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UNIVERSIDADE INTERNACIONAL DE LISBOA – UIL MESTRADO DE GESTÃO E MODERNIZAÇÃO PÚBLICA - MUNICIPAL E ESTADUAL. A GESTÃO PARTICIPATIVA COMO FATOR DE EFICIÊNCIA: UMA PROPOSTA PARA A ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA DO ESTADO DO CEARÁ. JOSÉ JOAQUIM NETO CISNE VOLUME I FORTALEZA – CEARÁ JANEIRO/2001

UNIVERSIDADE INTERNACIONAL DE LISBOA – UIL … · Nesse contexto, a qualidade dos serviços é um diferencial importante para as organizações, públicas ou privadas, que buscarão

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  • UNIVERSIDADE INTERNACIONAL DE LISBOA UIL

    MESTRADO DE GESTO E MODERNIZAO PBLICA - MUNICIPAL E

    ESTADUAL.

    A GESTO PARTICIPATIVA COMO FATOR DE EFICINCIA: UMA

    PROPOSTA PARA A ADMINISTRAO TRIBUTRIA DO ESTADO DO

    CEAR.

    JOS JOAQUIM NETO CISNE

    VOLUME I

    FORTALEZA CEAR

    JANEIRO/2001

  • 12

    UNIVERSIDADE INTERNACIONAL DE LISBOA UIL

    MESTRADO EM GESTO E MODERNIZAO PBLICA - MUNICIPAL E

    ESTADUAL.

    A GESTO PARTICIPATIVA COMO FATOR DE EFICINCIA: UMA

    PROPOSTA PARA A ADMINISTRAO TRIBUTRIA DO ESTADO DO

    CEAR.

    JOS JOAQUIM NETO CISNE

    Dissertao de Mestrado a ser apresentada

    Universidade Internacional de Lisboa como

    requisito parcial para a obteno do Ttulo de

    Mestre.

    Orientadores:

    * Profa. Doutora Maria Isolda Castelo Branco Bezerra de Menezes Brasil

    * Prof. Doutor Joo Abreu de Faria Bilhim Portugal

    FORTALEZA CEAR

    JANEIRO/2001

  • 13

    A GESTO PARTICIPATIVA COMO FATOR DE EFICINCIA: UMA

    PROPOSTA PARA A ADMINISTRAO TRIBUTRIA DO ESTADO DO

    CEAR.

    JOS JOAQUIM NETO CISNE

    BANCA EXAMINADORA:

    Orientadores:

    Prof. Doutora Maria Isolda Castelo Branco Bezerra de Menezes

    ______________________________________________

    Prof. Doutor Joo Abreu de Faria Bilhim

    ______________________________________________

    Membros:

    Prof. Doutor Joo Baptista Nunes Pereira Neto

    _____________________________________________

    Prof. Doutor Jos Teodoro Soares

    ______________________________________________

    Prof. Doutor Fausto Jos Robalo Amaro

    ______________________________________________

    Prof. Doutora Maria Helena Carvalho dos Santos

    ______________________________________________

  • 14

    A Deus que idealizou o meu projeto de vida;

    A meus pais que, pelos seus esforos, viabilizaram

    este projeto divino;

    ngela, minha esposa, Ana Thas e Letcia,

    razo de tudo isso, que compartilham comigo a

    implantao deste projeto A VIDA.

  • 15

    AGRADECIMENTOS

    Um trabalho desta natureza no se torna possvel sem a colaborao de

    muitos amigos e companheiros. Destaquem-se os orientadores, Profa. Isolda Castelo Branco

    e Prof. Joo Abreu Bilhim, que pela imensurvel pacincia e dedicao viabilizaram esta

    pesquisa.

    Agradeo aos companheiros da Secretaria da Fazenda do Estado do Cear,

    em especial ao Secretrio Ednilton Gomes de Sorez, pelas contribuies imprescindveis

    realizao deste trabalho.

    Ao magnfico Reitor da Universidade Estadual Vale do Acara, Jos

    Teodoro Sores, educador de viso empreendedora, pelo constante e irrestrito apoio.

    Aos colegas professores da Universidade Estadual do Cear pela

    colaborao nas discusses destas idias.

    A todos, meu preito de gratido.

  • 16

    RESUMO

    A administrao pblica, motivada pelas crises e a conseqente reforma

    do Estado, tem procurado evoluir do modelo burocrtico weberiano para modelos mais

    flexveis de gesto. Esses novos paradigmas da gesto pblica tm por objetivo a

    otimizao e a eficincia dos resultados, especialmente quanto aos servios prestados pelo

    Estado aos cidados. Esta dissertao constitui uma investigao de carter emprico com o

    objetivo de analisar os efeitos de uma forma de gesto participativa, ou seja, uma maior

    participao do cidado-contribuinte no contexto da administrao tributria. Procura

    avaliar os reflexos da gesto participativa na imagem organizacional da instituio

    fazendria, na disposio do contribuinte em cumprir voluntariamente suas obrigaes

    tributrias e na obteno de uma maior transparncia da relao entre a administrao

    tributria e o cidado-contribuinte. Tomando-se por base o modelo da administrao

    participativa e utilizando-se de todo um instrumental de pesquisa de natureza quantitativa e

    qualitativa, procura-se averiguar a percepo de grupos previamente selecionados sobre a

    importncia da formao de um frum constitudo por representantes do Estado do Cear

    (Secretaria da Fazenda e Procuradoria Geral do Estado), representantes das entidades de

    classes empresariais (Federaes da indstria, do comrcio e da agricultura) e

    representantes do cidado (Assemblia Legislativa do Estado do Cear, Associaes

    Comunitrias, Ouvidoria do Estado). A partir das abordagens tericas utilizadas e dos

    resultados dos dados obtidos pela pesquisa constata-se a viabilidade da implementao

    desse frum participativo, objeto de anlise desta dissertao, no mbito da administrao

    tributria, considerando-se que o mesmo poder gerar impactos positivos na imagem

    organizacional e na qualidade dos servios prestados pela Secretaria da Fazenda do Estado

    do Cear.

  • 17

    ABSTRACT

    The Public management, motivated by crisis and consequent state reform

    has tried to change from the burocratic model to flexible management models. These new

    paradigms of public management have as a goal the improvement and the efficiency of the

    results, specially the services rendered to citizens by the state. This dissertation is an

    investigation of empiric caracter with the goal of analising the effects of the participative

    administration, that is a bigger participation of taxpayers in the context of tax

    administration. It tries to evaluate the reflections of participative administration in the

    organizational image of the tax institution, the will of taxpayers to pay his tax obligations

    and obtain more transparency in the relationship between the administration and the

    taxpayer. Considering the administration management model and using every researching

    tool available in terms of quantity and quality, it tries to major the knowledge of groups

    previously selected: employees that are part of the senior management of the tax

    institution, tax collectors, public offices, business entities, and community associations,

    about the impacts of participative management in the Cears tax administration. It also

    tries to ascertain, in the member states of the Brazilian Federation, the existence of

    participative forum in the context of the tax administration of these states. Analysing the

    theoretical approaches and the results obtained by the research, we observe the feasibility

    of implementing the participative forum, object of the analysis of this dissertation, in the of

    Cearas tax adminstration, because it might generate positive impacts in the organizational

    image and in the quality of the services rendered by the state, besides contributing to the

    voluntary fulfillment of the tax obligations

  • 18

    SUMRIO PGINA

    Lista de Ilustraes............................................................................... 09

    Introduo ............................................................................................. 11

    Captulo I - Modelos de Gesto .......................................................... 18

    1.1 - Modelo administrativo gerencial ...................................... 19

    1.2 Modelo de gesto participativa.......................................... 26

    1.2.1 Consideraes sobre o conceito e o papel da

    participao no contexto organizacional .........................

    26

    1.2.2 Nveis e graus de participao............................... 37

    1.2.3 Tipos de participao ............................................. 39

    1.2.4 - Consideraes sobre a democracia participativa

    .........................................................................

    42

    1.2.5 As novas tecnologias como forma de manifestao da

    democracia .............................................

    49

    1.3 - Relao entre o indivduo e o Estado .............................. 53

    1.3.1 A accountability como mecanismo de viabilizao do

    controle social das aes governamentais

    ...................................................................

    56

    1.3.2 A sociedade civil como agente de controle social das

    aes do Estado ...............................................

    61

    1.3.3 Formas de controle da gesto pblica................. 79

    1.3.4 - A Lei de Responsabilidade Fiscal.......................... 82

    Captulo II As Causas e Conseqncias da Reforma do Estado . 87

    2.1 - A crise do Estado Brasileiro ............................................ 89

    2.2 - A reinveno do Governo e o novo papel do Estado Brasileiro

    ......................................................................................

    93

    2.3 Aspectos bsicos da reforma do Estado Brasileiro O Plano

    Diretor do Aparelho do Estado .......................................

    98

    2.4 O princpio da eficincia como orientador da administrao

    pblica brasileira ................................................

    108

  • 19

    Captulo III Consideraes sobre os Aspectos Tributrios .......... 114

    3.1 O poder fiscal do Estado ................................................... 114

    3.2 O Sistema Tributrio Nacional ........................................... 119

    3.3 A relao jurdico-tributria ............................................... 126

    3.3.1 - A Relao entre o fisco e o contribuinte ............... 126

    3.3.1.1 Outras experincias de integrao entre o fisco e

    o contribuinte .................................................

    135

    3.3.2 A obrigao tributria ........................................... 139

    3.3.2.1 Os sujeitos da relao tributria ................ 142

    3.4 A carga tributria brasileira ............................................... 143

    3.4.1 A carga tributria do Cear .................................... 148

    3.5 A justia fiscal .................................................................... 149

    3.6 Consideraes sobre a evaso fiscal ............................... 152

    3.7 O papel da educao na formao da conscincia tributria

    .......................................................................................

    158

    Captulo IV As Reformas Administrativa e Fiscal do Estado do Cear

    .....................................................................................................

    163

    4.1 - A reforma administrativa do Estado do Cear: reflexo das

    mudanas ..............................................................................

    163

    4.1.1 O Plano de Desenvolvimento Sustentvel1995-1998

    ....................................................................................

