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1 VI Congreso ALAP Dinámica de población y desarrollo sostenible con equidad Pobreza e mobilidade de renda nas regiões metropolitanas brasileiras Lilia Montali; Luiz Henrique Lessa Etapa 3

VI Congreso ALAP - alapop.org · 1 Segundo relatório da ONU de 2010, o Brasil apresenta o terceiro pior índice de desigualdade (0,56), ... Além de ser mais elevada do que aquela

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VI Congreso ALAP Dinámica de población y desarrollo sostenible

con equidad

Pobreza e mobilidade de renda nas regiões metropolitanas brasileiras Lilia Montali; Luiz Henrique Lessa

Etapa 3

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Sesion 5.3 – Pobreza y Vulnerabilidad Social: aproximaciones conceptuales y medición en la última década en América Latina

Pobreza e mobilidade de renda nas regiões metropolitanas brasileiras

Lilia Montali; Luiz Henrique Lessa

Resumo

A questão da pobreza tem sido um dos principais temas na agenda pública da política brasileira e integra compromisso do governo brasileiro com as Metas do Milênio (PNUD ONU, 2000). A pobreza aqui entendida como resultante de carências múltiplas vem se reduzindo enquanto resultado de um conjunto de políticas sociais. Dentre estas merece destaque a política de recuperação do salário mínimo e a politica de transferência condicionada de renda, que abrange um conjunto de ações através do Programa Brasil Sem Miséria.

O objeto desta proposta é interrogar se a mobilidade de renda observada a partir de 2004 (período que em se inicia a retomada do crescimento econômico no país e também a ampliação e aperfeiçoamento das políticas de combate à pobreza) é acompanhada de melhora em algumas das dimensões que possibilitam a elevação da condição de vida da população nas regiões metropolitanas e de mudanças que permitam a discussão de mobilidade social.

A análise tem por foco as regiões metropolitanas brasileiras e privilegia como eixos o nível educacional e as formas de inserção no mercado de trabalho, bem como indicadores de qualificação profissional. Constata que entre 2004 e 2009 há uma mobilidade de renda - considerando-se os decís de renda per capita domiciliar - quando parcelas da população metropolitana se desloca dos dois primeiros decís para os subsequentes. A investigação será ampliada até os anos mais recentes e se baseia nos microdados da série PNAD-IBGE 2001-2012.

Observação: Caso aprovada esta versão será substituída.

Introdução

A pobreza e a permanência de elevados índices de desigualdade social têm se mostrado como temas relevantes da agenda pública da política brasileira na última década. Em 2000 o Brasil aderiu às Metas do Milênio (PNUD ONU, 2000), juntamente com os demais 190 países membros da ONU, documento este que estabelece medidas e metas que deverão ser atingidas até 2015 para se reduzir a extrema pobreza e a fome, promover a igualdade entre os sexos, além de erradicar doenças que matam milhões, entre outros.

Trabajo presentado en el VI Congreso de la Asociación Latinoamericana de Población, realizado en Lima-Perú, del 12 al 15 de agosto de 2014. Pesquisadora do Núcleo de Estudos de Políticas Públicas da UNICAMP e Pesquisadora do CNPq, [email protected] Pesquisador do Núcleo de Estudos de Políticas Públicas da UNICAMP, [email protected]

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A pobreza entendida como resultante de carências múltiplas vem se reduzindo enquanto resultado de um conjunto de políticas sociais, a desigualdade também apresenta tendência declinante, ainda que se mantenha em níveis elevados1. Estudos mostram que nas últimas quatro décadas alterou-se o perfil da pobreza, considerando-se os locais de residência.

Dentre as politicas sociais recentes com maior impacto sobre a redução da pobreza e da desigualdades na primeira década do século XXI, merecem destaque as política de recuperação do salário mínimo, as medidas para a recuperação do emprego e a politica de transferência condicionada de renda, que abrange um conjunto de ações através do Programa Brasil Sem Miséria.

Indaga-se neste ensaio se a mobilidade de renda observada a partir de 2004 - período que em se inicia a retomada do crescimento econômico no país e também a ampliação e aperfeiçoamento das políticas de combate à pobreza -, é acompanhada de melhora em algumas das dimensões que possibilitam a elevação da condição de vida da população nas regiões metropolitanas e de mudanças que permitam a discussão de mobilidade social.

A análise tem por foco as regiões metropolitanas brasileiras e privilegia como eixos o nível educacional e as formas de inserção no mercado de trabalho, bem como indicadores de qualificação profissional. Na versão final deste ensaio a análise será ampliada até os anos mais recentes, utilizando a série PNAD-IBGE 2001-2012.

As regiões metropolitanas brasileiras se apresentam como espaços importantes para o estudo da problemática envolvida no comportamento da pobreza e da desigualdade de renda. Porque, por um lado, agregam as principais aglomerações urbanas do país e por serem também responsáveis por cerca de 40% do PIB nacional. Por outro lado, pela permanência da elevada proporção de pobres nessas regiões (Rocha, 2003; 2010; 2013) e pela desigualdade de renda que, embora em queda, é superior à nacional. Deve-se ressaltar, entretanto, que as regiões metropolitanas brasileiras (RMs) evidenciam as mesmas tendências apontadas para o Brasil na literatura com relação às tendências de redução da desigualdade de renda a partir de 2004, que resultam da elevação da renda domiciliar per capita e do crescimento mais acentuado do rendimento médio dos domicílios nos decís inferiores de renda.

Este ensaio é composto por três partes. Na primeira parte são apresentadas a regiões metropolitanas brasileiras, a heterogeneidade das mesmas e justificada a escolha do agregado de regiões metropolitanas do Sul e do Nordeste, por apresentarem situações contrastantes em relação à renda domiciliar per capita. Na segunda parte, são indicadas as principais políticas sociais responsáveis pela redução da pobreza na primeira década dos anos 2000. Na última parte, é apresentada a análise comparativa dos dados da PNAD relativos ao período de 2001-2009 com o intuito de identificar as características atuais da pobreza no Brasil, considerando como indicadores a renda, o vínculo contratual de trabalho e o nível educacional.

1. Desigualdade de renda nas metrópoles brasileiras

A análise da primeira década do século XXI evidencia com mais clareza, a partir de 2004, níveis mais elevados de desigualdade de renda para as regiões metropolitanas quando comparados aos do país, tendo por referência o Índice de Gini (Gráfico 1 e Tabela 1). 1 Segundo relatório da ONU de 2010, o Brasil apresenta o terceiro pior índice de desigualdade (0,56), ficando atrás apenas de países menores e menos ricos como Bolívia, Madagascar e Camarões (0,60), seguidos de Haiti, África do Sul e Tailândia com 0,5.

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Considerando-se um período mais longo, entre 2001 e 2009, a queda da desigualdade de renda foi da ordem de 9% para o país, enquanto para o conjunto das regiões metropolitanas brasileiras a queda foi de 7,6%.

Gráfico 1 Índice de Gini – Rendimento Domiciliar per capita Brasil e total das regiões metropolitanas, 2001-2009

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2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009

Brasil Total Metropolitano (1) Fonte: IBGE – Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, 2001-2009. Microdados reponderados até 2007. Elaboração dos autores. NEPP/UNICAMP. (1) O Total Metropolitano inclui as nove regiões metropolitanas.

Tabela 1

Índice de Gini – Rendimento Domiciliar per capita Brasil e Regiões Metropolitanas, 2001-2009

2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009

Regiões Metropolitanas (1) 0,598 0,596 0,586 0,578 0,580 0,566 0,561 0,557 0,552

Brasil 0,600 0,594 0,586 0,576 0,572 0,564 0,557 0,548 0,545 Fonte: IBGE – Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, 2001-2009. Microdados reponderados até 2007. Elaboração dos autores. NEPP/UNICAMP. (1) O Total Metropolitano inclui as nove regiões metropolitanas.

Com relação à proporção de pobres na população das regiões metropolitanas Rocha mostra que entre 2004 e 2008 a proporção de pobres cai de forma sustentada em todas as áreas de residência por ela analisadas, quais sejam, metropolitana, urbana e rural. Entretanto, é menor a queda no estrato metropolitano, que se mantém apresentando a maior proporção de pobres em sua população, ou seja, esta passa de 38,8% em 2004 para cerca de 27% em 2008, enquanto na população brasileira essa proporção cai de 33,3% para 22,8% (Rocha, 2010)2. Entretanto, a autora alerta para a heterogeneidade das regiões metropolitanas brasileiras e para seu comportamento na recente retomada do crescimento econômico.

2 Segundo Rocha (2010), a evolução da proporção de pobres entre 2004 e 2008 para a população brasileira é de 33,3 para 22,8; para as áreas metropolitanas cai de 38,8% para 27,1%; para as urbanas: de 29,6% para 19,9%; para as rurais cai de 35,4% para 24,3% (Tabela 1).

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Retomando uma análise de longo prazo feita por Rocha (2013), a Autora mostra que entre 1970 e 2011 ocorre tendência de redução do número absoluto de pobres e de redução sustentada da pobreza como tendência desde 1997 até o final do período. Mostra ainda que o perfil da pobreza mudou deixando de ser predominantemente rural para se tornar mais elevada nas áreas metropolitana e urbana. Aponta também para a convergência da proporção de pobres segundo os locais de residência. Durante esse período se dá a redução da pobreza rural provocada por diversos fatores, desde mudanças no processo produtivo, como medidas de políticas públicas, com destaque para a ampliação da previdência rural. Por outro lado, observa-se o aumento da pobreza metropolitana a partir das décadas de 80 e 90, períodos de baixo crescimento econômico e migração em direção às regiões metropolitanas da região Sudeste (São Paulo e Rio de Janeiro), segundo esta, os momentos de crise econômica destas duas décadas de baixo crescimento afetaram de forma mais aguda as metrópoles primazes de São Paulo e Rio de Janeiro. Segundo a Autora (Rocha, 2013) ocorre nesse período a “metropolização da pobreza”, quando a proporção de pobres passa de 29% em 1981, para 32% em 1993 (Gráfico 2).

