23
4 VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER NO ÂMBITO DOMÉSTICO E FAMILIAR E A LEI MARIA DA PENHA: UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA MARIA DO SOCORRO MIRANDA GUIMARÃES Resumo: o presente artigo discorre sobre a violência contra a mulher no âmbito doméstico e familiar. Com o objetivo de compreender o que motiva a agressão sobre a mulher no ambiente doméstico e familiar e como se dá o aumento da violência cada vez mais crescente envolvendo a mulher e o que tem sido feito como medida para combater esse tipo de violência. A metodologia utilizada na pesquisa foi pesquisa qualitativa exploratória por meio de pesquisa bibliográfica, realizada através de artigos científicos, livros, cartilhas, sites e a legislação sobre a temática. Conclui-se que a violência é um acontecimento complexo e difuso e que está associado às relações de gênero. Com a aprovação da Lei 11.340/06 houve inovações significativas em relação à legislação existente no enfretamento, combate e na punição ao agressor da mulher vitima de violência. As denúncias aumentaram segundo pesquisas realizadas. Palavras-chave: Violência contra a mulher; Violência doméstica; Gênero; Lei Maria da Penha. 1. INTRODUÇÃO O objetivo deste artigo é fazer uma análise de como se dá a violência contra a mulher no âmbito doméstico e familiar e também verificar as contribuições da Lei 11.340/2006, conhecida como Lei Maria da Penha, e quais as mudanças que ocorreram na vida das mulheres vitimas de violência após a implementação dessa Lei, bem como abordar algumas possíveis razões apontadas, por alguns estudiosos, sobre o que motiva a agressão contra o feminino. No intuito de se tentar entender o porquê as mulheres sofrem agressões violentas a ponto de serem assassinadas. O interesse acadêmico por essa pesquisa surgiu devido ao crescente e elevado aumento nos índices de morte de mulheres por violência no ambiente doméstico e familiar, verificada e divulgada nos meios de acesso às informações e comunicação como a mídia, revistas e jornais. Também devido aos debates no

VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER NO ÂMBITO DOMÉSTICO E … · contra a mulher na Lei Maria da Penha com atenção predominante sobre a violência doméstica, em virtude das contribuições

Embed Size (px)

Citation preview

4

VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER NO ÂMBITO DOMÉSTICO E FAMILIAR E A LEI

MARIA DA PENHA: UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

MARIA DO SOCORRO MIRANDA GUIMARÃES

Resumo: o presente artigo discorre sobre a violência contra a mulher no âmbito

doméstico e familiar. Com o objetivo de compreender o que motiva a agressão sobre a mulher no ambiente doméstico e familiar e como se dá o aumento da violência cada vez mais crescente envolvendo a mulher e o que tem sido feito como medida para combater esse tipo de violência. A metodologia utilizada na pesquisa foi pesquisa qualitativa exploratória por meio de pesquisa bibliográfica, realizada através de artigos científicos, livros, cartilhas, sites e a legislação sobre a temática. Conclui-se que a violência é um acontecimento complexo e difuso e que está associado às relações de gênero. Com a aprovação da Lei 11.340/06 houve inovações significativas em relação à legislação existente no enfretamento, combate e na punição ao agressor da mulher vitima de violência. As denúncias aumentaram segundo pesquisas realizadas.

Palavras-chave: Violência contra a mulher; Violência doméstica; Gênero; Lei Maria da Penha.

1. INTRODUÇÃO

O objetivo deste artigo é fazer uma análise de como se dá a violência contra a mulher no âmbito doméstico e familiar e também verificar as contribuições da Lei 11.340/2006, conhecida como Lei Maria da Penha, e quais as mudanças que ocorreram na vida das mulheres vitimas de violência após a implementação dessa Lei, bem como abordar algumas possíveis razões apontadas, por alguns estudiosos, sobre o que motiva a agressão contra o feminino. No intuito de se tentar entender o porquê as mulheres sofrem agressões violentas a ponto de serem assassinadas. O interesse acadêmico por essa pesquisa surgiu devido ao crescente e elevado aumento nos índices de morte de mulheres por violência no ambiente doméstico e familiar, verificada e divulgada nos meios de acesso às informações e comunicação como a mídia, revistas e jornais. Também devido aos debates no

5

transcorrer do curso em torno dessa violência cometida contra as mulheres que leva ao assassinato delas. Discussões que geraram questionamentos, estimulando o interesse em compreender essas questões em relação à violência contra a mulher. De uma maneira geral, o aumento da violência nas últimas décadas no Brasil é grande, e por se tratar de um assunto tão complexo muito autores abordam o conceito e as causas dessa violência como Lima (2009), que em sua obra “violência contra a mulher” diz que até meados do século passado, a violência contra a mulher era uma manifestação das relações de domínio do homem sobre a mulher e que a legislação de cada Estado admitia. De acordo com estudos de alguns autores, a violência contra a mulher tem fundamento, e esta relacionada com sua história, ou seja, alguns autores atribuem a violência contra a mulher, a uma questão cultural. Para o desenvolvimento deste artigo e a efetivação dos objetivos do estudo indicado, foi realizada uma pesquisa qualitativa exploratória bibliográfica. Para tanto, realizou-se uma análise na literatura acadêmica, na legislação e em sites que tratam da temática sobre gênero e violência contra a mulher, os quais fazem parte da problemática. Tendo em vista que em muitos aspectos há consenso na forma de ver e conceber a violência que se apresenta e a forma de ver e conceber que a literatura existente oferece. Por essa razão, a estrutura do artigo foi fundamentada em oito seções descritas a seguir: fatores conceituais sobre a violência; violência doméstica e familiar contra a mulher; divisões de papéis: trabalho produtivo e reprodutivo; gênero e violência contra a mulher; violência de gênero e suas implicações na violência contra a mulher; desigualdade de gênero e a violência contra a mulher; Lei 11.340/2006: Lei Maria da Penha; feminicidio e a violência contra a mulher. Quer-se compreender nas análises dos textos o porquê dos dados alarmantes de morte de mulheres brasileiras, em situação de violência no ambiente doméstico, cresce cada vez mais. O que vem preocupando a população brasileira. Segundo Waiselfisz (2012) em média, a cada 2 horas, uma brasileira foi morta por condições violentas e que na maioria das vezes as agressões ocorrem dentro de casa, sendo o agressor: o marido, o namorado, o companheiro ou ex- companheiro da mulher. Buscar-se-á também compreender como se articula a percepção da violência contra a mulher na Lei Maria da Penha com atenção predominante sobre a violência doméstica, em virtude das contribuições a que a Lei se propõe na proteção da mulher e prevenção da violência sobre ela, assim como prevê punição aos seus algozes. Partindo da concepção de que a mulher vitima de violência doméstica sofre agressão violenta ao ponto de chegar à morte, pauta-se como hipótese principal, na tentativa de confirmar, e não de negar que a Lei Maria da Penha veio a ser criada como medida de proteção a essa mulher. Uma vez que estabelece mecanismo de prevenção e punição, proporcionando meios de proteger a mulher contra a violência e resguardar-lhe a vida.

Conforme pesquisa divulgada em 2014, pela Central de Atendimento a Mulher (Ligue 180) da Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República (SPM-PR), as denúncias realizadas por mulheres vitimas de violência aumentaram. A pesquisa revelou, ainda, que o Distrito Federal é a unidade da federação com o maior percentual de registro de atendimentos no Ligue 180 em 2014. Em segundo lugar está o Mato Grosso do Sul e, em terceiro, o Rio de Janeiro. A Central de Atendimento à Mulher tem colaborado para a adoção de políticas públicas voltadas