    165

    4.2 A participao popular na Constituio Estadual de 1989

    ...............................................................................................

    170

    4.3 O modelo de gesto participativa do Cear: os conselhos com a

    participao da sociedade ............................

    172

    4.4 - A reforma administrativa da Secretaria da Fazenda do Estado

    do Cear............................................................................

    180

    Captulo V - Metodologia da Pesquisa .............................................. 189

    5.1 Definio de Termos ............................................................ 189

    5.2 Hiptese ............................................................................... 193

    5.3 Abordagem metodolgica .................................................. 193

    5.4 - Descrio da populao e da amostra ............................ 197

    5.4.1 - Definio da populao .......................................... 197

  • 20

    5.4.2 - Definio da amostra .............................................. 201

    Captulo VI - Anlises quantitativa e qualitativa dos dados coletados dos

    grupos selecionados ..................................................

    205

    6.1 Anlise das consultas aos Estados .................................. 249

    Consideraes finais .......................................................................... 252

    Bibliografia ............................................................................................ 257

    Apndices ............................................................................................. 269

    I Questionrio aplicado alta gerncia da Secretaria da Fazenda;

    ................................................................................................

    271

    II Questionrio aplicado aos demais servidores da Secretaria da

    Fazenda; ...........................................................................................

    279

    III Questionrio aplicado aos dirigentes das entidades representativas

    dos clientes da Secretaria da Fazenda; .................

    287

    IV Questionrio aplicado aos dirigentes das entidades representativas

    dos clientes da Secretaria da Fazenda associaes comunitrias;

    ..................................................................

    294

    V Consultas aos Estados; ................................................................ 301

    VI Modelo do Projeto de Lei que institui o Frum de Poltica Fiscal;

    ....................................................................................................

    302

    VII Roteiro das entrevistas; .............................................................. 304

    VIII Entrevistas com a alta gerncia da Secretaria da Fazenda; ... 306

    IX Entrevistas com os dirigentes das entidades: rgos pblicos e

    entidades de classe empresariais; ..................................

    338

    X Entrevistas com os dirigentes das associaes comunitrias. 436

  • 21

    LISTA DE ILUSTRAES

    FIGURAS PGINA

    1 Evoluo da carga tributria bruta no Brasil ............................ 147

    QUADROS

    I Funes positivas da participao por dimenses especficas

    ..........................................................................................

    34

    II Relao entre o Estado e a sociedade ....................................... 73

    III Carga tributria bruta do ICMS, IPVA, ITCD e taxas 1995

    1999 .....................................................................................................

    148

    IV Relao entre a carga tributria bruta do ICMS, IPVA, ITCD e

    taxas e o PIB 1995 1999 ...............................................................

    149

    V Relao das associaes comunitrias consultadas .............. 200

    VI Grupos selecionados para a pesquisa de campo ................... 202

    VII Contagem de Ateno da Secret. de Finanas de Fortaleza.... 214

    GRFICOS

    1 Imagem Interna da Secretaria da Fazenda..................................... 207

    2 Imagem Externa da Secretaria da Fazenda.................................... 207

    3 Abertura da Secretaria da Fazenda................................................ 210

    4 Ateno da Receita Federal............................................................. 212

    5 Ateno da Secretaria da Fazenda................................................. 213

    6 Satisfao com a introduo do frum.......................................... 215

    7 Freqncia de consulta do Governo.............................................. 216

    8 Freqncia de consulta da Secretaria da Fazenda....................... 217

    9 Apresentao de sugestes............................................................ 218

    10 Adoo do frum participativo .................................................... 220

    11 Frum versus Melhoria da qualidade........................................... 223

    12 Perspectiva de melhoria da qualidade......................................... 225

  • 22

    13 Perspectiva de melhoria da imagem............................................ 226

    14 Perspectiva de melhoria do comportamento............................... 228

    15 Perspectivas do aumento no nmero de sugestes/denncias. 231

    16 Perspectivas de mais presso sobre o Governo............................. 233

    17 Aquiecncia de participao no frum........................................ 236

    18 Carga tributria de ICMS................................................................ 237

    19 Carga tributria de IPVA................................................................. 238

    20 Carga tributria de TAXAS............................................................. 239

  • INTRODUO

    Que conhecer o homem, no cidado e no contribuinte,

    seja para ns responsveis pela fiscalidade, o primeiro

    princpio.

    Que, dignific-lo, atravs do Direito, da estrutura e da

    aco seja, afinal, o primeiro dos fins ( 1).

    Vitor Antnio Duarte Faveiro.

    Nos ltimos anos, a literatura sobre administrao tem dado

    destaque, dentre outros temas, s mudanas nas organizaes. Discute-se o

    cenrio da administrao neste novo sculo e analisam-se os desafios que o

    administrador ter que enfrentar para exercer seu papel num ambiente marcado

    por grandes e contnuas transformaes. As organizaes atuais possivelmente

    tendero a ser organizadas em torno de seus processos, assim como podero

    centrar seus esforos em seus clientes. Nesse contexto, a qualidade dos servios

    um diferencial importante para as organizaes, pblicas ou privadas, que

    buscaro ser geis e enxutas. Suas tarefas exigiro conhecimento do negcio,

    autonomia, responsabilidade e habilidade na tomada de deciso. Nelas no

    haver lugar para os empregados tradicionais, sem iniciativa e sem criatividade,

    tampouco para processos que no agreguem valor aos clientes.

    Assuntos como planejamento e gesto estratgica, liderana e

    desenvolvimento de equipes, delegao de autoridade e administrao de

    conflitos, qualidade total, gesto participativa, reengenharia de processos e

    arquitetura organizacional, entre outros, so anunciados como ferramentas

    necessrias transformao organizacional e administrao das mudanas

    exigidas pelos tempos atuais.

    1 FAVEIRO, Vitor Antnio Duarte Noes Fundamentais de Direito Fiscal. I Vol., Introduo

    ao Estudo da Realidade Tributria, Teoria Geral do Direito Fiscal. Coimbra: Coimbra Editora,

    Limitada, 1984. p. 168.

  • 12

    Este trabalho se amparou especialmente nos conhecimentos das

    cincias administrativa, sociolgica, jurdica, poltica, dentre outras, que norteiam

    o complexo estudo da relao tributria entre o fisco e o cidado-contribuinte no

    contexto dos novos paradigmas da administrao pblica gerencial.

    O Estado moderno tem investido na melhoria de seus processos,

    promovendo reformas estruturais e buscando dois objetivos bsicos: ajustar suas

    contas com a reduo do dficit fiscal e atender aos anseios da populao que

    reclama por eficincia e servios de qualidade. Essas tambm tm sido as razes

    das propostas de reformas constitucionais que esto sendo discutidas e

    implementadas pelo Estado brasileiro nos ltimos anos.

    O Estado do Cear vem realizando profundas mudanas em sua

    estrutura administrativa desde 1987 com o ento chamado Governo das

    Mudanas, motivadas primeiramente pela grande necessidade de equilibrar as

    finanas pblicas do Estado e ainda objetivando uma nova viso de administrar a

    coisa pblica. Buscavam, acima de tudo, proporcionar resultados eficientes e

    elevar a qualidade dos servios pblicos a partir de uma gesto participativa.

    A eficincia das polticas fiscal e tributria livra os Estados do

    modelo de desenvolvimento que sugere financiar seu crescimento custa do

    endividamento externo sob a forma de capitais e emprstimos geralmente caros.

    Agindo dessa forma, os Estados estaro, muitas vezes, ameaando sua prpria

    autonomia e restringindo seriamente suas aes, quando deveriam otimizar seus

    esforos prprios para a formao de capital com recursos de poupana interna.

    Para tanto, necessitam contar com uma administrao tributria eficiente sob

    todos os aspectos.

    A administrao tributria inserida no moderno conceito de

    gesto pblica dever estar atenta s mudanas e dever adaptar-se a elas com

    agilidade. Seu propsito captar e gerir o volume correto de receitas tributrias

    com o menor custo para o contribuinte de tal maneira que se assegure o mais

    alto grau de confiana pblica em sua integridade, eficincia e justia. Para tanto,

    os agentes do fisco precisam assessorar o contribuinte em suas dificuldades,

  • 13

    esclarec-lo sobre seus direitos e obrigaes, pesquisar e implementar novas

    tecnologias e mtodos de trabalho, visando desburocratizao, comodidade e

    reduo de custos.

    Os procedimentos da administrao tributria so,

    obrigatoriamente, vinculados lei. As atividades do administrador tributrio so

    regidas pelo poder vinculado, portanto, devem estar de acordo com o que

    determinam as normas tributrias, ficando o administrador sem o poder

    discricionrio de atender determinadas exigncias do contribuinte.

    Na sociedade atual, o cidado-contribuinte, que contribui com

    parte do seu patrimnio para o Estado, espera e exige servios de qualidade,

    correspondentes aos tributos que paga. Isso facilmente percebvel nas

    manifestaes dos cidados-contribuintes, que no aceitam mais a imposio

    como condio nica para o estabelecimento dos tributos. Essa revolta se d de

    forma silenciosa, manifestada pelo elevado nvel de evaso fiscal. Hoje o

    cidado, cada vez mais consciente de seus direitos e obrigaes, exige o direito

    de participar, de ser ouvido por meio de debates, audincias ou qualquer outra

    forma de dilogo e de intervir construtivamente no processo de quantificao

    tributria.

    A Secretaria da Fazenda do Estado do Cear, cuja misso

    maximizar a receita e otimizar a despesa para o desenvolvimento do Estado do

    Cear( 2), tem investido, especialmente na segunda metade da dcada de 90, na

    melhoria contnua de sua estrutura organizacional, na tecnologia, nos seus

    processos e na capacitao de seus colaboradores. Tem procurado melhorar

    continuamente a prestao de seus servios de atendimento aos contribuintes

    dos tributos de competncia estadual. Como rgo responsvel pelas polticas

    tributria e financeira no mbito do Estado, h implementado mudanas que

    repercutiram em todas as reas de sua gesto.

    2 Portaria n. 526, de 15 de maio de 1997 - Instituiu o atual Modelo de Gesto da Secretaria da

    Fazenda do Estado do Cear.

