrínsecos do homem, bem como objetivo, na ótica de como as pessoas e a

sociedade conceituam esse ser. O Direito Civil traz uma abordagem sobre a honra

no que tange à preservação da integridade moral dos indivíduos, conforme a seguir.

3.1.2 O Direito Civil Constitucionalizado

Feitas as análises sobre o ponto de vista constitucional do tema, tem-se que a

vida em sociedade impõe ao indivíduo que o mesmo se apresente na condição de

respeito bem como para que o indivíduo possa desenvolver uma boa reputação a

apresentação como homem honrado é decisiva.

Desta forma, para que ele possa, como exemplo, conseguir um bom

emprego, ou crescer em sua carreira profissional, ou mesmo no convívio entre

amigos ou no relacionamento afetivo, a boa índole faz-se essencial.

De acordo com Passos55, para sua realização pessoal o homem precisa estar

inserido no espaço social, deixando claro o entrelaçamento entre a condição

humana e a sociedade que ele ocupa.

Os valores morais e éticos do indivíduo destacam-no no meio social em que o

mesmo está inserido e quando os mesmos são atingidos, cria-se uma situação na

55 PASSOS, José Joaquim Calmon de. Direito, Poder, Justiça e Processo. Rio e Janeiro: Forense, 2000, p.42.

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qual o mesmo não é mais visto pela sociedade como era antes, o que pode causar-

lhe um dano de ordem moral.

Na visão de Byington56, “a moral tem a finalidade de regulamentar o

comportamento social”. Já no que diz respeito à ética, o referido autor afirma que “a

Ética sempre existiu para relacionar o indivíduo e a sociedade com o potencial pleno

do seu desenvolvimento dentro da relação entre o bem e o mal”.

Nesse prisma, a honra e a dignidade do ser humano, que é respaldada pela

sua integridade moral, possuem um caráter intrínseco, de forma que, se o indivíduo

lesado se sente ferido em sua integridade moral, certamente perderá motivação para

a busca de seu crescimento nas esferas profissional, afetiva, dentre outras já

citadas, ou seja, para um bom convívio social, bem como para está de bem consigo

mesmo, a integridade moral do indivíduo deve ser preservada.

Desta forma, a honra pode ser objetiva, que é a que “corresponde à

reputação da pessoa, compreendendo seu bom nome e a fama que desfruta na

sociedade” com também subjetiva, a qual é “correspondente ao sentimento pessoal

de estima ou à consciência da própria dignidade”.

Seguindo essa linha de raciocínio, Castro57 reforça a conceituação acerca da

divisão do enfoque que pode ser dado à honra nas perspectivas objetiva e subjetivo.

Na honra subjetiva, tem-se a estima que cada pessoa tem de si mesma, enquanto

que na honra objetiva, visualiza-se o juízo de valor que os demais fazem de nossa

dignidade.

Na visão de Venosa58 o dano moral é exatamente “um prejuízo que não afeta

o patrimônio econômico, mas afeta a mente, a reputação da vítima”, assim, à época

do Código Civil de 1916, a doutrina e a jurisprudência eram bastante cautelosas

quando tratavam da reparação por dano moral, o que foi prontamente sanado com o

56 BYINGTON, Carlos Amadeu Botelho. A Moral, a Lei, a Ética e a Religiosidade na Filosofia, no Direito e na Psicologia. Palestra proferida no II Encontro “Ética para o Juiz – Um Olhar Externo”. Evento da Corregedoria do Tribunal de Justiça de São Paulo. Escola Paulista de Magistratura, São Paulo, 22 de novembro de 2013. Disponível em <http://www.carlosbyington.com.br/site/wp-content/themes/drcarlosbyington/PDF/pt/A_Moral,_a_Lei,_a_Etica_e_a_Religiosidade_na_Filosofia,_no_Direito.pdf> . Acesso em: 17 nov. 2016, p.01. 57

CASTRO, Mônica Neves Aguiar da Silva. Honra, Imagem, Vida Privada e Intimidade, em Colisão com Outros Direitos. 1ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 6. 58

VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil – Teoria Geral das Obrigações e Teoria Geral dos Contratos. v. II, 11ª ed. São Paulo: Atlas, 2011, p. 341.

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Código Civil de 2002 em seu art. 18659, pois para Venosa60 “não é porque o dano

exclusivamente moral é difícil de ser avaliado economicamente que deve ser

deixado de lado”.

Nessa esteira, o dano moral pode ser direto ou indireto. No primeiro caso,

tem-se uma “lesão específica de um direito extrapatrimonial, como os direitos da

personalidade” enquanto que no segundo conceito, observa-se que o mesmo ocorre

quando há uma lesão específica a um bem ou interesse de natureza patrimonial,

mas que de modo reflexo, produz um prejuízo na esfera extra patrimonial.

A exemplo de um furto de bem que possua valor afetivo. Seguindo ainda a

abordagem do novo Direito Civil Constitucional quanto à integridade moral do

indivíduo, tem-se que o dano moral está necessariamente vinculado a alguma

reação psíquica da vítima.

Pode então haver ofensa à dignidade da pessoa humana sem dor, vexame,

sofrimento, assim como pode haver dor, vexame e sofrimento sem violação da

dignidade.

Citada honra quando violada pode ser objeto de reparação, ou por retratação

ou mesmo por indenização, uma vez que a dignidade da pessoa humana passou a

ganhar cada vez mais força com a Constituição Federal de 1988 e o novo Código

Civil de 2002, agora com uma visão não meramente patrimonialista, mas

considerando, cada vez mais, os direitos da personalidade.

Nessa linha de raciocínio, importante se faz explicitar que o dano moral não

deve ser confundido com meros transtornos diários aos quais todos estão sujeitos,

pois estes são aborrecimentos do dia a dia e fazem parte do cotidiano e se fossem

assim classificados como dano moral, a concepção de dano moral e

responsabilidade civil entrariam em descrédito, conforme enfatiza Tartuce61.

O mencionado autor deixa claro que cabe ao juiz, analisando o caso concreto

e diante da sua experiência, apontar se a reparação imaterial é cabível ou não.

Nesse sentido, foi aprovado, na III Jornada de Direito Civil, o Enunciado nº 159 do

59

Art. 186 – Aquele que por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. 60

Ibid., p. 342. 61

TARTUCE, Flávio. Direito Civil – Direito das Obrigações e Responsabilidade Civil. 7ª ed. São Paulo: Método, 2012, p. 394.

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Conselho de Justiça Federal, pelo qual o dano moral não se confunde com os meros

aborrecimentos decorrentes de prejuízo material.

Trilhando as lições apresentadas, tem-se a questionar como se dariam essas

ofensas causadoras de danos morais, uma vez que transtornos diários cotidianos

não seriam elencados como danos morais sendo definidos como acontecimentos

aos quais todos estão propensos a vivenciar.

Desta forma, Oliveira Júnior62 assevera que as ofensas à honra podem surgir

das mais variadas formas, seja através de escritos (cartas ou bilhetes), seja por meio

de publicações (jornais/revistas/periódicos/folhetos), seja por intermédio das novas

modalidades e transmissão de dados (fax/Internet) ou, ainda, de forma mais comum,

que é a palavra, seja diretamente dirigida, ou por meio de um comentário maldoso a

terceiros (“fofocas”), ou por telefone, ou mesmo pelos meios convencionais de

comunicação, como rádio e a televisão.

Por fim, referidos danos, como já explicitados, podem ser objeto de

indenização e, nessa linha de raciocínio, acrescente-se que ainda possuem uma

abordagem penal sobre o tema conforme será exposto a seguir.

3.1.3 Perspectiva Penal do dano moral

Os abalos provocados à honra do indivíduo são defendidos não só na

Constituição Federal e no Código Civil, mas também no Código Penal. Referido

instrumento normatizador, evidenciando a importância que esse tão valioso bem (a

honra) merece, criou figuras típicas objetivando a defesa da honra do indivíduo

caracterizando assim a: injúria, calúnia e a difamação.

Referidas tipificações estão elencadas nos artigos 138, 139 e 140,

respectivamente, do Código Penal brasileiro de 1940 tratando da imputação falsa de

fato definido como crime a alguém; imputação de fato ofensivo à reputação do

indivíduo; bem como, ofensa à dignidade ou decoro da pessoa.

Nesse sentido, tem-se que as lesões causadas à honra são passíveis de não

somente multas como também reclusão. Assim, observa-se a preocupação que o

62

OLIVEIRA JÚNIOR, Arthur Martinho. Danos Morais e a Imagem. São Paulo: Lex Editora, 2006, p. 40.

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- 40 -

direito tem tanto na esfera Civil como na esfera Penal na defesa da honra do

indivíduo, de forma que, existe uma abordagem sobre as tipificações penais, sobre

os crimes que abalam a honra, bem como as possíveis indenizações e penas

oriundas da honra abalada nas esferas penal e civil.

Na abordagem penal acerca da honra, tem-se que o objetivo do presente

trabalho não é esgotar o tema, por tratar-se de seara penal que engloba nuanças

particulares àquela área do direito. Contudo, na esfera civil, a abordagem

aprofundada faz-se necessária.

Objetiva-se então demonstrar no presente estudo a preocupação do

legislador penal na defesa da honra do indivíduo, mesmo que anterior à Constituição

Federal de 1988 bem como ao Código Civil de 2002.

Quando da execução dos crimes de calúnia, injúria e difamação, o objetivo do

sujeito ativo não é o de expor a honra alheia a perigo, mas sim, causar uma efetiva

lesão jurídica.

Para Jesus63 a conceituação típica descreve o comportamento do sujeito e o

resultado, porém, não exige a sua produção. Assim, não é necessário, no crime de

calúnia, por exemplo, que o sujeito consiga obter o resultado visado, que é o dano à

reputação do sujeito, sendo suficiente que o comportamento seja de modo a macular

a sua honra objetiva.

A calúnia é o mais grave de todos os crimes contra a honra previsto no

Código Penal. A lei explicita que, para execução do referido crime, basta que haja a

imputação falsa de um fato definido como crime a alguém. Como exemplo, pode-se

citar chamar alguém de ladrão sem que a pessoa o seja.

Nessa esteira, para Bitencourt64, o bem jurídico protegido no caso em tela é a

honra objetiva, isto é a reputação do indivíduo, ou seja, é o conceito que os demais

membros da sociedade têm a respeito do indivíduo, relativamente aos seus atributos

morais, éticos, culturais, intelectuais, físico e cultural.

Referido crime tem como pena a detenção de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos,

e multa, conforme discrimina o art. 138 do Código Penal. A segunda tipificação de

63

JESUS, Damásio de. Direito Penal – Parte Especial. v. II. 31ª ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 240. 64

BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal – Parte Especial – Dos Crimes Contra a Pessoa. 12ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 319.

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- 41 -

crimes contra a honra é a difamação, que difere-se da calúnia, pois nesta faz-se

necessário que a ofensa dirigida à vítima tenha o condão de defini-la praticante de

um ato criminoso sem ela ter praticado o citado ato, enquanto que na difamação,

faz-se necessário apenas que “o agente impute fatos à vítima que sejam ofensivos à

sua reputação”. Como pena, o código penal determina a reclusão de 3 (três) meses

a 1 (hum) ano e multa.

Um ponto bastante importante que não pode escapar à análise é que na

calúnia, para efetivação do crime faz-se necessário que a acusação feita à vítima

seja falsa, ou seja, atribuir fato criminoso a alguém que não cometeu. Já na

difamação, isso não importa, seja falsa ou verdadeira a acusação, o simples ato de

se praticar a ofensa já caracteriza o ato criminoso em si. Na análise de Bitencourt65

sobre a difamação “o fato, ao contrário da calúnia, não precisa ser falso nem ser

definido como crime”.

Por derradeiro, o último crime tipificado contra a honra é o de injúria, que

possui pena de 1 (hum) a 6 (seis) meses de detenção e multa e que é a que tem o

caráter menos grave comparada aos outros dois tipos penais.

Nos casos de discriminação com elementos raciais, religiosos, ou outros, o

crime configura-se como “injúria preconceituosa”, a qual tem pena inclusive similar

ao de homicídio culposo, que gira de 1 (hum) a 3 (três) anos de reclusão e multa

tendo sua proporcionalidade discutida comparativamente às demais infrações

penais.

Na injúria, a honra é ofendida de forma que o indivíduo tem sua dignidade ou

decoro atingidos e segundo Bitencourt66 “é preciso que a injúria chegue ao

conhecimento do ofendido ou de qualquer outra pessoa”, pois a ofensa proferida ou

executada que não chega ao conhecimento de ninguém não existe juridicamente.

Diferentemente da calúnia e difamação, em que existe a imputação de fatos a

alguém, no primeiro caso fatos criminosos falsos e no segundo caso fatos não

criminosos, mas ofensivos e que sejam verdadeiros ou não, na injúria observa-se

que existe a emissão de conceitos negativos sobre a vítima, de forma que

65 BITENCOURT, op. cit., p. 342. 66

BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal – Parte Especial – Dos Crimes Contra a Pessoa. 12ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 352.

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Bitencourt67 descreve bem os caracteres da honra lesados nesse crime, que são a

dignidade e o decoro, citando que a dignidade é o sentimento de honorabilidade da

pessoa, ou seja, seu valor social, que pode ser lesada com expressões como

“bicha”, “ladrão” ou outras formas de se ofender.

Já no que tange ao decoro, o referido autor menciona que o mesmo está

ligado à consciência da própria respeitabilidade social, é a decência que a pessoa

merece e que e ferida como quando alguém é chamado de anta, ignorante, dentre

outros adjetivos ofensivos.

Um ponto importante que não pode deixar de ser mencionado no que tange à

preocupação recíproca que teve os legisladores penal e civil, diz respeito aos

impactos que as ações questionadas em uma seara podem ter em outra. Nesse

prisma, vislumbra-se a situação de um indivíduo que teve sua honra afetada.

Pelo Código Civil, esse indivíduo tem um prazo prescricional de 03 (três) anos

para pretender a reparação civil (Arts. 186 e 206, § 3º, “V” do Código Civil). Contudo,

o indivíduo pode também pleitear dita compensação na esfera penal buscando

reparação por uma injúria, ou calúnia ou difamação, o que deixa evidenciados os

impactos das decisões em uma seara do direito sobre outra na esfera dos danos a

honra.

No exemplo citado, se um processo demorar 10 (dez) anos para ter sentença

transitada em julgado na esfera penal, acrescente-se mais 3 (três) anos e esse será

o prazo final que a pessoa ofendida terá para intentar a ação de reparação pelo

dano moral sofrido, pois pelo Código Civil em seu art. 200, não corre o instituto da

prescrição na seara civil quando existe pendência de julgamento do mesmo fato na

esfera penal.

Ressalte-se observação importante, pois para que a regra do art. 200 do

Código Civil seja colocada em prática, necessário se faz que quando da ofensa, o

sujeito passivo da lesão à honra tenha ao menos adentrado na esfera penal com

uma ação ou ao menos haja um inquérito policial em curso com alguma pretensão.

67

Ibid.

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Do contrário, o instituto da prescrição perderia sua eficácia jurídica, conforme

pode ser observado no Recurso Especial nº 1.180.237-MT68 que trata de um

acidente de trânsito em que para ter validade a aplicação do art. 200 do Código Civil,

aponta-se a necessidade de ao menos adentrar-se uma demanda na esfera penal.

De acordo com o que reza o art. 200 do Código Civil de 2002, a prescrição

desse crime só terá seu prazo inicial quando da sentença definitiva na esfera penal,

ou seja, só após a sentença transitada em julgado na esfera penal é que vai

começar a ser contado o prazo prescricional de 3 (três) anos ditado pelo art. 206,

§3º, “V” do Código Civil.

Nessa esteira, Jesus69 acrescenta que quando a honra é ferida através da

calúnia e difamação tem-se um enfoque objetivo (conceito que a sociedade tem

sobre o indivíduo) e quando a mesma é atacada através da injúria, observa-se um

enfoque subjetivo (conceito que ela tem de si própria).

Assim, observa-se que, no primeiro caso, tem-se o enfoque de atributos

morais enquanto que no segundo caso, tem-se o ataque a atributos físicos e

intelectuais. Referido autor acrescenta o ataque à honra comum e à honra especial

(ou profissional), diferenciando uma da outra em alguns aspectos70.

A honra comum diz respeito ao cidadão como pessoa humana no meio em

que o mesmo está inserido, já a honra especial, está ligada à atividade particular de

cada um, é a honra profissional, desta forma, se digo que alguém é ladrão ofendo-

lhe em sua honra comum, entretanto, se o chamo de mal profissional, estou

ofendendo a honra especial.

Por fim, observa-se que a preocupação com a honra não é exclusividade da

legislação civil, permeando por outras legislações a exemplo da legislação penal que

aborta as tipificações da injúria, calúnia e difamação.

68

RESP. 1.180.237-MT (2010/0024327-6) - Recurso especial. Responsabilidade civil. Acidente de trânsito. Prescrição da pretensão indenizatória. Suspensão prevista no artigo 200 do código civil. Necessidade de instauração de inquérito policial ou de ação penal. Inaplicabilidade da regra ao caso. (RESP. – 1180237, nº de distribuição 2010/0024327-6, STJ, Min. PAULO DE TARSO SANSEVERINO - TERCEIRA TURMA, julgado em 19/06/2012, publicado em 22/06/2012). 69

JESUS, Damásio de. Direito Penal – Parte Especial. v. II. 31ª ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 238. 70

Ibid.

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- 44 -

3.2 O DANO MATERIAL

Feitas as ponderações acerca da análise penal sobre as ofensas à honra do

individuo, bem como as penalidades oriundas de ditas ações, observa-se que o

Código Civil traz também penalidades àqueles que afetem a moral dos indivíduos.

Preliminarmente faz-se necessário determinar o que é um dano. Na ótica de

Santos71, o dano reflete um prejuízo, ou seja, uma diminuição de patrimônio

representando todo ato que diminua ou cause menoscabo aos bens materiais ou

imateriais.

Diante do citado conceito, tem-se que o dano pode girar na esfera material e

patrimonial ou mesmo na esfera imaterial, atingindo assim o psicológico, a

personalidade do indivíduo.

No horizonte de Frota72, o dano material apresenta-se diferenciadamente do

dano moral em face de algumas importantes distinções que o autor cita, sendo os

danos materiais ou morais diferentes desde a sua identificação, pois no dano

material, exige-se uma prova o que não é exigido no segundo tipo.

Já no que tange aos critérios adotados para diferenciação, no dano material

observa-se a indenização, já no dano moral tem-se uma compensação. Temas que

serão abordados nos tópicos a seguir.

3.2.1 O dano material fruto do dano moral

Feitas as devidas ponderações acerca das indenizações por danos morais,

bem como a ótica do Código Penal aplicada sobre a ofensa à honra do indivíduo,

observa-se que o dano moral pode causar impactos nas ordens material e

patrimonial do indivíduo, inclusive por um tempo indeterminado.

Quando se fala em honra, tem-se um direito personalíssimo, dentre outros

citados no capítulo II do Código Civil Brasileiro. Os direitos da personalidade são

absolutos, intransmissíveis, indisponíveis, irrenunciáveis, ilimitados, imprescritíveis,

71

SANTOS, Enoque Ribeiro dos. O Dano Moral da Dispensa do Empregado. 3ª ed. São Paulo: 2002, p. 74. 72

FROTA, Pablo Malheiros da Cunha. Danos Morais e a Pessoa Jurídica. 1ª ed. São Paulo: Editora Método, 2008, p.208.

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impenhoráveis e inexpropriáveis. O direito da personalidade é o direito da pessoa de

defender o que lhe é próprio, como a vida, a identidade, a liberdade, a imagem, a

privacidade, a honra.

Dada importância do direito à honra, como um direito inerente à

personalidade do indivíduo, bem como um direito fundamental na esfera

constitucional, vê-se que a mesma, quando ferida, pode causar danos imensuráveis

nas esferas psíquica e moral da pessoa humana, de forma que, além disso, referido

dano pode impactar até mesmo na órbita patrimonial das pessoas.

Nesse sentido, Cahali73, diferencia o que é um dano patrimonial do dano

moral, este último que para o referido autor é dado pela privação ou diminuição

daqueles bens que têm um valor precípuo na vida do homem e que são a paz, a

tranquilidade de espírito, a liberdade individual, a integridade individual, a integridade

física, a honra e os demais sagrados afetos.

Classifica, desse modo, em dano que afeta a parte social do patrimônio moral

(honra, reputação, etc.) e dano que molesta a parte afetiva do patrimônio moral (dor,

tristeza, saudade etc.); dano moral que provoca direta ou indiretamente dano

patrimonial (cicatriz deformante, etc.) e dano moral puro (dor, tristeza, etc.).

A exemplo de dano moral, que traz sequelas na órbita patrimonial, tem-se o

caso de um médico que tem sua honra ferida ao ponto de ter seu nome, na

qualidade de profissional, abalado com acusações falsas. Nesse caso, existe um

dano muito maior que o dano moral, pois os pacientes deixarão de demandarem

seus serviços profissionais, o que lhe causará lucros cessantes atingindo até mesmo

o seu patrimônio, em virtude do dinheiro que ele deixará de receber a partir de

então.

