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105 RIDEP · Nº20 · Vol. 2 · 2005 Validação de um instrumento de avaliação do apoio social em crianças – a versão portuguesa do My Family and Friends Validation of a social support evaluation instrument for school aged children – the portuguese version of “My family and friends” ANA ISABEL DE FREITAS PEREIRA 1 , MARIA CRISTINA CANAVARRO 2 , MARGARIDA FONSECA CARDOSO 3 , DENISA MENDONÇA 4 RESUMO O presente trabalho descreve alguns estudos psicométricos, efectuados na população portuguesa, do instrumento de avaliação do apoio social na infância desenvolvido por Reid e Landesman (1992)- My Family & Friends. Passado sob o formato de entrevista, este instrumento permite uma avaliação multidimen- sional do apoio social nos domínios afectivo, informativo, instrumental e com- panheirismo e inclui a avaliação do apoio prestado por diferentes figuras, con- cretamente, mãe, pai, irmãos, amigos, outros familiares e professor. O instrumento foi testado numa amostra de 549 crianças, dos 8 aos 11 anos de idade. Os resultados, expressos através de: a) adesão da criança à entrevista de ava- liação, b) fiabilidade, avaliada através de análises de consistência interna e de teste- 1. Mestre em Psicologia Clínica pela Universidade de Coimbra. Bolseira de Doutoramento da Fundação para a Ciência e Tecnologia. Assistente da Escola Superior de Educação João de Deus. E-mail: [email protected] 2. Doutorada em Psicologia Clínica pela Universidade de Coimbra. Professora Auxiliar da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Coimbra. Responsável pela Consulta de Acompanhamento Psicológico da Maternidade Doutor Daniel de Matos dos Hospitais da Universidade de Coimbra (HUC). E-mail: [email protected] 3. Doutorada pela Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto. Professora Auxiliar do Instituto de Ciências Biomédicas de Abel Salazar da Universidade do Porto. E-mail: [email protected] 4. Doutorada em Estatística pela Universidade de Exeter, Reino Unido. Professora Associada do Instituto de Ciências Biomédicas de Abel Salazar da Universidade do Porto. E-mail: [email protected]

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Validação de um instrumento de avaliação do apoiosocial em crianças – a versão portuguesa do My Family and Friends

Validation of a social support evaluation instrument forschool aged children – the portuguese version of “My family and friends”

ANA ISABEL DE FREITAS PEREIRA1, MARIA CRISTINA CANAVARRO2,MARGARIDA FONSECA CARDOSO3, DENISA MENDONÇA4

RESUMO

O presente trabalho descreve alguns estudos psicométricos, efectuados napopulação portuguesa, do instrumento de avaliação do apoio social na infânciadesenvolvido por Reid e Landesman (1992)- My Family & Friends. Passado sobo formato de entrevista, este instrumento permite uma avaliação multidimen-sional do apoio social nos domínios afectivo, informativo, instrumental e com-panheirismo e inclui a avaliação do apoio prestado por diferentes figuras, con-cretamente, mãe, pai, irmãos, amigos, outros familiares e professor.

O instrumento foi testado numa amostra de 549 crianças, dos 8 aos 11 anos deidade. Os resultados, expressos através de: a) adesão da criança à entrevista de ava-liação, b) fiabilidade, avaliada através de análises de consistência interna e de teste-

1. Mestre em Psicologia Clínica pela Universidade de Coimbra. Bolseira de Doutoramento daFundação para a Ciência e Tecnologia. Assistente da Escola Superior de Educação João de Deus. E-mail: [email protected]. Doutorada em Psicologia Clínica pela Universidade de Coimbra. Professora Auxiliar daFaculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Coimbra. Responsável pelaConsulta de Acompanhamento Psicológico da Maternidade Doutor Daniel de Matos dos Hospitaisda Universidade de Coimbra (HUC). E-mail: [email protected]. Doutorada pela Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto. Professora Auxiliar doInstituto de Ciências Biomédicas de Abel Salazar da Universidade do Porto. E-mail: [email protected]. Doutorada em Estatística pela Universidade de Exeter, Reino Unido. Professora Associada do Institutode Ciências Biomédicas de Abel Salazar da Universidade do Porto. E-mail: [email protected]

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reteste e c) validade de conteúdo, sugerem a adequação da versão portuguesa do ins-trumento para avaliar a percepção do apoio social, em crianças em idade escolar.

Os resultados obtidos mostram igualmente que as crianças desta faixa etáriapercepcionam diferentes perfis de apoio, em função da figura considerada. Ospais prestam um apoio mais generalizado, enquanto as restantes figuras prestamum apoio mais especializado. O conflito percebido nas relações é também dife-rente em função da figura de apoio em causa, sendo relativamente aos irmãosque as crianças percebem maiores níveis de conflito. São ainda apresentadasalgumas diferenças de género no que diz respeito à percepção do apoio social.

Palavras-chave

Apoio Social, Avaliação, Crianças em Idade Escolar, Estudos Psicométricos

ABSTRACT

Some psychometric studies of “My family and friends” (Reid & Landesman,1989), a measure of children’s perception of social support, conducted in theportuguese population are described in the present work. This instrument, witha dialogue format, allows a multidimensional evaluation of social support -emotional, informational, instrumental and companionship - and includes theevaluation of social support provided by different persons - mother, father,siblings, friends, family, teacher.

The instrument was tested in a sample of 549 children, aged from 8 to 11years. The data expressed through: a) children’s adherence to the evaluationinterview, b) reliability (internal consistency e test-retest) e c) content validity,suggest the portuguese version adequacy to evaluate the perception of socialsupport of school aged children.

Portuguese children perceive different support profiles for different supportproviders. Parents are support generalists while siblings, friends and teachersare support specialists. There is also a difference in perceived conflict in rela-tion to the different support figures with children perceiving higher levels ofconflict in relation to siblings. Further, some gender differences concerningsocial support perceptions are presented.

Key words

Social Support, Evaluation, School Aged Children, Psychometric Studies

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INTRODUÇÃO

O My family and friends, concebidopor Reid e Landesman (1992), é um ins-trumento de avaliação do apoio socialdestinado a crianças dos 6 aos 12 anos.

O conceito de apoio social tem sidodefinido de diversas formas na litera-tura ao longo do tempo. Embora nopassado, tenha sido operacionalizadosobretudo como um conceito unidi-mensional, actualmente a maioria dosautores são consensuais em relação àsua natureza multidimensional (e.g.Antonucci, 1987; Barrera, 1986;Laireter & Baumann, 1992; Sarason,Sarason & Pierce, 1990; Vaux, 1988).Na linha desta perspectiva mais recen-te, Vaux (1988, 1990) argumenta que oconceito de apoio social pode ser pers-pectivado como um meta construto ou,de acordo com Sarason et al. (1990),como um chapéu que acolhe umagrande variedade de fenómenos.

Numa perspectiva desenvolvimen-tista, Vaux (1988) salienta que o apoioprestado pelos outros está presente e éimportante ao longo de toda a vida doindivíduo, acrescentando que, “nãosendo uma característica pessoal está-tica ou uma circunstância do ambien-te, envolve um processo de transiçãodinâmica, entre o indivíduo e a redesocial de apoio, num determinado con-texto ecológico” (Vaux, 1988, p.28).Ao longo da vida, as necessidades, cir-cunstâncias e papéis vão mudando,reflectindo-se na forma e quantidadede apoio considerado adequado.

