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http://empresas.globo.com/Empresasenegocios/0,19125,ERA610337-2983-1,00.html Ed.177 01/10/03 PEQUENAS EMPRESAS & GRANDES NEGÓCIOS CAPA Viva a diferença! Para ser criativo e se destacar no mundo dos negócios, não é possível deixar as boas idéias surgirem naturalmente. É preciso provocá-las e oferecer um ambiente aberto à inovação Katia Simões/ Colaborou Lázaro Evair de Souza Desde o primeiro dia de atividade da Microsoft, seu fundador, o poderoso Bill Gates, impôs a si mesmo e à equipe de profissionais da empresa uma missão inegociável: a de tornar cada produto obsoleto antes que a concorrência o fizesse. Aos olhos dos empreendedores do passado, sua atitude parecia uma heresia. Afinal, a longevidade dos produtos no mercado sempre fora vista como uma recompensa pelo investimento realizado para desenvolvê-los. Gates não estava, porém, muito preocupado em manter velhos paradigmas para agradar a platéia. Ao contrário. Com a mesma inquietação que o transformou num dos empreendedores de maior sucesso da história e no homem mais rico do planeta, o seu objetivo era e ainda é o de estimular a criatividade de sua equipe, impregnar a Microsoft com o espírito da inovação e mostrar a necessidade de a empresa se reinventar a cada dia, para surpreender a clientela e tornar-se mais eficiente. É preciso se reinventar a cada dia para surpreender o cliente e tornar-se mais eficiente Segundo Moysés Simantob, coordenador do Fórum de Inovação da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo, existe um consenso geral de que as empresas que desejam prosperar no novo milênio devem ter a inovação como prioridade estratégica. O que se discute na atualidade, diz ele, é como inovar, é saber quais métodos e conceitos devem ser usados para que a inovação incorpore-se à rotina da equipe e não seja apenas uma prática isolada. Com o aumento da disputa pela preferência do consumidor, que hoje está mais exigente e com menos dinheiro no bolso, o preço justo, a qualidade e o bom atendimento já não são

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Segundo Moysés Simantob, coordenador do Fórum de Inovação da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo, existe um consenso geral de que as empresas que desejam prosperar no novo milênio devem ter a inovação como prioridade estratégica. O que se discute na atualidade, diz ele, é como inovar, é saber quais métodos e conceitos devem ser usados para que a inovação incorpore-se à rotina da equipe e não seja apenas uma prática isolada. PEQUENAS EMPRESAS & GRANDES NEGÓCIOS CAPA

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http://empresas.globo.com/Empresasenegocios/0,19125,ERA610337-2983-1,00.html Ed.177 01/10/03 PEQUENAS EMPRESAS & GRANDES NEGÓCIOS CAPA

Viva a diferença! Para ser criativo e se destacar no mundo dos negócios, não é possível deixar as boas idéias surgirem naturalmente. É preciso provocá-las e oferecer um ambiente aberto à inovação Katia Simões/ Colaborou Lázaro Evair de Souza Desde o primeiro dia de atividade da Microsoft, seu fundador, o poderoso Bill Gates, impôs a si mesmo e à equipe de profissionais da empresa uma missão inegociável: a de tornar cada produto obsoleto antes que a concorrência o fizesse. Aos olhos dos empreendedores do passado, sua atitude parecia uma heresia. Afinal, a longevidade dos produtos no mercado sempre fora vista como uma recompensa pelo investimento realizado para desenvolvê-los. Gates não estava, porém, muito preocupado em manter velhos paradigmas para agradar a platéia. Ao contrário. Com a mesma inquietação que o transformou num dos empreendedores de maior sucesso da história e no homem mais rico do planeta, o seu objetivo era e ainda é o de estimular a criatividade de sua equipe, impregnar a Microsoft com o espírito da inovação e mostrar a necessidade de a empresa se reinventar a cada dia, para surpreender a clientela e tornar-se mais eficiente.

É preciso se reinventar a cada dia para surpreender o cliente e tornar-se mais eficiente

Segundo Moysés Simantob, coordenador do Fórum de Inovação da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo, existe um consenso geral de que as empresas que desejam prosperar no novo milênio devem ter a inovação como prioridade estratégica. O que se discute na atualidade, diz ele, é como inovar, é saber quais métodos e conceitos devem ser usados para que a inovação incorpore-se à rotina da equipe e não seja apenas uma prática isolada. Com o aumento da disputa pela preferência do consumidor, que hoje está mais exigente e com menos dinheiro no bolso, o preço justo, a qualidade e o bom atendimento já não são

