Violino, arte e ciência(1)

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    Violino, arte e cincia

    A um violinista...

    -Assim no teu violino, artista! adormecido

    A espera do teu arco, em grupos vaporosos,

    Dorme, como num cu que no alcana o ouvido,

    Um mundo interior de sons misteriosos...

    Olavo Bilac

    Albert Einstein com seu violino em Princentown

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    Para os fsicos, importante lembrar que um violino no se comporta simplesmentecomo um transdutor acstico, o instrumento incorpora e transmite ao ouvinte, atravs da

    psico-acstica, a alma do artista.

    Weisswasser

    -Le Messie de Salabue-Antonius Stradivarius Cremonenfis

    Faciebat Anno 1716

    1- Breve histria de uma obra prima:

    Charles Beare, trinta anos atrs, constatou que os luthiers enfrentavam o desafio deequiparar-se Vuillaume, para no mencionar os grandes mestres de Cremona. SimoneSacconi, o grande copista depois de Vuillaume, durante os anos sessenta, fez uma rplicaperfeita do Stradivarius Hellier de 1679, hoje exposta no Museu de Cremona. Seusseguidores acreditam, que todas as tcnicas dos luthiers cremoneses, incluindo

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    Stradivari, tenham sido descobertas, e, que suas cpias modernas necessitam to somentede um certo tempo de maturao, (no se sabendo ainda, se esse certo tempo, ser otempo certo, em estado de inrcia ou tangidas) para que finalmente possamos ter violinoscom a sonoridade e timbre comparveis s grandes criaes dos arteses clssicos.Aceitar essa tese, ainda que na posteridade, leva-nos a buscar respostas definitivamente

    esclarecedoras, diversas perguntas enigmticas: Citando-se o Stradivarius Messias /ex-Salabue de 1716 como referncia a esse questionamento, pela analogia crtica queessa magnfica obra de arte da lutheria enfrentou no apagar das luzes do sculo XX, talqual anteriormente passou o Homem de Piltdown, pelos meandros da antropologia,cabe-nos formular a seguinte pergunta: Como um violino com quase trezentos anos,encontrando-se em estado de conservao impecvel e nico, jamais visto entre seuspares, e, sendo musicalmente verde, ter uma sonoridade qualificada como, um bouquetde suavidade e imponncia? Essa opinio foi emitida em 1891, por Joseph Joachim,para muitos, o maior violinista e professor do sculo XIX, quando o violino estava naposse do colecionador Robert Crawford. O Messias, teve seu nome atribudo porDelphin Alard, violinista e professor do Conservatrio de Paris, que tambm, era genrode Vuillaume. Esse episdio teria ocorrido durante uma das costumeiras visitas Parisde Luigi Tarisio, o maior de todos os colecionadores, ento proprietrio do violino, aindaconhecido como Salabue, que sempre alardeava aos msicos e luthiers da cidade sobre ogrande violino de 1716 que tinha adquirido do colecionador, o conde Cozio. Alard,presente na ocasio, em tom jocoso, teria dito a Tarisio: Ah, a, votre violon est donccomme le Messie; on lattend toujours, et, il ne parait jamais-Esse seu violino como oMessias, que esta sendo sempre esperado, mas nunca aparece. Alard, que aps a mortedo sogro, veio a possuir o violino, foi o nico violinista profissional que o deteve em todasua existncia, mesmo assim, tudo indica que no tenha sido tocado seguidamente pormais de quinze anos, tempo considerado muito aqum daquele satisfatrio, e necessriopara o ajuste da sonoridade atravs do envelhecimento. Nas opinies de Remy Prencipe eGuido Pasquali, segundo tambm os Hill, para amaciar a caixa de ressonncia doviolino, atravs do encordamento, so necessrios de cincoenta a sessenta anos para osviolinos de Stradivari e Del Ges. Sabemos que aps a posse de Robert Crawford, oviolino quase no foi tocado, passando o restante do tempo de sua existncia em poder decolecionadores extremamente zelosos. Essa intangebilidade, valorizou e, atribuiu-lhe acaracterstica de objeto de arte colecionvel, hoje, como pea integrante da coleo Hill,no acervo do Museu Ashmolean de Oxford. A mstica lendria do violino iniciou-sequando o mestre cremons resolveu dar-lhe a vida em 1716, a partir do molde internoPG Piu Grande, (ou PS, como leram os Hill, gravados na base do cravelhal,especulando, inicialmente, ter sido obra de seu filho, Paolo Stradivari) permanecendopor mais de vinte anos em seu Ateli como modelo, ou pea de vitrine, at sua morteem 1737, portanto como um violino intocado. Sabemos que Antonio Stradivari no fezsucessores com seu gabarito, quer em famlia, ou fora dela, como foi o caso dos Amati.Entretanto, o violino continuou sua permanncia no Ateli, sob gide de seu filho eherdeiro Francesco, at a morte deste, em 1744. Com a morte de Francesco, seu irmoPaolo Stradivari, herdou tudo que lhe pertencia, inclusive o Ateli, onde permaneciadescansando o Messias, juntamente com cerca de uma centena de outros instrumentosinacabados. Sendo um luthier ainda menos habilidoso que o falecido irmo, e, maisinteressado em outras atividades lucrativas no ramo de tecidos, Paolo Stradivari recorreuao luthier Carlo Bergonzi, que alem de empregado, foi seu inquilino no Ateli, para que