6

para o enfrentamento à violência contra a mulher e para a efetivação da Lei Maria da Penha. Portanto, este trabalho pauta-se numa revisão bibliográfica do tema violência contra a mulher no ambiente doméstico, e a Lei Maria da penha como avanço na legislação para coibir a violência doméstica. Esperando, com isso, que as suas contribuições sejam percebidas no sentido de confirmar a possibilidade de redução da violência contra a mulher. Visto que a Lei Maria da Penha, aliada a uma ampla divulgação, contribui no enfrentamento dessa questão, já que, após a criação da Lei, pode-se perceber uma maior mobilização das mulheres no que se refere ao aumento no número de denúncias o que é necessário para que a Lei seja aplicada. 2. REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 Fatores conceituais sobre violência, violência doméstica e familiar contra a mulher. A temática da violência não é atual, pois são conhecidas várias práticas violentas existentes na antiguidade. Essas práticas começaram a ser debatidas a partir do século XIX, quando a violência passou a ser caracterizada como um fato social e despertou a preocupação do poder público e, até mesmo de estudiosos de várias áreas (HAYECK, 2009). A violência, atualmente, é um acontecimento social inserido no cotidiano da população, de diferentes formas e em todas as classes sociais, que sofrem com vários tipos de violência. Comumente, a violência é conceituada como qualquer força ou prática projetada de um indivíduo sobre o outro, e, que vai além do ataque físico, bem como a coação política, doméstica ou de gênero, ou à liberdade de expressão e de pensamento de um indivíduo. É qualquer relação de força que um indivíduo impõe a outro (SILVA e SILVA, 2010). Segundo Dias (2010), geralmente, a violência é usada para exercer domínio e manter uma pessoa submetida à outra através de métodos agressivos de força física, mental e moral para que a pessoa faça o que não tem vontade. Lima (2009) em sua obra, “violência contra a mulher”, ressalta que a violência é um acontecimento complexo, visto que a ciência não consegue defini-la com exatidão. É um fenômeno influenciado por fatores como a cultura e as mudanças constantes de valores e padrões que regem a sociedade, em constante movimento, devido a isso, está sempre sendo submetida às revisões continuas. Leonel (2012) concorda com o autor citado e confirma que “violência é um fenômeno difuso e complexo cuja definição não encontra consenso cientifico”. Minayo (2003, apud GONÇALVES, 2010 p. 08) acrescenta que a violência é tudo aquilo que se projeta a outrem, para prejudicá-lo, usando métodos que o atinja, causando-lhes vários danos que podem ser: físicos, morais ou mentais. Conforme os conceitos mencionados acima, a violência é um fenômeno social complicado, longo e com amplos significados que está, geralmente, associada ao uso da força física ou psicológica para submeter uma pessoa a fazer o que ela não quer e mantê-la sob domínio. O fato é que a questão sobre a violência existe desde a antiguidade e, está integrada a uma relação de poder, força e desigualdades.

7

2.1.2 Violência doméstica e familiar contra a mulher Segundo a “convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher” (1994), conhecida como Convenção de Belém do Pará, a violência contra a mulher é qualquer ato ou comportamento ligado ao gênero que cause morte, dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico à mulher, tanto no ambiente público como no privado. A Lei 11.340/2006 acrescenta a esse conceito o dano patrimonial e moral. Também, ressaltaram a importância de se ter políticas de atenção à mulher vitima de violência.

Para os efeitos desta Convenção, entender-se-á por violência contra a mulher qualquer ato ou conduta baseada no gênero, que cause morte, dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico à mulher, tanto na esfera pública como na esfera privada (CONVENÇÂO de BELÉM do PARÁ, 1994, apud KNIPPEL e NOGUEIRA, 2010, p.27).

A esse conceito, a Lei Maria da Penha explicita que, a violência doméstica e familiar contra a mulher ocorre nas circunstâncias preditas nos incisos I (no ambiente doméstico), II (nas relações familiares), e III (nas relações de intimidades), do artigo 5º da Lei.

I-no âmbito da unidade doméstica, compreendida como espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vinculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas; II-no âmbito da familiar, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa; III-em qualquer relação intima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independente de coabitação.

Na violência doméstica e familiar contra a mulher não é necessário que a agressão ocorra no ambiente doméstico, basta existir o parentesco ou uma relação de convívio entre o agressor homem ou mulher, como nos casos de namorados, ex-namorados, ex- maridos ou marido, sendo a vitima sempre uma mulher. Existem diversos tipos de violência presentes nas relações de convívio, por isso, a violência não pode ser percebida somente como física, uma vez que uma pessoa pode sofrer em termos psicológico, morais, materiais e sexuais. Conforme o artigo 7º da Lei Maria da Penha, a violência doméstica e familiar pode ser refletida da seguinte forma:

I-Violência física: Entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal; II- Violência psicológica: Entendido como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição, insulto, chantagem, ridicularizarão, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação; III- Violência sexual: Entendida como qualquer conduta que constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça coação, ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante

8

coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercito de seus direitos sexuais e reprodutivos. IV- Violência patrimonial: Entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a desfazer suas necessidades; V- Violência moral: Entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injuria.

De acordo com Lima (2009), a violência contra a mulher é a expressão da dominação do homem sobre a mulher, que o exerce por meio de coação, de submetê-la a seu controle, reprimindo e ofendendo: física e moralmente a mulher. Infringindo assim os direitos essenciais da pessoa humana. Para Campos e Corrêa (2009) a desigualdade e a relação de poder entre os sexos dentro da sociedade são fatores responsáveis pela violência contra a mulher. Sua origem está ligada à cultura patriarcal que foi erguida tomando o homem como ser superior com poder de controlar tudo a sua volta, transformando assim a mulher em um ser inferior socialmente, resultando em uma posição de inferioridade e subordinação, passiva das mais cruéis formas de exploração e opressão do masculino sobre o feminino.

Entende-se por patriarcado

Como um sistema cultural em que o homem adulto é o chefe da casa e de todos: mulher, filhos e agregados devem estar sob suas ordens. Considera-se, também, que o masculino é o sujeito da sexualidade e o feminino, seu objeto. Na visão arraigada no patriarcado, o masculino é ritualizado como o lugar da ação, da decisão, da chefia da rede de relações familiares e da paternidade como sinônimo de provimento material. (LIMA e SANTOS 2009, p.277).

Outro aspecto que vale ressaltar é que segundo os autores Narvaz e Koller (2006) o patriarcado é um sistema que designa poder do homem ou masculino, e, não o poder dado à figura do pai. Os valores do patriarcado determina a superioridade masculina atribuindo maior valor as atividades masculinas em detrimento das atividades femininas. A superioridade masculina é ditada pelos valores do patriarcado que lhes confere uma importância maior ás atividades do homem em relação às das mulheres. Com base no que foi abordado acima se percebe que a violência contra a mulher no âmbito doméstico e familiar está ligada ao uso da força física masculina, e da história de desigualdade culturais entre homens e mulheres, da coerção e do poder. Diante dos fatos vale ressaltar que o patriarcado tem relação direta com a violência contra a mulher, pois durante muito tempo, a tradição patriarcal consentiu certo padrão de violência contra as mulheres em relação ao poder, subordinação e à divisão de papéis. 2.2 Divisões de papéis sociais: trabalho produtivo e reprodutivo

No contexto histórico, os diferentes papéis sociais atribuídos a homens e mulheres na sociedade foram se desenvolvendo com o processo civilizatório e a divisão do trabalho produtivo e reprodutivo. Essa distinção de papéis entre homens e mulheres é frequentemente abordada com uma visão biológica, que apontam as

9

diferenças no papel reprodutivo, bem como a centralização do poder ao gênero masculino modelando a sociedade de maneira sexista (NETA, 2013). O trabalho produtivo realizado pelos homens, aqui abordado, é aquele que gera diretamente mais-valia isto é, que valoriza o capital (MARX, 1978, apud ROSSO, 2013). Já o “trabalho reprodutivo é denominado como trabalho doméstico e, são as mulheres responsabilizadas pela execução deste trabalho que envolve o cuidado das pessoas, a manutenção da casa, e a preparação dos alimentos” (ÀVILA e FERREIRA, 2012 p.01). A divisão do trabalho produtivo e reprodutivo, em questão, configura a divisão sexual do trabalho. E para Melo e Castilho (2009), essa divisão sexual do trabalho reflete o fato de que a maioria dos homens desempenha suas atividades no mercado de trabalho capitalista (trabalho produtivo) e as mulheres a realização das tarefas domésticas concernentes aos cuidados da família (trabalho reprodutivo). Segundo Ávila e Ferreira (2012), essa divisão sexual explica as desigualdades vivenciadas pelas mulheres.

A divisão sexual do trabalho se sustenta em dois princípios: o da separação, que estabelece o trabalho produtivo como esfera de trabalho dos homens e o trabalho reprodutivo como o trabalho das mulheres; e o princípio da hierarquia, segundo o qual o trabalho do homem vale sempre mais que o trabalho da mulher. [...]. Ainda hoje, em nossa sociedade, os afazeres domésticos e o cuidado com as pessoas ainda são vistos como um atributo natural das mulheres [...]. Desde muito cedo, ainda na infância, as meninas

são socializadas para aprenderem a realizar esse trabalho (p. 02).