Na conceituação de Venosa74 lucro cessante “consiste naquilo que o credor

razoavelmente deixou de lucrar”, ou seja, existia uma expectativa real, ou fruto de

um trabalho comercial ou mesmo por uma clientela já existente e a mesma foi

frustrada pelo dano sofrido.

73

CAHALI, Yussef Said. Dano Moral. 4ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p.18. 74

VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil – Teoria Geral das Obrigações e Teoria Geral dos Contratos. v. II, 11ª ed. São Paulo: Atlas, 2011, p. 339.

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- 46 -

Nessa esteira, exemplo similar é o do caso de uma família em que o pai

morre em um acidente e o referido genitor era o responsável pela subsistência de

todos os membros da casa.

Desse modo, dispõe o art. 402 do Código Civil75 que a extensão do dano

pode ir além do que pode ser visto como perda imediata, mas também engloba

perdas relativas ao que se deixou de ganhar a partir do momento em que se é

vitimado com o dano.

Nessa linha de raciocínio o dano, em toda sua extensão, há de abranger

aquilo que efetivamente se perdeu e aquilo que deixou de lucrar: o dano emergente

e o lucro cessante.

Isso pode ser analisado no caso de um acidente ferroviário no qual a mãe

viúva perdeu seu filho trabalhador em acidente durante transporte ferroviário através

do julgado no qual o STJ concedeu em sede de Recurso Especial, no RESP nº

19.402-SP76 a cumulação de indenização pelo dano material com o dano moral.

O Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento de que mesmo sendo

juridicamente autônomas, as indenizações por danos materiais e morais, originadas

do mesmo fato, podem sim serem cumuladas, ex vi do disposto em sua súmula 37.

Face o exposto, observa-se que é mais do que cabível a indenização cumulada de

dano moral e dano patrimonial.

Por fim, observa-se que os direitos da personalidade merecem proteção

especial, não só pelo fato de constarem do novo Código Civil, como também por ser

uma garantia exposta na Constituição Federal e em convenção internacional,

conforme a seguir.

75

Art. 402 - Salvo as exceções expressamente previstas em lei, as perdas e danos devidas ao credor

abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar. 76

RESP nº 19.402-SP - Responsabilidade civil. Acidente durante transporte ferroviário. Ação indenizatória. Cumulação das indenizações pelo dano material e pelo dano moral. Ação ajuizada por mãe viúva, ante o falecimento de filho de 17 anos, já assalariado, vitimado em queda de trem. São cumuláveis as indenizações pelo dano material e pelo dano moral, ainda que oriundos do mesmo fato. Fixação de indenização pelo dano moral em valor igual a cinquenta salários mínimos vigorantes a data do pagamento. (RESP. – 19.402-SP, nº de distribuição 1992/0004807-2, STJ, Min. ATHOS CARNEIRO ANDRIGHI - T4 – QUARTA TURMA, julgado em 30/03/1992, publicado em 20/04/1992).

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3.2.2 A indenização por danos morais

A lesão ao dano moral constitui uma agressão a um direito da personalidade,

ou seja, um direito imaterial, de forma que, não há como se mensurar, precisamente,

um ressarcimento a esse direito. Por isso, o legislador civil deixa claro que o que

existe é uma reparação e não ressarcimento a um dano moral efetivo.

Referida conceituação é reforçada por Tartuce77 que aponta que constitui um

dano moral uma lesão aos direitos da personalidade elencados nos arts. 11 e 12 do

Código Civil e para sua reparação não se requer a determinação de um preço, para

a dor ou sofrimento, mas sim um meio para atenuar, as consequências do prejuízo

imaterial, o que traz o conceito de lenitivo, derivativo ou sucedâneo.

Por isso é que se utiliza a expressão reparação e não ressarcimento para os

danos morais. Na ótica de Moraes78, o dano moral tem sua origem etimológica da

palavra em latim “in dene”, que significa devolver o património ao estado em que se

encontrava, o que raramente é possível, sendo assim o dano moral compensado e

não indenizável.

Nesse prisma, observa-se que a reparação de um dano moral dá-se por uma

compensação, pois o dano moral em si não é como um patrimônio atingido no qual

se pode mensurar o quantitativo a ser pago, ou seja, referido dano atinge o aspecto

psicológico do indivíduo.

No que tange à natureza jurídica da indenização por danos morais, tem-se

que não existe unanimidade a respeito da mesma, divergindo assim três correntes

doutrinárias e jurisprudenciais que segundo Tartuce79 são:

1ª Corrente: A indenização por danos morais tem o mero intuito reparatório ou compensatório, sem qualquer caráter disciplinador ou pedagógico. Essa tese encontra-se superada na jurisprudência, pois a indenização deve ser encarada mais do que uma mera reparação;

2ª Corrente: a indenização tem um caráter punitivo ou disciplinador, tese adotada nos Estados Unidos da América, com o conceito de punitives damagens. Essa corrente não vinha sendo bem aceita pela nossa jurisprudência, que identificava perigos na sua aplicação. Porém, nos últimos tempos, tem crescido o número de adeptos a essa teoria [...]

77 TARTUCE, Flávio. Direito Civil – Direito das Obrigações e Responsabilidade Civil. 7ª ed. São Paulo: Método, 2012, p. 390. 78 MORAES, Maria Celina Bodin de. Danos à Pessoa Humana: Uma Leitura Civil-Constitucional dos Danos Morais. 1ª ed. Rio de Janeiro: Editora Renovar, 2003, p.145. 79

TARTUCE, op. cit. p. 406.

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3ª Corrente: A indenização por dano moral está revestida de um caráter principal reparatório e de um caráter pedagógico ou disciplinar acessório, visando a coibir novas condutas. Mas esse caráter acessório somente existirá se estiver acompanhado do principal.

Prevalece hoje no Brasil a 3ª corrente. Contudo, a mesma deve sempre

conter o caráter reparador, sendo o caráter disciplinador acessório, é o exemplo do

Recurso Especial nº 665.425/AM80 que trata de um erro médico que deixou sequelas

estéticas no paciente quando fica claro que não se mensura a dor e sofrimento da

vítima, levando ao ofensor não só a aplicação da uma punição com o caráter

sancionatório, mas também, educativo. Aqui tem-se um dano estético que fere a

honra do indivíduo como preceituam a Constituição Federal em seu art. 5º, X e a

Súmula nº 387 do STJ que trata da cumulação de dano moral com o dano estético.

Referido autor conclui que o dano moral não se resolve em uma indenização

propriamente dita, uma vez que, ao contrario do dano patrimonial que pode ser

mensurado em função da perda material sofrida e indenizado em um valor monetário

que possa trazer ao bem atingido sua forma original, o dano moral não pode ter suas

consequências extintas por um mero pagamento pecuniário, sendo assim

compensado e não ressarcido.

Assim, a imposição de pagamento do ofensor ao ofendido “ao mesmo tempo

que agrava o patrimônio daquele, proporciona a este uma reparação satisfatória”.

Desta forma Tartuce81 demonstra critérios de quantificação da indenização por dano

moral que devem ser observados pelo magistrado na mensuração da mesma, que

se relacionam à extensão do dano, as condições socioeconômicas e culturais dos

envolvidos, as condições psicológicas das partes e o grau de culpa do agente, de

terceiro ou da vítima, valendo acrescentar que desde o arbitramento do quantum a

ser indenizado, o valor deverá ser corrigido monetariamente desde a data do

arbitramento, conforme reza a súmula 362 do STJ.

80

RESP nº 665.425/AM - Direito Civil. Responsabilidade civil. Hospital. Ação de indenização. Dano moral. Erro médico. Sequelas estéticas e psicológicas permanentes. Conjunto probatório. Montante indenizatório. Razoabilidade. Súmula 7/STJ. Pré-questionamento. Ausência. Embargos de declaração. Omissão e contradição inexistentes. Rejeitam-se os embargos de declaração quando inexistente qualquer omissão, obscuridade ou contradição na decisão embargada. Na revisão do valor arbitrado a título de dano moral não se mensura a dor, o sofrimento, mas tão somente se avalia a proporcionalidade do valor fixado ante as circunstâncias verificadas nos autos, o poder econômico do ofensor e o caráter educativo da sanção. (RESP. – 665.425/AM, nº de distribuição 2004/0068236-3, STJ, Ministra NANCY ANDRIGHI- T3 - TERCEIRA TURMA, julgado em 25/04/2005, publicado em 16/05/2005). 81 TARTUCE, Flávio. Direito Civil – Direito das Obrigações e Responsabilidade Civil. 7ª ed. São Paulo: Método, 2012, p. 408 e p. 409.

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Desta forma, observadas as considerações do Código Penal quanto ao dano

moral, bem como a possibilidade de indenização pela legislação civil, visualiza-se a

seguir a importância dos direitos da personalidade.

3.2.3 A proteção aos Direitos Personalíssimos

A proteção aos direitos da personalidade pode se dar de forma preventiva ou

mesmo repressiva. Preventiva quando busca-se que o dano não ocorra e repressiva

quando o mesmo já ocorreu e busca-se uma reparação pelo dano sofrido bem como

a continuidade do dano.

A proteção jurídica aos direitos da personalidade está elencada

principalmente no art. 12 do Código Civil82. Nesse prisma o direito de buscar a

reparação de um dano moral é transmissível após o falecimento do titular do direito,

tendo assim seus herdeiros total legitimidade para buscar os direitos feridos do de

cujus.

O direito que sucede é o de ação, de caráter patrimonial, e não o direito moral

em si, personalíssimo por natureza e, portanto, intransmissível”, conforme pode ser

bem observado no julgado transcrito pelo Recurso Especial nº 1.071.158-RJ83 o qual

trata da legitimação dos sucessores para pleitear a indenização pelo dano auferido

ao falecido.

Por derradeiro, vale citar a Convenção Interamericana de Direitos Humanos

(Pacto de São José da Costa Rica), a qual fora inserida em nosso ordenamento

jurídico através do Decreto nº 678/1992, determinou no plano internacional “que os

Estados se comprometam a respeitar e garantir os direitos da personalidade”.

A valoração da dignidade dos ser humano vem sendo alvo de muita atenção

ao longo das últimas décadas, de forma que, observa-se que o direito agora, com

82

Art.12 – Pode-se exigir que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, e reclamar

perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei. Parágrafo único. Em se tratando de morto, terá legitimação para requerer a medida prevista nesse artigo o cônjuge sobrevivente, ou qualquer parente em linha reta, ou colateral até mesmo o quarto grau. 83

RESP 1.071.158-RJ - Civil e processual civil. Indenização. Dano moral. Vítima. falecimento. Sucessores. Legitimidade. Pedido. Petição inicial. Interpretação lógico-sistemática. Art. 42 do cp. Ofensas veiculada sem procedimento extrajudicial. Inaplicabilidade. Ofensas contra juiz. Inaplicabilidade. Dano moral. Indenização. Revisão pelo STJ. Valor irrisório ou excessivo. Possibilidade. (RESP. – 1.071.158-RJ, nº de distribuição 2008/0146386-9, STJ, Ministra NANCY ANDRIGHI - T3 - TERCEIRA TURMA, julgado em 25/10/2011, publicado em 07/11/2011).

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uma nova roupagem, passa a entender que a defesa do patrimônio é importante,

contudo, o ser humano tem seus valores que não podem deixar de serem

percebidos, e dentre eles, a honra merece atenção especial por representar um

esforço histórico fruto de sofrimentos e conquistas sociais.

Diante disso, observa-se que a preocupação com os valores relativos à

dignidade da pessoa humana se propaga em outras esferas legislativas, como no

próprio Direito Civil, que após a Codificação de 2002 passou a deixar de dar ênfase

ao patrimônio e aos contratos, como era na codificação de 1916, passando a

assumir uma postura de valoração do ser humano, principalmente no que tange aos

seus valores morais.

4 A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

4.1 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS E PRESERVAÇÃO DA DIGNIDADE

HUMANA

Na busca pela garantia do direito à honra da pessoa que venha a sofrer um

dano moral, faz-se necessário observar que o indivíduo possui valores que o

identificam socialmente deixando-o de ser apenas um número estatístico ou um

mero registro na análise populacional.

O ser humano possui sua individualidade e características que o diferencia

uns dos outros, de forma que, seus valores morais estão ligados à sua dignidade

perante a sociedade. Desta forma, na visão de Moraes, a dignidade da pessoa

humana é um valor que remete à valorização do ser humano no seu contexto

social84.

A mencionada autora85 acrescenta que o ser humano possui uma

característica distintiva dos outros seres que é uma dignidade e que a raiz da

palavra dignidade é oriunda do latim dignus – “aquele que merece estima e honra e

84

A autora deixa claro que o que distingue o ser humano dos animais é que existe uma qualidade própria apenas aos seres humanos: uma “dignidade” inerente à espécie humana. Etimologicamente, a palavra “dignidade” provém do latim dignus – “aquele que merece estima e honra, aquele que é importante”; diz-se que a sua utilização correspondeu sempre a pessoas, mas foi referida, ao longo da antiguidade, apenas à espécie humana como um todo, sem que tenha havido qualquer personificação. Para maior aprofundamento ver em MORAES, Maria Celina Bodin de. Danos à Pessoa Humana: Uma Leitura Civil-Constitucional dos Danos Morais. 1ª ed. Rio de Janeiro: Editora Renovar, 2003. p.77. 85 Ibid.

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- 51 -

que é importante” - sendo ao longo da antiguidade a espécie humana merecedora

desse atributo.

Assim, a Constituição Federal de 1988, fruto das lutas sociais de um povo que

sofreu durante anos os reflexos da ditadura militar e o período pós-guerra que

demonstrou ao mundo a figura da humilhação e exploração que um ser humano

pode ser submetido, reconheceu a dignidade da pessoa humana com um princípio

norteador da citada carta magna e que se reflete sobre toda a legislação brasileira.

Os princípios gerais do direito condicionam e orientam o ordenamento jurídico

em sua interpretação, e devem ser seguidos obrigatoriamente na edição normativa.

Na visão de Nader86, os princípios gerais representam uma garantia para o critério

de julgamento a ser proferido, sendo os princípios o último elo que o juiz deverá

recorrer de acordo com o direito brasileiro.

Historicamente, o princípio da dignidade da pessoa humana teve suas raízes

nos preceitos cristãos quando se analisava o homem como fruto da obra divina,

sendo então merecedor de um tratamento diferenciado e digno perante os outros,

assim, Moraes87 acrescenta que o cristianismo concebeu a ideia de dignidade

pessoal fundamentando que o homem é originado por Deus para ser o centro da

criação e merecedor de atenção e dignidade especial.

Todavia, mesmo com origens na antiguidade, esse valor chamado dignidade

da pessoa humana, foi realmente aceito de forma impositiva pela legislação em

tempos atuais, elevando-se à classificação de princípio e recepcionado pela

Constituição Federal como norte da legislação nacional fruto de um mundo marcado

pelas guerras mundiais quando atrocidades foram cometidas contra os povos.

É o que deixa claro Soares88 quando menciona que mesmo a dignidade da

pessoa humana sendo uma concepção oriunda de matrizes culturais anteriores,

desde a antiguidade até a idade moderna, sua consagração jurídica é recente.

86

NADER, Paulo. Introdução ao Estudo do Direito. 30ª ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2008, p. 199. 87

MORAES, Maria Celina Bodin de. Danos à Pessoa Humana: Uma Leitura Civil-Constitucional dos Danos Morais. 1ª ed. Rio de Janeiro: Editora Renovar, 2003, p. 77. 88

SOARES, Ricardo Maurício Freire. Elementos da Teoria Geral do Direito. 1ª ed. São Paulo:

Saraiva, 2013, p. 252.

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- 52 -

Face o exposto, observa-se a seguir o valor dos princípios em nossa

normatização, bem como a importância do princípio da dignidade da pessoa humana

na legislação pátria.

4.1.1 Princípios: vetores a serem seguidos

Os princípios não estão positivados, todavia, representam a bússola pela qual

a legislação deve mirar-se. Se por exemplo uma determinada norma possa vir a ter

um entendimento dúbio, a inclinação do entendimento que siga os princípios é que

deverá preponderar.

Nesse prisma, os princípios desempenham papel fundamental na legislação

pátria, de forma que, os mesmos devem fazer parte da interpretação legal. Desta

forma, os princípios funcionam como balizadores, contudo, anteriormente à fase

interpretativa ou da análise do caso concreto, os princípios devem estar presentes

na elaboração dos dispositivos legais, conforme explana Nader89 ao citar que os

princípios desempenham o papel de preencher as lacunas da lei em determinados

momentos.

Mais do que simplesmente valores, os princípios refletem orientações para

todas as normas de um sistema jurídico, ou seja, se uma lei for editada ela deve

seguir uma orientação principiológica, uma vez que, se a mesma for criada em

desacordo com um princípio, exemplo, contra a dignidade da pessoa humana, ela

será tida como inconstitucional, pois a Constituição Federal reflete os princípios

norteadores a serem seguidos pelas demais normas.

Na aplicação de um princípio deverá ser analisada uma situação concreta e,

verificado o comportamento repetitivo da mesma, para daí então criar-se um norte a

ser seguido pelo legislador bem como no julgamento de repetida situação, conforme

assevera Nader90 ao mencionar que o cientista do direito observará as fórmulas

adotadas pelo legislador ao regular várias situações semelhantes, induzindo à

existência de um princípio.

89

NADER, Paulo. Introdução ao Estudo do Direito. 30ª ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2008, p. 200. 90

NADER, op. cit., p. 203.

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No conflito entre princípios, deverá ser observado sempre o princípio da

dignidade da pessoa humana como norteador de todos os demais princípios, assim,

se existir uma querela onde sejam ponderados quais princípios devem ser aplicados

naquele caso, deve-se questionar acerca da dignidade humana que deve está

presente nesse sopesamento, uma vez que a dignidade humana representa um

valor que norteia todos os demais princípios.

Na visão de Nunes91, a dignidade humana tem um valor superior a todos os

demais princípios, pois é a mesma que dá o parâmetro para solução de conflito de

princípios; é ela a luz de todo ordenamento. Tanto no conflito em abstrato de

princípios como no caso real, concreto, é a dignidade que dirigirá o intérprete – que

terá em mãos o instrumento da proporcionalidade – para a busca da solução92.

Nessa esteira, o princípio da dignidade da pessoa humana está presente em

todas as clausulas gerias que atualmente vem sendo adotadas com objetivo de

recepcionar os princípios da Constituição Federal de 1988, conforme elucida

Soares93 ao mencionar que um aspecto marcante do pós-modernismo é a edição de

clausulas gerais com receptáculos de princípios, consagrando o princípio da

dignidade da pessoa humana, previsto no art. 1º, III da Carta Magna de 1988, base

para toda compreensão do conjunto dos direitos fundamentais dos cidadãos.

Ditos princípios são elaborados com a observação reiterada de determinadas

situações objetivando valorizar acima de todos os princípios a dignidade humana

que é um valor conquistado após períodos históricos de guerra em que o ser

humana era desprezado, todavia, questiona-se qual é a essência do princípio da

dignidade humana, o que será elucidado a seguir.

91

NUNES, Luiz Antônio Rizzato. O Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana: Doutrina e Jurisprudência. 1ª ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p.55. 92

“Assim, por exemplo, o princípio da intimidade, vida privada, honra, imagem da pessoa humana etc. deve ser entendido pelo da dignidade. No conflito entre liberdade de expressão e intimidade é a dignidade que dá a direção para a solução. Na real colisão de honras, é a dignidade que servirá – via proporcionalidade – para sopesar os direitos, limites e interesses postos e gerar a resolução”. 93 SOARES, Ricardo Maurício Freire. O Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana. 1ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p.137.

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4.1.2 O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana

A dignidade da pessoa humana é inerente ao ser humano e, de acordo com

Nunes94 “a dignidade humana é um valor preenchido a priori, isto é, todo ser

humano tem dignidade só pelo fato já de ser pessoa”.

Mesmo existente desde a antiguidade, a dignidade humana surgiu na

Alemanha como princípio desde a Constituição Federal de 1949, fruto das

atrocidades sofridas na época do Estado Nazista.

Desta forma, de acordo com Martins95 a Constituição alemã, de 23 de maio de

1949, foi a primeira a constitucionalizar o valor da dignidade da pessoa humana sob

a forma de princípio, em seu art. 1º, nº1, mencionando que: “A dignidade humana é

inviolável. Respeitá-la e protegê-la é obrigação de todos os Poderes estatais.” Sua

constitucionalização decorre, em grande medida, de uma franca reação aos horrores

provocados pelo Estado nazista.

Todavia, no Brasil, foi na Constituição Federal Brasileira de 1988 que esse

princípio ganhou força, após as conquistas do povo frente à ditadura militar e com a

concretização de suas aspirações, nas quais repudiou-se qualquer tratamento

desumano que os indivíduos pudessem sofrer.