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    este pudesse montar e vender os instrumentos. Na busca de interessados, vendendo suaherana, Paolo vem a conhecer o conde Cozio de Salabue, o primeiro dos grandescolecionadores de violinos raros, e rico bastante para comprar todo o esplio Stradivari.Assim, durante o ano de 1775, inicialmente o conde Cozio adquire de Paolo o famosoviolino, para em seguida comprar todos os demais que restavam no Ateli, totalizando

    cerca de uma dzia de instrumentos. A admirao, e o respeito que Cozio tinha porStradivari, foi alem dos violinos que comprara. Insistentemente, fez com que Paolovendesse a ele todo o ferramental, e, os moldes que estavam no Ateli Stradivari,devidamente documentado e autenticado, para que nenhuma coisa que tivesse pertencidoao extinto Ateli de Antonio Stradivari permanecesse em Cremona, que por esse motivo,quase que acabou por perder o vnculo histrico que teve com os Stradivari. Por mais demeio sculo o violino esteve em poder do conde, at que no ano de 1823, por obstinadainsistncia de Luigi Tarisio, Cozio concordou em desfazer-se de seu grande violinoStradivaius de 1716. Tarisio, um carpinteiro de profisso, era tambm uma das maioresautoridades em violinos raros da poca, alem de ter sido o maior de todos oscolecionadores do instrumento, em toda sua historia. Essa constatao surgiu, quandode sua morte, na casa de cmodos onde vivia, em Milo, no final do ano de 1854. Seucorpo foi encontrado abraado dois violinos, e, espalhados pelos cmodos doapartamento, estavam guardados mais de cento e cincoenta instrumentos, incluindo oMessias. Imediatamente informado do ocorrido com Tarisio em Milo, o luthierparisiense Jean-Baptiste Vuillaume, lembrou-se da conversa que Tarisio tivera com seugenro Alard, por ocasio do batismo do Messias, em seu Ateli, enfocando o magnficoviolino Stradivarius de 1716, que nunca tivera sido tocado, ou modificado, desde quesara da posse da familia Stradivari. Era a ocasio perfeita para um grande e habilidosocopista, como foi Vuillaume, em descobrir os segredos do maior dos mestres cremoneses.Assim, na posse de vultosa soma em dinheiro, Vuillaume partiu para Milo, maisprecisamente para um pequeno sitio na localidade de Fontaneto, onde residiam osherdeiros de Tarisio. Reunido todo o espolio instrumental de Tarisio, Vuillaumeconsegue comprar de seus herdeiros cerca de cento e cincoenta instrumentos, incluindoo Messias, realizando, o que se tem noticia, ate hoje, a maior transao da historia doviolino. Vuillaume, desmonta o Messias em seu ateli particular da rua Ternes,analisando minuciosamente cada pea, medida, posio, constituio, modelagem, e,acabamento, a fim de obter uma reproduo perfeita da obra prima do mestre Stradivari.A partir de ento, alem de ser o mais famoso violino da historia, o Messias, passava sertambm o mais copiado. Muito mais preocupado com a esttica, considerando aaparncia externa do violino, Vuillaume no se deu conta que Stradivari trabalhava apartir de moldes internos para fabricar seus instrumentos, coisa que s foi descobertamuito tempo depois, por Simoni Sacconi, quando teve acesso s ferramentas do mestre,que provenientes da coleo do conde Cozio, foram acabar no Museu de Cremona, ondeSacconi estava trabalhando. Vuillaume achou por bem manter o violino intacto, mesmonas adaptaes menores para os virtuosi da poca, morrendo em 1875, sem terdescoberto os segredos de Stradivari. As filhas de Vuillaume herdaram o violino, e apsalgum tempo Alard acabou por comprar a parte da cunhada, tornando-se seu novoproprietrio. Com a morte de Alard, em 1890, suas herdeiras entregaram o violino firma W.E. Hill e filhos, para que buscasse um comprador altura do instrumento. Portrs vezes consecutivas, o violino foi vendido diferentes interessados, mas, por um fatoinusitado, ou quem sabe, um fascnio, sempre acabou por voltar para a posse dos Hill,