  • 14

    Nesse contexto, acredita-se ser importante o processo de ouvir o

    cidado-contribuinte. As informaes dele colhidas colaboram para que as

    reparties tributrias apliquem seus recursos de forma otimizada e prestem um

    servio de qualidade.

    Um rgo como a Secretaria da Fazenda do Estado do Cear,

    para o seu bom gerenciamento, necessita de informaes e de feedback dos

    servios que presta sociedade. A participao gera informaes importantes

    para o planejamento e para a tomada de deciso mais sintonizada com as

    mudanas sociais.

    Entende-se que a participao dos cidados-contribuintes

    importante e ter um melhor efeito na fase pr-jurdica da poltica tributria, ou

    seja, antes da elaborao das normas, ocasio em que podem apresentar

    sugestes para melhorar a aplicao delas.

    Esta pesquisa tem por objetivo geral analisar a possibilidade de

    implantao de uma forma de gesto participativa (criao de um frum) que

    envolva a colaborao permanente de clientes consultados (Servidores

    Fazendrios, entidades Pblicas e empresariais, Associaes comunitrias) e

    avaliar seu impacto na imagem organizacional e na eficincia dos servios

    prestados pela Secretaria da Fazenda do Estado do Cear.

    a) Identificar algumas experincias nacionais (Portugal, Canad)

    e estaduais (Gois, Tocantins, Mato Grosso do Sul, Amazonas) de gesto

    participativa existentes em outras administraes tributrias que possam servir

    de referencial para a implantao dessa mesma forma de gesto na Secretaria

    da Fazenda do Estado do Cear;

    b) Investigar a percepo dos clientes consultados sobre a

    viabilidade de se constituir um frum participativo para discutir e aprimorar os

    procedimentos tributrios no mbito da Secretaria da Fazenda do Estado do

    Cear;

    c) Identificar a disposio dos clientes consultados a participar

    desse Frum e contribuir para a construo de um processo de gesto

    participativa na Secretaria da Fazenda;

  • 15

    d) Avaliar, sob a tica dos servidores fazendrios, os impactos

    de uma forma de gesto participativa (Frum) na Secretaria da Fazenda.

    Esta pesquisa se justifica tambm pela necessidade de a

    organizao conhecer melhor a percepo de seus clientes sobre a sua imagem

    organizacional e sobre os seus servios, aps o que a organizao poder ter

    mais condies para planejar e replanejar suas aes e atend-los melhor. Com

    a implantao de uma forma inovadora de gesto que conte com a participao

    de seus clientes por meio de entidades representativas e que aproveite suas

    opinies sobre os servios e sugestes para melhorar os procedimentos

    fazendrios, espera-se que haja:

    a) um impacto positivo na imagem institucional da Secretaria da

    Fazenda, visto que haver um canal permanente de comunicao com os

    representantes dos diversos segmentos econmicos do Estado;

    b) uma possvel reduo da evaso fiscal, vez que dessa

    relao de parceria espera-se participao, entendimento e compreenso e, com

    isso, aceitao das obrigaes tributrias e o seu fiel cumprimento, decorrentes

    do comprometimento gerado pelo entendimento e participao.

    c) aumento do nmero de sugestes para a melhoria dos

    servios, e at mesmo apresentao de denncias quanto a possveis

    comportamentos ou atitudes inaceitveis, tanto pelos cidados-contribuintes

    como pelos servidores fazendrios.

    Espera-se que haja uma maior transparncia e eficincia na

    aplicao dos procedimentos tributrios se a administrao tributria puder contar

    com a colaborao de um frum formado por entidades pblicas e privadas da

    sociedade civil, que representem os contribuintes e cidados na discusso de

    questes relacionadas com a poltica fiscal e tributria.

    Um outro aspecto importante a credibilidade que o frum

    precisa ter junto sociedade, o que poder ser conquistado medida que

    preserve os interesses da coletividade. Tal requisito exige muita maturidade,

    conscincia e esprito pblico dos membros participantes frente s presses

  • 16

    naturais que surgiro, visando manuteno de certos privilgios de

    determinados segmentos sociais ou econmicos representados no frum. Seus

    componentes devem ter maturidade suficiente para inibir toda e qualquer

    tentativa de manipulao cujo fim seja o de preservar interesses particulares,

    em detrimento dos interesses da sociedade.

    Vale ressaltar que, para ter xito, cada frum, comit ou qualquer

    outro tipo de colegiado com finalidades consultivas ou deliberativas deve ser

    institudo e coordenado obedecendo a uma metodologia, uma vez que cada um

    deles tm suas especificidades, nomeadamente quando se trata de algo novo

    como esse frum, objeto desta pesquisa, que tratar de temas conflituosos,

    envolvendo grandes interesses particulares.

    Este trabalho compe-se de seis captulos seguidos das

    consideraes finais. O primeiro captulo faz apreciaes sobre o modelo de

    administrao gerencial e sobre o papel da participao nesse novo paradigma

    de gesto pblica. Trata tambm de analisar o conceito, os tipos, os nveis e os

    graus da participao e aborda a relao entre o indivduo e o Estado, as novas

    tecnologias como formas modernas de viabilizar o exerccio da cidadania e de

    aproximar o cidado do Estado. Ressalta ainda o papel da sociedade civil como

    elemento de controle das aes governamentais. Destaca as diversas formas de

    controle da gesto pblica e desenvolve uma breve anlise sobre a Lei de

    Responsabilidade Fiscal.

    O objetivo central do segundo captulo analisar a crise e a

    reforma do Estado brasileiro, considerando os anos 70 e 80. Procura discutir o

    Plano Diretor da reforma, a reinveno e o novo papel do Estado. Aborda ainda

    o princpio da eficincia como diretriz atual das aes da administrao pblica

    brasileira.

    No terceiro captulo, estudam-se os principais aspectos

    tributrios, especialmente o poder fiscal do Estado, o sistema tributrio brasileiro,

    a relao jurdica entre o fisco e o cidado-contribuinte, a justia fiscal e a carga

    tributria do Estado do Cear e do Brasil, abordando tambm as complexas

  • 17

    questes relacionadas com a evaso fiscal e a importncia da educao tributria

    na formao da conscincia social.

    O captulo quarto tem por temas principais as reformas

    administrativa e fiscal que foram implantadas no Estado do Cear nos ltimos

    anos e destaca a importncia dos Conselhos de Participao como canais de

    manifestao dos interesses da sociedade junto ao Governo do Estado. Enfatiza

    as mudanas estruturais que ocorreram na administrao tributria desse Estado,

    a partir de 1987.

    A metodologia da pesquisa objeto do quinto captulo; no sexto

    captulo, so analisados e interpretados os dados da pesquisa colhidos por meio

    dos questionrios e das entrevistas realizados com os grupos previamente

    selecionados.

    Finalmente, nas consideraes finais, procura-se fazer um

    confronto dos resultados da pesquisa com seus objetivos e hipteses

    anteriormente traados e tambm confirmar a viabilidade da implementao do

    referido frum participativo.

  • 18

    CAPTULO I - MODELOS DE GESTO

    No existem pases subdesenvolvidos e sim apenas

    pases subadministrados.

    Peter F. Drucker.

    As inovaes tecnolgicas e as transformaes sociais ocorridas

    na sociedade contempornea tm provocado mudanas na vida das pessoas e

    alimentado a esperana de uma melhor distribuio da riqueza como garantia do

    bem-estar social.

    Nesse contexto, quase sempre o Estado tem sido o grande

    indutor do mencionado processo de mudanas. Para exercer suas atividades, o

    Estado, como todas as demais organizaes, necessitam de um suporte

    administrativo. As teorias e prticas que compem os modelos administrativos

    tm evoludo, especialmente no sculo XX, com o surgimento de diversas

    escolas, voltadas ao aprimoramento contnuo e adequao s novas realidades

    sociais, polticas e econmicas.

    A base terica da cincia da Administrao, comparada com as

    demais cincias, relativamente nova. Sua fundamentao terica princpios e

    modelos - se destacaram, especialmente, a partir dos estudos de Frederick

    Taylor, Henri Ford, Henri Fayol, Max Weber, dentre outros que colaboraram para

    tornar a Administrao uma cincia no incio do sculo XX.

    Na gesto pblica, cujos princpios e caractersticas no devem

    ser confundidos com os da administrao das empresas privadas (3), observam-

    se, em sua evoluo, trs modelos com caractersticas bem definidas:

    * administrao pblica patrimonial;

    * administrao pblica burocrtica;

    * administrao pblica gerencial.

    3 HENRY, Minztberg Administrando Governos, Governando Administraes. Braslia:

    ENAP. Revista do Servio Pblico, Ano 49, n. 4, Out. Dez., 1998. p. 162.

  • 19

    Por no fazer parte do contexto desta pesquisa o estudo

    aprofundado da evoluo dos modelos administrativos (4), os enfoques partiro

    do modelo de Administrao Gerencial ou New Public Management.

    1.1 MODELO ADMINISTRATIVO GERENCIAL

    O modelo administrativo gerencial, nova tendncia da a gesto

    pblica, o resultado do aprimoramento dos modelos administrativos que tm

    sido implementados e tambm conseqncia da evoluo da sociedade que

    conscientemente passou a exigir mais eficincia das aes governamentais e

    maior participao na tomada de deciso e no estabelecimento dessas aes.

    BORINS oferece a seguinte definio para a nova gesto pblica:

    a nova gesto pblica uma nova conceituao da administrao pblica que

    consiste de vrios componentes inter-relacionados: fornecer servios de alta

    qualidade que os cidados valorizam; aumentar a autonomia dos gestores

    pblicos, especialmente dos controles da agncia central; medir e premiar

    organizaes e indivduos com base no cumprimento das metas exigidas de

    performance; tornar disponvel recursos humanos e tecnolgicos que os

    gestores necessitam para desempenharem bem suas tarefas; e, reconhecendo

    as virtudes da competio, manter uma atitude aberta a respeito de quais

    propsitos pblicos devem ser desempenhados pelo setor privado, e no pelo

    setor pblico ( 5).

