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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPRITO SANTO
CENTRO DE CINCIAS HUMANAS E NATURAIS
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM HISTRIA SOCIAL DAS
RELAES POLTICAS
JOANA DARCK CAETANO
O PROJETO POLTICO DO PARTIDO DOS TRABALHADORES EM
CACHOEIRO DE ITAPEMIRIM ES E A GESTO (2009 2012) NO
MBITO DOS PILARES DO MODO PETISTA DE GOVERNAR
VITRIA
2014
JOANA DARCK CAETANO
O PROJETO POLTICO DO PARTIDO DOS TRABALHADORES EM
CACHOEIRO DE ITAPEMIRIM ES E A GESTO (2009 2012) NO
MBITO DOS PILARES DO MODO PETISTA DE GOVERNAR
Dissertao apresentada ao Programa de Ps-
Graduao em Histria do Centro de Cincias
Humanas e Naturais da Universidade Federal
do Esprito Santo, como requisito para a
obteno do ttulo de Mestre em Histria na
rea de concentrao em Histria Social das
Relaes Polticas.
Orientador: Prof. Dr. Luiz Cludio M. Ribeiro
VITRIA
2014
JOANA DARCK CAETANO
O PROJETO POLTICO DO PARTIDO DOS TRABALHADORES EM CACHOEIRO
DE ITAPEMIRIM ES E A GESTO (2009 2012) NO MBITO DOS PILARES DO
MODO PETISTA DE GOVERNAR
Dissertao apresentada ao Programa de Ps-
Graduao em Histria Social das Relaes
Polticas do Centro de Cincias Humanas e
Naturais da Universidade Federal do Esprito
Santo, como requisito para obteno do ttulo
de Mestre em Histria.
Aprovada em:
COMISSO EXAMINADORA
_____________________________________
Prof. Dr. Luiz Cludio M. Ribeiro (Orientador) UFES
_____________________________________
Prof. Dr. Pedro Ernesto Fagundes UFES
_____________________________________
Prof. Dr. Vitor Amorim de Angelo UVV
VITRIA
2014
Caetano, Joana DArck. O projeto poltico do Partido dos Trabalhadores em Cachoeiro de Itapemirim-ES e a gesto (2009-2012), no mbito dos pilares do Modo Petista de Governar/ Joana DArck Caetano. - 2014 161 f. : il Dissertao (Mestrado em Histria) - Universidade Federal do Esprito Santo, Vitria, 2014. Orientao: Prof. Dr. Luiz Cludio M. Ribeiro. 1. Partido dos Trabalhadores 2. Cachoeiro de Itapemirim. 3. Democracia. 4. Participao Popular. 5. Polticas Pblicas Sociais. I Ttulo.
[...] O saber histrico pode contribuir para dissipar as iluses ou os
desconhecimentos que durante longo tempo desorientaram as memrias coletivas...
Roger Chartier
A Gilberto Caetano, pai (in memorian).
AGRADECIMENTOS
Agradeo em primeiro lugar a Deus, por ter alimentado minhas foras nas horas
mais difceis, quando muitas vezes eu j no encontrava o caminho em minha
pesquisa e Ele revigorava minhas energias para seguir em frente buscando a luz
para entender a Histria.
A meus filhos Gilberto Caetano Nicolo dos Santos e Sofia Caetano dos Santos, por
suportarem minha ausncia mesmo quando fisicamente estava presente, com
resignao e companheirismo. A meus pais Maria e Gilberto (in memorian), pelo
apoio que sempre me deram. A minha irm Maria das Graas Caetano e irmo
Gilberto Caetano Junior, em nome de todos os irmos, por sempre estarem por
perto, me motivando a continuar lutando por meus objetivos.
Ao Professor Luiz Cludio Ribeiro Moiss, orientador do meu trabalho, que me
incentivou, me apontou as sadas dentro das teorias e das prticas da Histria
Poltica, acreditando no meu esforo e capacidade de enfrentar e vencer os desafios
que me eram apresentados a cada instante neste ngreme caminho que a busca
do conhecimento. Sempre paciente e cuidadoso para comigo nos momentos de
orientao.
Aos professores Vitor Amorim de Angelo e Pedro Ernesto Fagundes, por aceitarem
fazer parte da banca e que a partir de suas observaes pude olhar para meu
trabalho de maneira diferente, com mais clareza e objetividade. Isso foi muito
importante para meu amadurecimento como acadmica. Empenhei-me muito para
seguir os apontamentos que fizeram e espero ter conseguido.
Aos alunos do Mestrado em Histria, em particular Daniela Durante, Silvia Souza
Dias, Bruno Sobroza Duarte, Dinorh Lopes Rubim e Jos Carlos Rocha Junior, que
partilharam momentos inesquecveis, de estudos e tambm diverso.
Aos meus amigos em geral, que torceram e me ajudaram de alguma forma, em
nome de Marcelle Ferreira Lins, Lidolfer Polonini e Cristiane Marinato, agradeo
todos os que me acompanharam, de longe ou perto, nesta jornada longa e dura,
mas tambm enriquecedora para minha vida, principalmente como pessoa.
RESUMO
A presente dissertao analisa a trajetria do Partido dos Trabalhadores no
municpio de Cachoeiro de Itapemirim, cidade localizada ao sul do estado do Esprito
Santo, e a chegada ao poder nas eleies de 2008, bem como a atuao da
administrao petista no perodo de 2009-2012, considerando a conjuntura poltica,
econmica e social que se encontrava o cenrio que objeto do estudo. O
levantamento do surgimento da cidade, seus aspectos naturais, econmicos,
polticos, sociais e culturais so fatores importantes para a compreenso da histria
do tempo presente. A pesquisa tambm analisa o surgimento e a trajetria do
Partido dos Trabalhadores no Brasil, no Esprito Santo, com nfase em Cachoeiro
de Itapemirim e a chegada ao poder no municpio. Entram na pauta da discusso
ainda, as contradies do PT ao participar das eleies e afastar-se da sua base
social. Com a chegada ao poder em Cachoeiro de Itapemirim-ES, municpio que
apresenta muitas necessidades prioritrias, visivelmente no que concerne
infraestrutura urbana dos bairros perifricos, que cresceram desordenadamente e
sem o acompanhamento do Poder Pblico, o governo petista se depara com o
desafio de seguir as diretrizes do chamado Modo Petista de Governar, que tem
como pilares a participao popular, a inverso de prioridadese a tica e a
transparncia no governo. A proposta verificar se a administrao petista, durante
o primeiro mandato (2009-2012) seguiu os parmetros indicados acima e os
resultados dessas aes para a populao, principalmente da periferia, que
dependem mais das polticas pblicas sociais.
Palavras-chave: Partido dos Trabalhadores; Cachoeiro de Itapemirim; democracia;
participao popular; Polticas pblicas sociais.
ABSTRACT
This dissertation examines the trajectory of the Partido dos Trabalhadores (Workers
Party) in Cachoeiro de Itapemirim, south of the state of Esprito Santo, and
ita arrival to power in the 2008 elections, as well as the performance of the PT
administration in 2009-2012 considering the political, economic and social mood that
was the scenario form the object of study. The survey of the emergence of the city,
its natural, economic, political, social and cultural aspects are important for
understanding the history of this time factor. The research also examines the
emergence and trajectory of PT (Workers Party) in Brazil, Espirito Santo, with
emphasis in Cachoeiro de Itapemirim and the coming to power in the city. Come on
the agenda for further discussion, the contradictions of PT to participate in the
election and move away from its social base. With the coming to power in
Itapemirim-ES, a municipality that has many priority needs, noticeably when it
comes to urban infrastructure of the suburbs, which grew haphazardly and without
the handling of the government, the PT government is faced with the challenge of
following the guidelines of the PT way of Government, founded on popular
participation, the "inversion of priorities" and ethics and transparency in government.
The proposal is to verify that the PT administration during its first term (2009-2012)
followed the above parameters and the results of those actions for the population,
especially in the periphery areas, which are more dependent on the public social
policies.
Keywords: Workers Party, Partido dos Trabalhadores, Cachoeiro de Itapemirim-ES,
democracy, popular participation, the public social policies.