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    sem nunca mais deixar a Inglaterra. Nesse vai e vem, inicialmente o violino pertenceu Robert Crawford de Edinburgo, de 1891, (quando autorizado a ser experimentado porJoachim) at 1897.Em seguida, ao tenor italiano Ernesto Niccolini, um dos maridos daDiva Adelina Patti, at 1904, passando a ser guardado no castelo Craig-Y-Nos,pertencente famosa soprano, voltando em seguida posse dos Hill. Novamente, os Hill

    decidem por vende-lo Richard Bennett, de Lancashire, o ltimo dos colecionadoresparticulares, onde permaneceu at o ano de 1928, quando volta definitivamente para acoleo dos Hill. No incio da segunda grande guerra mundial, os Hill mandamconstruir uma galeria, e, resolvem doa-lo, no ano de 1939 juntamente com outrosinstrumentos ao Museu Ashmolean de Oxford, onde permanece intacto h setenta anos.

    Possuidor DesdeNaosse

    At Preo pago

    Ashmolean Museum in Oxford,

    Hill Collection1939

    W.E. Hill & Sons 1931 1939...Richard Bennett (Lancashire) 1913 1928

    W.E. Hill & Sons 1904 1913...

    Ernest Niccolini 1897 1904Robert Crawford (Edinburgh) 1891 1897

    W.E. Hill & Sons 1890 1891

    Delphin Alard 1875 1890

    Jean-Baptiste Vuillaume(Paris) 1855 1875

    Luigi Tarisio 1827 1854Count Cozio di Salabue 1775 1827

    Paolo Stradivari 1743 1775Francesco Stradivari 1737 1743

    2- Acertos e desacertos da arte e da cincia:

    A cincia tem demonstrado sua incapacidade em decifrar os segredos de Stradivari, e, astentativas de imita-lo tem sido fadadas ao fracasso. As copias do Messias, desde Giuseppe

    Rocco e Vuillaume, hoje, bastante amadurecidas, demonstram que a sonoridadeesperada esta muito aqum da desejada. Portanto, o envelhecimento, pelo uso, quer nosparecer que no o fator preponderante para alcanar-se a sonoridade e o timbre dovelho cremons. Ate hoje a fisico-qumica no conseguiu determinar se houve, e quaisforam os tipos de reaes qumicas, entre os sais ou as bases estveis presentes namadeira, em seu selante, ou talvez no verniz, em contato com o cido rico, ou mesmo,atravs dos agentes naturais do intemperismo aliados ao envelhecimento, presente aoxidao fotoqumica, e, principalmente, se todos esses fenmenos, total ou

