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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE RAÍSSA DE ARAUJO DIAS SLAM RESISTÊNCIA E AS MICROTERRITORIALIZAÇÕES URBANAS São Paulo 2018

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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE

RAÍSSA DE ARAUJO DIAS

SLAM RESISTÊNCIA E AS MICROTERRITORIALIZAÇÕES

URBANAS

São Paulo

2018

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RAÍSSA DE ARAUJO DIAS

SLAMS RESISTÊNCIA E AS MICROTERRITORIALIZAÇÕES

URBANAS

Dissertação apresentada ao programa de Pós Graduação em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie como requisito à título de Mestre em Arquitetura e Urbanismo.

ORIENTADOR: Professor Pós Doutor Igor Guatelli

São Paulo

2018

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D541s Dias, Raíssa de Araujo.

Slam Resistência e as Microterritorializações Urbanas / Raíssa de

Araujo Dias.

57 f. : il. ; 30 cm

Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo) –

Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2018.

Orientador: Igor Guatelli.

Bibliografia: f. 56-57.

1. Cidade. 2. Espaço. 3. Slam. 4. Sujeito. 5. Território. I.

Guatelli, Igor, orientador. II. Slam Resistência e as

Microterritorializações Urbanas.

CDD 711.4

Bibliotecária Responsável: Giovanna Cardoso Brasil CRB-8/9605

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“A arte não me levou aonde eu queria

mas fez do meu coração um lugar habitável”.

Ni Brisant

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RESUMO

Este trabalho tem como objetivo expor e discorrer sobre uma das diversas formas de expressão marginal existentes nas cidades, buscando uma possível intersecção entre tais formas de expressão artística e a emergência de outras ou novas territorialidades no espaço público. Partindo das expressões marginais nascidas no movimento hip-hop norte americano da década de 70 e no Brasil na década de 80, também inspiração em outras diversas manifestações e movimentos artísticos internacionais e nacionais, como as instalações, os happenings e as performances, busca-se apreender e refletir sobre um outro “ethos” urbano trazido por uma arte que combina o lírico e a revolta ao manifestar-se em algumas praças e edifícios da cidade tratadas aqui como “espaços intermediários”. Neste trabalho, essa outra territorialidade (ou um espaço intermediário entre o espaço público extensivo e o espaço privado) será considerado um local fértil para a liberdade de expressão, sugerindo a apropriação e a criação livre de seus usuários, impulsionando o surgimento de reduzidos “outros espaços” que acontecem a partir do uso, uma “arquitetura espontânea” do espaço gerada a partir do entendimento destes processos de apropriação das cidades pelas linguagens marginais e contestatórias presentes nos Slams – coletivos onde poetas leem ou recitam uma poesia própria de maneira performática, em forma de batalha - na cidade de São Paulo. Parte-se de uma discussão para a construção de uma cartografia da ação contestatória do sujeito na cidade, sua expressão e esse outro espaço produzido como insumo para uma reflexão sobre o espaço público na contemporaneidade. Espera-se que ao final do trabalho, seja possível, matizar mesmo que enquanto conceito, aquilo que seria uma arquitetura sensível a tal “ethos” urbano. Palavras-chave: Cidade. Espaço. Slam. Sujeito. Território.

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Abstract

This paper aims to expose and discuss one of the many forms of marginal expression existing in cities, seeking a possible intersection between such forms of artistic expression and the emergence of other or new territorialities in the public space. Starting from the marginal expressions born in the American hip-hop movement of the 70's and in Brazil in the 80's, also inspiration in other diverse manifestations and international and national artistic movements, such as installations, happenings and performances, it is sought apprehend and reflect on another urban ethos brought about by an art that combines lyrical and revolt by manifesting itself in some squares and buildings of the city treated here as "intermediate spaces". In this work, this other territoriality (or an intermediate space between the extensive public space and the private space) will be considered a fertile place for freedom of expression, suggesting the appropriation and free creation of its users, impelling the emergence of small "others spaces "that happen from the use, a" spontaneous architecture "of the space generated from the understanding of these processes of appropriation of the cities by the marginal and contestatory languages present in the collective Slams where poets read or recite a poetry of their own in a performative way, in form of battle - in the city of São Paulo. It starts from a discussion for the construction of a cartography of the contestatory action of the subject in the city, its expression and that other space produced as input for a reflection on the public space in the contemporaneity. It is hoped that at the end of the work, it is possible to qualify even as a concept, what would be an architecture sensitive to such urban ethos. Keywords: City. Space. Slam. Subject. Territory.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ---------------------------------------------------------------------- 09

1.1 Justificativa --------------------------------------------------------------------------- 13

1.2 Objetivo -------------------------------------------------------------------------------- 14

2 SLAMS E A MICROPOLITICA URBANA ----------------------------------- 16

2.1 Slams - Máquina de Guerra: Potência Ativa --------------------------------- 22

2.2 Slams - Microesferas e Micropolíticas Sociais ------------------------------ 27

2.3 Slams – Microesferas e Micropolíticas Territoriais --------------------------- 31

3 ESPAÇO INTERMEDIÁRIO ----------------------------------------------------- 36

3.1 O Espaço Outro, Outros Espaços no Espaço, Dentro do Espaço ----- 38

3.2 Centro Cultural São Paulo: Território em Devir ----------------------------- 43

4 SLAM E ARQUITETURA: UM AGENCIAMENTO POSSÍVEL? ------- 47

5 CONSIDERAÇÕES INCONCLUSAS ----------------------------------------- 51

REFERÊNCIAS --------------------------------------------------------------------- 56

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 Slam Resistência, Praça Roosevelt ------------------------------------ 11

Figura 2 Slam Resistência, Praça Roosevelt ------------------------------------ 15

Figura 3 Slam Resistência, Praça Roosevelt ------------------------------------- 18

Figura 4 ZAP! Slam, Virada Cultural ------------------------------------------------ 19

Figura 5 ZAP! Slam, Virada Cultural ------------------------------------------------ 19

Figura 6 Slam Resistência, Praça Roosevelt ------------------------------------ 21

Figura 7 Slam Resistência, Praça Roosevelt ------------------------------------ 21

Figura 8 a 11 Slam Resistência, Praça Roosevelt ------------------------------------- 22

Figura 12 Página Oficial no Facebook do Slam Resistência ------------------- 23

Figura 13 Página Oficial no Facebook do Slam do 13 -------------------------- 23

Figura 14 Instagram oficial do Slam do 13 ----------------------------------------- 23

Figura 15 Instagram oficial do Slam Resistência --------------------------------- 23

Figura 16 Na imagem, fundadores e organizadores do Slam do 13 -------- 24

Figura 17 Slam Resistência, Praça Roosevelt ------------------------------------- 24

Figura 18 Slam Resistência, Praça Roosevelt ------------------------------------- 25

Figura 19 Slam Resistência, Praça Roosevelt ------------------------------------- 27

Figura 20 Slam Resistência, Praça Roosevelt ------------------------------------- 28

Figura 21 Slam Resistência, Praça Roosevelt ------------------------------------- 29

Figura 22 Slam Resistência, Praça Roosevelt ------------------------------------- 30

Figura 23 Mapa da cidade de São Paulo -------------------------------------------- 33

Figura 24 Mapa da cidade de São Paulo -------------------------------------------- 35

Figura 25 Slam Resistência, Praça Roosevelt ------------------------------------- 37

Figura 26 Slam Resistência, Praça Roosevelt ------------------------------------- 40

Figura 27 Slam Resistência, Praça Roosevelt ------------------------------------- 42

Figura 28 Centro Cultural São Paulo ------------------------------------------------- 43

Figura 29 Centro Cultural São Paulo ------------------------------------------------- 43

Figura 30 Centro Cultural São Paulo ------------------------------------------------- 43

Figura 31 Centro Cultural São Paulo ------------------------------------------------- 44

Figura 32 Centro Cultural São Paulo ------------------------------------------------- 44

Figura 33 Centro Cultural São Paulo ------------------------------------------------- 44

Figura 34 Centro Cultural São Paulo ------------------------------------------------- 44

Figura 35 Centro Cultural São Paulo ------------------------------------------------- 45

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Figura 36 Centro Cultural São Paulo ------------------------------------------------- 45

Figura 37 Slam Resistência, Praça Roosevelt ------------------------------------- 49

Figura 38 Slam Resistência, Praça Roosevelt ------------------------------------- 49

Figura 39 Slam Resistência, Praça Roosevelt ------------------------------------- 50

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1 INTRODUÇÃO: O Corpo e a Rua

A arte que se expressa na cidade de maneira marginal1, e em diálogo

constante com os espaços, é considerada uma crítica à sociedade ou um grito

desesperado de uma comunidade, grupo ou indivíduo.

Quando o assunto é a arte urbana contestatória, o Movimento Hip Hop,

surgido na periferia de Nova York, durante os anos 70, é aqui entendido como ponto

de partida de uma trajetória recente, na qual diversas formas de linguagem, popular2

e marginal, viriam a nascer nas cidades.

Tais formas de expressão popular tomam relevante importância no contexto

das cidades daquele momento, tal fato mantêm-se presente ainda hoje nas cidades

brasileiras, sobretudo nos grandes centros urbanos. É inegável a importância do

grafite e do rap como formas de expressão e auto reconhecimento.

No Brasil, desde os anos 80, “partindo de questões sociais diferenciadas”

segundo Mariane Lemos Lourenço (2010), “O Movimento Hip Hop e a Constituição

dos Narradores Urbanos”, tomam força na cidade de São Paulo. Este movimento

tem início com encontros de letristas de rap, de áreas periféricas distintas, perto da

estação de metrô São Bento no centro da cidade.

O direito à cidade é, portanto, muito mais do que um direito de acesso individual ou grupal aos recursos que a cidade incorpora: é um direito de mudar e reinventar a cidade, mas de acordo com nossos mais profundos desejos. (HARVEY, 2012, p. 28)

Os encontros realizados pelo Movimento Hip Hop provocaram não apenas um

novo conceito de arte da periferia – em diálogo com as áreas centrais – mas

1 De acordo com o Glossário de Derrida (1976), desenvolvido por Silviano Santiago e pesquisadores do Departamento de Letras da PUC do Rio de Janeiro, a palavra ‘marginal’ surge do conceito de ‘margem’: A margem não é um além, o que prescreveria o limite. Não é, por conseguinte, um “fora” em oposição a um dentro. O limite é violentado, rasura-se, perde-se; o próprio e o outro jogam; a perda é o encontro. E o primeiro texto é desvelado (ao menos, em parte), permite-se ser contrariado em sua opacidade inicial. O fora e o dentro se reescrevem e não se separam. A margem e o “marginalizado”, o “disseminado”, o “suplemento” e a possibilidade de ser da escritura (re)compõem o texto; mais do que exteriores a ele, são o “interior do interior”, razão de ser da estrutura que se deixa ler dentro (e) fora da superfície. 2 Milton Santos (2000), em Para uma Outra Globalização descreve sobre o processo histórico de globalização e sobre um outro mundo em que “as pessoas constituiriam a principal preocupação, um verdadeiro período popular da história, já entremostrado pelas fragmentações e particularizações sensíveis em toda a parte devidas à cultura e ao território” (p.119).

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também a necessidade de ocupação do espaço. Passa a existir uma nova maneira

de intervir na cidade e de se instalar em qualquer lugar que aparenta qualquer

necessidade de vida, onde um simples cidadão se torna protagonista da própria

história.

A intervenção, entendida aqui como forma de ocupação e uma maneira de

integrar o espaço, o objeto e as pessoas, provoca a interatividade do usuário ou

observador com o ambiente ou a cidade.

Além disso, é um direito mais coletivo do que individual, uma vez que reinventar a cidade depende inevitavelmente do exercício de um poder coletivo sobre o processo de urbanização. (HARVEY, 2012, p. 28)

Através de sua expressão, que poderá manifestar-se ou não neste lugar,

usurpando e deturpando o sentido dado, o arquiteto Igor Guatelli (2012, p. 116), no

livro “Arquitetura dos Entre Lugares”, sugere que “as essências relacionadas ao

habitar seriam substituídas pelo acidental”.