    4 Para maior aprofundamento sobre a evoluo dos modelos administrativos pblicos e privados

    sugere-se analisar as obras dos seguintes autores citadas na bibliografia desta pesquisa:

    WOOD Jr., Thomaz; KOONTZ, Harold & ODONNEL Cyril; TAYLOR, Frederick; FAYOL, Henri;

    MOTTA, Paulo Roberto; MAXIMIANO, Antonio Csar Amaru; BILHIM, Joo Abreu de Faria;

    FERLIE, Ewan; DRUCKER, Peter F.; DEMING, W. Edwards; DENTON, D. Keith; ALBRECHT,

    Karl; GUEDES, Armando M. Marques; WEBER, Max. 5 BORINS, Sanford apud, BEHN, Robert D. - O Novo Paradigma da Gesto Pblica e a

    Busca da Accountability Democrtica. Braslia: ENAP, Revista do Servio Pblico, Ano 49,

    Nmero 4, Out-Dez 1998. p. 39.

  • 20

    Na opinio de PEREIRA, a aplicao do modelo gerencial objetiva

    assegurar o carter democrtico da administrao pblica por meio da

    prestao de um servio pblico que tenha como caracterstica a orientao para

    o cidado-usurio ou cidado-cliente, em vez de manter o carter auto-referido

    que caracteriza a administrao pblica burocrtica, voltado para afirmao do

    poder do Estado e da burocracia estatal. Baseia-se, pois, na responsabilizao

    do servidor, dos polticos e dos representantes formais e informais perante a

    sociedade, por meio de mecanismos de controle social ou de participao

    cidad. Para ele, os controles sociais so essenciais na administrao pblica

    gerencial na medida em que compensam a reduo legal de procedimentos e

    complementam o controle de resultados. E afirma ainda que a Reforma

    Gerencial uma reforma para a democracia (6) .

    O autor considera a necessidade de se adequar a gesto estatal

    eficincia exigida pela globalizao e a importncia do controle social na

    preservao do interesse pblico em detrimento de interesses de grupos

    econmicos. Para ele, a democracia se prope a dar transparncia s aes

    pblicas e a priorizar o atendimento dos anseios dos cidados (7).

    A implantao deste modelo administrativo, de um certo modo,

    objetivou redimir o Estado da crise econmica e fiscal que atravessou na dcada

    de 70, acelerada, dentre outros fatores, pelas crises do petrleo em 1973 e 1979,

    que contriburam para desacelerar o crescimento da economia mundial a partir da

    Segunda Grande Guerra. At esse perodo, no havia maiores questionamentos

    sobre o papel do Estado que se ocupava, dentre outras coisas, em garantir a

    prosperidade econmica e o bem-estar social (8).

    6 PEREIRA, Luiz Carlos Bresser Reforma do Estado Para a Cidadania: A Reforma Gerencial

    Brasileira na Perspectiva Internacional. Braslia: ENAP, Editora 34, 1998. p. 112 e 147. 7 Ibidem, p. 141 152. 8 ABRUCIO, Fernando Luiz O Impacto do Modelo Gerencial na Administrao Pblica: Um

    breve estudo sobre a experincia internacional recente. Braslia: ENAP. Cadernos ENAP n.10,

    1997. p. 7.

  • 21

    A partir desse perodo, comeou-se a discutir a redefinio do

    papel do Estado na economia e a reduo dos gastos pblicos. Para reagir ao

    esgotamento do modelo weberiano, foram introduzidos novos modelos

    gerenciais na administrao pblica, implementados, a princpio, nos Estados

    Unidos, na Gr-Bretanha, Austrlia e Nova Zelndia, depois nos pases da

    Europa e no Canad (9).

    O modelo gerencial atual conseqncia do capitalismo

    globalizado, ps-moderno ou ps-industrial. Foi uma forma encontrada pelo

    Estado para superar a crise fiscal endgena iniciada nos anos 70 diante da qual

    reconstri-se e enfrenta os desafios de uma sociedade exigente e socialmente

    fragmentada, politicamente democrtica, em constante mudana tecnolgica; uma

    sociedade e uma economia integradas ao mundo em tempo real pela tecnologia

    da informao (10).

    Segundo o Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado, a

    Administrao Pblica Gerencial surge na segunda metade do sculo XX como

    resposta expanso das funes econmicas e sociais do Estado e

    globalizao. Os avanos do modelo gerencial rompem com os mtodos da

    administrao burocrtica, porm permanece com alguns de seus princpios e se

    apoia, com certa flexibilidade, em alguns deles, tidos como fundamentais. A

    diferena bsica entre os modelos est na forma de controle que deixa de

    basear-se nos processos para concentrar-se nos resultados, e no na rigorosa

    profissionalizao da administrao pblica, que continua um princpio

    fundamental (11).

    9 ABRUCIO, Fernando Luiz op. cit., p. 7 8. 10 PEREIRA, Luiz Carlos Bresser Reforma do Estado Para a Cidadania: A Reforma

    Gerencial Brasileira na Perspectiva Internacional - op. cit., p. 142 e 151. 11 GOVERNO FEDERAL Plano Diretor do Aparelho do Estado - op. cit., p. 22.

  • 22

    Na Amrica Latina e no Brasil, tambm aconteceu, na

    administrao pblica, a passagem do modelo burocrtico weberiano para o

    modelo de administrao pblica gerencial ou New Public Management (12).

    O novo modelo tem evoludo, como forma de melhor se adequar

    administrao pblica, da sua concepo original, modelo gerencial puro,

    passando pelo consumerism at sua forma atual, public service orientation, que

    d maior nfase transparncia administrativa e maior interao entre o Estado

    e a sociedade (accountability) (13).

    Descrevendo a evoluo do modelo gerencial , RUA constata que

    o modelo gerencial puro, importado diretamente do setor privado, exibia

    inicialmente caractersticas que o tornava inadequado administrao pblica por

    ser totalmente apoltico (14).

    Referindo-se evoluo do modelo gerencial, a autora procurou

    atribuir-lhe algumas caractersticas, observando que na tentativa de encontrar

    uma soluo que compatibilizasse as vantagens da administrao gerencial com

    as caractersticas prprias do setor pblico, diversas propostas surgiram, dando

    origem a diferentes modelos. Menciona algumas caractersticas centrais que

    compem o que hoje se entende como modelo de Administrao Pblica Gerencial

    e tem servido de orientao para a reforma administrativa no Brasil:

    12 ABRUCIO descreve a evoluo que aconteceu com o prprio modelo gerencial como forma de

    melhor atender as necessidades pblicas. E afirma sobre a primeira fase do modelo gerencial: o

    ponto central do modelo gerencial puro a busca da eficincia. Para tanto, parte do pressuposto de

    que preciso modificar as engrenagens do modelo weberiano. A burocracia tradicional (Whitehall

    para os ingleses) definida como uma organizao com estrutura rgida e centralizada, voltada ao

    cumprimento dos regulamentos e procedimentos administrativos e em que o desempenho

    avaliado apenas com referncia observncia das normas legais e ticas. (ABRUCIO, Fernando

    Luiz op. cit., p. 18). 13 Ibidem, p. 13 18. 14 RUA, Maria das Graas Desafios da Administrao Pblica Brasileira: Governana,

    Autonomia, Neutralidade. Braslia: Revista do Servio Pblico, Ano 48, N. 3, Set/Dez. 1997. p.

    144.

  • 23

    * O foco o cidado, e as atividades se orientam para a busca de resultados.

    * O princpio da eficincia econmica cede espao ao princpio da flexibilidade.

    * nfase na criatividade e busca da qualidade.

    * Descentralizao, horizontalizao das estruturas e organizao em redes.

    * Valorizao do servidor, multiespecialidade e competio administrada.

    * Participao dos agentes sociais e controle dos resultados (15).

    A estratgia da Administrao Pblica Gerencial est orientada:

    * para a definio precisa dos objetivos que o administrador pblico dever

    atingir em sua unidade;

    * para a garantia de autonomia do administrador na gesto dos recursos

    humanos, materiais e financeiros que lhe forem colocados disposio para que

    possa atingir os objetivos contratados;

    * para o controle ou cobrana a posteriori dos resultados (16).

    Outro ponto importante desse modelo de administrao refere-se

    ao fato de, na estrutura organizacional, ser essencial a descentralizao e a

    reduo de nveis hierrquicos. tambm condio desse modelo a maior

    participao dos agentes privados e das organizaes da sociedade civil na

    administrao, somada recomendao de deslocar a nfase dos

    procedimentos (meios) para os resultados (fins) (17).

    Ainda quanto diferenciao dos mtodos da administrao

    pblica e da administrao empresarial, o modelo gerencial o que mais

    semelhanas apresentam com o modelo administrativo das organizaes

    privadas, embora os parmetros devam ficar resguardados (18).

    15 RUA, Maria das Graas - op. cit., p. 145. 16 GOVERNO FEDERAL Plano Diretor do Aparelho do Estado op. cit., p. 22. 17 Ibidem, p. 22. 18 Ibidem, p. 22 23.

  • 24

    Nesse modelo administrativo, o cidado visto como aquele que

    paga seus tributos e, como cliente (19), tem o direito de exigir um servio pblico

    de qualidade.

    O modelo de Administrao Gerencial se firmou no contexto dos

    pases desenvolvidos e, por meio da adoo de novos mtodos de administrao,

    promoveu a definio clara de objetivos para cada unidade da administrao, da

    descentralizao, da mudana de estruturas organizacionais e da adoo de

    valores e de comportamentos modernos no interior do Estado, tendo sido capaz

    de tornar eficientes e os servios prestados pelo Estado, garantindo-lhes a

    qualidade (20).