Gráfico 2 Proporção de pobres segundo estrato de residência (%)

Brasil - 1970- 2010

Fonte: PNAD, elaboração de Rocha, apud Rocha, 2013.

Outra especificidade das regiões metropolitanas que ainda merece destaque é a renda per capita domiciliar mais elevada em comparação com a das áreas não metropolitanas e à do país (Gráfico 3). Além de ser mais elevada do que aquela das áreas não metropolitanas, a evolução da renda domiciliar per capita metropolitana revela as oscilações mais acentuadas de queda durante o período de baixo crescimento da economia e de empobrecimento experimentadas a partir dos anos 90 acentuadas pela reestruturação produtiva, apresentando os menores valores em 2003; bem como de elevação mais rápida nos anos recentes de recuperação, a partir de 2004. Deve-se lembrar que as áreas metropolitanas brasileiras foram afetadas com mais intensidade pelo processo de reestruturação produtiva e organizacional do que as áreas urbanas não metropolitanas e áreas rurais. Esse processo que se intensifica a partir de 1990 no país, atuou de forma diferenciada entre as regiões metropolitanas, relacionada à organização

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das atividades econômicas em cada uma delas. Associada ao baixo ritmo de crescimento da economia, a reestruturação produtiva elevou o patamar de desemprego e implicou em crescente precarização das relações de trabalho com redução do assalariamento regulamentado e aumento de vinculações menos protegidas, como trabalho autônomo e assalariamento sem registro, dentre outras formas. Nesse período se acentuou o empobrecimento nessas regiões. A partir de 2004 inicia-se a recuperação econômica, ampliam-se o emprego e as contratações regulamentadas, embora não correspondam a esse movimento acréscimos equivalentes nos rendimentos dos ocupados e nos rendimentos familiares (Montali, 2008).

Gráfico 3 Rendimento domiciliar per capita médio

Brasil, Regiões Metropolitanas e Não Metropolitanas, 2001-2009

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Brasil Regiões Metropolitanas Regiões Não Metropolitanas Fonte: IBGE – Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, 2001-2009. Microdados reponderados até 2007. Elaboração dos autores. NEPP/UNICAMP. Valores atualizados para 2009 (INPC). (1) O Total Metropolitano inclui as nove regiões metropolitanas.

A heterogeneidade entre as regiões metropolitanas – nestas incluindo o Distrito Federal – se evidencia também no que se refere aos valores do rendimento domiciliar per capita. Assim, são observados distintos valores médio e mediano do rendimento domiciliar per capita. Considerando inicialmente o valor mediano, que indica um corte abaixo do qual estão 50% dos domicílios de uma região, constata-se que, no ano de 2009, o valor mediano do Brasil coincide com o valor do salário mínimo vigente, R$ 465,00.

A grande heterogeneidade existente entre as regiões metropolitanas brasileiras se revela no fato de no extremo superior estarem o Distrito Federal, a região Metropolitana de São Paulo com valores medianos da ordem de 1,4 e 1,3 salários mínimos, respectivamente; e as regiões metropolitanas do Sul: RM de Curitiba com valores medianos da ordem de 1,4 salários mínimos e Porto Alegre com valores medianos cerca de 1,3 salários mínimos, seguidos das demais RM da região Sudeste, com valores acima de 1 salário mínimo de 2009. Por outro lado, o valor mediano mostra para as regiões metropolitanas do Norte e do Nordeste que metade ou mais dos domicílios têm renda domiciliar per capita bastante abaixo do salário mínimo de 2009, situação pior do que a observada para a média dos domicílios situados nas áreas não metropolitanas, que inclui espaços urbanos e rurais (Tabela 2).

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Tabela 2 Rendimento domiciliar per capita mediano e médio

Brasil e Regiões Metropolitanas, 2001-2009 V a lo r M e d ia n o V a lo r M é d io2 0 0 1 2 0 0 6 2 0 0 9 2 0 0 1 2 0 0 6 2 0 0 9

B r a s i l 3 1 0 , 0 4 1 0 , 2 4 6 5 , 0 6 3 8 , 4 7 0 2 , 7 7 6 6 , 1T o t a l M e t r o p o l i t a n o 4 3 0 , 6 4 7 4 , 6 6 7 5 , 0 8 8 1 , 0 9 3 0 , 2 9 9 5 , 7R M B e lé m 2 5 8 , 4 3 1 2 , 5 3 5 1 , 7 5 3 1 , 0 5 7 3 , 1 5 9 9 , 7R M F o r t a l e z a 2 4 0 , 4 2 7 9 , 3 3 3 6 , 6 5 5 1 , 4 5 2 5 , 0 6 3 5 , 0R M R e c i fe 2 5 6 , 2 2 9 3 , 0 3 5 5 , 0 5 7 4 , 1 6 1 2 , 8 6 6 4 , 7R M S a l va d o r 2 8 4 , 2 3 5 1 , 6 4 2 3 , 8 6 6 3 , 2 6 6 2 , 9 8 1 4 , 2R M B e lo H o r i z o n t e 3 7 0 , 3 4 6 8 , 8 5 3 9 , 2 7 3 0 , 8 8 9 0 , 0 1 0 0 3 , 9R M R io d e J a n e i r o 4 7 3 , 7 5 2 4 , 4 5 7 2 , 0 9 3 8 , 7 1 0 0 2 , 9 1 1 0 5 , 1R M S ã o P a u lo 5 1 3 , 8 5 7 1 , 3 6 0 0 , 0 9 8 1 , 1 1 0 1 0 , 1 1 0 0 7 , 9R M C u r i t ib a 4 6 1 , 6 5 2 7 , 4 6 6 3 , 0 9 1 8 , 2 9 3 1 , 1 1 1 0 2 , 1R M P o r t o A le g r e 5 1 6 , 7 5 7 7 , 2 6 1 9 , 0 1 0 0 2 , 7 1 0 3 8 , 4 1 0 4 0 , 1D i s t r i t o F e d e r a l 5 1 6 , 7 6 3 5 , 8 6 6 6 , 7 1 2 2 2 , 4 1 4 7 6 , 4 1 6 7 8 , 8T o t a l N ã o M e t ro p o l i t a n o 2 8 7 , 1 3 5 6 , 3 4 3 0 , 0 5 2 3 , 0 5 9 6 , 5 6 6 1 , 1

Fonte IBGE – Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios. Elaboração: NEPP/UNICAMP. Em valores de 2009.

A heterogeneidade existente entre as Regiões Metropolitanas é reafirmada quando se analisa a renda domiciliar per capita média. O Distrito Federal é o território com maior renda domiciliar per capita média, no valor de R$ 1.678,80 em 2009. Em segundo lugar, aparece a RM do Rio de Janeiro, com o valor médio de R$ 1.105,10 no mesmo ano. Cabe destacar que este valor apurado para a RM do Rio de Janeiro em 2009 é inferior ao valor apurado para o Distrito Federal em 2001 (R$ 1.222,40 em valores atualizados para reais de 2009). Ou seja, a renda domiciliar per capita do DF está bastante acima das rendas domiciliares per capita das demais regiões estudadas (Tabela 2). Além do Distrito Federal, podemos considerar que as RMs do Sudeste e do Sul são as que apresentam maiores valores médios, sempre acima de R$ 1.000,00. Por outro lado, as RMs do Norte e Nordeste apresentam os menores, variando entre R$ 500 e um teto de R$ 820.

Estas disparidades de renda definiram a escolha deste ensaio em detalhar a análise para dois conjuntos correspondendo às regiões metropolitanas do Sul (Curitiba e Porto Alegre) dentre os níveis mais elevados de rendimento domiciliar per capita e às regiões metropolitanas do Nordeste (Fortaleza, Recife, Salvador).

2. Elementos que atuam na diminuição da desigualdade de renda: Salário Mínimo e as politicas sociais de transferência de renda. A importância do Salário Mínimo

Na primeira parte deste item são apresentados alguns aspectos do debate sobre a importância do Salário Mínimo como uma política pública capaz de mitigar a desigualdade de renda no país3.

O salário mínimo foi criado no período do Estado Novo e foi um dos direitos trabalhistas estabelecidos pela Consolidação das Leis do Trabalho. Ele é definido, na legislação, como:

A contraprestação mínima devida e paga diretamente pelo empregador a todo trabalhador, inclusive ao trabalhador rural, sem distinção de sexo, por dia normal de serviço, e capaz de 3 A discussão sobre a evolução do Salário Mínimo se baseia em MONTALI, e outros; Relatório Final Desigualdade e Pobreza nas Famílias Metropolitanas: diagnóstico e recomendações para a redução das desigualdades (2011).

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Gráfico 2Valor real do salário mínimo, mensal, 1940 - Junho/2012

satisfazer, em determinada época e região do País, as suas necessidades normais de alimentação, habitação, vestuário, higiene e transporte4. (Brasil, Lei nº 5.452, 1 de maio de 1943). Uma vez implementado, o salário mínimo visou fixar um custo mínimo para a reprodução da força de trabalho brasileira.

No início, o valor do salário mínimo era decidido por uma Comissão de Salário definida pelo Governo federal em cada região e que era responsável por estipular seu respectivo valor de acordo com as respectivas especificidades locais. Após 1984, ele passa a ter apenas um único valor nacional. Há muitas controvérsias sobre o estabelecimento do salário mínimo no Brasil, principalmente quanto a seu peso específico como regulador do preço da força de trabalho no processo de transição entre uma economia agrário-exportadora e o início da predominância de uma estrutura produtiva de base urbano-industrial. Para muitas interpretações, tais como a do cepalino Ignácio Rangel, o salário mínimo fora fixado “artificialmente” pelo Estado a um valor acima do que se poderia obter numa barganha realizada num “mercado livre” entre capitalistas e trabalhadores5.