Este trabalho se propõe a produção no campo da arquitetura, dos rastros de

uma intervenção inspirada e sensível às diversas formas de manifestação urbanas

surgidas nos espaços e estruturas de São Paulo, usando como objeto de estudo o

Slam Resistência3.

Foi em um bar periférico do norte de Chicago que o Slam nasceu, quando um operário da construção civil e poeta Marc Kelly Smith fez um show chamado Uptown Poetry Slam – o primeiro do gênero. As regras simples criadas por Marc em 1986 permanecem. Não vale usar figurinos, acessórios, cenário ou acompanhamento musical. A poesia deve ser autoral, precisa ser recitada em até três minutos. (PRATA, 2017, p. 26-27)

3 O primeiro Slam em um espaço público no centro da cidade de São Paulo, acontece desde 2014, na Praça Roosevelt toda primeira segunda-feira do mês. Em uma conversa informal com um dos poetas frequentadores da competição de poesia (spoken word), foi descoberto que o Slam Resistência não está sendo organizado atualmente pelos organizadores originais. FONTE: Página Oficial do Slam Resistência no Facebook. Disponível em: https://www.facebook.com/slamresistencia/, acesso em: 24 de maio de 2018.

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Figura 1: Slam Resistência Primeira Edição, Praça Roosevelt, São Paulo, Outubro de 2014. FONTE: Acervo Slam Resistência. Disponível em: https://www.facebook.com/slamresistencia/, acesso em: 07 de fevereiro de 2018. Nota-se a utilização das estruturas da Praça – pelos usuários, como a configuração de uma plateia participante da intervenção.

A existência do espaço entre lugares ou intermediário, a partir de

intervenções marginais e perturbadoras será a chance de recriar nosso modelo de

cidade, de desenvolvimento e de liberdade. Segundo Guatelli (2008) em

“Contaminações Construtivas do Espaço Urbano: Cultura urbana através da

intertextualidade e do entre”, para Arquitextos:

O espaço intermediário seria compreendido aqui justamente como uma in-definição, um espaço aberto às significações entre espaços definidos, espaços que seriam os agentes catalisadores, motivadores dessas ações dos usuários, desses eventos, desses acontecimentos inesperados que surgiriam e permaneceriam sempre em processo, transitórios, jamais se firmando como atividade dominante que pudesse se transformar em uma convenção de uso, e onde o programa não seria determinado pelo arquiteto, mas mutável, estaria sempre sendo solicitado e conformado por essas ações.

A arte se torna componente de uma sociedade que se encontra em constante

movimento, sem referentes fixos. Traduz um papel simbólico da arquitetura, com

diferentes pontos de produção e difusão, um novo planejamento de como se projetar

a arte no espaço como maneira de ocupação.

Nós vivemos na época da simultaneidade: nós vivemos na época da justaposição, do próximo e do longínquo, do lado-a-lado e do disperso. Julgo que ocupamos um tempo no qual a nossa experiência do mundo se assemelha mais a uma rede que vai ligando pontos e se intersecta com a sua própria meada do que propriamente a uma vivência que se vai enriquecendo com o tempo. (FOUCAULT, 1984, p. 78)

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Em 1960 seria lançado o “Manifesto da Internacional Situacionista” de cunho

social, cultural e político. O situacionismo4 teve início na Europa e reuniu poetas,

arquitetos, artistas plásticos, cineastas e outros profissionais que se denominavam

dotados de uma ideologia marginal:

Os situacionistas chegaram a uma convicção exatamente contrária daquela dos arquitetos modernos. Enquanto os modernos acreditaram, em um primeiro momento, que a arquitetura e o urbanismo poderiam mudar a sociedade, os situacionistas estavam convictos de que a própria sociedade deveria mudar a arquitetura e o urbanismo. Enquanto os modernos chegaram a achar, como Le Corbusier, que a arquitetura poderia evitar a revolução, os situacionistas, ao contrário, queriam provocar a revolução, e pretendiam usar a arquitetura e o ambiente urbano em geral para induzir à participação, para contribuir nessa revolução da vida cotidiana contra a alienação e a passividade da sociedade. (JACQUES, 2003, p.19)

A natureza da obsolescência na arquitetura efêmera provoca uma

necessidade de atualizar a mensagem, que é uma das virtudes da arte. A liberdade

de expressão permite aos artistas compor algo que reflete valores ou denunciam

injustiças e opressões, a ocupação do espaço através da expressão do Slam

Resistência no espaço público:

Disso advêm algumas questões correlatas: todas as pessoas se apropriam e percebem o espaço, ou a forma, da mesma maneira, ou, na maioria das vezes, como o arquiteto pretende que elas percebam ou se apropriem? É possível o arquiteto determinar que exista uma forma adequada para cada tipo de uso, imaginando uma uniformização da percepção forma-espacial e uma estandardização

4 O situacionismo é um movimento surgido na Itália nos anos 60 que influencia toda a Europa, até seu fim em 1972. A última fase do movimento trazia textos de Guy Debord (1931 - 1994) sobre anarquismo e surrealismo, criticava o modo de vida capitalista utilizando a expressão “espetacular mercantil” para a cultura de consumo da época. Estudantes de Paris nos protestos de Maio de 68 foram influenciados pelo Manifesto Internacional Situacionista. No início da revolta, protestos estudantis se estenderam aos trabalhadores, na França e desencadearam na queda do governo do general De Gaulle. No referencial teórico, Apologia da Deriva, de Paola Jacques (2003) foram encontrados dados relevantes para este trabalho, sobre como aconteceram os movimentos sociais na Europa nos anos 60: “O que é de fato uma situação? É a realização de um jogo superior, ou mais exatamente a provocação para esse jogo que é a presença humana. Os jogadores revolucionários de todos os países podem unir-se na IS para começar a sair da pré-história da vida cotidiana. Desde já propomos uma organização autônoma dos produtores da nova cultura, independente das organizações políticas e sindicais que existem no momento, por não lhes reconhecermos a capacidade de organizar algo diferente do arranjo do que já existe.” Internacional Situacionista – IS, n 4, Junho de 1960. (JACQUES, 2003, p. 126-128)

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dos movimentos das pessoas nesse espaço? (GUATELLI, 2008, 094.00)

1.1 Justificativa

A origem de minhas preocupações para este trabalho teve início em 2013 quando

como vivência e experiência participei do Coletivo Esquina5 na cidade de Poços de

Caldas, Minas Gerais. Para circular em diferentes espaços, o movimento Esquina

passou a promover intervenções culturais e artísticas nos locais públicos e

institucionais das periferias e centro da cidade, a fim de propor o diálogo entre as

artes em diferentes ambientes.

A partir da busca de novas possibilidades de ocupação, de outros modos de

existência nas cidades e resistência, de intervenções perturbadoras como os Slams,

em locais públicos, surge o Slam Resistência. Como estudo de caso para este

trabalho, o Slam Resistência acontece na Praça Roosevelt, no centro da cidade de

São Paulo, toda primeira segunda feira do mês, considerado aqui como formatos

estéticos conjugados a micropolíticas6 no espaço público.

5 De acordo com a descrição do próprio Movimento Esquina Intervenções Urbanas (2013):

“Como vivência e experiência, o Coletivo Esquina surgiu de um grupo de oito pessoas que se formou em Gestão Cultural pelo Instituto Federal de Ciência e Tecnologia do Sul de Minas Gerais e é uma iniciativa que busca sensibilizar as pessoas por meio da cultura, difundir e espalhar a literatura, a fotografia, a música, o teatro e as artes visuais através de intervenções em espaços públicos e institucionais da cidade de Poços de Caldas, Minas Gerais. Para circular em diferentes espaços, o movimento Esquina promove intervenções culturais e artísticas nos locais públicos e institucionais das periferias e centros centrais da cidade, a fim de propor o diálogo entre as artes em diferentes ambientes. A ideia foi importada dos saraus que acontecem no estado de São Paulo, traz um “microfone” disponível ao público, que pode contribuir com contação de poesias e performances teatrais de poemas, além da contribuição com variadas formas de arte. Os eventos oferecem também varal de fotos com imagens clicadas por fotógrafos da cidade, em intervenções que já aconteceram nas periferias e a distribuição de poesias de autores vivos da literatura marginal, além de cartazes com frases significativas de rap. O intuito é fazer com que a literatura seja levada para casa, tocada e distribuída. Durante os encontros, através da palavra falada, os idealizadores querem popularizar a cultura na cidade e fazer com a que as pessoas que apreciam a arte circulem em diferentes ambientes. A ideia é tirar a poesia das bibliotecas e levá-la para os saraus, para dar voz à população, tornar a população protagonista da própria história e multiplicadora de cultura. O intuito do movimento Esquina é ser democrático, receber públicos de todas as idades, sejam crianças, adolescentes, adultos ou idosos, sem distinção de pessoas, seja por condição social, etnia, deficiência física ou sensorial, gênero, faixa etária, domicílio e ocupação”. 6 Segundo Suely Rolnik (2018), em entrevista sobre seus estudos sobre micropolítica

surgidas atualmente sobre o inconsciente colonial-capitalístico na América Latina em relação às questões socioeconômicas “Em vez de sucumbir à melancolia, ou seja à impossibilidade de fazer o luto do objeto perdido e permanecer eternamente colada a este,

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1.2 Objetivo

Como objetivo, uma problematização teórico-conceitual desses lugares onde

os Slams acontecem e no momento em que acontecem foi realizada. A partir de um

trabalho de campo pela captura de imagens, e acesso às redes sociais do Slam

Resistência, como objetivo específico para esta dissertação. Associado a essa

discussão conceitual e inteligível, uma pesquisa também imagética foi feita de

ocupações encontradas no Centro Cultural São Paulo.

O material levantado tem como intuito investigar o processo singular de

interação social, uma guerra poética no momento em que acontece o Slam

Resistência. Nos seus rastros, emerge uma arquitetura sensível a tal intervenção de

arte que é esse Slam – a batalha de poesia original falada, e ocupação do espaço

analisando o sujeito. Refletir sobre a extensão política e social dessa ação no

espaço, incluindo o indivíduo, presente em Michel Foucault (2006, p. 13):

Parece-me que a aposta, o desafio que toda história do pensamento deve suscitar, está precisamente em apreender o momento em que um fenômeno cultural, de dimensão determinada, pode efetivamente constituir, na história do pensamento, um momento decisivo no qual se acha comprometido até mesmo nosso modo de ser de sujeito moderno.

A intenção deste trabalho é a produção de uma cartografia urbana gerada a

partir das urbanidades e territorialidades provenientes da arte urbana contestatória,

neste caso, os Slams como ponto de partida. Essa cartografia será o material para

reflexões sobre o fazer arquitetônico na contemporaneidade.

O evento, no momento em que acontece o Slam Resistência, um indivíduo

reconhece o outro e provoca a articulação no espaço. Passa a existir um processo

de subjetivação emancipada, não conduzida ou imposta, no processo de construção

sinto que graças ao desmoronamento deste mundo idealizado, podemos reconhecer mais claramente que é preciso deslocar-se da micropolítica dominante, a qual abarca a própria esquerda. Refiro-me à micropolítica reativa do inconsciente colonial-capitalístico que comanda o sujeito moderno que, todavia, encarnamos, inclusive na esquerda. É nesta direção que se move um novo tipo de ativismo, que vem se propagando na sociedade brasileira e que se caracteriza precisamente pela invenção de múltiplas formas de ação micropolítica. Estas talvez já não caibam no imaginário das esquerdas, sobretudo em sua versão partidária e sindical, e menos ainda no binômio esquerda x direita.” FONTE: https://www.goethe.de/ins/br/pt/kul/fok/rul/20790860.html, acesso em: 26 de novembro de 2018.