LISTA DE SIGLAS
ACL Academia Cachoeirense de Letras
ACM Antonio Carlos Magalhes
ADUFF Associao de Docentes da Universidade Federal Fluminense
ALCA Associao do Livre Comrcio das Amricas
ARENA Aliana Renovadora Nacional
BC Banco Central
CAE Conselho da Alimentao Escolar
CEBs Comunidades Eclesiais de Base
CMPCCI Conselho Municipal de Polticas Culturais de Cachoeiro de Itapemirim-ES
CPDM Conselho Plano Diretor Urbano
CPI Comisso Parlamentar de Inqurito
CPMF Contribuio Provisria sobre Movimentao Financeira
CRFB Constituio da Repblica Federativa do Brasil
CUT Central nica dos Trabalhadores
DEM Democratas
EGPP Escritrio de Gesto de Projetos Prioritrios
FAMMOPOCI Federao de Associao de Moradores e Movimentos Populares
de Cachoeiro de Itapemirim-ES
FBP Frente Brasil Popular
FHC Fernando Henrique Cardoso
FUNDAP- Fundo do Desenvolvimento das Atividades Porturias
FUNDEB Fundo de Desenvolvimento da Educao Bsica
FUNDEF Fundo de Desenvolvimnto da Educao Fundamental
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica
ISS Imposto Sobre Servios
MEC Ministrio da Educao
MEPES Movimento de Educao Promocional do Esprito Santo
OGU Oramento Geral da Unio
ONGs Organizaes No-Governamentais
ONU Organizao das Naes Unidas
OP Oramento Participativo
PAC Programa de Acelerao de Crescimento
PC do B Partido Comunista do Brasil
PCB Partido Comunista Brasileiro
PED Processo de Eleies Diretas
PFL Partido da Frente Liberal
PH Paulo Hartung
PHS Partido Humanista da Solidariedade
PMDB Partido da Mobilizao Democrtica do Brasil
PMN Partido da Mobilizao Nacional
PPA Plano Pluri Anual
PPS Partido Progressista Social
PR Partido Republicano
PRP Partido republicano Progressista
PRTB Partido Renovador Trabalhista Brasileiro
PSB Partido Socialista Brasileiro
PSDB Partido da Social Democracia Brasileira
PSDC Partido Social Democrata Cristo
PSTU Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado
PT Partido dos Trabalhadores
PT do B Partido Trabalhista do Brasil
PTB Partido Trabalhista Brasileiro
PTC Partido Trabalhista Cristo
PTN Partido Trabalhista Nacional
SAAE Servio de Saneamento de gua e Esgoto
SEMDES Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social
SICONV Sistemas de Convnios e Contrato de Repasses
SUS Sistema nico de Sade
UFF Universidade Federal Fluminense
UFRJ Universidade Federal do Rio de Janeiro
UNE Unio Nacional dos Estudantes
SUMRIO
INTRODUO ............................................................................................... 14
CAPTULO I - CACHOEIRO DE ITAPEMIRIM REVISITANDO A HISTRIA
DO MUNICPIO .............................................................................................. 23
1 SURGIMENTO E CARACTERSTICAS DO MUNICPIO ............................. 23
1.1 A capital do mrmore e granito ..................................................................... 30
CAPTULO II ................................................................................................. 34
2 O PT FUNDADO EM SO PAULO-SP ..................................................... 34
2.1 A organizao do PT em Cachoeiro de Itapemirim-ES ............................... 41
2.2 A participao do PT de Cachoeiro de Itapemirim-ES -1988-1998 ............. 46
2.3 A experincia eleitoral do PT no Brasil ......................................................... 55
2.4 Eleies 2008 e a vitria do PT em Cachoeiro de Itapemirim ..................... 59
2.4.1 Composio Poltica do Governo ................................................................. 65
2.4.2 Relaes Polticas: Governo Federal, Governo Paulo Hartung e a Cmara de
Vereadores .................................................................................................... 69
CAPTULO III ................................................................................................. 72
3 O MUNICPIO E A GARANTIA DE DIREITOS ............................................. 72
3.1 Fisiologismo e Clientelismo ......................................................................... 77
3.2 Cultura e cidadania ........................................................................................ 81
3.3. Trabalhar um Direito ................................................................................... 86
3.4 Educar preciso ............................................................................................ 90
3.5 Segregao espacial e democracia ............................................................... 96
3.6 O Oramento Participativo ........................................................................... 101
3.7 A tica e a transparncia no governo e a Inverso de Prioridades ...... 107
CONSIDERAES FINAIS ........................................................................ 112
REFERNCIAS ........................................................................................... 125
ANEXOS ................................................................................................................ 131
Anexo A Prmio Gestor Eficiente da Merenda Escolar .................................... 131
Anexo B Entrevista com o presidente da FAMMOPOCI (Federao de Associao
de Moradores e Movimentos Populares de Cachoeiro de Itapemirim), em
23/010/2014, a respeito do oramento participativo no municpio ..................... 133
Anexo C Entrevista com o ex-secretrio de Gesto e Estratgia do municpio de
Cachoeiro de Itapemirim-ES (2009-2010) e atual Deputado Estadual Rodrigo
Coelho, responsvel pela implantao do oramento participativo no municpio .. 137
Anexo D Relatrio das plenrias do oramento participativo por regio ............ 142
Anexo E Fotos de obras de infraestrutura de bairros perifricos ....................... 157
14
INTRODUO
Sendo obrigado a saber agir como um animal, deve o prncipe
valer-se das qualidades da raposa e do leo, pois o leo no
sabe se defender das armadilhas, e a raposa no consegue
defender-se dos lobos. preciso, portanto, ser raposa para
reconhecer as armadilhas, e leo para afugentar os lobos.
Nicolau Maquiavel
O presente trabalho prope a anlise da trajetria do Partido dos
Trabalhadores no municpio de Cachoeiro de Itapemirim, repassando por sua
formao e a chegada ao poder nas eleies de 2008 e atuao do governo petista
no perodo de 2009/2012 em relao aos pilares que norteiam as aes dos
governos do PT no Brasil, que so basicamente trs: a participao popular na
definio de polticas pblicas; inverso da poltica governamental e dos
investimentos, fazendo opo pelos pobres; tica e transparncia no governo.
Ser analisado o chamado modo petista de governar em Cachoeiro de
Itapemirim, depois de dcadas de revezamento no poder por polticos tradicionais,
nas ltimas podemos citar Theodorico de Assis Ferrao, Jos Tasso de Andrade e
Roberto Almockadice Valado (os trs juntos somaram 20 anos de mandato) e se de
fato esta opo do eleitor correspondeu s expectativas daqueles que apostaram na
mudana proposta na campanha eleitoral pelo, ento candidato, hoje prefeito
reeleito Carlos Casteglione, que representa o Partido dos Trabalhadores.
Para lograr xito nesta empreitada, o presente texto ser estruturado a partir
de algumas hipteses. Quanto prtica da inverso de prioridades implementao
das polticas pblicas no municpio, considerando as necessidades mais urgentes da
populao em relao aos investimentos em obras de infraestrutura nos bairros
perifricos e pobres.
15
Quanto participao popular, em particular atravs do Oramento
Participativo (OP), que foi implantado no municpio em 2009, atravs da Secretaria
de Gesto Estratgica e se a populao acolheu a iniciativa, opinando sobre as
prioridades oramentrias para suas comunidades.
Quanto tica e a transparncia governamental, dentro dos parmetros do
Modo Petista de Governar, como uma das bandeiras que o partido defendeu desde
seu surgimento e que, desta forma, passou a imagem para o eleitorado de ser
diferente dos demais, que j no possua credibilidade junto populao.
Sobre as fontes de pesquisa, recorreremos a Documentos Partidrios
(Estatuto, Manifesto, Jornais, Revistas, Livros de Atas, entre outros), dados do IBGE
(Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica) e dados estatsticos nas secretarias
municipais de Educao, Obras e Gesto Estratgica. Acresceremos entrevistas
com o ex- secretrio de Gesto Estratgica e atual Deputado Estadual Rodrigo do
Carmo Coelho, que foi responsvel pela implantao do OP (Oramento
Participativo) no municpio e o Presidente da FAMOPOCCI (Federao de
Associao de Moradores e Movimentos Populares de Cachoeiro de Itapemirim),
Ronaldo Xavier, que est em permanente contato com as comunidades, sobre a
implantao e o resultado do Oramento Participativo no municpio. As entrevistas
com os colaboradores acima citados, foram realizadas em udio e transcritas
posteriormente, sendo utilizadas parcialmente.
Com o intuito de atingirmos os objetivos delineados no trabalho
desenvolvemos uma pesquisa com abordagem qualitativa, adotando como tcnicas
de coleta de dados a entrevista e a anlise documental. A utilizao das duas
tcnicas ocorre na inteno de que as mesmas se completem, preenchendo desta
maneira possveis lacunas que por ventura possa existir. A medida adotada para o
estudo dos dados coletados a apreciao de contedo (BARDIN, 2004).
Objetivando compreender a construo da democracia atravs da conscincia
poltica, da participao popular e do governo petista, e ainda as contradies de um
partido que se prope a representar uma classe, mas precisa administrar para todos,
optou-se por uma pesquisa qualitativa por entender que a mesma [...] se interessa
16
pela compreenso mais aprofundada dos fatos e das aes que podem delinear a
dinmica da sociedade, das organizaes, dos grupos e dos indivduos (SALM et al,
2000, p. 2).
Devido ao farto material terico produzido sobre o Partido dos Trabalhadores,
a participao poltica do povo e a importncia disto para a transformao, bem
como a plena cidadania, ser salutar filtrar a produo escrita que dar sustentao
s ideias colocadas neste trabalho.
Existem inmeros trabalhos publicados sobre a fundao e a trajetria do PT
e tambm sobre experincias administrativas em prefeituras onde o partido esteve
atuando no comando. Este material foi organizado com reunio de textos de
intelectuais que dominam determinado assunto ligado a alguma rea
Este estudo divide em trs captulos. O primeiro captulo faz um levantamento
a respeito do passado do municpio de Cachoeiro de Itapemirim, desde seu
surgimento passando pelas etapas polticas at a emancipao. A histria poltica,
econmica, social e cultural foi observada atravs de autores que apresentaram
ricas informaes sobre o cotidiano, as fontes de riquezas, a importncia poltica e
cultural do municpio dentro do estado do Esprito Santo.
O segundo captulo analisa o processo de fundao do PT, a partir da
necessidade de um partido classista que atendesse os anseios e organizasse a
classe trabalhadora no Brasil. Analisa ainda a organizao do PT no municpio de
Cachoeiro de Itapemirim, pontuando as dificuldades enfrentadas, as limitaes das
lideranas, as divergncias no seio do partido. Alm disso, analisa a experincia
eleitoral do PT, bem como a eleio de 2008 e a vitria eleitoral no municpio,
seguindo da composio poltica do governo petista e sua relao poltica com o
Governo Federal, Governo Paulo Hartung e a Cmara de Vereadores.
Em relao aos conflitos internos do partido, h uma discusso muito acirrada
sobre os rumos do PT enquanto partido. Questiona-se quanto natureza ideolgica
e s aes do partido, se revolucionrio ou reformista. Referente ao tema, Oliveira
17
(2008), em sua dissertao sob o ttulo Desempenho poltico-eleitoral do Partido
dos Trabalhadores, no Esprito Santo, nas eleies de 1982 a 2002, escreve,
Quando o assunto o Partido dos Trabalhadores, no se pode deixar de lado a ambiguidade verificada nas entranhas do prprio movimento esquerdista internacional desde os seus primrdios. Isto diz respeito s polmicas em torno do debate sobre que caminho a esquerda no mundo deveria trilhar, o da reforma ou o da revoluo.Essa anlise importante, porque o PT parte integrante de tal debate como um partido que, embora se intitulando diferente dos tradicionais partidos, sempre refletiu, no seu interior, essas
controvrsias [...] (OLIVEIRA, 2008, p. 30-31).
Sobre as transformaes do PT e os caminhos que a esquerda brasileira
trilhou e trilha, desde a sua fundao, Demier (2003) rene uma gama de
posicionamentos e reflexes de vrios intelectuais e militantes em de esquerda, em
forma de entrevista, como Joo Batista Oliveira de Arajo (Bab), Csar Benjamin,
Luciana Genro, Marcelo Badar Mattos, Valrio Arcary, Virgnia Fontes e Z Maria.
Essas personalidades polticas discutem com muita propriedade as aes do
Governo Lula no que se refere Poltica Econmica, Poltica Social, Poltica
Internacional, Reforma Agrria e movimentos sociais. Analisam a democracia
partidria, bem como o PT dentro do contexto do socialismo e as perspectivas em
relao ao sistema socialista atual. Esses intelectuais fizeram consideraes
profundas sobre os temas acima expostos e se mostraram bastantes pessimistas em
relao ao rumo poltico ideolgico que o PT est trilhando e desanimado quanto ao
retorno do PT s suas origens. Sobre isso, Demier (2003) pontua em sua
apresentao do livro A transformao do PT e os rumos da esquerda no Brasil,
[...] o PT das greves e das lutas visto seno como um adolescente rebelde e contestatrio que inevitavelmente caminha para um amadurecimento responsvel familiar-profissional, livrando-se enfim das aventuras e inconsequncias da jovialidade. O olhar para a infncia petista nesse tipo de abordagem assemelha-se ao ato de um acadmico ex-marxista que, ao olhar sorridente para sua antiga opo terica e percebendo como evolura intelectualmente, a toma como pueril e rasteira, localizando-a como algo datado e que, portanto estava fadado a desaparecer (DEMIER, 2003, p. 8).