Fonte: IPEADATA. Apud, Montali e outros, 2012.

4 http://www.planalto.gov/ccivil_03/Decreto-Lei/Del5452.htm Acesso em julho de 2012. 5 “... graças a isso (à legislação trabalhista) o padrão salarial tornou-se relativamente independente das condições criadas pela presença de um enorme exército industrial de reserva...” Ignácio Rangel, A inflação brasileira, Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro, 1963, p.44-5 Apud: (OLIVEIRA, 2003, p. 36)

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Desde a criação do salário mínimo é possível identificar cinco momentos que refletem as principais mudanças no seu valor real, como mostra o Gráfico 4 (Montali, L e outros, 2012). No período que vai da criação do salário mínimo em 1940 até início dos 50, não há novos reajustes, o que leva a uma queda do seu valor. Num segundo momento, há uma tendência de crescimento que vai até o Golpe Militar de 1964. A partir de então, ele sofre uma queda acentuada, mas que se estabiliza em 67 e que dura até a crise econômica do início dos anos 80. Durante esta década, a inflação corrói ainda mais seu valor real, que só volta a crescer a partir de 1995, devido à estabilidade da moeda e à redução da inflação, obtida a partir do plano Real e por diversas políticas de estabilização subsequentes a este.

O salário mínimo enquanto direito trabalhista de fixação dos salários foi tema de debate na literatura acadêmica que questionava a sua incapacidade de estabelecer um mínimo salarial no mercado. Tais críticas refletiam a não concordância da ortodoxia econômica liberal em relação à intervenção estatal nos negócios privados. Alguns economistas, como Macedo e Garcia (1978, 1980) destacam o fato de que a queda do valor real do salário mínimo foi acompanhada por uma progressiva diminuição da proporção de trabalhadores que tinham seus salários embasados no seu valor corrente – uma forte evidência que demonstraria a perda de referência desse mecanismo de regulação enquanto política pública eficaz na regulação do mercado e no combate a pobreza. No entanto, é importante destacar que a fixação de um salário mínimo tem impacto na economia como um todo e que reside, justamente, no seu “efeito farol”, que é a sua capacidade de orientar a variação do leque salarial, que se torna menos amplo (BALTAR e SOUZA, 1979).

De acordo com as críticas realizadas pelos economistas desenvolvimentistas no período militar, sob a influência do pensamento Cepalino, a superação da pobreza no Brasil só seria possível num contexto de crescimento sustentado e com o aprofundamento da industrialização, o que levaria a um aumento generalizado dos níveis de renda dos diversos estratos, dos quais os inferiores deveriam obter ganhos mais elevados que os obtidos pelos estratos de renda superiores (o que não ocorreu). Estes autores tais como Celso Furtado, Raul Prebisch e Aníbal Pinto evidenciavam que o rebaixamento do salário mínimo e a repressão salarial, via mercado, privilegiaram apenas os ocupados de rendimentos médio e alto, o que levou a um padrão de acumulação e de consumo viabilizado pela política econômica e social dos governos militares após 1964. Este padrão de acumulação imensamente desigual foi intencionalmente estruturado no Brasil com o objetivo de incentivar o desenvolvimento industrial e aquecer a economia para desenvolver o país.

A atual política de valorização do salário mínimo estabelecida pelo governo federal, respondeu a reinvindicação de movimento articulado em 2004 pelas Centrais Sindicais, que visava fortalecer a opinião dos poderes Executivo e Legislativo acerca da importância social e econômica da proposta de valorização do salário mínimo. Também como resultado dessas negociações, foi acordado uma política permanente de valorização do salário mínimo até 2023. Segundo nota do Dieese6 (Dieese, 2010), o salário mínimo teve um aumento real de 53,7% durante o governo Lula (abril de 2003 a janeiro de 2010) e cerca de 46,1 milhões de pessoas tem rendimentos referenciados no salário mínimo. Apenas isso já bastaria para justificar a importância e valorização de sua manutenção enquanto política pública de regulamentação do mercado, mesmo que aproximadamente metade dos trabalhadores brasileiros se encontre na informalidade. As análises do IPEA indicam que as famílias que 6 Nota técnica DIEESE. Política de valorização do salário mínimo: considerações sobre o valor a vigorar a partir de 1º de Janeiro de 2010. Número 28. (São Paulo, 2010).

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tiveram uma mudança efetiva de sua condição de extrema pobreza ou pobreza foram aquelas que tiveram dentre seus membros, alguém que conseguiu um emprego regulamentado neste período ou que tinham algum familiar que recebesse o BPC no valor de um salário mínimo (IPEA, 2007).

Os programas de transferência de renda e o objetivo de erradicação da pobreza Na década de noventa, o processo de globalização da economia mundial é impulsionado pelas mudanças internacionais e, no caso dos países latino-americanos a aplicação do programa político formulado pelo consenso de Washington, cujos princípios deveriam ser adotados pelas economias da América Latina para a adequação aos novos padrões competitivos internacionais. As reformas estabelecidas produziram um empobrecimento massivo dos trabalhadores assalariados, aumento do desemprego, precarização das relações trabalhistas e uma reestruturação produtiva que modificou a economia brasileira, assentada até então sob um caráter nacional-desenvolvimentista. Este movimento de transformação econômica produziu efeitos perversos sobre as conquistas dos direitos sociais estabelecidos e garantidos pela constituição de 1988. Segundo Anete B. L. Ivo (2011), o caminho encontrado pelos governantes foi uma tendência de restrição dos custos da “seguridade social de perspectiva universalista e inclusiva para a assistência focalizada sobre aqueles em situação de pobreza e pobreza extrema, com base na gestão dos mínimos sociais”. Nesse contexto, surgem no Brasil diversos programas de auxílio focalizados nos setores mais vulneráveis da população, tanto a nível federal, como o BPC (Benefício de Prestação Continuada) e o PETI (Programa de erradicação do trabalho infantil) em 1996, quanto a nível municipal, como o Renda Mínima, implementados em Campinas, Brasília e Ribeirão Preto em 1995. Em 2003, foi criado o Programa Bolsa-Família, o que representou um esforço do governo federal em unificar, integrar e ampliar a experiência dos programas sociais anteriores, através de um cadastro único dos beneficiários realizado pelas prefeituras dos municípios. A Constituição Brasileira de 1988 garantiu direitos universais à população, tais como o acesso à educação, à saúde, a um salário mínimo de sobrevivência para incapacitados (Benefício de Prestação Continuada), com a perspectiva de construir uma noção ampliada de cidadania que partisse de uma visão universalista e igualitária. As políticas voltadas à assistência social foram reconfiguradas pela Constituição devido a sua antiga matriz assistencialista e clientelista, e incluída no sistema de Seguridade Social, que permitiu um avanço no sentido de considerar os cidadãos em situação de pobreza como portadores de direitos e não mais como “clientes” dependentes de entidades filantrópicas privadas e paraestatais. “O novo padrão de política social teve como momento fundador a promulgação da Constituição de 1988, que representou uma redefinição do arranjo federativo brasileiro, por um lento e complexo processo de transferência de capacidade decisória, funções e recursos do governo federal para estados e municípios. As políticas de assistência e de combate à pobreza passaram a ser uma atribuição dos municípios, embora a superação da pobreza e a redução da desigualdade continuassem sendo atribuições das três esferas do governo (BICHIR, 2010, p. 117)”. Na opinião da autora, as políticas sociais no Brasil atravessavam um momento de renovação, diante do padrão de proteção existente no governo militar, caracterizado pela forte centralização, por processos fechados de decisão e pela ineficácia e iniquidade da distribuição de serviços e benefícios. No entanto, as contradições existentes entre as conquistas democráticas asseguradas pela Constituição e as transformações econômicas neoliberais transformaram as políticas sociais universalistas em assistência focalizada sobre aqueles em situação de pobreza e pobreza extrema.