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de um sujeito. Nos rastros dessa investigação toda, emerge uma questão espacial

sensível ao estado da arte e no modo operante da arquitetura na atualidade:

Michel Foucault nos interpela no sentido de que somos responsáveis, sempre onde estamos, pela produção e reprodução ou pelo questionamento e inflexão das figuras de saber, das relações de poder, das práticas estratégicas que constituem espaços de exclusão, de segregação, de censura, de interdição, de reclusão, de silenciamento, que fazem parte da maquinaria social que sustentamos. Refletir, portanto, sobre onde estamos, onde nos situamos, quais os espaços que constituímos e que nos constituem, que segmentações espaciais atualizamos em cada uma de nossas ações. (MUNIZ; VEIGA; SOUZA, 2008, p. 11-12)

Figura 2: Slam Resistência, Praça Roosevelt, São Paulo, 2017. IMAGEM: Vitor Villaça Campanario, em: 04 de setembro de 2017.

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2 SLAMS E MICROPOLÍTICA URBANA

Foucault mostrava em seu curso O Nascimento da Biopolítica, que a democracia nessa sociedade que já não era mais só disciplinar e que mais tarde Gilles Deleuze anunciou como sociedade de controle, de intermináveis controles -, ampliava conservadorismos políticos, penalidades e religiosidades. Então, um parresiasta se atualiza ao questionar a democracia não pela sua bula, mas pelo paradoxo que faz conviver crescimento de liberdades com ampliação de assujeitamentos; ao discutir os anarquismos diante de sua incorporação no interior de lutas democráticas. (PASSETTI et al., 2008, p. 110)

O trabalho centra-se em uma investigação dos rastros deixados pelos Poetry

Slam ou Slam – encontros de poesia falada, ou spoken word e performática. Em

forma de competição, um júri popular é escolhido aleatoriamente entre o público no

início do evento. O evento é divulgado com antecedência em data, hora e local

através das redes sociais pelos organizadores de cada Slam da cidade de São

Paulo, surgido em 2008. Logo em seguida do fim da performance, o júri apresenta a

nota aos slammers7, ou poetas, levando em consideração principalmente dois

critérios: a poesia e o desempenho, além do tempo de performance que não deve

exceder três minutos. Se exceder o tempo, o próprio público levanta a mão para

sinalizar sobre. Em cada evento podem ser inscritos uma quantidade variável de

slammers, enquanto cada um deles está declamando, quem assiste a performance

deve ficar em silêncio. A força dos aplausos e gritos do público, ao final da

apresentação, demonstra preferência ao slammer ou poesia que mais gostaram,

serão os prováveis ganhadores da competição.

O fato é que no Slam o que menos importa é a nota. Campeão ou não, todos ganham: artistas e o público. As poesias dão a oportunidade da pessoa se ver e se identificar na fala da outra, que as vezes nem conhece. Sonhos são compartilhados por todos. (LETA, Voz das Comunidades, 24 de janeiro de 2018)

As regras básicas, de 1986 surgidas nos EUA prevalecem: é proibido o uso

de figurino ou objeto cênico durante a performance, os textos declamados devem

ser originais, próprio de cada poeta.

O formato da competição diz que o poeta ou poetisa não deve usar adereços ou ferramentas cênicas, não pode ter acompanhamento

7 Slammer é o nome dado aos poetas que possuem textos próprios que competem nos

slams. FONTE: Documentário Slam Voz de Levante, 2017.

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musical e deve falar poesias de sua autoria. O tema das poesias é livre, valorizando a liberdade de expressão. (LETA, Voz das Comunidades, 24 de janeiro de 2018)

Porém alguns Slams recentemente começam a possuir regras particulares,

pequenas mudanças que fazem cada Slam ser único pela forma como se organiza e

configura, como as heterotopias8 de Michel Foucault (1984).

O parresiasta é próprio da democracia ateniense e também da anarquia contemporânea. Ele pratica a verdade como obrigação e exige franqueza; escolhe a fala em vez do silêncio; reconhece o risco de morte sobre a segurança; evita a lisonja; faz de sua atitude uma obrigação moral em vez de agir segundo uma conduta relativa ao próprio interesse ou ao aparato moral. No campo filosófico, a parrésia está relacionada com o cuidado de si. A palavra parrésia, que apareceu primeiro na tragédia mais racional de Eurípedes, em latim se transformou em libertas (liberdade de quem fala) (PASSETTI et al., 2008, p. 110).

Cada Slam de poesia possui um grito de guerra único e diferente. Quando o

poeta, pronto para competir, começa a performance, antes, os mestres de cerimônia

gritam e o público repete o grito de guerra do Slam. A partir daí todos no local ficam

em silêncio até que o slammer termine a performance.

8 Conceito que foi criado por Michel Foucault, para uma Conferência em Paris, em 1967. No

texto “De Outros Espaços”, o autor comenta sobre um “espaço outro” onde acontecem relações além do tempo. Também além dos espaços pré-determinados para relações que já acontecem, como espaços projetados para encontros. “Nós vivemos na época da simultaneidade: nós vivemos na época da justaposição, do próximo e do longínquo, do lado-a-lado e do disperso. Julgo que ocupamos um tempo no qual a nossa experiência do mundo se assemelha mais a uma rede que vai ligando pontos e se intersecta com a sua própria meada do que propriamente a uma vivência que se vai enriquecendo com o tempo.” (p. 78). Este conceito de Foucault, a heterotopia, será discutido mais adiante neste trabalho. “O espaço no qual vivemos, que nos leva para fora de nós mesmos, no qual a erosão das nossas vidas, do nosso tempo e da nossa história se processa num contínuo, o espaço que nos mói, é também, em si próprio, um espaço heterogêneo. Por outras palavras, não vivemos numa espécie de vácuo, no qual se colocam indivíduos e coisas, num vácuo que pode ser preenchido por vários tons de luz. Vivemos, sim, numa série de relações que delineiam lugares decididamente irredutíveis uns aos outros e que não se podem sobre-impor.” (p. 79)

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Figura 3: Slam Resistência, Praça Roosevelt, São Paulo, 2017. IMAGEM: Vitor Villaça Campanario, em: 04 de setembro de 2017.

O Slam é uma celebração da poesia original falada na cidade de São Paulo

que acontece desde de 2008. A precursora dos eventos de Poetry Slam na cidade

foi Roberta Estrela D’álva, artista referência para o Movimento Hip Hop da cidade,

segundo a Revista Brasileiros (2017). “Em 2008, apaixonada pelos embates depois

de uma viagem aos Estados Unidos, Roberta resolveu trazê-los para o Brasil e

organizou em São Paulo o primeiro Slam” de acordo com a escritora Liliane Prata,

em entrevista com Estrela D’alva (2017).

Os primeiros Slams aconteciam no Sesc Campo Limpo uma vez por mês –

ZAP! ou Zona Autônoma da Palavra. “As pessoas estavam esperando um espaço de

diversidade como esse” disse Roberta Estrela D’alva (2017). A configuração do

acontecimento se dava em um palco de pequeno porte, os poetas declamavam os

textos originais em um microfone, como nos primeiros Slams surgidos nos EUA. E

da mesma maneira ocorre na competição anual mundial de Poetry Slam em Paris,

na França, atualmente.

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Figura 4: ZAP! Slam, Virada Cultural, Largo São Bento, São Paulo, 2012. IMAGEM: Leonardo Galina (Guma), em: 06 de maio de 2012. Disponível em: http://zapslam.blogspot.com.br/search/label/fotos, acesso em: 26 de maio de 2018. Figura 5: ZAP! Slam, Virada Cultural, Largo São Bento, São Paulo, 2012. IMAGEM: Leonardo Galina (Guma), em: 06 de maio de 2012. Disponível em: http://zapslam.blogspot.com.br/search/label/fotos, acesso em: 26 de maio de 2018.

A artista Estrela D’alva participou da produção do documentário “Slam: Voz

de Levante”, lançado em outubro de 2017. Também é organizadora do Slam BR,

“etapa nacional que reúne os que receberam a maior nota nas edições regionais”

(PRATA, 2017, p. 27).

De acordo com a Mostra Trilhas Urbanas – Poesias, realizada pelo Slam do

Corpo9, na exposição das obras de Jean- Michel Basquiat na cidade de São Paulo

entre janeiro e março de 2018:

Todo final de ano acontece o Slam BR, o campeonato nacional da modalidade, onde slammers de diversos Slams, que competiram durante todo o ano, concorrem a uma vaga para representar o Brasil na Copa Mundial de Poesia na França.

O Poetry Slam passou a acontecer em escolas, universidades, bibliotecas de

todo o mundo a partir de 1986, de acordo com o site oficial de Marc Smith, criador

oficial da competição de poesia surgida nos Estados Unidos. Como solução para

resgatar clientes de um local falido, de acordo com o depoimento de Marc Smith no

documentário “Slam: Voz de Levante”, a premiação da competição eram apenas

alguns dólares. No Brasil, as premiações geralmente são livros de poetas vivos da

9 Corposinalizante é o coletivo realizador do Slam do Corpo, “o primeiro Slam de Surdos e Ouvintes do Brasil, com poemas em libras e língua portuguesa” de acordo com os organizadores. Os prêmios recebidos pelo coletivo Corposinalizante pela realização do Slam do Corpo, até então, são: Prêmio Darcy Ribeiro 2009, Prêmio Ludicidade 2009, Prêmio Sentidos 2010, Prêmio Artes Cênicas na Rua 2010, Pontinho de Cultura. Disponível em: https://www.facebook.com/pg/Corposinalizante, acesso em: 27 de Maio de 2018.

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cena dos Saraus e Slams atuais, em alguns casos camisetas de coletivos ligados

aos movimentos de resistência.

Os anarquismos não cessam de acontecer. No campo e nas cidades, na produção e na cultura, na vida diária, eles inventam costumes libertários que desintegram, abalam a propriedade, corroem os Estados, estraçalham o Indivíduo. A anarquia é uma singularidade que procria grupos de afinidades, organizações, associações com existências muitas vezes breves, outras vigorosas, algumas apenas circunstanciais, e que atua intensificando os acontecimentos (PASSETTI et al., 2008, p. 110-111).

O surgimento da competição de poesia falada na cidade de São Paulo

influencia o slammer Emerson Alcalde – vice-campeão mundial de Poetry Slam, que

por uma questão de dificuldade de deslocamento dentro da cidade de São Paulo,

tem a ideia de criar um Slam no próprio bairro, numa praça, próxima à estação do

metrô Guilhermina-Esperança (Revista Brasileiros, 2017).

Os situacionistas perceberam então que não seria possível propor uma forma de cidade pré-definida pois, segundo suas próprias ideias, esta forma dependia da vontade de cada um e de todos, e esta não poderia ser ditada por um planejador. Qualquer construção dependeria da participação ativa dos cidadãos, o que só seria possível por meia de uma verdadeira revolução da vida cotidiana. (JACQUES, 2003, p. 19).

Um espaço intermediário surge após a aglomeração de indivíduos e seus

interesses, “passou a ter iluminação após o uso daquele ambiente” segundo o poeta

Alcalde, em uma entrevista para a Revista Brasileiros no segundo semestre de

2017. Aquele evento passou a ser conhecido como Slam da Guilhermina10, o

pioneiro em um local público e acessível, sem distinção, um Slam não institucional.

Atualmente, o poeta Emerson Alcalde também é organizador do Slam BR, e SóFalá

que acontece na Red Bull Station – uma instituição que se encontra no centro da

cidade de São Paulo apoiadora de projetos urban thinking.

A partir dos precursores, vários outros Slams surgiram em espaços

intermediários da cidade – qualquer lugar que tenha um uso improvisado e/ ou

10 No dia 25 de Maio de 2018, em um dos eventos do Slam da Guilhermina onde acontecia o lançamento do livro Sangria, da poeta Luiza Romão, de acordo com a página pessoal da slammer em tempo real: “Slam da Guilhermina rolando e eis que encostam: 6 viaturas, 1 base móvel e 2 ônibus da polícia militar. Se isso não é postura ostensiva e cercamento intelectual, eu não sei o que é. Edit: eles acabaram de sair. Do nada. Assim como chegaram, uma hora de intimidação. Que tempos, parças!” Disponível em: https://www.facebook.com/luiza.romao.1, acesso em: 28 de maio de 2018.

