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34 Jornal de Leiria 23 de Março de 2017 Viver RICARDO GRAÇA Jacinto Silva Duro [email protected] “A organização apenas tem motivos para estar sa- tisfeita com o programa e, em especial, com a ade- são do público a um festival que versa sobre a poe- sia, uma forma literária que ainda é considerada como sendo de ‘nicho’”. Foi desta forma que, na terça-feira à noite, na Arquivo Livraria, João Na- zário, um dos responsáveis por aquele espaço, classificou, na sessão de encerramento do evento, a forma como decorreram os seis dias deste even- to dedicado à mais nobre das formas de literatura: a poesia. Tendo sido uma ideia original do poeta Paulo José Costa, que contou com o apoio e financiamento da Ar- quivo Livraria e da Câmara de Leiria, o responsável pelo semanário afirmou que, “de forma geral, as vá- rias sessões foram bastante concorridas e participa- das pelo público. Os eventos programados foram mui- to ricos, com intervenientes que trouxeram muitas coisas novas, deixando a poesia e a cidade de Leiria, com uma boa marca neste campo." Em pleno Dia Mundial da Poesia, João Nazário agradeceu a Paulo José Costa, que desafiou a li- vraria a abraçar a Ronda, à Câmara de Leiria, na pes- soa do vereador da Cultura, Gonçalo Lopes, aos poetas e intervenientes, ao comércio, restauração e hotelaria da cidade, que apoiaram uma iniciati- va com um orçamento limitado, à Escola Superior de Artes e Design, de Caldas da Rainha, que criou o troféu do Prémio de Poesia Francisco Rodrigues Lobo, e à Fundação Caixa Agrícola de Leiria, que pa- trocionou o galardão poético. SONHO Teria passado a vida atormentado e sozinho se os sonhos me não viessem mostrar qual é o caminho umas vezes são de noite outras em pleno de sol com relâmpagos saltados ou vagar de caracol quem os manda não sei eu se o nada que é tudo à vida ou se eu os finjo a mim mesmo para ser sem que decida. Agostinho da Silva, in Poemas, lido por Paulo José Cos- ta, no encerramento da Ronda Poética 2017 Paulo José Costa recordou que, em Outubro, lançou o desafio à responsável da Arquivo Livraria, Alexandra Vieira, e que ela abraçou o projecto prontamente. "Ti- vemos a oportunidade de estruturar e desenvolver to- das as actividades com todas as pessoas que estiveram implicadas directa e indirectamente nas acções apre- sentadas. Uma actividade destas só é possível com o con- tributo de pessoas, de algumas que aparecem mencio- nadas no programa e de muitas outras que não apare- cem, mas que são extraordinariamente importantes. Lei- ria merecia um evento como este, para provarmos que a literatura e a poesia são também merecedores de di- ferentes actividades com um cariz ecléctico, cultural e que tragam público.” O programa, sublinhou o poeta, abrangeu públicos de todas as idades, em vários contextos, em vários espa- ços, uns nobres, como a Igreja da Misericórdia, o Museu do Moinho do Papel, o m|i|mo, a Biblioteca Municipal Afonso Lopes Vieira e os espaços comerciais. Além dis- so, Paulo José Costa referiu ainda, a importância de se ter levado uma turma de uma escola do I ciclo a um bair- ro habitado por pessoas de etnia cigana, onde a poesia foi declamada pelos mais novos, tendo havido um mo- mento de confraternização, com palavra e versos a se- rem a ligação entre as pessoas. O mentor referiu ainda o sucesso que foi o primeiro Poetry Slam da cidade do Lis, realizado no Atlas Hostel, organizado pela escritora Carla Veríssimo, que também apresentou o seu livro Entrilhas, no espaço Eça, no sá- bado, ao início da tarde. "Além da oficina, o concurso foi imensamente participado, com pessoas de várias idades a declamar e a participar activamente. Sei que este Poetry Slam vai dar azo a outros concursos, entretanto." Por fim, o poeta, mencionou a acção programada para o Estabelecimento Prisional de Leiria (EPL), para o último dia, ontem, quarta-feira, dia 22, que considerou "forte e que colocou reclusos e poetas profissionais do EPL. Um momento indescritível, com uma intensidade enorme". Para o vereador da Cultura, Gonçalo Lopes, felizmen- te, há muitos “paulos” e associações e empresas como o Grupo Movicortes, a que pertencem a Arquivo e o JORNAL DE LEIRIA, disponíveis a colaborar e que oferecem uma boa parte do seu tempo, dentro de um “carinho muito es- pecial pela cultura”, numa óptica de responsabilidade ci- vil e social. “Leiria é uma cidade que pauta a sua oferta como espaço de diversidade de experiências e era preci- so mostrar a experiência da literatura e poesia precisava de espaço na nossa programação. Esta Ronda é uma ex- periência notável, feita com grande esforço e orçamento curto, tendo um impacto muito grande”, resumiu. Leiria com o coração na poesia Leiria merecia um evento como este, para provarmos que a literatura e a poesia são também merecedores de diferentes actividades com um cariz ecléctico, cultural e que tragam público”