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mais vistos como diferenciais de mercado. Passaram a ser uma obrigação para quem espera ter vida longa no mundo dos negócios. Além disso, com a globalização, a tecnologia ficou mais acessível a todos. Um produto que hoje é visto como revolucionário, amanhã já é copiado pela concorrência. De acordo com Tales Andreassi, mestre em inovação pela Universidade de Sussex, na Inglaterra, e professor de empreendedorismo e inovação da FGV de São Paulo, isso significa que é preciso fazer a mesma coisa melhor a cada dia e tocar o presente com os olhos ambiciosamente voltados para o futuro. 'O que leva o consumidor a entrar numa determinada loja e não na do vizinho, ou a escolher um produto em detrimento de outro, é a cultura do novo', afirma Andreassi. Assim como a Microsoft, uma série de outras empresas conseguiu transformar criatividade em lucro e inovação em ferramenta de trabalho. Talvez o melhor exemplo disso seja a americana 3M. Responsável, entre outras coisas, pela criação do Post-it (aquele papelzinho usado para escrever as tarefas que não podemos esquecer e que pode ser colado em qualquer lugar), a 3M é reconhecida como a empresa mais criativa do mundo. Ela exige que 15% do tempo de seus funcionários seja destinado à geração de idéias e projetos inovadores. Espírito jovem No Brasil, a Natura, maior empresa de cosméticos do país, é um modelo admirado e respeitado por clientes, fornecedores e funcionários, em razão do comprometimento que tem com o aperfeiçoamento constante de seus produtos e de sua ação na sociedade. Segundo Alessandro Carlucci, vice-presidente de negócios, a Natura investe 3% do valor líquido do faturamento anual – R$ 1,4 bilhão em 2002 – em pesquisa e em desenvolvimento de novos produtos. A empresa, conhecida pela política de valorização de seu pessoal, também oferece recompensas concretas para as novas idéias aprovadas para implementação. “Somos uma organização de espírito jovem, pouco preocupada em saber quem errou, mas interessada em valorizar aqueles que sugerem novos processos”, afirma Carlucci. Um bom exemplo desta filosofia de trabalho é a linha Ekos, fruto do investimento em pesquisas da biodiversidade da Amazônia. Em apenas quatro anos, a Ekos já representa 10% do negócio da Natura e foi escolhida pela marca como carro-chefe de sua expansão internacional. “Tudo isso não valeria nada se nós não trabalhássemos 24 horas pensando nos hábitos, necessidades e atitudes de nosso consumidor”, diz Carlucci. Muitas vezes, voltar os olhos para o consumidor e reorganizar o que já existe é tão ou mais importante do que ter idéias novas. A São Paulo Alpargatas, por exemplo, procurou seguir essa receita para recuperar o prestígio e as vendas das sandálias Havaianas. “Nos anos 80, a sandália era sinônimo de pobreza, com o foco de produto barato se sobrepondo à estratégia de expansão dos negócios da linha”, declara Paulo Lalli, diretor da Unidade de Negócios Sandálias da Alpargatas. A reconstrução da marca teve início em 1994 com o lançamento da linha Top, cujos modelos tinham solado mais alto e cores da moda. A empresa procurou associar a sandália à figura de formadores de opinião, o que ajudou a reverter o quadro negativo. “Na Copa do Mundo de 1998, a meta era vender 400.000 pares de Havaianas verde-

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amarelas”, diz Lalli. “Conseguimos vender 3 milhões, o que provou que estávamos no caminho certo”. Ao contrário do que pode parecer à primeira vista, não é preciso ser um gigante corporativo internacional, como a Microsoft e a 3M, ou uma potência brasileira, como a Natura, para chegar lá. Uma série de pequenas empresas nacionais tem investido na inovação para ganhar espaço e evidência no mercado. E, justamente por serem de menor porte, elas têm muito mais flexibilidade para se adaptar às mudanças e para testar novas práticas de gestão. Aqui mesmo, nesta reportagem, você poderá conferir histórias de quatro empresas que, com criatividade, souberam atrair a atenção e a preferência do consumidor. A rede de Drogarias Arco-Íris, por exemplo, transformou o ambiente geralmente sisudo das farmácias num lugar agradável, bem iluminado, com cores suaves nas paredes e no uniforme dos funcionários. Não só aumentou o fluxo de clientes, como virou ponto de encontro do pessoal da terceira idade. A Viva Vida, confecção feminina com trinta anos de mercado, procurou transformar suas lojas numa extensão da casa do cliente. Resultado: ampliou em 15% o valor médio das compras. Processo contínuo Já a Fast Runner, a primeira loja especializada em corrida de São Paulo, é o único endereço da cidade no qual é possível testar o seu tipo de pisada antes de escolher o tênis preferido. Hoje, de cada dez clientes que fazem o teste, nove realizam a compra. Por fim, a indústria de Embalagens Jaguaré, que, cansada de bater de frente com grandes concorrentes, decidiu ir ao encontro do cliente em equipe, para oferecer soluções de embalagens personalizadas, em vez de tirar apenas pedidos de caixas em série. Como afirmam os especialistas, a criatividade muitas vezes está em fazer o óbvio com qualidade, seja por meio do redesenho do ponto-de-venda, seja por meio da oferta de um produto inovador. Para chegar lá é preciso muito empenho, porque a inovação deve ser um processo contínuo, que envolva toda a equipe. Por isso, não basta encará-la apenas como uma questão episódica. É necessário que ela se torne um método de gestão capaz de transformar uma boa idéia em lucro. “Criar um método mais eficaz de controle de qualidade, por exemplo, significa muito mais do que centenas de relatórios bem-feitos”, afirma Victor Mirshwka Júnior, diretor da Fundação Armando Álvares Penteado e especialista em criatividade pela Creative Education Foundation, em Buffalo, Nova York. O psicólogo Edward De Bono, professor de inovação da Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, e considerado como a principal autoridade do momento em criatividade em todo o mundo, diz que a informação, a competência e a tecnologia estão se convertendo em commodities, ou seja, em algo comum. A diferença entre uma empresa e outra está, cada vez mais, na maneira como cada uma converte tudo isso em valor, o que só é possível fazer por meio do investimento em criatividade. Para muitos empresários, no entanto, investir em criatividade ainda significa promover seminários esporádicos sobre o tema, financiar a participação dos funcionários e executivos em workshops ou instalar a velha caixa de sugestões nos corredores. “Trata-se de uma conduta arcaica, que não gerará frutos se as sugestões não forem lidas, avaliadas, colocadas em prática e recompensadas”, afirma Mirshwka. “As organizações