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marginal, no extremo da Zona Sul, na Zona Leste e no Centro. O Slam constrói o

espaço intermediário no momento em que ele acontece, quando deixa de ser

resíduo, um espaço de intermediação, um evento. Um lugar onde há interação de

indivíduos com interesses ligados através da arte marginal, original e performática.

Figura 6: Slam Resistência, Praça Roosevelt, São Paulo, Junho de 2015. FONTE: Acervo Slam Resistência. Disponível em: https://www.facebook.com/slamresistencia/, acesso em: 07 de fevereiro de 2018. Figura 7: Slam Resistência, Praça Roosevelt, São Paulo, Fevereiro de 2016. FONTE: Acervo Slam Resistência. Disponível em: https://www.facebook.com/slamresistencia/, acesso em: 07 de fevereiro de 2018. As imagens acima mostram o início do Slam Resistência, a divulgação e público claramente aumentou de acordo com os acessos online e no momento em que o evento acontece.

A diferença entre os espaços de Slam em local institucional e de Slam em local

público, no momento em que o evento está acontecendo é que em um local privado

existe um palco – improvisado ou já construído, com microfone e uma configuração

de plateia bastante parecida com a de um teatro. Geralmente, um espaço que

possui cobertura, acesso a sanitários, exemplificando, muitos acontecem em

instituições como o Serviço Social do Comércio (SESC) de todo o Brasil, atualmente.

No Slam que sucede no espaço público, como o Slam Resistência, específico

para esta dissertação, a formação ou configuração do espaço é efêmera. Ou seja,

não existe um palco, o público improvisa para conseguir participar do evento e

observar as performances, não possui microfone e não é patrocinado por

instituições. É comum encontrar públicos iguais ou parecidos nos dois tipos de

intervenção, já que os coletivos de poesia original marginal se conectam no

ambiente urbano e, principalmente, pela internet.

O anarquista não se prepara para a revolução. Ele pratica insurreições todos os dias associando-se aos parceiros e experimentando outros costumes. A associação é o lugar da existência amistosa e conflituosa, estabelecida por pessoas contundentes, livres de regras fixas, constantes e imutáveis. Relaciona-se formando federações, compostas de miríades de associações que atravessam territórios, fronteiras e certezas. Os

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anarquistas são nômades, máquinas de guerra voltadas para destruir desigualdades, hierarquias e experimentar libertarismos. Eles inventam seus próprios recursos. (PASSETTI et al., 2008, p. 111)

Atualmente, mais de 30 Slams existem na cidade de São Paulo de acordo

com o poeta Emerson Alcalde (Revistas Brasileiros, 2017), sendo institucionais ou

não, em espaços públicos ou não. Como os que acontecem na Virada Cultural,

desde 2015.

Figura 08 a 11: Slam Resistência, Praça Roosevelt, São Paulo, 2017. IMAGEM: Vitor Villaça Campanario, em: 04 de setembro de 2017.

2.1 Slams - Máquina de Guerra: Potência Ativa

A divulgação dos Slams passa a ser possível através do acesso do público à

internet, na era da popularização da informação nas mídias sociais. A organização e

a divulgação dos eventos, acontece pelo Facebook e Instagram, qualquer pessoa,

sem distinção, tem conhecimento do horário e local onde acontece cada Slam da

cidade, se acessar os links dos Slams na internet, podem participar como

competidores ou plateia.

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Figura 12: Página Oficial no Facebook do Slam Resistência, acesso em: 28 de janeiro de 2018. Figura 13. Página Oficial no Facebook do Slam do 13, acesso em: 12 de abril de 2018.

Figura 14: Instagram oficial do Slam do 13, publicação do dia 15 de março de 2018, imagem com um total de 128 curtidas, o perfil possui atualmente 951 seguidores online. Disponível em: https://www.instagram.com/slamdo13/, acesso em: 12 de abril de 2018. Figura 15: Instagram oficial do Slam Resistência, publicação do dia 30 de janeiro de 2018, imagem com um total de 83 curtidas e 3 comentários, o perfil possui atualmente 879 seguidores. Disponível em: https://www.instagram.com/oficial.slamresistencia/, acesso em: 12 de abril de 2018.

Vídeos são feitos ao vivo pelos organizadores dos Slams, durante a batalha

de poesia, ou em outros momentos para promover os próximos eventos. Há também

uma promoção, via internet, dos Slams e movimentos de resistência a partir da

criação de mercadorias, – como por exemplo a venda de camisetas com o logo de

cada Slam, lojas online são criadas pelos organizadores. Não são todos os coletivos

que possuem mercadorias para venda.

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Figura 16: Na imagem, fundadores e organizadores do Slam do 13 vestindo os produtos produzidos, encontrados na página oficial do Slam no Facebook, em um álbum com o nome de “Lojinha Slam do 13”. Disponível em: https://www.facebook.com/SlamDo13/, Acesso em: 27 de abril de 2018.

Importante ressaltar que nem todos os Slams acontecem com frequência ou

possuem produtos para vendas, alguns são bem organizados e possuem uma

hierarquia melhor definida, dentro da esfera de cada Slam, que outros. Uploads de

imagens são totalizados depois que acontecem os eventos, também pela

organização dos Slams.

Figura 17: Slam Resistência, Praça Roosevelt, São Paulo, 2017. IMAGEM: Vitor Villaça Campanario, em: 04 de setembro de 2017. Na imagem é possível observar a posição central dos organizadores do evento, alguns podem ser identificados pelas roupas com o escrito “Slam Resistência”.

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Cada Slam possui uma organização própria, com uma equipe bem definida ou

não, de apresentadores e mestres de cerimônia (MC)11 no momento em que

acontecem. Gritos de guerra também são particularidades de cada Slam e são

usados como antecessores à performance de cada competidor da batalha de

poesia. Fotógrafos, videomakers, apoiadores e coletores de notas dadas pelo

público aos slammers são funções previamente definidas pelos organizadores.

Figura 18: Slam Resistência, Praça Roosevelt, São Paulo, Março de 2016. FONTE: Acervo Slam Resistência. Disponível em: https://www.facebook.com/slamresistencia/, acesso em: 07 de fevereiro de 2018. Notável a contínua aglomeração de pessoas das primeiras ocupações pelo Slam Resistência na Praça Roosevelt desde o início até as intervenções atuais.

Os pioneiros a executarem os Slams na cidade de São Paulo são em geral

poetas, com títulos publicados ou não, fazem parte de coletivos ou não, vivem da

cultura como trabalho e sentiram a necessidade de ocupar o espaço incluindo

qualquer sujeito. Atualmente, os organizadores dos eventos que promovem a

competição de poesia geralmente são os mestres de cerimônia nos eventos. Existe

um esforço da parte dos precursores de motivar a divulgação dos Slams.

11 O mestre de cerimônia surgiu no início da cultura Hip Hop, é o indivíduo que faz a apresentação e mediação nos eventos de rap, saraus e slams. Geralmente é alguém conhecido dentro do Movimento Hip Hop pela maioria das pessoas que frequentam os eventos e traz consigo o bom humor, na maioria das vezes possui o dom de rimar e fazer rir. FONTE: Hip Hop Evolution. Darby Wheeler. Documentário. EUA: Netflix, 2016. (188 minutos).

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Acontece de alguns Slams que surgem em certos lugares da cidade não

permanecerem em constante atividade. Slams surgem e permanecem por um

período e logo se desconectam, online ou não. Enquanto tal inconstância de eventos

e organização não desenvolve, slammers passam a migrar para outros Slams mais

próximos, ou mesmo longe se de fácil acesso através da mobilidade urbana.

Essa possibilidade se dá através de contatos feitos com poetas de toda a

cidade de São Paulo, no momento em que os eventos acontecem ou online, as

pessoas se reconhecem.

As dinâmicas sociais e urbanas são conexões inéditas que provocam um

intertexto do lugar. Assim sujeito, objeto e território são os textos com possibilidade

de remontagem dessas relações, uma recomposição, mesmo que efêmera na

composição do espaço intermediário.

A construção desse outro sujeito, um ser múltiplo, em toda sua multiplicidade

traz uma articulação estratégica com engrenagens, a máquina de guerra (PASSETTI

et al., 2008, p. 111). Sem interrupção ou uma finalidade precisa, essa congestão

espacial (KOOLHAAS, 2014, p.46) advinda do momento em que acontece o Slam

Resistência, promove uma mudança de intensidade de como a coisa acontece no

mundo. Consequentemente o indivíduo, naquele espaço, também muda, passa a ser

outra coisa além ou aquém do que era antes.

A intenção dessa reunião de pessoas com a arte original é dar voz à

população, divulgando a arte marginal, que se entende aqui por estar “às margens –

nas bordas, um fora dentro que permanece fora, nunca está a bordo porque aborda

pelas bordas e não por aquilo que parece ser central”, segundo Igor Guatelli, em

uma conversa, durante orientação para este trabalho, lembrando dos navios de

Foucault (1984) no texto “Outros Espaços” mais a frente neste trabalho.

Os escritos de Foucault, desde as análises genealógicas, provocam o deslocamento da existência para a fronteira, levando ao desaparecimento do limite entre posicionamentos e contraposicionamentos, o que implica dar forma à impaciente liberdade. (PASSETTI et al., 2008, p. 111).

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Figura 19: Slam Resistência, Praça Roosevelt, São Paulo, 2017. IMAGEM: Vitor Villaça Campanario, em: 04 de setembro de 2017.

2.2 Slams - Microesferas e Micropolíticas Sociais

Estes espaços que possibilitam e criam um fluxo, seja do corpo ou da palavra,

um chamado de liberdade no ambiente urbano. Para Foucault (2006) e Deleuze

(1995), essa microesfera – o Slam, opõem-se a sociedade da maneira como

acontece atualmente. Seria o Slam Resistência a possível máquina de guerra, a

potência ativa no espaço das possibilidades não dadas, não ofertadas?

Esse espaço seria aquele que construímos para o nosso habitar, e onde, para Foucault, ‘sempre nos tornamos algo diferente do que somos’, ou para Derrida, ‘onde se criaria a possibilidade de chegada de algo que não nos deixaria os mesmos’, ou ainda, para Gilles Deleuze, ‘onde se daria a possibilidade de ocorrência do “virtual”, ou seja, a realidade da qual ainda não possuímos o conceito’. Em suma, seria no espaço, não no espaço pré-determinado, mas nos “entres”, nos espaços livres de pré-configurações, que vivenciaríamos estes “momentos de invenção” e criaríamos condição para o devenir autre, indo além dos limites impostos pelo natural [é possível afirmar o que seria próprio e essencial de cada “lugar” ou espaço?], pela história

construída por discursos dominantes. (GUATELLI, 2008, 094.00)

O sujeito criativo no mundo contemporâneo cria possibilidades de

ecossistemas. Os coletivos que existem e subsistem nas cidades são rizomas, de

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acordo com o filósofo Gilles Deleuze (1995). O conceito de rizoma ou de situações

rizomáticas resiste a algo instável e difícil de ser mapeado, uma estrutura de

multiplicidade (DELEUZE, 1995).

A propriedade e identidade do lugar é deturpado nos instantes em que

acontece a competição de poesia, o evento, manifestação. Um lugar não

reconhecido, ilegítimo. No momento do evento se torna um jogo no espaço, entre os

indivíduos. A deturpação do uso na arquitetura em Tschumi (1996), pode ser

considerada uma construção impermanente de territorialidades.

Em 1720, o filósofo Leibniz escreve em “Princípios da Filosofia - Monadologia”

sobre as mônadas que são como bolhas ou esferas. Leibniz disserta sobre a

mônada ser um mundo completo simples e indivisível. Compostas por partes

simples, as mônadas são auto suficientes, ou seja, perfeitas e é assim que a bolha,

no caso, o Slam, torna-se uma esfera de compartilhamento.