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    parcialmente, interferem na sonoridade. As pequenas modificaes nos violinos antigos,a partir do sculo XIX, limitaram-se ao brao, que recebeu um enxerto com inclinaopara trs, ao espelho cnico, que foi aumentado e mais achatado para ficar paralelo scordas, feita uma pequena alterao no ngulo da pestana. Para levar a cabo essasmodificaes, foi preciso aumentar a altura do cavalete, com isso, o estandarte, tambm

    teve seu ngulo de inclinao aumentado.Essas pequenas descaracterizaes do original,por no interferirem na caixa acstica, no diminuram em nada as qualidadesressonantes do instrumento, contudo, aumentaram a tenso sobre o tampo, por essemotivo, a barra harmnica teve que ser alongada a fim de distribuir uniformemente apresso sobre ele, impedindo que este pudesse rachar.Tais modificaes, quase queimperceptveis para o leigo, foram incorporadas ao pequeno instrumento simplesmentepara dar mais comodidade ao dedilhado pela mo esquerda dos virtuosi. Cabe ressaltarque, com o aumento de massa na barra harmnica que ocupa setenta e cinco por centode comprimento interno no tampo, e, sendo esta incorporada ele, seu diapason baixoulevemente.Uma sonoridade mais intensa e brilhante foi conseguida, nos Stradivarius,com a diminuio da convecsidade, ou, como querem os violeiros, um maioraplainamento do tampo, para os modelos de corpo alongado, e, o consequenteredimensionamento das aberturas ff, alm do aumento do diapason do L central,tambm para os demais violinos, inicialmente de 415 HZ para conjuntos de cmara, e,430 HZ, exigido para as pequenas orquestras de cmara at o sculo XIX, aos 440 HZatuais, procedimento adotado com a finalidade de alcanar a totalidade do volume dasgrandes salas de concerto modernas.

    O efeito do clima sobre as conferas alpinas, sobre as acercias, bem como s diversasoutras espcies de madeiras utilizadas na fabricao dos instrumentos de cordaeuropeus, assim como o amadurecimento ao sabor do intemperismo natural, e,mrmente, o tratamento qumico utilizado para protege-las aps sua supresso, tm sidoapontados como fatores responsveis pelo som inigualvel dos instrumentos fabricadospor Stradivari e por Del Ges. Os invernos europeus excepcionalmente frios do perodode 1645 a 1715, caracterizado como mini era do gelo, teriam afetado as madeirasutilizadas pelos mestres da Pennsula Itlica para a fabricao dos instrumentos,deixando-as mais fortes e densas,(exceto o bano, africano, que j possui naturalmenteessa caracterstica, sendo somente utilizado nas partes do instrumento que nointerferem na resposta acstica). As inmeras anlises dendrocronologicas, feitas apartir da ltima dcada do sculo passado, quando recaram as suspeitas sobre oMessias, (acreditando pudesse ser uma falsificao, de paternidade atribuda Rocco,ou Vuillaume), conseguiram indicar com certa exatido a idade dos instrumentosfabricados por Stradivari, e pelos demais luthiers de Cremona, demonstrando, tambm,uma alterao significativa no crescimento e formao dos anis do abeto alpino, e,como consequencia disso, um aumento de compactao nos caules, durante a mini erado gelo. Por outro lado, muito tempo foi perdido nas discusses e controvrsias sobre asformulas dos vernizes utilizados para permear a madeira e proteger o instrumento daumidade, da transpirao, e, do cido rico. As resinas naturais e artificiais, bem comoos corantes, desde a poca da alquimia medieval, e do proto-renascimento, tambmforamobjeto de anlises e discusses. Hoje, pelo fato de saber-se que todos os luthiers daEuropa utilizavam os mesmos vernizes moles, e, alguns o ambarino, essa discussoparece ter sido encerrada. Entretanto, mesmo considerando as formulas, qualitativa e