A Dignidade Humana tornou-se um farol para todos os demais ramos do

direito, de forma que, segundo Soares96 como a dignidade da pessoa humana está

situada no pico basilar da Constituição de 1988, o legislador conferiu a qualidade de

norma embasadora de todo sistema jurídico a esse princípio orientando a totalidade

do catálogo de direitos fundamentais, tais como os direitos individuais à vida, à

liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, dentre outros.

Nesse horizonte, tem-se que a dignidade humana pode ser analisada por três

prismas de dimensão, onde na primeira dimensão, a dignidade humana é vista como

valores intrínsecos à natureza do ser humano que sequer precisam ser positivados,

a exemplo da vida, da saúde, liberdade e outros direitos que fazem parte da

essência do ser humano.

94

NUNES, Luiz Antônio Rizzato. O Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana: Doutrina e Jurisprudência. 1ª ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p.52. 95

MARTINS, Flademir Jerônimo Belinati. Dignidade da Pessoa Humana. Princípio Constitucional Fundamental. 1ª ed. Curitiba: Editora Juruá, 2003, p. 36. 96

SOARES, Ricardo Maurício Freire. O Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana. 1ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p.135.

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- 55 -

Segundo Chohfi e Mendes97, a dignidade de primeira dimensão, como visto, é

de fácil visualização, pois atinge valores tão fundamentais – como a vida, a saúde ou

a liberdade – que dispensam inclusive a letra da lei para sua proteção. São valores

tão aparentes a própria natureza do homem que sua violação é tida como absurda,

passível de uma contra ação suficiente e vultosa, que impeça o mal respectivo.

Já na segunda dimensão, a dignidade humana é tida como atos que são

praticados ilicitamente e que acabam por ferir a dignidade humana, é o exemplo de

um contrato de trabalho no qual o trabalhador é explorado e são privados dele seus

direitos positivados.

Na visão de Chohfi e Mendes98 são nesses direitos que a dignidade é mais

relativizada e, portanto, de difícil percepção, pois justamente nesta esfera das

dimensões é que se praticam atos formalmente ilícitos, mas que no seu âmago

ferem diretamente a dignidade da pessoa humana.

No que tange à terceira dimensão da dignidade humana, tem-se que direitos

como ao meio ambiente saudável ou, mesmo o ambiente de trabalho, são afetados

de forma direta limitando o indivíduo no mundo em que vive ou nas expectativas

profissionais que são frustradas por medidas extremamente absurdas.

Conforme elucidam Chohfi e Mendes99, é o caso, por exemplo, de uma

empresa que lesa o meio ambiente do trabalho seja por até por proceder pressão

psicológica desmedida no ambiente laboral aos funcionários, o chamado assédio

moral coletivo, como ocorre com metas coletivas praticamente impossíveis de serem

alcançadas, e que impedem a remuneração digna esperada.

Com a recepção do princípio da dignidade da pessoa humana, tem-se a

possibilidade de reparação pelos danos extra patrimoniais sofridos, ou seja, um

dano que venha a ofender a honra e a moral do indivíduo pode ser reparado à luz do

princípio da dignidade da pessoa humana.

Nesse diapasão, com a aplicação do princípio da dignidade da pessoa

humana nas relações de direito privado, tem-se claramente a possibilidade de

ressarcimento da um dano moral, conquista essa oriunda da constitucionalização do

97

CHOHFI, Thiago e MENDES, Maristela Piconi. A Segunda Dimensão da Dignidade Humana no

Direito Laboral. São Paulo: Caderno de Direito UNIMEP, 2001, p. 15. 98

Ibid., p.16. 99

Ibid., p.15.

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direito civil, conforme aponta Schreiber100, existe agora uma força maior que impõe a

reparabilidade do dano extrapatrimonial.

Finalmente, Moraes101 acrescenta que o dano extrapatrimonial objeto de

reparação na ação de dano moral ferido pela mitigação da dignidade humana é fruto

de uma cláusula geral que tutela a personalidade do indivíduo na esfera civil que

hoje se rege como direito civil constitucionalizado 102.

4.1.3 O papel do Estado na garantia de uma vida Digna

O direito busca garantir às pessoas o convívio em sociedade de forma

pacífica dando às mesmas garantias para essa existência ordenada. Na execução

do mesmo, o Estado atua como promotor dessas garantias e seguranças à

população, exercitando o direito de forma soberana editando normas que venham a

atender às aspirações sociais.

Nesse sentido, Mello103 enfatiza que o direito reflete a soberania estatal, esta

que serve como um instrumento de gestão da sociedade que almeja segurança e

garantias e, com base na soberania estatal, é posto um conjunto de normas jurídicas

que regulam a efetivação dos direitos e garantias.

Todavia, a sociedade é multável com o passar do tempo, uma vez que, com a

evolução histórica, novos acontecimentos e situações surgem com a urgente

necessidade de disciplinamento legal para regular determinadas situações, assim, o

direito busca adaptações às novas situações mirando-as à luz dos princípios que

são fruto das experiências já vivenciadas e que podem ser tomadas como moldes

para criação de novos direitos.

100

SCHEREIBER, Anderson. Direitos da Personalidade. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2013, p. 90. 101

MORAES, Maria Celina Bodin de. Danos à Pessoa Humana: Uma Leitura Civil-Constitucional dos Danos Morais. 1ª ed. Rio de Janeiro: Editora Renovar, 2003.p. 133. 102

“O dano moral tem como causa a injusta violação a uma situação jurídica subjetiva extrapatrimonial, protegida pelo ordenamento jurídico através da cláusula geral de tutela da personalidade que foi instituída e tem sua fonte na Constituição Federal, em particular e diretamente decorrente do princípio da dignidade da pessoa humana (também identificado como princípio geral de respeito à dignidade humana)”. Para maior aprofundamento verificar em MORAES, Maria Celina Bodin de. Danos à Pessoa Humana: Uma Leitura Civil-Constitucional dos Danos Morais. 1ª ed. Rio de Janeiro: Editora Renovar, 2003.p. 133. 103

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. O conteúdo jurídico do princípio da igualdade. 3ª Ed. São Paulo: Editora Malheiros, 2011, p. 80.

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- 57 -

Segundo Mello104 as novas necessidades relacionadas com avanços

tecnológicos, realidades econômicas, dentre outras, impulsionam e intensificam a

cada dia um novo processo legislativo. A partir de então, dar-se início a uma

produção contínua de disposições normativas que resulta numa dispersão da

legislação.

De acordo com Passos105, a vida humana ao longo do tempo sofre alterações

em função do dinamismo fruto da evolução. Face o exposto, o Brasil sofreu ao logo

de muitos anos processos que vieram a fortalecer a criação de um princípio

norteador e protetor do indivíduo que é o princípio da dignidade da pessoa humana.

Para se chegar a esse ponto, o povo brasileiro sofreu drásticas retaliações e

tratamentos desumanos no período de ditadura militar e, segundo Nader106,

representaram o conceito de arbitrariedade, que pode ser praticada com base em

uma ação, ou seja, quando o Estado (por exemplo) vai além de suas competências,

ou mesmo por omissão, quando um órgão da administração pública deixa de fazer

uma um ato para o qual é competente.

Na busca pelo equilíbrio das relações sociais, o disciplinamento jurídico deve

visualizar o ser humano em dois focos, primeiramente contemplando os direitos

individuais da pessoa, nas suas esferas patrimonial e também extra patrimonial.

Posteriormente, é necessário inserir esse mesmo indivíduo dentro de um

contexto social e vislumbrar o direito da coletividade. Do ponto de vista de Nader107

o objetivo a ser alcançado pelo Estado, na busca pelo alcance dos interesses da

sociedade, inspira-se em filosofias distintas com posições bem definidas onde na

primeira tem-se o indivíduo em primeiro plano e a segunda analisa-se a coletividade

como um todo.

Com a Constituição Federal de 1988, a dignidade humana tornou-se um valor

a ser perseguido pelo ordenamento jurídico pátrio, representando assim uma

finalidade a ser alcançada pelo Estado em seu papel, conforme deixa claro

104

Ibid., p. 83. 105 PASSOS, José Joaquim Calmon de. Direito, Poder, Justiça e Processo. Rio e Janeiro: Forense, 2000, p.54. 106

NADER, Paulo. Introdução ao Estudo do Direito. 30ª ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2008,

p.138. 107

Ibid., p. 135.

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Soares108 ao afirmar que este princípio encontra-se no ápice do ordenamento

jurídico e que o mesmo exprime as finalidades a serem alcançadas pelo Estado e o

conjunto da sociedade civil, emanando-se por toda legislação pátria não podendo

ser pensado de maneira individual, mas sim coletiva.

Desta forma, o Estado não só valoriza o indivíduo, mas sim todo o coletivo

buscando atender os interesses da sociedade civil priorizando o direito coletivo ao

individual, é o que pode ser observado em um Estado de Direito onde são

preservados os direitos humanos.

Para efetivação de seu papel na sociedade, o Estado necessita de

independência e harmonia nos três poderes, bem como que o seu papel não esteja

focado simplesmente na sanção, mas também no cumprimento de obrigações,

conforme enseja a população quando da eleição e seus representantes políticos.

Esse entendimento é reforçado nos dizeres de Nader109 que explica que o

Estado de Direito caracteriza-se pela proteção dos direitos humanos de maneira

efetiva e que para que seja alcançado esse objetivo, faz-se necessário que o Estado

esteja estruturado no modelo clássico de poderes independentes e que os mesmos

interajam com harmonia, além, disso, o Estado não pode ser visto simplesmente

como um poder sancionador, mas sim, como um ente dotado também de

obrigações, com participação do povo na administração pública, pela escolha de

seus legítimos representantes.

Face o exposto, tem-se que o Estado tem obrigações a cumprir frente à

população, todavia é um esforço conjunto na busca da preservação de uma vida

digna para a sociedade, na qual esta tem o dever de buscar saber escolher os seus

representantes que vão disciplinar as leis que regem seu país.

4.2 A BUSCA PELA REALIZAÇÃO DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA

HUMANA

A dignidade da pessoa humana é inerente ao ser humano desde o seu

nascimento, desta forma, a qualidade de ser um ser humano o identifica como

108

SOARES, Ricardo Maurício Freire. O Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana. 1ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p.149. 109

NADER, Paulo. Introdução ao Estudo do Direito. 30ª ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2008, p.138.

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portador do direito à dignidade humana é o que assevera Chohfi e Mendes110 ao

especificar que todo aquele que nasce com vida é detentor de direitos, mesmo que

os mínimos necessários.

Daí se pode abstrair o conceito de dignidade humana, que é um princípio

limitador mínimo desses direitos inerentes ao ser humano, o que não pode ser

aplicado a um animal, por exemplo.

Desta forma, a dignidade almejada é fruto da identidade ética reconhecida no

convívio com outros iguais dotados de livre vontade e que não podem vir a serem

discriminados no grupo social em que convivem. Nas palavras de Moraes111 o

substrato material da dignidade pode ser visto na ótica de um sujeito moral (ético),

que reconhece a existência de outros.

Além disso, pode-se vislumbrar que os referidos sujeitos são merecedores

do mesmo respeito e integridade física e psicológica e que são dotados de vontade

livre sendo parte de um grupo social, em relação ao qual tem a garantia de não vir a

serem marginalizados.

Assim, a busca pela realização da dignidade humana é uma tarefa não só do

Brasil, mas de outros países que comungam de legislações e tratados comuns

objetivando construir um mundo melhor em que o ser humano possa demonstrar sua

evolução moral fugindo ao comparativo dos primórdios e das barbáries cometidas

séculos atrás.

4.2.1 A criação da Organização das Nações Unidas e os Tratados

Internacionais

Com os conflitos internacionais, países se agruparam no sentido de tomar

medidas necessárias para coibir os abusos praticados no planeta que cercearam a

vida dentro dos parâmetros morais.

Desta forma, com o findar da Guerra Fria, foi criada a Organização das

Nações Unidas – ONU, dando continuidade aos trabalhos empregados pelo

Conselho Nacional das Nações Unidas. O objetivo maior sempre foi o de manter a

110

CHOHFI, Thiago e MENDES, Maristela Piconi. A Segunda Dimensão da Dignidade Humana no Direito Laboral. São Paulo: Caderno de Direito UNIMEP, 2001, p. 13. 111

MORAES, Maria Celina Bodin de. Danos à Pessoa Humana: Uma Leitura Civil-Constitucional dos Danos Morais. 1ª ed. Rio de Janeiro: Editora Renovar, 2003, p. 85.

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paz mundial e para tanto, o combate às atrocidades e guerras sempre foi um dos

maiores focos dessa Organização.

Nesse sentido, diversas missões foram executadas pela ONU com o intuito de

buscar manter o equilíbrio internacional, de forma que, segundo Faganello112, com o

fim da Guerra Fria as peacekeeping operations passaram a ser empregadas com

maior frequência na missão consagrada à Organização das Nações Unidas (ONU),

de manter a paz e a segurança internacional. Foram 35 operações desdobradas

durante a década de 1990.

Foi com a Carta das Nações Unidas que em 1945 a Comunidade das Nações

Unidas estabeleceu matérias relativas à segurança nacional e a busca pela proteção

dos direitos humanos, preservando assim a integridade moral dos indivíduos em um

contexto de guerras em que pessoas eram enviadas para campos de concentração

e executadas em massa.

Na visão de Faganello113, diante das violações aos direitos humanos de forma

massiva efetivadas contra a nação “não eleita” do povo alemão, através de práticas

de torturas, prisões arbitrárias, assassinatos em massa e o envio de milhares de

pessoas para campos de concentração, tais direitos mostraram-se frágeis.

Foi então que, ao final da segunda guerra, em 1945, que a comunidade

internacional foi brindada com a edição da Carta das Nações Unidas que, além de

dispor sobre matéria de segurança internacional, estabelecia como um dos

propósitos da “família das nações” que se formava a proteção e a promoção dos

direitos humanos.

Os direitos voltados para dignidade humana passaram a serem tidos como

fundamentos da paz almejada pela ONU, assim, quando aprovada a Declaração das

Nações Unidas em 1948, os direitos humanos passaram a ter valor focal nas

missões da ONU na busca pela paz.

Segundo Faganello114, quando da aprovação da Declaração Universal dos

Direitos Humanos pela Assembleia Geral das Nações Unidas (AGNU), os direitos

112

FAGNELLO, Priscila Liane Fett. Operação de Manutenção da Paz da ONU: De que forma os Direitos Humanos revolucionaram a principal ferramenta internacional da paz. Brasília: FUNAG, 2013, p. 17. 113

Ibid., p. 24. 114

Ibid.

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humanos serviram de propósito norteador da Organização das Nações Unidas

(ONU) e passaram a ser reconhecidos como o fundamento da paz, conforme dispõe

seu preâmbulo.

Diante do exposto, observa-se também a questão da receptividade dos

Tratados que são firmados entre outras nações e o Brasil, se os mesmos possuem o

status de norma constitucional suprimindo as demais leis ordinárias brasileiras ou se

encaixam no mesmo patamar das mesmas.

Preliminarmente, cabe deixar claro que a Carta Magna Brasileira é a lei

suprema do país e uma norma ou tratado internacional não pode fazer frente a este

diploma legal, assim, um tratado ou convenção jamais terá o mesmo status da

Constituição Federal de 1988.

Vale ressaltar que os tratados internacionais que tiverem como objeto direitos

humanos, terão um status superior às normas infraconstitucionais, paralisando-as

quando for o caso.

Contudo, no julgamento do RE nº 466.343, o STF decidiu que os tratados e

convenções internacionais sobre direitos humanos, que não incorporados na forma

do § 3º, art. 5º/CF, têm natureza de normas supralegais, determinando a eficácia

paralisante de toda legislação infraconstitucional contrária.

Todavia, se os referidos tratados, que abordam direitos humanos,

ingressarem no Brasil obedecendo aos trâmites exigidos na Constituição Federal

vigente, estes adentrarão ao ordenamento jurídico pátrio com status de normativo

constitucional, conforme deixa claro Almeida Júnior e Perlatti115.

Esse é também o entendimento de Soares116, uma vez que os citados

tratados quando obedecem os trâmites constitucionais, por tratarem de questões

relevantes direcionadas à dignidade da pessoa humana, adentram ao ordenamento

jurídico com o status de emendas constitucionais, vez que a referida dignidade serve

115

“Em conformidade com todo exposto, forçoso é reconhecer que a Carta Magna de 1988 incluiu, dentre os direitos constitucionalmente protegidos, aqueles enunciados nos tratados internacionais de que o Brasil seja parte. As regras internacionais definidoras de direitos humanos, previstas em tratados ratificados pelo Brasil, ingressam em nosso ordenamento jurídico com status de norma constitucional.” Para um maior entendimento verificar em PERLATTI, João Eduardo Franco. O conflito entre o direito interno brasileiro e os tratados internacionais de direitos humanos. São Paulo: Paradigma Ciências Jurídicas, 2001. p. 44. 116

SOARES, Ricardo Maurício Freire. Elementos da Teoria Geral do Direito. 1ª ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p.252.

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de parâmetro para intelecção dos referidos direitos que, aprovados, em cada Casa

do Congresso Nacional, em dois turnos, por 3/5 dos votos dos respectivos membros,

serão considerados hierarquicamente equivalentes às emendas constitucionais.

Do ponto de vista de Oliveira, em termos de classificação, os tratados podem

ser interpretados como tratados-lei e tratados-contratos, o que facilita os critérios

interpretativos aplicados a um e a outro caso117.

No primeiro caso os Estados membros vinculam-se com os entes

internacionais de maneira uniforme e duradoura, exigindo uniformidade de

interpretação através de um critério objetivo interpretativo.

Já quanto aos tratados contratos, estes exigem uma interpretação subjetiva

onde é ponderada a vontade das partes que participam do processo interpretativo do

mesmo, é o entendimento de Oliveira118.

Por fim, é de competência do Presidente da República assinar ou ratificar os

tratados internacionais, todavia, essa aprovação pode ser rejeitada pelo Congresso

Nacional, conforme deixa claro Gabsch119.

Diante do exposto, observa-se o esforço para se buscar aplacar os conflitos

internacionais com a criação de Organizações voltadas para esse fim, bem como a

receptividade dos tratados internacionais pelo Brasil, inclusive a elevação dos

mesmos ao nível de Emenda Constitucional quando versam acerca de direitos

humanos.

4.2.2 A valorização da honra e do ser humano no Brasil

O contexto de desvalorização da dignidade moral do ser humano avançou no

Brasil ao longo de sua história. Desde sua descoberta, índios foram tomados para

mão de obra e a escravidão perdurou por muito tempo por distinção de raça.

117

“Mesmo que parte da doutrina considere relativa e contestável, em termos gerais, a classificação entre tratados-lei e tratados-contrato, pelo menos para a determinação dos critérios interpretativos aplicáveis a uma e outra espécie de tratado sua validade é afirmada”. Para maior aprofundamento ver OLIVEIRA, Renata Fialho de. Interpretação e Aplicação de Convenções Internacionais em matéria Substantiva, Processual e Conflitual. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2014. p. 89-91. 118

“Em função das características dos tratados-contrato e da importância da identificação da vontade das partes no processo interpretativo, aplica-se para interpretação critérios que valorizem a interpretação subjetiva”. Ibidem, p.90. 119

GABSCH, Rodrigo D’Araújo. Aprovação de Tratados Internacionais pelo Brasil: Possíveis Operações para Acelerar seu Processo. Brasília: Fundação Alexandre de Gusmão, 2010, p.35.

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Por não serem facilmente subordinados, os índios não eram bons escravos,

papel que ficou para os negros africanos que vieram em navios negreiros para

serem explorados em nosso país.

De acordo com Lopes120, quando a escravidão estava acabando na Europa

ocidental, iniciava-se na América. Na escravidão moderna, observa-se algumas

marcas distintivas: quanto ao regime de produção ela se insere no pacto colonial de

produção das grandes fazendas de produtos de exportação. Quanto aos sujeitos da

escravidão sua marca mais forte será a exclusividade étnica: negos africanos e

indígenas.

Os negros eram tratados como propriedade e não tinham qualquer tipo de

respeito quanto ao seu aspecto moral e, sendo vistos como “coisa”, eram sujeitos a

trabalhos não remunerados, sofriam humilhações, estupros, torturas, chibatadas e

sequer podiam demonstrar sua insatisfação com o tratamento desumano que lhes

era direcionado para não sofrerem penas maiores.

Por conseguinte, mesmo com a abolição da escravatura em 13 de maio de

1888, isso não significou que essa parte do povo brasileiro passou a ter sua

dignidade moral respeitada em todos os aspectos. No geral, governo após governo,

instalou-se no país a ditadura militar, inspirada no pós-guerra, quando buscou-se a

tomada do poder e para tanto, práticas de torturas e perseguições não foram

poupadas, desprezando assim os aspectos morais do povo.