Uma esfera, um acontecimento, que não pré existe ao compartilhamento onde

estão as subjetividades múltiplas dos indivíduos. Na monadologia de Leibniz, tudo

que é compartilhado no espaço ocupa espaço, existe uma troca nas bolhas, no

espaço onde acontece o Slam.

Figura 20: Slam Resistência, Praça Roosevelt, São Paulo, 2017. IMAGEM: Vitor Villaça Campanario, em: 04 de setembro de 2017.

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O uso horizontal e vertical daquele lugar, pelo indivíduo sem distinção, acorda

com Passetti (2008, p. 112-113) em “Michel Foucault e os Guerreiros Insurgentes -

Anotações Sobre Coragem e Verdade no Anarquismo Contemporâneo”, no livro

Cartografias de Foucault que “Todavia, a anarquia não é um movimento linear. Sua

singularidade está em produzir diversos anarquismos e não ser apanhada por um

modelo.” Seria então o momento de observar o que as heterotopias de Foucault

(1984) têm a ver com as cidades contemporâneas.

De que maneira a arquitetura poderia auxiliar a construção das microesferas

que ocupam o espaço urbano? “O anarquista não habita um território, inventa

percursos e distribui as pessoas num espaço aberto.”, como disse Passetti (2008, p.

115-116), “O seu espaço é localizado, mas não delimitado, e é onde acontece uma

máquina de guerra diante de um Estado”.

Os indivíduos descartados como aglomerados tomam força quando sujeitos

reunidos pelo Slam, apresentado aqui neste trabalho. Desencadeiam situações

rizomáticas, instáveis e difíceis de serem mapeadas – desde o início da divulgação

dos próximos eventos pela Internet, até o momento em que acontecem.

Para os anarquistas, as liberações de costumes no amor, na educação, na arte, no aprendizado, nas comemorações festivas, antecedem e acompanham a revolução como fator libertador. (PASSETTI et al., 2008, p. 111)

Figura 21: Slam Resistência, Praça Roosevelt, São Paulo, 2017. IMAGEM: Vitor Villaça Campanario, em: 04 de setembro de 2017.

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Em outro momento, pode-se citar o livro “Esferas II”, de Sloterdijk (2017), que

acrescenta o fato de que nas esferas, se foge da razão histórica, as mônadas de

Leibniz passam a possuir aberturas. Microterritorializações, como para Deleuze

(1995), de codificações instáveis onde as ações espontâneas como os Slams são

diferentes das ações induzidas. Como, em relação à arquitetura e o espaço urbano,

potencializar essas ações considerando o Slam Resistência como hipótese ou uma

ponta solta intencional no espaço público?

Os Slams surgem contra uma fonte de autoridade e em um espaço urbano

intermediário. Essa estrutura múltipla faz com que esses indivíduos possam ser uma

coisa e outra, tornando-se outra coisa; entendendo-se coisa aqui como o papel do

sujeito no espaço intermediário. Lugar onde existe na sociedade o entendimento do

outro indivíduo no momento em que acontece, a maneira como o sujeito se expressa

é seu próprio reconhecimento, quando se torna protagonista da própria história:

Não somos, enfim, governados por ideias, mas por efeitos de lutas. O anarquista é o combatente das grandes e pequenas desigualdades, e das imediatas e transcendentais hierarquias, quando permanece rebelde (PASSETTI et al., 2008, p. 119).

Figura 22: Slam Resistência, Praça Roosevelt, São Paulo, 2017. IMAGEM: Vitor Villaça Campanario, em: 04 de setembro de 2017.

Inventar a vida é mais que resistir aos efeitos de dominação e contrapropor maneiras de ultrapassar a exploração e a dominação. É preciso recusar o soberano sobre si e promover a vida libertária por miríades de associações. Restrita ao movimento social, a anarquia

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estará reduzida à posição resistente, a compor um fluxo alternativo, a reescrever uma polêmica com o Estado e à economia atual; quem sabe até assujeitada ao marxismo ou mesmo a uma contraordem organizativa interna que julgue o que é anarquismo e o que não é, segundo um modelo, uma doutrina. Limitado ao movimento social o anarquismo é somente utopia de revolução, risco de restauração de um soberano, iminência do terror. O parresiasta não desaparece, atinge. (PASSETTI et al., 2008, p. 121)

2.3 Slams – Microesferas e Micropolíticas Territoriais

Segundo o documentário “Slam: Voz de Levante” lançado na Mostra

Internacional de Cinema de São Paulo em 2017, atualmente nos EUA slammers se

movimentam na cidade para participar dos Slams que acontecem em locais

privados.

A periferia passa a ocupar outros espaços, de acordo com o documentário

exibido em 25 de outubro de 2017, no Itaú Cinemas Frei Caneca em São Paulo,

pessoas partem das margens para o centro portando apenas o dinheiro da

passagem e textos próprios preparados para participarem da competição que nos

Estados Unidos acontecem em locais institucionais.

No Brasil, a maioria dos Slams ocorre em espaços públicos. O Slam

Resistência é o único que acontece com frequência, toda primeira segunda feira do

mês, em um espaço público no centro da cidade de São Paulo, na Praça Roosevelt.

O evento com maior quantidade de acessos, online e no momento em que

acontece a competição de poesia original e performática, é o mais conhecido da

cidade. Pode ser entendido aqui como ponto de encontro, um local fértil para a

liberdade de expressão, sem distinção de pessoas e o início de uma conversa entre

periferia e os centros urbanos, além dos eventos de poesia oferecidos pela Virada

Cultural.

Em uma conversa informal, com um dos poetas que competiam no Slam

Resistência, Praça Roosevelt, no dia 04 de Setembro de 2017, foi descoberto que o

deslocamento dentro da cidade de São Paulo também acontece como em Nova

Iorque, nos EUA, a periferia vai ao centro.

De acordo com o texto “Post-it City: los otros espacios publicos de la ciudad

europea”, de Giovani La Varra, encontrado no livro Mutations (KOOLHAAS;

KWINTER; FABRICIUS; BOERI; OBRIST; TAZI, 2000, p. 426) na Europa os usos

dos espaços públicos estão em mutação assim como os novos espaços

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direcionados para este movimento ou ocupação. Possibilita a diversidade de

indivíduos e a materialidade dos espaços devido ao fluxo, mobilidade urbana tanto

nas margens como nos centros. A criação de outros espaços transfigura o sentido e

o valor dados para os espaços públicos e construídos.

Através das dinâmicas da vida coletiva no ambiente urbano surge uma

reinterpretação temporal do espaço público, espaços que passam a se colocar em

função da ocasião. Lugares de reconhecimento dos próprios indivíduos fora dos

canais convencionais.

O centro de São Paulo é referência para o Movimento Hip Hop desde o

surgimento do movimento no país, nos anos 80. Movimento que passa a acontecer

alguns anos após a implantação do sistema de transporte metropolitano facilitando o

fluxo de indivíduos e possibilitando contato com outros lugares.

Atualmente, alguns escritores vão até o centro da cidade participar do Slam

Resistência somente com o dinheiro da condução que o leva até o local. O que

diferencia a situação de São Paulo de Nova Iorque atualmente, é que alguns poetas

levam consigo pequenos poemas originais escritos à mão, em pequenos papéis

retirados de cadernos e oferecem às pessoas que estão presentes no momento da

ocupação do território, ou cópias de poesias e desenhos feitos pelos próprios

poetas.

A intenção do poeta com quem foram trocadas informações, era poder

participar do evento sem qualquer custo, e não vender a arte que produzia. O

produto que estava oferecendo valia qualquer moeda, “pra ajudar na passagem de

volta”, disse o slammer.

Enquanto o Slam acontece está surgindo o espaço intermediário. O slammer

compete e faz conexões pessoais ou não com outros indivíduos que estão naquele

espaço. Passantes ou poetas, usuários do espaço público, skatistas, curiosos,

participantes. O slammer vende a própria arte com custo quase zero e constrói

vínculos sociais e profissionais com outros poetas de outros Slams de outros bairros

da cidade de São Paulo12.

12 Durante o estudo de caso, o breve mapeamento dos Slams na cidade de São Paulo, nota-se que a maioria dos movimentos de resistência e eventos promovidos pelas batalhas de poesia passam a ter força depois de 2013. Interessante fazer uma relação das manifestações que ocorreram no Brasil em 2013, contra o aumento das passagens do transporte público, ou manifestações dos 20 centavos. “Em junho de 2013, um aumento nas tarifas de transporte público provocou protestos em São Paulo, dando início a uma nova

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Abaixo apresenta-se um breve mapeamento, até 2015, sobre o fluxo dos

primeiros Slams da cidade de São Paulo. Interessante observar a concentração de

indivíduos frequentadores e produtores, participantes ou não das atividades

promovidas por cada Slam apresentado no mapa. Nota-se que os Slams ocorrentes

na Zona Sul como nos bairros Vila Mariana e Pinheiros, Zona Leste como em São

Miguel e Centro, por exemplo, Barra Funda apresentam maior aglomeração de

eventos.

onda de ativismo político”. FONTE: 20 Centavos. Tiago Tambelli. Documentário. Brasil: 2014. (52 minutos)

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Figura 23: Mapa da cidade de São Paulo, 2016. FONTE: IBGE, modificado por Raíssa de Araujo Dias. Disponível em: ftp://geoftp.ibge.gov.br/organizacao_do_territorio/malhas_territoriais/, acesso em: 12 de março de 2018. Apresenta a localização original dos Slams, onde surgiram, mapeados até Dezembro de 2015, de acordo com as eliminatórias do Slam BR do mesmo ano. FONTE: Evento Slam BR 2015, no Facebook, criado por Roberta Estrela D’alva, Emerson Alcalde, Thiago Peixoto, Lews Barbosa, Lucas Afonso, Will Junio, Adelson Chaves e Marcos Bassini. Disponível em: https://www.facebook.com/SlamDo13/, https://www.facebook.com/slamdaguilhermina/, https://www.facebook.com/slamresistencia/, https://www.facebook.com/Slam-Fun%C3%A7%C3%A3o-379901975517497/, https://www.facebook.com/zapslam/ https://www.facebook.com/menorslamdomundo/, https://www.facebook.com/Corposinalizante/, https://www.facebook.com/SlamdaPonta/, https://www.facebook.com/slamdogrito/, https://www.facebook.com/slamrachaopoetico/ https://www.facebook.com/slamdocorre/acesso em: 12 de março de 2018.

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Figura 24: Mapa da cidade de São Paulo, 2016. FONTE: IBGE modificado por Raíssa de Araujo Dias. Disponível em: ftp://geoftp.ibge.gov.br/organizacao_do_territorio/malhas_territoriais/, acesso em: 12 de março de 2018. Apresenta os Slams surgidos até dezembro de 2015 e seus fluxos até março de 2018, partindo do bairro de origem de cada Slam. FONTE: Eventos dos Slams ZAP!, do Corpo, Menor Slam do Mundo, da Guilhermina, Resistência, da Ponta, do Grito, do 13, Slam Rachão, Slam Função e do Corre, no Facebook, organizados pelas páginas oficiais de cada Slam. Disponível em: https://www.facebook.com/SlamDo13/, https://www.facebook.com/slamdaguilhermina/, https://www.facebook.com/slamresistencia/, https://www.facebook.com/Slam-Fun%C3%A7%C3%A3o-379901975517497/, https://www.facebook.com/zapslam/ https://www.facebook.com/menorslamdomundo/, https://www.facebook.com/Corposinalizante/, https://www.facebook.com/SlamdaPonta/, https://www.facebook.com/slamdogrito/, https://www.facebook.com/slamrachaopoetico/ https://www.facebook.com/slamdocorre/, https://www.facebook.com/events/440108519524300/, https://www.facebook.com/events/1143319599131294/, acesso em: 24 de março de 2018.