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criativas são aquelas que não esperam o surgimento de grandes idéias naturalmente. Elas provocam”. Cabe, portanto, às empresas de todos os portes criar condições para o florescimento de novas práticas, como a promoção do intercâmbio com o mercado, o investimento em treinamento, o incentivo aos programas de engajamento interno, a facilitação da comunicação entre os empregados e a criação de uma área destinada exclusivamente à inovação. “Só quando esta engrenagem estiver funcionando e a equipe empenhada é que a inovação passará a ser vista como uma competência da empresa e não como mais um modismo”, afirma Simantob.

Portas abertas A inovação é um processo contínuo que exige a participação de todos

Saiba que a iniciativa de inovação deve partir do próprio empresário. Quem se mantém preocupado apenas com o desenrolar da operação tem olhos exclusivamente para o presente, não consegue semear a criatividade entre os membros da equipe. Olhar para o futuro deve ser um exercício cotidiano.

Depure suas idéias, amadureça-as, para ser capaz de apresentar um projeto concreto, que possa surpreender a concorrência e o consumidor Questione tudo e todos. É perguntando como as coisas acontecem que se alimenta o lado criativo e se dimensiona a empreitada. Os jovens costumam ouvir e enxergar apenas o que lhes interessa. A realidade dos negócios vai além do nosso próprio umbigo. Por isso, não superestime o seu próprio produto ou serviço, não diminua o poder da concorrência e não estime uma demanda maior do que a realidade do mercado e do momento Deixe a acomodação de lado, ela é a pior inimiga da criatividade. Ninguém nasce líder e nem tampouco se mantém na ponta eternamente. As empresas e as pessoas não são líderes, 'estão' líderes Lembre-se de que para cada idéia ou situação há outra oposta. Portanto, o momento recessivo pode representar o fim para uns e a oportunidade de um novo negócio para outros. É justamente nos períodos de crise que surgem as melhores oportunidades e boa parte das grandes idéias Fuja da rotina. Fazer as mesmas coisas, seguir os mesmos caminhos todos os dias só contribui para inibir a criatividade. Quando você se sente incomodado, parte em busca de novas soluções, exercita sua face criativa Reinvente produtos, processos e serviços. Seja persistente nessa tarefa, porque a insistência em aperfeiçoá-los costuma gerar negócios criativos Ponha em prática as boas idéias sugeridas pela sua equipe. De nada adianta estimular seus funcionários a pensar diferente se as novas propostas não forem reconhecidas e, acima de tudo, valorizadas. Jamais deixe de dar um parecer sobre qualquer sugestão.

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Quanto mais rápido você se pronunciar, maior será o número de idéias apresentadas para avaliação

Crie um ambiente propício à criatividade. Sorria sempre, porque o bom humor fortalece o processo de inovação. Empresas reconhecidamente sisudas, que se caracterizam pelo ar austero, normalmente não primam pela criatividade Ofereça aos seus empregados e a você mesmo a possibilidade de desfrutar de experiências diferentes daquelas vividas no ambiente de trabalho. A variação é a mãe da criatividade. Quanto maior o número de portas abertas, mais criativas sua equipe e sua empresa serão. Veículo: Revista Empresas e Negocios Data: 01/10/03