A definição de apoio social comoum conceito multidimensional, inte-gra os aspectos estruturais do apoio,como a noção de rede social e asdimensões de apoio recebido e perce-bido (e.g. Barrera, 1986; Laireter &Baumann, 1992; Sarason et al., 1990;Vaux, 1988). Determinadas caracte-rísticas da rede social de apoio, con-cebida como canal através do qual oapoio é providenciado (Moreira,2002), devem ser consideradas comorelevantes. Nomeadamente: dimen-são, composição, homogeneidade,estabilidade, frequência e densidade.

O suporte social é particularmenteimportante durante a fase do ciclo devida correspondente à infância, poiseste é um período caracterizado poruma maior vulnerabilidade social edependência física em relação aosoutros. Esta fase é também muitoimportante na construção da identida-de pessoal, para a qual contribuemmúltiplos contextos interpessoais(família, escola, grupo de pares) sig-nificativos durante esse período.

A importância particular da vincu-lação (Bowlby, 1988; Bretherton,1985) e de outros tipos de relações,que fazem parte dos contextos sociaisda infância, tem sido salientada pordiversos autores desenvolvimentistas,referindo o seu efeito em diversasáreas do desenvolvimento (Hinde &Stevenson-Hinde, 1986; Perris, 1994;Sameroff & Seifer, 1990).

No entanto, embora a associaçãoentre suporte social ao longo da vida e

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diversas áreas de desenvolvimento(saúde mental, satisfação com a vida,ajustamento emocional, ...) esteja bemdocumentada utilizando, retrospecti-vamente, a percepção do adulto, comouma de nós já anteriormente haviaconstatado (Canavarro, 1999), emrelação ao suporte percepcionado emdeterminada época da vida, nomeada-mente durante a infância, ainda hápouca informação sistematizada sobrea sua natureza e consequências.

Neste contexto, em nossa opinião,o My family and friends surge, pordiversos motivos, como um instru-mento privilegiado para avaliar osuporte social em crianças.

Um primeiro aspecto que considera-mos vantajoso, prende-se com este ins-trumento ter sido construído com basenuma linha teórica que conceptualiza oapoio social como um conceito multi-dimensional, avaliando-o em diferen-tes áreas (emocional, informativa, ins-trumental e afiliativa) e recolhendotambém informação sobre aspectosestruturais associados à rede de apoio.O My family and friends anota a per-cepção que a criança tem do apoio for-necido por todos os familiares e outrasfiguras significativas não familiares. Aeste respeito, a literatura refere a famí-lia, os amigos e os indivíduos perten-centes ao contexto escolar, de formageral, como fontes de apoio chave paraa maioria das crianças e adolescentes(Cauce, Mason, Hiraga, Liu, 1994).Por outro lado, para além dos diferen-tes tipos de apoio, este instrumento

inclui, igualmente, a avaliação do con-flito que a criança percebe relativa-mente às diferentes figuras de apoio. Aavaliação desta faceta é importantedado que as interacções negativas tam-bém fazem parte das relações, possuin-do um forte impacto na saúde (Walen& Lachman, 2000).

Um segundo aspecto subjacente ànossa preferência diz respeito à utili-zação da própria criança como infor-mador. Esta estratégia vai ao encontrodas investigações que suportam ovalor preditivo (avaliado em relaçãoao ajustamento emocional, auto-con-ceito, ajustamento familiar) da utiliza-ção da criança como fonte de infor-mação, por comparação com a infor-mação obtida através dos pais (Berndt& Perry, 1986).

Apreciamos também o formato doinstrumento. Sendo uma “entrevistalúdica”, em que as perguntas não sãoabertas (o que nesta faixa etária con-duz a respostas mais incompletas doque as que são dadas por adultos,Bigelow, 1977), foge simultaneamen-te às formas tradicionais de respostamúltipla ou verdadeiro vs falso, o queleva habitualmente a que, nas respos-tas dadas, as crianças simplifiquem osseus sentimentos (Bierman, 1983).Possibilita, assim, uma informaçãomais reveladora das percepções dacriança sobre a sua rede de suporte.

Por último, a nossa própria expe-riência com o My family and friendsleva-nos a estar de acordo com os seusautores originais e mencionar que o

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instrumento permite que a criançatenha uma boa compreensão emocio-nal e cognitiva das tarefas que lhe sãopropostas, sendo estas ainda conside-radas pela maior parte das criançascomo algo agradável e interessante.

Descrição do instrumento

A avaliação é feita em duas partesprincipais1. Uma primeira onde a crian-ça é introduzida na tarefa e lhe é pedi-do que identifique as figuras mais rele-vantes da sua rede social de apoio.Primeiro todas as pessoas da sua famí-lia nuclear (mãe, pai, e irmãos); poste-riormente, é incentivada a identificarum ou dois amigos, um ou dois fami-liares mais próximos e o professorfavorito (no caso de ter mais do que umprofessor). Por fim, é-lhe dada a opor-tunidade de incluir outras pessoas espe-ciais que ainda não tenham sido referi-das. Os nomes de cada uma das pesso-as são escritos em cartões e é recolhidainformação adicional sobre cada umadas figuras identificadas (tipo de afilia-ção, idade, frequência de contacto), queé registada numa folha de pré-triagem.

Numa segunda parte da entrevista,a criança avalia as pessoas identifica-das na primeira parte relativamente a:

a) disponibilidade de cada uma daspessoas para fornecer diferentestipos de apoio,

b) a qualidade da ajuda recebidapor cada uma das figuras. Paraeste efeito são apresentadas àcriança 12 situações relativas adiferentes necessidades/desejosde apoio. São incluídos cincodiálogos para o apoio afectivo edois diálogos para cada um dosdomínios: informativo, instru-mental e companheirismo. Éigualmente incluído um diálogosobre o conflito entre a criança eas figuras de apoio.

Relativamente a cada um dos diálo-gos é pedido à criança, num primeiromomento, para colocar os cartões (cf.Figura 1) de cada uma das figuras deapoio numa tábua de ordenação, com 10ranhuras, em função da frequência comque cada figura é utilizada para satisfazeras necessidades de apoio descritas porcada um dos diálogos. O entrevistadorformula uma pergunta do tipo: “Quandoqueres ou necessitas de _________(determinado tipo de apoio social), comqual destas pessoas vais ter mais vezes?”.A criança identifica a pessoa, colocando-a na primeira ranhura da tábua de orde-nação. O entrevistador continua, pergun-tando: “Olha para os cartões das pessoasque sobram. A seguir com quem vais termais vezes?” Estas questões continuamaté a criança dizer que não recorre a maisnenhuma pessoa para aquele tipo especí-fico de apoio.

1. O instrumento original contém uma terceira parte, que foi eliminada da versão portuguesa. Estaparte consiste na identificação de outras pessoas da rede de apoio social da criança e na recolha dealgumas informações adicionais acerca destas figuras.