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3 ESPAÇO INTERMEDIÁRIO

O espaço intermediário capaz de intermediar corpos em tensão, em intensa

troca e interação, nestes espaços programados. São espaços pensados aqui como

espaços de função não definida, ou qualquer lugar que aparenta uma utilização

improvisada – constituindo-se como local fértil para a liberdade de expressão, do

querer-dizer13 além do que deve ser dito, um espaço da função do querer.

Um espaço de intermediação de conflitos, desejos, outros modos de

existência, de outras interações sociais e intersubjetivas. Um espaço, pelos seus

limites não dados, mas construídos, capaz de precipitar e provocar outras

subjetividades libertárias.

O espaço intermediário surge quando existe uma ação, há aglomeração

interativa entre pessoas mediado por alguma ruptura do espaço urbano dado. Esse

espaço não pré existe à aglomeração, é um espaço genérico ou universal. Na

arquitetura, não é a escala do espaço público nem a escala doméstica do indivíduo.

O espaço em questão está entre - “meios” consolidados, outro “meio”, um

entre-lugares, nem um, nem outro, mas bastardo e “impróprio”. Por tudo isso, aberto

a incessantes apropriações e expropriações do que não se consolida como próprio

(GUATELLI, 2012). Um espaço sempre em devir14, um devir-território:

Como temos visto, através de uma atitude guiada pela desconstrução, desregulamentação, disjunção, descontinuidade, deslocamento da relação entre significante e significado, entre forma e função, e, ao mesmo tempo, uma valorização do que se denomina de entre, daquilo que está constantemente em processo, do transitório, do ambíguo, busca-se uma transgressão dos valores

13 “O privilégio concedido à consciência significa o privilégio concedido ao presente. Mesmo

se se descreve a temporalidade transcendental da consciência, como o fez Husserl, é o presente vivo que se concede o poder de síntese e de reunião incessante de traços. Não se pode limitar tal fechamento sem solicitar o valor de presença que Heidegger mostrou a ser determinação ontoteológica do ser. E ao solicitar este valor de presença, nós interrogamos o privilégio absoluto dessa forma ou desta época da presença geral que é a consciência do querer dizer na presença a si. ” De acordo com o Glossário de Derrida (1976), desenvolvido por Silviano Santiago e pesquisadores do Departamento de Letras da PUC do Rio de Janeiro. 14 “A significação deste neologismo está longe de ser unívoca. Usa-se por vezes como

sinônimo de ‘vir a ser’; outras vezes é considerado o equivalente de ‘ir sendo’; e ainda outras vezes emprega-se para designar de um modo geral, o mudar ou mover-se. Dentro desta multiplicidade de significações parece haver, contudo, um núcleo significativo invariável no vocábulo ‘devir’: é o que se destaca o processo do ser ou, se se prefere, o ser como processo. ” Em Dicionário de Filosofia, de José Ferrater Mora, terceira edição, 1998.

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históricos arquitetônicos e a abertura de outras possibilidades. (GUATELLI, 2008, 094.00)

A relação do sujeito – coletivo ou não, com a arte, o espaço e a performance

provoca encontros gerados na cidade, no caso, o Slam Resistência que se

concentra em um espaço público, na Praça Roosevelt, no centro de São Paulo.

Onde estão, na cidade, por exemplo, os happenings que segundo Tadeusz Kantor

(1975) são um momento revolucionário, onde há construção desse sujeito.

Enquanto milênios inteiros trabalharam a favor da permanência, das axialidades, das relações e da proporção, o programa do espaço – lixo é a escalada. Em vez de desenvolvimento, oferece entropia (KOOLHAAS, 2014, p. 78).

Acontece o surgimento de microterritórios que passam a existir através dos

Slams Resistência: onde indivíduos descartados, separados, são uma força quando

aglomerados. A construção do sujeito como insumo para esta dissertação e o futuro

da arquitetura no espaço urbano, uma força que parece emanar da improvável

articulação de indivíduos motivados por formas de resistência como prática de

reexistência na cidade.

Teríamos agora, então, um confronte entre estabilidade dos lugares imediatamente percebidos e de apropriação rápida e a instabilidade daqueles espaços entre-meios, intermediários, onde os processos de percepção e apropriação não seriam tão imediatos, justamente por não terem um sentido inicial, o que possibilitaria leituras indiretas, inventivas (GUATELLI, 2012, p. 107-108).

Figura 25: Slam Resistência, Praça Roosevelt, São Paulo, 2017. IMAGEM: Vitor Villaça Campanario, em: 04 de setembro de 2017.

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O uso antagônico do espaço cria lugares de intimidade e dificuldade para o

arquiteto em resumir estes espaços em projetos. De acordo com o texto “Post-it City:

los otros espacios publicos de la ciudad europea”, de Giovani La Varra, encontrado

no livro Mutations (KOOLHAAS; KWINTER; FABRICIUS; BOERI; OBRIST; TAZI,

2000, p. 428) contínuas significações de um espaço aberto relacionado à dimensão

e extensão do território urbano traz a diferença dos modelos de habitar já projetados

e preparados. O surgimento de um lugar de intercâmbios nas bifurcações da cidade,

o espaço intermediário é criativo, proposital e auto reflexivo.

Os Slams que sucedem nos espaços intermediários - são espaços de poder

que criam outros lugares em qualquer lugar, uma heterotopia urbana – conceito

citado no texto “Uma Cartografia das Margens”, encontrado no livro Cartografias de

Foucault (MUNIZ; VEIGA; SOUZA, 2008, p.11) que pode alimentar uma reflexão

sobre os limites da cartografia urbana normalmente utilizadas e consideradas para o

reconhecimento de territórios:

Michel Foucault tratou em suas pesquisas da constituição histórica e social de diferentes espacialidades, desde os espaços disciplinares como: a escola, o asilo, o hospício, o hospital, a prisão, até os espaços de liberdade inventados pelos homens em seu cotidiano de lutas e resistência às normas e à lei, o que chamou de heterotopias.

O espaço intermediário é um espaço que já existe ou está acontecendo no

mundo, mas que não é visto ou percebido. Passa a existir, a partir da tensão criada

pelos Slams, estudados aqui, a experiência sensível do que acontece na cidade

através da situação constituída no momento que acontece a batalha de poesia

performática.

Nesses eventos, onde acontece o Slam Resistência, pensar em suas

possíveis reverberações no espaço urbano, abrir possibilidades para uma expansão

de limites que delimitam ações nos campos do saber.

3.1 O Espaço Outro, Outros Espaços no Espaço, Dentro do Espaço

O espaço no qual vivemos, que nos leva para fora de nós mesmos, no qual a erosão das nossas vidas, do nosso tempo e da nossa história se processa num contínuo, o espaço que nos mói, é também, em si próprio, um espaço heterogêneo. Por outras palavras, não vivemos numa espécie de vácuo, no qual se colocam indivíduos e coisas, num vácuo que pode ser preenchido por vários tons de luz. Vivemos, sim, numa série de relações que delineiam lugares

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decididamente irredutíveis uns aos outros e que não se podem sobre impor (FOUCAULT, 1984, p. 79).

O lugar, aqui, não é considerado apenas através da democracia, mas em

como as relações pessoais estão dispostas no mundo, a maneira como acontecem.

Da classificação à circulação, o espaço tem a ver com os elementos humanos

integrados naquele lugar, “uma forma de relação entre vários lugares”, como explica

Michel Foucault nas anotações de uma conferência na França, nomeada “Outros

Espaços” (1984, p. 79).

Foucault (1984) lembra que podem ser consideradas uma série de relações

de determinados lugares como ruas, transportes ou ainda cafés, cinemas, praias e

praças para um início de estudo do espaço. Também lugares fechados ou semi

fechados, como casas e quartos, mas não são dessas relações que Foucault nos

fala.

Em todos esses lugares citados acima, o que nos interessa neste trabalho

são como as relações criadas se relacionam com “todos os outros lugares”

(FOUCAULT, 1984, p. 80), existentes como lugares “estranhos” a esses lugares

comuns à vida social cotidiana, mas pertencentes a ela. Espaços que se

desencadeiam em outros, fazem parte mas estão sempre a parte, lugares que

acontecem de forma exclusiva:

Em primeiro lugar, existem as utopias. As utopias são lugares sem lugar real. São lugares que têm uma relação analógica direta ou invertida com o espaço real da sociedade. Apresentam a sociedade numa forma aperfeiçoada, ou totalmente virada ao contrário. Seja como for, as utopias são espaços fundamentalmente irreais. Há também, provavelmente em todas as culturas, em todas as civilizações, espaços reais – espaços que existem e que são formados na própria fundação da sociedade - que são algo como contra lugares, espécies de utopias realizadas nas quais todos os outros lugares reais dessa dada cultura podem ser encontrados, e nas quais são, simultaneamente, representados, contestados e invertidos. Este tipo de lugares está fora de todos os lugares, apesar de se poder obviamente apontar a sua posição geográfica na realidade. Devido a estes lugares serem totalmente diferentes de quaisquer outros lugares, que eles refletem e discutem, chamá-los-ei, por contraste às utopias, heterotopias (FOUCAULT, 1984, p. 80).

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Figura 26: Slam Resistência, Praça Roosevelt, São Paulo, 2017. IMAGEM: Vitor Villaça Campanario, em: 04 de setembro de 2017.

Foucault (1984, p. 81) apresenta diversos princípios sobre as heterotopias –

que segundo ele, “nunca são iguais quando constituídas”, onde a heterotopia não

exclui a utopia e pode até incluí-la. Em certo momento do texto, Foucault (1984)

disserta sobre as heterotopias de crise e desvio que são dependentes do que é

coletivo, de um compartilhamento de indivíduos:

Nas ditas sociedades primitivas, há um tipo de heterotopia que eu chamaria de heterotopia de crise, id est, lugares privilegiados ou sagrados ou proibidos, reservados a indivíduos que estão, em relação à sociedade e ao ambiente humano que ocupam, numa situação de crise: adolescentes, mulheres menstruadas ou grávidas, idosos, etc. (...) Mas estas heterotopias de crise têm desaparecido dos nossos dias e sido substituídas, parece-me, pelo que poderíamos chamar heterotopias de desvio: aquelas nas quais os indivíduos, cujos comportamentos são desviantes em relação às norma ou média necessárias, são colocados (FOUCAULT, 1984, p. 80-81).

Assim, o espaço resíduo encontrado nas cidades, a partir das heterotopias de

desvios, onde acontecem as ações coletivas, podem vir a ser espaços

intermediários. Um espaço que reconhece o coletivo através da força e intensidade,

quebra a lógica daquele espaço mudando a qualidade da coisa.

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Para melhor entendimento, na contemporaneidade estamos acostumados

com o espaço coletivo do Shopping Center, por exemplo. O mundo do Shopping é

sim uma heterotopia, onde vários acontecimentos estão surgindo naquele momento,

naquele espaço. Mas mesmo que o espaço seja coletivo, pode não ser intensificado

como os espaços promovidos por coletivos de indivíduos que se alimentam de uma

mesma ideia, como os Slams investigados para esta dissertação.

De volta ao texto de Michel Foucault (1984), no terceiro princípio das

heterotopias, o autor utiliza como exemplo os jardins onde é necessário o

surgimento de um microcosmos para sobreviver. Também faz uma relação com o

teatro, onde lugares se sucedem em “projeções de espaços tridimensionais”

(FOUCAULT, 1984, p. 82). Espaços que surgem através da interação entre plateia,

palco e atores, por exemplo, como acontecem a disposição das coisas.

Já no quarto princípio, o filósofo discorre sobre heterotopias que estão ligadas

“às pequenas parcelas de tempo” (FOUCAULT, 1984, p. 82). Os momentos, para

Foucault (1984), são espaços além de um tempo linear e utiliza em seu texto,

“Outros Espaços”, o lugar do cemitério para exemplificar os espaços de

heterocronias15:

Do outro lado do espectro estão as heterotopias que estão associadas ao tempo na sua vertente mais fugaz, transitória, passageira. Refiro-me ao que assume o modo do festival. Estas heterotopias não estão orientadas para o eterno; bem pelo contrário, são de uma absoluta cronicidade, são temporais. É o que encontramos nas feiras e nos circos, lugares vazios colocados nos limites das cidades que, duas vezes por ano, pululam com barraquinhas, vitrines, objetos heteróclitos, lutadores, mulheres-serpente, pessoas que lêem o futuro nas mãos, entre muitos outros (FOUCAULT, 1984, p.82).