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    quantitativamente idnticas quanto aos reagentes utilizados no verniz cremons,comparado aos demais vernizes usados na poca, no se comprovou at hoje se aoxidao por via mida ou fotosinttica desses vernizes, associada ao envelhecimento,influem na sonoridade. Somente para ter-se uma idia dessa complexidade deingredientes na formulao dos vernizes, dos corantes, e nas possveis inter-reaes ao

    longo do tempo, basta citar que a espectometria de massa encontrou resduos de plen deflores silvestres no verniz de Stradivari, o que leva-nos ao campo de pesquisa dapaleobotnica. Quanto ao tratamento qumico da madeira, existem trs teorias plausveisaplicadas aos instrumentos cremoneses, especialmente aos de Stradivari, que ainda noforam comprovadas: A primeira diz respeito ao exame atravs da microscopia eletrnicapor difrao dos raios X, EDAX, que identificou determinada substancia mineralconhecida como Terra de Pozzolana, provavelmente coletada em jazida prxima aoVesvio, ou em ocorrncias mais afastadas, nos stios do Etna ou do Stromboli, quevinha sendo utilizada como selante ou liga de argamassa cimenteira, desde o ImprioRomano.O Pozzolana, nada mais do que cinza vulcnica; uma rocha muito cida,porosa, e leve, pela elevada presena de slica que contm, lixiviada e sedimentada depmices resultantes da micro-cristalizao dos gases expelidos atravs do conevulcnico, cujo fenmeno causado pelo alto impacto com a atmosfera. Ou seja, aspropriedades de baixssima densidade granulomtrica desse mineral, corroboravam comessas mesmas caractersticas presentes no abeto, extrado radialmente da tora utilizadapara talhar o tampo do violino, que, quando posto em vibrao, poderia anular asfrequencias de ressonncia esprias do espectro audvel, motivada pelo aumento demassa com mesmo peso especfico, e, ressonncia homognea, em sintonia com asaberturas ff (no querendo dizer com isto, que a caixa de ressonncia do violino venha afuncionar como um refletor de baixos, cujo princpio tem origem nos ressonadores deHelmholtz ). Quanto s propriedades seladoras desse mineral, sendo essa cinza vtrea,torna-se prova dagua, o que, alem de homogenizar a superfcie da madeira permitindoum brunimento incomparvel, favorecia a aplicao de diversas demos de um vernizmais mole e espesso, de secagem lenta por conter leo de linhaa, e corantenaturalmente avermelhado, mas com caractersticas de alto brilho, tcnica essa, quetambm j era conhecida pelo mestre cremons, sendo vivamente identificada noMessias. como dizem alegoricamente nossos gelogos: Se houve, ou se no houve oderrame de basalto sobre o deserto Botucatu; apareceu o arenito cozido. Todavia, nose sabe se existem outros componentes nesse preparo, como j dito acima, e, se elerealmente representa papel fundamental na alta qualidade tonal dos instrumentos deStradivari. A segunda teoria, que se aplica tambm aos outros mestres de Cremona,fundamenta-se na saturao da madeira pela gua, j que as toras de abeto, suprimidasnos Alpes, vinham flutuando at o seu destino pelo rio P.Essa situao de transporteteria mudado aps a ocupao da Europa por Napoleo, face aberturas de estradaspara movimentao de seus exrcitos. Como ltima teoria concernente qumica, cabemencionar a presena de resduos de sal na formula de NaCl (cloreto de sdio), emmolcula que no de halita, portanto na forma de sal marinho, encontrado eminstrumentos Cremoneses e do Veneto. Assim, possvel que, tanto Stradivari, quantooutros luthiers de Cremona, bem como, do prprio Veneto, tenham se utilizado de sobrasde marinha veneziana para fabricar seus instrumentos. Resta saber se a salinizaosomente acrescentava o fato de proteger mais a madeira contra a ao de brocas ecupins, ou se fator preponderante na incomparvel qualidade acstica e tonal dos

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    violinos, principalmente daqueles concebidos na fase urea do mestre, nos primeirosvinte anos do sculo XVIII.