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Num segundo momento, é pedidoà criança para classificar a satisfaçãocom o apoio fornecido por cada umadas figuras, desde a figura localizadana 1ª ranhura até à figura da últimaranhura. Assim, a criança utiliza um

termómetro (cf. Figura 2) onde faz asua avaliação, movendo um indica-dor, numa escala de 0 a 50 (de nãomuito até muitíssimo), para cada umadas pessoas colocadas na tábua deordenação.

Figura 1 - Material utilizado na 1ª parte da avaliação: cartões de identificação das figuras da rede social da criança.

Figura 2 - Material utilizado na 2ª parte da avaliação: tábua de ordenação e termómetro para classificação do apoio fornecido

por cada uma das figuras.

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O Quadro 1 descreve as 12 situaçõ-es de apoio e as respectivas perguntassobre a satisfação com o apoio recebi-do, tal como são formuladas na versãoportuguesa do instrumento.

Como já mencionámos anterior-mente, o My family and friends foiconstruído com base em quadros teó-ricos cognitivo-desenvolvimentais eassim norteado pela importância doenvolvimento da criança como cola-boradora activa (Reid, Landesman,Treder, & Jaccard, 1989). O apelo asituações concretas e a utilização demateriais (os cartões, a tábua de orde-nação, os termómetros) que a criançapode manipular, são formas de a man-ter mais envolvida e concentrada natarefa. Desta forma, reduzem-se pro-blemas motivacionais e de atenção,frequentes nas entrevistas de avalia-ção realizadas com crianças destasfaixas etárias.

O estudo das características psi-cométricas do instrumento original(Reid et al., 1989) foi realizadonuma amostra de 249 crianças comidades compreendidas entre os 6 eos 12 anos de idade. Os resultadosdeste estudo sugerem que as crian-ças têm diferentes necessidadessociais e que compreendem que aspessoas diferem quanto à sua capa-cidade para satisfazerem a suas

necessidades dos diferentes tipos deapoio. As análises do teste-reteste ede consistência interna sugerem,igualmente, uma fiabilidade aceitá-vel do instrumento.

O presente trabalho descreve oestudo de validação da versão do Myfamily and friends para a populaçãoportuguesa.

A tradução do instrumento paralíngua portuguesa foi desenvolvidaem três fases. Num primeiro momen-to, duas psicólogas, com experiênciaclínica com crianças, realizaram tra-duções independentes do instrumentooriginal, em inglês, para a língua por-tuguesa. A comparação destas duasversões apoiou a sua equivalência,dando origem apenas a pequenosajustamentos na versão resultante.Seguidamente foi realizada a retro-versão da versão portuguesa por umaterceira psicóloga. A verificação daequivalência do conteúdo da retrover-são com a versão original foi feita porum sujeito bilingue. Por fim, a versãoportuguesa do My family and friendsfoi aplicada a um conjunto de 15crianças com o objectivo de testar aclareza do vocabulário utilizado.Como resultado desta aplicaçãoforam feitas ligeiras alterações de lin-guagem para melhorar a compreen-são de algumas questões.

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Tipo

de

Apo

ioSo

cial

e N

.º do

Diá

logo

Diálogos: Situações Sociais e Questões de Satisfação

I. Emocional

1

Situação Social: Se quiseres falar sobre os teus sentimentos (como sentires-te contente, triste ou zan-gado), com qual destas pessoas é que vais ter mais vezes?Questão de Satisfação: Quando falas com ______ acerca dos teus sentimentos quanto melhor é queele(a) te faz sentir?

6Situação Social: Quando fazes alguma coisa bem, que te faz sentir realmente feliz, como ter 100%num teste, ou receber um prémio, com qual destas pessoas vais ter mais vezes?Questão de Satisfação: Quando tu contas ao(à) ______ a boa notícia, quanta felicidade é que sentes?

8

Situação Social: Se fizesses alguma coisa que te fizesse sentir realmente mal (como algo que ninguémsoubesse, ou algo que não deverias teres feito), com qual destas pessoas é que irias ter mais vezes?Questão de Satisfação: Quando tu te sentes mal e falas com ______, quanto melhor é que ele(a) teajuda a sentir?

10 Situação Social: Qual destas pessoas te compreende ou te conhece melhor?Questão de Satisfação: Quanto é que o(a) ______ te compreende?

12 Situação Social: Qual destas pessoas faz ou diz coisas que te ajudam a sentires-te bem contigo próprio?Questão de Satisfação: Como é que o(a) ______ te faz sentir acerca de ti próprio, ou por seres como és?

II. Informativo

4

Situação Social: Qual destas pessoas te conta ou mostra coisas que te ajudam a aprender mais acercade como o mundo funciona? (Alguns exemplos são aprender acerca de notícias que saem nos jornais,ou mostrar-te como se constróem ou fazem coisas.)Questão de Satisfação: Quanto é que tu aprendes acerca das coisas estando com cada uma destas pessoas?

11

Situação Social: Se houver algo acerca do qual tu não sabes muito e precisas de mais informação,como algo em casa ou na escola, com quem é que vais falar para teres uma resposta? Questão de Satisfação: Quando vais ter com o(a) ______ para pedir informações, quanto é queaprendes com as respostas que te dá?

III. Instrumental

2Situação Social: Quando necessitas que te ajudem com o trabalho da escola (como leitura, escrita,matemática, estudo do meio), com qual destas pessoas é que vais ter mais vezes?Questão de Satisfação: Quando vais pedir ajuda à(ao) ______, quanto é que achas que ele(a) te ajuda?

7

Situação Social: Quando necessitas que te ajudem em alguma coisa em casa (como quando precisasde ajuda para algo que não consegues fazer, que não consegues encontrar, ou que não consegues fazersem ajuda), com qual destas pessoas é que vais ter mais vezes?Questão de Satisfação: Quando vais pedir ajuda ao(à) ______, quanto é que achas que ele(a) te ajuda?

IV. Companheirismo

3

Situação Social: Se quiseres sair e fazer coisas realmente divertidas, com qual destas pessoas é quevais ter mais vezes? Questão de Satisfação: Quando vais ter com o(a) _______ para te divertires, quanto é que te divertesrealmente com ele(a)?

9Situação Social: Se queres estar com alguém que te faz sentir feliz, com qual destas pessoas é que vaister mais vezes?Questão de Satisfação: Quando estás com o(a) ______, quanta felicidade é que sentes?

V. Conflito

5 Situação Social: Com quem é que ficas aborrecido ou zangado mais vezes, mesmo que não o demonstres?Questão de Satisfação: Quão zangado(a) ou aborrecido(a) tu ficas com o(a)______?

Quadro 1 - Diálogos da versão portuguesa do My family and Friends

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METODOLOGIA

Amostra

A amostra foi constituída por 549crianças, com idades compreendidasentre os 8 e os 11 anos de idade. Ascrianças foram seleccionadas alea-toriamente de 78 turmas de escolasde zonas rurais e urbanas dasregiões do Norte, Centro, Lisboa eVale do Tejo. A autorização dos paisfoi pedida pelo professor, tendo-severificado apenas cerca de 5% derejeições, na totalidade dos sujeitossolicitados.