O posicionamento poltico do PT tem sido discutido diuturnamente no s por
correligionrios, mas tambm por polticos e intelectuais externos ao mesmo, isto
porque, como disse o prprio Demier (2003, p. 9), agora os rumos e as diretrizes do
18
Partido dos Trabalhadores no dizem respeito mais somente militncia da
esquerda em geral, e sim ao conjunto da sociedade brasileira.
No terceiro captulo ser apresentado um panorama geral sobre a vida urbana,
os direitos fundamentais do cidado e as condies de vida dos muncipes,
principalmente nos bairros perifricos, onde as dificuldades em serem atendidos em
suas necessidades bsicas so maiores. Ser analisado o resultado do processo de
implantao do Oramento Participativo e a proposta de participao popular nas
prioridades dos investimentos e por fim, se houve execuo de obras de
infraestrutura nos bairros de periferia que melhorasse a vida dos moradores.
A experincia emprica em relao histria poltica do municpio exerceu
grande influncia. Foi motivador tambm a veleidade de pesquisar os fatos polticos
que alimentaram a histria do municpio de Cachoeiro de Itapemirim-ES, no campo
da disputa eleitoral, das transformaes sociais, do acesso aos servios pblicos
essenciais e que depende do poltico no interesse da realizao de levantamentos
sobre este assunto, principalmente em relao s novas propostas de polticas
pblicas apresentadas pelo governo petista. Sobre a importncia da poltica na vida
da sociedade, Rmond (2003), em seu livro Por uma histria poltica afirma,
[...] o historiador do poltico no reivindica como objeto de sua ateno preferencial essa hegemonia; no pretende que tudo seja poltico, nem ter a imprudncia de afirmar que a poltica tem sempre a primeira e a ltima palavra, mas constata que o poltico o ponto para onde conflui a maioria das atividades e que recapitula os outros componentes do conjunto social (RMOND, 2003, p. 447).
A participao da vida poltica, seja em escala municipal, estadual ou nacional,
faz toda a diferena no resultado da aplicao das polticas pblicas. Um povo,
participativo politicamente, estar em melhores condies de reivindicar seus
direitos e de apontar aos governantes suas necessidades. Se abster da poltica,
como muitos fazem, abrir mo do prprio destino, pois a poltica influencia a vida
de todos. Sobre isso, Ren (2003) afirma,
[...] se o poltico uma construo abstrata, assim como o econmico ou o social, tambm a coisa mais concreta com que todos se deparam na vida, algo que interfere na sua atividade
19
profissional ou se imiscui na sua vida privada (REMND, 2003, p. 442).
Ainda sobre a participao popular na poltica, Remnd (2003) atesta que sua
longa experincia como historiador permitiu-lhe perceber que houve uma elevao
progressiva por parte do pblico, quando se trata de compreenso dos fatos
polticos e das exigncias a respeito de informao poltica e se inserindo cada vez
mais nesse processo afirma,
[...] os cidados se sentem mais membros de um corpo poltico, e consentem mais que nunca em participar de decises que afetam a coletividade (REMND, 2003 p. 25).
Para que entendermos as aes atuais dos governantes e termos uma
participao ativa na poltica, preciso investigar o passado, que imprescindvel
para a compreenso do presente que permeia este trabalho, em geral, a histria
no somente o estudo do passado, ela tambm pode ser, com menor recuo e
mtodos particulares, o estudo do presente (CHAUVEAU; TTARD, 1999, p.15).
Quando se trata de poltica e do Partido dos Trabalhadores, considerado uma
das maiores agremiaes partidrias da histria recente da poltica com seus 34
anos de existncia, podemos verificar uma vasta produo escrita e que utilizaremos
algumas delas neste trabalho. No entanto, para balizar este estudo, recorremos aos
textos de histria poltica de vrios historiadores, reunidos no livro Por uma Histria
Poltica, organizado por Rmond (2003) e que auxilia a compreenso do todo social
atravs da anlise da participao da vida poltica, processo eleitoral, formao de
partidos entre outros que so de cunho inteiramente poltico.
Enumerar trabalhos acadmicos e obras sobre os assuntos em pauta se torna
tarefa difcil pela quantidade existente, mas podemos destacar, alm do baluarte da
histria poltica acima citado, obras como As transformaes do PT e os rumos da
esquerda no Brasil, organizada pelo historiador Demier (2003), que analisa a partir
de entrevista com fundadores e dissidentes do partido e intelectuais que analisam a
chegada do PT ao poder e as conseqncias polticas e ideolgicas deste feito,
20
poltica econmica e social, reforma agrria, movimentos sociais, socialismo,
democracia partidria e as perspectivas da esquerda no Brasil.
Em Conscincia Poltica e Participao no Oramento Participativo de
Cachoeiro de Itapemirim-ES no perodo 2009-2012, Souza (2012), analisa a
implantao e os resultados do Oramento Participativo no municpio como uma
ferramenta utilizada, geralmente em administraes petistas, por tratar-se de um dos
pilares do Modo Petista de Governar. O autor pontua as falhas e as lacunas da
estrutura e da execuo, a satisfao e a insatisfao dos agentes envolvidos e
principalmente a formao da conscincia poltica da populao ao participar de
aes polticas voltadas para a coletividade.
Outra obra que podemos destacar O Partido dos Trabalhadores e a poltica
brasileira (1980-2006), uma histria revisitada, organizada pelos professores Angelo
e Villa (2009), que rene textos sobre o surgimento, a trajetria e a
institucionalizao do partido, bem como a participao do PT em eleies para a
Cmara de Deputados, as correntes internas do PT, a participao da sociedade
civil no governo Lula entre outros que refletem a importncia do surgimento do
partido, sua trajetria e chegada ao poder, assim como as aes do governo petista,
para a histria poltica brasileira.
A necessidade de organizao da sociedade a partir de movimentos urbanos
para a construo do socialismo por via democrtica e as demandas da populao
urbana, particularmente das periferias, no que tange aos servios pblicos e s
prioridades de investimentos dos recursos pblicos. Temas como democracia
poltica, movimento citadino e poder municipal so pontos importantes da obra de
Castells (1980), sob o ttulo Cidade, democracia e socialismo. Esta obra faz uma
abordagem sobre o que o autor classifica como movimento citadino ocorrido em
Madrid (Espanha) e que foi responsvel pela transformao social ocorrida no pas,
ainda que enfrentando o problema de ordem poltica e econmica do capitalismo
avanado. O referido movimento, como o prprio autor afirma, alm de fazer histria,
fez casas, equipou bairros, plantou rvores, abriu escolas, viajou em novas linhas de
nibus, danou nas festas populares e avanou em outras conquistas para a
populao urbana. Castells (1980) nos d embasamento para escrever sobre a
21
cidade como espao do cidado e inicia a obra apresentando as dificuldades e as
recompensas da luta para a conquista da liberdade, democracia e dignidade do
cidado. De forma metafrica, traduz a luta e a esperana de uma vida melhor,
As grandes mudanas polticas so a expresso de profundos processos de transformao social. Como se a vida se formasse nas entranhas das sociedades e tivesse que percorrer leitos subterrneos at que a fora de sua corrente consiga infiltrar-se nas paredes das prises e sair luz do dia institucional (CASTELLS, 1980, p.13).
Alm de Castells (1980) que aborda temas importantes no contexto social que
diz respeito democracia e o capitalismo, Casanova (1995), em sua obra O
Colonialismo Global e a Democracia, disserta de maneira abrangente a questo da
explorao capitalista de maneira global, dos pases considerados grandes
potncias sobre os pases perifricos, o chamado Terceiro Mundo, principalmente no
que se refere ao endividamento do segundo em relao ao primeiro, e o que isso
representa no aumento da pobreza para a classe trabalhadora e o comprometimento
da democracia. Segundo Casanova (1995), os exploradores sequer querem que se
fale da explorao,
[...] Os que se beneficiam da explorao no querem nem que se pense nela; os que, s vezes tentam denunci-la, no conseguem; e aqueles que a denunciam fazem-no com uma conceitualizao e uma base emprica to frgil quanto suas foras polticas (CASANOVA, 1995, p. 41).
O objetivo desta pesquisa facilitar a compreenso da histria poltica do
municpio de Cachoeiro de Itapemirim, principalmente a partir da fundao e da
chegada do Partido dos Trabalhadores ao poder local e a formulao das polticas
pblicas do governo petista, eleito pelo voto popular em 2008, com promessa de
mudana na poltica e apresentando bandeiras sedutoras, principalmente para a
classe menos favorecida, em geral moradores da periferia, como por exemplo, a
inverso de prioridades, que consiste em comear a trabalhar as necessidades
urgentes, da periferia para o centro, atendendo s necessidades prioritrias dos
cidados que habitam este espao.
Neste contexto, o municpio de Cachoeiro de Itapemirim-ES aponta muitas
necessidades prioritrias, visivelmente no que concerne infraestrutura urbana dos
22
bairros perifricos, que cresceram desordenadamente e sem o acompanhamento do
Poder Pblico que os relegou por muito tempo. Outros servios essenciais como
moradia social, transporte pblico, iluminao pblica e espaos de lazer ainda so
reclamados pela populao cachoeirense, evidenciando uma demanda reprimida
desses servios. Este trabalho no tem a pretenso de analisar todos os atos
administrativos e resultados do governo petista em Cachoeiro de Itapemirim em seu
primeiro mandato (2009-2012), mas se, enquanto proposta de mudana na poltica
que se comprometeu a realizar, conseguiu colocar em prtica os pilares do Modo
Petista de Governar, baseado nos pilares j mencionado acima.
CAPTULO I
CACHOEIRO DE ITAPEMIRIM REVISITANDO A HISTRIA DO MUNICPIO
1 SURGIMENTO E CARACTERSTICAS DO MUNICPIO
Mas eu a levarei para a beira do ribeiro, na sombra fria do
bambual; ali pescarei piaus. H rolinhas. Ou ento ir descendo
o rio numa canoa bem devagar e de repente dar um galope na
correnteza, passando rente s pedras, como se a canoa fosse
um cavalo solto...