    A adoo do modelo de Administrao Pblica Gerencial tem por

    objetivo fortalecer o combate captura do Estado por interesses particulares,

    19 PEREIRA usa as expresses cidado-usurio e cidado-cliente como sinnimas, porm

    possvel distingui-las: o cidado usurio no paga, enquanto o cidado-cliente paga pelos servios

    recebidos. (...) uma tolice se supor que o cidado deva ser sempre usurio, jamais pagando por

    servios prestados pelo Estado.(...) A idia de que o cidado deve ser visto como cidado-cliente

    central na Reforma Gerencial. Entretanto, comum ouvirmos crticas a esta viso, que seria

    neoliberal por reduzir o cidado, primeiro condio de contribuinte, e, depois, de cliente,

    quando ele muito mais do que isto: um cidado portador de direitos e obrigaes polticas. A

    crtica no faz sentido. O verdadeiro cidado sem dvida aquele que tem direitos efetivos,

    inclusive o de ser tratado com respeito pelos prestadores de servios do Estado. A orientao para

    o cliente importada da administrao de empresas significa exatamente isso: atender s

    necessidades do cliente, respeit-lo. Mas no significa que, com ela, esteja sendo posto de lado o

    direito do cidado de participar, que esteja sendo subestimada a importncia dos mecanismos e

    instituies de controle social, que so um elemento essencial da administrao pblica gerencial (PEREIRA, Luiz Carlos Bresser Reforma do Estado Para a Cidadania: A Reforma Gerencial

    Brasileira na Perspectiva Internacional - op. cit., p. 111 e 119).

    HENRY tambm procura esclarecer esta questo de nomenclatura cidado, cliente, usurio,

    consumidor dentre outros que usam para designar os beneficirios dos servios pblico. O autor

    observa que, consumidor, cliente, cidado e sdito, so os quatro chapus que todos ns

    usamos numa sociedade. E como consumidores do governo recebem servios diretos; cidados

    se beneficiam da infra-estrutura pblica, que o governo coloca sua disposio. Mas considera

    que haja uma diferena capital entre as atividades voltadas para o consumidor e as atividades

    voltadas para o cidado: a freqncia com que ocorrem. (HENRY, Minztberg op. cit., p. 155). 20 GOVERNO FEDERAL Plano Diretor do Aparelho do Estado - op. cit., p. 24.

  • 25

    defender o patrimnio pblico, utilizar os recursos escassos dos contribuintes de

    forma a atender ao interesse geral, ou, em outras palavras, afirmar o direito de

    cidadania res pblica (21).

    BEHN, analisando os paradigmas da nova gesto pblica,

    considera importante que esta demonstre ser tambm politicamente responsvel

    e compatvel com o accountability democrtico (22).

    Quanto ao comportamento dos agentes pblicos, nesse novo

    modelo de gesto, cabe ao servidor no apenas cumprir as regras cegamente,

    mas ter uma postura proativa na resoluo dos problemas pblicos, zelando pelo

    interesse pblico e prestando servios eficientes aos cidados (23).

    Observa-se que esse novo modelo de Administrao procura

    dotar o Estado de um suporte tcnico-cientfico mais compatvel com a realidade

    atual, capacit-lo a prestar melhores servios aos seus cidadoscontribuintes,

    dando a estes mais oportunidades para opinar sobre questes que lhes dizem

    respeito. Ouvindo o cidado, o Estado aumentar as possibilidades de prestar

    servios mais compatveis com as expectativas dos usurios. Por isso, esse novo

    modelo de gesto, na busca da eficincia, procura viabilizar a participao dos

    clientes internos e externos nas decises.

    21 PEREIRA, Luiz Carlos Bresser Reforma do Estado Para a Cidadania: A Reforma

    Gerencial Brasileira na Perspectiva Internacional - op. cit., p. 151. 22 BEHN, Robert D. op. cit., p. 6. 23 Ibidem, p. 7.

  • 26

    1.2 MODELO DE GESTO PARTICIPATIVA

    1.2.1 CONSIDERAES SOBRE O CONCEITO E O PAPEL DA

    PARTICIPAO NO CONTEXTO ORGANIZACIONAL.

    O modelo de Administrao Gerencial preceitua uma maior

    participao dos cidados e clientes nas decises das organizaes pblicas ou

    privadas.

    A idia de participao (24) est, de um certo modo, associada ao

    processo democrtico ocorrido em diversas fases da histria da humanidade,

    desde as polis da Grcia Antiga at as formas de administrao participativa e

    gestes compartilhadas nas organizaes atuais (25).

    Ao referir-se s vrias definies de participao, VENOSA

    esclarece que existem diferentes abordagens para o que se entende por

    participao, limitadas quanto ao seu alcance, a partir do conceito mais amplo de

    participao, forma legtima da influncia de indivduos sobre decises que afetam

    suas vidas. (...) todas elas, no entanto, entendem participao como participao

    parcial e no participao plena (26).

    24 LAMMERS prope a seguinte definio para participao: Participar o conjunto das diversas

    formas de presso de baixo para cima (dos subordinados sobre os superiores) e que so aceitas

    como legtimas pelos subordinados e superiores. (Apud VENOSA, Roberto Organizao e a

    panacia participativa ou participao e a panacia organizacional? Rio de Janeiro: Revista

    de Administrao Pblica, 8(4): 80 102, out./dez. 1974. p. 82). 25 Segundo MENDONA a participao se constitui um dos mais importantes temas da prtica e

    da teoria organizacional, seja como conceito central, seja como tecnologia social. O autor cita a

    seguinte indagao de Guy BRAINBANT: No se poderia dizer hoje (...) que a condio

    essencial do bom funcionamento dos servios pblicos uma boa participao dos cidados, dos

    funcionrios e dos usurios na sua direo e sua gesto?. (MENDONA, Luis Carvalheira de

    Participao na Organizao: Uma Introduo aos seus Fundamentos, Conceitos e Formas.

    So Paulo: Ed. Atlas, 1987. p. 20). 26 VENOSA, Roberto - op. cit., p. 82.

  • 27

    Procurando esclarecer a definio de participao, MENDONA

    recorre a ROCCA e RETOUR, que, ao rever as definies sobre participao,

    extraem como varivel comum e fundamental a referncia a um processo de

    influncia, poder, controle e interveno. Nessa perspectiva, concluem esses

    autores que participao ato de influir, de exercer controle, de ter poder, de

    estar envolvido ativamente (27).

    A participao como estratgia social (28) desempenha um papel

    importante na reduo da alienao (29) dos colaboradores das organizaes

    pblicas ou privadas na tomada de deciso, na resoluo de problemas e na

    implantao de mudanas institucionais, o mesmo acontecendo aos cidados com

    relao ao Estado, ou seja, a participao aumenta a legitimidade e viabiliza um

    maior controle social das aes pblicas.

    A administrao participativa tem despertado interesse de vrios

    tericos de organizaes e tm sido cada vez mais constantes os debates sobre

    esse tema. VENOSA observa ainda que diversos pases como os Estados Unidos,

    27 ROCCA, Santiago & RETOUR, Didier apud, MENDONA, Luis Carvalheira de - op. cit., p.

    48. 28 MENDONA analisa as quatro categorias de concepes sobre a participao atribudas por

    DACHLER e WILPERT: viso socialista; teoria democrtica; relaes e desenvolvimento humano;

    produtividade e eficincia. (MENDONA, Luis Carvalheira de - op. cit., p. 29 - 35). 29 Segundo MOTTA a alienao faz com que o indivduo no se sinta parte ativa do processo de

    deciso e ao; seus poderes e sua capacidade de contribuio parecem alijados da organizao

    do trabalho. Ele se torna passivo, dependente, e passa a encontrar em si prprio e no contexto em

    que atua justificativas para pessimismo, frustrao e acomodao. A organizao perde

    oportunidades reais de contribuio, alm de serem negligenciadas, em nvel individual, as

    perspectivas de realizao pessoal e profissional. (...) Na vida diria, a alienao reflete-se na

    despreocupao com a produtividade, na falta de iniciativa e, sobretudo, na apatia, submisso e

    alta dependncia das chefias. s vezes, dirigentes erradamente julgam essas caractersticas de

    alienao inerentes natureza humana no trabalho, devendo ser compensados por presses de

    autoridade. Utilizam-se de seu poder formal para reduzir a passividade e obter ndices mnimos de

    eficincia. Essa prtica acaba por reforar as crenas mtuas sobre tutelagem das chefias e sobre

    necessidades e presso para obteno de resultados, ou seja, mantm-se o status quo de baixa

    satisfao e produtividade. (MOTTA, Paulo Roberto Gesto Contempornea: A cincia e a

    arte de ser dirigente. Rio de Janeiro: Record, 1991. p. 161).

  • 28

    Sucia, Polnia, dentre outros, tm experimentado esta tcnica administrativa com

    relativo sucesso e afirma que a definio de administrao participativa no uma

    utopia moderna (30).

    Ao descrever administrao participativa, MAXIMIANO menciona

    que, na prtica das organizaes, alm dos funcionrios e fornecedores, os

    clientes tambm so consultados para determinadas decises. Essas

    organizaes tm a preocupao de estar sempre em sintonia com o ambiente

    interno e externo, recebendo informaes teis para o aprimoramento de sua

    gesto (31).

    Ressalta ainda esse autor que a Administrao Participativa um

    dos campos mais complexos da moderna teoria da Administrao, uma vez que

    envolve, alm de diversos conceitos e tcnicas, um avanado contedo filosfico-

    doutrinrio. Ao conceituar Administrao Participativa, faz algumas consideraes

    tais como:

    * Participar no natural nos modelos convencionais mecanicistas da

    administrao, especialmente no modelo Taylor-Ford;

    * A alienao desperdia o potencial de contribuio intelectual das pessoas, ou

    seja, desperdia capital intelectual;

    * A participao aproveita esse potencial, contribuindo para aumentar a

    qualidade das decises e da administrao, a satisfao e a motivao das

    pessoas, fatores fundamentais para a resoluo criativa dos problemas

    organizacionais;

    * Aprimorando a deciso e o clima organizacional, a administrao participativa

    contribui para aprimorar a competitividade e a eficincia das organizaes, em

    especial neste tempo de rpidas mudanas econmicas e sociais (32).

    Ao analisar as bases organizacionais da participao, MOTTA

    conclui que o conceito de participao na teoria gerencial est relacionado,

    30 VENOSA, Roberto - op. cit., p. 80 83. 31 MAXIMIANO, Antonio Cesar Amaru Teoria Geral da Administrao op. cit., p. 340. 32 Ibidem, p. 322.

  • 29

    especialmente, com os fatores conflito e cooperao e que esses dois fatores tm

    importncia singular na organizao como sistema dinmico e aberto.