De forma a tornar a amostra com-parável à utilizada no estudo de vali-dação do instrumento original (Reidet al., 1989), foram utilizados osseguintes critérios de exclusão:mudanças na composição e estruturada família nuclear ocorridas nos últi-mos 12 meses (nascimento deirmãos ou separação/divórcio dospais) e doença psiquiátrica de umdos progenitores.

No Quadro 2 apresentamos as

características gerais da amostra. A amostra é constituída por um

número semelhante de crianças dosexo masculino e crianças do sexofeminino, que frequentam os 3º e 4ºanos de escolaridade.

A grande maioria das crianças per-tence a famílias nucleares intactas.Das crianças cujos pais estão separa-dos ou divorciados, a grande maioriavive só com a mãe (73%) e com a mãee o padrasto (24%).

Mais de metade das crianças temapenas um irmão e as restantes crian-ças distribuem-se igualmente pelascategorias sem irmãos e 2 ou maisirmãos. Relativamente à posição nafratria, 45 % são irmãos mais novos,10 % são irmãos do meio, 44 % sãoirmãos mais velhos e 1 % têm umirmão gémeo.

As crianças distribuem-se deforma equilibrada pelos três níveissócio-económicos considerados. Porfim, a maioria das crianças pertence azonas urbanas e semi-urbanas e sóuma pequena minoria pertence azonas rurais.

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N (%)

Sexo

Feminino 261 47,5

Masculino 288 52,5

Escolaridade

3º ano 262 47,7

4º ano 287 52,3

Idade

8 anos 169 30,8

9 anos 242 44,1

10-11 anos 138 25,1

Situação Conjugal Pais

Casados/União de Facto 491 89,4

Separados/Divorciados 53 9,7

Viuvez 5 0,9

Número de irmãos1

Filho único2 117 21,3

1 irmão 317 57,7

2 ou mais irmãos 115 21

Nível Sócio-Económico3

Baixo 193 35,2

Médio 173 31,5

Médio-elevado e elevado 183 33,3

Zona de Residência

Urbana 279 50,8

Semi-urbana 171 31,1

Rural 99 18,0

Quadro 2 - Características gerais da amostra (n=549)

1. Só se consideram irmãos filhos do mesmo pai e da mesma mãe.2. Destas crianças 13 têm meios irmãos.3. Adaptação da classificação de Simões (1994)

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Procedimento

Após o pedido de autorização ecolaboração aos pais e às própriascrianças, os entrevistadores desloca-ram-se às escolas para entrevistar ascrianças durante o período de aulas.Cada entrevista teve a duração de 20 a45 minutos.

Como já foi descrito anteriormen-te, em primeiro lugar foi explicado àcriança os objectivos da entrevista eassegurada a confidencialidade dasrespostas. Depois desta breve introdu-ção, era-lhe pedido que identificasseas figuras familiares e não familiaresmais significativas. Seguidamente,eram apresentados os 12 diálogoscom as respectivas tarefas de ordena-ção e classificação da satisfação como apoio recebido. No final, o entrevis-tador classificava ainda o comporta-mento da criança, numa escala tipoLikert de dez pontos nos seguintesdomínios: interesse, cooperação,compreensão e diversão.

Na recolha de dados participaram 4psicólogos, 8 estagiários finalistas dePsicologia da Faculdade de Psicologiae de Ciências da Educação daUniversidade de Coimbra e 11 esta-giários das licenciaturas em Educaçãode Infância e em Ensino Básico - 1ºCiclo da Escola Superior de EducaçãoJoão de Deus. Todos os entrevistado-res possuíam formação na área deavaliação de crianças. Seguindo asorientações das autoras do instrumen-to (Reid & Ramey, 1992) foi feita a

formação para a administração do ins-trumento. Este procedimento envol-veu: a) estudo do manual, b) observa-ção de um vídeo de demonstração daaplicação do instrumento original, c)prática simulada da entrevista, d) aobservação de uma entrevista feitacom base na versão portuguesa doinstrumento e e) a realização de umaentrevista a uma criança com observa-ção de uma das autoras, que no finalda entrevista debatia com o entrevis-tador tópicos relativos à relação esta-belecida com a criança, introdução dacriança na tarefa, eficiência e clarezada questões colocadas, entre outrosaspectos.

Análises

Um processo adequado de adapta-ção de um instrumento de avaliaçãodeve seguir um procedimento muitosemelhante ao da sua construção(Ribeiro, 1999). Assim, seguimos asugestão do autor e submetemos anova versão do instrumento aos mes-mos procedimentos psicométricos aque foi sujeita a versão original.

Em primeiro lugar, foram reali-zadas análises com o objectivo deexplorar o comportamento da crian-ça durante a entrevista, bem como ainfluência da idade e do género nocomportamento de adesão à tarefa.Para este efeito recorremos a esta-tística descritiva, a análises devariância e a testes t para amostrasindependentes.

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Seguidamente, foi analisada a capa-cidade da criança diferenciar os dife-rentes tipos e fontes de apoio social apartir das classificações da satisfaçãocom o apoio afectivo, informativo, ins-trumental e companheirismo, forneci-do para cada uma das figuras de apoio.Com este objectivo foram efectuadasanálises de variância de medidas repe-tidas, considerando dois factores intra-sujeitos, o tipo de apoio e a fonte deapoio. O conflito percebido em rela-ção a cada uma das figuras de apoio,foi também analisado através de ummodelo ANOVA de medidas repetidas,considerando um factor intra-sujeitos,a fonte de apoio.

Numa terceira etapa, foram averi-guadas diferenças de género quanto àsatisfação com o apoio percebido.Para este efeito foram realizadas aná-lises de variância de medidas repeti-das com dois factores intra-sujeitos, otipo de apoio e a figura de apoio e umfactor entre sujeitos, o género. Deigual modo, as diferenças de géneroquanto ao conflito percebido foramanalisadas através de um modeloANOVA de medidas repetidas, consi-derando um factor intra-sujeitos, afonte de apoio e um factor entre sujei-tos, o género .

Nas análises de variância de medi-das repetidas, quando se verificou aviolação do pressuposto da esfericida-de, foi aplicado o factor de correcçãoHuynh-Feldt aos graus de liberdadedos testes F.

Em quarto lugar, foram realizadas

análises de consistência interna e deestabilidade temporal das quatro áreasde apoio social para as diferentesfiguras. A consistência interna dasdiferentes subescalas foi analisadaatravés do cálculo do coeficiente alfade Cronbach e a estabilidade temporaldo instrumento foi obtida através docálculo do coeficiente de correlaçãointra-classe.

Por fim, apresentamos os resulta-dos de um pequeno estudo de validadede conteúdo a partir da análise das res-postas de vinte crianças da amostra.

RESULTADOS

Comportamento da criança durante a entrevista: influência dogénero e idade da criança.

No final de cada entrevista o entre-vistador avaliou o comportamento dacriança numa escala de 0 (nenhum) a10 (muito alto), relativamente a qua-tro dimensões: interesse, cooperação,compreensão e diversão. Nas quatroavaliações apenas um reduzido núme-ro de crianças se situou na metadeinferior da escala. As médias obtidaspara a avaliação do interesse (M=7,76DP=1,47), cooperação (M=8,40,DP=1,36), compreensão (M=8,15DP=1,40) e diversão (M=7,10DP=1,63) são reveladoras de um bomnível de adesão à tarefa.

