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2 Daniel Munduruku e Heloisa Prieto Ilustrações Daniel Kondo VÓ CORUJA

vó CoruJa - Amazon Web Services...8 9 D ona Irani afastou-se do murmúrio da festa de aniversário e se sentou cal-mamente à beira do rio. Ela gostava de ver o gramado da aldeia

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Daniel Munduruku e Heloisa Prieto

Ilustrações

Daniel Kondo

VÓ CORUJA

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Copyright do texto © 2014 by Daniel Munduruku e Heloisa PrietoCopyright das ilustrações © 2014 by Daniel Kondo

Grafia atualizada segundo o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, que entrou em vigor no Brasil em 2009.

Projeto gráfico de capa e miolo adriana fernandes

Revisão viviane t. mendes arlete sousa

2014 Todos os direitos desta edição reservados àeditora schwarcz s.a.Rua Bandeira Paulista, 702, cj. 3204532-002 — São Paulo — sp — BrasilTel.: (11) 3707-3500Fax: (11) 3707-3501www.companhiadasletrinhas.com.br www.blogdacompanhia.com.br

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (cip)(Câmara Brasileira do Livro, sp, Brasil)

Munduruku, DanielVó coruja / Daniel Munduruku e Heloisa

Prieto ; ilustrações Daniel Kondo. — 1a ed. — São Paulo : Companhia das Letrinhas, 2014.

isbn 978-85-7406-631-8

1. Contos indígenas — literatura infanto-juvenil. i. Prieto, Heloisa i i. Kondo, Daniel. i i. Título.

14-02472 cdd-028.5

Índices para catálogo sistemático:1. Contos indígenas : Literatura infantojuvenil 028.52. Contos indígenas : Literatura juvenil 028.5

Para minha mãe Maria, avó coruja de meus filhos.Para Thereza, que também

sabe ser coruja.D. M.

Para meu pai, Luiz Prieto,

vo coruja contador de histórias da mata.

H. P.

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Essa frase, que com certeza todos já ouviram dos pais ou dos avós, fala do amor dessa ave por seus filhotes. Neste li-vro, a vó narradora, que certa vez foi apelidada de Coruja por seus companheiros da tribo, nutre por seus netos o mesmo sen-timento. Como guardiã dos segredos de diversas tradições in-dígenas, ela conta histórias provenientes de tribos espalha-das pelo país e compartilha com as crianças o seu afeto e sua sabedoria.

Dona Irani é uma avó misteriosa e acolhedora. Ela nar-ra contos mágicos como alguém que atira flores e envolve a todos com o perfume da memória ancestral. Em cada narra-tiva, descobrimos um recorte de mundo diferente e aprende-mos que “na natureza vivem muitas gentes”; que cada povo é um universo e que a gente tem que conhecer as tradições pa-ra apreciar as diferenças. Cada história é um novo trecho de rio, onde mergulhamos com o auxílio da vó coruja e assim saciamos a sede da nossa imaginação.

Sou coruja mesmo!“ ”

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Dona Irani afastou-se do murmúrio da festa de aniversário e se sentou cal-mamente à beira do rio. Ela gostava de ver o gramado da aldeia repleto de crianças, e naquele dia havia muitos convidados, amigos de seus netos, por

ali. “Melhor que risada de menino, só mesmo canto de passarinho”, ela pensou.Seus cabelos longos, lisos e brancos brilhavam sob a luz do entardecer. Dona Ira-

ni sabia que seu desejo de olhar o rio seria respeitado pelos adultos. Todo mundo conhecia seu jeito silencioso de ser. Por mais que ela visitasse a cidade, por mais que seus netos conhecessem os caminhos da vida fora de sua terra, dona Irani acreditava que fosse capaz de ensinar a eles os segredos da tradição. Naquele final de tarde, ela já estava um pouco cansada de ouvir tanta conversa. Seus netos haviam convida do

uma amiga da escola para festejar o aniversário ali na aldeia. Eles adoravam essas festas da cidade — cantar parabéns, comer bolo e ganhar presentes —, e agora es-tavam promovendo uma igualzinha em sua aldeia. Já para dona Irani, o maior pre-sente era poder viver cada instante, o aqui e o agora. O presente era o momento pre -sente, era poder se sentar e ouvir o ruído do rio misturado com as gargalhadas de criança. Ecos da sua vida.

Pensando nisso, dona Irani nem viu Tonhõrepu, nome tradicional de seu neto Henrique, e sua irmã Kababyrai, também conhecida como Beth no mundo da cida-de, se aproximarem com uma cara brava e preocupada.

— Vó, aqui tá todo mundo dizendo que todo índio é igual. É assim mesmo?— É, eles tão dizendo que o que falam por aí é que índio é igualzinho em todos

os lugares. É verdade? — perguntaram com alguma angústia.A sábia mulher deixou os netos desabafarem por um momento. Depois pediu que

sentassem ao seu lado, olhassem bem para o horizonte e admirassem o voo dos pás-saros. Mesmo contrariados, os dois obedeceram porque tinham aprendido desde bem pequeninos que a palavra dos avós devia ser respeitada.

A avó deixou que o tempo passasse pequeno e só quando percebeu que os netos estavam mais tranquilos pediu que fizessem a pergunta novamente. Tonhõn, já bem mais calmo, repetiu a questão que os preocupava. Dona Irani respondeu:

— Na natureza nada é igual, embora muitas coisas se pareçam. As folhas de uma mesma árvore são diferentes; as gotas que formam o mesmo rio também; assim como os grãos bem pequenos da terra, nossa mãe; os pássaros que voam em ban-do ou os peixes em busca de um lugar para a desova. Cada ser é diferente do outro, apesar de todos terem surgido da mesma palavra criadora.

A avó deu uma pausa para que os netos pudessem absorver suas palavras e em seguida retomou seu pensamento.