Rubem Braga
O municpio de Cachoeiro de Itapemirim est localizado no sul do Estado do
Esprito Santo, encravado entre as montanhas e s margens do rio Itapemirim, que
atravessa a cidade de norte a sul, onde o grande cronista Rubem Braga quis que
fossem jogadas as cinzas do seu corpo. No entanto, passou por vrias etapas
polticas at ganhar o ttulo de municpio emancipado. Primeiro foi freguesia (1856),
com o nome de Parchia de S. Pedro das Cachoeiras de Itapemirim, depois foi vila
(1867), posteriormente comarca (1876), e finalmente cidade, tendo como primeiro
prefeito o Coronel Francisco de Carvalho Braga, de famlia portuguesa, da cidade de
Braga e pai do poeta Newton Braga e do cronista Rubem Braga. A origem do
municpio pode ser verificada na descrio de alguns historiadores, entre eles,
Marins,
habitaes ribeirinhas, disseminadas rio abaixo; s vezes rodeadas de palissadas protectoras, habitadas por caboclos e mestios. Pequenas roas em volta, onde por egual se cultivava a mandioca as bananeiras e algumas touceiras de canna de assucar. A pesca e a caa provio fartamente vida. Raizes e benzeduras, curavo os males do corpo (MARINS, 1919, p.135).
O nome do municpio alvo de curiosidade devido utilizao do substantivo
masculino cachoeiro ao invs de cachoeira, porm, na poca, isso era uma
maneira prpria dos brasileiros, principalmente dos habitantes do Esprito Santo. H
tambm outras verses como: que veio da simplificao popular de encachoeirado,
24
que existia na margem esquerda do rio um cajueiro e os navegantes do rio o
chamavam de cajueiro do Itapemirimetc. Passou a receber vrias denominaes
at ser o que foi grafado definitivamente Cachoeiro de Itapemirim, no ato da
instalao da comarca, em 1877, na regncia da Princesa Isabel e tambm em 1884,
quando a Cmara Municipal informou para o Dicionrio Geogrfico do Brasil que A
sede do municpio Cachoeiro de Itapemirim.
Como j exposto, a sede do municpio nasceu s margens do rio e cercada
por colinas que no passado eram lavouras de caf. Depois, passaram a abrigar
pequenas culturas que abasteciam a cidade e, posteriormente, foram loteadas para
dar lugar aos bairros residenciais. Mais ao longe, a rea toda rodeada por uma
cadeia de montanhas rochosas, destacando-se uma delas como smbolo do
municpio, o Pico do Itabira ou Pedra do Itabira, tombada como patrimnio natural
pelo Conselho Estadual de Cultura. Marins descreve de forma quase potica a
cidade entre as montanhas,
Para alm da zona urbana comeam as grandes montanhas rochosas, que emergem de valles profundos, talhados em socalcos e alcantis em cujas bases serpeam em rpidos declives e correm amortecidas nas planuras alagadas onde vicejam gramneas densas, as aguas dos innumeros ribeires, que cruzam por todas as terras dos districtos, banhando-as fartamente. De toda cidade avista-se, como vedetta mudo das geraes que passam. A rocha Itabira de bizarra estructura (1), destacando-se no azul do firmamento (MARINS, 1919, p. 47).
Cachoeiro de Itapemirim uma regio privilegiada devido sua localizao
geogrfica, j que est prxima vrias rodovias federais, capital Vitria-ES e ao
Rio de Janeiro-RJ, que possuem importantes portos, o que facilita muito o avano
econmico do municpio. No passado, contou com o desenvolvimento do vale do
Itapemirim foi fundamental para a formao do municpio de Cachoeiro de
Itapemirim, que se tornou um importante plo da economia da provncia do Esprito
Santo. Sobre esta importncia do cenrio da regio sul o
grande entusiasta do desenvolvimento do vale do Itapemirim, o governador Francisco Alberto Rubim falou da existncia de um caxoeiroa seis lguas de distncia (hoje Cachoeiro de Itapemirim), onde mandou estabelecer, para proteo e apoio ao desenvolvimento da regio, dois quartis, um na parte norte,
25
guarnecido por tropas da capitania do Esprito Santo, e outro no lado sul do rio, construdo e guarnecido, estranhamente por soldados da Segunda Diviso de Minas Gerais. Esses quartis, com a denominao de quartel da Barca, em homenagem ao conde da Barca, deram origem a Cachoeiro de Itapemirim e estavam situados prximos de onde hoje o Cemitrio Municipal (lado norte) e incio do bairro Baiminas (lado sul) (OLIVEIRA, 2008, p. 527-528).
O municpio de Cachoeiro de Itapemirim, cortado pelo rio, possua um servio
de transporte rudimentar uma canoa para fazer a travessia das pessoas de uma
margem outra, mediante o pagamento da passagem pelo usurio, sob um contrato
firmado com a Cmara Municipal. Cada embarcao comportava oito passageiros e
o valor da passagem era oitenta ris. O ltimo contratante do servio de transporte
fluvial foi o negro Felipe da Silva Costa, em 1887. No mesmo ano, foi inaugurada a
Ponte Municipal, inaugurada em 11 de junho de 1887, e a travessia era feita sob a
cobrana de pedgio at o ano de 1920, quando as despesas com a construo
foram totalmente pagas e ento foi liberada a passagem gratuita. At ento, a
Cmara a alugava a um particular para explor-la. O valor da passagem baseava-se
numa tabela de preos que adotava critrios como: pessoa calada, carro com carga
ou sem carga, caf ou outro produto transportado por pedestres era cobrado por
quilo, litro ou fracionado etc. A cobrana era efetuada de um lado e do outro da
ponte (BRAGA, 1986, p. 35).
O lugarejo foi se desenvolvendo s margens do Itapemirim, com a
colonizao vindo rio acima e as embarcaes sendo obrigadas a parar, devido s
corredeiras que dificultavam a navegao, na altura do Baiminas e do lado norte, em
frente, onde depois seria, a Fbrica de Cimento, atualmente desativada. Nesta
regio, foram construdas as primeiras casas do municpio e, posteriormente, tornou-
se importante polo econmico, principalmente pela utilizao do rio Itapemirim como
transporte fluvial para passageiros e escoamento de produtos como madeira, caf,
cana-de-acar, que eram transportados at o porto da Barra.
Grandes extenses de terras foram dominadas por plantadores de caf
formando os latifndios na regio, quando as amplas negociaes comerciais no
sculo XIX eram realizadas pela elite cafeeira. Em 1856, viviam em Cachoeiro e nas
grandes fazendas ao redor, 3.561 pessoas, sendo 2.141 escravas (BRAGA, 1986, p.
26
25), havendo, desta forma, mais escravos que pessoas livres. Com a abolio da
escravatura, em 1888, os libertos foram entregues prpria sorte. Segundo
Bittencourt, (2006, p. 548), em Cachoeiro, concentrava-se o nmero de 6.965 dos
13.403 escravos que havia no estado no dia da abolio, considerado o maior
contingente do Imprio D-se o incio favelizao e, por conseguinte,
desigualdade social no Brasil, refletida at nos dias atuais, processo que foi
agravado ainda mais com o desenvolvimento industrial nos grandes centros urbanos
e pela desvalorizao do trabalhador rural nesse perodo. As habitaes foram
sendo construdas margem dos centros urbanos sem nenhum acompanhamento
tcnico profissional, sem infraestrutura e sem o olhar criterioso do Poder Pblico.
Sobre o tema, Gabriel Bittencourt discorre,
A industrializao engendra um efeito social bastante adverso, sobretudo em pases de grandes desigualdades sociais e em vias de desenvolvimento. Ela eleva os ndices de favelizao nas reas urbanas, atrai trabalhadores das regies vizinhas e eleva o preo da terra urbana, desorganizando o seu espao. Enfim, promove a poluio urbana, degradando o nvel de vida nas grandes cidades [...] (BITTENCOURT, 2006, p. 426).
Por causa da alta demanda de transporte de caf, o rio Itapemirim passou a
ser insuficiente nessa funo, e para atender a essa necessidade, foram construdas
as ferrovias Caravelas (1887), Leopoldina Railway (1903) e Estrada de Ferro
Itapemirim (1926), transformando a paisagem natural do municpio,
(...) mesmo a zona cafeeira de Cachoeiro de Itapemirim era considerada mal servida de meios de transportes. At a chegada dos trilhos da Leopoldina Railway (1903). O sistema integrado pela Estrada de Ferro Caravelas (inaugurada em 1887), era tido como insuficiente: uma ferrovia acanhada, mal construda e encravada num porto fluvial sem boas condies navegabilidade. Da a criao posteriormente, da Estrada de Ferro de Itapemirim (1926), cujo leito acompanhava parte do curso do rio do mesmo nome e visava beneficiar a produo do baixo Itapemirim, particularmente da Usina Paineiras (BITTENCOURT, 2006, p. 306).
A construo das ferrovias foi de grande importncia para o desenvolvimento
econmico do municpio que, geograficamente, posicionava-se em local estratgico
e isso facilitava o escoamento da produo de caf e a
articulao econmica entre os municpios limtrofes,
27
Cachoeiro de Itapemirim constitua um entroncamento ferrovirio; alm das linhas para o Rio de Janeiro e para Vitria, possua outras para o litoral (at Barra do Itapemirim e Maratazes, ferrovia construdas nos anos 1920 pelo governo estadual), para Castelo e uma ainda que, passando por Alegre e Guau, chegava a Carangola, j em Minas Gerais (ACHIAM, 2010, p. 58).
Embora a principal atividade econmica fosse a lavoura de caf, outras
vocaes econmicas foram surgindo, e com o fornecimento de energia eltrica e de
cursos de gua que possibilitavam sua gerao (Cachoeiro foi a dcima cidade do
pas e a primeira do estado a adquirir luz eltrica), o municpio passou a ser atrativo
para investimentos dos governantes estaduais e empreendedores particulares que
traziam divisas e desenvolvimento para o municpio,
Fbricas de tecidos, de cimento, de leos, serrarias, usinas de acar e novas unidades de produo de energia eltrica, dentre outras atividades, passaram a se instalar na regio. Empregos surgiram, e com isso o comrcio ampliou seu mercado consumidor, tornando-se tambm uma atividade econmica importante para o municpio (COSTA; SALDANHA, 2011, p. 170).
Em relao importncia poltica do municpio, Cachoeiro de Itapemirim foi
bero de quatro presidentes do Estado: Jernimo de Sousa Monteiro (1908-1912),
Marcondes Alves de Souza (1912-1916), Bernardino de Sousa (1916-1920) e
Florentino Avidos (1924-1928). No que tange cultura, o teatro remonta segunda
metade do sculo XIX, precisamente em 1866, quando surgiu o S.P. Ensaios
Dramticos. Posteriormente, foi fundada a Sociedade de Recreio Dramtico
Cachoeirense, que apresentava peas e atraa muitas pessoas para os espetculos.