No período pós-guerra, o Brasil também viveu à sombra da ditadura e, de

acordo com Rezende121, as liberdades foram cerceadas dos indivíduos.

Perseguições, torturas, toque de recolher, tudo isso fez parte das ações do governo

militar objetivando coibir o livre exercício dos direitos da população no chamado

terror em nome de uma suposta democracia.

Em 13 de dezembro de 1968 passou a vigorar o Ato Institucional nº 05, o qual

significava a implantação do estado de terror em nome da continuidade e do

aprimoramento da ordem institucional. O executivo passava a ter poderes para

120

LOPES, José Reinaldo de Lima. O Direito na História. 3ª ed. São Paulo: Atlas, 2011, p. 322. 121

“No ano de 1968 a partir do AI-5 – verificou-se a implantação de uma estratégia de terror implantada pelo Estado com o endurecimento político do Governo Costa e Silva e da preponderância cada vez maior da linha dura no interior do aparelho de Estado. [...] Prevalecia o arbítrio para tanto, valia o uso da repressão e da tortura”. Para um maior aprofundamento do tema verificar em REZENDE, Maria José de. A Ditadura Militar no Brasil: Repressão e Pretensão de Legitimidade. 1964-1984. Londrina : Eduel, 2013. p.89.

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intervir em todas as esferas da sociedade. Institucionalizava-se a tortura e outras

formas de repressão.

Conforme relata Rezende122, foram muitas as limitações sofridas pelo povo

que lutou pela concretização de uma nova Constituição Federal que abraçasse os

verdadeiros anseios do povo, dignificando o indivíduo e reconhecendo seus valores

morais e, após muitas lutas e muito sofrimento, finalmente foi realizada a Assembleia

Geral Constituinte que promulgou a Constituição Federal de 1988.

Nela, as liberdades agora eram trazidas de forma que o povo, por exemplo,

através do impeachment poderia inclusive retirar o Presidente da República que não

estivesse atendendo aos anseios do povo.

A Constituição de 1988 traz como centro não mais o patrimônio e os contratos

que eram bastante valorizados no Código Civil de 1916, mas sim o ser humano em

si, e a dignidade da pessoa humana passou a ser um vetor de onde irradiam todos

os demais princípios.

Nessa esteira, assevera Soares123 que o sistema constitucional do Brasil foi

influenciado por tendências abolicionistas buscando emancipar o ser humano

mediante sua dignidade intrínseca, mormente com o advento da Constituição

Federal de 1988, concebida no contexto político-social de redemocratização do país,

após o longo período autocrático da ditadura.

Nesse novo paradigma, os princípios passam a ter um valor muito maior e a

lei uma interpretação voltada para a dignidade humana, ou seja, não basta o que

está escrito simplesmente na lei, é preciso interpretá-la, de forma que, até a

Segunda Grande Guerra Mundial, a teoria jurídica vivia sob a influência do Estado

Legislativo, onde a Lei e o Princípio da Legalidade eram as únicas fontes de

legitimação do Direito, na medida em que uma norma jurídica era válida não por ser

justa, mas sim, por haver sido posta por uma autoridade.

É o que deixa claro Lassale, o mesmo elucida que não adianta o que está

escrito em uma folha de papel e que por mais leis que existam, são as aspirações de

122

Ibid., p. 93. 123

SOARES, Ricardo Maurício Freire. Elementos da Teoria Geral do Direito. 1ª ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 255.

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um povo que devem criar a lei, e se assim não for, a Constituição de um país nada

mais será que uma mera folha de papel124.

Nessa esteira, conquistas sociais foram alcançadas na busca pela

democracia e com a Constituição Federal de 1988; os anseios sociais foram

atendidos de forma que foram superadas muitas explorações que eram cometidas

até então fruto da ditadura militar.

Com o Neoconstitucionalismo, a Constituição passa a ser o centro de onde

irradiam os parâmetros de todas as demais normas, além do que, os princípios

passaram a ser efetivamente reconhecidos e a dignidade da pessoa humana traz

um norte valorativo aos direitos morais do indivíduo.

Até a concretização desse sonho, muitos movimentos foram realizados e

rechaçados pelo governo que limitava a liberdade de expressão, a liberdade de

imprensa, a liberdade de locomoção e muitos movimentos que vivenciamos nos

tempos atuais eram tidos como agrupamentos criminosos.

Como o exemplo dos movimentos grevistas e estudantis, que de acordo com

Rezende125, eram tidos como clandestinos e ilegais pelo Estado Militar. Greves

bancárias, movimentos de sem terra e de metalúrgicos em Minas Gerais em outubro

de 1968, eram vistas como atentados à ordem institucional.

4.2.3 O Neoconstitucionalismo e as conquistas voltadas para honra

Após um período de ditadura militar, em que havia uma séria de privações

desde reuniões em praças, à liberdade de expressão ou de imprensa, além do

desrespeito à dignidade humana, a Constituição Federal de 1988 trouxe um novo

panorama uma vez que uma séria de direitos e garantias que foram conquistados

pela sociedade que lutava incessantemente por mudar aquele cenário.

Na referida carta magna, uma série de demandas sociais foram efetivadas, a

exemplo de direitos trabalhistas e sociais. O direito ao voto aos maiores de 16 anos,

124

“A essência da Constituição está nos Fatores Reais do Poder que regem uma nação que quando escritos em folha de papel acabam por receber expressão escrita. A partir desse momento, incorporamos a um papel não são simplesmente fatores reais do poder, mas sim o verdadeiro direito”. Para ler mais verificar em LASSALLE, Ferdinand. A Essência da Constituição. 9ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 20. 125

REZENDE, Maria José de. A Ditadura Militar no Brasil: Repressão e Pretensão de Legitimidade. 1964-1984. Londrina : Eduel, 2013. p.89.

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reduções nas jornadas de trabalho de 48 para 44 horas semanais, o direito de greve,

mesmo que ainda não regulamentado, licenças maternidade e paternidade, dentre

outros diretos representaram exemplos de conquistas sociais daquele momento.

Com o advento da Constituição de 1988, deixou-se para traz uma fase

obscura e passou-se a ter liberdades, tanto de expressão, como de imprensa, além

do que, uma grande conquista foi a dignidade da pessoa humana. A nação passou a

ter o poder de exigir do Estado contraprestações para garantia da saúde, educação,

segurança, trabalho e até mesmo lazer.

Com isso o ser humano passou a ser considerado e seus valores morais

dignificados de maneira que abusos que anteriormente eram cometidos, a exemplo

da tortura e do racismo, passaram a serem crimes inafiançáveis.

Conforme explicita Soares126, a dignidade da pessoa humana tornou-se

principio basilar da Constituição Federal de 1988, que se tornou a norma principal de

onde irradiam todas as demais e referencia para os direitos fundamentais, de forma

que, com essa conquista, a qualidade moral do indivíduo também passa a ser

valorizada cada vez mais.

Citado autor menciona que o legislador brasileiro conferiu à ideia de dignidade

da pessoa humana a qualidade de norma embasadora de todo o sistema

constitucional, e este princípio reflete-se sobre os direitos individuais, tais como à

vida, a liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, além disso, irradia-se

sobre direitos sociais como educação, a saúde, a moradia, o lazer, a segurança, a

previdência social, a proteção à maternidade e à infância, à assistência aos

desamparados; os direitos dos trabalhadores urbanos e rurais; os direitos da

nacionalidade; os direitos políticos e os direitos difusos, regulados em diversos

preceitos da Carta Magna.

A Constituição Federal de 1988 representou não somente o fim da ditadura

militar, mas também a conquista da redemocratização do país, de forma que, o

brasileiro passou a participar mais ativamente da vida política nacional a ponto de

até mesmo retirar do poder seus representantes políticos que não correspondam

aos anseios da nação.

126

SOARES, Ricardo Maurício Freire. O Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana. 1ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p.135.

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Diante disso, pessoas que não possuíam moradia se reuniram em

movimentos sociais ganhando proteção, políticas sociais mais direcionadas foram

aplicadas, edificou-se um novo modelo de Estado Social buscando o bem estar da

comunidade.

Nesse diapasão, conforme elucida Barroso127, a Constituição Federal de 1988

além de ser o símbolo maior de uma história de sucesso, representou a transição de

um Estado autoritário, quando uma série de abusos eram cometidos, com uso de

intolerância e violência, passando a ser um Estado Democrático de Direito, definindo

então o referido autor que “A Constituição de 1988 foi o rito de passagem para a

maturidade institucional brasileira.”

Com as conquistas oriundas da Constituição Federal de 1988, a referida

Carta Magna passou a ter supremacia normativa acima de todas as demais normas,

de forma que, a mesma passou a irradiar as diretrizes a serem miradas por todos os

outros instrumentos normativos.

De acordo com Barroso128, “[...] a Constituição promoveu uma transição

democrática bem sucedida e assegurou ao país estabilidade institucional mesmo em

momentos de crise aguda.” O direito Constitucional passou então para o ápice das

normas.

Hoje se fala em Direito Civil Constitucional, em Direito Empresarial

Constitucional e outros ramos do Direito que foram constitucionalizados, uma vez

que agora os mesmos seguem os ditames da Constituição Federal de 1988, o que

representou um novo pensamento constitucional voltado a reconhecer a supremacia

axiológica da Constituição.

Durante a Segunda Guerra Mundial, a teoria jurídica era influenciada pelo

Estado Legislativo de Direito, ou seja, valia o que estava positivado, sem se analisar

juízos de valores acerca da aplicação real da justiça ao caso concreto.

O novo direito constitucional pondera as normas à luz de princípios

norteadores que traduzem as situações concretas em conformidade com os

princípios que buscam justamente a efetivação da justiça.

127

BARROSO, Luis Roberto. O Constitucionalismo Democrático no Brasil: Crônica de um Sucesso Imprevisto. Revista Neoconstitucionalismo em Perspectiva. Viçosa: UFG, 2014.p. 28. 128

Ibid., p. 33.

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De acordo com Soares129, um ponto que marca o neoconstitucionalismo é a

frequente utilização de princípios jurídicos embasando processos hermenêuticos e

decisórios conciliando ideias de justiça com exigências de segurança e legalidade.

No Neoconstitucionalismo, o poder emana do povo através de seus

representantes legais e os valores explícitos na nova Constituição são frutos de

reflexões e visão histórica objetivando o aprimoramento de processos de controle do

poder com a finalidade de aprimoramento da convivência social e política.

Assim, observa-se que o Neoconstitucionalismo é fruto de um esforço da

coletividade que abarcou na nova Constituição seus anseios onde a analise legal

deixa de limitar-se à letra morta da lei, mas sim, seu real sentido busca pela justiça,

análise por princípios e alcance da realização dos direitos fundamentais.

Por derradeiro, a Constituição tornou-se a norma superior a todas as demais,

atribuindo poder imperativo a ela sobre os demais institutos, sob pena de sanção.

Deste modo, no constitucionalismo moderno a Nova Constitucional nasceu para

edificar o Estado de Direto.

5 DIREITO A HONRA – BANALIZAÇÃO BILATERAL

5.1 DEMANDAS JUDICIAIS PLEITEANDO DANOS MORAIS

Na busca da garantia do direito à honra, tutelado pela Constituição Federal de

1988 e pelo Código Civil de 2002, o indivíduo que tem referido instituto mitigado

demanda junto ao Poder Judiciário a reparação pelos danos morais feridos por

outrem.

Para tanto, a Justiça deve analisar o caso concreto e tem a tarefa de filtrar o que

realmente é um dano que venha a ferir a honra do indivíduo e o que é um

acontecimento cotidiano. Muitas pessoas, por exemplo, que adentrarem a um metrô

e que se chocam sendo empurradas em meio à multidão agitada que briga por uma

vaga; não se configura dano que venha a ferir a honra e a moral individual, até

porque, todos os que ali se encontram são vítimas da referida conturbação.

129

SOARES, Ricardo Maurício Freire. Elementos da Teoria Geral do Direito. 1ª ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p.247.

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Nessa linha de raciocínio, o magistrado deve fazer um esforço no sentido de

identificar no caso concreto qual a melhor forma de se reparar a honra do indivíduo,

que pode também ser atingida através da calúnia, injúria e difamação, condutas

tipificadas no Código Penal, e no art. 953 do Código Civil de 2002130.

Em conformidade com o que diz Castro131, o bem jurídico honra representa as

qualidades inerentes ao ser humano que definem-no no meio social que o mesmo

ocupa.

Com a possibilidade de reparabilidade pelos danos morais, os indivíduos

adentram ao Poder Judiciário buscando reparação por dano moral nas mínimas

coisas possíveis o que resulta em um inchaço nas demandas judiciais por danos

morais.

Em muitas ações em que conste uma busca legítima por uma reparabilidade por

um dano material, consta-se como pedido acessório a reparação por dano moral,

objetivando-se ganhar uma quantia financeira a mais, o que torna a ação judicial

uma espécie de oportunidade financeira.

Face o exposto, constata-se o dano moral é uma realidade cabendo ao juiz

saber identificar se realmente o dano existe ou é um acontecimento comum e

cotidiano, evitando assim o inchaço de máquina judiciária por demandas

desnecessárias, bem como que o dano moral torne-se uma oportunidade financeira

para pessoas que se aproveitam dessa tutela judicial buscando uma vantagem

monetária.

5.1.1 A honra individual nos acontecimentos cotidianos

Os acontecimentos cotidianos muitas vezes proporcionam situações

desagradáveis aos indivíduos não apenas fisicamente como também verbalmente. O

excesso de demandas do dia a dia fruto da facilidade de informações em um mundo

globalizado e que avança em tecnologias constantemente contribui para o

acentuado aumento de estresse bem como uma luta constante contra o tempo.

130

“CCB – 2002 - Art. 953 – A indenização por injúria, difamação ou calúnia consistirá na reparação

do dano que delas resulte o ofendido. Parágrafo único. Se o ofendido não puder provar prejuízo material, caberá ao juiz fixar, equitativamente, o valor da indenização, na conformidade das circunstâncias do caso”. 131 CASTRO, Mônica Neves Aguiar da Silva. Honra, Imagem, Vida Privada e Intimidade, em Colisão com Outros Direitos. 1ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p.05.

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A velocidade de informações, a facilidade de comunicações proporcionando

mais reuniões de trabalho, o trânsito congestionado, a exigência crescente de

capacitação intelectual para galgar melhores postos profissionais, todos esse

acontecimentos colaboram para criar um ser humano mais tenso e propenso a

desaguar sua ansiedade com o mínimo aborrecimento.

Na visão de Moraes132, os danos a terceiros podem ser provenientes do

desenvolvimento das atividades cotidianas. Em muito casos, as pessoas são vítimas

de pisadas nos pés, a exemplo de quem transita em transportes coletivos, ou

mesmo empurrões.

Não somente na esfera física, mas as pessoas também sofrem determinadas

agressões verbais fruto do estresse cotidiano ou mesmo interpreta determinadas

palavras de outrem equivocadamente de maneira a se sentir ofendido, e é nesse

contexto que surgem as demandas por danos morais, cabendo ao magistrado

diferenciar o que é um direito à honra ferida ou um mero acontecimento cotidiano.

De acordo com Passos133, o homem é uma criatura incompleta que necessita

de aceitação social para ter sua realização pessoal, necessitando assim da

aprovação dos outros para se sentir inédito ou irrepetível.

De acordo com Moraes134, é preciso saber identificar o que realmente vem a ser

um dano moral, situações essas que venham a extremar os atributos intrínsecos da

pessoa humana que devem ser protegidos pelo direito.

Ou seja, não é qualquer acontecimento desagradável da vida que pode ser

tipificado como um dano moral. Faz-se necessário que a integridade moral do

individuo seja maculada de forma a trazer-lhe um transtorno de ordem psíquica ou

material que seja representativo para o indivíduo em seu âmbito introspectivo ou na

coletividade na qual o mesmo está inserido, conforme elucida Ferreira135.

132 MORAES, Maria Celina Bodin de. Danos à Pessoa Humana: Uma Leitura Civil-Constitucional dos Danos Morais. 1ª ed. Rio de Janeiro: Editora Renovar, 2003, p.175. 133 PASSOS, José Joaquim Calmon de. Direito, Poder, Justiça e Processo. Rio e Janeiro: Forense, 2000, p.41. 134 MORAES, Maria Celina Bodin de. Danos à Pessoa Humana: Uma Leitura Civil-Constitucional dos Danos Morais. 1ª ed. Rio de Janeiro: Editora Renovar, 2003, p.72. 135 “Pode-se perceber que como o instituto do dano moral tornou – se algo tão conhecido da população e está tão ligado ao cotidiano das pessoas que acaba se confundindo com um mero dissabor, um aborrecimento. Um mero dissabor não tem condão de gerar uma indenização por danos morais, pois se trata de situações que o cidadão esta sujeito a passar em seu dia a dia. Para ensejar uma indenização por

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Ocorre que no seu dia a dia, devido à quantidade de responsabilidades as quais

o indivíduo está sujeito, o mesmo não se predispõe a sofrer qualquer tipo de

dissabor, de forma que, ser atingido pelo mínimo aborrecimento, mesmo que seja

uma situação mais simples possível que cause um mero dissabor, faz com que ele

se sinta vítima de um dano moral, como bem deixa claro Ferreira136.

Nesse sentido, buscou-se inserir a possibilidade de demanda por ressarcimento

por danos morais com base no conceito de piunitive damages oriundo das

experiências norte-americanas, de acordo com Frota137, objetivando fugir da

impossibilidade de ressarcir o dano não material, todavia, esclarecendo que os

danos morais fogem aos acontecimentos de menor potencial ofensivo.

Assim, tem-se que o dano de ordem moral deve ser reparado, mas com uma

finalidade não de vingança, como era a lei do talião: “olho por olho dente por dente”,

mas visando aplacar o sentimento de vingança do indivíduo e trazer-lhe um lenitivo

capaz de traduzir a ele que atos que ofendem a honra são punidos com a finalidade

de manter a ordem no convívio social e preservar a dignidade humana. Conforme

elucida Reis138.

Nesse prisma, tem-se que a tarefa de identificar se no caso concreto existe ou

não uma situação que enseje reparação por dano moral não é fácil; o julgador não

só tem que se ater ao caso concreto, como também buscar fundamentação legal e

danos morais é necessário uma dor intensa, um vexame, um sofrimento ou uma humilhação que foge à normalidade, interferindo no comportamento psicológico do indivíduo. Logo, não é qualquer caso que se enquadra como dano moral”. Aprofundar em FERREIRA, Thiago Soares. A Banalização do Dano Moral. Monografia apresentada à Universidade Católica de Brasília. Brasília: Universidade Católica de Brasília, 2012.ps. 45-47”. 136 “Para que possamos entender, um mero dissabor, um aborrecimento são situações que qualquer

indivíduo está sujeito a passar em seu dia a dia e que acaba sendo confundindo com uma dor, (raiva, decepção e etc..) e que acaba se parecendo com o conceito de dano moral”. Aprofundar em FERREIRA, Thiago Soares. A Banalização do Dano Moral. Monografia apresentada à Universidade Católica de Brasília. Brasília: Universidade Católica de Brasília, 2012.p. 48”. 137 “A grande preocupação em inserir legalmente o caráter punitivo aos danos extrapatrimoniais

advém da experiência norte-americana, pois a ausência de critérios definidos para o arbitramento do dano, bem como o profundo conhecimento de suas consequências para sociedade, causam perplexidade, tendo em vista o conceito de dano punitivo (punitive damages)”. Avançar os estudos em FROTA, Pablo Malheiros da Cunha. Danos Morais e a Pessoa Jurídica. 1ª ed. São Paulo: Editora Método, 2008. p. 216. 138 “A função da indenização deve, no nosso modo de entender, constituir não um procedimento de

vingança privada e voluntária, mas uma forma de reparar e aplacar o sentimento de vingança nas pessoas lesionadas” para maior aprofundamento ver REIS, Clayton. Os Novos Rumos da Indenização Por Dano Moral. 1ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p.130.

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verificar se existem empecilhos capazes de trazer confusão. Na visão de Passos139

contratempos que ocorrem e tiram o direcionamento de nossas vidas acabam sendo

uma espécie de dano que precisa ser reparado140.

Desta forma, observa-se que na esfera individual, por exemplo, é difícil

identificar se o indivíduo foi ofendido na sua honra subjetiva, pois em determinados

contextos algo que para algumas culturas ou países pode ser tido como ofensivo

para outros pode não ser.

Na esfera legal, tem-se o exemplo trazido por Schreiber, explícito no Código

Civil, que e o caso da ingratidão traduzida pela injúria grave ou calúnia, que são

capazes de revogar a sucessão hereditária141.

Outra peculiaridade que deve ser considerada é se o dano sofrido pelo indivíduo

foi capaz de causar alterações na vida do mesmo, bem como se houve algum tipo

de sofrimento, pois se assim não ocorreu, haverá ali a identificação de um dissabor

cotidiano ao qual todos são vitimas no seu dia a dia.