No que concerne à existência dediferenças na adesão das crianças àentrevista em termos de grupo etário

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(em três categorias: 8, 9, 10-11 anos) ede género, os resultados apenas reve-laram diferenças estatisticamente sig-nificativas em termos de género. Estasdiferenças verificaram-se relativamen-te ao interesse manifestado (t = 2,689,p=0,007) e apenas marginalmente emrelação à diversão durante a tarefa (t =1,973, p=0,049). As crianças do sexofeminino revelam um maior interesse(M=7,93, DP=1,43) e diversão (M=7,25 DP=1,56) durante a tarefa do queas crianças do sexo masculino (inte-resse - M= 7,60 DP=1,49) (diversão -M = 6,97, DP = 1,68).

Capacidade da criança paradiferenciar diferentes tipos e diferentes fontes de apoio social.

Um aspecto fundamental para avalidação deste instrumento para apopulação portuguesa é o de conhecerse as crianças portuguesas, à semel-hança das crianças americanas destafaixa etária, conseguem diferenciar osdiferentes tipos de apoio social e asdiferentes figuras que o fornecem.

Assim, as classificações das crian-ças quanto à satisfação com o apoiorecebido foram analisadas utilizandoum modelo ANOVA de medidas repe-

tidas com dois factores, o tipo de apoioe a figura de apoio. Nestas análises sóforam incluídas as crianças com clas-sificações completas relativamente àsseis figuras de apoio consideradas noestudo original (mãe, pai, irmãos, ami-gos, familiares e professor) (n=311).

Os resultados das análises revelaramefeitos significativos para o tipo deapoio (F(2,8, 882,3)=114,658,p<0,001), fonte de apoio (F(4,2,1297,3)=211,859 p<0,001) e para ainteracção entre o tipo de apoio e a fontede apoio (F(11,6, 3590,1)=161,255,p<0,001). Os efeitos principais corrobo-ram a existência de diferenças na per-cepção de apoio social em função dotipo de apoio que é prestado (afectivo,informativo, instrumental e companhei-rismo) e em função da pessoa que o for-nece (mãe, pai, irmão, amigo, familiar eprofessor). O efeito de interacção entreestas variáveis apoia a ideia de que ascrianças percebem perfis distintos deapoio para as diferentes figuras quefazem parte da sua rede social.

De forma a testar os efeitos sim-ples da interacção entre o tipo deapoio e a fonte de apoio realizaram-secomparações múltiplas par a par (uti-lizando a correcção Bonferroni)(Quadro 3).

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Comparando o perfil de apoio decada uma das figuras consideradas,observa-se que os progenitores funcio-nam como figuras de apoio mais gene-ralizado, ao passo que as restantes rela-ções são mais especializadas relativa-mente ao tipo de apoio que prestam.

No que diz respeito aos irmãos, ocompanheirismo é a área de maiorsatisfação, seguindo-se o apoio afecti-vo, instrumental e informativo.

O companheirismo também é odomínio de maior satisfação relativa-mente ao apoio prestado pelos ami-gos, seguindo-se o apoio afectivo, oinformativo e o instrumental.

No que toca aos familiares, ascrianças percebem um apoio maissatisfatório na função de compan-heirismo e de apoio afectivo,seguindo-se o apoio informativo e oapoio instrumental. Este perfil con-juga o apoio prestado por diferentesfiguras familiares, nas sua maioriaavós, tios/madrinha ou padrinho eprimos.

Finalmente, o professor aparececomo uma figura especializada noapoio informativo, sendo os restantestipos de apoio afectivo, instrumental ecompanheirismo, percebidos comopouco satisfatórios.

Figura ApoioTipo de Apoio

Afectivo Informativo Instrumental Companheirismo Total

Mãe 40,066 (0,54) 36,868 (0,78) 38,719 (0,66) 31,587 (0,89) 38,810 (0,58)

Pai 34,794 (0,73) 34,381 (0,90) 32,095 (0,89) 30,148 (0,97) 32,855 (0,72)

Irmão(ã) 23,069 (0,91) 15,722 (1,01) 19,883 (0,97) 31,564 (0,95) 22,560 (0,80)

Amigo(a) 21,626 (0,84) 11,805 (0,86) 7,849 (0,68) 33, 863 (0,89) 18,786 (0,64)

Familiar 25,097 (0,86) 20,322 (1,05) 15,260 (0,93) 28, 445 (1,00) 22,881(0,77)

Professor 12,954 (0,77) 30,651 (1,00) 11,900 (0,68) 8,752 (0,79) 16,064 (0,61)

Total 26,268 (0,51) 24,958 (0,54) 20.951 (0,46) 27,393 (0,55)

a

1

a

2

b

3,4

b

4

b

3

b

5

b

1

a

2

d

4

d

5

c

3

a

3

a,b

1

b

2

c

3

c

5

d

3

b

4

c

1,2

b

1,2

a

1,2

a

1

a

2

c

3

Quadro 3 - Classificação (de 0 a 50) da satisfação por tipo de apoio e fonte de apoio social - média e desvio padrão

*A carregado os valores acima de 25. * A ordenação das médias é feitas por letras nas comparações em cada linha e por números nas com-parações em cada coluna (1>2>3>..., a>b>c>...). As médias que partilham a mesma letra ou núme-ro de ordenação não diferem significativamente entre si, para p<0,05.

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No que diz respeito ao conflito, osresultados das análises de variância demedidas repetidas (um factor intra-sujeitos) apoiam a existência de dife-renças significativas para as diferen-tes figuras de apoio, F(4,2,1370,9)=109,035, p<0,001. As crian-ças percepcionam um maior nível deconflito relativamente aos irmãos(M=23,53, DP=18,81), amigos(M=10,28, DP=13,17), ao pai(M=8,80, DP=13,43), à mãe (M=7,94,DP=12,23), aos familiares (M=7,157,DP=13,13 ) e ao professor (M=3,66,DP=10,65 ).

Diferenças de género relativamente àpercepção de apoio social e à per-cepção de conflito.

Embora o estudo do instrumentooriginal não faça referência às dife-renças de género em relação à percep-ção do apoio social, optámos por con-siderar a variável género nas análises,dado estas surgirem apontadas nosresultados de diferentes estudos (East

& Rook, 1992; Shute, De Blasio, &Williamson, 2002).

Para averiguar as diferenças degénero quanto à satisfação com oapoio percebido, foram realizadasanálises de variância de medidas repe-tidas com dois factores intra-sujeitos,o tipo de apoio e a figura de apoio eum factor entre sujeitos, o género. Osresultados revelaram uma interacçãoestatisticamente significativa entretipo de apoio, fonte de apoio e género,F(11,6,3579,8) = 2,245, p=0,009.Salientamos a existência de diferen-ças significativas quanto à satisfaçãocom o apoio informativo(F(1,309)=4,270, p=0,040) e instru-mental (F(1,309)=4,182, p=0,042)prestado pela mãe e quanto à satisfa-ção com o apoio afectivo prestadopelos amigos (F(1,309)=8,750,p=0,003), no sentido das raparigasestarem mais satisfeitas (ver Figura3). Contudo em ambos os sexos o per-fil de apoio das diferentes figuras,segue os padrões anteriormente des-critos para a amostra global.