No incio do sculo XX, as apresentaes aconteciam no Caadores Carnavalesco
Clube e depois no Cine Teatro Central. Havia ainda o Cine Teatro Santo Antnio e o
Cine Guandu. A msica tambm se fez presente por meio da Escola de Msica de
Cachoeiro de Itapemirim, criada em 1930 pelo professor Alfredo Herkenhoff, que
oferecia aulas de solfejo, violino, piano, violoncelo, cornetin, trombone, flauta,
saxofone e canto, e no que se refere bandas de msica, ainda mais longnquo os
registro, pois datam de 1880, 1900, 1917, 1922 e 1931, entre elas, duas mantm
sua atividades, a banda Lira de Ouro (1922) e a banda 26 de julho (1931). Outras
aes culturais aconteciam, como festejos carnavalescos, temporadas de jantares
danantes no Hotel Itabira, concurso promovido pela loja Nova Sria sobre
28
conhecimentos gerais, com prmios que iam desde boneca a caminho,
construes de coretos em praas pblicas, em geral utilizado pelas bandas
musicais que atraam tanto o pblico infantil como o adulto. No campo das letras,
tambm havia bons atrativos como os poetas Dr. Frederico Codeceira e Newton
Braga, o cronista Rubem Braga que em 1936 escreveu e publicou O Conde e o
Passarinhoe bateu recorde de vendas na cidade.A venda de livros em Cachoeiro
era considerada um bom negcio entre o exploradores do ramo, uma vez que os
cachoeirenses mostravam-se vidos por leitura de todo o tipo. O gosto literrio
variava de autores estrangeiros como Ea de Queiroz, Delly e Ardel a autores
nacionais como Jos de Alencar, Castro Alves, Casimiro de Abreu e outros.
O municpio de Cachoeiro de Itapemirim foi palco de muitas atividades
culturais e a vida social se enchia de encantos. Houve tempos de glria no s no
campo econmico, mas tambm no poltico e cultural,1
Ns estamos falando com os olhos do passado, quando Cachoeiro subiu, elevou-se e ocupou a posio de capital da indstria do Estado, conceito que, alis, tambm chegou a alcanar na rea concernente poltica, bem como, no espao cultural [...] (MACIEL, 2003, p. 37-38).
Nessa poca, Cachoeiro de Itapemirim exercia forte atrao sobre polticos
influentes, investidores, empresrios da indstria e do comrcio e trabalhadores de
outros lugares para se estabelecerem na sede do municpio. Apenas os artistas,
cantores e escritores continuavam migrando, principalmente para o Rio de Janeiro,
como Dora Vivcqua (Luz Del Fuego), Carlos Imperial, Jece Valado, Roberto
Carlos, Rubem Braga, entre outros
Em Cachoeiro de Itapemirim -ES, assim como em todo centro urbano
brasileiro, os trabalhadores foram chegando em grande nmero, vindos do campo
para vender sua fora de trabalho nas indstrias que se instalavam no municpio.
Sem opo de moradia no centro, foram construindo seus barracos nas reas
perifricas da cidade. Veiga sustenta que os fenmenos de aglomerao e de
1 Ver Maciel, 2003.
29
congesto urbana so obviamente inseparveis da debilitao de certas regies e
do xodo rural (VEIGA, 2002, p. 281).
No centro da cidade, precisamente nas ruas 25 de Maro, Moreira, Dona
Joana, Costa Pereira, Cel. Francisco Braga, Prof. Quintiliano, Bernardo Horta, Praa
Jernimo Monteiro, assim como na Rua Moreira, do outro lado do rio, alm de outras
vias centrais, foram construdos os prdios ou casas para os moradores das famlias
mais tradicionais, e no entorno foram surgindo empreendimentos como o Mercado
Municipal, Palcio Bernardino Monteiro, que posteriormente se transformou em
colgio, Igreja Nosso Senhor dos Passos, Centro Operrio e Proteo Mtua, a
Escola Gracia Guardia, Catedral de So Pedro, o Iate Clube, a Escola Liceu Muniz
Freire, o Frum, a Escola de Comrcio, o Mercado da Pedra, a Agncia dos Correios,
agncias bancrias, cartrios e, posteriormente, hotis, restaurantes, livrarias,
clubes, teatros, cinemas, lojas comerciais, fbricas, supermercados, farmcias, entre
outras atividades necessrias populao cachoeirense.
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1.1 A capital do mrmore e granito
Antes de se estabelecer com potencial explorador do mrmore e do granito,
Cachoeiro de Itapemirim percorreu outros caminhos econmicos, como a explorao
do calcrio, fabrico de cal, tijolos e telhas, fabrico de cimento e posteriormente, a
extrao mineral das rochas encravadas nas regies de Itaoca, Gironda, Soturno,
Santana e tantas outras das proximidades que foram sendo descobertas.
Existem diferenas entre as rochas do mrmore e o granito, no entanto, a
principal est na gnese e na sua composio mineralgica, que sofre influncia
pelas condies da formao das rochas. Os mrmores so rochas constitudas em
grande parte por calcita e dolomita, com acrscimo de alguns minerais, tais como
mica, clorita e etc, enquanto os granitos tem sua formao predominantemente por
quartzo, feldspato, biotita ou muscovita e anfiblios, o que garante a colorao
diferente e diversificada, de acordo com sua formao.
Segundo Maciel (2003), a primeira marmoraria era a do Sr. Waldemar Alves
Tavares, instalada na regio central da cidade, na Rua 25 de Maro, e consta de
junho de 1919, com o nome de Marmoraria Itabira. Por muitos anos, era a nica
marmoraria existente e trabalhava com a construo de mausolus, lpides,
catacumbas, estatuetas de mrmore, mesas, lavatrios e outros objetos de utilidade
domstica.
Apesar da importncia econmica, com atividades em vrios ramos, o setor
de extrao e serragem de mrmore e granito comeou a se destacar em Cachoeiro
de Itapemirim. Em 1977, das 44 empresas de beneficiamento de mrmore do Estado,
32 estavam instaladas no municpio, o que corresponde a 73% do total. No entanto,
as mesmas enfrentavam dificuldades no transporte da produo, j que as vias de
acesso se encontravam em situao precria epela falta de investimento e
incentivos por parte do governo e ainda porque os grupos mineradores tinham
interesse apenas na explorao e aproveitamento do calcrio,
Os grandes grupos mineradores, em poder dos quais estavam as reservas minerais do Estado, s se interessavam pela explorao e
31
aproveitamento do calcrio, dificultando o acesso das empresas voltadas para o beneficiamento do granito e do mrmore, assim como tambm, a precariedade das vias de acesso encarecia sensivelmente o preo do frete[..] O mrmore nacional, segundo seus produtores, s se tornava invivel devido ao fator frete. Sua qualidade era tida como sem competidor no mercado internacional (BITTENCOURT, 2006, p. 405-406).
Com o passar dos anos, ocorreram diversas transformaes no espao
geogrfico. Em 1995, houve a retirada dos trilhos do centro da cidade para dar lugar
construo de uma das principais vias, a Linha Vermelha. A cidade perdeu o ttulo
de polo econmico, em razo de fechamentos ou transferncias de indstrias para
outros lugares, em consequncia dos altos impostos e da guerra fiscal, agregados
falta de capacitao profissional e de investimentos e o no acompanhamento da
modernizao dos equipamentos. No entanto, com a descoberta das jazidas
minerais na regio, os investimentos migraram para a explorao do setor de
mrmore, granito e rochas ornamentais. Segundo Maciel (2003), em 1990 acontecia
a 2 Exposio de Mrmore e Granito de Cachoeiro de Itapemirim e a beleza e alta
qualidade e variedade das amostras seria motivo de
atrao irresistvel aos antigos gregos, egpcios e romanos que ornamentavam suas construes com mrmores rarssimos- os palcios, os templos, as manses e os teatros; fascinaria aos orgulhosos faras, que irigiam enormes construes, ornamentando-as com mrmores especiais dificilmente encontrados; causaria deslumbramento ao rei Artaxerxes da Prsia, que pavimentava seus palcios com os preciosssimos mrmores de Paros. Superaria as belezas dos palcios Assrios-Babilnicos, as enormes construes consagradas ao culto da divindade, o templo da Fortuna Viril. O famoso templo de Jerusalm. Tudo edificado de mrmore esmeraldino. E, pode-se dizer, os blocos marmreos expostos nesta exposio, procedentes de Gironda, Itaca, Prosperidade, Vargem Alta etc... causaria superioridade s cavas da Ilha de Paros, na Grcia, s cavas do Lcio, s massas de Carrara, na Itlia, aos mrmores Porfiro rubro do Egito, ao Altssimo, o Corchia, o Monte Costa, o Estaturio, o Porraci e o Branco Altssimo, antigamente muito famosos (MACIEL, 2003, p. 396-397).
Em junho de 1982, uma caravana de empresrios do setor do mrmore e do
granito participa pela primeira da Feira de Mrmore e Mquinas, em Carrara, na
Itlia. Esse fato foi importante para estabelecer o contato com compradores
internacionais e para apresentar os produtos brasileiros, que foram expostos no
32
evento. Alm disso, os empresrios brasileiros puderam conhecer novidades no
ramo a partir de visitas s empresas italianas.
Entretanto, o mrmore de Cachoeiro de Itapemirim-ES, somente foi
reconhecido por sua variedade e qualidade no final da segunda metade do sculo
XX, pois, at ento, a explorao desses minerais era duvidosa. Ainda que alguns
gelogos atestassem sua existncia no Brasil, raramente eram encontrados e, ainda
assim, apresentavam qualidade muito abaixo da expectativa. A preferncia era pelo
mrmore da Frana, Alemanha, Holanda, Grcia e de outros pases de onde eram
importados para c. Um dos mais famosos era o mrmore de Carrara, da Itlia,
cobiado pelo mundo todo. Atualmente, o municpio de Cachoeiro de Itapemirim
promove a Feira Internacional do Mrmore e Granito, que est na 25 edio e atrai
pessoas de todo o mundo interessadas no negcio das rochas ornamentais.
O municpio, aps o investimento no setor do mrmore e granito, deu um salto
na modernizao e passou a ser destaque no ramo no sul do estado do Esprito
Santo, tornando-se responsvel pelo fornecimento de 80% do mercado brasileiro de
mrmore, sendo o maior plo de beneficiamento de rochas e fabricao de
mquinas e equipamentos para o setor de rochas das Amricas.
No entanto, para chegar a essas riquezas nas profundezas da terra, as
empresas do setor deixaram profundas cicatrizes no meio ambiente, em um rastro
de destruio inimaginvel por onde passaram explorando. Tambm verdade que
a legislao ambiental no era to rigorosa como atualmente o so. O produto
seguia em direo ao exterior, que muitas vezes comprava a matria-prima bruta e
nos vendia por alto preo, j trabalhada.