    Confirmando a importncia da participao no contexto do novo

    modelo de Administrao Gerencial, observa que, modernamente, so mais livres

    nas organizaes as manifestaes individuais e grupais na busca de seus

    interesses e consideram incuas e prejudiciais eficincia os

    constrangimentos clssicos livre expresso e circulao de idias, baseados

    na hierarquia formal. Nestes novos tempos, devem ser incentivadas, no mbito

    das organizaes, a liberdade, a iniciativa e a democracia (33).

    Abordando o conflito como fator inerente ao meio organizacional,

    o autor citado enfatiza trs principais correntes de pensamento sobre esse fato

    administrativo:

    * A primeira corrente trata o conflito como sendo essencialmente de interesses,

    existente no sistema social externo e trazido organizao do trabalho. As

    formas de relao de trabalho refletem a estrutura social externa (...).

    * A segunda corrente v o conflito como essencialmente de papis em nvel

    organizacional, resultante de adaptaes sociais impostas organizao da

    produo, fruto da evoluo tecnolgica e econmica (...).

    * Finalmente, a terceira corrente trata o conflito como sendo essencialmente de

    personalidade e de percepo em nvel individual e de pequenos grupos

    organizacionais (34).

    A participao nas organizaes, segundo esse autor, tem por

    misso ser um instrumento de estmulo para a cooperao e soluo de conflitos.

    Ressalta ainda que para os que admitem ser o conflito proveniente de fatores

    organizacionais e individuais, a participao normalmente considerada uma

    forma eficaz de soluo, acomodaes ou equilbrio, entre grupos divergentes

    (35).

    33 MOTTA, Paulo Roberto - Gesto Contempornea: A cincia e a arte de ser dirigente - op.

    cit., p. 152 153. 34 Ibidem, p. 152 153. 35 Ibidem, p. 159.

  • 30

    Para a viabilizao do processo participativo, dois condicionantes

    so fundamentais: os fatores psicossociais e o tipo de estrutura da organizao,

    lembrados por VENOSA, quando ressalta que a Administrao Participativa, por

    ser considerada complexa e multifacetada, pressupe que as pessoas afetadas

    pelas decises devem fazer parte do processo de tomada de deciso,

    considerados os seguintes aspectos:

    * a estrutura organizacional;

    * a dinmica interna dos processos decisrios;

    * as variveis psicossociais que afetam o comportamento dos participantes

    (36).

    Ainda segundo o autor, o processo de socializao do indivduo

    influencia fortemente a forma como este percebe a organizao e tambm

    determina as normas de seu comportamento, ajustadas sua exposio

    organizacional posterior (37).

    VENOSA lembra ainda que o homem, desde o seu nascimento e

    por toda a sua vida, convive com organizaes de estruturas hierarquizadas,

    sendo esta a forma determinante de como ele perceber todas as organizaes no

    tocante aos processos de comunicao e de tomada de deciso. Neste caso,

    sentencia o autor, que mantendo-se esta viso organizacional, a participao (...)

    dificilmente ser atingida nas formas organizacionais existentes (38).

    Quanto s variveis psicossociais que afetam o comportamento

    das pessoas envolvidas no processo participativo, importante enfatizar que este,

    de um certo modo, requer uma relao de confiana mtua para que se torne

    ainda mais produtivo.

    36 VENOSA, Roberto - op. cit., p. 81 87. 37 Ibidem, p. 81 87. 38 Ibidem, p. 81 87.

  • 31

    Os participantes, sejam subordinados ou dirigentes, tm vises e

    comportamentos diferentes quanto ao processo participativo (39). O subordinado

    pode no estar preparado para este processo, e o dirigente pode ter suas

    expectativas frustradas diante das presses exercidas pelas reivindicaes

    decorrentes do embate democrtico. Os dirigentes consideram trs fatores

    inibidores da funo gerencial decorrentes da participao dos trabalhadores nas

    decises da organizao: dispndio maior de tempo no processo de deciso,

    interferncia de pessoal no-qualificado e reduo das prerrogativas de poder na

    gerncia (40).

    Analisando o comportamento dos dirigentes diante de certas

    situaes do processo participativo, MOTTA conclui que estes muitas vezes se

    frustram, a ponto de argumentarem desfavoravelmente participao, quando, ao

    iniciarem o processo participativo, na expectativa de um exerccio maior de

    cooperao e de novos nveis de satisfao no trabalho, surpreendem-se com o

    excesso de crticas, questionamentos e reivindicaes sobre condies de

    trabalho (41).

    Quanto estrutura organizacional, em relao ao segundo fator

    condicionante da participao, pode-se verificar que certos tipos de estrutura

    geram obstculos participao, enquanto outros podem facilitar este processo.

    Analisando as implicaes da estrutura organizacional no processo

    de participao, MENDONA observa que certos tipos de estrutura criam

    obstculos participao, ao passo que outras estruturas como que viabilizam tais

    39 ROSINHA CORRION ressaltando o comportamento das pessoas participantes diante dos

    estmulos da organizao, no se podendo esperar respostas uniforme e homogneas

    participao oferecida, concluiu que nem todos os indivduos desejam o comprometimento mental

    com a tarefa que realizam. (Apud, VENOSA, Roberto - op. cit., p. 57). 40 MOTTA, Paulo Roberto - Gesto Contempornea: A cincia e a arte de ser dirigente - op.

    cit. p. 175. 41 Ibidem, p. 164.

  • 32

    solues. (...) Em outras palavras, a participao como processo precisa ter seu

    efetivo desdobramento ao nvel da estruturao da organizao (42).

    Outro aspecto digno de nota a natureza das tarefas. Existem

    tarefas que, por sua natureza, no comportam solues participativas. Essa

    questo foi considerada por KANTOR, ao afirmar que nem sempre a participao

    o melhor caminho para executar tarefas. Existem circunstncias sob as quais

    decises autoritrias, unilaterais ou a delegao a uma pessoa faz mais senso (...)

    idealmente o problema que determina o veculo, se participao ou no (43).

    Nesse contexto, poder-se-ia questionar: se h uma sociedade

    esclarecida e se existe de forma percebvel uma insatisfao dessa sociedade

    quanto ao processo tributrio brasileiro, por que o Estado no discute com

    transparncia junto a essa sociedade as formas de obteno e aplicao dos

    recursos pblicos, a fim de conscientiz-la e, em parceria com ela, tentar reduzir o

    antagonismo existente entre o Estado, o cidado-contribuinte e o nvel de evaso

    fiscal?

    Quanto capacidade do povo em tomar parte das decises

    pblicas que dizem respeito cidadania (44), vale lembrar o que ressalta WALKER

    (45): (...) toda forte tradio autoritria da comunidade se ope s prticas de

    participao na empresa, sobretudo se esta tradio existe no crculo familiar na

    forma de educar os filhos (46). Com base nesse mesmo raciocnio, DACHLER e

    42 MENDONA, Luis Carvalheira de op. cit., p. 50. 43 KANTOR, Rosabeth apud, MENDONA, Luis Carvalheira de - op. cit., p. 59. 44 Para um aprofundamento sobre a cidadania no Brasil ver DaMATTA, Roberto A Casa & A

    Rua: Espao, Cidadania, Mulher e Morte no Brasil. 5 Edio. Rio de Janeiro: Rocco, 1997. p.

    80. 45 WALKER, K. apud, MENDONA, Luis Carvalheira de op. cit., p. 49. 46 MENDONA ao se referir a prtica da participao no Brasil atribui trs caractersticas de

    nosso carter. Ele afirma que do autoritarismo econmico ao autoritarismo social, a passagem

    tambm no difcil no Brasil. Se ns entendermos cultura como o sistema de valores, hbitos e

    cosmoviso de um povo, conforme Enrique Saraiva, podemos assimilar que trs grandes

    caractersticas compem o nosso carter, a saber: autoritarismo, personalismo e relaes de

    amizade. (...) as relaes de amizade ou de lealdade a grupos ou a famlias como que

  • 33

    WILPERT concluram que certas organizaes, inseridas na sociedade, tais como

    a famlia, a igreja, a escola e o governo, cujos fundamentos repousam em

    princpios autocrticos, tendero a considerar que seus membros no dispem

    das aptides necessrias implantao de tal modelo (47).

    Quanto capacidade do povo para participar das decises

    coletivas, PEREIRA & FONSECA concluram que um povo desenvolvido um

    povo equilibrado que busca o novo por intermdio da participao popular, da

    adequao dos objetivos e prioridades s reais necessidades da sociedade, da

    viabilidade e integrao dos recursos e esforos. Associando o processo de

    desenvolvimento ao processo participativo, os autores asseguram que a

    governabilidade um conceito importante porque, medida que a populao se

    torna mais esclarecida, mais educada e mais bem informada, cresce a demanda

    por servios em quantidade e qualidade (48).

    As funes positivas da participao, sob o ponto de vista

    econmico, social, poltico, organizacional e psicolgico, so analisadas por

    MOTTA, conforme se observa no quadro abaixo (49):

    domesticam a impessoalidade da burocracia weberiana no Brasil. (...) prtica de

    apadrinhamento (o lado benevolente do autoritarismo). (...) nepotismo. (...) A essas prticas no

    entanto, a igualdade do princpio da participao se ope. (...) no mbito organizacional

    propriamente dito e na esfera do setor pblico, o processo administrativo dos rgos pblicos tem

    revelado reas de srios estrangulamentos e emperramento no seu sistema decisrio, em aberta

    e direta coliso com os princpios e prticas da participao do cidado. (MENDONA, Luis

    Carvalheira de op. cit., p. 101 - 102). 47 DACHLER & WILPERT apud, MENDONA, Luis Carvalheira de op. cit., p. 49. 48 PEREIRA, Maria Jos Lara de Bretas & FONSECA, Joo Gabriel Marques Faces da

    Deciso: As Mudanas de Paradigmas e o Poder da Deciso. So Paulo: Makron Books,

    1997. p. 156. 49 MOTTA, Paulo Roberto - Gesto Contempornea: A cincia e a arte de ser dirigente - op.

    cit., p. 176.

  • 34

    Dimenso Funo Positiva Primordial Conceito

    Econmica

    Eficincia

    Melhorar a eficincia e a eficcia da

    gerncia, proporcionando melhor

    produo e produtividade.