Como diz Ferreira142, os meios de comunicação acabam por influenciar as

pessoas de que qualquer probleminha pode ser objeto de uma ação por danos

morais, o que acaba por desvalorizar esse instituto que não deve ser utilizado dessa

maneira, percebendo-se se de fato houve o dano, qual alteração aquele dano trouxe

a vida do indivíduo, o nível de sofrimento entre outras características.

Outro ponto importante é o que diz respeito a inscrição irregular no cadastro de

proteção ao crédito, se o indivíduo já tiver sido cadastrado em outra situação, novo

139 PASSOS, José Joaquim Calmon de. Direito, Poder, Justiça e Processo. Rio e Janeiro: Forense, 2000, p.11. 140 “Os contratempos derivados do conserto do carro objeto de colisão, por exemplo, mesmo que sejam pagas as despesas com a utilização de outro veículo, nosso quotidiano foi perturbado e algum desconforto ocorreu que jamais teria ocorrido não fosse aquele ato causador do dano.” 141 “O Código Civil cuida ainda, com especial atenção, de algumas repercussões patrimoniais da violação à honra. Como já se adiantou, a codificação autoriza a revogação por ingratidão da doação por parte do doador se o donatário “o injuriou gravemente ou o caluniou” (art. 557, III), ou, ainda, se praticou tal ofensa em face do “cônjuge, ascendente, descendente, ainda que adotivo, ou irmão do doador” (art. 558). Na mesma direção, o art. 1.814 chega ao ponto de eleger a violação à honra como causa de exclusão da sucessão hereditária, nos seguintes termos: “Art. 1.814. São excluídos da sucessão os herdeiros ou legatários: [...] II - que houverem acusado caluniosamente em juízo o autor da herança ou incorrerem em crime contra a sua honra, ou de seu cônjuge ou companheiro [...]”. Para saber mais ler SCHEREIBER, Anderson. Direitos da Personalidade. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2013. p.77. 142 FERREIRA, Thiago Soares. A Banalização do Dano Moral. Monografia apresentada à Universidade Católica de Brasília. Brasília: Universidade Católica de Brasília, 2012, p.51.

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cadastro não cria a possibilidade de reparação por dano moral, é o que elucida a

súmula 385 do STJ, todavia, ressalva-se o direito de busca por cancelamento justo.

Mais um exemplo sobre o tema é o que reza a súmula 370 do STJ que deixa

claro que a apresentação de cheque pré-datado antecipadamente caracteriza sim

um dano moral.

Nessa tarefa de identificação da existência ou não de um dano moral a ser

reparado, o magistrado defronta-se com necessidade de identificação da existência

ou não de oportunistas que objetivam na ação judicial, ter uma satisfação financeira,

tirando uma quantia que não deveria ser objeto da ação para aumentar seus ganhos

financeiros com aquela ação que busca um ressarcimento por um dano moral,

conforme será explicitado a seguir.

5.1.2 Processos judiciais: uma oportunidade financeira ou a busca pela justiça

Muitas demandas são ajuizadas no Poder Judiciário pleiteando indenização por

danos morais, e na verdade, algumas delas não passam de acontecimentos

cotidianos que fazem parte dos dissabores normais.

Todavia, existem também pessoas que, de má fé, adentram com um pedido de

reparação por dano moral junto à justiça objetivando ganhar uma quantia a mais

além do que está de fato sendo objeto da ação.

Por exemplo, um dano de ordem material que não causou um dano moral, mas

que pleiteia-se o segundo em função de um ganho a mais no resultado financeiro da

ação.

Ou ainda, existem aqueles que adentram com um pleito único e específico por

danos morais sem que esse sequer tenha existido. Nesse sentido, cabe ao juiz

analisar especificamente o caso concreto para verificar se o dano moral ocorreu e

avaliar a indenização justa refutando as tentativas de ganhos exorbitantes.

Na visão de Passos143 pode ser comparado a um negócio no qual uma das

partes tem uma lucratividade (aquele que sofreu o dano) e a outra parte (o ofensor)

é quem paga pelo dano e pelo prejuízo que acaba por ter financeiramente, tendo

143 PASSOS, José Joaquim Calmon de. Direito, Poder, Justiça e Processo. Rio e Janeiro: Forense, 2000, p.13.

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que sair dessa negociação mercadológica, mas o advogado sempre tem o seu

quinhão financeiro garantido144.

Já na ótica de Byington145, muitos advogados sequer estão preocupados pela

busca da justiça, mas sim única e exclusivamente com seus honorários, às vezes

mesmo sabendo que o seu cliente é culpado146.

Nessa esteira, como a legislação civil pátria não trás critérios específicos para

indenização, o magistrado tende a buscar arbitrar a quantia a ser paga a título de

dano moral, como bem explica Tartuce147, que afirma que mesmo não especificado

no Código Civil de 2002 os critérios para quantificação, bem como indenização, a

doutrina e jurisprudência não são unânimes no que tange aos critérios que devem

ser utilizados, sabendo-se apenas que o magistrado deve-se utilizar do arbitramento.

Desta forma, quanto aos critérios mais utilizados para indenização pelo dano

moral, tem-se o arbitramento, que é o mais comum em nosso país, mas também

existe o método de tarifação, através do qual existe um tabelamento pelo dano

causado, todavia, não é esse o critério predominante no Brasil. A súmula 281 do

STJ reforça esse entendimento “a indenização por dano moral não está sujeita à

tarifação”.

Na busca da aplicação justa de um quantum indenizatório, o juiz deve ter o

cuidado não somente de analisar o lado daquele que sofreu o dano, que não pode

receber um “prêmio de loteria” pelo dano sofrido, mas também o lado do ofensor,

144 “A honra, no mundo capitalista, também tem uma valor de mercado. Se não vale a lei da oferta e

da procura, vale a lei do desencoraja e enriquece. O ofendido precisa lucrar com a ofensa e o ofensor estimar que o preço pago convida-o a sair do mercado, porque não compensador o negócio. Não me parece justo, entretanto, que o ganho do ofendido seja tão estimulante que ele se sinta tentado a explorar esse rendoso negócio. Sem esquecer o sócio de ambos os contendores, o advogado, sempre beneficiado com uma parcela não muito desprezível do resultado obtido, resultado esse impossível de ser alcançado sem que entre na cena um terceiro personagem também suspeito – o magistrado”. 145 BYINGTON, Carlos Amadeu Botelho. A Moral, a Lei, a Ética e a Religiosidade na Filosofia, no Direito e na Psicologia. Palestra proferida no II Encontro “Ética para o Juiz – Um Olhar Externo”. Evento da Corregedoria do Tribunal de Justiça de São Paulo. Escola Paulista de Magistratura, São Paulo, 22 de novembro de 2013. Disponível em <http://www.carlosbyington.com.br/site/wp-content/themes/drcarlosbyington/PDF/pt/A_Moral,_a_Lei,_a_Etica_e_a_Religiosidade_na_Filosofia,_no_Direito.pdf> . Acesso em: 17 nov. 2016, p.06. 146

Nesses casos, esses profissionais do Direito frequentemente usam sua inteligência e o seu conhecimento para descobrir falhas formais que, ou invalidem os processos, ou os prorroguem indefinidamente. Trabalham dentro da moralidade das leis, para encobrir o delito, ferindo frontalmente a Ética. 147 TARTUCE, Flávio. Direito Civil – Direito das Obrigações e Responsabilidade Civil. 7ª ed. São Paulo: Método, 2012, p.408.

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que não pode sofrer um quanto indenizatório capaz de leva-lo à falência total, como

diz Santana148.

Nesse diapasão, utiliza-se em nosso país o critério de arbitramento através do

qual o juiz pondera sobre o fato cometido e o dano sofrido analisando o

merecimento da indenização e equalizando um valor que não seja ínfimo a ponto de

estimular o praticante à reincidência, mas também não tão alto que não o leve a

falência; já do lado de quem sofreu o dano o arbitramento deve realmente dar a ele

a sensação de alívio pelo dano sofrido, mas também não pode lhe causar um

enriquecimento descomunal.

Desta forma, evita-se que se oportunize a demanda por dano moral como forma

de um ganho financeiro superior ao dano que realmente foi sofrido por aquele

vitimado em sua honra sem alijar a ação de dano moral que visa uma reparação.

Mesmo sendo o arbitramento o parâmetro mais utilizado em nosso país, existe

também o parâmetro tarifado, no qual os valores são mais ou menos tabelados e os

processos acabam por serem analisados de forma fria, sem verificar-se a existência

de uma análise subjetiva na qual pondera-se sobre o sentimento daquele que foi

ofendido, simplesmente enquadrando a pessoa que fora vítima do dano em

determinada tarifação.

Por fim, Schreiber afirma que a inibição por demandas por danos morais

objetivando uma oportunidade financeira e a justiça no caso em concreto, faz-se

também por uma reparação que não enseje necessariamente um valor monetário, a

exemplo daquele que é ofendido e que pode receber do ofensor um pedido de

desculpas em público como forma de “lavar a sua honra” mitigada149.

148 “A atuação do juiz dirige-se a encontrar uma quantia que não seja ínfima, simbólica, que não represente uma mera censura judicial, ou reduzida a ponto de desmerecer a relevante natureza jurídica do bem da vida violado (direitos da personalidade). Por outro lado, o juiz não pode estabelecer um valor para o dano moral que represente um enriquecimento ilícito da vítima, um injustificado aumento patrimonial, ou corresponda a um montante desproporcional à condição econômica do ofensor, fato capaz de levá-lo à ruína”. Para complementar leitura ver SANTANA, Héctor Valverde. A fixação do valor da indenização por dano moral. Revista de Informação Legislativa. Brasília a. 44 n. 175 jul./set. 2007. p.27.

149 “À parte a indenização monetária, o dano moral pode ser compensado também de modo não pecuniário, caso isso atenda ao interesse da vítima. Tome-se como exemplo a situação do empregado que, humilhado pelo empregador no ambiente de trabalho, decide promover ação judicial com o legítimo propósito de ver reparado o dano que sofreu em sua honra. É certo que a atribuição de um valor financeiro tem efeito benéfico sobre a vítima, mas compensação ainda mais ampla pode ser alcançada, além da indenização em dinheiro, se o empregador for condenado, por exemplo, a

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5.1.3 Excesso de demandas judiciais acerca de danos morais

O número de demandas judiciais por danos morais tem aumentado não só pelo

fato de que o indivíduo não aceita ser atingido de forma alguma e para ele tudo é um

dano que fere sua honra, mas também por outros fatores.

Na visão de Ferreira150, alguns fatores que colaboram para o crescimento das

demandas por danos morais estão ligados à assistência gratuita da justiça, a lei dos

juizados especiais (nº 9.099/95)151 e a falta de conhecimento da população da

função pedagógica e punitiva do dano moral.

Com a gratuidade judicial, as pessoas adentram com o pleito de dano moral

sabendo que não haverá ônus na busca de um suposto direito, que na verdade pode

ser ilegítimo, e se a ação não for provida, nada se perde, de forma que, se houvesse

consequências, somente quem de fato sofreu um dano moral iria até o fim arcando

com os custos da ação em busca de um direito legítimo.

Nesse prisma, tem-se que o instituto acaba sendo banalizado, pois o juiz em

alguns casos erra na hora de julgar, e favorece a quem não tinha um direito legítimo

a ser pleiteado.

Desta forma, de acordo com Ferreira152, isso acaba por abarrotar a máquina

judiciária de processos tornando-a cada vez mais lenta e a justiça que deveria ser

feita em tempo justo, acaba sendo postergada, quando não executada, face a pleitos

temerários.

Diz o mencionado autor que este grande número de ações ajuizadas tem gerado

um aumento significativo na quantidade de processo em tramitação no judiciário,

elevando o numero de serviço, causando lentidão nos serviço prestado pelo

judiciário brasileiro.

Desta forma, o juiz não deve se enganar em sua análise, buscando visualizar a

existência ou não do dano, mensurando o quanto a ser pago em função da extensão

afixar no espaço de trabalho pedidos públicos de desculpas ao ofendido”. Ver também em SCHEREIBER, Anderson. Direitos da Personalidade. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2013. p. 18. 150 FERREIRA, Thiago Soares. A Banalização do Dano Moral. Monografia apresentada à Universidade Católica de Brasília. Brasília: Universidade Católica de Brasília, 2012, p.46. 151 “A lei 9.099/95 em seu artigo 54 abarca mais um princípio de relevante importância a ser

observado, para se atingir os fins almejados pela lei, o da gratuidade no primeiro grau de jurisdição.” 152 Ibid.

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do mesmo. De acordo com Tartuce153, alguns fatores importantes devem ser

ponderados na analise do magistrado154.

O juiz deve atentar para o quanto a ser indenizado, avaliando a repercussão do

dano e, principalmente, a condição financeira do ofensor, a exemplo, se um ator de

um filme estrangeiro que ganha milhões e tem uma imensa propriedade mundo

afora cometer uma lesão à honra alheia, este não terá nenhum problema em pagar

uma indenização por danos morais em uma quantia, por exemplo, de R$2.000,00. É

um valor insignificante para ele, assim, como saberá que será penalizado desta

forma, reincidirá, tornando a lei ineficaz.

Faz-se necessário, acrescentar que na sua análise o juiz não necessariamente

precisa identificar a existência de um dano material para poder fixar a indenização

por dano moral, que pode ser exclusivo, conforme elucida Schreiber155: “O dano

moral poderá ser fixado equitativamente pelo juiz, independentemente de existir

prova do dano patrimonial ou o dano patrimonial em si”. Quanto a isso, não há

qualquer dúvida.

Por derradeiro, é pertinente deixar claro que mesmo facilitando o aumento

quantitativo de processos por danos morais na justiça brasileira, a garantia da

assistência gratuita aos processos é um direito, que assegura àqueles que não têm

condições financeiras para arcar com os custos de uma causa, ao acesso à justiça.

Conforme deixa claro Ferreira156.

153 TARTUCE, Flávio. Direito Civil – Direito das Obrigações e Responsabilidade Civil. 7ª ed. São Paulo: Método, 2012, p.409. 154 “[...] na esteira da melhor doutrina e jurisprudência, na fixação da indenização por danos morais, o magistrado deve agir com equidade, analisando: a) a extensão do dano; b) as condições socioeconômicas e culturais dos envolvidos; c) as condições psicológicas das partes; d) o grau de culpa do agente, de terceiro ou da vitima”. 155 SCHEREIBER, Anderson. Direitos da Personalidade. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2013, p.75. 156 Além disso, é o mandamento constitucional do artigo 5º, inciso LXXIV, ao dispor que “o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de fundos”. Regra constitucional que, sem dúvida, coopera sobremaneira para o acesso da população ao Judiciário, contribuindo ainda, para a atuação do princípio da igualdade, ao facilitar o alcance de classes menos favorecidas ao Judiciário, para fazer valer os seus direitos. Nos termos do artigo 2º desta lei, fará jus ao benefício “todo aquele cuja situação econômica não lhe permita pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo do sustento próprio ou da família”. Para maior aprofundamento ver FERREIRA, Thiago Soares. A Banalização do Dano Moral. Monografia apresentada à Universidade Católica de Brasília. Brasília: Universidade Católica de Brasília, 2012, p.50.

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Desta forma, a conscientização do papel educativo das penas deve ser avaliado

e não buscar sempre uma reparabilidade financeira nas causas por danos morais, o

que requer uma mudança cultural daqueles que adentram às portas da justiça.

5.2 PANORAMA DO PODER JUDICIÁRIO BRASILEIRO

Com o excesso de demandas por danos morais de forma desarrazoada, o

Judiciário acaba enxergando referidas demandas de maneira comum sem dar a

importância que o assunto realmente merece, isso se dá não somente pelo fato de

pessoas demandarem algo que não têm direito com a intenção de um ganho

financeiro extra, mas também pela desmotivação de alguns funcionários públicos e

muitas vezes sua falta de capacitação.

Com o passar dos tempos, mais pessoas tem adentrado ao Poder Judiciário e

essa demanda crescente não acompanha o crescimento da prestação jurisdicional,

que além de morosa, acaba por ter funcionários desmotivados para execução dos

serviços, conforme estudos da PUCRS157.

Outro ponto a ser considerado é que com a Constituição Federal de 1988, várias

conquistas sociais foram garantidas, além de liberdades e o acesso à justiça.

Mesmo com ações intentadas anteriormente à Carta Magna de 1988, os direitos

relativos aos danos morais já possuíam uma perspectiva de garantia, mesmo que de

forma geral.

Nesse sentido, vale ressaltar que o dano moral não é pago, mas sim reparado,

então o magistrado deve ter a devida cautela mesmo com um cenário desfavorável,

com uma maquina pública desmotivada e uma crescente demanda cotidiana de

processos, na análise minuciosa do caso concreto.

Mesmo com todo esse cenário desfavorável, a reparabilidade por danos morais

é um direito que deve ser exercitado por todos os que tiverem sua honra atingida

pleiteando assim seu direito.

157 A pesquisa realizada pela equipe da Administração identificou uma série de problemas com as equipes administrativas nos Tribunais, dentre elas: baixa motivação, falta de perspectiva de carreira, falta de conhecimento em gestão, ausência de programas de qualificação, grande número de estagiários, evasão de servidores, dentre outras”. Para maior aprofundamento ver PUCRS - Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas. Demandas judiciais e morosidade da justiça civil. Porto Alegre: PUCRS, 2011, p.192.

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5.2.1 Visão do Poder judiciário acerca das demandas pleiteando danos morais

O Poder Judiciário lida com questões relativas a danos morais cotidianamente,

algumas legítimas, outras ilegítimas, todavia, objetivando manter um equilíbrio nos

valores sentenciados, ele tem buscado estabelecer uma média dos valores que

devem ser pagos a título de danos morais, o que em muitos casos sequer é

acrescentado ou diminuído pelas cortes superiores, conforme enfatiza Couto e

Silva158.

Desta forma, os valores pagos estão diretamente ligados à análise do caso

concreto, e neste deverá ser definido o quanto de fato deve ser arbitrado pelo

magistrado, todavia, respeitando um valor razoável para garantir a indenização

daquele que sofreu o dano.

O juiz deve sempre ater-se ao caso concreto para fixação desse valor e, além

disso, objetivar restituir a vítima à situação original em que se encontrava, utilizando-

se de um lenitivo para aplacar o sofrimento ocorrido, é o que elucida Schreiber159

citando que o magistrado deve valer-se de meios não pecuniários para alcançar a

mais ampla compensação do dano moral sofrido.

Schreiber160 aponta o exemplo de um caso no qual a imprensa divulgou a

imagem de uma notícia que causou destaque, vinculando-a a outra situação como

se houvesse nexo de uma com a outra objetivando assim ganhar popularidade da

notícia, o que ensejou certamente uma restituição por um claro dano moral, através

da qual a vítima acabou ganhando popularidade pela sua situação particular ser

veiculada com outra de maior porte161.

158 “Na maioria das vezes, o STJ conserva o valor arbitrado pelas instâncias inferiores, ainda que esse valor desvie da recomendação da Corte. Por exemplo, em casos de morte a Seção de Direito Privado do STJ recomenda valores entre 300 e 500 salários mínimos, mas mantém decisões de tribunais locais até 100 salários mínimos acima ou abaixo do recomendado (entre 200 e 600 salários mínimos). Assim, os acórdãos que fixam um novo valor são mais expressivos, pois revelam, com maior rigor, o que o STJ considera razoável”. Aprofundar em COUTO, Igor Costa e SILVA, Isaura Salgado. A quantificação do dano moral segundo o Superior Tribunal de Justiça. Revista Civilistica.com, FAPERJ/PUC RIO: a.2. n.1. 2013, p.10. 159 SCHEREIBER, Anderson. Novos Paradigmas da Responsabilidade Civil: Da Erosão dos Filtros da Reparação à Diluição dos Danos. 5ª ed. São Paulo: Atlas, 2013, p.80. 160 Ibidem, p. 83. 161 “Embaixo da foto do retratado lia-se, em letras menores, a seguinte afirmativa: “Violência voltou a imperar na Rua Duque de Caxias, atrás do prédio da Delegacia de Cabo Frio.” O fato retratado pela divulgação da imagem (a presença do sujeito naquela rua) era verdadeiro, sendo certo que a mesma foto já havia sido utilizada pelo jornal meses antes, sem impugnações, para dar notícia de um incêndio ocorrido naquela rua, evento que, aí sim, guardava relação com o fotografado. Todavia, a nova veiculação da foto em notícia atinente a disputa amorosa causou dano à honra do

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No sopesamento entre a liberdade de imprensa e a honra individual, deve-se

avaliar se existem dados concretos para difusão de determinada notícia que venha a

macular a honra do indivíduo, bem como se a referida notícia é de interesse público

ou não, uma vez que não sendo, certamente não deve ser divulgada.

É o que assevera Schreiber162 acrescentando que a importante tarefa de

informar não pode ser desvirtuada em sua função genuína, para albergar a

publicação de manifestações pejorativas sobre qualquer pessoa, sem a existência

de dados objetivos cuja transmissão possa assumir interesse informativo para o

público daquele veículo de comunicação.