A divisão sexual do trabalho conforme Carloto (2012) se estabelece como prática social mantendo tradições que classificam trabalhos masculinos e trabalhos femininos. Os autores Campos e Corrêa (2009) acrescentam que embora os muitos avanços conquistados no século XX, em consequência especialmente da constituição federal de 1988, as mulheres ainda vivem em uma posição de desigualdade em relação aos homens. Recebem em média bem menos, que os homens e trabalham em dobro ou triplo, sofrem mais violência, e para chegar ao poder tem maiores dificuldades. As mulheres são 51% da população mundial, e são 70% responsáveis pelo trabalho realizado no mundo e atém apenas 4% dos empregos decisórios (CAMPOS e CORRÊA, 2009). Vale resaltar que a violência de gênero não afeta a mulher puramente por sua condição biológica de fêmea, mas pelas atividades a ela atribuídas como o trabalho reprodutivo visto como inferior por não gerar capital. Esta é uma atribuição que coloca a mulher em situação de inferioridade em relação ao homem fragilizando e deixando-a a mercê da violência por parte daquele que desempenha o trabalho produtivo e que gera capital. De acordo com Kinippel e Nogueira (2010) as heranças da sociedade patriarcal ainda são atuais na sociedade brasileira do século XXI, e confirmam que apenas com políticas públicas apontando à modificação desse conceito é que se pode achegar-se a uma sociedade igualitária e um respeito maior entre homens e mulheres. Conforme os fatos relatados acima, observa-se que a violência contra a mulher encontra alicerce na subordinação da mulher em relação ao homem, reforçada ao longo dos tempos, por uma cultura social patriarcal e na divisão social de papéis.

10

2.3 Gênero e a violência contra a mulher Segundo Campos e Corrêa (2009), o conceito de gênero foi produzido a partir dos anos setenta, principalmente no campo das ciências sociais. Eles abordam que não são as características sexuais, mas a forma com que elas são concebidas que estabelece o conceito de feminino e o de masculino em uma dada sociedade e em um determinado período histórico. Conforme Silva e Silva (2010, p. 166) “gênero é uma categoria relacional, ou seja, é entendido como o estudo das relações sociais entre homens e mulheres e como essas relações são organizadas em diferentes sociedades, época e culturas”. E para Gonçalves (2010), o conceito de gênero surge nos anos 70, por meio do movimento de mulheres, que protestavam contra a situação de dominação a que eram submetidas em várias épocas e situações, pelo simples fato de serem mulheres bem como procuravam compreender sobre o porquê as desigualdades sociais entre homens e mulheres aconteciam. A partir da década de 1970, as mulheres, de forma organizada, saíram às ruas em protesto por não mais aceitarem o ditado de que “em briga de marido e mulher não se mete a colher” e lutar pela justiça, pois homens matavam suas esposas e ex-esposas em nome da “legitima defesa da honra” o período marcou o início de protestos contra a impunidade dos agressores (CFEMEA, 2007). Knippel e Nogueira (2010) definem gênero como

Uma opção para estudar a problemática da violência contra a mulher a partir de uma visão que contemple os papéis sociais impostos a homens e mulheres, a partir da difusão e aceitação de uma cultura de cunho machista na qual o homem possui plena legitimidade de exercer exclusivamente o poder familiar, podendo, para tanto, fazer uso da força, se necessário (p.105).

Diante dos conceitos trazidos os autores Knippel e Nogueira (2010) confirmam que gênero recai sobre dois elementos bem definidos, as relações de poder e a subordinação, e que gênero não se refere ao sexo ou a categoria social, mas ao papel social imposto culturalmente a homens e mulheres. Portanto de acordo com o que foi relatado, gênero diz respeito às relações sociais entre homens e mulheres, ou seja, os papéis determinados, impostos a homens e mulheres dentro da sociedade e como essas relações são construídas, depende da cultura de cada lugar. 2.4 Violência de gênero e suas implicações na violência contra a mulher

Segundo Dias (2010) o avanço da Medicina, a descoberta de métodos contraceptivos, e as lutas originadas pelo movimento feminista induziram a redefinição do padrão de família imaginada. Ao se agregar no mercado de trabalho a mulher ausentar-se de casa, atribuindo ao homem também as responsabilidades domésticas, a mudança por ser novidade terminou por trazer insegurança e conflitos. A autora diz ainda que a violência surgiu como justificativa de compensar prováveis falhas no cumprimento dos papéis de gênero. “Quando um não está satisfeito com a atuação do outro, surge à guerra dos sexos. Cada um usa suas

11

armas: ele, os músculos; ela as lagrima. A mulher, por evidência, leva a pior e se torna vitima da violência masculina.” (DIAS, 2010, p.21). Para os autores Gebrim e Borges (2014), a prática de violência contra a mulher é em função do gênero feminino, daí o nome de violência de gênero porque esta está relacionada à condição de subordinação da mulher dentro da sociedade. Também afirmam que é devido à sua posição de subordinação na ordem sociocultural patriarcal, que se perpetua o caráter estrutural e o histórico do tipo de violência de gênero. Igualmente concordam em dizer que as formas de discriminação contra a mulher e a geração de práticas sociais que permitem ataques contra a integridade, desenvolvimento, saúde e vida da mulher são naturalizadas a partir de condições históricas. Conforme Tavares (apud, KNIPPEL e NOGUEIRA, 2010, p.110) o que estabelece as relações de violência entre os sexos são os papéis sociais impostos a homens e mulheres, reforçados por culturas patriarcais, e não os papéis sociais que ambos desempenham, e nem as diferenças biológicas entre homens e mulheres. As autoras Campos e Corrêa (2009) concordam com os autores supracitados acima e ainda acrescentam que:

A violência praticada contra a mulher é conhecida como violência de gênero porque se relaciona à condição de subordinação da mulher na sociedade, que se constituem na razão implícita do número estarrecedor de casos de agressão físicas, sexuais, psicológicas, morais e econômicas (patrimoniais). [...] revelando a incontestável desigualdade de poder entre homens e mulheres, sobretudo nas relações domésticas e familiares. [...] a violência de gênero também traz intrínseco que o ato de violência doméstica expressa um exercício de poder do homem sobre a mulher, dando um desequilíbrio entre os sexos, onde quase sempre o homem ao se sentir superior a mulher, age de forma violenta, fazendo uso da coerção como forma de perpetuar a subordinação feminina, prevalecendo à superioridade da força física e submetendo a mulher a toda espécie de violência (p.159 e 212).

Ainda que a violência de gênero, a violência doméstica e a violência contra as mulheres estejam ligadas em si, de acordo com Souza (2009), dependendo do ambiente de atuação, elas têm conceitos distintos. Afirma também que a violência de gênero generalizou-se para ser usada e fazer referência aos diversos atos praticados contra as mulheres seja no ambiente familiar, na sociedade em geral e principalmente nas relações de trabalho, caracterizando a dominação do gênero masculino sobre o feminino construído e nutrido a partir de estereótipos estabelecido para cada gênero (SOUZA, 2009). Conforme foi citado anteriormente à dominação masculina sobre o feminino é exercida de maneira continua para que as mulheres entendam e aceitem como naturais às diferenças físicas dos órgãos sexuais e da divisão do trabalho, o que induz a toda uma percepção de quão deve ser a conduta feminina e masculina, e acabem por aceitar sua condição. E de forma inconsciente são mantidos esses pretextos costumeiros de família e posteriormente a toda a ordem social com suas instituições, como a igreja, a escola e o Estado (LIMA, 2009).

A violência de gênero tem sido definida, como aquela exercida pelos homens contra as mulheres, em que o gênero do agressor e da vitima está intimamente unido à explicação desta violência. Portanto, a violência de gênero contra a mulher, nada mais é do que um reflexo da relação de

12

dominação masculina, dos padrões de comportamento ditados pela cultura e da desigual divisão de poder nas relações sociais (LEONEL, 2012 p.85).