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Na tentativa de mitigar as consequências da pobreza, se iniciaram os debates acerca da viabilidade de uma política de transferência monetária de renda aos mais pobres. Nesse âmbito, podem-se destacar as primeiras iniciativas, tais como a aprovação no Senado do projeto de lei para a criação do Programa de Garantia de Renda Mínima, proposto pelo senador Eduardo Suplicy. Por ocasião da aprovação do projeto, houve uma intensa discussão sobre os objetivos e definições que norteariam as políticas de transferência de renda no país. Inicialmente proposto por Suplicy, o Programa de Garantia de Renda Mínima seria focado no atendimento aos idosos, no entanto as discussões destacaram a necessidade da vinculação entre família e educação no combate a pobreza brasileira. O programa Bolsa-Escola implementado no Distrito Federal pelo governo de Cristovam Buarque e o programa de Garantia de Renda Mínima implantado em Campinas, ambos em 1995, podem ser considerados exemplos de programas pioneiros de transferência de renda pioneiros no sentido de que exigiam como condição para a participação das famílias a permanência de jovens e adolescentes na escola, tentando quebrar o ciclo da pobreza intergeracional. O sucesso dessas experiências levaram o governo federal a criar em 1997 o Programa Federal de Garantia de Renda Mínima que consistia no co-financiamento de até 50% dos programas instituídos nos municípios que não tivessem recursos suficientes. Por ter como critério de seleção os municípios que tivessem baixo IDH, ficava difícil conseguir municípios que tivessem capacidade e disposição de financiar a contrapartida exigida. Por isso, o governo federal criou em 2001 o Programa Nacional de Bolsa Escola (PNBE). Seu objetivo era “garantir que a totalidade da população de 7 a 14 anos tivesse acesso à escola, mediante a concessão de uma bolsa complementar, no valor de R$ 15,00 por criança até o limite máximo de três crianças por família (ou R$ 45). O cadastramento das famílias e das crianças era de responsabilidade das prefeituras municipais, que também se comprometiam a desenvolver atividades socioeducativas em horário complementar às aulas, sem receber qualquer repasse financeiro do Governo Federal. Para recebimento da bolsa, a criança deveria frequentar, respectivamente, 85% das aulas previstas e para o acompanhamento da gestão do programa nos municípios impôs-se a criação dos conselhos de controle social, que deveriam ser compostos por mais de 50% de membros pertencentes à sociedade civil. Uma inovação do programa em âmbito federal foi a criação do Cartão Bolsa Escola, ou seja, a partir de então a União passou a pagar diretamente às famílias o valor mensal da bolsa, pagamento esse feito à mãe das crianças participantes do programa e, no caso de sua ausência ou impedimento, ao responsável legal (Valente, 2003) (Apud: Montali e outros, 2012, p. 43). Além do Programa Bolsa Escola, no governo FHC foi criada uma rede de proteção social que inclua a previdência rural e diversos programas de assistência social, como o PETI (Programa de Erradicação do Trabalho Infantil, 1996), que era uma transferência monetária direta às famílias vinculadas à participação em atividades complementares à jornada escolar. Mas foi somente no governo Lula que a rede de assistência social herdada do governo FHC foi ampliada consideravelmente tanto em relação ao seu volume de gastos em programas de transferência de renda quanto ao número de beneficiários. Uma das principais iniciativas na área social no governo Lula foi o programa Fome Zero, amplo programa que previa a participação dos três níveis de governo e da sociedade civil no combate à pobreza. Em 2003 foi criado o Ministério de Desenvolvimento Social e combate à Fome (MDS) – e o Cartão-Alimentação do programa Fome Zero foi incorporado a um novo programa de transferência direta de renda, o Programa Bolsa-Família (PBF). Este programa unificou três programas que já existiam na gestão anterior, tais como o Bolsa-Escola, o Bolsa Alimentação e o Auxílio-Gás. Também procurou unificar as ações dos governos federal,

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estaduais e municipais em um único programa de transferência direta de renda por meio de convênios.

Os fundamentos inovadores do PBF em relação aos demais programas residem em quatro aspectos (Fonseca, Roquete, 2005, p.133): 1- a família como unidade básica receptora dos benefícios e do cumprimento das condicionalidades. 2- a inclusão prioritária dos membros das famílias em programas e políticas que permitam uma saída do programa. 3- a descentralização pactuada com os estados e municípios da federação. 4- o Cadastro Único dos programas Sociais como ferramenta de planejamento e controle dos cadastrados no programa.

O principal objetivo do programa reside na mitigação da pobreza, porém seus programas complementares, a exigência do cumprimento das condicionalidades e as ações focalizadas geram inúmeras consequências (Fonseca e Roquete, 2005, p.133): criação de possibilidades de emancipação sustentada dos grupos familiares; incentivo ao desenvolvimento local dos territórios; prioridade assegurada aos mais pobres; estabelecimento e busca do princípio de equidade; aumento da eficiência e a efetividade do uso dos recursos; unificação, ampliação e racionalização dos programas de transferência de renda e, finalmente, retiro dos incentivos para políticas setoriais de transferência de renda (como os antigos programas fundidos pelo Bolsa-família). Para além da análise da aplicação, racionalidade e eficácia dos recursos e da articulação entre as esferas do governo, o importante nesse trabalho é considerar a capacidade do programa em cumprir seu principal objetivo, que é criar a possibilidade de emancipação sustentada dos grupos familiares e assegurar as condições para uma vida digna às famílias beneficiárias do programa, entendendo-se como vida digna aquela que se caracteriza como não vulnerável aos riscos da fome, invalidez, doença, velhice, desemprego e exclusão social (por renda, gênero, etnia, etc).

Os estudos realizados a partir dos dados da PNAD mostram que o programa Bolsa-Família obteve sucesso quanto a sua capacidade de focalizar suas ações nos estratos mais vulneráveis da população brasileira. Desde a implementação do programa, em 2004, uma série de pesquisas tem registrado uma melhoria nas condições de vida dos setores mais pobres da população, com redução de desigualdades sociais e aumento de renda, embora inconclusivas na afirmação acerca da existência de uma tendência permanente de redução da pobreza no país. Segundo o informe do IPEA (IPEA, 2011), no período de 2004-2009, a pobreza e a extrema pobreza tornaram-se cada vez menos determinadas pelo baixo valor do rendimento per capita dos membros da família e cada vez mais determinados pela exclusão desses membros do mercado de trabalho, sugerindo que o Bolsa-família e demais programas, como o BPC, tem sua eficácia melhorada em associação com a renda oriunda do trabalho.

Nesse sentido, as políticas públicas que permitem a criação e incentivo de empregos regulamentados, tais como a qualificação profissional e o aumento do salário mínimo são fatores importantes para que se acelere a saída das famílias do programa, tornando-as emancipadas economicamente. Algumas iniciativas foram tentadas para perseguir esses objetivos, embora sem sucesso, como é o caso do programa Primeiro Emprego, que foi extinto pelo governo federal quatro anos depois de seu anúncio, sem nenhum resultado concreto. Segundo estudo de Sergei Soares “Distribuição de Renda no Brasil de 1976 a 2004” apontado pelo jornalista Marco Aurélio Weissheimer, em seu livro sobre o Bolsa-família, o programa foi responsável por um terço da queda na desigualdade no Brasil, logo no início de sua criação e impactou diretamente na melhoria da nutrição infantil e também, de modo indireto, na redução do trabalho infantil. “O Bolsa-família foi responsável por um terço da

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queda na desigualdade no Brasil entre os anos de 2001 e 2004. O mercado de trabalho teria sido o responsável pelos outros dois terços de queda na desigualdade, segundo estudo realizado pelo IPEA em 2006. De acordo com a pesquisa, a desigualdade caiu por ano em média 0,7 pontos percentuais do Índice de Gini” (Weissheimer, 2006).

Considerando que a pobreza é um fenômeno multidimensional, o governo Dilma lançou o programa Brasil sem miséria, que visa identificar e combater a extrema-pobreza no Brasil, cuja concentração é mais elevada principalmente nas áreas rurais do Norte e Nordeste. Este programa apresenta uma série de medidas que não considera exclusivamente o critério de transferência de renda como instrumento de combate a pobreza. Segundo informe do Ministério do Desenvolvimento Social (MDS, 2012, p.6), o programa visa retirar a população extremamente pobre de sua condição, rompendo o círculo vicioso da exclusão social, que segundo o Censo de 2010, era cerca de 16 milhões de pessoas: “A insuficiência de renda é um relevante indicador de privações, mas não é o único. Fatores sociais, geográficos e biológicos multiplicam ou reduzem o impacto exercido pelos rendimentos sobre cada indivíduo. Entre os mais desfavorecidos faltam instrução, acesso à terra e insumos para produção, saúde, moradia, justiça, apoio familiar e comunitário, crédito e acesso a oportunidades”. De acordo com o informe, o objetivo do Brasil Sem Miséria é promover a inclusão social e produtiva da população extremamente pobre, tornando residual o percentual dos que vivem abaixo da linha da pobreza e funciona na busca de três eixos específicos (MDS, 2012, p.2)7:1- Elevar a renda familiar per capita. 2- Ampliar o acesso aos serviços públicos, às ações de cidadania e de bem estar social. 3 - Ampliar o acesso às oportunidades de ocupação e renda através de ações de inclusão produtiva nos meios urbano e rural.

Por isso, é necessário levar em conta outros mecanismos além da simples transferência de renda que permitam uma diminuição da miséria e que ajam em conjunto com a mesma, uma vez que apenas a transferência de renda é insuficiente para promover uma estável seguridade social às famílias beneficiadas. Os dados mostram que as rendas das famílias continuam sujeitas a rotatividade dos empregos precários, aos choques econômicos e a sazonalidade da economia, mostrando que a renda familiar per capita dos inseridos no mercado de trabalho informal flutua continuamente, o que leva, portanto, a uma variação na dependência ou não das famílias ao programa, como aponta estudo do IPEA (2007, p.12). Em certos períodos, inclusive, é possível que alguns beneficiários tenham uma renda além dos limites de corte adotados para a concessão do benefício, mas que no momento da entrada no programa cumprissem integralmente com todos os critérios para a inclusão. Nesse sentido, o Brasil Sem Miséria incluiu a possibilidade de desligamento voluntário do programa com retorno garantido no prazo de 3 anos. Se a pessoa perde o emprego, ela pode retornar ao Bolsa-Família imediatamente.

3. Mobilidade de Renda no período de 2004 a 2009

A partir do período que se inicia em 2004 até 2009 (ano da crise financeira), o Brasil retoma um período de crescimento econômico, depois de um longo período de estagnação econômica, com aumento do emprego assalariado protegido pela legislação trabalhista. Este estudo pretende identificar quais foram os grupos que se encontravam em situação de vulnerabilidade e que tiveram um aumento na sua renda familiar per capita suficiente para deixarem de se situar entre os decis de renda mais baixos entre os anos de 2004 e 2009. Optou-se aqui por utilizar como recurso à análise a distribuição por decis de renda que 7 http://www.brasilsemmiseria.gov.br/documentos/Cartilha_20X20.pdf Acesso em agosto de 2012.