viver 1706:Layout 1 - Jornal de Leiria · nos transversal, olham o termo casa como um quase si-nónimo de intimidade. Caso se conhecessem e a idade o permitisse, ... não temos máscaras

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34 Jornal de Leiria 23 de Março de 2017

ViverRICARDO GRAÇA

Jacinto Silva [email protected]

� “A organização apenas tem motivos para estar sa-tisfeita com o programa e, em especial, com a ade-são do público a um festival que versa sobre a poe-sia, uma forma literária que ainda é consideradacomo sendo de ‘nicho’”. Foi desta forma que, naterça-feira à noite, na Arquivo Livraria, João Na-zário, um dos responsáveis por aquele espaço,classificou, na sessão de encerramento do evento,a forma como decorreram os seis dias deste even-to dedicado à mais nobre das formas de literatura:a poesia.

Tendo sido uma ideia original do poeta Paulo JoséCosta, que contou com o apoio e financiamento da Ar-quivo Livraria e da Câmara de Leiria, o responsávelpelo semanário afirmou que, “de forma geral, as vá-rias sessões foram bastante concorridas e participa-das pelo público. Os eventos programados foram mui-to ricos, com intervenientes que trouxeram muitascoisas novas, deixando a poesia e a cidade de Leiria,com uma boa marca neste campo."

Em pleno Dia Mundial da Poesia, João Nazárioagradeceu a Paulo José Costa, que desafiou a li-vraria a abraçar a Ronda, à Câmara de Leiria, na pes-soa do vereador da Cultura, Gonçalo Lopes, aospoetas e intervenientes, ao comércio, restauraçãoe hotelaria da cidade, que apoiaram uma iniciati-va com um orçamento limitado, à Escola Superiorde Artes e Design, de Caldas da Rainha, que criouo troféu do Prémio de Poesia Francisco RodriguesLobo, e à Fundação Caixa Agrícola de Leiria, que pa-trocionou o galardão poético.

SONHOTeria passado a vida atormentado e sozinho se os sonhos me não viessem mostrar qual é o caminho

umas vezes são de noite outras em pleno de sol com relâmpagos saltados ou vagar de caracol

quem os manda não sei eu se o nada que é tudo à vida ou se eu os finjo a mim mesmo para ser sem que decida. Agostinho da Silva, in Poemas, lido por Paulo José Cos-

ta, no encerramento da Ronda Poética 2017

Paulo José Costa recordou que, em Outubro, lançouo desafio à responsável da Arquivo Livraria, AlexandraVieira, e que ela abraçou o projecto prontamente. "Ti-vemos a oportunidade de estruturar e desenvolver to-das as actividades com todas as pessoas que estiveramimplicadas directa e indirectamente nas acções apre-sentadas. Uma actividade destas só é possível com o con-tributo de pessoas, de algumas que aparecem mencio-nadas no programa e de muitas outras que não apare-cem, mas que são extraordinariamente importantes. Lei-ria merecia um evento como este, para provarmos quea literatura e a poesia são também merecedores de di-ferentes actividades com um cariz ecléctico, cultural eque tragam público.”