Com o setor cada vez mais em ascenso, foi inevitvel organizao da
classe trabalhadora em associao e posteriormente em Sindicato.Em 1989, um
grupo de trabalhadores liderados por parte da igreja catlica do municpio de
Vargem Alta-ES, participou da Caminhada dos Mrtires, que comeou na
localidade de Alto Moledo. Essa caminhada teve o objetivo de denunciar o grande
nmero de acidentes que acontecia com os operrios nas jazidas de extrao de
mrmore e granito e nas serrarias daquela regio. A partir deste ato, foi fortalecida a
33
ideia de se formar o Sindicato dos Trabalhadores do Mrmore e Granito, que
atualmente atua em todo o estado do Esprito Santo.
O Sindicato dos Trabalhadores do Mrmore e Granito se fortaleceu com o
apoio do Partido dos Trabalhadores, que posteriormente ganhou musculatura
poltica devido ao grande nmero de trabalhadores do setor que incorporou
militncia do partido. A representatividade de classe deste sindicato foi tanta que,
em 1999, o ex-Presidente Lula, que poca ainda no estava neste cargo, veio a
Cachoeiro de Itapemirim ES para visitar o distrito de Itaoca Pedra, devido ao
volume de denncias de acidentes de trabalho, e ficou conhecido como lugar de
vivas e mutilados. A influncia poltica do rgo de classe no municpio foi
relevante, pois em 2008 teve um de seus dirigentes, Gildo Abreu, que era suplente,
assumido a vaga de vereador pelo Partido dos Trabalhadores.
Essa revisita Histria do municpio de Cachoeiro de Itapemirim uma
tentativa de lanar um pouco de luz sobre o presente, para melhor compreenso do
processo poltico que vivenciamos, a partir do levantamento dos fatos histricos,
polticos, econmicos, sociais e culturais. Para entender a histria do tempo
presente, necessrio revirarmos o passado.
CAPTULO II
2 O PT FUNDADO EM SO PAULO-SP
O marxismo no est morto, porque s seria possvel matar o
marxismo se acabassem com o problema que lhe d origem. O
marxismo no uma simples resposta aos problemas postos
pelo capitalismo, o marxismo a reformulao de um campo
de reflexo e a exigncia de uma forma de pensar...
Virgnia Fontes
Quando se pensa uma organizao partidria, o grupo fundador leva em
considerao a afinidade ideolgica que dar sustentao aos planos, s aes e
principalmente longevidade da vida do partido. Os objetivos se alinham, ainda que
haja divergncias internas sobre a ttica e o pensamento converge para os mesmos
ideais. Os indivduos conseguem se identificar atravs de smbolos, cdigos,
palavras, gestos e outras formas de identificao e se agrupam de acordo com estes
interesses comuns. Sobre isso Berstein (2003) afirma,
Na realidade, dirigentes polticos e eleitos, militantes e eleitores simpatizantes vivem num certo clima cultural que faz com que as prprias palavras que empregam sejam uma referncia implcita doutrina sem que seja necessrio exprimi-la, pois algumas frmulas so de algum modo codificadas e tm para aqueles que as ouvem uma ressonncia que supera singularmente de primeiro grau, remetendo a toda uma tradio alimentada de lembranas, acontecimentos precisos, datas chaves[...] (BERSTEIN, 2003, p. 87-88).
Podemos usar como exemplo desta linguagem codificada as palavras
camarada, utilizada pelos membros do partido comunista e companheiros,
utilizada pelo Partido dos Trabalhadores no Brasil, assim como os smbolos
utilizados como a foice e o machado pelo primeiro e a estrela pelo segundo,
permitem a identificao e a compreenso dos membros do grupo.
35
Sob essa tica, nasceu o Partido dos Trabalhadores no Brasil e em 10 de
fevereiro de 1980 foi aprovado pelo movimento pr-PT, no Colgio Sion, em So
Paulo-SP, o Manifesto Partido dos Trabalhadores, publicado no Dirio Oficial da
Unio, em 21 de outubro de 1980. De acordo com o documento, o Partido dos
Trabalhadores surge da necessidade sentida por milhes de brasileiros de intervir na
vida social e poltica do pas para transform-la. Havia grande nsia de liberdade e
democracia por parte do povo brasileiro, que vivia os derradeiros momentos da
ditadura militar, ainda sob forte temor. Por isso, talvez, a urgncia em construir um
novo caminho poltico para trilhar. O momento era propcio2 e frtil para a formao
de um partido que tinha como proposta a incluso das massas nas decises internas
e ainda na defesa dos direitos dos trabalhadores e a participao nas disputas
eleitorais seria uma das ferramentas a ser utilizada para a mobilizao social e
formao da conscincia poltica da classe trabalhadora. A respeito disso Silva
(2009), em seu texto Nem reforma nem revoluo: a estrela branca, afirma,
O Parido dos Trabalhadores nasceu enquanto crtica contundente poltica eleitoreira e manipuladora das massas, prpria dos partidos burgueses e populistas.Gestado dentro da ordem, o PT manifestou o objetivo de priorizar a organizao autnoma dos trabalhadores. A participao do jogo eleitoral e parlamentar pautava-se pela perspectiva da luta pela organizao e pela elevao da conscincia poltica da classe trabalhadora contra a ordem social vigente (SILVA, 2009, p.18).
No seio da organizao do Partido dos Trabalhadores, segundo o documento
de fundao, havia lugar para todos que montaram uma dura resistncia
democrtica, incluindo operrios industriais, assalariados do comrcio e dos servios,
funcionrios pblicos, moradores da periferia, trabalhadores autnomos,
camponeses, trabalhadores rurais, mulheres, negros, estudantes, ndios e outras
minorias exploradas pelo capitalismo, que imbudos de um mesmo objetivo
formaram o que alguns historiadores classificam de famlia poltica, como Berstein
(2003) afirma,
[...] Essa cultura difusa se exprime por um sistema de referncias em que se reconhecem todos os membros de uma mesma famlia poltica, lembranas histricas comuns, heris consagrados,
2 O perodo anterior ao citado, foram os anos de Ditadura Militar no Brasil. O momento se torna
propcio, pois a democracia restabelecida aps o fim do regime, em 1985.
36
documentos fundamentais (que nem sempre foram lidos), smbolos, bandeiras, festas, vocabulrios de palavras codificadas etc, [...] (BERSTEIN, 2003, p. 88-89).
No mesmo sentido, segue discorrendo sobre a afinidade ideolgica e por que
no dizer da empatia entre os membros da famlia poltica, por razo de vivenciarem
as mesmas questes ou no se conformarem com determinadas situaes,
formando esta famlia poltica,
[...] Assim a cultura poltica aparece, em suas diversas manifestaes, como a linguagem comum simplificada (da qual o rito a forma mais sumria) dos membros de uma formao, que desse modo fazem profisso de ideologia sem precisar necessariamente exprimi-la explicitamente, mas com a certeza de serem facilmente compreendidos por todos os membros do grupo [...] (BERSTEIN, 2003, p. 89).
Esse grupo traa planos, idealiza projetos, monta estratgias, organiza
discursos, promove debates, formula ideias, defende concepes, levanta bandeira
da causa que acredita, recruta aliados, desenvolve tticas, estuda teorias, faz
enfrentamentos no campo ideolgico, etc.., e para tanto, se faz necessrio saber
quem so e onde esto as foras externas que podem fortalecer a organizao.Se
faz necessrio tambm que esse grupo tenha uma liderana para ter como
referncia, para direcionar suas aes na luta poltica para conquistar seus objetivos.
Nesse caso, de acordo com Arcary e Fontes (2003), Luiz Igncio Lula da Silva se
despontou como tal e teve sua liderana potencializada devido ao vcuo que existia
no capo poltico da esquerda,
[...] Lula surgiu como um grande lder operrio, todavia a construo do PT foi potencializada pelo fato importantssimo de que aqui quase no havia competio no campo da esquerda. A esquerda brasileira tinha sido destruda. Por isso, Lula um lder operrio que praticamente no precisou competir com ningum, porque o velho PCB tinha se desmantelado e a esquerda dele(j rompida com o partido) tinha sido fracionada e se envolvido numa aventura militarista- o herosmo dos que lutaram contra a ditadura merece respeito, evidentemente. A esquerda, fisicamente destruda e desmantelada, deixou uma lacuna enorme, e nesse momento que o PT surge e ocupa rapidamente esse vazio.[...] (ARCARY; FONTES, 2003, p. 96).
37
Neste caso, de acordo com o Manifesto, para que o PT pudesse desenvolver
sua estratgia, seria necessria uma relao permanente com os movimentos
sindicais e populares que lhe deram origem. Isso revela a dependncia inicial do PT
dessas organizaes, que foram frentes de luta e resistncia contra a opresso a
que durante longo tempo foi submetido o povo brasileiro3. Como afirma Braga (2009)
sobre o surgimento do partido, o PT surge em um perodo da histria brasileira em
que a assimetria entre a ordem social e a ordem poltica agudamente questionada,
traduzindo-se na crise em torno da democratizao do sistema poltico.
O manifesto afirma ainda que o partido diferente por ser democrtico amplo
e aberto e que so as bases que mandam. Ele se faria presente em todas as lutas
do movimento popular, a fim de respeitar e defender a autonomia das organizaes
populares e tambm por seu objetivo poltico: lutar pela construo de uma
democracia que garanta aos trabalhadores, em todos os nveis, a direo das
decises polticas e econmicas do pas. A esse respeito Berstein (2003) disserta,
[...] num partido de tradio democrtica onde os membros constituem uma realidade, a opinio deles que em ltima anlise prevalece, apesar das tendncias oligrquicas reais, que conseguem retardar ou nuanar as tendncias dominantes da base, mas jamais anul-las (BERSTEIN, 2003, p. 86).
Para Oliveira (2008), importante discutir sob qual ideologia foi fundado o
Partido dos Trabalhadores para melhor compreenso das teorias e das prticas
defendidas pelos seus idealizadores. Em que proposta para a poltica brasileira o
partido se ancora e se apresenta para o povo. Sobre o assunto, coloca em seu
trabalho de dissertao,
Essa meno acerca da ideologia importante, porque nos documentos do PT comum a apresentao de suas propostas polticas como as mais vantajosas, em detrimento de tudo aquilo que existia na poltica brasileira, ou seja, o partido colocava-se como aquele verdadeiramente defensor da tica e da moral da poltica. As demais agremiaes existentes no Brasil eram colocadas como imorais e demaggicas. Essa demonstrao de vantagens de uma proposta sobre outra marca o carter de seu discurso, no nvel mais simples (OLIVEIRA, 2008, p. 39).