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Por fim, as diferenças de géneroquanto ao conflito percebido, foramanalisadas utilizando um modeloANOVA com dois factores, um factorintra-sujeitos, a figura de apoio, e umfactor inter-sujeitos, o género.

Os resultados evidenciaram dife-renças significativas para os doisgéneros no que concerne ao conflitopercebido relativamente ao pai(F(1,322)=11,679, p=0,001), à mãe(F(1,322)=5,871, p=0,016) e ao pro-fessor (F(1,322)=5,418, p=0,021), nosentido das crianças do sexo masculi-no perceberem um maior conflito queas crianças do sexo feminino.

Fiabilidade

O conceito de fiabilidade refere-seao grau em que uma escala está a ava-liar algo de forma a que os resultados

possam ser replicáveis, independente-mente das diferentes circunstâncias(por exemplo, momentos diferentes,avaliadores diferentes) (Nunnaly,1978). A fiabilidade é, desta forma,uma “medida da proporção da variabi-lidade das pontuações que é devida adiferenças verdadeiras entre indiví-duos” (Streiner & Norman, 1989, p.6). Para avaliar a fiabilidade da versãoportuguesa do My Family and Friendsaveriguámos a consistência internadas diferentes subescalas, através docálculo do coeficiente alfa deCronbach e analisámos a estabilidadetemporal do instrumento, calculando ocoeficientes de correlação intra-classe.

Análise de consistência interna

Nunnaly (1978) refere que “o coe-ficiente alfa de Cronbach é a fórmula

Figura 3 - Classificações médias da satisfação com as diferentes funçõesde apoio prestado por figuras chave, em função do género da criança

0

5

10

15

20

25

30

35

40

Ap. Afect. Ap. Inform. Ap. Instr. Companh.

Pai

Feminino

Masculino

0

5

10

15

20

25

30

35

Ap. Afect. Ap. Inform. Ap. Instr. Companh.

Irmãos

Feminino

Masculino

0

5

10

15

20

25

30

35

40

A p. A f ect. A p. Inf orm. A p. Instr. Companh.

A migos

Femin ino

Mas culino

0

5

10

15

20

25

30

35

Ap. Af ect. A p. Inform. A p. Instr . Companh.

Familiares

Feminino

Mas culino

0

5

10

15

20

25

30

35

A p. A f ect. A p. Inf orm. A p. Ins tr . Companh.

Prof essor

Feminino

Masc ulino

0

5

10

15

20

25

30

35

40

45

Ap. Afect. Ap. Inform. Ap. Instr. Companh.

Mãe

Feminino

Masculino

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básica para determinar a fiabilidadebaseada na consistência interna” (p.230). Este coeficiente dá-nos umaboa estimativa da fiabilidade namaioria das situações, uma vez que“a maior fonte de erro é devida àamostragem de conteúdo” (Nunnaly,1978, p.230).

Nunnaly (1978) considera quevalores de fiabilidade a partir dos 0,7são aceitáveis, quando se trata deinvestigação básica. Neste sentido,todas as subescalas globais apresen-tam bons níveis de fiabilidade, comexcepção da subescala do apoio ins-trumental (Quadro 4).

Fonte de Apoio

Tipo de ApoioValores globais

Afectivo Informativo Instrumental Companheirismo

Mãe 0,703 0,640 0,600 0,472 0,840

Pai 0,776 0,692 0,580 0,514 0,871

Irmão(ã) 0,834 0,754 0,653 0,593 0,897

Amigo(a) 0,771 0,682 0,472 0,522 0,851

Familiar 0,785 0,704 0,601 0,558 0,873

Professor(a) 0,761 0,551 0,255 0,605 0,754

Valores globais 0,900 0,729 0,674 0,730

Quadro 4 - Consistência interna da pontuação das escalas - alfa de Cronbach

No que toca às subescalas que con-sideram simultaneamente a fonte deapoio e o tipo de apoio, os valores sãomais variáveis. Como podemos obser-var pelos valores apresentados noquadro anterior, são as escalas deapoio afectivo que apresentam umnível mais elevado de consistênciainterna. Por outro lado, são as escalasde apoio instrumental e companheiris-

mo que apresentam valores mais bai-xos de consistência interna.

Estabilidade temporal

O método de reteste consiste emaplicar o mesmo teste à mesma amos-tra de indivíduos com um determinadointervalo de tempo e correlacionar osresultados obtidos nos dois momentos.

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Tendo por objectivo avaliar a esta-bilidade temporal do instrumento, fez-se uma segunda aplicação do MyFamily and Friends a 59 crianças,passadas 4 a 6 semanas da primeira

entrevista. A consistência entre o testee o reteste foi avaliada através doCoeficiente de Correlação Intraclasse.Os resultados são apresentados noQuadro 5.

Fonte de Apoio

Tipo de ApoioConflito

Afectivo Informativo Instrumental Companheirismo Total

Mãe 0,784 0,623 0,750 0,703 0,828 0,530

Pai 0,813 0,716 0,718 0,731 0,847 0,465

Irmão(ã) 0,772 0,600 0,706 0,648 0,794 0,569

Amigo(a) 0,635 0,246 0,495 0,504 0,513 0,388

Familiar 0,556 0,687 0,749 0,484 0,702 0,582

Professor(a) 0,674 0,481 0,367 0,429 0,575 0,265

Total 0,708 0,608 0,659 0,718 0,377

Quadro 5 - Estabilidade temporal da pontuação das escalas - coeficiente de correlação intraclasse

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Segundo Fleiss (1981) um coefi-ciente de correlação intraclasse cujovalor seja igual entre 0,4 a 0,7 traduzuma concordância razoável a boa e umcoeficiente superior a 0,70 traduz umaexcelente concordância. Segundo estaclassificação apenas quatro dos trinta ecinco coeficientes traduzem uma con-cordância pobre. Nomeadamente osseguintes: Escala de ApoioInformativo do Amigo, Escala deConflito com Amigo, Escala do ApoioInstrumental do Professor e Escala deConflito com o Professor. Como sepode observar no quadro anterior, asescalas que apresentam níveis maiselevados de fiabilidade são as quedizem respeito ao apoio prestado pormembros da família.

Validade de Conteúdo

A validade de conteúdo é uma vali-dade que garante que a inspecção doconteúdo do teste por especialistas o

que permite afirmar que o teste avaliao que é suposto avaliar (Ribeiro,1999). A investigação com criançastem apontado a importância de avaliaras crenças e entendimento que ascrianças têm acerca dos itens (Reid etal., 1989). Assim, de forma semelhan-te ao que foi feito nos estudos com aversão original, questionámos umapequena parte da nossa amostra(n=20) sobre a compreensão dos diá-logos apresentados. O esclarecimentofornecido pelas crianças mostrou umaboa compreensão das questões deapoio social e os exemplos dadospelas crianças portuguesas enqua-dram-se quase na totalidade nas cate-gorias criadas pelas autoras do instru-mento original a partir da análise deconteúdo das respostas dadas pelascrianças americanas.

De seguida (cf. Quadro 6) apresenta-mos um quadro com alguns exemplosdados para cada uma das categoriasestabelecidas por Reid et al. (1989).