Existem ainda os danos morais cumulados com danos materiais, que segundo

Couto e Silva, tendem a ter valores bastante diferenciados, pois existem várias

hipóteses de danos materiais específicos, inclusive danos de ordem estética163.

Referidos autores citam o REsp 519.258164 relativo à incapacidade relativa de

um jovem que fora acidentado no trânsito no exercício do trabalho, no qual o tribunal

local fixou indenização em 400 salários mínimos por dano moral mais 200 salários

mínimos por dano estético. A Quarta Turma do STJ reduziu para R$ 152.000,00

(366 salários mínimos) por danos morais mais 200 salários mínimos por dano

estético.

Além disso, observa-se no REsp 1.081.432165 o caso de uma criança eu ficou

em estado vegetativo em virtude de afogamento em piscina do condomínio quando

teve o seu cabelo sugado por um ralo de extrema potência na piscina no ano de

1998, de forma que, o tribunal de origem fixou a indenização em R$ 100.000,00 por

danos morais. A Quarta Turma do STJ elevou o valor: R$ 100.000,00 (215 salários

mínimos) por danos morais e R$ 50.000,00 (108 salários mínimos) por danos

estéticos.

retratado e de sua mulher, já que, conforme registrou o TJ/RJ, “quem vê a foto e lê o texto abaixo, naturalmente a relaciona com a nota divulgada que fala da disputa de duas mulheres a bala, sendo a figura do apelado, o pivô da referida disputa”. Em outras palavras, o fato real não pode ser divulgado em conexão com manchete que diz respeito a outro fato, também real, mas que nenhuma relação guarda com o primeiro.” 162

“Aqui, como em outros campos, o direito de informar não pode servir de carta branca para estampar declarações de qualquer tipo, sem uma responsável ponderação entre o interesse social na difusão daquela afirmação e o impacto negativo que pode produzir sobre a honra das pessoas”. 163 COUTO, Igor Costa; SILVA, Isaura Salgado. A quantificação do dano moral segundo o Superior Tribunal de Justiça. Revista Civilistica.com, FAPERJ/PUC RIO: a.2. n.1. 2013. p.13. 164

REsp 519.258 – STJ, 4ª T., REsp 519.258, Rel. Min. Fernando Gonçalves, j. em 06.05.2008. 165

REsp 1.081.432 STJ, 4ª T., REsp 1.081.432, Rel. Min. Carlos Fernando Mathias, j. em 03.03.2009.

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Ou seja, face o exposto fica bem claro que só o caso concreto vai definir sob

qual enfoque o magistrado analisará a causa e definirá qual a posição do Poder

Judiciário frente ao dano moral pleiteado na ação ou mesmo o dano moral cumulado

com um dano material.

5.2.2 Análise de julgados anteriores à Constituição de 1988

Mesmo antes da Constituição Federal de 1988, o ordenamento jurídico pátrio

reconhecia a indenização por danos extrapatrimoniais, é o caso do REsp 232103 SP

que relata um acidente de trem em que a pessoa caiu do veículo ferroviário ficando

inválida.

Mesmo tendo ocorrido em 28 de janeiro de 1983 e negado, em primeira

instância, a parte recorreu e o seu direito a indenização por dano moral foi

reconhecido em segundo grau166.

Nessa esteira, tem-se outro reconhecimento de um dano moral anterior à

Constituição de 1988 com base no REsp 320.462 – SP167, em que se observa um

acidente de ônibus no qual um pai de família falece e a esposa e filho ficam

desamparados, ajuizada a ação de reparação por danos materiais e morais contra a

Viação Transdutra Ltda.

Na primeira instância a parte autora conseguiu o pagamento de pensão

alimentícia, todavia, a Décima Câmara de Férias do Primeiro Tribunal de Alçada Civil

do Estado de São Paulo decidiu que o dano moral era incabível por ser anterior à

Constituição de 1988168.

166 REsp: 232103 SP 1999/0086120-5, Relator: Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR, Data de

Julgamento: 18/11/1999, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJ 17.12.1999 p. 382: RESPONSABILIDADE CIVIL. Dano moral. Fato anterior a 1988. A indenização pelo dano moral pode ser deferida por fato ocorrido antes da Constituição de 1988, pois já antes dela o nosso ordenamento legal admitia a responsabilidade civil do causador de dano extrapatrimonial. Recurso conhecido e provido. 167 REsp 320462 SP 2001/0048993-1, Relator: Ministro BARROS MONTEIRO, Data do julgamento:

15/09/2005, T4 - QUARTA TURMA, Data da Publicação: DJ 24.10.2005 p.327. 168 RESPONSABILIDADE CIVIL Acidente de trânsito Indenização por morte do marido e pai dos autores, passageiro da empresa-ré. Responsabilidade objetiva desta, sendo inócua a apuração da culpa do motorista do ônibus. Pensão corretamente fixada em 2/3 da remuneração auferida pela vítima à época do acidente, como anotado na carteira de trabalho, resguardando o direito de acrescer. Descabimento, por outro lado, do dano moral por ser o evento anterior à CF/88. Agravo retido improvido e apelos parcialmente providos.

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Inconformada a autora da ação recorreu ao STJ que acatou a indenização por

dano moral conforme relatório do Min. Barros Monteiro169.

Por conseguinte, de acordo com o REsp 646154 RJ170, observa-se outro caso

em que o pedido de dano moral ocorreu antes da Constituição de 1988 diante de

falha no pagamento de FGTS.

O relator Min. Humberto Gomes de Barros assevera que o pagamento por danos

morais é cabível mesmo o fato tendo ocorrido 19 anos antes da Constituição Federal

de 1988 porque “A prova do dano moral é desnecessária, bastando a demonstração

do indevido saque do FGTS, para que seja deferida a indenização” cominando

assim na indenização de R$15.000,00.

Nessa esteira, no REsp 512393 SP171 tem-se mais uma caso de fato ocorrido

antes da Constituição Federal de 1988 em que foi reconhecido o pagamento de

indenização por dano moral. Tem-se nessa situação a ocorrência de um dano moral

proveniente da perda de audição de um empregado fruto de acidente de trabalho

oriundo de altos ruídos provocados no ambiente laboral, sendo fixado o pagamento

por danos morais na ordem de R$39.000,00.

169 “O SR. MINISTRO BARROS MONTEIRO (Relator):

1. Prima facie, acha-se satisfeito, no caso, o requisito do prequestionamento, uma vez que a decisão recorrida apreciou às expressas o tema relativo ao dano moral. É suficiente, para o atendimento do aludido pressuposto, que a questão jurídica tenha sido analisada pelo Tribunal de origem, pouco relevando que não tenha sido feita referência, de modo específico, aos preceitos legais posteriormente invocados no apelo especial. 2. A promulgação da Carta Política de 1988 apenas veio reforçar, na ordem jurídica brasileira, a previsão já existente da reparação por dano moral. Encontrava-se a indenização contemplada na regra geral constante do art. 159 do Código Civil de 1916. Daí o verbete sumular n. 37 desta Casa, que não deixa dúvida alguma a respeito: São cumuláveis as indenizações por dano material e dano moral oriundos do mesmo fato. Descabida, pois, a distinção feita pelo acórdão combatido segundo o qual a cumulação por danos material e moral somente era admissível em favor da própria vítima. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é inequívoca a respeito. Quando do julgamento do REsp n. 232.103-SP, relator Ministro Ruy Rosado de Aguiar, esta Quarta Turma decidiu com base na seguinte ementa: RESPONSABILIDADE CIVIL. Dano moral. Fato anterior a 1988. A indenização pelo dano moral pode ser deferido por fato ocorrido antes da Constituição de 1988, pois já antes dela o nosso ordenamento legal admitia a responsabilidade civil do causador de dano extrapatrimonial. Recurso conhecido e provido”. Nesses termos, ao excluir a indenização por dano moral na espécie, o julgado recorrido afrontou a norma inserta no art. 159 do CC/1916”. 170 REsp: 646154 RJ 2004/0033220-6, Relator: Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, Data de Julgamento: 21/11/2006, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 18/12/2006 p. 366. 171 REsp: 512393 SP 2003/0035485-8, Relator: Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO,

Data de Julgamento: 10/04/2007, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 27/08/2007 p. 220.

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Face a todo exposto, observa-se que mesmo que o direito a indenização por

danos morais tenha sido explicitado na Constituição Federal de 1988, o

reconhecimento do mesmo era reconhecido em julgados conforme elencado

anteriormente, com base na regra geral constante do art. 159 do Código Civil de

1916: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência,

violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano”.

5.2.3 Visão jurisprudencial nos tempos atuais

Com as decisões dos Tribunais tomadas reiteradamente acerca de determinado

tema cria-se a jurisprudência e, no caso dos danos morais, observa-se que os

indivíduos demandam junto ao Poder Judiciário pleiteando não necessariamente a

justiça, mas em muitos casos, objetiva-se ascender uma querela às vezes de cunho

político ou simplesmente um ganho financeiro, conforme estudos da PUCRS172.

Na análise dos Tribunais, a honra deve ser preservada, é o que observa-se no

REsp 1.025.047/SP173, no qual um político é acusado durante CPI de engravidar

uma adolescente, o que se comprovada, através de exame de DNA, má-fé e

falsidade na acusação, é passível de indenização por um dano moral, conforme

elucida Schreiber174.

Mesmo que as figuras públicas devam suportar o ônus de seu próprio sucesso e

uma vez enveredando pela carreira de político sabe-se que seu nome pode ser

ventilado em ataques perante o público, não é aceitável que sejam aceitas

acusações falsas objetivando macular a imagem do político, ferindo-lhe moralmente,

o que é passível de uma punição por crime contra honra.

Outro tema enfrentado pelos tribunais é a questão de atribuírem em público a

suspeita de um crime a determinado indivíduo, o que gera na opinião pública uma

172 “O comportamento identificado nas pesquisas de campo realizadas pelos sociólogos especialmente, tornou possível verificar que os indivíduos – pessoas físicas e jurídicas – utilizam-se do Judiciário, muitas vezes, de forma alternativa (que não na busca da efetiva prestação

jurisdicional), de acordo com seus interesses”. Para aprofundar ver PUCRS - Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas. Demandas judiciais e morosidade da justiça civil. Porto Alegre: PUCRS, 2011 pag. 188 173 REsp: 1.025.047/SP SP 2008/0016673-2, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de

Julgamento : 26/06/2008, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 05/08/2008 174 SCHEREIBER, Anderson. Novos Paradigmas da Responsabilidade Civil: Da Erosão dos Filtros da Reparação à Diluição dos Danos. 5ª ed. São Paulo: Atlas, 2013, p.80.

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tendência a identificar o suspeito como efetivamente praticante do ato criminoso,

agredindo assim a reputação da pessoa.

É o caso do REsp 984.803/ES175 que é, conforme Schreiber176, é um tema

bastante espinhoso, pois visualiza-se mais uma caso de confronto entre os direitos a

liberdade de informação e honra. Por um lado observa-se a necessidade de

informação à sociedade de assunto de seu interesse, todavia, com essa mera

acusação o público tende a discriminar a pessoa socialmente já o julgando como

culpado.

No julgamento, entendeu-se que a imprensa deve resguardar com os devidos

cuidados a imagem daquele que é acusado e, como houve os cuidados e diligências

necessárias, o recurso foi provido em favor da Globo Comunicações Participações

Ltda.

Nesse conflito entre liberdade de imprensa e direito a honra, observa-se no voto

da Ministra Nancy Andrighi (pag. 6) que a solução da lide não se dá pela negação de

um desses dois direitos, mas sim, coma busca do ponto de equilíbrio entre os dois

direitos para que possam os mesmos conviverem de forma harmonizadora evitando

excessos.

Além disso, tem-se o direito de resposta que é garantido pela Constituição

Federal em seu art. 5º, V, e que deve ser proporcionado na mesma intensidade do

dano que fora provocado. Ou seja, se insulto alguém em um meio televisivo com

alcance nacional, não posso garantir o direito de resposta ao ofendido em uma rádio

local cujo público seja bastante restrito, deixando todo o resto do país de ter acesso

ao referido veículo transmissivo. É o que deixa claro Schreiber em suas lições177.

Quanto aos valores pagos por ofensa a honra, a jurisprudência tem entendido

que vítimas com maior poder aquisitivo tendem a receber valores maiores a título de

175 REsp: 984.803/ES: 2007/0209936-1, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento :

26/05/2009, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 19/08/2009. p. 223. 176 SCHEREIBER, Anderson. Novos Paradigmas da Responsabilidade Civil: Da Erosão dos Filtros da Reparação à Diluição dos Danos. 5ª ed. São Paulo: Atlas, 2013, p.84. 177 “

Outro instrumento importante é o direito de resposta, que consiste na faculdade de replicar ou retificar matéria publicada. O próprio Supremo Tribunal Federal, na decisão que fulminou a Lei de Imprensa, ressalvou o direito de resposta, derivado do art. 5º, V da Constituição da República, norma “de eficácia plena e aplicabilidade imediata”. A resposta deve se dar, no mínimo, a mesma visibilidade e destaque da matéria difamatória, repelindo-se com veemência a técnica maliciosa de errar em letras garrafais e corrigir em notas miúdas”. Para maior aprofundamento ver SCHEREIBER, Anderson. Direitos da Personalidade. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2013.p. 80.

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danos morais, todavia, o magistrado deve cautelar-se em seu julgamento para não

criar uma situação que venha a configurar um enriquecimento ilícito fruto de sua

sentença, conforme explicitam Couto e Silva178 mencionando REsp 959.780 ES179

com relatoria do Ministro Paulo De Tarso Sanseverino180.

Nesse prisma, Bastos181 acrescenta o exemplo REsp-222522/MA182 que reflete

decisão do STJ no sentido de minorar o valor arbitrado para pagamento de dano

moral constatado183.

Desta forma, a Corte Superior tem analisado de maneira bastante criteriosa as

questões relativas a danos morais, buscando verificar a origem dos mesmos bem

como o quantum deve ser pago pelo mesmo, considerando a condição social da

vitima e do autor e ao mesmo tempo analisando as condições que causaram o dano

para poder arbitrar o que, de fato, deve ser pago como lenitivo ao prejuízo causado.

178COUTO, Igor Costa e SILVA, Isaura Salgado. A quantificação do dano moral segundo o Superior Tribunal de Justiça. Revista Civilistica.com, FAPERJ/PUC RIO: a.2. n.1. 2013 , p. 07. 179 REsp: 959.780/ES: 2007/0055491-9, Relator: Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, Data de Julgamento: 26/04/2011, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 06/05/2011. 180 “Vítimas com alto poder aquisitivo ou relevância política tendem a receber valores maiores a título

de compensação, ao passo que vítimas de menor padrão socioeconômico recebem quantias menores. Cabe reproduzir mais uma explicação do Ministro Paulo de Tarso Sanseverino: “As condições pessoais da vítima constituem também circunstâncias relevantes, podendo o juiz valorar a sua posição social, política e econômica. A valoração da situação econômica do ofendido constitui matéria controvertida, pois parte da doutrina e da jurisprudência entende que se deve evitar que uma indenização elevada conduza a um enriquecimento injustificado, aparecendo como um prêmio ao ofendido. O juiz, ao valorar a posição social e política do ofendido, deve ter a mesma cautela para que não ocorra também uma discriminação, em função das condições pessoais da vítima, ensejando que pessoas atingidas pelo mesmo evento danoso recebam indenizações díspares por esse fundamento.” ... Esse arbitramento equitativo será pautado pelo postulado da razoabilidade, transformando o juiz em um montante econômico a agressão a um bem jurídico sem essa natureza. O próprio julgador da demanda indenizatória, na mesma sentença em que aprecia a ocorrência do ato ilícito, deve proceder

ao arbitramento da indenização”. 181 BASTOS Guilherme Augusto Caputo. Danos morais: o conceito, a banalização e a indenização. Revista TST. Brasília, vol. 73, no 2, abr/jun 2007, p.100. 182 REsp: 222522/MA: 2007/0055491-9, Relator: Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, Data de Julgamento: 26/04/2011, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 06/05/2011. 183 “[...] decisões prolatadas pelo egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão e pelo colendo

Superior Tribunal de Justiça no célebre processo em que o Banco do Brasil S/A foi condenado pelo juízo de origem a pagar a uma vidraçaria indenização no importe de R$ 258.000.000,00 em decorrência da indevida devolução de um cheque em valor equivalente a 3,48 salários mínimos. Tal importância foi reduzida pela egrégia Corte Regional a R$ 145.000,00 e, sucessivamente, a 20

salários mínimos pela colenda Corte”.

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6 BREVE VISÃO DO DANO MORAL EM OUTRAS PERSPECTIVAS

6.1 A EXPERIÊNCIA DOS ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA

A Suprema Corte Americana é citada neste trabalho em função de sua

importância no contexto mundial e pelo fato de muitas de suas decisões servirem de

parâmetro para os julgados de diversos outros países, inclusive o Brasil, de forma

que, observa-se a visão histórica da Suprema Corte Americana e qual o papel que a

mesma exerce no Judiciário Americano.

Muitas das decisões da Suprema Corte Norte-Americana – certamente com

maior frequência e profundidade que as de qualquer outro tribunal – influíram na

história e traçaram novos rumos à vida da sociedade nos Estados Unidos.

Numa visão mais aprofundada, tem-se que as decisões proferidas pela

Suprema Corte acabam por influenciar também na política dos Estados Unidos.

Nesse prisma, observa-se que as decisões de julgados relativos a danos morais

naquele país estão fundamentadas no punitive damage o que será abordado em

seguida.

Por conseguinte tem-se que mesmo pautado no punitive damages existe uma

preocupação muito grande em não se gerar enriquecimento desmensurado à

pessoa lesada fruto da aplicação desse método de punição.

Desta forma, muitas das decisões da Suprema Corte Americana acabam por

influenciar nas decisões do judiciário brasileiro. Nesse prisma, questiona-se acerca

das alternativas adotadas pelo Brasil no que tange às ações por danos morais, se as

mesmas são positivas ou não.

Observa-se também alternativas que podem ser adotadas para poder

amenizar a questão dos danos morais no Brasil, bem como a forma como os

referidos processos são recepcionados pelo judiciário brasileiro buscando uma

administração focada em um planejamento bem como uma reeducação por parte

daqueles que buscam a justiça pleiteando danos morais.

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6.1.1 A Suprema Corte Americana

A criação da Suprema Corte dos Estados Unidos é fruto de uma previsão

expressa na Constituição Federal Americana e a mesma tem sua sede localizada

em Washington nas proximidades do Capitólia184, conforme enfatiza Moraes185.

Contudo, a mesma ocupou a sede do Capitólia por um bom período e

somente no século XIX passou a ter sua sede própria a partir de 1935, é o que deixa

claro Baum186 quando em suas lições informa que a referida Corte reunia-se

anteriormente no Royal Exchange Building, em Nova York, e, depois, no Old City

Hall, na Filadélfia mudando-se para Washinton com o resto do Governo Federal no

início do século XIX. Nos 130 anos seguintes, ocupou vários lugares no Capitólio,

como “inquilina” do Congresso e somente no ano de 1860, obteve uma sede

“permanente” no antigo local do Senado no Capitólio.

No que tange à nomeação de seus juízes, compete ao Presidente da

República essa função, todavia, é o Senado Federal quem confirma a referida

nomeação. Nesse processo, conforme enfatiza Moraes187, “não existe uma

exigência de capacitação para o referido magistrado e a escolha é de cunho

totalmente político”.

Quanto ao número de juízes, a composição da Suprema Corte é formada por

nove juízes sendo um deles o Chief Justice, que é quem preside a Corte, sendo o

mesmo escolhido pelo Presidente da República e sem um mandato com prazo

determinado, é o que elucida Barbosa Moreira188 em seus ensinamentos189.

184

“O Art. III da Constituição dos Estados Unidos da América prevê em sua seção 1 que o Poder Judiciário será investido em uma Suprema Corte e nos tribunais inferiores que forem oportunamente estabelecidos por determinação do Congresso. A Suprema Corte tem sede em Washington, reunindo-se anualmente durante um período que começa na primeira segunda-feira de outubro e dura normalmente até o início de junho, ocupando prédio próprio desde 1935, em um quarteirão inteiro no lado oposto ao Capitólia”. 185

MORAES, Alexandre de. Jurisdição Constitucional: Breves Notas Comparativas sobre a Estrutura do Supremo Tribunal Federal e a Corte Suprema Norte-Americana. Cadernos de Direito: Cadernos do Curso de Mestrado em Direito da Universidade Metodista de Piracicaba. Controle de Constitucionalidade. V.5 n 8-9, jan a dez/2005. São Paulo: 2005, p. 28. 186

BAUM, Lawrence. A Suprema Corte Americana: Uma análise da mais notória e respeitada instituição judiciária do mundo contemporâneo. Rio de Janeiro: Forense, 1987.p. 28. 187

MORAES, op. cit., p. 12. 188

BARBOSA MOREIRA, José Carlos. A Suprema Corte Norte-Americana: um modelo para o mundo? Revista Brasileira de Direito Comparado. N 26. Rio de Janeiro: Instituto de Direito Comparado Luso-Brasileiro, 2004, p. 35.