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consiste em dividir a renda per capita total em grupos que variam entre os dez por cento mais pobres até os dez por cento mais ricos, obtendo com isso uma escala de distribuição de renda com dez divisões. Para este trabalho, utilizou-se a renda per capita domiciliar fornecida pela PNAD como o critério de referência para investigar a mobilidade de renda, ainda que o objetivo desta análise seja identificar o perfil dos indivíduos que integram estes domicílios. A escolha de se trabalhar com as divisões por decis de renda difere da metodologia de linhas de pobreza adotadas por Sonia Rocha, mencionadas em item anterior. Mesmo considerando-se as limitações existentes por conta da diversidade regional, foram adotados neste ensaio os mesmos cortes de renda indicativos de pobreza utilizados na formulação das políticas públicas para identificar a gravidade da pobreza e a elegibilidade dos beneficiários. Assim, considera-se nesse estudo como extremamente-pobres ou indigentes aqueles indivíduos em domicílios com renda per capita inferior a ¼ do salário mínimo e como pobres aqueles com renda entre ¼ e ½ salário mínimo, deflacionado para os valores de 2009 (R$ 465 per capita).

São comparadas as informações relativas ao Nordeste metropolitano e o Sul metropolitano. Optou-se por comparar duas regiões com características contrastantes em relação aos níveis de pobreza, apresentadas no item 1. A partir da mudança observada no período 2004-2009 se constata que conforme há redução da incidência de pobreza (considerando-se a renda), mais caracterizada ela se torna em relação aos indicadores das demais carências.

Ainda que os dados relativos às áreas não metropolitanas do Sul e do Nordeste tenham sido processados, não foram utilizados na pesquisa devido às dificuldades para a análise comparativa decorrentes de suas especificidades econômicas e sociais, como o peso elevado das áreas rurais na composição das taxas. No entanto, merece ser ressaltado que, em relação às áreas não metropolitanas do nordeste, houve aumento de renda domiciliar per capita entre os decis inferiores, considerando-se os respectivos valores de corte, próximo à média nacional, que foi da ordem de 40% entre os anos de 2004 e 2009. Merece destaque, também, que no intervalo situado entre o 4º e 7º decis registrou-se um aumento na renda de cerca de 50%, portanto maior que a média nacional, que foi da ordem de 45%, considerada para o mesmo quinquênio. Este ganho é relevante, uma vez que o Nordeste Não metropolitano apresenta uma das maiores desigualdades de renda do Brasil, com 80% dos mais pobres em 2009 possuindo renda média de até no máximo a um salário mínimo para este ano.

3.1. Brasil – Indicadores de renda e pobreza

Através da análise dos valores de corte dos decís de renda per capita domiciliar do Brasil, é possível constatar indicações que as proporções mais elevadas de aumento do rendimento ocorridas entre 2004 e 2009 se encontram nos decis inferiores, com crescimento cerca de 40%, enquanto que nos decis de renda mais elevados, o aumento foi de 20%, mostrando que o crescimento econômico do país no período tendeu a beneficiar os mais pobres8.

8 Para uma discussão mais aprofundada acerca do crescimento pró-pobre que teria ocorrido no período, ver artigo publicado pelo Centro de Políticas Sociais da FGV em parceria com a International Poverty Centre (órgão da ONU), que define como pró-pobre o crescimento que atinge proporcionalmente os mais pobres do que não pobres. Assim, o crescimento pró-pobre diminui a desigualdade, enquanto o antipobre a aumenta.

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Gráfico 5

Valor dos decís de rendimento domiciliar per capita Brasil – 2001-2009

77 131

185

251

310

403

545

775

1.37

8

68.8

94

89 143

194

254

329

410

541

760

1.26

7

77.6

20

125

202

278

363

465

543

700

950

1.55

0

94.6

70

0

500

1.000

1.500

2.000

2.500

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

decis

Val

ores

em

rea

is (R

$)

2001 2004 2009 Fonte: PNAD Elaboração: NEPP/UNICAMP Valores deflacionados para 2009.

Os Gráficos 5 e 6 apresentam a distribuição segundo decis do rendimento per capita domiciliar para o total dos domicílios do Brasil e para o total dos domicílios das áreas metropolitanas brasileiras. pode-se notar os valores da renda média per capita inferior para áreas Não Metropolitanas em destaque principalmente nos decis inferiores, uma vez que para os decis mais elevados a diferença é pouco substancial. Pode-se notar que o valor de renda domiciliar per capita correspondente à pobreza (inferior a ½ salário mínimo – R$ 232 per capita para valores de 2009) estava localizada, em 2004, para as áreas metropolitanas entre os 30% mais pobres (3º decil) e para o total da população brasileira entre os 40% mais pobres (4º decil). Em 2009, ela se encontrava entre os 20% mais pobres nas áreas metropolitanas e entre os 30% mais pobres para o total da população brasileira (ambas com corte de R$250 per capita). A faixa de renda correspondente à extrema-pobreza (inferior a ¼ de SM – R$116 per capita) se situava no primeiro decil para as regiões metropolitanas tanto em 2004 quanto 2009, enquanto que nas áreas não metropolitanas esta se encontrava no 2º decil, ou, 20% mais pobres em 2004 e em 2009 se situava no 1º decil, ou, entre os 10% mais pobres. Ou seja, nos dois casos analisados (pobreza e extrema-pobreza para áreas metropolitanas brasileiras e para o total da população brasileira) observam-se indicações de recuperação da renda domiciliar per capita e redução dos níveis de pobreza registrados no Gráfico 3, com uma vantagem quantitativa para o total da população brasileira em relação à extrema-pobreza.

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Gráfico 6 Valor dos decís de rendimento domiciliar per capita (R$)

Brasil Metropolitano – 2001-2009

110

178

258

327

431

563

753

1.10

2

1.93

8

68.8

94

114

180

253

329

415

539

710

1.01

4

1.77

4

77.6

20

164

250

345

450

531

675

888

1.25

0

2.10

0

74.0

00

0

500

1.000

1.500

2.000

2.500

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

decis

Val

ores

em

rea

is (R

$)

2001 2004 2009

Fonte: PNAD Elaboração: NEPP/UNICAMP Valores deflacionados para 2009.

3.2. Nordeste Metropolitano

O crescimento econômico do Nordeste Metropolitano foi durante muito tempo influenciado pelas atividades agrícolas voltadas para à exportação. Com a decadência da economia nordestina ainda no século XIX, essas regiões que outrora foram o centro da economia colonial iniciaram um grande ciclo de decadência e do acúmulo de riqueza, passaram a concentrar pobreza. A industrialização ocorrida no eixo sudeste só atingiu a região muito mais tardiamente e esta sempre dependeu dos investimentos estatais para se desenvolver na região, através de incentivos fiscais e financeiros, como a SUDENE. “O crescimento urbano e industrial no século XX foi lento no Nordeste metropolitano por causa da ausência de excedente em forma de capital dinheiro que pudesse ser transformado em capital industrial, com escala suficiente para alavancar a economia regional. Nesse cenário, amplia-se o papel desenvolvimentista e assistencialista do Estado, que promove um mínimo de racionalidade econômica diante do quadro de escassez e de contrastes sociais” (FALVO, 2011, p. 122).

A industrialização incentivada pelo Estado e a descentralização da indústria do eixo Sudeste ocorrida nos anos recentes dinamizou a economia metropolitana Nordestina, “mas logrou quantidade de empregos líquidos inferior ao planejado, além da instalação de filiais do Centro e do Sul divergir dos interesses regionais. Por outro lado, o setor público transformou-se no gerador privilegiado de ocupações da classe média, motivado pelos gastos em infraestrutura, em políticas sociais (expansão de todos os níveis educacionais) e na expansão das autarquias e das empresas estatais. Porém, dinamizar a economia não foi suficiente para equacionar a desigualdade social nessas localidades, intensificada com a ampliação das atividades informais e do subemprego na década de 1990, ocupações de refúgio dos trabalhadores marginalizados na frágil estrutura produtiva” (FALVO, 2011, p. 125). Dessa forma, foi

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somente após os anos 2000 que a região metropolitana do Nordeste registra um aumento na renda dos mais pobres devido ao crescimento econômico gerador de empregos, em concomitância às políticas de transferência de renda focalizadas do governo, reduzindo-se a desigualdade de renda.

O Gráfico 7 apresenta a renda domiciliar per capita do Nordeste Metropolitano, cujos decis inferiores apresentam uma elevação da renda superior a 50%. A faixa correspondente aos 10% mais pobres (extrema pobreza, inferior a ¼ de salário mínimo – R$ 116) apresenta um ganho de renda de quase 60% no período. Esta tendência de aumento de até 50% permanece até o 5º decil e diminui para pouco mais de 40% no sexto, que é a faixa correspondente ao valor do salário mínimo em 2009. Em 2004, a faixa de renda correspondente ao valor do salário mínimo estava situada entre o 7º e 8º decis, sendo que em 2009, este valo se situava no 6º decil. A política de valorização do salário mínimo permitiu que aqueles que tinham a renda média igual a um salário mínimo deixassem de se situar entre o 7º e 8º decis, para se situarem no 6º decil, evidenciando um ganho de renda de quem recebia um salário mínimo em 2004 e que também orientou a renda dos decis inferiores para cima (“efeito farol”). A renda média dos 10% mais ricos, entretanto, foi a que registrou o maior crescimento no período, superando os 300%.

Gráfico 7

Valor dos decís de rendimento domiciliar per capita (R$) Regiões Metropolitanas do Nordeste – 2001-2009

69 107

155

199

258

327

448

689

1292

6889

4

72 110

151

190

249

329

422

634

1189

2154

4

115

170

233

299

374

465

584

833

1500

6500

0

0

500

1000

1500

2000

2500

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

decis

Val

ores

em

rea

is (R

$)

2001 2004 2009

Fonte: PNAD Elaboração: NEPP/UNICAMP Valores deflacionados para 2009.