3 Manifesto do Partido dos Trabalhadores de 1980, escrito em 1980 aps a consolidao do partido
no cenrio poltico.
38
A democracia interna do partido sempre foi motivo de orgulho para os
militantes do PT, uma vez que permite a formulao e a defesa de ideias
divergentes. A formao de correntes no interior do partido legtima e reconhecida
pela direo nacional. Essas tendncias disputam o poder, divergem sobre
concepes e prticas e at se contradizem, sendo considerado por alguns como
salutar identidade partidria e como fragilidade por outros.
No entanto, com a vitria do Partido dos Trabalhadores em 2002 para
Presidncia da Repblica, foram aparecendo as divergncias internas e militantes
histricos foram expondo suas insatisfaes, tecendo as crticas a um PT que estava
fugindo ao propsito de sua criao. Um deles foi o, ento deputado estadual pelo
Par, Bab4, que ao ser entrevistado pelo historiador Demier (2003), afirma,
[...] As lideranas foram cerceando os espaos democrticos para poder, cada vez mais, fazer com que a base deixasse de participar das decises do partido. Antes era muito fcil ir para qualquer encontro, nos quais assistamos a debates de todas as foras polticas. A direo do partido foi cerceando sistematicamente esses debates; ao mesmo tempo que reduziam - o que era um dos trunfos do PT - a questo da democracia interna, com o intuito de castrar qualquer pensamento diferenciado dentro do PT[...] (DEMIER, 2003, p. 24).
Outros militantes de esquerda e simpatizantes do PT tambm se
posicionaram contrariamente aos rumos ideolgicos que o partido estava tomando
sob a direo nacional, afirmando que o mesmo estava deixando de ser um
movimento de base para ser meramente eleitoral. Em entrevista ao historiador
Felipe Demier, a professora de Histria, Virgnia Fontes5 afirma,
[...] se um partido existe unicamente para conquistar cargos no executivo, sua funo simplesmente um jogo do mercado eleitoral, e no a organizao das vontades, que a articulao orgnica entre essa organizao e a formao das conscincias, no sentido
4 Joo Batista Oliveira de Arajo, Bab, nascido em Faro (PA) engenheiro mecnico, fundador do PT
e da CUT, militante histrico, passando por vrios cargos eletivos, desde vereador em Belm (PA), 4 mandatos de Deputado Estadual e Deputado Federal. Destacou-se pela severidade das crticas poltica econmica do governo Lula, defendendo o rompimento com poltica de subservincia aos banqueiros e a Alca. Fez o enfrentamento chamada cpula do PTacusando Lula, Jos Dirceu, Jos Genono e os demais, de descumprimento das resolues do Partido. Sofreu processo de expulso do PT por se recusar a votar a favor da Reforma da Previdncia. 5 Virgnia Maria Gomes Fontes, professora de Histria na Universidade Federal Fluminense, militante
do PCB (Partido Comunista Brasileiro) durante a ditadura militar.
39
de uma formao conjunta do partido com o movimento de base [...] (ARAJO; FONTES; MATOS, 2003, p. 21).
Desde a sua fundao at a chegada ao poder em 2002 e aps assumir o
governo em 2003, muitas foram as transformaes sofridas pelo PT, causando
rupturas e, conseqentemente a retirada de muitos militantes, voluntariamente ou
no. Muitos militantes, mesmo permanecendo filiados, afirmam desiludidos com o
rumo poltico partido adotou e no se faz mais poltica como antes. Evidente que
todo processo sofre evoluo e em muitos casos o PT precisou se adequar
realidade, mas verdade tambm que houve um recuo no enfrentamento mercado
financeiro internacional, o que contrariou as expectativas de muitos militantes.Muitas
bandeiras da luta social que foram levantadas pelo PT foram deixadas de lado para
cumprir os compromissos firmados com os aliados para ganhar as eleies.
No Esprito Santo, assim como nos outros estados e municpios do pas, a
formao do PT seguiu os passos do PT nacional, com o mesmo perfil de dirigentes
e filiados, orientados pela mesma proposta de construo de democracia, direito
cidadania e que o povo pudesse atuar como dono do poder. Com correntes de
pensamentos diferentes, que divergiam entre si, mas que convergiam quando se
tratava de mudana na poltica do pas, de maneira que os trabalhadores fossem os
beneficiados, o PT capixaba foi se consolidando e se organizando a partir do apoio
popular e das lideranas que foram surgindo,
do meio sindical, despontaram duas grandes figuras na fundao do
PT no Esprito Santo: o mdico Vitor Buaiz, cuja candidatura ao
governo do Estado no incio das conversas parecia certa, e o
jornalista Rogrio Medeiros. Dos movimentos populares e da Igreja
progressista, despontou Cludio Vereza, e dos movimentos de
resistncia armada apareceu Perly Cipriano. Por ocasio da
importante posio poltica que ocupavam nas suas entidades
sindicais e movimentos sociais, essas quatro lideranas acabaram
tomando a dianteira no processo de fundao do partido aqui no
Esprito Santo [...] (OLIVEIRA, 2011, p. 85-85)
O PT capixaba, seguindo as diretrizes do diretrio nacional, lanou
candidatura prpria na primeira eleio ps-ditadura militar, com o nome de Perly
Cipriano para candidato a governador e tinha sua plataforma alicerada no
moralismo, na anticorrupo e na mobilizao das massas. Utilizou-se da campanha
40
eleitoral como meio de organizar a classe trabalhadora na luta por mais liberdade,
melhores condies de vida e combate ao poder econmico.
41
2.1 A organizao do PT em Cachoeiro de Itapemirim-ES
A abertura poltica no municpio de Cachoeiro de Itapemirim acompanhou a
redemocratizao do pas e os partidos que se encontravam na clandestinidade
voltaram a se organizar. No entanto, assim como em So Paulo-SP, um partido de
esquerda estava surgindo como uma novidade. O Partido dos Trabalhadores
demandou grande empenho das foras de esquerda para ser fundado no municpio.
Um grupo de pessoas com afinidade poltica de esquerda, composto por Pedro
Correia Reis, Jos Paradella Netto, Lcio Pinto, Mauricio Luiz Daltio e outros,
trabalharam em prol de filiaes de seus familiares e de simpatizantes, com o fim de
atingir o nmero mnimo exigido pelo Cartrio Eleitoral para Registro de partido,
como afirma Berstein (2003, p. 72), Um partido antes de tudo uma reunio de
homens em torno de um objetivo comum [...] e Silva (2009, p. 32) pontua O PT
fruto do esforo prtico e terico de homens e mulheres. Assim como no Brasil e no
Esprito Santo, a legenda partidria no municpio contou com o empenho de pessoas
que apostavam na transformao social a partir da organizao da classe
trabalhadora.
Era um perodo muito difcil para agregar adeptos, pois a lembrana da
ditadura militar estava ainda latente na memria das pessoas, o que intimidava a
participao ativa do cidado na vida poltica devido ao medo das represlias por
parte de quem detinha o poder, seja poltico, militar ou econmico.Os trabalhadores
temiam, principalmente, as demisses, que ocorriam quando os patres descobriam
o envolvimento dos empregados com a poltica dos partidos de esquerda.
O nmero de filiados fora suficiente para o registro do Partido dos
Trabalhadores. Muitas eram as dificuldades a serem vencidas. Alm das
burocrticas, havia as de cunho financeiro e de formao ideolgica. Ser membro de
partido de esquerda naquele momento era arriscar o emprego, as relaes sociais e
s vezes, a prpria pele. Numa sociedade conservadora, era comum, naquele
momento, rotular como baderneiro, anarquista e comunista aquele que optava por
uma ideologia diferente da convencional.
42
A primeira diretoria do PT foi empossada no dia 19 de julho de 19816, durante
a conveno municipal, nas dependncias da Cmara de Vereadores de Cachoeiro
de Itapemirim, presidida pelo senhor Pedro Correia Reis. A eleio contava com
uma nica chapa para concorrer ao diretrio municipal, formada por: Pedro Correia
Reis, Jos Paradella Netto, Maurcio Luiz Daltio, Rogrio Tavares da Assumpo,
Ronaldo Santana, Tissiani Ferreira Ges Cavalcanti, Saulo Tavares Severo e Jacy
do Nascimento, alm dos suplentes Paulo Antnio de Alvarenga Moura, Carlos
Gamba de Paz e Valdemir Silva Motta. Compareceram 87 filiados na conveno,
contabilizando 85 votos a favor da chapa nica, um voto em branco e outro nulo.
Desse diretrio, a primeira Comisso Executiva do PT ficou assim constituda:
presidente: Pedro Correia Reis; vice-presidente: Jos Paradella Netto; secretrio:
Maurcio Luiz Daltio; tesoureiro: Rogrio Tavares da Assumpo; 1 suplente: Saulo
Tavares Severo e 2 suplente: Jacy do Nascimento. Todas as convenes e eleio
de diretrio eram acompanhadas por um observador da Justia Eleitoral, designado
pelo Juiz Eleitoral da Zona, que assinava o livro de ata por ltimo. Nesta conveno,
especificamente, no foi possvel identificar o nome do representante da Justia
Eleitoral, por causa da assinatura ilegvel.
No ano de 1982, o Partido dos Trabalhadores, recentemente fundado,
apresentou chapa completa para disputar as eleies. O candidato escolhido pelo
PT para concorrer eleio de prefeito foi Pedro Correia Reis, tendo como vice-
prefeito foi Carlos Gamba de Paz. A disputa foi com Roberto Almockadice Valado,
vice Ilo Coelho pelo MDB (Movimento Democrtico Brasileiro), e Alicio Franco, com
vice Joo Atayde pela ARENA (Aliana Renovadora Nacional), saindo vitorioso
Roberto Almockadice Valado, que tinha um histrico no movimento estudantil e na
resistncia contra a ditadura militar, em Cachoeiro de Itapemirim. A votao do
candidato pelo Partido dos Trabalhadores foi irrisria, porm importante para marcar
presena no processo eleitoral no municpio. Alm disso, as condies para
participar da disputa eram precrias: inexperincia eleitoral, dificuldade financeira,
poucos militantes conscientes da importncia do momento, j que a maioria dos
6 Fonte: Livro de Ata, pginas 2 e 3, do Partido dos Trabalhadores de Cachoeiro de Itapemirim.
43
filiados foi para cumprir a exigncia quantitativa da legislao eleitoral. Em reunio
da Executiva, o tema amplamente discutido,
o tesoureiro Paradella abriu os trabalhos colocando as pautas: cartaz,
plstico, pixao e a carta dos candidatos aos eleitores. Assim a
palavra foi passada a companheira Lurdinha que disse que foram
encomendados 5000 cartazes na Frangaf, ficando o oramento em
CR$ 2.250 [...] Antes de passar para o assunto de pixao falaram
Saint Clair e Paradella falando que ajudariam no pagamento do
cartaz. Sobre a pixao falou Fernando que a mesma no deve ser
feita indiscriminadamente e tambm mal feita pois se tornaria
poluio visual, deu a ideia de uma placinha para se pixar, usou a
palavra Nevton falando que a pixao importante para botar os
nomes na rua, para que todos saibam dos candidatos do PT e
sugeriu seu nome para pixar. Foi decidido, ento que se criasse um
comit de pixao com Saulo, Nevton, Mizoca e Joaquim Neiva
Junior [...]7
As dificuldades eram grandes, inclusive na organizao dos documentos, j
que os livros de atas no eram organizados em sequncia numeral, precisando
buscar a ordem dos acontecimentos de acordo com as datas das reunies. Os
membros do diretrio exerciam os cargos que lhe eram confiados mesmo com as
limitaes de cada um, por isso, s vezes, o pesquisador se depara com
dificuldades na investigao.