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Contudo, nem sempre foi este o número estabelecido de juízes que

compunham a Suprema Corte, uma vez que, desde 1789 o referido número sofreu

diversas modificações ficando a cargo do Código Judicial Federal de 1869

estabelecer o número atual de membros da Suprema Corte Americana, assim, tem-

se que por não ser um número fixado na Carta Constitucional Americana, essas

modificações simbolizaram uma fragilidade no que tange à facilidade de alteração do

numero de componentes da mesma, conforme elucida Moraes190.

No que se refere ao seu papel, a Suprema Corte é um órgão de eminência

política191 e suas decisões repercutem na política nacional de forma bastante

acentuada, é o que enfatiza Baum192: “através de sua interpretação da Lei, a Corte

Suprema desempenha um papel muito importante no sistema de elaboração de

políticas do Governo Federal”.

Quanto à sua competência a mesma recai sobre certas classes especificadas

de casos como um tribunal de julgamento inicial, o que é chamado de competência

original. Estes casos podem ser levados diretamente à Corte. A competência original

da Corte inclui alguns casos nos quais um Estado é parte, e casos que envolvem

embaixadores.

Em conformidade com sua competência apelatória, a Corte pode julgar casos

levados por partes insatisfeitas com decisões das cortes federais de apelação e das

cortes de apelação especializadas do sistema federal. A Corte pode julgar casos

189

“Compõe-se a Suprema Corte de nove membros, intitulados Justices (o Chief Justice, que a preside, e oito Associate Justices), nomeados pelo Presidente dos Estados Unidos, mediante aprovação do Senado. O Chief Justice não é eleito pelos seus pares, mas designado pelo Presidente dos Estados Unidos, que pode escolhê-lo dentre os próprios membros do tribunal ou nomear pessoa até então estranha a seus quadros. Não há fixação de mandato para o Presidente: salvo o extraordinário caso de impeachment, ele permanece na presidência até que faleça ou se retire da Corte”.

190 MORAES, Alexandre de. Jurisdição Constitucional: Breves Notas Comparativas sobre a Estrutura

do Supremo Tribunal Federal e a Corte Suprema Norte-Americana. Cadernos de Direito: Cadernos do Curso de Mestrado em Direito da Universidade Metodista de Piracicaba. Controle de Constitucionalidade. V.5 n 8-9, jan a dez/2005. São Paulo: 2005. p. 14. 191

“[...] A Corte Suprema é “política” numa variedade de sentidos. A maior parte das pessoas nomeadas para a Corte foi, antes, participante ativa da política e, frequentemente, as nomeações são objeto de considerável disputa política”. Para maior aprofundamento ver em BAUM, Lawrence. A Suprema Corte Americana: Uma análise da mais notória e respeitada instituição judiciária do mundo contemporâneo. Rio de Janeiro: Forense, 1987.p. 12. 192

Ibid., p. 16.

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levados diretamente dos tribunais distritais em certas ocasiões em que uma lei do

Congresso foi declarada inconstitucional, é o que deixa claro Baum193.

Além disso, compete à Suprema Corte o reexame de decisões dos Tribunais

Federais de Segunda Instância, bem como as decisões das Supremas Cortes

Estaduais que tenham decidido matéria federal, conforme elucida Barbosa

Moreira194.

Quanto à composição do judiciário americano, tem-se que aos Estados são

compostos por dois conjuntos de tribunais, um para lidar com questões de direito

civil e penal e o outro para lidar com causas de insignificância maior.

De acordo com Baum195, existe uma importância muito grande para os

Tribunais Federais Distritais, uma vez que existem 94 tribunais distritais nos Estados

Unidos – de um a quatro em cada Estado, juntamente com um tribunal no Distrito de

Columbia e em alguns territórios.

No que tange aos tribunais distritais, estes julgam todos os casos federais ao

nível de julgamento de primeira instância, exceto quanto a algumas classes

especializadas de casos que vão para o Tribunal Tributário, Tribunal de Comércio

Internacional e o Tribunal de Reclamações.

Por derradeiro, visualiza-se que a Suprema Corte Americana é responsável

pelo reexame de demais causas julgadas por instâncias inferiores, é o que deixa

claro Barbosa Moreira196 esclarecendo que a principal via de acesso do litigante à

Suprema Corte é a petition for certiorari, que é o requerimento pelo qual se pleiteia

que a Corte reexamine causa julgada por tribunal inferior.

Tecidas considerações importantes acerca da Suprema Corte Americana,

observa-se a seguir com base em que as ações são julgadas pela mesma, criando-

se, no caso dos danos morais, a figura do Punitive Damagens, que hoje é bastante

utilizado nos julgados Americanos fruto de um direito derivado de um costume

Inglês, conforme será abordado a seguir.

193

Ibid., p. 25. 194

BARBOSA MOREIRA, José Carlos. A Suprema Corte Norte-Americana: um modelo para o mundo? Revista Brasileira de Direito Comparado. N 26. Rio de Janeiro: Instituto de Direito Comparado Luso-Brasileiro, 2004, p. 38. 195

BAUM, op. cit., p. 23. 196

BARBOSA MOREIRA, op. cit., p. 38.

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6.1.2 Punitive Damage

No que diz respeito ao punitive damage, tem-se que o mesmo está

relacionado a uma penalidade além do que é devido pelo prejuízo causado de forma

a desestimular o ofensor a reincidir na ação que provocou o dano moral.

De acordo com Resedá197, constata-se ser uma ideia de vingança devido ao

valor aplicado que pode criar restrições econômicas ao ofensor buscando-se assim

a imposição de uma penalidade, afinal, a ânsia pela sustentação da paz social faz

com que sejam necessários contornos mais agressivos do que aqueles

apresentados pela ideologia do ressarcimento.

De acordo com Bastos198, trata-se de uma indenização com o objetivo de

punir o réu em uma ação civil com um valor suplementar ao que poderia ser

necessário para suprir o agravo recebido, nesse sentido, tem-se que o sentimento

de vingança acaba por ser aplacado com o pagamento da referida quantia.

Acrescente-se que o punitive damage pode ser visto na doutrina americana

por nomes sinônimos199, contudo, o significado é o mesmo. Nesse prisma,

historicamente tem-se que o punitive damage teve suas origens na Inglaterra, fruto

do direito consuetudinário, quando ultrajes eram punidos de forma severa pelo júri.

Conforme exemplifica Resedá200, mesmo sendo constantemente relacionado

a doutrina americana, a Inglaterra foi o berço do punitive damage por volta do século

XVII . A maioria dos doutrinadores aponta o surgimento do instituto a partir do direito

consuetudinário em decisões nas quais o júri buscava punir os ofensores quando

estes agiam valendo-se de malícia, fraude ou opressão.

A doutrina americana traz ainda a figura do exemplary damage que tem por

intuito coibir a repetição do referido ato criminoso por outrem através de penas

197

RESEDÁ, Salomão. A Aplicabilidade do Punitive Damage nas ações de indenização por dano moral no ordenamento jurídico brasileiro. Dissertação de Mestrado apresentada à Universidade Federal da Bahia – UFBA. Salvador: UFBA, 2008, p. 224. 198 BASTOS Guilherme Augusto Caputo. Danos morais: o conceito, a banalização e a indenização. Revista TST. Brasília, vol. 73, no 2, abr/jun 2007, p.89. 199

“Porém, antes disso, também é necessário lembrar que o ordenamento americano apresenta inúmeros sinônimos para o instituto em estudo. “Exemplary damage”, “vindictive damage”, “smart damage” ou até mesmo “smart money” são expressões utilizadas pelos Norte-Americanos como equivalentes ao punitive damage. Não há qualquer diferença entre eles, todos se referem ao mesmo foco”. Ibid., p. 232 200 Ibid., p. 236.

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severas. Na visão de Resedá201 “a indenização punitiva possui também a função de

desestímulo a novas condutas danosas, é o que assevera”.

Outras categorias de imputação aos atos danosos são intituladas como actual

damages, que pode ser chamado de compensatory damages e o nominal damage.

No primeiro caso tem-se uma compensação da vítima de forma a desprezar a

situação do sujeito ativo enquanto que no segundo caso existe uma indenização

simbólica para danos causados em menor potencial. Resedá202 acrescenta a

existência de outras duas categorias: “o general damage e o direct damages ou

necessary damages”203 .

O direito americano tem como base jurídica predominante a utilização do

Common Law, ou seja, o direito fundamentado na jurisprudência, o que é diferente

do direito aplicado no Brasil que é fundamentado principalmente no Civil Law, que é

o direito fundado nos textos legais.

Nesse prisma, tem-se que o punitive damage, segundo Resedá204, ganhou

bastante força, tornando-se uma forte arma contra abusos que atingiam a

coletividade americana, mesmo que implantado a somente aproximadamente 60

anos, tem tido um altíssimo uso nos últimos 30 anos.

Nessa esteira, uma preocupação importante não pode deixar de ser pontuada

no que tange às indenizações milionárias, ou seja, muitas vezes, com o intuito de se

punir severamente com um valor acrescido, objetivando a desestímulo de uma ação,

pode-se enveredar por um caminho onde se estimule o enriquecimento fruto de uma

decisão judicial.

6.1.3 Julgados acerca de Danos Morais nos E.U.A

Feitas as ponderações acerca da importância da Suprema Corte e do modelo

utilizado pela mesma para punir de forma severa através do punitive damage,

201

Ibid., p. 226. 202

Ibid., p. 233. 203

“Também conhecido por direct damages ou necessary damages eles estão diretamente relacionados aos danos desprovidos de valoração econômica. Tais danos, por sua vez, não necessitam de comprovação, bastando apenas a demonstração da existência do comportamento ilícito, ou seja, do nexo causal. São consequências de atos que por si só já possuem uma presunção de prejuízo, como no caso da perda de um ente querido”. 204

RASEDÁ, op. cit., p. 240.

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observa-se através das situações a seguir expostas como se deu a evolução da

aplicação deste instituto em determinados casos relativos a danos morais.

Preliminarmente, visualiza-se que, segundo Resedá205, “os primeiros registros

relativos ao punitive damages datam de 1791” através do caso conhecido como

Coryell v. Colbough. Na referida lide observa-se o não cumprimento de uma

promessa de casamento, ferindo os costumes da época e causando transtornos

emocionais indescritíveis para mulher vitimada. Os jurados decidiram pela aplicação

do pagamento de uma indenização à vítima no intuito de lhe preservar e também

evitar que futuramente outros viessem a ter a referida atitude.

Outro caso marcante, segundo Lanne206, foi travado entre a BMW of North

America vs. Gore (Certiorari to the Supreme Court of Alabama nº 94-896.

Argumentos em 11/10/95 – Decisão em 20/05/96) no qual houve um valor

condenatório a título de punitive damage elevadíssimo, todavia a Suprema Corte

ventilou que mesmo sendo valor exorbitante, seria justificado por ser uma

penalidade imposta pelo Estado a quem descumpre suas leis, baseando-se no

interesse do Estado em proteger sua economia e seus consumidores.

Foi marcante também o julgado acerca do caso conhecido como Ford Pinto

Case que segundo Resedá207, envolveu a empresa automotiva Ford no ano de 1972

quando a condutora do veículo Ford Pinto, Sra. Luly Gray, foi vitimada em acidente

de trânsito em autoestrada indo a óbito, e o passageiro Richard Grimshaw, de treze

anos de idade, sofreu lesões corporais gravíssimas. A empresa sopesou os custos

205 RESEDÁ, Salomão. A Aplicabilidade do Punitive Damage nas ações de indenização por dano moral no ordenamento jurídico brasileiro. Dissertação de Mestrado apresentada à Universidade Federal da Bahia – UFBA. Salvador: UFBA, 2008, p. 241. 206

LANNE, Yuri Nathan da Costa. Indústria do dano moral ou da lesão? uma solução a partir do instituto do punitive damages . ARGUMENTUM. Revista de Direito. n 15. São Paulo: UNIMAR, 2014, p. 177. 207

RESEDÁ, op. cit., p. 243: “No julgamento, ficou provado que, durante testes de colisão, os engenheiros da Ford descobriram que um acidente envolvendo a traseira do veículo poderia facilmente romper o tanque de combustível e provocar incêndio. Ocorre que, conforme também se demonstrou, a linha de produção já se encontrava montada ao tempo desta descoberta. Desse modo, os executivos da empresa preferiram produzir o veículo como originalmente projetado, mesmo sabendo que as intervenções necessárias poderiam evitar danos e salvar milhares de vidas. Um documento interno da própria empresa apresentou estudo envolvendo o custo aproximado das indenizações relacionadas com o defeito de fabricação do veículo; valor este que incluía as mortes e lesões corporais. Da mesma forma, foram levantados os gastos necessários para corrigir o problema a partir de um recall de todos os veículos. O confronto destes dois tópicos possibilitou à empresa chegar à conclusão de que o pagamento das indenizações era muito mais vantajoso do que o aperfeiçoamento necessário para evitar os acidentes.”

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com produção dos veículos já fabricados bem como de possíveis indenizações e,

devido aos segundos serem mais vantajosos optaram por não corrigir o erro.

Ocorreu também no Novo México, de acordo com Schreiber208, uma situação

que ensejou a aplicação do punitive damage em 1992 contra a MC Donald’s, na qual

uma senhora acompanhava o neto e comprou café, só que a bebida derramou sobre

suas pernas e nádegas causando-lhe queimaduras de segundo e terceiro grau. A

vítima, Sra. Liebeck, ficou internada no hospital por sete dias e mais três semanas

em casa em função de sua elevada idade, 76 anos.

Ela entrou em contato por carta com a MC Donald’s informando que a

temperatura do café deveria ser mais baixa e requereu o pagamento de seus custos

hospitalares na monta de US$2,000.00, acrescido do salário que a filha se privou de

receber em seu emprego em função da companhia que prestou a mãe.

A empresa ofereceu somente US$800.00, o que foi rejeitado pela vítima que

adentrou as vias judiciais pleiteando US$100,000.00 por compensatory damage e o

triplo desse valor por punitive damage. Ficou comprovado que a temperatura sendo

menor poderia ter causado um dano menor à vítima e a empresa foi condenada a

indenizar a autora pelo dano sofrido209.

Outra situação emblemática foi travada entre Curtis Publishing Co. v. Buttus,

quando houve publicação de matéria ofensiva à reputação do demandante em 1962.

Segundo Resedá210, o conteúdo da matéria jornalística versava acerca de uma

acusação na qual um jogo de futebol americano entre as Universidades de Alabama

e Georgia tinha sido combinado com participação do diretor esportivo com base em

escutas telefônicas sem quaisquer provas da real existência dos enlances entre as

partes.

Butts estava pleiteando uma ascensão profissional no quadro de funcionários

ligados a esportes e por causa da notícia publicada acabou sendo prejudicado. Os

jurados determinaram o pagamento de US$ 60,000.00 a título de compesatory

208 SCHEREIBER, Anderson. Direitos da Personalidade. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2013, p.19. 209

“Após a apresentação das alegações aos jurados, a Mc Donald’s foi condenada no pagamento da quantia de US$ 200,000.00 a título de danos compensatórios, com redução de 20% em razão da participação da demandante no resultado e US$ 2,7000,000.00 como danos punitivos. O julgador, por sua vez, reduziu a quantia em caráter de danos punitivos para US$540,000.00, calculando-os no triplo do compensatory damage recebido." 210

RESEDÁ, Salomão. A Aplicabilidade do Punitive Damage nas ações de indenização por dano moral no ordenamento jurídico brasileiro. Dissertação de Mestrado apresentada à Universidade Federal da Bahia – UFBA. Salvador: UFBA, 2008, p. 247.

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damage e mais US$ 3.000.000,00 como punitive damage. O tribunal reduziu o total

a ser pago para US$ 460.000,00 através de apelação.

Resedá211 assevera os cuidados que devem ser adotados quanto aos

pagamentos de punitive damages objetivando evitar o que ele chama de

transformação das Cortes em “loterias”, mas esses valores certamente são

ajustados quando apreciados por instâncias superiores não passando assim

despercebidos.

6.2 PERSPECTIVAS PARA AS NOVAS GERAÇÕES

Quanto à utilização das soluções aplicadas pela Suprema Corte Americana,

vale salientar, que a justiça brasileira não tem a mesma formatação estrutural que a

justiça americana, a exemplo das decisões proferidas pela tribuna do Júri que não

são aplicadas da mesma forma aqui em nosso país. Desta forma, não há o que se

falar em competência do Tribunal do Júri para aferir, e aplicar, o valor condizente a

título de caráter punitivo dos danos morais.

Nesse diapasão, observa-se a existência de uma grande receptividade do

punitive damage na jurisprudência brasileira, como forma de coibir determinadas

ações que possam ser reincididas ou mesmo desprezadas pelos ínfimos valores

condenatórios.

Quanto às medidas que vêm sendo adotadas pelo judiciário brasileiro,

buscando melhorar a aplicação da justiça, tem-se que é visível o esforço que é

aplicado na busca por uma justiça mais célere e eficaz, a exemplo da criação do

Conselho Nacional de Justiça – CNJ, que tem buscado cobrar mais das autoridades

judiciárias potencializando seus resultados, todavia, na esfera dos danos morais, é

cabível um maior esforço externo no intuito da busca por educar a população acerca

do que vem realmente a ser um dano moral e quando se deve pleitear o mesmo.

Nessa linha de raciocínio, observa-se o papel de advogados oportunistas que

mesmo com o conhecimento necessário se aproveitam dessa brecha legal para

auferirem maiores ganhos no resultado da ação.

211

RESEDÁ, Ibid., p. 253.

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Algumas sugestões para as melhorias que podem ser reforçadas no processo

judicial é a busca pela conciliação, mediação e a arbitragem, bem como uma gestão

planejada e participativa em que o processo seja conhecido por todos buscando-se

maior eficácia na celeridade processual, todavia, do lado de quem adentra as portas

do judiciário, o processo educacional ainda se faz essencial objetivando esclarecer

acerca do que deve ou não ser conceituado como um dano moral ou um

acontecimento cotidiano, conforme será explanado a seguir.

6.2.1 Influências da Corte Norte-Americana nas soluções brasileiras

No Brasil a aplicação do punitive damage ainda não tem os contornos

perfeitos a ponto de demonstrar o que é esse instituto, de forma que, preside a ideia

de vingança que deve ser compensada com vultosas indenizações.

Do ponto de vista de Resedá212, muitos daqueles que se dedicam a referida

temática esquecem-se de mencionar que a aplicação do punitive damage se dá

diante de casos considerados de extrema gravidade ou da reiteração de condutas

ofensivas.

Na visão de Schereiber213, no Brasil não existe essa previsão legal, mas, com

o avanço da legislação civil observa-se que a aplicabilidade do caráter

compensatório com o caráter punitivo214.

A receptividade desse instituto na jurisprudência brasileira sobre danos

morais vem ganhando força em virtude da possibilidade de, com indenizações bem

mais altas, coibir-se a reincidência ou estímulo a pratica de determinados atos.

A exemplo, tem-se que aquele que possui ganhos financeiros exacerbados

pode sopesar se vale apena persistir no ato danoso uma vez que a indenização que

vai pagar pode ser simbólica para seus cofres.

212

RESEDÁ, Ibid., p. 227. 213

SCHEREIBER, Anderson. Direitos da Personalidade. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2013, p. 20. 214

“O instituto não encontra previsão expressa no direito brasileiro. Em nossa tradição, a punição sempre foi desempenhada pelo direito penal, reservando-se ao direito civil uma função exclusivamente reparatória. Entretanto, no campo do dano moral, o espírito punitivo tem feito estrada. No afã de assegurar indenizações mais elevadas às vítimas, a doutrina brasileira tem aludido a um “duplo caráter” da indenização por dano moral, que combinaria (i) o caráter compensatório, voltado a reparar o dano moral sofrido, e (ii) o “caráter punitivo para que o causador do dano, pelo fato da condenação se veja castigado pela ofensa que praticou” . Diversos autores sustentam, nessa direção, que “a indenização do dano moral tem um inequívoco sabor de pena, de represália pelo mal injusto”.”

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À luz desse entendimento, Souza Costa215 aponta que a indenização punitiva

tem ganhado força no Brasil, uma vez que, a simples reparação por dano moral não

tem sido satisfatória na solução de diversos conflitos, por exemplo, no caso em que

o ofensor, mesmo após a reparação do dano que causou, aufere benefício

econômico com o ilícito praticado ou quando o ofensor encara a reparação do dano

como um preço que ele se propõe a pagar para cometer o ilícito ou persistir a

praticá-lo.

Diante do exposto, cuidados são necessários quando da importação de

institutos alienígenas à nossa legislação, uma vez que, a estrutura da Suprema

Corte Americana tem uma formatação que não condiz com a nossa, assim, nem

sempre trazer institutos de outras culturas para nossa pode sempre ser a melhor

saída, conforme deixa claro Barbosa Moreira216.