O programa, sublinhou o poeta, abrangeu públicos detodas as idades, em vários contextos, em vários espa-

ços, uns nobres, como a Igreja da Misericórdia, o Museudo Moinho do Papel, o m|i|mo, a Biblioteca MunicipalAfonso Lopes Vieira e os espaços comerciais. Além dis-so, Paulo José Costa referiu ainda, a importância de seter levado uma turma de uma escola do I ciclo a um bair-ro habitado por pessoas de etnia cigana, onde a poesiafoi declamada pelos mais novos, tendo havido um mo-mento de confraternização, com palavra e versos a se-rem a ligação entre as pessoas.

O mentor referiu ainda o sucesso que foi o primeiroPoetry Slam da cidade do Lis, realizado no Atlas Hostel,organizado pela escritora Carla Veríssimo, que tambémapresentou o seu livro Entrilhas, no espaço Eça, no sá-bado, ao início da tarde. "Além da oficina, o concurso foiimensamente participado, com pessoas de várias idadesa declamar e a participar activamente. Sei que este PoetrySlam vai dar azo a outros concursos, entretanto."

Por fim, o poeta, mencionou a acção programada parao Estabelecimento Prisional de Leiria (EPL), para o últimodia, ontem, quarta-feira, dia 22, que considerou "forte eque colocou reclusos e poetas profissionais do EPL. Ummomento indescritível, com uma intensidade enorme".

Para o vereador da Cultura, Gonçalo Lopes, felizmen-te, há muitos “paulos” e associações e empresas como oGrupo Movicortes, a que pertencem a Arquivo e o JORNALDE LEIRIA, disponíveis a colaborar e que oferecem umaboa parte do seu tempo, dentro de um “carinho muito es-pecial pela cultura”, numa óptica de responsabilidade ci-vil e social. “Leiria é uma cidade que pauta a sua ofertacomo espaço de diversidade de experiências e era preci-so mostrar a experiência da literatura e poesia precisavade espaço na nossa programação. Esta Ronda é uma ex-periência notável, feita com grande esforço e orçamentocurto, tendo um impacto muito grande”, resumiu.

Leiria com o coração na poesia

Leiria mereciaum eventocomo este, paraprovarmos quea literatura e apoesia sãotambémmerecedoresde diferentesactividadescom um carizecléctico,cultural e quetragampúblico”

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RICARDO GRAÇA

RICARDO GRAÇA

Lamento das casas felizesRuy de Saveedra venceu Prémio de Poesia Francisco Rodrigues Lobo