No quinto princípio de Michel Foucault (1984, p. 83) sobre o espaço em

discussão, a heterotopia “não é acessível tal qual um lugar público”. Existem rituais

pré estabelecidos de relações para a permanência e participação nestes espaços,

“em que o indivíduo tem de obter permissão e repetir certos gestos” para usufruí-los:

15 Em Outros Espaços, texto de Michel Foucault, há uma breve descrição do que vem a ser heterocronia: “Poderíamos dizer, talvez, que os conflitos ideológicos que se traduzem nas polêmicas contemporâneas se opõem aos pios descendentes do tempo e aos estabelecidos habitantes do espaço. ” (p. 78)

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Há ainda outras heterotopias que, ainda que à primeira vista pareçam ser aberturas, servem de forma velada a curiosas exclusões. Todos podem entrar nestes lugares heterotópicos, mas essa é apenas uma ilusão: pensamos que entramos ali onde somos, simplesmente pelo fato de ali termos entrado, excluídos. Estou pensando naqueles quartos que existiam nos casarões do Brasil, e um pouco por toda a América do Sul: a entrada para esses quartos de dormir não era a entrada para a casa em si, a entrada da família; qualquer viajante que por ali passasse poderia abrir a porta e ocupar uma cama e dormir uma noite. Mas esses quartos estavam construídos de uma tal forma que esse indivíduo passageiro nunca tinha acesso livre às partes da casa da família; o visitante era portanto um verdadeiro convidado transitório, não era convidado sequer (FOUCAULT, 1984, p. 83).

As heterotopias também têm um papel específico ligado aos espaços que

sobram, os espaços intermediários, por vezes criados para serem reais, organizados

e perfeitos em desacordo e conflito com os espaços existentes e mal construídos –

da realidade; seriam estes espaços de compensação:

Os bordéis e as colônias são dois tipos extremos de heterotopias. Mas, atenção. Um navio é um pedaço flutuante de espaço, um lugar sem lugar, que existe por si só, que é fechado sobre si mesmo e que ao mesmo tempo é dado à infinitude do mar. E, de porto em porto, de bordo a bordo, de bordel a bordel, um navio vai tão longe como uma colônia em busca dos mais preciosos tesouros que se escondem nos jardins. Perceberemos também que o navio tem sido, na nossa civilização, desde o século dezesseis até os nossos dias, o maior instrumento de desenvolvimento econômico (ao qual não me referi aqui), e simultaneamente o grande escape da imaginação. O navio é a heterotopia por excelência. Em civilizações sem barcos, esgotam-se os sonhos, e a aventura é substituída pela espionagem, os piratas pelas polícias (FOUCAULT, 1984, p. 84).

Figura 27: Slam Resistência, Praça Roosevelt, São Paulo, 2017. IMAGEM: Vitor Villaça Campanario, em: 04 de setembro de 2017.

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Heterotopias de revoltas, em certo sentido, que aqui os Slams possam ser

pequenas embarcações, como os navios no texto de Michel Foucault (1984), que

aportam e perturbam as localidades onde aportam.

3.2 Centro Cultural São Paulo: Território em Devir

Figura 28: Centro Cultural São Paulo, São Paulo, 2018. IMAGEM: Vitor Villaça Campanario, em: 13 de novembro de 2018. Figura 29: Centro Cultural São Paulo, São Paulo, 2018. IMAGEM: Vitor Villaça Campanario, em: 13 de novembro de 2018.

Dos happenings de Kantor às performances, teatros e intervenções do e no

espaço público; nos Slams que se sucedem na praça Roosevelt, no Centro Cultural

São Paulo dançarinos que utilizam do prédio público para aperfeiçoamento da arte,

um local de encontro, notam-se a experiências intensas do corpo e de práticas

emancipatórias de si.

Figura 30: Centro Cultural São Paulo, São Paulo, 2018. IMAGEM: Vitor Villaça Campanario,

em: 13 de novembro de 2018.

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Ocupar e permanecer ocupando lugares de forma criativa, o livro “Nietzsche

Deleuze arte resistência” (2004) organizado por Daniel Lins, no texto Corpos em

Movimento: Gil dança Gilles (p. 164-174) de Maria Cristina Franco Ferraz, a autora

expõe a obra de José Gil Movimento Total – o corpo e a dança, que articula com

pensamentos deleuzeanos e faz pensar efetivamente o corpo em dimensão total.

A totalidade encontrada na performance sugere “sentido e intensão”,

experimentações do corpo em movimentos ínfimos, emana elementos

representativos, narrativos e emocionais no espaço. Sugere uma atenção voltada

para o próprio indivíduo, o próprio corpo naquela situação enquanto dança.

Figura 31: Centro Cultural São Paulo, São Paulo, 2018. IMAGEM: Vitor Villaça Campanario, em: 13 de novembro de 2018. Figura 32: Centro Cultural São Paulo, São Paulo, 2018. IMAGEM: Vitor Villaça Campanario, em: 13 de novembro de 2018.

Maria Cristina observa que Gil convoca a experimentação de alguns

coreógrafos contemporâneos, e nota que, para Gil, a consciência do corpo, quando

emerge, perde seus pontos de referências habituais substituídos pelos espontâneos.

Figura 33: Centro Cultural São Paulo, São Paulo, 2018. IMAGEM: Vitor Villaça Campanario, em: 13 de novembro de 2018. Figura 34: Centro Cultural São Paulo, São Paulo, 2018. IMAGEM: Vitor Villaça Campanario, em: 13 de novembro de 2018.

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Assim, superfície e matéria causam diversas intensidades conquistadas pelos

bailarinos. O movimento dançando é relacionado por Gil ao corpo sem órgãos de

Deleuze que constrói o corpo de duas maneiras:

Ao desestruturar o organismo, liberta os afetos e dirige suas energias para a ‘periferia do corpo, para a pele; ao fazê-lo ‘cria uma superfície contínua de espaço-pele, impedindo que os orifícios induzam movimentos em direção ao interior do corpo. O corpo abre-se, assim, ao espaço e se torna espaço. É esse tornar-se pele intensiva que possibilita a comunicabilidade ‘entre inconscientes’. (FERRAZ et al., p. 170)

A partir da observação de Gil, percebe-se uma transmissão de inconscientes

de energia propagadas no espaço, puro fluxo, intensivo no espaço. No caso desta

observação, do espaço público Centro Cultural São Paulo, nota-se a diferenciação

de indivíduos ocupando o mesmo espaço.

Figura 35: Centro Cultural São Paulo, São Paulo, 2018. IMAGEM: Vitor Villaça Campanario, em: 13 de novembro de 2018. Figura 36: Centro Cultural São Paulo, São Paulo, 2018. IMAGEM: Vitor Villaça Campanario, em: 13 de novembro de 2018.

Uma malha, trançada de pequenas percepções, surge nos espaços públicos

investigados para este trabalho: Slam Resistência e Centro Cultural São Paulo.

“Tecida por uma ‘poalha de pequenas percepções”, segundo Maria Cristina ao citar

Leibniz, comentando sobre os corpos, “pondo-os em contato direto”. Gil sintetiza: “a

cada corpo em osmose inicia um processo de captura dos outros corpos, o que

implica um devir-outro”. (p. 172)

Impossível prever o que irá acontecer aos corpos em contato com o

movimento no espaço, onde a comunicabilidade acontece entre todos os corpos. Há

uma comunicação dos inconscientes individuais através da movimentação

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dispersada como rizoma, provocado por cada corpo no ambiente, que impregna e

contamina, influencia.

Eis toda a diferença entre um movimento trivial e um movimento dançando: a potência de sua propagação virtual. Tal possibilidade – também presente em um simples aceno de mão de despedida, através do qual um corpo resiste em deixar o outro, produzindo-se como espectro para além do espaço objetivo que se introduz entre os corpos e insiste em afastá-los – é levada à sua mais alta potência na dança. (FERRAZ at al., p. 174).

Intensidades, dimensionalidades, fluidez podem ser consideradas

comunicações infinitas em potencialidades no espaço. Além de possibilidades de

outros espaços dentro do espaço oferecidos pelo “movimento total”. Como forma de

resistência, a dança apresentada aqui, como criação de outras formas de vida,

“libertador de forças insuspeitadas” (p. 174).

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4 SLAM E ARQUITETURA: UM AGENCIAMENTO16 POSSÍVEL?

Perturbar a ordem: tornar-se outra coisa, em projeto não quer dizer resolver

um problema existente, talvez até precipitar outros novos resultados e situações. Os

rastros são vestígios e devires, que projetam a situação – sem as amarras da

escala, tais intervenções empíricas, como os Slams?

A possibilidade de entendimento do processo de apropriação do espaço feito

pelos Slams pode ser um programa relacionando espaço, evento e movimento; a

criação de outras articulações para a Arquitetura?

Os tempos, neste trabalho - comparados às bolhas ou esferas, como as

mônadas, sobrevivem além da realidade, num ambiente possível. A utopia é o

território da negação, da crítica e revolução. O lugar outro ou heterotopia, é diferente

do não-lugar da utopia. Ela é a incongruência entre conteúdo e expressão, outro

lugar possível, porém existente.

Essas esferas, em constante transformação não dimensionadas, à deriva,

abrem uma discussão com o programa arquitetônico; necessidade que a atualidade

tem de não se preocupar apenas com a finalidade das coisas, e sim como a coisa

acontece no ambiente urbano, portanto nas considerações da temporalidade da

coisa.

De acordo com o filósofo Peter Sloterdijk (2017) no livro “Esferas II”, a esfera

possui aberturas como janelas, podem ser espaços com válvulas de escape ou

soleiras, projetam fuga, estão entre. Nessa instabilidade ou indefinição, em relação à

arquitetura: é possível abrir um campo das ações não induzidas?

Rem Koolhaas (2014) escreve sobre os espaços resíduos, que em excesso

na cidade projetam a abertura à expectativa, a experiência do lugar e não-lugar. No

livro Mutations (2000), resultado de uma pesquisa feita em Harvard coordenada por

Koolhaas, um dos autores Giovanni La Varra trabalha a ideia dos espaços “Post It”,

16 “Todo agenciamento possui uma tetravalência distribuída em dois eixos: de início, um

primeiro eixo horizontal, um agenciamento comporta dois seguimentos: um de conteúdo, o outro de ex-pressão. Por um lado, ele é o agenciamento maquínico de corpos, de ações e de paixões, mistura de corpos reagindo uns sobre os outros; por outro lado, agenciamento coletivo de enunciação, de atos e de enunciados, transformações incorpóreas sendo atribuídas aos corpos. Mas segundo um eixo vertical e orientado, o agenciamento tem, de uma parte, lados territoriais e reterritorializados que o estabilizam e, de outra parte picos de desterritorialização que o arrebatam. ” Segundo Gilles Deleuze e Felix Guattari, em Mil Platôs – Capitalismo e Esquizofrenia, 1995, p. 112.

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espaços de ocupações momentâneas nas cidades, lugares de encontro que surgem

através de conexões mutáveis, onde um dos fatores relevantes para estas relações

parte da possibilidade de mobilidade urbana cada vez mais acessível.

O campo da arquitetura não deveria ofertar mas criar um suporte mínimo,

como um acolhimento irrestrito, para que situações como os Slams possam

acontecer nas cidades? Ainda no campo da arquitetura, questionar se regras e

normas, que impõe condições de uso do espaço, dificulta uma desejável

hospitalidade incondicional do lugar.

Nesses espaços, onde podem acontecer manifestações como os Slams, no

instante em que provocam pracialidades – situações transitórias e momentâneas de

praças, de coletividades imprevistas. Onde a afeição e a percepção do sujeito se

enriquecem fazendo surgir o espaço intermediário, pode vir a ser heterocronias

urbanas, acontecimentos que estão além de um tempo linear e da codificação prévia

do território.