    3- Concluses:

    A busca na criao de um violino perfeito, por parte de arteses, tcnicos, e cientistas daatualidade, leva-nos a estabelecer uma comparao entre a pseudologia fantasiosa deTartini e sua Sonata do Diabo:

    Sonhei certa noite, em 1713, que havia vendido minha alma ao diabo. Tudo obedecia aminhas ordens; meu novo criado se antecipava a cada um dos meus desejos e ossuperava todos. Finalmente, tive a idia de entregar-lhe meu violino, para ver o que fariacom ele. Foi grande o meu espanto ao ouvir uma sonata to bela e original, tocada comgrande superioridade e inteligncia, que eu nunca tinha ouvido algo parecido, nemmesmo imaginado que uma coisa to encantadora fosse possvel. Senti tanto prazer arrebatamento, surpresa que perdi o flego: a violncia daquela sensao me acordou.Imediatamente lancei mo do violino*, tentando reproduzir os sons que ouvira, mas emvo. A pea que compus ento verdadeiramente a melhor que jamais escrevi, e dei-lhe onome de Sonata do Diabo, mas ela to inferior ao que eu havia ouvido que se eupudesse me sustentar de outra maneira teria quebrado o meu violino e abandonado amsica para sempre.

    O sonho de Tartini - Sonata do Diabo - Duo Oistrakh-Yampolski em prensagem daColumbia inglesa.

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    *Nota: O violino que Tartini, lanou mo para compor a Sonata, objeto de seu sonho,por certo, no foi o Lipinsky, que somente veio a ser concebido pelo mestre Stradivaridois anos aps, em 1715, sendo Giuseppe Tartini seu primeiro possuidor, embora leve onome do virtuose polons. Cabe aqui conjecturar; E se o mesmo sonho tivesse ocorridodois anos depois ?

    Arteses e cientistas: trabalhando, disputando, desmontando, copiando, decifrando;Rocco, Vuillaume e Sacconi, para citar somente os melhores; pesquisando, formulando;Helmholtz, Savart, Saunders e Raman, guisa de equaes matemticas e formulasqumicas, das propores ureas elaboradas pelos gregos, a alquimia dos vernizes luzda qumica moderna dos espectometros, do ultra violeta, a microscopia eletrnica doEDAX no mago do telrico; os hierglifos de Pollens, os PG ou PS no cravelhal, dosHill; as fotografias de alta definio na dendrocronologia de Klein, e os desmentidos daslupas de Topham e McCormick, as contradies, de um lado, Pollens e a comunidadecientfica, e de outro, Beare a frente do Ashmolean e dos Hill, enfim, todos, e com tudode informao que acha-se a disposio da cincia, da tecnologia e da arte no final dosculo XX, e no conseguiu-se decifrar, nem sequer igualar, muito menos superar asonoridade de um violino de Antonio Stradivari. Nos parece que falta na sopa deingredientes - da cincia; o catalisador, talvez um crisol presente na grande colher, ouquem sabe, alguma pitada misteriosa da flor da mandrgora silente, a fim decomplementar sua receita diabolicamente perfeita. Quanto arte, parece faltar o gniodo entalhe no bordo (acercia) de uma voluta com espirais inspiradas em Vignola, eherdadas de Arquimedes, que, caso algum queira copiar, ou imitar, ser como umatentativa em re-esculpir o Moises de Michelangelo; ou seja, vale dizer que: O Diabo estapara o sonho de Tartini, assim como Antonio Stradivari esta para a arte da lutheria, paraa tecnologia, e, para a cincia que pretende desvendar seus mistrios.

    Quanto ao arco, modelo Tourte, idealizado por esse fabricante pedido de Viotti, comum todos os violinos de bons luthiers, era originalmente confeccionado em pau-brasil(Pernambuco) e cerdas de crina equina. Hoje, parece existir uma preocupaoexagerada por parte dos luthiers quanto substituio por madeira de mesma densidade,como a massaranduba, (no caso o aparaj, que apresenta tonalidade avermelhada, maisparecida com a colorao original) quando se sabe que pequena ou quase nenhumainfluencia exerce sobre a sonoridade, que no a de tenso mecnica (energia gerada pelomsico em relao posio e a presso do arco no ponto de tangencia com as cordas,como tambm de seu sentido ascendente ou descendente). Haja visto que, interpretesmais modernos e at contemporneos, como Emil Telmanyi, e Otto Buchner, dentreoutros, utilizam arcos dos periodos barroco e maneirista, como o Vega-Bach porexemplo, para interpretarem suas apresentaes e gravaes. O importante que o arcotenha tenacidade, seja to leve o quanto possvel, e mantenha a crina bem esticada.