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Quadro 6 - Categorização das descrições das crianças sobre as suas neces-sidades sociais e alguns exemplos de resposta de crianças portuguesas

Necessidades de apoio social ExemplosI. Apoio Emocional

1. Apoio para acontecimentos/experiências nega-tivos (que a criança sofreu ou cometeu)

Quando me chamam nomes; Quando a professora ralha comi-go; Quando sou mal educada; Quando perco alguma coisa;Quando os meus pais têm problemas lá em casa

2. Apoio para experiências positivas (concretiza-ção de pequenos objectivos, concretização deobjectivos pessoais, experiências sociais positivascom família e pares, aquisições materiais)

Quando os professores me elogiam; Quando faço bem as fichas;Quando me porto bem; Quando passo de cinto no Taikondo;Quando arranjo outra amiga; Quando estou apaixonada; Quandonasceu alguém da minha família; Quando me compram o quequero; quando recebo uma prenda

3. Apoio para a compreensão do próprio (demons-tração de empatia para com a criança, manifesta-ção verbal de apoio; comunicação através deexpressão facial e demonstração física; criançarefere conhecimento intuitivo da compreensãoque os outros têm por si)

Ajudam quando estou em dificuldades; Consolam-me; Sabem oque eu gosto e não gosto; Sabem quando estou a mentir; Dizemque gostam de mim; Dá-me alcunhas que me faz sentir bemcomo minhoca fresca; Dizem coisas que me acalmam; Dão mecarinho; Pega-me ao colo e aperta-me; Não sei explicar bem; Jávivem comigo há tanto tempo

4. Promoção da auto-valia (cumprimentos gerais eespecíficos dados à criança; acções que agradamà criança ou presentes)

Diz que sou bonito; Elogia-me, dizem-me que fiz bem,Quando me sinto feia e gorda, eles dizem-me que não sou;Fazem-me as vontades, Ajudam-me quando me magoou eestou doente

II. Apoio Informativo

1. Acerca do mundo Sobre o 25 de Abril; Pergunto sobre a guerra, sobre o quedizem os jornais e televisão; Porque as pessoas poluem

2. Acerca de novas competências/aprendizagens Ensinam-me a fazer comida; Aprendo ponto cruz; Ensinam-me a pesquisar; Ensinar-me a andar de bicicleta

3. Acerca do próprio Dizem-me o que fazer quando estou em perigo; Quando não mesinto bem, a tia explica-me que existem esses problemas

4. Informação específica O que vou comerIII. Apoio Instrumental

1. Escola, trabalho ou aulas Corrigem-me os trabalhos; Explicam-me quando não perce-bo a matéria; Fazem-me perguntas para eu pensar

2. Tarefas e actividades quotidianas Ajudar a pôr a mesa, a varrer o chão; Partir a carne quando édura; Ajudar a arrumar a roupa; Ajudar a tomar banho

3. Actividades físicas novas ou difíceis Ajuda-me quando quero fazer uma prenda para os pais;Ajudar a fazer bolos; Ir à Internet

4. Localização de objectos Ajudam-me a encontrar o game boy; Quando não encontro osténis; Procurar o caderno da escola

IV. Companheirismo1. Envolvimento em actividades físicas, desportose outros jogos

Jogar futebol, Andar de bicicleta; Jogar à apanhada, Jogamosténis; Jogar à corda; Jogar no computador

2. Passeios a locais interessantes ou de aventura Vamos à loja de animais; Vamos comer fora; Convidam-mepara ir a casa deles; Levam-me a passear

3. Criação de projectos ou actividades especiais,incluindo fantasia

Brincamos de faz de conta, com bonecas, fazemos projectos;Brincamos às lojas

4. Observação/audição dos media Ouvimos música5. Acções que visam a boa disposição da criança Fazem palhaçadas, Fazem-me cócegas, Fazem-me rir

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Como podemos constatar no qua-dro anterior, os exemplos dados pelascrianças para cada um dos diálogossugerem um bom entendimento decada um dos quatro tipos de apoioavaliados pelo instrumento.

Discussão

O presente estudo procurou averi-guar as características psicométricasda versão portuguesa de um instru-mento de avaliação do apoio socialem crianças, o My family and Friends.Os resultados, à semelhança do queaconteceu no estudo original (Reid etal., 1989), parecem sugerir que esteinstrumento é adequado para avaliar oapoio social em crianças em idadeescolar.

Em primeiro lugar, no que respeitaà avaliação que o entrevistador fez docomportamento da criança durante aentrevista, as crianças revelaram glo-balmente resultados elevados em ter-mos de interesse, cooperação, com-preensão e diversão.

O estudo das diferenças de génerona adesão das crianças à entrevistarevelou diferenças estatisticamentesignificativas, no sentido das rapari-gas demonstrarem mais interesse ediversão durante a tarefa. Os resulta-dos relativos à validação da escalaoriginal (Reid et al., 1989) são semel-hantes no que toca à dimensão diver-são, mas não relativamente à dimen-são interesse, em relação à qual asmédias não diferiam significativa-

mente para os dois sexos. No entanto,é importante salientar, que em ambosos estudos e apesar da existência dediferenças significativas em funçãodo género, os resultados médios man-têm-se elevados para ambos os sexos.

No que concerne às diferenças emtermos de grupos etários, ao contráriodo que aconteceu na amostra america-na, onde se verificaram diferençassignificativas quanto à dimensão coo-peração, os resultados obtidos com aamostra portuguesa não corroborarama existência de diferenças significati-vas em função da idade. Contudo énecessário ter em conta, que a amostraamericana abrangia um maior interva-lo de idades (dos 6 aos 12 anos) doque a amostra do presente estudo.

A validade de conteúdo do instru-mento foi igualmente apoiada por umpequeno estudo realizado junto de 20crianças. Quando questionadas sobreo significado de cada um dos diálo-gos, estas crianças responderam for-necendo bons exemplos de cada umdos tipos de apoio avaliados.

No seu conjunto os resultadosapoiam a fiabilidade da versão portu-guesa do My family and friends doinstrumento. O estudo de consistênciainterna, revelou bons níveis de fiabili-dade para todas as subescalas globais,com excepção da subescala do apoioinstrumental.

No entanto, os valores das subesca-las que discriminam simultaneamenteo tipo de apoio e a pessoa que o for-nece são mais variáveis. Tal como

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sucedeu para o estudo de validação doinstrumento original, são as escalas deapoio afectivo que apresentam umnível mais elevado de consistênciainterna. Tal pode acontecer por serprecisamente esta escala que apresen-ta um maior número de itens (cinco),sendo as restantes escalas apenasconstituídas por dois itens.

Por outro lado, são as escalas deapoio instrumental e companheirismoque apresentam menor consistênciainterna. No que diz respeito ao apoioinstrumental, os resultados encontradossão semelhantes aos resultados de vali-dação do instrumento original. Reid etal. (1989) explicam esta baixa consis-tência devido ao conteúdo dos dois diá-logos que avaliam este tipo de apoio.Um dos diálogos refere-se à ajuda quea criança recebe nos trabalhos da esco-la, ao passo que o outro diálogo se refe-re à ajuda que a criança recebe em casapara as tarefas que tem que realizar (ex.encontrar algo, arrumar os seus brin-quedos, etc.). Como é natural, algumaspessoas, nomeadamente as que nãocohabitam com a criança, que prestamgrande auxílio nos trabalhos da escola,não são as mesmas pessoas a quem acriança recorre quando necessita deajuda em casa.