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Tabela 3 Distribuição da PIA (pessoas) por situação ocupacional e condição na precariedade da ocupação

segundo decis do rendimento domiciliar per capita. Regiões Metropolitanas do Nordeste – 2001- 2009

1 0 % 2 0 % 3 0 % 4 0 % 5 0 %2 0 0 1O c u p a d o s n ã o p r e c á r i o s 2 ,9 9 ,0 1 1 ,3 1 5 ,6 1 9 ,1 2 9 ,3 9 1 9 ,2O c u p a d o s p r e c á r io s 1 9 ,3 2 3 , 3 2 7 ,6 2 7 ,4 2 9 ,1 2 4 ,5 8 2 5 ,0O c u p a d o s 2 2 ,2 3 2 , 3 3 8 ,9 4 3 ,1 4 8 ,2 5 3 ,9 7 4 4 ,2D e s e m p re g a d o s 1 5 ,3 9 ,3 8 ,5 7 ,5 7 ,4 4 ,3 3 7 ,3In a t iv o s 6 2 ,5 5 8 , 4 5 2 ,6 4 9 ,5 4 4 ,4 4 1 ,6 9 4 8 ,5T o t a l 1 0 0 ,0 1 0 0 ,0 1 0 0 , 0 1 0 0 ,0 1 0 0 ,0 1 0 0 ,0 1 0 0 ,02 0 0 4O c u p a d o s n ã o p r e c á r i o s 4 ,9 1 3 , 1 1 7 ,2 2 3 ,1 2 5 ,0 3 5 ,7 2 2 ,1O c u p a d o s p r e c á r io s 2 6 ,2 2 8 , 8 2 9 ,5 3 0 ,5 2 8 ,6 2 4 ,7 2 7 ,4O c u p a d o s 3 1 ,1 4 1 , 8 4 6 ,8 5 3 ,5 5 3 ,5 6 0 ,5 4 9 ,5D e s e m p re g a d o s 1 9 ,4 1 2 , 9 1 0 ,9 8 ,8 6 ,7 5 ,7 1 0 ,2In a t iv o s 4 9 ,5 4 5 , 3 4 2 ,3 3 7 ,7 3 9 ,7 3 3 ,8 4 0 ,3T o t a l 1 0 0 ,0 1 0 0 ,0 1 0 0 , 0 1 0 0 ,0 1 0 0 ,0 1 0 0 ,0 1 0 0 ,0

O c u p a d o s n ã o p r e c á r i o s 5 ,1 1 5 , 8 2 1 ,4 2 7 ,5 2 9 ,8 3 9 ,5 2 6 ,1O c u p a d o s p r e c á r io s 2 5 ,2 2 8 , 5 2 8 ,6 3 0 ,3 3 2 ,2 2 2 ,9 2 6 ,5O c u p a d o s 3 0 ,3 4 4 , 3 4 9 ,9 5 7 ,8 6 2 ,0 6 2 ,4 5 2 ,5D e s e m p re g a d o s 1 7 ,2 1 1 , 7 9 ,5 7 ,4 6 ,0 3 ,9 8 ,4In a t iv o s 5 2 ,4 4 4 , 0 4 0 ,5 3 4 ,9 3 2 ,0 3 3 ,7 3 9 ,0T o t a l 1 0 0 ,0 1 0 0 ,0 1 0 0 , 0 1 0 0 ,0 1 0 0 ,0 1 0 0 ,0 1 0 0 ,0

5 0 % m a is p o b r e s 5 0 % a c i m a d a m e d ia n a

2 0 0 9

T o t a l

Fonte: PNAD. Elaboração: NEPP/UNICAMP Excluídos da análise de domicílios: pensionistas, empregados domésticos residentes e parentes dos empregados domésticos.

A distribuição do perfil da PIA do Nordeste Metropolitano analisada segundo os decís de renda mostra: que, em 2004, o primeiro decil é composto de apenas 5% de ocupados não precários, 26% de ocupados precários e de quase 20% de desempregados, bem como uma proporção de inativos de quase 50%. Este quadro permanece o mesmo para 2009, sem diferenças substanciais. Comparando a PIA total do Nordeste Metropolitano com o perfil dos 10% mais pobres, estes exibem a maior proporção de desempregados e inativos, tanto para 2004 quanto para 2009 (Tabela 3).

A faixa correspondente ao valor do Salário Mínimo encontra-se no 7º decil do Nordeste Metropolitano em 2004 e no 6º decil em 2009, o que os situa na parte entre aqueles acima da mediana. Este grupo apresenta as melhores indicações de melhora em relação ao emprego, com um taxa de ocupados, desempregados e ocupados não precários bem acima da PIA total.

No período cresce a proporção de ocupados, porém os ganhos em relação ao total da PIA Metropolitana são bastante tímidos no período, com destaque para o aumento de ocupados não precários (4 p.p) e queda no número de desempregados (quase 2 p.p). Vale destacar que no período considerado, a situação só começa a melhorar a partir do 4º decil, quando os valores são significativamente melhores que a PIA total de 2009. Apesar das características da PIA terem se alterado pouco no período, houve uma melhora na qualidade das ocupações, ou seja, diminuição do emprego precário e aumento do não precário.

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Tabela 4 Escolaridade da população (a partir dos 10 anos de idade), segundo decis do rendimento

domiciliar per capita Regiões Metropolitanas do Nordeste - 2001-2009

10 % 20 % 30% 40% 5 0%20 01

A n alfa be to 2 0,6 1 6,5 14 ,4 12 ,6 11 ,4 6 ,17 1 1,4E n sino fund am e nta l inc o mp le to 6 7,5 6 9,1 66 ,2 63 ,3 57 ,6 4 0,1 4 5 4,6E n sino fund am e nta l co mp le to 3 ,0 2 ,9 3 ,7 4 ,3 5 ,8 3 ,71 3,8E n sino mé dio 8 ,6 1 1,2 15 ,2 19 ,2 24 ,1 3 3,5 2 2 3,0E n sino S upe rior 0 ,3 0 ,2 0 ,5 0 ,7 1 ,0 1 6,4 5 7,2T o ta l 10 0 10 0 10 0 100 100 10 0 1 00, 0

20 04A n alfa be to 1 4,9 1 1,6 9 ,8 8 ,9 6 ,4 3,7 9,8E n sino fund am e nta l inc o mp le to 6 7,5 6 1,0 53 ,4 48 ,7 41 ,5 2 8,8 5 1,5E n sino fund am e nta l co mp le to 3 ,4 4 ,4 4 ,9 4 ,8 5 ,5 2,8 3,9E n sino mé dio 1 3,8 2 2,1 29 ,8 34 ,2 39 ,7 3 5,0 2 6,3E n sino S upe rior 0 ,4 0 ,9 2 ,0 3 ,5 7 ,0 2 9,8 8,5T o ta l 10 0,0 10 0,0 10 0,0 10 0,0 10 0,0 1 00, 0 1 00, 0

A n alfa be to 1 2,5 1 0,8 8 ,8 7 ,7 5 ,6 4,8 8,0E n sino fund am e nta l inc o mp le to 6 5,3 5 6,4 52 ,4 45 ,9 42 ,9 2 8,7 4 5,7E n sino fund am e nta l co mp le to 4 ,1 5 ,5 5 ,3 6 ,0 5 ,3 3,7 4,7E n sino mé dio 1 7,3 2 6,1 31 ,0 35 ,9 38 ,7 3 5,0 3 0,4E n sino S upe rior 0 ,8 1 ,2 2 ,4 4 ,5 7 ,4 2 7,9 1 1,2T o ta l 10 0,0 10 0,0 10 0,0 10 0,0 10 0,0 1 00, 0 1 00, 0

50% m ais po bre s 50% a ci m a d a m e dia na

20 09

T ota l

Fonte: PNAD Elaboração: NEPP/UNICAMP A análise da escolaridade do Nordeste Metropolitano (Tabela 4), também evidencia, em relação ao primeiro decil, uma melhora bastante tímida quanto aos indicadores educacionais. A proporção de analfabetos cai pouco no quinquênio, exibindo valores superiores a 10% nos dois primeiros decis, tanto em 2004 quanto em 2009, sendo que os valores mais elevados também estão concentrados nesses dois primeiros decis. As alterações em relação aos perfis dos 50% mais pobres são bastante tímidas, no entanto há um aumento na escolaridade para esse grupo (pelo menos até o 4º decil, visto que o 5º decil apresenta valores de mesma proporção no período), com aumento do Ensino Fundamental Completo e Ensino Médio. Em relação ao grupo com renda acima da mediana, os valores também permanecem praticamente estáveis. No total acumulado, a tendência de pouco progresso no quinquênio se repete, no entanto pode-se destacar o aumento do ensino superior, queda do ensino fundamental incompleto e diminuição de quase 2% no nível de analfabetos, o que infelizmente é pouco para uma melhora sustentada capaz de modificar em longo prazo os péssimos indicadores educacionais do país.

3.3. Sul Metropolitano

Os valores dos cortes dos decís de renda domiciliar per capita do Sul Metropolitano exibidos no Gráfico 8, indicam menor pobreza se comparadas ao Nordeste Metropolitano. O valor de renda indicativa de pobreza (abaixo de ½ salário mínimo) corresponde aos dois primeiros decis em 2004 e apenas ao primeiro em 2009. O primeiro decil teve um aumento de renda de 39%, seguidos pelo segundo e terceiro, que tiveram um aumento de renda de 30% e 31, respectivamente. Os ganhos vão diminuindo progressivamente, sendo que no décimo decil há uma diminuição de 42% na renda domiciliar per capita entre 2004 e 2009. O valor de renda correspondente ao valor do salário mínimo no período (R$ 465) se situa entre o 4º e o 5º decil

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em 2004 e entre o 3º e o 4º decil em 2009, o que evidencia um ganho de renda daqueles que recebiam um salário mínimo em 2004, elevando a renda dos demais através do já citado “efeito farol”.