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    Otto Buchner portando violino da escola do Tyrol com arco barroco em prensagemalem da Calig.

    Seria importante testar madeiras mais leves, flexveis e abundantes, de crescimentorpido e reflorestveis para essa finalidade, inclusive em testes com legno, madeiras

    tais como: a jaboticabeira e a goiabeira, ambas de extrema tenacidade. Outro fenmenoacstico que se apresenta, esta relacionado com as pequenas lascas de breu fundidaspelo atrito, e, desprendidas do arco, quando chocam-se com o tampo do violino. Esseimpacto, gera um rudo que pode ser notado pelos ouvintes da primeira fileira deassentos das pequenas salas de cmara. A tecnologia demonstrou que o mesmo rudogerado durante a gravao em estdio, se captado por microfones sensveis, ficaregistrado nas matrizes, e caso no filtrado no master, transferido aos acetatos, e acpia final. Esses rudos so identificados como frequencias muito altas, mas audveis,que lembram sons caractersticos de pequenos curto-circuitos eltricos. Observou-se,tambm, que a impregnao da madeira do tampo pelo acmulo de breu afeta a respostaacstica do instrumento. Por esse motivo, o violino geralmente aps uma apresentao,

    limpo com um pano de tecido fino, que na verdade no remove os resduos de breu, aocontrario, o breu espalha-se pela madeira do tampo vindo a funcionar como umobstculo filtrante. Para uma remoo completa desses resduos, o violino deve serlimpo, por fora, com um pano impregnado em aguarrs sendo posteriormente lustradocom um pano seco de algodo ou linho. Aps a limpeza externa, e, para avivar o lustro,pode-se usar tambm o azeite de oliva sobre o verniz. Fica a pergunta para mais outraesperada resposta; externamente, cera no, azeite sim! Porque, se ambos so produtosgordurosos? Internamente, a limpeza deve ser feita, introduzindo-se arroz cru bem seco

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    pelas aberturas ff, agitando-se levemente o instrumento em todas as direes, para quenenhum resqucio de gordura penetre dentro da caixa de ressonncia, onde a madeirano selada, nem envernizada.

    Emil Telmanyi usando um arco Bachiano Vega numa presagem em disco digital da

    DanaCord.

    Particularmente, acredito que as mltiplas questes de natureza cientfica, quer fsicasou qumicas, que envolvem a arte de Stradivari, foram observadas e estudadas ao longodo tempo, isoladamente, umas das outras. Acredito tambm, que essas questes devemser estudadas em conjunto de interdependncia multidisciplinar para que talvezpossamos compreende-las melhor, encontrando respostas s perguntas que aguardamtrs sculos na arte da violeria de perfeio. E, se no existirem outros mistrios a nosserem revelados, tudo leva a crer que, a genialidade insupervel de Antonio Stradivari fruto de um conjunto de situaes altamente favorveis, que encontraram na arte, talvezao acaso, a pedra filosofal da lutheria, parafraseando os fsicos, numa ambincia de

    relatividade, no tempo e no espao.

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    Accardo IT Dynamic DS 4001 (nota: capa GF internamente autografada por Accardo)

    Quanto sonoridade e ao timbre, que so caractersticas fsicas, acrescida arte doentalhe insupervel dos violinos, que uma caracterstica artesanal e nica deStradivari, somadas pea fundamental dessas duas associaes na pessoa de umgrande virtuoso, fao minhas as palavras de Toby Faber, e acrescento: J temos osvirtuosi! Precisamos de um novo Antonio Stradivari! E mais: Gostaramos, tambm, aexemplo ao que fez Salvatore Accardo com o Del Ges Canone de Paganini, ilustradoacima, de uma gravao solo do Strad Messias, sob os auspcios do Museu Ashmoleande Oxford, inclusive para um registro histrico de que no dispomos, at o momento,interpretada pelo melhor de nossos virtuosi da atualidade, Gil Shaham, a fim decompara-la com as demais gravaes existentes dos violinos do maior luthier do mundo.

    Saulo Zucchello Filho