    Social Distribuio e Segurana Melhorar a distribuio dos

    benefcios do trabalho entre

    aqueles que colaboram na obteno

    dos resultados e aumentar a

    segurana social do emprego.

    Poltica Democratizao e

    Descentralizao

    Redistribuir o poder na

    organizao, afim de que seus

    membros tenham maior influncia

    nas decises sobre seu destino

    profissional e sobre o destino de

    sua organizao.

    Organizacional Integrao Aumentar a interao e o

    compartilhamento de valores

    visando a desenvolver a

    identificao, a lealdade e a

    aceitao de valores comuns.

    Psicolgica Auto-realizao Satisfazer aspiraes individuais de

    iniciativa e criatividade e assegurar

    melhor integrao e interao com

    o grupo organizacional de

    referncia.

    Quadro I: Funes Positivas da Participao por Dimenses Especficas.

    Fonte: MOTTA, Paulo Roberto - Gesto Contempornea: A cincia e a arte de ser dirigente -

    op. cit., p. 176.

    Considerando o contexto social e a moderna administrao,

    ressaltem-se os pontos enumerados por MENDONA como facilitadores ou

    inibidores da implementao da administrao participativa:

  • 35

    Sinais contrarios participao

    * a natureza intrnseca do funcionamento do capitalismo no Brasil, gerando

    descomunal exrcito de reserva nas cidades brasileiras e reproduzindo

    condies de trabalho prximas quelas da Revoluo Industrial britnica;

    * ao nvel cultural, os trs aspectos analisados do autoritarismo, a saber,

    autocracia, personalismo e lealdade pessoais;

    * a ao/omisso do Estado na gesto social da fora de trabalho;

    * a prpria composio da sociedade brasileira de meios-cidados social e

    politicamente;

    * a ausncia de trabalhadores em rgos que geram recursos deles

    arrecadados;

    * uma esclerosada e fechada prxis administrativa da administrao pblica

    impermevel visibilidade e participao do cidado/usurio.

    Sinais favorveis participao

    * o clima de democracia poltica experimentado no pas;

    * a prpria organizao em nvel capilar e vascular dessa mesma sociedade,

    atravs dos movimentos sociais urbanos;

    * destacada e vigorosa atuao das Comunidades Eclesiais de Base CEBs;

    * o discurso abrandado dos tcnicos de R.H. no pas, chamando ateno para

    o aspecto social e humano da organizao;

    * a mobilizao por participao interna de funcionrios pblicos;

    * os prprios meios de comunicao, massificando informaes e relativizando

    essa rigidez cultural (50).

    Em seu relatrio apresentado American Telephone & Telegraph

    Company AT&T, TOFFLER afirmou que o problema da participao ampliada

    referente tomada de decises nas organizaes precisa de um tratamento mais

    imaginativo do que tem recebido. Props o que chamou de estratgias

    alternativas para participao pblica nas decises organizacionais e tambm que

    estava convencido de que h plena justificativa para o envolvimento pblico em

    determinados processos de deciso empresarial, com base tanto na eficincia

    quanto na justia (51).

    50 MENDONA, Luis Carvalheira de op. cit., p. 105. 51 TOFFLER, Alvin A Empresa Flexvel. 4 Edio, Rio de Janeiro: Ed. Record, 1985. p. 223.

  • 36

    Segundo esse autor,

    as presses para a participao pblica na formulao da poltica das

    corporaes ou novos mecanismos que garantam a responsabilidade social da

    companhia provavelmente se tornaro ainda mais intensos nos prximos anos.

    (...) as presses para a responsabilidade empresarial e a participao pblica

    no so primariamente o resultado da agitao antiempresarial de

    contestadores, mas derivam de mudanas profundas na sociedade. Por esse

    motivo, creio que qualquer tentativa de ignorar o problema ou contorn-lo com

    gestos vazios no apenas fracassaria, mas tambm funcionaria como um

    bumerangue acarretaria ataques e perigos desnecessrios para a corporao.

    um grave erro encarar a presso para a participao apenas em termos de

    ameaas s prerrogativas empresariais (52).

    A aceitao da participao pblica, segundo TOFFLER, alm de

    ser um ato de boa-f e de boa cidadania, aperfeioa imensamente os esforos de

    planejamento e de obter informaes antecipadas, o que facilita a tomada de

    deciso e a adaptao s mudanas.

    Como modelo mais eficiente de participao pblica, TOFFLER

    apresenta o Modelo de Alerta Prvio, que consiste na criao de um Conselho de

    Assessores Pblicos com certa autonomia e atribuies definidas.

    MARQUES, que chamou a gesto participativa de Administrao

    Solidria, considera o autoritarismo e a dominao exerccio esprio do poder. A

    autora manifestou preocupao com o lado enganoso da administrao

    participativa ao afirmar que

    proclamar a administrao solidria pode ser, mais uma vez, um modo de lidar

    com uma realidade, iludindo-se de que est fazendo alguma coisa para

    beneficiar as pessoas, os grupos, a instituio, o Pas, mas, de fato, poder-se-

    estar incorrendo na montagem de uma cortina de fumaa que impede de ver

    os conflitos em toda sua nudez, na desesperada busca de cada um

    (individualismo), para sobreviver na selva das relaes humanas aguerridas que

    supe, sempre, a vitria dos mais fortes (competio). Essa luta torna os

    52 Ibidem, p. 223 224.

  • 37

    esquemas de colaborao facilitadores inocentes para a tomada de espaos

    pelos mais vivos, sempre ambicionando assegurar para si os lugares ao sol,

    no se importando se todos os demais ficam eternamente na sombra, sem

    calor, sem brilho e sem nutrio para suas legtimas aspiraes (53).

    Conclui que, para a administrao solidria, deve ficar claro o

    papel das organizaes como estruturas sociais, cuja finalidade atingir

    determinados objetivos econmicos, sociais ou polticos (54).

    Observa-se que no h como desconsiderar a participao, seja

    do cidado-cliente e dos empregados no mbito das organizaes privadas, seja

    do cidado-contribuinte e dos servidores no mbito das organizaes pblicas, por

    se tratar de realidade que reflete uma ansiedade coletiva e por se sentirem no

    direito de opinar sobre decises que os afetam.

    1.2.2 NVEIS E GRAUS DE PARTICIPAO

    O processo de participao, segundo BORDENAVE (55), constitui-

    se numa necessidade humana em que, do ponto de vista progressista, a

    participao faz crescer a conscincia crtica dos membros participantes, fortalece

    seu poder de reivindicao e os prepara para adquirir mais poder, alm de facilitar

    o processo de resoluo dos conflitos.

    Acredita-se que a gesto participativa dever ser pautada por uma

    co-responsabilidade de senso tico e por uma grande conscincia social, tendo

    sempre a preocupao de jamais comprometer o interesse pblico e o equilbrio

    financeiro do Estado.

    53 MARQUES, Juracy Cunegatto Administrao Participativa: Poder, Conflito e Mudana na

    Escola. Porto Alegre: Ed. SAGRA, 1987. p. 87. 54 Ibidem, p. 143. 55 BORDENAVE, Juan E. Diaz O Que Participao. So Paulo: Ed. Brasiliense, 1983. p. 12.

  • 38

    O autor citado enumerou o que chamou de alguns princpios da

    participao:

    * A participao uma necessidade humana e, por conseguinte, constitui um

    direito das pessoas;

    * A participao justifica-se por si mesma, no por seus resultados;

    * A participao um processo de desenvolvimento da conscincia crtica e de

    aquisio de poder;

    * A participao leva apropriao do desenvolvimento pelo povo;

    * A participao algo que se aprende e aperfeioa;

    * A participao pode ser provocada e organizada, sem que isto signifique

    necessariamente manipulao;

    * A participao facilitada com a organizao e a criao de fluxos de

    comunicao;

    * Devem ser respeitadas as diferenas individuais na forma de participar;

    * A participao pode resolver conflitos mas tambm pode ger-los;

    * No se deve sacralizar a participao: ela no panacia nem

    indispensvel em todas as ocasies (56).

    Referindo-se aos graus e aos nveis de participao, o autor

    considerou que o grau de participao varia num continuum desde o menor, que

    a informao outra parte aps tomada a deciso, sem ouvir seu ponto de vista,

    at a autogesto, que consiste numa independncia do grupo na conduo da

    organizao, projeto ou atividade. Entre esses dois pontos, tem-se a consulta

    facultativa ao grupo, a consulta obrigatria ao grupo, a elaborao de

    recomendaes pelo grupo, a co-gesto ou compartilhamento e a delegao.

    Os nveis de participao que dizem respeito importncia das

    decises apresentam a seguinte variao:

    Nvel 1 Formulao da doutrina e da poltica da instituio;

    Nvel 2 Determinao de objetivos e estabelecimento de estratgias;

    Nvel 3 Elaborao de planos, programas e projetos;

    Nvel 4 Alocao de recursos e administrao de operaes;

    56 Ibidem, p. 76 81.

  • 39

    Nvel 5 Execuo das aes;

    Nvel 6 Avaliao dos resultados (57).

    A democracia participativa conduz a populao a nveis cada vez

    maiores de participao decisria, eliminando a diviso de funes entre aqueles

    que planejam e decidem no topo da organizao e os que executam e sofrem as

    conseqncias das decises na base. Considera-se ainda a participao uma

    habilidade que, por no ser inata, deve ser aprendida e aperfeioada

    continuamente pelo homem, assim tambm as foras e operaes que constituem

    a dinmica da participao devem ser compreendidas e dominadas pelas pessoas

    (58). Na verdade, parece evidente que a melhor maneira de se aprender a

    participar praticando a participao no dia-a-dia.

    No contexto do modelo de Administrao Gerencial, a participao

    deve acontecer de forma mais ampla e democrtica para que os resultados e as

    decises possam ser compartilhadas com todos os envolvidos.

    1.2.3 TIPOS DE PARTICIPAO

    O termo participao, em sentido amplo, compreende todas as

    formas e meios pelos quais os membros de uma organizao, individual ou

    coletivamente, podem influenciar o destino dessa organizao e contribuir para a

    democratizao do poder.