Então cabe ressaltar a percepção de que a violência de gênero está fundamentada na relação de poder e dominação do masculino sobre o feminino nas relações sociais e na divisão de papéis impostos a homens e mulheres como foi mencionado anteriormente. 2.5 Desigualdade de gênero e a violência contra a mulher

Souza (2009) destaca que “histórica e filosoficamente, no período do Iluminismo e das grandes Revoluções do século XVIII, à mulher sempre foi reservado um papel familiar e social inferior ao homem, fortalecendo a cultura da subordinação e até mesmo da coisificação [...]” (p.35 e 36). O autor ainda esclarece que a cultura de diferença de gênero adquiriu força através de práticas de impor papéis sociais atribuídos a homens e mulheres definidos, desde que o sujeito nasce é imposto a cada um a ideia e uma espécie de regras de que homem deve ser forte, decidido, determinado e líder, enquanto a mulher fica com o papel de incapaz de exercer as atividades de homens e, portanto é inferior a ele. (SOUZA, 2009) Dias (2010, p. 40) confirma que “a relação de desigualdade entre homem e mulher, realidade milenar que sempre colocou a mulher em situação de inferioridade lhe impondo a obediência e a submissão”. A desigualdade induz hoje, a chamada violência de gênero, que teve origem na dominação social do masculino sobre o feminino. Essa desigualdade é a grande responsável pelo surgimento da superioridade dos homens em relação às mulheres. Por meio da opressão e supressão dos direito das mulheres foi concedido aos homens privilégios, vantagens materiais e culturas (CAMPOS e CORRÊIA, 2009). Atualmente no Brasil como em outras culturas, segundo Souza (2009) ainda prevalece “um sentimento, em maior ou menor grau, de que a mulher goza de status inferior ao do homem, sendo que isso se expressa em costumes, piadas, discriminação no âmbito trabalhista e até mesmo em letras de músicas” (P.38). E para Lima (2009) ainda com toda a mudança da mulher no contexto social, tendo acesso às universidades, ganhando espaços profissionais antes destinados aos homens, e se tornando provedoras da casa e da família não se tornaram iguais. Cabe aqui então ressaltar que a mulher ainda tem muitos desafios a serem superados na constituição da igualdade. Homens e mulheres biologicamente não são iguais, mas deve ser iguais como sujeitos de direitos, respeitando sua especificidade. A mulher tem conquistados muitos espaços no mercado de trabalho, se tornando provedora do lar, mas ainda existe, uma cultura machista que coisifica a mulher, e acha que tem direitos sobre ela. A desigualdade entre homens e mulheres é manifestada de maneira mais visível e desumana através da violência de gênero, que ocorre indiretamente em função do gênero, visto que o homem acredita ser superior a mulher e que pode controla-la, subjuga-la, humilhá-la e agredir de diversas formas, ocorrendo o que se denomina: a violência contra a mulher (CAMPOS e CORRÊA, 2009). Os autores Cunha e Pinto (2007, p. 07) na apresentação de sua obra relatam que “as estatísticas mostram, contudo, que algo precisava ser feito, a fim de estancar a condição de verdadeira calamidade pública que assume, em nosso País, a violência contra a mulher”.

13

Foi, por essa razão, que se criou a Lei, denominada de Lei Maria da Penha, eis que a legislação até então não era suficiente para coibir a violência doméstica, pois a lei nº 9.099/95, que trata dos juizados especiais criminais, não mais atendia aos anseios da mulher (SIRVINKAS apud, LIMA 2009 p.61).

Lima (2009) confirma que a Lei 11.340/2006 conhecida como Lei Maria da Penha foi fundamentada em vários documentos internacionais, os quais visam, há muito tempo, à eliminação da violência contra a mulher. Revelando ainda que a luta contra a violência é antiga, bem como mostrando necessidade da existência desse diploma legal.

Diante dos fatos houve realmente a necessidade da criação de uma nova legislação capaz de coibir, prevenir e punir a violência doméstica e familiar contra a mulher, estabelecendo medidas de assistência e proteção, deixando à mulher mais protegida contra a violência doméstica e familiar. 2.6 Lei 11. 340/2006: Lei Maria da Penha

Maria da Penha é o nome da mulher que rompeu várias barreiras estabelecidas pela sociedade brasileira tornando-se público um drama que aflige no mundo inteiro a mulher, que é a violência doméstica. Responsável pela iniciação de várias alterações e novidades legislativas, a Lei Maria da penha interferem no direito vicil, direito penal e no direito processual (KINIPPEL e NOGUEIRA, 2010). Bastos (2007) acrescenta que a Lei 11.340/06 é em homenagem a Maria da Penha, uma mulher vitima de violência doméstica, e que a Lei tende a adequar instrumentos que visam o combate e o enfrentamento de um problema que aflige uma ampla parte das mulheres no Brasil e no mundo, que é a violência de gênero. E Lavorenti (2009) confirma que a Lei atende recomendações internacionais, e tem o objetivo de dá uma resposta plena e articulada contra a violência doméstica e familiar praticada contra a mulher e tem como finalidade a implantação de mecanismos que visam a coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher e buscar o respeito, à igualdade e dignidade da mulher. A atual Lei Maria da Penha surge como consequência de um esforço coletivo dos movimentos de mulheres e poderes públicos no enfrentamento à violência doméstica e familiar e ao alto índice de mortes de mulheres no país. Configurando-se como resposta efetiva do Estado brasileiro às recomendações da Convenção de Belém do Para (convenção Interamericana para Prevenir, Punir, e Erradicar a Violência contra a Mulher) e da Convenção da ONU sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW). Respaldada no artigo 226, parágrafo 8º da Constituição Federal de 1988 no qual diz “o Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações”. (BRASIL, 2013). O artigo 6º da Lei 11.340/06 enfatiza que a violência doméstica e familiar constitui uma das formas de violação dos direitos humanos. Desde o início dos debates para a criação da Lei 11.340/06, a ideia básica foi caracterizar a violência doméstica e familiar contra a mulher como violação dos direitos humanos das mulheres e organizar uma Lei que garantisse proteção e procedimentos policiais e judiciais humanizados para as vitimas de violência (CFEMEA, 2007).

14

Brazão e Oliveira (2010) relatam que O projeto tinha como princípio criar uma legislação integral com mecanismos de prevenção e punição, que atendesse aos anseios e reivindicações de milhares de brasileiras vítimas de violência, que abrangesse a complexidade do fenômeno da violência doméstica e que contribuísse para sua desnaturalização e a reconhecesse como uma violação dos direitos humanos das mulheres. [...] estabelecer a retirada do julgamento dos casos de violência doméstica do âmbito da (Lei 9.099/1995), que os consideravam como crimes de menor potencial ofensivo, isto é, como crimes de natureza leve e não como uma violação dos direitos humanos das mulheres (BRAZÃO e OLIVEIRA, 2010 p.94).

A Lei 11.340/06 cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher e compõe a criação de diferentes serviços, apontando o atendimento especializado à mulher vitima de violência doméstica e familiar.

Esta Lei cria mecanismo para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher nos termos do § 8º do art. 226 da Constituição Federal, da convenção sobre a Eliminação de todas as Formas de violência contra a mulher, da convenção interamericana para prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher e de outros tratados internacionais ratificados pela Republica Federativa do Brasil; dispõe sobre a criação dos juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; e estabelece medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar (BRASIL, 2006).

A Lei Maria da Penha trouxe um conjunto de regras penais e extrapenais, princípios, objetivos e diretrizes que visam à prevenção de eventuais atos de violências praticados no cenário doméstico e familiar, protegendo especialmente a mulher vítima das mais diversas formas de violência. Antes da Lei, 11.340/2006 as ameaças eram tratadas como faltas menores e não eram suficientes para que o agressor fosse para a prisão ou afastado do lar. O crime de violência doméstica era julgado nos juizados especiais criminais, e o agressor era condenado a pagar a pena com cestas básicas. A partir da Lei Maria da Penha o agressor pode ser preso em flagrante ou ter a prisão preventiva decretada, será afastado do lar, e ainda o juiz pode obriga-lo a participar de programas de recuperação e reeducação. A Lei Maria da Penha é reconhecida cada vez mais como um instrumento jurídico, proporcionando a várias mulheres uma vida sem violência, pois:

A Lei restabelece o inquérito policial para apurar os crimes de violência doméstica e garantiu a assistência jurídica gratuita em sede policial e judicial. Previu a criação de centros de atendimentos psicossocial e jurídico, casas-abrigo, delegacias especializadas, núcleos de defensorias públicas, núcleos de promotoria especializados, serviços de saúde, centros especializados de perícias médico-legais e centros de educação e de reabilitação para os agressores (BRAZÃO e OLIVEIRA, 2010, p.95).

Rocha (2007) comenta que a violência contra a mulher não se limita as classes sociais mais baixas, pois a luta tomada pela biofarmacêutica Maria da Penha Maia Fernandes, vitima de violência no âmbito familiar, eram praticadas por seu marido, um professor universitário e economista, confirmando, assim que a violência é um reflexo de uma cultura onde a mulher é tida como um ser inferior e

15

que precisa se sobrepujada às vontades muitas vezes bárbaras de seus companheiros. Os autores Knippel e Nogueira (2010) confirmam que a violência doméstica contra a mulher ocorre em todas as classes sociais, a violência, não é averiguada somente nas classes mais baixas da população. Essa afirmativa se fundamenta na própria relação de poder que ampara toda a teoria da violência doméstica contra a mulher, ficando mais aparente em umas do que em outras. Para Souza (2009) “O problema da violência do homem em relação à mulher ultrapassa as fronteiras das classes sociais; está presente em todas elas e não respeita sequer o grau de intelectualidade”. (p.22). Campos e Corrêa (2009) ressaltam e acrescentam, confirmando o que foi mencionado anteriormente sobre a violência contra a mulher, tendo em vista um problema complexo e com raízes profundas nas relações de gênero e que é independentemente da raça, classe social, idade, ou da sua orientação sexual.