Como exemplo, tem-se que no Brasil as decisões por danos morais não são

tomadas por um Tribunal do Júri enquanto que nos Estados Unidos o panorama é

esse, tendo o Tribunal do Júri Brasileiro competência para participar no julgamento

de crimes dolosos contra a vida, conforme elucida Resedá217 ao mencionar que a

Constituição Federal de 1988, na alínea d, do inciso XXXVIII, do art. 5º determina a

competência exclusiva para a “o julgamento dos crimes dolosos contra a vida”. Não

havendo o que se falar sobre competência do Tribunal do Júri para aferir, e aplicar, o

valor condizente a título de caráter punitivo dos danos morais.

A necessidade de aplicação do punitive damage no Brasil é importantíssima,

uma vez que os direitos da personalidade precisam ser protegidos, de forma que, o

Poder Judiciário necessita dar uma resposta à sociedade que clama pelo direito de

defesa da sua honra. Desta forma, a busca por uma punição mais elevada ou um

215

SOUZA COSTA, Ana Carolina Gusmão de. Dano Moral e Indenização Punitiva. Artigo Científico apresentado à Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: EMERJ, 2009, p. 14. 216

: “Uma coisa, no entanto, afigura-se indubitável: várias das características da Suprema Corte norte-americana causariam estranheza, quando não escândalo, se fossem transplantadas para o nosso universo judicial. Podem ser aceitas, nos Estados Unidos, com tranquilidade, e até produzir, lá, bons frutos; não quer dizer necessariamente que fosse proveitoso copiá-las aqui”. Para aprofundamento verificar em BARBOSA MOREIRA, José Carlos. A Suprema Corte Norte-Americana: um modelo para o mundo? Revista Brasileira de Direito Comparado. N 26. Rio de Janeiro: Instituto de Direito Comparado Luso-Brasileiro, 2004. p. 51. 217

RESEDÁ, Salomão. A Aplicabilidade do Punitive Damage nas ações de indenização por dano moral no ordenamento jurídico brasileiro. Dissertação de Mestrado apresentada à Universidade Federal da Bahia – UFBA. Salvador: UFBA, 2008, p. 283.

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exemplo para não reincidência, como no exemplary damage, faz-se imprescindível

para que o direito de reparação por danos morais continue a ser valorizado em

nosso país.

Assim, Resedá218 deixa claro que o duplo caráter do punitive damage, vem

sendo plenamente aceito no Brasil no que tange às ações de danos morais

individuais, ganhando cada vez mais força na jurisprudência, apesar de não ser um

comportamento majoritário, mas já existem posturas mais rígidas do Poder Judiciário

na aplicação desse instituto.

O que não pode ser refutado é o objetivo da aplicabilidade desse instituto que

é o de ressarcir o dano moral sofrido, bem como desestimular a reincidência da

prática que gerou esse dano.

6.2.2 Brasil: as medidas adotadas pelo judiciário Brasileiro são positivas?

Ao longo dos tempos, as demandas judiciais vêm crescendo de maneira

exacerbada, isso é fruto do crescimento populacional bem como do dinamismo das

relações sociais fruto das facilidades e tecnologias que fazem com que o contexto

de vida atual exija muito mais do ser humano, o que se traduz em situações estresse

e impaciência.

Com isso e com as garantias proporcionadas pela legislação vigente, a

exemplo da lei dos juizados especiais e da justiça gratuita, as demandas por

ressarcimento por danos morais são cada vez maiores. Não distante, a máquina

judicial não acompanha o referido crescimento, de forma que, existem dois

panoramas a serem visualizados no que tange ao tratamento que é dado acerca da

matéria dos danos morais.

Primeiramente, tem-se a questão interna do Poder Judiciário que se encontra

limitado em atender a crescente demanda, fazendo-se necessária, cada vez mais, a

modernização de sua máquina, e, além disso, capacitação de seus funcionários e

aumento do número dos mesmos.

Ao longo dos últimos anos, visualiza-se que o Poder Judiciário tem buscado

efetivar ações que contribuem para melhoria no atendimento, mesmo que ficando

218 RESEDÁ, Ibid., p. 304.

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ainda a dever. Um grande esforço que foi aplicado nessa busca por superação, foi a

criação do Conselho Nacional de Justiça, o CNJ.

Desde a sua criação com a Emenda Constitucional nº 45 de 2004

Magistrados foram condenados, alguns com punição administrativa máxima, não

restando dúvidas, portanto, que o CNJ realiza um trabalho de difícil execução que é

fiscalizar e punir administrativamente desvios no interior do Judiciário.

O Artigo 103-B da Constituição Federal de 1988, em seu parágrafo 4º e

incisos subscritos, estabelecem as competências do Conselho Nacional de

Justiça219. Com a implantação do CNJ, houve um dinamismo maior na administração

judiciária e resultados foram alcançados através das cobranças exercidas por este

Conselho.

O segundo panorama traz uma visão externa; observa-se que o judiciário

poderia adotar medidas, no sentido de educar a população acerca do que é o dano

moral e quando o mesmo efetivamente é cabível, diferenciando-o, dos

acontecimentos cotidianos aos quais todos estão expostos.

Nesse prisma, importante se faz esclarecer que em muitos casos advogados

aproveitam-se da situação tentando “inchar” o valor da sentença imputando pleito

por danos morais nas ações que efetivamente possuem um pleito sério, buscando-

se um lenitivo a um dano moral inexistente com o intuito de ganhar mais.

Cabem ações drásticas do poder judiciário no sentindo de coibir as aventuras

desses profissionais severamente bem como a tentativa de esclarecer à população

acerca das demandas por danos morais, deixando claro o caráter pedagógico e

punitivo do dano moral uma vez que, é melhor evitar a entrada excessiva de

demandas por danos morais na máquina judiciária que tentar aparelhar e capacitar

219

Artigo 103-B § 4º Compete ao Conselho o controle da atuação administrativa e financeira do

Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes, cabendo-lhe, além de outras atribuições que lhe forem conferidas pelo Estatuto da Magistratura: II - zelar pela observância do art. 37 e apreciar, de ofício ou mediante provocação, a legalidade dos atos administrativos praticados por membros ou órgãos do Poder Judiciário, podendo desconstituí-los, revê-los ou fixar prazo para que se adotem as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, sem prejuízo da competência do Tribunal de Contas da União; III - receber e conhecer das reclamações contra membros ou órgãos do Poder Judiciário, inclusive contra seus serviços auxiliares, serventias e órgãos prestadores de serviços notariais e de registro que atuem por delegação do poder público ou oficializados, sem prejuízo da competência disciplinar e correicional dos tribunais, podendo avocar processos disciplinares em curso e determinar a remoção, a disponibilidade ou a aposentadoria com subsídios ou proventos proporcionais ao tempo de serviço e aplicar outras sanções administrativas, assegurada ampla defesa.

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uma máquina para lidar com uma demanda crescente e ilimitada, é o

posicionamento também de Ferreira220.

6.2.3 Alternativas para valoração do direito a honra

Por fim, observa-se a necessidade de um esforço conjunto no intuito de

promover melhorias nos aspectos relativas à questão das ações por danos morais.

Institucionalmente, o Poder Judiciário necessita atuar com processos de

gestão onde todos interajam de forma planejada buscando-se antecipar os

acontecimentos futuros e adaptando-se às mudanças do ambiente externo que vão

criando novas situações, assim, se houver um preparo para se antecipar à chegada

de mudanças, certamente a máquina judiciária estará mais preparada para lidar com

as mesmas.

Na visão de Martelli Moreira221, o planejamento estratégico para atuação

dentro do poder judiciário faz uma diferença capaz de acelerar processos e saber

lidar com as demandas vindouras, assim, as expectativas criadas pelo planejamento

estratégico foram: Antecipação dos acontecimentos; preocupação com o futuro da

organização; tomada de decisões de forma organizada; preocupação com a eficácia;

preocupação com mudanças no ambiente externo; correta utilização dos recursos

internos; preocupação com a cultura organizacional; caracterização de um processo

interno de mudanças; caracterização do processo de aprendizado institucional.

Dessa fora, tem-se que a ampla participação de todos proporciona uma

divisão de responsabilidades, melhorando o cumprimento de prazos e a qualidade

do serviço prestado ao público.

Além do processo de educação ao público, bem como da punição de

causídicos oportunistas nas ações de danos morais, existe também um investimento

maciço e necessário que deve sempre ser feito no intuito de resolver questões

220

FERREIRA, Thiago Soares. A Banalização do Dano Moral. Monografia apresentada à Universidade Católica de Brasília. Brasília: Universidade Católica de Brasília, 2012, p.51: “Fica em falta também o judiciário brasileiro que não faz campanha de conscientização. Deveria ser feita algo que explicasse ao cidadão o que é dano moral, a finalidade do dano moral, dentro do possível procurar explicar ao cidadão algumas causas que possam ensejam o dano moral, mesmo sabendo que este é um instituto subjetivo, aonde não se consegue vislumbrar a partir de que ponto deixa de ser um mero dissabor, um aborrecimento e passa a ser algo que mereça ser indenizado”. 221

MARTELLI MOREIRA, João Luiz. Planejar o Futuro é Planejar o Presente. Revista CEJ – Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal. Administração da Justiça. N 1 (1997). Brasília: CEJ, 1997, p. 31.

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relativas a danos morais antes mesmo das mesmas tornarem-se objeto de querelas

mais acirradas, para tanto, a conciliação, arbitragem e a mediação desempenham

um papel muito importante nesse contexto.

A Conciliação está prevista no art. 3º da lei dos Juizados Especiais Cíveis nº

9.099/95 bem como na esfera Federal no art. 38 da lei 10.259/01. Através desses

institutos, os Juizados passaram a ter competência para conciliação das causas a

eles submetidas, sendo assim, se uma demanda por danos morais puder ser sanada

ou esclarecida através de um processo de conciliação entre as partes, certamente

diversas demandas deixarão de inchar a máquina judiciária com processos judiciais.

Nesse contexto, objetivando ou sanar uma demanda que já existe ou tentar

evitar que a mesma surja, o conciliador desempenha um papel de suma importância

pois o mesmo sugere, interfere, aconselha as partes, o que não ocorre na mediação

conforme será exposto. O papel do conciliador não é necessariamente analisar ou

julgar o conflito, mas sim, tentar forçar um acordo para evitar que a demanda

avance.

Na mediação isso não ocorre, o mediador apenas age com o intuito de

facilitar a comunicação entre as partes em um procedimento extrajudicial. A

mediação pode ser judicial, quando ocorre após a judicialização da ação e as partes

resolvem voltar atrás para tentarem nova negociação ou por via incidental, quando

ainda não se adentrou as vias judiciais, todavia, é sempre fruto de uma negociação

que não deu certo e criou barreiras de comunicação entre as partes.

Já na arbitragem, que junto com a mediação são procedimentos privados,

elege-se um arbitro imparcial que vai decidir a causa, tendo sua decisão força

vinculante e impositiva.

O que merece ser entendido é que deve existir um esforço das duas partes,

daquele que pretende ou daquele que adentrou às portas do judiciário, bem como do

próprio Poder Judiciário no intuito de tentar resolver da melhor maneira possível as

questões relativas aos danos morais, evitando assim a banalização dos processos

que objetivam a reparação por danos morais.

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7 CONCLUSAO

Em face de todo exposto, nesta pesquisa foi possível investigar as principais

bases teóricas sobre danos morais bem como suas origens, observando-se que a

questão dos danos morais remonta o período antes de Cristo desde o código de Ur-

Nammu avançando pelos Código de Hamurabi e de Manu, inclusive com registros

em livros sagrados como a Bíblia Sagrada e o Alcorão, até chegar ao período

Romano.

Constatou-se que durante o período de Roma Antiga os danos morais já eram

cometidos principalmente em virtude da separação de classes quando os patrícios

humilhavam os plebeus. Mesmo após a queda do império romano, no avançar da

Idade Média, a prática de danos morais foi cada vez maior nos feudos entre a

nobreza e a plebe e humilhações eram cometidas quando ser humano era tratado

como objeto.

Com o período de guerras, os danos morais eram cometidos cada vez mais e

as classes mais oprimidas buscavam justiça revoltando-se contra quem estava no

poder, a exemplo das Revoluções Francesa e Industrial, contudo, foi com as duas

grandes guerras mundiais (dentre varias outras que ocorreram na história) que o ser

humano foi cada vez mais desprezado e mau tratado inclusive em campos de

concentração sendo executado por pelotões de fuzilamento ou em câmeras de gás,

dentre outras formas meticulosas de extermínio em massa.

Surgiu então a Declaração Universal dos Direitos do Homem como forma de

resguardar a Dignidade da Pessoa Humana. Nessa busca pela proteção da honra,

nasce a codificação civil com o intuito de resguardar os direitos privados.

Inicialmente na França, através de Napoleão Bonaparte, com o cunho patrimonial e

contratual, todavia, com o passar dos anos a realidade transforma-o como

instrumento de defesa dos interesses humanos.

No Brasil, o Código Civil de Clóvis Beviláqua inaugurou uma nova fase da

legislação privada brasileira, contudo, o mesmo sofreu grandes retaliações por Ruy

Barbosa, a maioria de cunho linguístico. Em 2002 passou a vigorar o novo código

civil, inspirado na Constituição Federal de 1988 a qual tinha como principio basilar o

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da dignidade da pessoa humana, este que se irradiou por toda normatização

brasileira.

A dignidade da pessoa humana é um valor a ser perseguido em nosso país,

isso fruto das humilhações e abusos morais e físicos sofridos por um povo que

sofreu os dramas oriundos da ditadura militar e que teve seus anseios atendidos por

este diploma legal. Com o novo Código Civil de 2002, o direito civil passou a ter uma

nova roupagem e, a principal preocupação, que era o patrimônio e os contratos,

passou a ser o ser humano em sua dignidade.

O direito a honra está resguardado pela Constituição Federal de 1988 e pelo

novo Código Civil de 2002, todavia, existe uma proteção específica ao mesmo no

Código Penal através das tipificações penais de calúnia, injúria e difamação. Estes

crimes podem ensejar inclusive a reclusão daquele que os pratique.

Assim, o demandante pode acessar tanto a ceara civil como penal para

buscar o seu direito, podendo na ceara civil a ação ficar com seu prazo suspenso

até que expire a tramitação penal.

Concluímos também que os danos morais podem trazes inclusive um dano de

ordem material, é o exemplo do profissional que tem seu nome “sujo na praça” e

acaba por perder seus clientes tendo seus lucros cessados.

Quanto às indenizações por danos morais, o juiz tem a tarefa de avaliar a

existência ou não do dano, uma vez que, acontecimentos cotidianos não podem ser

confundidos com danos morais, pois todos estão sujeitos aos mesmos.

Concordamos com a ideia da importância dos princípios que mesmo não

sendo positivados, são balizadores da normatização legal pátria e surgem do

sentimento da nação, nesse sentido, o principio da dignidade da pessoa humana é o

mais importante e que vem dar valor à questão moral dos indivíduos.

Posicionamo-nos no sentido que nessa busca, o Estado desenvolve seu

papel com políticas públicas coibindo os excessos praticados na sociedade, todavia,

cabe também aos eleitores saberem escolher seus candidatos que os representarão

para que posteriormente não haja queixas pelo descumprimento de seus deveres.

Quanto aos esforços pela dignificação do homem, tem-se que as diretivas não

são dadas somente no Brasil, e que o mundo tem essa preocupação, principalmente

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após os períodos de guerras, assim, tratados e organizações internacionais foram

criadas no intuito de buscar preservar esse tão valioso princípio, a exemplo da ONU.

No Brasil, com o Neoconstitucionalismo, a Constituição Federal passou a

irradiar seus princípios por toda normatização brasileira, de forma que, as leis

editadas contra esses vetores são tidas com inconstitucionais.

Na busca por uma reparação por um dano moral sofrido, observa-se que

existe uma banalização não só por parte de quem demanda, uma vez que, não sabe

a real caracterização de um dano moral, mas também por parte do judiciário, que ao

receber uma demanda exacerbada, acaba por não dar conta de julgar tantos

processos, além disso, advogados oportunistas pleiteiam danos morais inexistentes

com o intuito de aumentarem seus honorários com uma sentença mais favorável.

Concluiu-se também que mesmo antes da Constituição de 1988, já se falava

em danos morais por analogia, pois todo aquele que cometia um dano deveria o

indenizar, segundo o Código Civil de 1916.

Ademais, nos Estados Unidos da América já se falava a mais de 60 anos em

danos morais, e os mesmos eram punidos através da figura do punitive damage que

representa uma indenização bem maior do que realmente se merece, com o intuito

de punir quem praticou o ato e melindrando-o para não reincidir no mesmo.

As penas aplicadas além do caráter punitivo tem o objetivo educador

buscando reformular o ponto de vista daquele que praticou o dano. A Suprema Corte

Americana é o principal órgão do poder judiciário americano, todavia, tem um caráter

político muito grande. A Corte é formada por nove juízes sendo um deles o

presidente e a mesa reexamina diversas matérias.

Observa-se em alguns julgados que a aplicação do punitive damage é bem

acentuada. Os julgados da Corte Norte Americana influenciaram muito as decisões

jurisprudenciais brasileiras, mas há cuidados que necessitam serem adotados

quando se utiliza a legislação alienígena, como as adaptações necessárias.

Quanto às alternativas para se revolver o problema, visualiza-se a

necessidade de implementação de tecnologias novas, gestão estratégica e

planejada do sistema judiciário de forma que todos participem do processo de

Gestão e saibam de tudo que acontece na logística judiciária, além do aumento do

número de funcionários.

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Uma ação importante, já adotada, foi a criação do Conselho Nacional de

Justiça que passou a cobrar mais resultados dentro da esfera judicial, o que

dinamizou um pouco mais a liberação desses processos, além de prender

magistrados corruptos, dentre outras medidas.

Nessa esteira tem-se que o problema é também fruto da quantidade de

pessoas que buscam o poder judiciário para resolverem seus problemas. Outras

facilidades, como a criação dos juizados especiais que não possuem custos bem

como a justiça gratuita para todos contribuíram com o excesso de demandas por

danos morais hoje existentes, todavia, são facilidades necessárias para garantir o

direito de igualdade e o acesso à justiça.

Um investimento na conciliação, na arbitragem o na mediação é importante,

com isso, muitas demandas deixariam de seguir para julgamento enxugando a

máquina judiciária do acúmulo de processos por danos morais e valorizando tão

importante instituto hoje relativamente banalizado.

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REFERÊNCIAIS

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BARROSO, Luis Roberto. O Constitucionalismo Democrático no Brasil: Crônica de um Sucesso Imprevisto. Revista Neoconstitucionalismo em Perspectiva. Viçosa: UFG, 2014. BASTOS Guilherme Augusto Caputo. Danos morais: o conceito, a banalização e a indenização. Revista TST. Brasília, vol. 73, no 2, abr/jun 2007. BAUM, Lawrence. A Suprema Corte Americana: Uma análise da mais notória e respeitada instituição judiciária do mundo contemporâneo. Rio de Janeiro: Forense, 1987. BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal – Parte Especial – Dos Crimes Contra a Pessoa. 12ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012. BRASIL – Superior Tribunal de Justiça - RESP 1.071.158-RJ (2008/0146386-9) - STJ, Ministra NANCY ANDRIGHI - T3 - TERCEIRA TURMA, julgado em 25/10/2011, publicado em 07/11/2011. BRASIL – Superior Tribunal de Justiça - RESP 19.402-SP (1992/0004807-2)- STJ, Min. ATHOS CARNEIRO ANDRIGHI - T4 – QUARTA TURMA, julgado em 30/03/1992, publicado em 20/04/1992. BRASIL – Superior Tribunal de Justiça - RESP nº 665.425/AM (2004/0068236-3) - STJ, Ministra NANCY ANDRIGHI- T3 - TERCEIRA TURMA, julgado em 25/04/2005, publicado em 16/05/2005. BRASIL – Superior Tribunal de Justiça – RESP. 320462 - SP (2001/0048993-1) - STJ, Min. BARROS MONTEIRO, QUARTA TURMA, julgado em 15/09/2005, publicado em 24.10.2005 (p.327). BRASIL – Superior Tribunal de Justiça – RESP. 646154 - RJ (2004/0033220-6) - STJ, Min. HUMBERTO GOMES DE BARROS, TERCEIRA TURMA, julgado em 21/11/2006 publicado em 18/12/2006 (p. 366). BRASIL – Superior Tribunal de Justiça – RESP. 1.025.047 - SP (2008/0016673-2) - STJ, Min. NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 26/06/2008, publicado em 05/08/2008. BRASIL – Superior Tribunal de Justiça – RESP. 1.081.432 - SP (2008/0164516-7) - STJ, Min. CARLOS FERNANDO MATHIAS - QUARTA TURMA, julgado em 03.03.2009, publicado em 17/08/2009.

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