Gráfico 8 Valor dos decís de rendimento domiciliar per capita

Regiões Metropolitanas do Sul – 2001-2009 14

9

230

310

388

488

629

829

1171

2067

4133

7

158

249

329

401

507

634

824

1141

1943

4562

2

220

325

433

513

634

783

1000

1375

2233

2685

0

0

500

1000

1500

2000

2500

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10decis

Val

ores

em

rea

is (R

$)

2001 2004 2009

Fonte: PNAD Elaboração: NEPP/UNICAMP Valores deflacionados para 2009.

Comparando os anos de 2004 e 2009 (Tabela 05), observa-se que as maiores alterações ocorridas na PIA do Sul Metropolitano se situam entre o grupo dos 50% mais pobres, principalmente em relação aos ocupados precários, que registram uma queda expressiva nesse grupo e que mantém em todos os decis de 2009 uma distribuição próxima à proporção total (24,3%). Não há alterações substanciais na proporção total da PIA e entre os 50% acima da mediana no quinquênio analisado. Entretanto o primeiro decil registra uma queda de 5,7 p.p entre os ocupados precários, o segundo registra uma queda de 8 p.p e o terceiro tem uma queda de 6 p.p, superando a redução de 2 p.p na PIA Total. Em relação à proporção de ocupados, os três primeiros decis registram também uma queda em torno de 3 p.p. A proporção de desempregados também se mantém estável em relação aos 30% mais pobres, enquanto que a taxa de ocupados não precários teve um aumento de cerca de 4 p.p tanto para o segundo quanto para o terceiro decil. Quanto aos Inativos, nota-se o aumento de 2,2 p.p no primeiro decil, 4,1 p.p no segundo e 2% no terceiro, o que sugere que no período de cinco anos considerado, essas pessoas provavelmente desistiram de procurar emprego, talvez devido à falta de qualificação profissional (uma vez que a proporção de ocupação manteve-se estável). A hipótese de envelhecimento da população não é plausível, uma vez que cinco anos são insuficientes para alterar a proporção de inativos da PIA Total em apenas 1 p.p. Pelo contrário, a concentração de Inativos acima da proporção total em 2004 entre os 50% mais pobres em 2004 e entre os 40% mais pobres em 2009, sugere uma alta concentração de pobreza entre aqueles que possuem uma renda de até um salário mínimo (com certeza muito desses devem ser beneficiários do BPC).

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Tabela 5 Distribuição da PIA (pessoas) por situação ocupacional e condição na precariedade da ocupação

segundo decis do rendimento domiciliar per capita Regiões Metropolitanas do Sul - 2001-2009

10 % 20 % 30 % 40 % 50 %20 01

O cu pa dos n ão p r ec á r io s 7 ,0 1 4 ,9 2 2 ,4 2 4 ,4 3 0 ,4 3 6 ,4 4 2 6 ,9O cu pa dos p re cá ri o s 23 , 6 2 6 ,2 2 4 ,7 2 6 ,6 2 7 ,2 24 , 5 2 5 ,1O cu pa dos 30 , 6 4 1 ,2 4 7 ,1 5 1 ,0 5 7 ,6 6 0 ,9 5 5 2 ,1D es e m p re ga d os 11 , 7 7 ,3 7 ,0 5 ,4 4 ,4 2 ,6 5 5 ,2I na ti vos 57 , 7 5 1 ,6 4 6 ,0 4 3 ,7 3 8 ,0 3 6 ,3 9 4 2 ,7T o ta l 1 00 ,0 1 00 , 0 1 00 , 0 1 00 , 0 1 0 0 ,0 1 00 10 0 ,0

20 04O cu pa dos n ão p r ec á r io s 3 ,5 1 1 ,9 1 6 ,8 2 2 ,6 2 6 ,9 39 , 9 3 2 ,4O cu pa dos p re cá ri o s 28 , 3 3 1 ,9 2 9 ,4 2 9 ,9 2 7 ,3 24 , 8 2 6 ,4O cu pa dos 31 , 8 4 3 ,8 4 6 ,2 5 2 ,5 5 4 ,2 64 , 7 5 8 ,7D es e m p re ga d os 18 , 5 1 0 ,8 8 ,2 8 ,1 6 ,1 3 ,5 5 ,5I na ti vos 49 , 6 4 5 ,5 4 5 ,7 3 9 ,4 3 9 ,7 31 , 8 3 5 ,7T o ta l 1 00 ,0 1 00 , 0 1 00 , 0 1 00 , 0 1 0 0 ,0 1 00 ,0 10 0 ,0

O cu pa dos n ão p r ec á r io s 5 ,6 1 6 ,5 2 0 ,6 2 7 ,7 3 3 ,4 40 , 7 3 4 ,1O cu pa dos p re cá ri o s 22 , 6 2 3 ,9 2 3 ,4 2 5 ,7 2 5 ,3 24 , 2 2 4 ,3O cu pa dos 28 , 2 4 0 ,4 4 4 ,1 5 3 ,4 5 8 ,7 64 , 9 5 8 ,3D es e m p re ga d os 20 , 0 1 0 ,0 8 ,3 6 ,4 5 ,3 2 ,6 4 ,9I na ti vos 51 , 8 4 9 ,6 4 7 ,6 4 0 ,2 3 6 ,1 32 , 5 3 6 ,7T o ta l 1 00 ,0 1 00 , 0 1 00 , 0 1 00 , 0 1 0 0 ,0 1 00 ,0 10 0 ,0

50 % m a is p o b r es 50 % ac im a da m e d i an a

20 09

T ot al

Fonte: PNAD. Elaboração: NEPP/UNICAMP Excluídos da análise de domicílios: pensionistas, empregados domésticos residentes e parentes dos empregados domésticos.

Em relação à escolaridade do Sul Metropolitano, a Tabela 6 mostra pouca mudança no perfil da escolaridade das pessoas. A queda na proporção de analfabetismo no quinquênio pode ser considerado o elemento de melhora de maior significância (pouco mais que 2 p.p), no entanto, ela ainda é superior a 10% até o 4º decil em 2004 e até o 3º em 2009, o que evidencia o quão pouco se avançou. No geral, há uma melhora, ainda que pouco expressiva, no perfil educacional em todos os decis do grupo dos 50% mais pobres. Onde isso não ocorre, pelo menos não há piora e as proporções mantêm-se estáveis. Pode-se destacar também o aumento do Ensino Superior entre os 50% mais pobres, que era praticamente inexpressivo em 2004 e passa a exibir valores em torno de 2%, chegando a 5,5% no quinto decil em 2009. Os valores dos perfis de escolaridade proporcionais aos 50% menos pobres e do total mantêm-se praticamente os mesmos no período.

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Tabela 6 Escolaridade da população (a partir dos 10 anos de idade), segundo decis do rendimento

domiciliar per capita. Regiões Metropolitanas do Sul - 2001-2009

10 % 20% 3 0% 40 % 50 %20 01

A n al fa be to 2 4,6 18 ,6 14 ,0 1 1,8 1 1,3 4,5 7 11, 4E n si no fund am e nta l inc o m p le to 6 2,9 64 ,0 60 ,9 5 7,7 5 3,4 3 7,8 2 50, 5E n si no fund am e nta l co mp le to 4 ,7 5 ,8 7, 0 7,9 7 ,5 5,2 5 5 ,9E n si no m é dio 7 ,0 10 ,8 16 ,3 2 1,1 2 4,7 2 9,3 7 21, 4E n si no S upe ri or 0 ,8 0 ,8 1, 8 1,5 3 ,2 2 2,9 7 10, 8T o ta l 1 0 0,0 10 0,0 100 ,0 1 00, 0 10 0,0 1 00 ,0 1 00 ,0

20 04A n al fa be to 2 1,9 18 ,5 13 ,4 1 0,6 8 ,9 3,9 9 ,0E n si no fund am e nta l inc o m p le to 6 3,8 62 ,6 60 ,7 5 7,4 5 2,8 36, 2 47, 6E n si no fund am e nta l co mp le to 5 ,2 6 ,2 7, 6 7,8 6 ,7 5,0 5 ,9E n si no m é dio 8 ,4 11 ,8 17 ,2 2 2,5 2 7,8 30, 6 24, 5E n si no S upe ri or 0 ,8 0 ,8 1, 1 1,8 3 ,8 24, 3 13, 0T o ta l 1 0 0,0 10 0,0 100 ,0 1 00, 0 10 0,0 1 00 ,0 1 00 ,0

A n al fa be to 1 8,1 14 ,1 10 ,8 9,6 6 ,6 3,8 6 ,8E n si no fund am e nta l inc o m p le to 6 3,5 62 ,0 59 ,6 5 3,3 5 1,5 37, 0 45, 3E n si no fund am e nta l co mp le to 5 ,0 6 ,6 8, 0 8,7 8 ,5 6,0 6 ,6E n si no m é dio 1 1,0 15 ,7 19 ,3 2 5,3 2 7,9 28, 6 25, 4E n si no S upe ri or 2 ,4 1 ,6 2, 3 3,2 5 ,5 24, 5 15, 9T o ta l 1 0 0,0 10 0,0 100 ,0 1 00, 0 10 0,0 1 00 ,0 1 00 ,0

5 0% m a i s pob re s

20 09

50 % a c im a da m e di ana T o ta l

Fonte: PNAD Elaboração: NEPP/UNICAMP

Para finalizar é possivel observar que o acesso aos serviços públicos urbanos apresenta progresso entre 2004 e 2009, porém, que permanece marcante a pior condição de acesso nos quatro decís inferiores de rendimento domiciliar per capita em ambos os conjuntos de regiões metropolitanas analisados (Tabelas 7 e 8).

Também em ambos os conjuntos de regiões metropolitanas e, especialmente para os 4 decís inferiores de renda é pior o acesso aos serviços de coleta de lixo e à rede coletora de esgoto, marcando negativamente as condições de vida destes domicílios.