Em 1984, o PT realizou nova conveno, em 08 de janeiro, s 18 horas, nas
dependncias da Cmara Municipal de Vereadores, com a presena do observador
da Justia Eleitoral Tarcsio Rabelo Cabral8, desta vez com a participao de 81
filiados que votaram na nica chapa apresentada, sem registro de voto branco e
nulo. A nova Executiva para o exerccio do mandato ficou assim composta:
presidente: Pedro Correia Reis; vice-presidente: Octacilino Nunes dos Santos;
secretrio: Saulo Tavares Severo; tesoureiro: Nelson Luiz dos Santos e suplentes
Jos Paradella Netto e Ailton Antonio Sabino.
7 Extrado do Livro Ata, pginas 19 e 20, da reunio realizada na sede provisria do PT, instalada no
Sindicato dos Ferrovirios, em 17/05/1986. 8 Fonte: Livro Ata, pgina 11, do Partido dos Trabalhadores de Cachoeiro de Itapemirim.
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Em 1986, foi realizada nova conveno partidria, no dia 13 de abril, na
Cmara Municipal de Cachoeiro de Itapemirim, s 09:00 horas9, acompanhada pelo
observador da Justia Eleitoral Waldeir Garrute, desta vez com a participao de
101 filiados, sem nenhum registro de voto branco e nulo e 01 voto contra a chapa
apresentada, que ficou assim composta: presidente: Pedro Correia Reis; vice-
presidente: Valdemir Silva Motta; secretrio: Luis Fernando Novoa Garzu;
tesoureiro: Jos Paradella Netto e vogais: Saint Clair Lopes e Cedecias Gonalves
Pereira.
No incio de 1987, o presidente Pedro Correia Reis pediu para se afastar da
presidncia do PT por motivos de sade10 e foi instituda uma Comisso Provisria
que teve como presidente Maria de Lourdes Savignon, em um mandato tampo at
setembro, quando foi realizada nova conveno, em 27 do mesmo ms, na Cmara
Municipal de Vereadores e acompanhada pelo observador Eleitoral Fernando dos
Santos Ayub, em que foi eleita uma chapa de diretrio. Conforme ata de reunio do
partido, pgina 16 e pgina 19 (verso) entende-se que o cargo de presidncia foi
ocupado por Maria de Lourdes Savignon, embora no esteja explcita esta
informao.
De acordo com registro em ata, de uma reunio ocorrida em nove de maro
de 1987, o PT enfrentava problemas com um de seus fundadores, Rogrio Medeiros,
que fazia crticas ao partido atravs da imprensa e em carta dirigida Executiva
Regional, que a respondeu. Por sua vez, a Executiva Municipal criticava Rogrio
Medeiros por ter confeccionado panfleto junto com Gerson Camata, o que
demonstrava ato falho por parte do membro, pois Camata no estava na Coligao
com o PT. Divergncias internas j eram muito comuns dentro do PT, quando a
ento deputada federal Maria de Lourdes Savignon (Lurdinha) denunciou o filiado e
militante Fernando Netto por ter declarado no programa de rdio Momento
Polticona Rdio Cachoeiro que,
a populao deveria prevenir-se contra os polticos profissionais que
se recanditariam este ano, inclusive a deputada Lurdinha que havia
9 Fonte: Livro da Ata, pginas 13 e 14, do Partido dos Trabalhadores de Cachoeiro de Itapemirim.
10 Informao obtida do filiado e militante Antnio Carlos de Oliveira.
45
faltado a votaes essenciais no Congresso no ano passado,
especialmente a do oramento federal11
Os conflitos internos eram levados para conhecimento e deliberao das
instncias partidrias que abriam discusses sobre o assunto para solucionar o
problema. No caso acima citado, a deliberao culminou na ida do presidente do PT
local Rdio para esclarecer a situao, alm de gerar uma representao ao
Diretrio Regional para ver se o caso seria passvel de ser submetido Comisso
de tica, j que o comportamento do filiado, na concepo unnime dos presentes
reunio, foi de despeito s normas partidrias, caracterizando uma difamao
injustificada imagem do partido. As divergncias internas no se tratavam apenas
de discordncias de opinies, as candidaturas individualista e defesa de interesses
prprios sempre apareciam nos debates e eram discutidas fervorosamente entre os
filiados e devidamente documentadas em livro de ata.
11
Fonte: Ata de reunio da Comisso Executiva Provisria, em 06/02/1990, pgina 05, Partido dos Trabalhadores de Cachoeiro de Itapemirim.
46
2.2 A participao do PT de Cachoeiro de Itapemirim-ES (1988-1998)
Em 1988, aconteceu a Conveno Municipal do PT para escolher a chapa de
candidatos a prefeito, vice-prefeitos e vereadores. O evento ocorreu no dia 29 de
julho de 1988, na Cmara Municipal de Cachoeiro de Itapemirim e e ali decidiu-se
que o partido mais uma vez lanaria chapa completa, do majoritrio (Prefeito e Vice
Prefeito) e tambm para Legislativo (vereadores), com o objetivo de fortalecer as
bases eleitorais. Para representar o PT como candidato a prefeito, foi escolhido
Elieser Rabello e o vice-prefeito Jos Irineu de Oliveira. O partido teve tambm
chapa completa de candidatos a vereadores.
Nesta eleio foram eleitos dois vereadores, lvaro Scalabrin, professor e
atuante na Igreja Catlica, com apoio da CEB`s (Comunidades Eclesiais de Base),
conforme declarao do militante Mizoca em ata da reunio da Executiva Municipal
do dia 13 de abril de 1986, e Luiz Carlos Poloni, que era locutor de programa local
de rdio e ganhou popularidade com a tradicional orao da Ave Maria, s 18 horas.
A candidatura majoritria municipal, embora tenha marcado espao, no logrou xito.
Todas essas pessoas se agruparam em torno de um objetivo: mudanas na poltica
local. Maria de Lourdes Savignon explana sobre as dificuldades do processo de
transformao da sociedade, a qual o PT almejava naquele momento atravs da
participao popular, e cita as bandeiras polticas do partido no parmetro nacional:
jornada de trabalho de 40 horas semanais, salrio mnimo compatvel com as
necessidades de sobrevivncia do trabalhador, estabilidade de emprego, reforma
agrria, reforma tributria, ensino pblico e gratuito, no pagamento da dvida
externa, contra a fome, misria e inflao12.
Os dirigentes do partido queriam a reverso do quadro poltico, social e
econmico do pas e a transformao da sociedade, com base na mxima
sociedade justa e igualitria. Com apoio de parte da Igreja Catlica, sindicatos e
orientados por intelectuais da esquerda, os militantes organizaram passeatas contra
o capitalismo e um dos alvos foi o monoplio da empresa de transporte coletivo.
Alm disso, havia forte movimento para uma transformao interna por maior
12
Fonte: Livro da Ata, pgina 33, sobre a Pr-conveno do PT em 30 de agosto de 1987.
47
envolvimento dos filiados, visando melhor organizao em torno do objetivo da
mudana. Para tanto, o debate de uma das reunies teve como foco principal a
apresentao de um plano de ao,
para organizao de,nosso partido (almejamos e) apresentamos o seguinte plano de ao, dividido em duas partes; apresentaremos nossa proposta para debate com o grupo aqui presente e na Conveno Oficial: A) Nvel Interno: - instalao da sede dentro dos prximos 60 dias, reorganizao das fichas dos filiados- atualizao de endereos; trabalhar p/ a organizao e construo do partido- participao ampla dos filiados- trabalho nos bairros; prioridade na conduo do partido; criao da comisso de finanas; criao da comisso de organizao; criao de Secretarias de Movimento Popular e Sindical; criao de Secretaria de Formao e Informao Poltica, preparao dos militantes a respeito das polticas sociais; criao de comisso de informao; criao de comisso para levantamento da situao poltico-econmica e social de Cachoeiro; estabelecer atividades do partido a cada trs meses.13
O PT de Cachoeiro de Itapemirim-ES iniciou o ano de 1989 com dois
vereadores eleitos e uma deputada federal, j que Maria de Lourdes Savignon
(Lurdinha) como primeira suplente, tinha ocupado a vaga de Vitor Buaiz, que havia
sido eleito para a Prefeitura de Vitria. O Partido no municpio, portanto, estava com
uma grande responsabilidade, j que haveria eleio para presidente da Repblica,
pela primeira vez pelo voto direto depois da redemocratizao do pas, e o candidato
petista Luiz Incio Lula da Silva, que disputaria com grandes chances de vencer,
abalava as estruturas do poder vigente, ou seja, das foras polticas de direita que
h anos se revezavam no comando poltico e econmico do pas.
[...] fora de dvidas, porm, que vieram a revelar-se particularmente danosas entre os veculos de comunicao a partir da campanha, para a presidncia da Repblica de Fernando Collor cuja imagem de heri moo, caador de marajs, foi, em grande parte, uma criao irresponsvel da mdia, com destaque para a Rede Globo- e tambm uma construo ideolgica. Afinal, a administrao jornalstica do crescimento de Collor foi um recurso para barrar, na poca, a ascenso de Lula, cujos ndices de aceitao na opinio pblica atemorizava o status quo[...] (GOMES, 2001, p. 598-599).
13
Fonte: Livro da Ata, pgina 30-31, Partido dos Trabalhadores de Cachoeiro de Itapemirim.
48
Para tentar minimizar os danos do massacre miditico, a Executiva Municipal
organizava arrasto14 no centro da cidade para entrega de panfletos, formao
poltica com o objetivo de preparar os militantes para o discurso de pedir o voto,
realizao de feijoadas para arrecadar recursos financeiros para a FBP (Frente
Brasil Popular)