A violência contra a mulher é um acontecimento extremamente complexo, com raízes profundas nas relações de domínio baseada no gênero, interligadas a condição sexual da vitima, que independem de classes sociais ou culturais e encontram sua maior complexidade nas dificuldades para se conhecer a real magnitude do problema, por ser erroneamente considerado, até adjunto desta lei, como uma questão da esfera privada, que não dizia respeito ao poder publico, o que promoveu a banalização do problema da violência de gênero, gerando a impunidade e mais violência (CAMPOS e CORRÊA, 2009, p.212).

O relato de Maria da Penha é um estímulo a todas as mulheres que procuram justiça para os responsáveis pela violência que passam muitas vezes em silêncios. E fatores ligados à falta de condições financeira, a vergonha, o medo, e a não informação sobre a Lei induzem milhares de mulheres a conviverem com a humilhação e maus-tratos contínuos (KINIPPEL e NOGUEIRA, 2010). Ainda conforme os autores a Lei Maria da Penha modificou a forma como a violência doméstica contra a mulher é vista pela sociedade brasileira, melhorando expressivamente a vida das mulheres que sofrem agressões feitas por seus parceiros ou maridos. A Lei apresenta aspectos conceituais e educativos, que a classificam como uma legislação avançada e inovadora, com capacidade de compreender a complexidade das questões sociais e o problema da violência doméstica e familiar (CFEMEA, 2007). Diante dos fatos mencionados vale comentar que a Lei Maria da Penha instituiu diversos serviços, visando o atendimento especializado à mulher vitima de violência doméstica e familiar. Antes da sanção da Lei Maria da Penha, existia uma falta de compreensão mais ampla e um entendimento bastante restrito do que seria violência doméstica contra a mulher, pois a violência doméstica era entendida como sendo somente agressão física. Hoje já há um entendimento de que a violência doméstica é crime e deve ser punida, mostrando que está havendo uma mudança política, jurídica e cultural, como também uma conscientização maior da população sobre o que é violência depois da criação da referida Lei.

16

2.7 Feminicídio e a violência contra a mulher Feminicídio significa a morte de mulheres, por questões de gênero unicamente por serem mulheres. O termo femi é proveniente de femin, que vem do grego, e quer dizer revelar seu pensamento através da falar, opinar, enquanto que a expressão cidio vem do latim cid/um, que significado atuação de quem mata ou a sua consequência (DICIONÁRIO INFORMAL, 2015, TEXTO DIGITAL). O feminicídio se configura quando o assassinato de uma mulher for confirmado tão somente por questões de gênero, ou seja, quando uma mulher é assassinada simplesmente por ser mulher. O termo feminicídio foi empregado inicialmente no ano de 1976, em Bruxelas, no Tribunal Internacional de Crimes Contra Mulheres, para caracterizar o assassinato 1de mulheres pelo fato de serem mulheres. No entanto, só depois no ano de 1990, é que foi dado um conceito ao tema, definindo feminicídio como o assassinato de mulheres concretizado por homens causados por um sentimento de propriedade sobre a mulher, indignação, ódio ou prazer (GEBRIM e BORGES 2014). No Brasil, entre 2001 a 2011, em pesquisa divulgada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) verificou-se que.

Ocorreram mais de 50 mil feminicídios, sendo em média, 5.664 mortes de mulheres por causas violentas a cada ano e 472 a cada mês, e 15,52 a cada dia, ou uma morte a cada 1h30. Segundo o estudo, as mulheres jovens foram as principais vítimas, mais da metade dos óbitos (54%) foram de mulheres de 20 a 39 anos. Do total de mortes, 61% foram de mulheres negras, as principais vítimas em todas as regiões do País, com exceção da Sul; 36% dos assassinatos ocorreram aos finais de semana, quando grande parte das Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher está fechada. Somente os domingos concentraram 19% das mortes. Os Estados com maiores taxas de homicídios a cada 100 mil mulheres foram: Espírito Santo (11,24), Bahia (9,08), Alagoas (8,84), Roraima (8,51) e Pernambuco (7,81). Por sua vez, taxas mais baixa foram observadas no Piauí (2,71), Santa Catarina (3,28) e São Paulo (3,74) (IPEA, 2011, TEXTO DIGITAL).

E segundo dados do Mapa da Violência (2012) o Brasil está entre os países com maior índice de homicídios femininos com uma taxa de 4,4 assassinatos em 100 mil mulheres, ocupando a sétima posição em um ranking de 84 nações. (WAISELFIZ, 2012, TEXTO DIGITAL). A central telefônica, o ligue- 180 indicaram que de janeiro a junho de 2014 ocorreram 176 tentativa de homicídios e 49 homicídios de mulheres consumados, dados que alertaram a necessidade de aprovação da proposta legislativa que criar uma tipificação penal específica para este crime (SPM-PR, 2014, TEXTO DIGITAL) No Brasil o feminicídio foi classificado como crime hediondo. Então vale lembrar que no dia nove de março de 2015 a Presidente Dilma Rousseff sancionou a Lei 13.104/15 a chamada Lei do Feminicídio, que inclui o assassinato de mulheres

1 Feminicídio pode ser classificado em três situações: Feminicídio íntimo: quando há entre a vitima e o agressor uma relação de afeto ou parentesco. Feminicídio não íntimo: quando não há entre a vitima e o agressor uma relação de afeto ou parentesco, mas o crime é caracterizado por haver violência ou abuso sexual. Feminicídio por conexão: quando um homem assassina uma mulher que desejava intervir no assassinato de outra. Disponível em: http://www.significados.com.br/feminicidio/ acesso em 25/05/2015.

17

por razão de gênero como crimes hediondos. A intenção é tentar diminuir as taxas de homicídio feminino no país. A Lei do Feminicídio também prevê o aumento da pena em um terço se o crime ocorrer durante a gestação ou nos três meses após o parto ou se for contra a mulher idosa, adolescente ou com deficiência. Também vale no caso de o assassinato ocorrer na presença de filhos, netos, pais ou avós da vítima (BRASIL, 2015, TEXTO DIGITAL). A necessidade de se criar uma Lei especifica para os crimes relacionados ao gênero feminino, justifica o número elevado de mortes de mulheres cometido por parceiros ou ex-parceiros, muitas das ocasiões dentro de sua própria residência. A Lei é um avanço na luta pelo enfrentamento e o combate da violência contra a mulher, pois reconhece o feminicídio como crime hediondo e altera o código penal prevendo penas mais rígidas para o assassinato de mulheres.

3. CONSIDERAÇÔES METODOLÓGICAS

A metodologia usada na pesquisa foi pesquisa qualitativa exploratória bibliográfica. A pesquisa bibliográfica partiu de material já elaborado, constituído principalmente de livros e artigos científicos. (GIL, 2008). Ainda segundo o autor, a pesquisa bibliográfica busca explicar um problema a partir de referências teóricas já publicadas, constituída principalmente de livros, monografias, teses e publicações periódicas, como jornais e revistas. Tem por intuito possibilitar o conhecimento e a análise das contribuições culturais ou científicas existentes sobre um determinado assunto. A pesquisa bibliográfica constitui-se em revisão de literatura especificamente de teóricos do assunto em questão. A mesma abrange leitura, análise e interpretação de livros, revistas e artigos científicos, etc. A pesquisa exploratória estabelece critérios, métodos e técnicas para a elaboração de uma pesquisa e visa oferecer informações sobre o objeto. Segundo GIL (2008) as pesquisas exploratórias tem por finalidade desenvolver, esclarecer e modificar conceitos e ideias, tendo em vista a formulação de problemas mais precisos ou hipóteses pesquisáveis para estudos posteriores. As pesquisas exploratórias visam proporcionar uma visão geral de um determinado fato.