Deve ser ressaltado, no entanto, que no período analisado tornou-se quase universal o acesso à agua canalizada em ao menos um cômodo do domicílio e à energia elétrica, o que significa melhora substantiva nas condições de vida das populações metropolitanas, ampliando a possibilidade de acesso a bens como eletrodomésticos que permitem maximizar o uso do tempo e ampliar horizontes.

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Tabela 7

Proporção de domicílios com acesso a serviços urbanos, segundo decis de rendimento domiciliar per capita (%)

Regiões Metropolitanas do Nordeste - 2004-2009

2004 2009 2004 2009 2004 2009 2004 20091º 83,9 90,1 99,2 99,6 88,4 93,7 45,0 46,22º 89,2 93,8 99,7 99,9 93,4 95,9 46,3 52,33º 93 95,7 99,7 99,9 94,4 97,2 51,2 53,84º 93,2 96,6 99,7 99,9 95 97,2 56,1 605º 95,8 98,6 99,9 99,9 96,8 97,8 63,9 63,26º 97,1 96 99,9 99,9 97,9 97,1 65,4 60,87º 97,9 97,8 99,9 100,0 97,6 99 71,6 68,58º 98,8 99,3 99,8 99,9 98,9 99,2 76,0 72,99º 99,4 99,9 100 100,0 99,1 99,7 78,0 77,610º 99,6 99,7 100 100,0 99,1 99,6 85,5 84,8

Rede de esgoto

deci

s de r

enda

Água Canalizada Rede Elétrica Coleta de Lixo

Fonte: PNAD Elaboração: NEPP/UNICAMP

Tabela 8 Proporção de domicílios com acesso a serviços urbanos, segundo decis de

Rendimento domiciliar per capita (%) Regiões Metropolitanas do Sul - 2004-2009

2004 2009 2004 2009 2004 2009 2004 20091º 92,4 97,5 97,7 99,4 93,2 96,2 59,4 612º 95,6 97,6 99,5 100 95,6 96,2 69,3 63,83º 98,5 97,9 99,7 99,9 96,2 98,1 66,8 68,24º 97,7 98,6 99,7 99,9 96,9 97,9 72,7 72,85º 98,7 99,6 100 100 98,1 99 79,8 746º 99,3 98,3 99,9 99,9 99,3 98,3 83 73,67º 99,4 98,9 99,9 99,8 98,5 99,6 83,4 78,98º 99,6 99,4 100 99,9 98,9 99,2 88,8 82,19º 99,8 99,7 99,9 100 99,8 99,6 92,8 84,610º 99,8 99,7 100 100 99,9 99,9 94,6 89,3

Rede de esgoto

deci

s de r

enda

Água Canalizada Rede Elétrica Coleta de Lixo

Fonte: PNAD Elaboração: NEPP/UNICAMP

4. Considerações finais

No Brasil, de forma semelhante ao que acontece em diversos paises da América Latina e nos demais paises emergentes, são analisados aspectos que indicam o crescimento da classe média, ainda que com características distintas da classe média tradicional (Birdsall, 2013).

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Atualmente, é assunto comentado na mídia brasileira e também oficialmente reconhecida por parte de órgãos governamentais para a definição de suas políticas públicas - a “nova classe média” brasileira - que teria surgido no período recente de crescimento pelo qual atravessou o país, principalmente a partir de 2004. Segundo essas fontes, essa nova classe emergiu da pobreza e se integrou aos circuitos de consumo médio do país, frequentando escolas particulares, shopping centers, universidades e financiando a casa própria, trilhando, assim, o caminho da ascenção social, outrora possibilidade impensada para tal contigente de pessoas pauperizadas, cuja única preocupação se resumia à sobrevivência imediata.

Dessa forma, convencionou-se por parte da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República (SAE), chamar de “nova classe média” todos aqueles que recebem uma renda mensal per capita entre R$ 291 e R$ 1.019,00, que é aproximadamente metade da População Economicamente Ativa (PEA) do país. Este valor se situa entre 0,46 SM e 1,6 SM, considerando-se o Salário Mínimo vigente em 2012 (R$ 622), ou seja, abarca diversos perfis ocupacionais e situações sociais. Desconsiderando as implicações que este termo trouxe para a compreensão (ou falta dela) da realidade econômica do país, é inegável que ele mais confunde do que ajuda a distinguir o que de fato aconteceu no período de crescimento.

Nas análises realizadas nesse projeto, foram escolhidas dois conjuntos de regiões metropolitanas com características contrastantes: as Regiões Metropolitanas do Nordeste e : as Regiões Metropolitanas do Sul. O primeiro conjunto concentra muito mais pobreza que o segundo, no entanto, por serem regiões metropolitanas intensamente urbanizadas, apresentam características em comum, como a densidade populacional, a complexidade econômica (variedade de serviços e empregos) e os mesmos problemas de várias regiões metropolitanas: periferias com altas concentrações de pobreza em contraste com bolsões de habitação de população de rendimentos mais elevados.

É inegável que nesse período de crescimento (2004-2009) houve aumento na renda domiciliar per capita domiciliar entre os grupos mais pobres da população, como ficou claro nas distribuições de renda por decis, mas não se pode afirmar que esses grupos possam fazer parte de uma suposta “nova classe média”. Embora as faixas de renda que correspondem a um valor igual ou pouco superior ao salário mínimo integrem os decis menos pobres da população, isto só reafirma a desigualdade social que continua a marcar o país como um dos mais desiguais do mundo, mesmo com a recente queda do índice de Gini.

O aumento do emprego entre as ocupações menos remuneradas foi um dos fatores de maior peso responsável pelo aumento de renda no período. No entanto, para os decis de renda mais baixos, há pouco a ser comemorado, uma vez que as taxas de desemprego e ocupações precárias são altíssimas. Segundo Marcio Pochmann, em seu livro Nova Classe média? , demonstra que o atual ciclo de crescimento econômico foi marcado por três fatores principais: 1) crescimento do trabalho assalariado formal e protegido por lei na base da pirâmide social brasileira 2) criação de emprego em ocupações que pagam até 1,5 salário mínimo e 3) deslocamento da dinâmica da geração de postos de trabalho da indústria (décadas de 70 e 80) para o setor de serviços (anos 90 e 2000). Dessa forma, com a valorização do salário mínimo e o aumento do emprego, permitiu-se a esse enorme contingente de trabalhadores conquistar um padrão de consumo relativamente inédito na história nacional, o que possibilitou a estes uma percepção de futuro mais positiva do que antes.

O crescimento do emprego (principalmente no setor de serviços) na base da pirâmide social brasileira no período de 2004-2009 tem a ver com um processo de desindustrialização intenso

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que atingiu o país principalmente a partir da década de noventa. Os setores industriais ofereciam melhor remuneração e muitos dos trabalhadores dessas indústrias faziam parte da então tradicional “classe média” da população, uma vez que para ocupar estes empregos, era necessário determinado conhecimento técnico e, portanto, exigia formação educacional mais elevada. Atualmente, estes setores médios encontram-se principalmente no setor público, ou no setor de serviços privado onde se localizam os empregos de melhor remuneração, uma vez que houve queda nos empregos gerados pela indústria. Assim, restou aos estratos mais vulneráveis da população, os empregos que oferecem menor remuneração e que exigem baixa ou nenhuma qualificação profissional, em setores tais como telemarketing, atendentes de comércio e terceirizados de empresas que cumprem diversas tarefas em indústrias. Este movimento que aumentou a proporção de ocupações não precárias se deve à formalização das ocupações de baixa remuneração, pois ainda que sejam mal remuneradas, as mínimas garantias e direitos oferecidas pelos empregos registrados em carteira são suficientes para garantir alguma melhora na vida dos trabalhadores que ocupam a base da pirâmide social (o direito ao auxílio desemprego é um deles, por exemplo). Dessa forma, os empregos que exigem baixa qualificação foram os que mais influenciaram a mobilidade de renda verificada no período. Assim se mantém os “gargalos” que travam a ascenção social, sendo um exemplo o não preenchimento de vagas em empregos que oferecem melhor remuneração e exigem qualificação mais alta que a média.

A pobreza é entendida nesse trabalho como um fenômeno multidimensional, do qual a falta ou ausência de renda é apenas um de seus elementos. O aumento da renda registrado no período não foi acompanhado por melhorias substanciais em outros indicadores, como a qualidade do emprego e da educação, que são excelentes parâmetros de condição social. O progresso registrado no período de crescimento pré-crise foi pontual e há dificuldades estruturais que dificultam o avanço dos indicadores educacionais, apesar das diversas políticas de inclusão. As mudanças observadas na elevação da renda se relacionam principalmente ao crescimento econômico combinado com as políticas de valorização do salário mínimo e de transferência de renda. Espera-se, contudo, que essas mudanças possam levar a uma alteração no ciclo intergeracional de transmissão da pobreza, isto é, na capacidade que a pobreza tem de se reproduzir entre as gerações das famílias em situação de vulnerabilidade.

A boa dinâmica econômica nacional observada entre 2004 e 2009 foi favorecida também, em grande parte, devido a situação econômica externa, que favoreceu os produtos exportados pelo país. Isso contribuiu para uma retomada da elevação do PIB, juntamente com a ampliação do investimento e do consumo. Conforme exposto, nesse quinquênio de crescimento, registraram-se aumento na renda dos mais pobres, mas a questão da desigualdade social permanece, uma vez que crescer economicamente nunca significou uma melhora imediata na vida das pessoas mais pobres. Assim, ainda que a elevação da renda familiar tenha favorecido o acesso a bens e aos serviços para segmentos mais amplos da população, permanecem os hiatos de educação, moradia e saúde. Para se ter uma ideia, o IDH brasileiro (0,718) se situa na 84ª posição mundial e se enquadra na categoria de “Desenvolvimento Humano Elevado”, o que impediria, então, o Brasil de avançar, senão a péssima distribuição de renda que permite ao crescimento econômico beneficiar apenas uma parte da população?

5. Referências bibliográficas

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