    57 Ibidem, p. 33 - 34. 58 Ibidem, p. 46 52.

    Como soluo do problema do despreparo do cidado para fazer parte da democracia

    participativa, BOBBIO afirma que o nico modo de fazer com que um sdito se transforme em

    cidado pelo prprio exerccio da prtica democrtica, ou seja, a educao do cidado para o

    processo participativo est na prpria participao. (BOBBIO, Noberto O Futuro da

    Democracia. 7 Edio. So Paulo: Paz e Terra, 2000. p. 43).

  • 40

    Existem diversas maneiras para exprimir a adeso participao,

    segundo BORDENAVE:

    * a participao espontnea, decorrente das decises pessoais de pertencer a

    um determinado grupo, expressar, dar e receber afeto ou obter reconhecimento

    e prestgio;

    * a participao imposta, em que o indivduo obrigado a realizar aes ou

    atividades consideradas indispensveis pela lei ou pela autoridade constituda,

    caracterizando-se como uma obrigao, mais do que como uma deciso;

    * a participao voluntria, comum nas equipes de trabalho, onde os integrantes

    do grupo tm liberdade de decidir sobre metas, estratgias, recursos e diviso

    de trabalho;

    * a participao provocada por agentes externos no sentido de ajudar uma

    pessoa ou grupo a tomar decises, como por exemplo, a terapia, as situaes

    de consultoria, treinamento, grupo de trabalho etc;

    * a participao concedida, tpica dos programas de gesto participativa em que

    os empregados recebem delegao para tomar decises, dentro de regras e

    estratgias preestabelecidas e consideradas legtimas por ambas as partes;

    * a participao conquistada, em que as pessoas ou grupos adquirem

    autonomia para intervir em processos de deciso ou gesto ou para apropriar-se

    de parte dos resultados, mesmo contra a vontade de outros atores (59).

    Caracteriza-se basicamente a participao em dois tipos:

    * participao direta quando o indivduo age isoladamente,

    procurando influenciar as decises organizacionais e nelas interferir;

    * participao indireta quando a vontade do indivduo se

    manifesta por meio de representantes escolhidos por eles para represent-los

    junto s instituies.

    As formas de participao indireta so classificada por MOTTA em

    quatro grandes grupos (60):

    59 BORDENAVE, Juan E. Diaz op. cit., p. 27 30. 60 MOTTA caracteriza as duas primeiras formas essencialmente como formas de consultas e

    negociaes e as duas ltimas como forma de co-determinao e autodeterminao em nvel

    empresarial. (MOTTA, Paulo Roberto Gesto Contempornea: A cincia e a arte de ser

    dirigente - op. cit. p. 165 173).

  • 41

    * comits de empresa ou de estabelecimento;

    * negociao coletiva;

    * co-gesto;

    * autogesto.

    Referindo-se aos tipos de participao, MENDONA caracteriza a

    participao direta como psicolgica e pessoal, e a participao indireta como

    sociolgica, poltica e coletiva. Afirma ainda existir uma longa distncia

    separando a teoria e a prtica da participao (61).

    Na concepo de MOTTA, a participao direta necessita ser

    complementada pela participao indireta, sendo que a primeira tem algumas

    limitaes, dentre elas:

    * afetar principalmente a rea gerencial e quadros tcnicos, e os trabalhadores

    e funcionrios de nvel hierrquico mais baixo;

    * no influenciar significativamente decises de distribuio, isto , as decises

    de reparties dos resultados do trabalho e da produo;

    * no possuir carter de representao da coletividade de trabalhadores ou de

    outros grupos profissionais especficos da empresa e, portanto, pouco contribuir

    para mudar as relaes de controle e superviso da produo, no relacionando

    variveis fundamentais do trabalho, como esforo-recompensa ( 62).

    A crena na existncia de interesses comuns o que justifica as

    formas de participao; dessa forma, v-se aumentado o grau de cooperao e

    eficcia na resoluo dos conflitos, quando esses interesses comuns so

    reforados (63).

    O mesmo autor ressalta que do ponto de vista administrativo, o fenmeno mais importante do

    sculo o desenvolvimento nos pases avanados das formas de participao. (MOTTA, Paulo

    Roberto apud, MENDONA, Luis Carvalheira de - op. cit., p. 66). 61 MENDONA, Luis Carvalheira de Mendona - op. cit., p. 52. 62 MOTTA, Paulo Roberto - Gesto Contempornea: A cincia e a arte de ser dirigente - op.

    cit., p. 164 165. 63 Ibidem, p. 174.

  • 42

    Percebe-se, ento, que os dois tipos de participao, direta e

    indireta, podem se complementar no mbito social e no mbito das organizaes

    por no serem mutuamente excludentes.

    1.2.4 - CONSIDERAES SOBRE A DEMOCRACIA PARTICIPATIVA

    No mbito das aes governamentais, a democracia participativa

    est avanando devido ao crescimento da conscincia poltica do cidado.

    A democracia, que nasceu dos ideais filosficos do povo grego, ao

    longo da histria, mesmo sofrendo alguns percalos, tem se constitudo num

    marco para a sociedade do sculo XX que, apesar das inmeras guerras, foi

    talvez o perodo da histria em que mais se tenha contribudo para a consolidao

    da democracia, graas ao desenvolvimento social que elevou o nvel de

    conscientizao do cidado.

    A importncia da democracia nos dias atuais , para

    BONAVIDES, mais do que um simples sistema de governo, uma modalidade de

    Estado, um regime poltico ou mesmo uma forma de vida, pois tende a se

    converter, ou j se converteu, no mais novo direito dos povos e dos cidados.

    direito de qualidade distinta, direito que eu diria da quarta gerao (64).

    A atual Constituio Brasileira (65) preconiza em seu prembulo

    que foi institudo um Estado Democrtico, destinado a assegurar o exerccio dos

    direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurana, o bem-estar, o

    desenvolvimento, a igualdade e a justia como valores supremos de uma

    64 BONAVIDES, Paulo Teoria do Estado. 3 Edio. So Paulo: Malheiros Editores, 1995. p.

    349. 65 Constituio da Repblica Federativa do Brasil. Coleo Saraiva de Legislao. 22a Edio.

    So Paulo: Ed. Saraiva, 1999. p. 01.

    BONAVIDES sentencia que o princpio representativo, mortalmente ferido de ilegitimidade em

    todas as pocas do Brasil, republicano, s tem servido de perpetuar o domnio inarredvel das

    oligarquias. (BONAVIDES, Paulo Teoria do Estado - op. cit., p. 361).

  • 43

    sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social

    (...). Estabeleceu ainda, no Pargrafo nico do artigo 1, o nobre princpio

    democrtico segundo o qual todo poder emana do povo, que o exerce por meio

    de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituio (66). Com

    isso, ficou estabelecida a origem do poder popular e a forma de sua expresso por

    meio da democracia direta e da democracia representativa.

    A participao do cidado nas aes governamentais

    considerada por KOHEN uma das maiores caractersticas do sistema democrtico.

    Porm, adverte ser quase impossvel, na prtica, incluir nessa participao direta a

    totalidade das pessoas que formam as comunidades polticas, tendo em vista a

    complexidade das sociedades contemporneas (67).

    BOBBIO tambm observa que a democracia no goza no mundo

    de tima sade, como de resto jamais gozou no passado, mas no est beira do

    tmulo. Para ele, o modelo do Estado democrtico fundado na soberania popular,

    idealizado imagem e semelhana da soberania do prncipe, era o modelo de uma

    sociedade monstica. E considera que a sociedade real, subjacente aos governos

    democrticos, pluralista (68).

    No aspecto poltico-ideolgico, a democracia participativa se d de

    duas formas - Democracia direta e Democracia indireta ou representativa -,

    existindo entre elas um contnuum que apresenta uma variedade de formas

    intermedirias (69).

    66 Constituio da Repblica Federativa do Brasil - op. cit., p. 03. 67 KOHEN, Beatriz Poder Cidado e aes de interesse pblico um exemplo de controle a

    partir da sociedade civil: o programa de participao e fiscalizao cidad na Argentina, In:

    PEREIRA, Luiz Carlos Bresser & GRAU, Nuria Cunill (Orgs.) O Pblico No-Estatal na

    Reforma do Estado, Rio de Janeiro: Editora Fundao Getlio Vargas, 1999. p. 365. 68 BOBBIO, Noberto O Futuro da Democracia - op. cit., p. 19 e 36. 69 Segundo BOBBIO, estes dois sistemas de democracia no so alternativos, mas so sistemas

    que podem integrar reciprocamente. (Ibidem, p. 65).

  • 44

    A democracia indireta ou representativa assinalou politicamente a

    fase estreante do Estado de Direito, segundo BONAVIDES. Ele refora a

    argumentao de BOBBIO ao afirmar que a existncia da democracia no significa

    que diversas outras formas de representao sejam desconsideradas ou

    eliminadas, sem o que, argumenta esse autor, no haveria essa democracia (70).

    H uma relao histrica entre o Estado democrtico e o Estado

    burocrtico. Os Estados que se democratizaram tambm se tornaram mais

    burocratizados, como conseqncia do processo de democratizao (71). Por outro

    lado, tecnocracia e democracia so consideradas antitticas por BOBBIO. O

    argumento do autor que a condio de especialista, protagonista da sociedade

    industrial, no para qualquer cidado, o que no se coaduna com os princpios

    da democracia por esta sustentar a hiptese de que todos os cidados podem

    decidir sobre tudo que lhe diz respeito (72).

    Um ponto que vale ressaltar so os dois extremos do processo

    participativo. De um lado, o excesso de participao do cidado em todos os atos

    do Estado, o cidado total, do outro, o poder excessivo do Estado que no

    permite qualquer participao, o Estado total. evidente que o processo ideal

    deveria se situar num ponto intermedirio, onde as questes comuns fossem

    70 BONAVIDES, Paulo Teoria do Estado - op. cit., p. 354 e 366.

    KOHEN, analisando a importncia da representao poltica como mediadora dos interesses do

    cidado, no considera o direito de votar como suficiente representao poltica, sendo esta

    instrumento de aes em defesa dos direitos do cidado, por restringir a sua participao. Sugere

    uma evoluo da democracia representativa para uma etapa posterior, marcada pelo