Para a construção do tema e o desenvolvimento do artigo foi feito uma pesquisa de conceitos sobre violência, violência doméstica e familiar contra a mulher e a Lei 11.340/06, Lei Maria da Penha com objetivo de observar como se dá a violência contra a mulher no âmbito doméstico e familiar e a aplicabilidade da citada Lei neste contexto. Para tal foi utilizados como metodologia uma pesquisa bibliográfica através de artigos científicos, revistas, livros, cartilhas sobre a Lei Maria da Penha, dicionários e sites na internet sobre o tema violência doméstica e familiar contra a mulher e a Lei Maria da Penha. Quanto aos livros, dicionários e artigos científicos impresso para a construção deste artigo, estes estavam disponíveis na biblioteca do campus I da Universidade Católica de Brasília. Bem como outros livros e revistas, que também foram utilizados na elaboração do artigo estes foram disponibilizados na biblioteca Cyro dos Anjos no Tribunal de Contas do Distrito Federal, pela busca de palavras chaves: violência doméstica e familiar contra a mulher e a Lei Maria da Penha. Para a realização desta pesquisa foram utilizados livros, artigos e revistas com publicações consideradas no período de 10 anos. A leitura critica do material

18

coletado foi baseada no levantamento de informações e dados estatísticos consultados em diversos sites; tais como Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da Republica, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), Instituto Avante Brasil, Datasenado, Mapa da violência e a Central de Atendimento à Mulher ligue 180. 4. RESULTADOS 4.1 Análises e dados sobre a violência contra a mulher e a Lei Maria da Penha

Em pesquisa realizada pelo o Instituto Avante Brasil, apontou que 40.000 mil mulheres foram vítimas de homicídios no Brasil, entre 2001 e 2010. Só no ano de 2010, 4,5 entre 100.000 mulheres perderam suas vidas no país. Em 2012, ocorreram 4.719 mortes de mulheres por meios violentos no Brasil, ou seja, 4,7 2assassinatos para cada 100 mil mulheres. Entre 1996 e 2012 houve um crescimento de 28%. Na última década com números disponíveis (2002-2012), o crescimento foi de 22.5% no número absoluto de homicídios, vez que em 2002 constatou-se 3.860 mortes e, em 2012, 4.719 (IAB, 2012, TEXTO DIGITAL). O estudo acima citado demonstra um aumento no número de homicídios de mulheres no Brasil nas últimas décadas, contudo pouco expressivo com relação às décadas anteriores, e, se for levado em considerando que tal aumento pode ser justificado pelo fato da Lei 11.340/06 ter somente entrado em vigor em 2006, portanto estando recente e sendo adaptadas a novas normas e o reconhecimento de todos, naturalmente, em tão pouco tempo, os resultados não poderia ser outro, contudo. A Lei trouxe garantias, mais assistência social, preservou os direitos patrimoniais das mulheres, criou regras mais duras para punir e manter temido o agressor; abriu caminhos para novos resultados, porem, positivos. Desde 2006, quando a Lei Maria da Penha foi sancionada, o número de mulheres mortas dentro do lar se estabilizou. De acordo com o IPEA, é 5,43 óbitos para cada 100 mil mulheres, número que seria maior sem a aplicação da Lei. Outra pesquisa realizada pelo Datasenado em 2013 relatou que a Lei Maria da Penha é conhecida por 99% das brasileiras e que 66% se sentem mais protegida desde a aprovação da Lei. Esse índice entre as mais jovens chega aos 71%. A pesquisa do Datasenado também revelou que, apesar das mudanças, no combate à violência contra as mulheres ainda existe um extenso caminho a ser percorrido. É possível aferir que 700 mil brasileiras permaneçam ainda lidando com agressões, sobretudo de seus parceiros. A pesquisa mostrou que 13 milhões das mulheres, 19% da população feminina maiores de 16 anos já foram vítimas de qualquer tipo de agressão. Ainda segundo a pesquisa

2 Instituto Avante Brasil- IAB (Instituto de Prevenção do crime e da violência) é uma entidade sem fins lucrativos, e que vem facilitar o acesso às informações e pesquisas sobre os mais diversos temas acadêmicos e científicos. Disponível em: http://institutoavantebrasil.com.br/o-instituto. Acesso em: 03/05/2015

19

Em todo o país, as mulheres de menor nível educacional ainda são as mais agredidas 71% dessas relatam aumento de violência em seu cotidiano. E 31% das vitimas ainda convivem com o agressor. A violência física predomina, mas cresce o reconhecimento das agressões moral e psicológica. Segundo a pesquisa do Datasenado o medo, ainda é o maior inibidor das denúncias de agressões. E em segundo lugar a dependência financeira que vem curiosamente registrada entre mulheres de melhor condição financeira (DATASENADO, 2013, TEXTO DIGITAL).

Os resultados das pesquisas comprovam que a violência doméstica e familiar contra as mulheres é uma amostra verdadeira da história de desigualdades culturais entre homens e mulheres, de poder e da força física masculina. Os dados expostos acima revelam também que a Lei Maria da Penha é conhecida pela maioria da população, portanto, o que os impede de acioná-la é o medo, que ainda é o maior inibidor das denúncias de agressões, seguido da dependência financeira. Além disso, a Central de Atendimento à Mulher – Ligue 180, da Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República (SPM-PR) mostrou que 3Cerca de 77% das mulheres em situação de violência sofrem agressões semanal ou diariamente, conforme dados dos atendimentos realizados de janeiro a junho de 2014. O Ligue 180 nos primeiros seis meses realizaram 265.351 atendimentos, sendo que as denúncias de violência corresponderam a 11% dos registros, ou seja, foram citadas 30.625 ocorrências. Em 94% deles, o autor da agressão foi o parceiro, ex-parceiro ou um familiar da vítima. Os dados mostram ainda que a violência doméstica também afeta os filhos com frequência em 64,50% os filhos presenciaram a violência e, em outros 17,73%, além de presenciar, também sofreram agressões (SPM-PR, 2014, TEXTO DIGITAL). Ainda de acordo a Central de Atendimento a Mulher

Em 2014, foi divulgado em balanço que cerca de 20.000 denúncias foram encaminhadas aos órgãos de segurança pública e ao sistema de justiça. Houve um aumento de 50% nos registros de cárcere privado e de 18% no número de estupros denunciados e que após nove anos de funcionamento e com mais de quatro milhões de atendimentos desde sua criação em 2005, o Ligue 180 é cada vez mais acessado pelas mulheres brasileiras, cobrindo atualmente cerca de 70% de todos os municípios do país. Outra importante conquista foi à interiorização do serviço, que, em 2014, quadruplicou o número de atendimentos prestados a pessoas da zona rural em relação ao ano de 2013 (SPM-PR, 2014, TEXTO DIGITAL).

Nos dados divulgados pela central de atendimento percebe-se um aumento nos números de denúncias, isso mostra a importância desse serviço prestado em todo o país, vale lembrar que a Central de Atendimento a Mulher funciona 24 horas por dia. O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) divulgou em abril de 2015, em Brasília, um estudo sobre a efetividade da Lei Maria da Penha (LMP). Os resultados indicaram que a Lei fez diminuir em cerca de 10% a taxa de homicídio contra as mulheres dentro das casas. Embora tenha esta evolução, percebe-se que

3 A pesquisa Data Senado realizada em 2013 é a quinta de uma serie histórica que começou em

2005.

20

a efetividade da Lei não se deu de modo igual no país, por motivo dos “diferentes graus de institucionalização dos serviços protetivos às vítimas de violência doméstica” (IPEA, 2015, TEXTO DIGITAL). Conforme o IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), para que haja uma redução4 nos números de homicídios o Estado deve ter o compromisso de acolher e proteger a mulher em situação de violência, e ainda por medidas para conter a desigualdade de gênero no Brasil. E segundo a pesquisadora responsável pelo documento, Leila Posenato Garcia, a Lei Maria da Penha originou avanços na responsabilização e prevenção à violência contra as mulheres, mas para sua completa efetivação a sociedade brasileira precisa ter uma mudança de mentalidade. Pois, “nenhuma legislação por si só resolve o problema, uma vez que a desigualdade de gênero existente na sociedade alimenta a violência contra a mulher”, avalia (IPEA, 2015, TEXTO DIGITAL). Os autores Knippel e Nogueira (2010, p.137) ressaltam que a Lei Maria da Penha em “si já foi uma inovação, porem não atingiu o resultado almejado. Este, só será possível, através da educação e do amparo do Estado para com as vitimas de tantas injustiças”. Entretanto, vale comentar que não é fácil derrotar uma violência enraizada na cultura e que não conhece fronteiras de classe social, raça, e cor. A secretária de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres da SPM-PR (Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República), Aparecida Gonçalves, confirma essa questão e diz que “O Estado deve atuar fortalecendo os serviços especializados, garantindo acesso à informação e proteção às mulheres, conforme a Lei determina” (SPM-PR, 2015, TEXTO DIGITAL). Como foi mencionado no capitulo anterior à violência contra a mulher é histórica e tem relação direta com o patriarcado, pois durante muito tempo a mulher foi vitima de uma situação de dominação e submissão do homem. “Desde que o mundo é mundo humano, a mulher sempre foi discriminada, desprezada, humilhada, coisificada, objetificada, monetarizada” (DIAS, 2010 p.18). A autora confirma ainda que a desigualdade entre homem e mulher é milenar, e que a sociedade ainda cultiva valores de violência. E que em grande parte da historia, o patriarcado era aceito e legalizado pela sociedade. A Lei Maria da Penha veio para requerer uma verdadeira mudança nos valores que naturalizam a violência doméstica e familiar, em que durante séculos, os padrões de superioridade masculina e submissão feminina foram aceitos por toda sociedade (CFEMEA, 2007). Desde sua aprovação em 2006 a Lei Maria da Penha é avaliada como uma das grandes conquista para todas as mulheres brasileiras, pois ampliou mecanismos que considera a violência contra a mulher uma ofensa aos direitos humanos. Para tanto as conquistas se deve aos movimentos feministas e a lutas das mulheres em prol de seus direitos. O resultado da pesquisa mostra um significativo avanço na questão da violência contra a mulher no que se refere às denúncias e o reconhecimento da

4 Segundo Waiselfisz (2012) entre 1980 e 2010, mais de 92 mil mulheres foram assassinadas, sendo

43,7 mil só na última década, ou seja, em média, a cada 2 horas uma brasileira foi morta por condições violentas. O Mapa da Violência mostrou ainda que é no ambiente doméstico que mais ocorrem às agressões contra as mulheres. No estudo, em 71,8% dos atendimentos registrados a violência aconteceu na residência da vítima e 41% das mortes femininas ocorreram dentro de casa.