No desmontar das identidades do espaço, do objeto e do sujeito descobre-se

a multiplicidade da coisa, passa a ser perceptível tal multiplicidade no espaço

através dos estudos de caso feito em uma linguagem fotográfica para este trabalho.

Quando a multiplicidade acontece, nota-se que não são as mesmas identidades,

torna-se outra coisa – não a mesma. A destinação e a finalidade do lugar alteram-se

quando deixam de orientar e induzir ações que devem ou deveriam acontecer a

partir de códigos e técnicas de uso, de conduta.

Conexões inéditas nos espaços intermediários surgem e detonam processos

existentes, acontece uma desestabilização e promoção de devires nestes espaços:

onde estruturas não complementares passam a se articular de maneira dinâmica,

como nos eventos promovidos pelo Slam Resistência, na Praça Roosevelt em São

Paulo, geralmente das 19 às 22 horas toda primeira segunda feira do mês.

No momento em que o Slam Resistência acontece, não existe principal ou

secundário; seja território, objeto ou sujeito. A força está na articulação e formação

dos emaranhados surgidos entre território, objeto e indivíduos, processos horizontais

ou horizontalidades.

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Figura 37: Slam Resistência, Praça Roosevelt, São Paulo, 2017. IMAGEM: Vitor Villaça Campanario, em: 04 de setembro de 2017.

Figura 38: Slam Resistência, Praça Roosevelt, São Paulo, 2017. IMAGEM: Vitor Villaça Campanario, em: 04 de setembro de 2017.

Nota-se que o espaço – para o que foi projetado – se excede em sua própria

representação no momento dessa congestão rizomática do território de agora e do

futuro. Essa intensidade quantitativa que altera a qualidade do lugar, seria o devir

outro do lugar ou heterocronia.

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Aqui, que o Slam Resistência possa ser um observatório para os arquitetos,

como o Centro Cultural São Paulo ainda pode sê-lo.

Os espaços transitivos seriam os motivadores da ocupação e uso dos espaços intransitivos, e estes, forças de significação por sua aparente indefinição e flexibilidade de apropriação, seriam, então, os intensificadores de uso, pois podem ser constantemente transgredidos em seu sentido original por atos e manifestações dos múltiplos autores, leiam-se usuários. O que vemos hoje nas cidades, nas ruas, pontes, praças, sobretudo naquelas onde não há rigidez de concepção ou controle de uso, ou seja, em espaços infraestruturais urbanos, pessoas ansiosas por deixarem suas marcas, por registrarem suas atitudes, vemos, agora, no âmbito do edifício, a incorporação desses espaços intransitivos ou pouco transitivos. (GUATELLI, 2012, p. 108)

Um espaço que só acontece através da experiência pessoal e individual e

coletiva, por esse sujeito múltiplo e invariável, que habita a cidade como esses

emaranhados compostos por “slammers”, apoiadores e apaixonados pelo

movimento, curiosos, passantes, integrantes, organizadores. A construção desse

sujeito no espaço intermediário determina a programação incidental do território

através do uso, da aglomeração, das relações criadas nesse espaço de liberdade.

Se existe a necessidade, para a arquitetura, de analisar o sujeito e como ele

se programa e se reprograma no espaço, trata-se aqui de aventar a possibilidade de

projetos arquitetônicos não como fim, mas como meio, um suporte para o acidental,

o incidental e seus devires territoriais e sociais.

Figura 39: Slam Resistência, Praça Roosevelt, São Paulo, 2017. IMAGEM: Vitor Villaça Campanario, em: 04 de setembro de 2017.

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5 CONSIDERAÇÕES INCONCLUSAS

Pode-se considerar, a partir deste trabalho, que o espaço em questão não

possui fronteiras determinadas, e o entendimento do espaço, como ambiente

cultural, e um gerador de compartilhamentos passivos, ativos, transitórios, criativos.

De 1951 a 1971, o pediatra e psicanalista inglês Donald Woods Winnicott

discorre sobre o espaço potencial, considerando este espaço um terreno de jogo

como um lugar de permanente troca. Segundo o doutor em comunicação social

Rogerio Luz (2007), em O espaço potencial: Winnicott, a zona psíquica intermediária

de Winnicott seria a matriz da experiência cultural individual.

Winnicott faz uma diferenciação entre as palavras playing e game, colocando-

as em oposição. A brincadeira, geralmente coletiva, promove abordagens da área

intermediária de experiências individuais entre realidade interna e externa gerando

um ponto de apoio, algo em comum acordo. Assim, o espaço potencial é

considerado ao mesmo tempo psíquico e real, onde o jogo sem regras pré-definidas

pode se fazer valer “caso as condições sejam favoráveis”.

Como um tabuleiro de xadrez, existe ali uma zona de segurança, com

pequenas regras e ordens, como todo e qualquer jogo. Mas ainda assim, um espaço

sem determinação de fronteiras, considerando um outro espaço. No jogo de xadrez,

instalado em uma zona territorial ou tabuleiro, inúmeras jogadas ou percursos

podem ser escolhidos, um plano de consistência multivetorial.

Como no Slam Resistência, esfera territorial que promove a competição de

poesia, as jogadas que acontecem no território no momento da manifestação. No

entre lugar, onde as peças participantes: slammers, organizadores e público estão

potencialmente interligados.

Este jogo também acontece nas movimentações dos participantes através do

mapeamento, encontrado no primeiro capítulo deste trabalho, entre Slams da cidade

de São Paulo e na observação das comunicações online, pelos interessados na

competição de poesia.

A noção de ilusão é deturpada, em relação à sentido e função, para Winnicott,

o espaço potencial elucida, retroativamente, a totalidade do percurso que não define

a chegada. Espaço que em processo de maturação, mostra a diferença entre

isolamento e comunicação. Espaço que une e separa, espaço de conexão e ruptura.

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Além disso, a experiência, quando chega a constituir-se, é princípio de singularização – de diferença e variabilidade – e não de adequação, adaptação, integração ou socialização. A singularidade das experiências se opõe à estrutura generalizante e repetitiva de comportamentos. E não se trata, afirma o autor, da variabilidade própria à realidade interna ou à realidade do mundo objetivamente compartilhado. (LUZ, 2007).

Esta superfície de articulação entre o sujeito e o mundo, considerando aqui o

Slam Resistência como terreno de jogo de Winnicott, procura dar conta deste

movimento de aproximação e distanciamento, união e separação, próprio ao jogo e

à criação cultural. Um espaço de constante passagem do não-ser e do ser, o mesmo

e o outro, repouso e movimento. Ainda segundo Rogerio Luz (2007):

O jogo, que se dá sempre no espaço e no tempo desse mundo, permite a comunicação e a circulação da experiência sob a forma primeira do paradoxo vivido.

De acordo com a psicanalista, teórica e crítica da arte e cultura, Suely Rolnik

(2018), em A Hora da Micropolítica, começa no embate, as reações coletivas que

tornam os participantes ativos da cidade. Lugares de horizontalidades,

microterritorialidades e microagenciamentos, onde Slams podem ser parresia.

Autênticos agentes da criação de modos de existência, primeiro individuais,

depois unidos em algum propósito social, político e econômico. Novos sentidos são

dados, em várias direções, de modos distintos sobre as relações nos espaços, com

os espaços:

Já que atualizam experiências singulares dos efeitos das forças que agitam a realidade. Efeitos que estão presentes em todos os corpos, em determinado momento e contexto. (ROLNIK, 2018).

Rolnik (2018) discorre sobre como o saber-do-corpo e as forças que

reinventam a realidade, “são momentos em que a imaginação coletiva é acionada

para criar novas maneiras de existir, outras alianças, novos sentidos” para a vida.

Assim, passa a existir um espaço para observação, com necessidade de análise,

dos entres destes momentos de articulações e emaranhados de espaço-tempo.

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Maneiras de existir, coexistir e resistir de indivíduos, como as práticas de si17,

nos espaços urbanos públicos - como o Slam Resistência investigado - de formas

coletivas por um “acaso” em comum, em um território em eterno devir.

17 “Nós nos constituímos como sujeitos (somos capacitados) por meio de várias ‘práticas de

si’, as quais incluem atividades como a escrita, a dieta, o exercício e o dizer a verdade. Ao mesmo tempo, somos constituídos (somos constrangidos) na medida em que a maneira como realizamos essas práticas é moldada por instituições como escolas, tribunais de justiça, hospitais e aparelhos de segurança do Estado, bem como pelas normas e valores mais gerais prevalecentes da sociedade na qual vivemos. Dito de outra maneira, a subjetividade não é distinta, mas antes formada em e através de relações de poder. Não há instituições e normas emancipadoras que nos capacitem, por um lado, e instituições e normas opressivas ou normalizadoras que nos constranjam, por outro; em vez disso, somos simultaneamente capacitados e constrangidos pelas mesmas instituições e normas. Portanto, nos encontramos confrontados pela tarefa de descobrir quando e como somos capacitados e quando e como somos constrangidos, determinar maneiras pelas quais práticas existentes têm o potencial de afrouxar constrições e, portanto, de resistir à normalização, e de empregar essas práticas não apenas para esse propósito, mas também afim de desenvolver práticas novas e diferentes – formas novas e diferentes de nos relacionarmos com nós mesmos e com outrem. ” Em Michel Foucault: conceitos fundamentais, editado por Dianna Taylor, 2018, (p.221).

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PEDRA, de Mariana Felix18

“Um dia a encontrei de canto

Chorando

Debaixo de uma mesa

Escondendo seu pranto

Tentei pegá-la e ela coagida

Se esquivou

Desconfio que ela já sabia que eu iria falar algum blá blá blá sobre amor

Perguntei o que houve

E com a voz abafada ela me respondeu:

Eles me pegaram...

Tentei correr, mas não deu!

Quem foi? Por favor, me diz

Eram cinco meninos

Mas quando vi já estavam passando a mão em mim

Depois ainda me xingaram

Me chamaram de preta favelada

Me humilharam, fui muito mal tratada

Vem cá!

Ela então saiu

Enxugando as lágrimas

E eu a acompanhei até a porta

Mas me doeu muito ver sua fragilidade assim tão exposta

Tentei tirar um sorriso dela

Que ali parecia tão conformada

Cocei a sua barriga

Fiz umas caretas

Coisas bobas, mas que criança costuma achar graça

18 Mariana Felix é “escritora, slammer, apresentadora e educadora. Tem dois livros publicados: ‘Vício’ (2017) e ‘Mania’ (2016) com crônicas, poesias e dissertações sobre o empoderamento feminino, sobre amor e sobre a relação da autora com a cidade”. FONTE: Página Oficial Mariana Felix Facebook, acesso em: 14 de março de 2019.

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E na hora da despedida

Eu disse com a voz mais alta que o habitual:

Safira acredita! O bem sempre vence o mal!

Mas ela me olhou como quem não acredita

Então lhe dei um abraço e mais uma coçada na barriga

Mas na segunda ela não apareceu

Nem terça, nem quarta

Na quinta eu já estava preocupada

Na sexta veio a notícia

A Safira? Você não soube?

Todo mundo só fala na desgraça:

O padrasto estuprou, matou e jogou na mata!

Na hora fiquei sem reação

Juro que me faltou o chão

Tentei me acalmar pra não parecer

Mas me deu até desgosto de continuar a viver!

Nome: Safira Silva de Andrade

Ah, esqueci de dizer: 11 anos de idade

O grito de socorro diário era tão abafado

Que acredito que ninguém ouviu

A última coisa que vi foi cada lágrima sua que caiu

Se eu soubesse

Jamais teria deixado ela ir embora

Agora não sei o que machuca mais

A tragédia ou tê-la deixado passar por aquela porta

Queria ter algo menos triste

Pra contar

Mas essa história mudou minha vida

Mas quando contaram na tv

Minha amiguinha...a Safira

Não passou de uma estatística...”

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