No que concerne aos diálogos queavaliam o companheirismo, encontra-mos uma explicação dos resultadosencontrados na inspecção das respostasque as crianças deram às questões queprocuravam averiguar o entendimentoque as crianças tinham dos diálogos.

Assim, verificámos que, para a maioriadas crianças, o diálogo que questionacom quem é que a criança sai e faz coi-sas divertidas (Diálogo 3) é entendidopelas crianças como o apoio que rece-bem nas actividades subjacentes àdimensão companheirismo. Pelo con-trário, o diálogo que questiona a crian-ça a quem é que ela recorre quando sequer sentir feliz (Diálogo 9) é associa-do, por algumas crianças, a um apoiomais de natureza afectiva

Os resultados relativos à consistên-cia entre o teste e o reteste das dife-rentes subescalas sugerem uma boaestabilidade temporal. Apenas quatrodos trinta e cinco coeficientes tradu-zem uma concordância pobre sendoeles: Escala de Apoio Informativo doAmigo, Escala de Conflito com oAmigo, Escala do Apoio Instrumentaldo Professor e Escala de Conflito como Professor. As escalas que apresen-tam níveis mais elevados de fiabilida-de são as que dizem respeito ao apoioprestado por membros da família.Uma hipótese explicativa destesresultados prende-se com o facto doapoio percebido de elementos nãofamiliares (amigos e professores)poder ser mais vulnerável a flutuaçõ-es temporais. Para poder averiguar seos níveis mais baixos de acordo entreo teste e o reteste se devem a verda-deiras flutuações temporais no apoiosocial ou a problemas nos instrumen-tos de avaliação Wolchik et al. (1988)recomendam intervalos de tempomais curtos (2 a 3 dias).

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Comparativamente ao estudo daestabilidade temporal do instrumentooriginal, não podemos avaliar as dife-renças entre a versão portuguesa e aamericana, porque no estudo de Reidet al. (1989) não são fornecidos osdados para cada uma das escalas.

Um último aspecto fundamentalpara a validação do questionário para apopulação portuguesa é o de conhecerse as crianças portuguesas, à semel-hança das crianças americanas destafaixa etária, conseguem diferenciar osdiferentes tipos de apoio social e asdiferentes figuras que o fornecem.

Os resultados obtidos quanto àsatisfação com os quatro tipos deapoio fornecidos pela mãe, pai,irmãos, amigos, familiares e profes-sor, sugerem que as crianças destafaixa etária percepcionam diferentesperfis de apoio em função da figuraconsiderada. Estes dados apoiam apertinência de ambos os modelos fun-cional2 e estrutural/relacional3 na ava-liação do apoio social em crianças.

Comparando o perfil de apoio decada uma das figuras consideradas,observa-se que os progenitores fun-cionam como figuras de apoio maisgeneralizado, i.e., a satisfação com o

apoio recebido dos progenitores é ele-vada em todas as categorias de apoioconsideradas. Por outro lado, as res-tantes relações são mais especializa-das relativamente ao tipo de apoio queprestam. Estes dados vão no sentidodos encontrados pelo estudo de vali-dação do instrumento original (Reidet al. 1989) e por outros estudos reali-zados com crianças de faixas etáriassemelhantes (Furman & Buhrmester,1985) e sugerem que na rede social decrianças co-existem figuras de apoiogeneralistas e especialistas. Os gene-ralistas são figuras chave, que forne-cem diferentes tipos de apoio, aopasso que os especialistas oferecemum tipo de apoio mais restrito (Cauce,Reid, Landesman, & Gonzales, 1990).

No que diz respeito ao conflito per-cebido, no sentido do encontrado poroutros estudos (Furman &Buhrmester, 1985), as crianças glo-balmente percebem um conflitomoderado com os irmãos e reduzidocom as outras figuras de apoio.Furman & Buhrmester (1985) a estepropósito referem que as normassociais proíbem o conflito de criançascom adultos e que em relação às ami-zades, o conflito ocorre com pouca

2. No modelo funcional o tipo ou conteúdo do apoio trocado (ex. apoio instrumental, apoio afectivo) éconsiderado como mais importante. O estudo do apoio social na fase adulta centra-se, em grande parte,nas características funcionais das redes de apoio social (Cauce et al., 1990; Wolchik, et al., 1988).3. No modelo estrutural ou relacional é dado um maior relevo à figura de apoio social. Na literatu-ra do apoio social na infância este é o modelo mais adoptado (Cauce et al., 1990). Na infância e ado-lescência alguns trabalhos têm apoiado a supremacia do modelo da Fonte de Apoio sobre o modeloFuncional (Wolchik, et al., 1988); e outros validado a utilização de ambos os modelos (Cauce et al.,1990; Reid et al. 1989).

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frequência porque essas relaçõesestão sujeitas à dissolução nos casosem que o conflito é elevado.

Quanto às diferenças de género, ascrianças do sexo feminino parecemestar mais satisfeitas do que as criançasdo sexo masculino em relação ao apoioinformativo e instrumental prestadopela mãe e quanto à satisfação com oapoio afectivo prestado pelos amigos.Outros estudos (East & Rook, 1992;Furman & Buhrmester, 1985) repor-tam igualmente uma maior intimidade,afecto e satisfação percebida pelasraparigas nas relações de amizade.

Relativamente ao conflito, os rapa-zes apresentam globalmente maioresníveis de conflito que as raparigas,sendo essas diferenças significativasrelativamente ao conflito percebidocom o pai, a mãe e o professor.

Em conclusão, o My family and

friends parece ser um instrumentoválido para a avaliação multidimen-sional do apoio social em crianças. Osresultados referentes à adesão dacriança à entrevista de avaliação, àfiabilidade (consistência interna eteste-reteste) e validade de conteúdosugerem a adequação da versão portu-guesa do instrumento para a avaliaçãoda percepção do apoio social emcrianças em idade escolar.

O processo de validação deste ins-trumento deve ser aprofundado eminvestigações posteriores, sendonecessário averiguar nomeadamente aadequação da versão portuguesa doMy family and friends a outras faixasetárias. Consideramos igualmenteimportante futuramente averiguar aassociação entre os resultados forne-cidos por este instrumento e o ajusta-mento emocional das crianças.

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Agradecimentos

A primeira autora contou com uma bolsa de doutoramento concedida pelaFundação para a Ciência e Tecnologia para a elaboração deste trabalho. À DrªMolly Reid agradecemos a disponibilidade demonstrada ao longo de todo pro-cesso do desenvolvimento da versão portuguesa deste instrumento.Agradecemos a colaboração dos Drs. Maria João Pimentel, Patrícia Pascoal eMiguel Praça no processo de tradução e retroversão do instrumento.Agradecemos igualmente aos psicólogos e alunos finalistas da Faculdade dePsicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Coimbra e da EscolaSuperior de Educação João de Deus pela sua colaboração nas entrevistas reali-zadas às crianças.