Em 42,5% dos casos, o agressor é o marido, namorado, companheiro ou ex-companheiro da mulher.

21

mulher por seus direitos e sua autonomia, identificando a Lei Maria da Penha como um meio de proteção a mulher no enfretamento e combate a violência, e que a Lei por si só não resolve o problema, espera-se que o Estado tenha mais comprometimento com a questão e a efetivação da Lei tal qual como determina.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A violência contra a mulher no âmbito doméstico e familiar, descrito neste artigo, teve como objetivo compreender o que motiva a violência contra a mulher no ambiente doméstico e familiar, especialmente, aquelas que são mortas por causa da agressão violenta que sofre por parte dos ditos parceiros do convívio doméstico e familiar. Também na tentativa de entender o aumento, cada vez maior, da violência envolvendo a mulher, tendo em vista o que tem sido feito para combater esse tipo de violência contra o gênero feminino. Para tanto, foi feito uma análise na literatura acadêmica, na legislação e em sites que tratam da temática sobre gênero e violência contra a mulher. Tendo em vista o que foi discorrido ao longo do trabalho na busca de compreender os conceitos de violência através dos textos e autores presente nesta pesquisa, percebe-se que a violência é um fenômeno complexo e longo, perpassando toda a história da humanidade, estando enraigada na cultura, dificultando, portanto, pensar em erradicar uma violência com raízes tão profundas. Enraizada, uma vez que existe consenso entre os estudiosos sobre a temática, que a violência que sofre as mulheres no ambiente doméstico e familiar, é uma história antiga, e o sistema patriarcal é um dos maiores contribuidores dessa história durante séculos, e que ainda persiste em nossa sociedade. Infelizmente, constata-se, no decorrer do trabalho, que ainda existe uma cultura machista que coisifica o corpo da mulher, no qual o homem acha que tem direitos sobre ela, tendo em vista os números elevados de agressões e mortes de mulheres dentro de casa, causados pelos seus próprios companheiros. . De acordo com o descrito neste trabalho e com o que articulam alguns autores, um dos fatores que desencadeiam a prática de violência contra a mulher é pelo simples fato de ser mulher, ou seja, a mulher sofre violência no ambiente doméstico ou fora dele em função do gênero feminino, daí o nome de violência de gênero porque esta está relacionada à condição de subordinação da mulher dentro da sociedade. Outro aspecto é a desigualdade estabelecida pelo sistema patriarcal que ditou a relação de poder do homem sobre a mulher, dando origem a ideia de superioridade dos homens em relação às mulheres e a diferença de gênero. Atualmente, infelizmente, verifica-se ainda a existência de situações de subjugo na sociedade contemporânea e que, por isso, continuam fortalecendo as desigualdades de gênero. A despeito da cultura machista, que continua atuante, a mulher sempre foi vista como um ser inferior e submisso ao homem, o que fazia com que, anos atrás, a questão da violência fosse colocada de lado. Daí veio o “basta”, a mulher já não quis mais aceitar a condição de inferior, incapaz a que teve toda a vida. O avanço das mulheres em termos sociais e culturais é exprimido na luta pela sua própria emancipação, saiu de casa em busca do direito de ser dona de si mesmo, e adquiriu mais informação, mais autonomia financeira, mais denúncias, quebrando o conceito

22

de frágil a qual foi submetida ao longo da história, porém, isso acarretou vários conflitos sociais. Outro aspecto verificado, e que tem servido de estimulo a violência praticada contra as mulheres é a impunidade, materializada na certeza de que nada acontecerá ao suposto autor ou pelo desconhecimento da legislação ou outros fatores específicos. Motivos que vem contribuindo para a ideia de que a violência não será vencida tão facilmente, sendo necessário um maior esforço por parte de todos, como, respectivamente, o Estado e a sociedade. Entretanto essa realidade que segundo o mapa da violência (2012) a cada duas horas uma mulher é assassinada sendo a maioria em sua residência, vitimas dos seus próprios parceiros, começou a ser modificada com a aprovação da Lei 11.340/2006, conhecida popularmente como Lei Maria da Penha. Neste cenário de violência, a Lei Maria da Penha apresenta de modo minucioso, os conceitos e diferentes formas de violência contra a mulher, esperando ser um instrumento de transformação política, jurídica e cultural, indicando mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a Mulher, bem como medidas de prevenção da violência, de proteção e assistência integral à mulher. Contudo mesmo com a criação da Lei Maria da Penha, a problemática ainda é grande, o Estado precisa ampliar ainda mais seus esforços no que diz respeito à violência que sofre a mulher no lar, executando as medidas que visam punir, prevenir e combater a violência com mais rigor, tal qual a Lei determina. E a sociedade precisa consciência de que a violência contra a mulher é um crime e uma violação dos direitos humanos e deve ser denunciada. Um desafio para a sociedade, inclusive para os profissionais que trabalham com a violência e a violência de gênero, principalmente, para o assistente social que atua diretamente na qualidade dos serviços prestados á população, sem discriminar, por questões de inserção de classe social, gênero, etnia, religião, orientação sexual, idade e condição física, para tanto, são desafios que devem está apropriados às novas exigências da sociedade, especialmente, sobre as relações de gênero que se associam ao poder e a violência, exigindo a intervenção de profissionais da área do serviço social. Esta pesquisa, alcançando a proposta prevista tenciona contribuir, também, para a construção de uma nova visão a respeito da violência contra a mulher no ambiente doméstico e familiar, e na tentativa de esclarecer que o Estado é um dos maiores responsáveis por essa expressão da questão social, colaborando, quem sabe, para que os supostos autores tenham consciência da punição frente à agressão proferida contra a mulher e a certeza de que não ficarão impunes diante dessa nova realidade. Pretende-se, ainda, incutir na sociedade a importância de políticas publicas que diminuam, no futuro, os efeitos, nocivos, da violência praticada contra a mulher atualmente. Diante de todo o processo desenrolado ao longo deste trabalho, percebe-se que a violência contra a mulher faz parte de um processo histórico, não sendo facilmente vencida. Contudo, é importante salientar que na tentativa de erradicação da violência contra a mulher, uma série de medidas protetivas vem sendo criadas e empregadas visando à solução dessa problemática. Logo não se pode falar em acabar com a violência doméstica no âmbito familiar contra a mulher sem que haja um envolvimento completo da sociedade. É preciso que as mulheres que sofrem agressão tenham a coragem para denunciar o agressor, pois agindo assim, ela está se protegendo contra futuras agressões e sua possível morte, além de incentivar outras mulheres a tomar a mesma atitude. Afinal,

23

enquanto houver a ocultação do crime sofrido, não é possível encontrar soluções para o problema. A Lei Maria da Penha estabelece medidas de prevenção, proteção e repressão à violência contra a mulher, promovendo mudanças para a superação da desigualdade entre homens e mulheres. A problemática da violência doméstica e de gênero, ainda que ela não seja erradicada totalmente, que seja amplamente discutida em sociedade, alcançando visibilidades e levando a negação da violência para que haja uma diminuição no número tão elevado de mortes de mulheres por violência que tem preocupado a população feminina. Frente a isso, constata-se que a hipótese levantada no inicio desse estudo confirmou-se, uma vez que a Lei 11.340/06 conhecida como Lei Maria da Penha vem contribuindo de maneira significativa nesta questão da violência contra a mulher no ambiente doméstico e familiar. Confirmando-se em um instrumento legal que dá apoio a outras políticas públicas, que tendem a informar e dar assistência às mulheres vitima de violência doméstica, pois segundo pesquisa, houve um aumento de denúncias que é necessária para que a Lei seja aplicada. VIOLENCE AGAINST WOMEN IN THE HOME AND FAMILY SCOPE AND MARY LAW PENHA: A LITERATURE REVIEW Resume: this article discusses violence against women in the home and family

environment. In order to understand what motivates aggression on women in the home and family environment, how the increase in ever-increasing violence involving women and what is has been done as a measure to combat this type of violence against women. The methodology used in the research was qualitative exploratory literature survey, conducted through scientific articles, books, booklets, websites and legislation on the subject. It is concluded that violence is a complex and diffuse event and is associated with gender relations. With the approval of Law 11,340 / 06 were significant innovations in relation to existing legislation in coping, fighting and punishing the aggressor the victim of violence woman. The complaints increased according to surveys performed.

Keywords: Violence against women; Domestic violence; gender; Maria da

Penha Law.

24

6. REFERÊNCIAS

AVILA, Maria Betânia. FERREIRA, Verônica. Trabalho produtivo e reprodutivo e os desafios para a igualdade de gênero. In: SOS Corpo Instituto Feminista para a Democracia. Comitê de gênero e Raça da Chesf. Recife, 2012. Disponível em:

http://www.chesf.gov.br/portal/page/portal/chesf_portal/conteudos_portal/docs/trabalho_reprod.pdf. Acesso em: 04/03/2015.

BASTOS, Marcelo Lessa. Violência Domestica e Familiar Contra a Mulher- Lei Maria da Penha. Alguns Comentários. In: Estudos sobre as novas leis de violência doméstica contra a mulher e de tóxicos (11.340/06 e 11.343/06). Doutrina e Legislação. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2007.

BALANÇO 2014 LIGUE-180. Central de Atendimento a Mulher. Disponível em:

http://www.spm.gov.br/central-de-conteudos/publicacoes/publicacoes/2015/balanco180_2014-versaoweb.pdf. Acesso em: 10/04/2015.

BRASIL. Lei Maria da Penha: Lei 11.340 de 07 de agosto de 2006. Coíbe a violência doméstica e familiar contra a mulher. Secretaria de políticas para as mulheres Presidência da Republica. Brasília, 2011.

BRASIL. Lei Maria da Penha. Lei 11.340 de 07 de agosto de 2006. Conheça a lei que protege as mulheres da violência doméstica e familiar. Secretaria de Políticas para as Mulheres Presidência da Republica. Brasília, 2013.

BRASIL. Secretaria de Políticas para Mulheres. Presidência da República.

Central de Atendimento a Mulher. Ligue 180. Disponível em: http://www.compromissoeatitude.org.br/dados-do-ligue-180-revelam-que-a-violencia-contra-mulheres-acontece-com-frequencia-e-na-frente-dos-filhos/,Acesso em:10/04/2015.

BRASIL. Presidência da República. Disponível em:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13104.htm. Acesso em: 17/04/2015.

BRAZÃO, Analba et al. Violência contra as mulheres: uma historia contada em décadas de lutas. 1º Ed. Brasília/ CFEMEA: Ars ventura & comunicação, 2010.

CAMPOS, Amini Haddad. CORRÊA, Lindinalva Rodrigues. Direitos Humanos das Mulheres. Curitiba: Juruá, 2009.

CARLOTO, Maria Cássia. Conceito de gênero e sua importância para análise das relações sociais. Disponível em:

http://www.uel.br/revistas/ssrevista/c_v3n2_genero.htm. Acesso em 26/03/2015

25

CFEMEA – CENTRO FEMINISTA DE ESTUDOS E ASSESSORIA – Lei Maria da Penha: do papel para a vida. Comentários à Lei 11.340/2006 e sua inclusão no ciclo orçamentário. Brasília, 2007.

DATA SENADO. Violência Domestica e Familiar contra a Mulher. Disponível em: http://www.senado.gov.br/senado/datasenado/pdf/datasenado/DataSenado-Pesquisa-Violencia_Domestica_contra_a_Mulher_2013.pdf. Acesso em: 10/04/2015

DIAS, Maria Berenice. Alei Maria da Penha na Justiça: A efetividade da Lei 11.340/06 de combate à violência domestica e familiar contra a mulher. 2º ed.rev.atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010.

DICIONARIO INFORMAL. Disponível em: http://www.dicionarioinformal.com.br/significado/feminic%C3%ADdio/7365/. Acesso em: 17/04/2015.

GEBRIM, Luciana Maibashi. BORGES, Paulo Cesar Corrêa. Violência de gênero: Tipificar ou não o femicidio/ feminicidio? In: Revista de Informações Legislativa. V.51, n.202. Brasília, abr/jun, 2014.

GIL, Antonio Carlos. Métodos e técnicas de pesquisa social. 6ª ed. São Paulo: Atlas, 2008.

GONÇALVES, Rosana. Violência doméstica e familiar contra a mulher: percepções das abrigadas sobre a casa abrigo. Trabalho de conclusão de curso (Graduação em Serviço Social) Universidade Católica de Brasília. Brasília, 2010.

HAYECK, Cynara Marques. Refletindo sobre a violência. In: Revista Brasileira de

Historia e Ciências Sociais. Ano I n.1- junho, 2009. Disponível em: http://www.rbhcs.com/index_arquivos/Artigo.Refletindo%20sobre%20a%20viol%C3%AAncia.pdf. Acesso em: 03/05/2015.

INSTITO AVANTE BRASIL. Disponível em: http://institutoavantebrasil.com.br/topicos/mapa-da-violencia-contra-a-mulher/. Acesso em: 17/04/2015.

INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLICADA. Disponível em: htt/www.compromissoeatitude.org.br/ipea-divulga-pesquisa-sobre-a-e. Acesso em: 10/04/2015.

KNIPPEL, Edson Luz. NOGUEIRA, Maria Carolina de Assis. Violência Doméstica: A Lei Maria da Penha e as normas de Direitos Humanos no Plano Internacional. Porto Alegre: Ed. Sergio Antonio Fabris, 2010.

LAVORENTI, Wilson. Violência e Discriminação Contra a Mulher: Tratados Internacionais de Proteção e o Direito Penal Brasileiro. Campinas, SP: Millennium, 2009.

26

LEONEL, Juliano de Oliveira. Aspectos e jurídicos da violência doméstica contra a mulher e a responsabilidade internacional do Estado. Dissertação (mestrado).

Universidade Católica de Brasília. Brasília, 2012.

LIMA, Fausto Rodrigues. SANTOS, Claudirene. Violência Doméstica. Vulnerabilidade e Desafios na Intervenção Criminal e Multidisciplinar. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009.

LIMA, Paulo Marco Ferreira. Violência contra a mulher: O homicídio privilegiado e a violência doméstica. São Paulo: Atlas, 2009.

MELO, Hildete Pereira. CASTILHO, Marta. Trabalho reprodutivo no Brasil: quem faz?In: Rev.econ.comtemp. vol.13 no.1Rio de Janeiro. 2009. Disponível em:

http://www.scielo.br/pdf/rec/v13n1/06.pdf.Acesso em 31/03/2015.

NARVAZ, Martha Giudice. KOLLER, Helena Silva. Famílias e patriarcado: da prescrição normativa à subversão criativa. In: Psicol. Soc.vol.18 no. 1. Porto Alegre, 2006. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=s0102-71822006000100007&script=sci_arttext.Acesso em:04/03/2015.

NETA, Joana da Silva. Ligue-180 como instrumento de enfretamento a violência de gênero e acesso a direitos. Trabalho de conclusão de curso (Graduação em

Serviço Social). Universidade Católica de Brasília. Brasília, 2013.

ROCHA, Sandro Caldeia Marron. Abordagem a Lei de Violência Domestica Contra a Mulher-Lei 11.340/06. In: Estudo sobre as novas leis de violência

domestica contra a mulher e tóxicos (11.340 e 11.443/06). Doutrina e Legislação. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2007.

ROSSO, Sadi Dal. Teoria do valor e trabalho produtivo no setor de serviços. In: Cad.CRH vol.27 no. 70 Salvador Jan/abr. 2014. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-49792014000100006&lng=pt&nrm=iso. Acesso em 20/03/2015.

SILVA, Kalina Vanderlei. SILVA, Maciel Henrique. Dicionário de conceitos históricos. 3º. Ed. São Paulo: Contexto, 2010.

SOUZA, Sergio Ricardo. Comentários à lei de combate a violência contra a mulher. 3º Ed. Curitiba: Juruá, 2009.

WAISELFISZ, Julio Jacob. Mapa da violência 2012. Atualização: Homicídio de mulheres no Brasil Disponível em:

http://www.mapadaviolencia.org.br/pdf2012/MapaViolencia2012_atual_mul. Acesso em 10/04/2015.