Pedro Mexia, Carlos André, Orlando Cardoso,Cristina Nobre e Maria Celeste Alves, o júri daprimeira edição do Prémio de Poesia FranciscoRodrigues Lobo - Arquivo Livraria/FundaçãoCaixa Agrícola de Leiria, considerou que a obraLamento das Casas Felizes, do poeta MiguelAyres de Campos, que concorreu com opseudónimo Ruy de Saveedra, reuniu ascondições para ser considerada a vencedora daprimeira edição do Prémio de Poesia FranciscoRodrigues Lobo. Segundo a opinião do júri, “o trabalho vencedorreúne o apuro formal, a finura de linguagem, acapacidade imagética, a sensibilidade e emoçãoe a riqueza expressiva das grandes obras depoesia”.O prémio foi anunciado na terça-feira, dia 21 deMarço – Dia Mundial da Poesia, e conta comuma vertente monetária, editorial e física. Além da atribuição de mil euros ao vencedor,haverá ainda a publicação de um livro ondeconstará a indicação Obra premiada com oPrémio Poesia Francisco Rodrigues Lobo – 1.ªEdição 2017. Ayres de Campos, que é natural de Barcelos enão pôde estar presente na atribuição dogalardão, receberá ainda uma peça concebidana Escola Superior de Artes e Design de Caldasda Rainha, do Instituto Politécnico de Leiria.A autora é Rita Frutuoso, técnica responsávelda oficina de cerâmica daqueleestabelecimento de ensino onde, em 2005,terminou a licenciatura no curso Design –Tecnologias para a Cerâmica. É uma peça com aqual a artista procurou, através da simplicidadeda composição, transmitir a sua concepçãosobre o que é a poesia. “A obra cria uma tensãoprovocada pela aparente ausência de tensão, oruído que se pode escutar por detrás do espaçoganho por um silêncio profundo”, diz RitaFrutuoso.A tarefa do júri não foi fácil e os cincoelementos acabaram por fazer uma mençãohonrosa à obra Papéis Secundários, do poetaaçoriano Daniel Gonçalves, pseudónimoJuliana Paes. “Os meus Papéis Secundários sãoa dança que faço com os outros poetas, e com aoutra música, pequenas ficções que me dãovida, que me deixam nesta estatura mínima, deao menos ter a boca de fora, respirando o poucoque resta, se tudo à volta é tão grande”, afirmouna sua página da rede social de Facebook, opoeta.Ao todo, o Prémio de Poesia FranciscoRodrigues Lobo - Arquivo Livraria/FundaçãoCaixa Agrícola de Leiria recebeu 190 obrascandidatas, tendo o júri considerado que,destas, 134 reuniam condições para seremadmitidas a concurso.

Jacinto Silva Duro, com [email protected]

� Será o tema “casa” suficiente para uma sessão de poe-sia sobre o lar, o conforto ou a sua falta, a morada e do-micílio? Inês Fonseca Santos, jornalista e escritora, e os poe-tas Maria de Sousa, Rita Taborda Duarte e Paulo José Mi-randa entenderam que sim e ofereceram-se para explicarpor que razão Só as casas explicam que exista/uma pala-vra como intimidade. Este foi, afinal o tema central do úl-timo momento de debate da Ronda Poética 2017.

Ao fim da tarde do Dia Internacional da Poesia, na Ar-quivo Livraria, ela mesmo uma “casa” para tantos poetas,autores, letras, palavras, livros e obras-primas, serviu depalco e porto de abrigo aos autores que participaram nodebate e que aproveitaram, também eles para declamarpoemas, seus ou “pedidos em empréstimo”, sobre o temada “casa”. Por exemplo, a poetisa Rita Taborda Duarte par-tilhou, demonstrando algum pudor, um dos seus primeirostrabalhos com o público para, de seguida fazer uma pon-te com Luísa Neto Jorge, escritora nascida em Lisboa emMaio de 1939, e a relação desta, que é uma das suas autoraspreferidas, com a temática em debate.

De modo geral, todos os oradores, de forma mais ou me-nos transversal, olham o termo casa como um quase si-nónimo de intimidade. Caso se conhecessem e a idade opermitisse, Dylan poder-se-ia ter inspirado em PauloJosé Miranda, o primeiro poeta e escritor a receber o pré-mio literário José Saramago, para escrever Like a RollingStone (1965), tantos foram já os sítios a que o autor chamoude casa. De uma quinta na Turquia, na margens do MarMorto, ao mais fundo Sertão do sul do Brasil, passando por

Debate A casa onde crescemos é das coisas mais intimas que há

Poesia permite “acampar” nos livrosLisboa – cidade com quem diz ter uma má relação – até aum simples quarto de hotel. Não obstante, Miranda afir-mou que “a casa onde crescemos é das coisas mais inti-mas que há” e, para o provar leu o poema, A Casa, um dosprimeiros que escreveu. Nele faz uma descrição do espaçode dentro e o circundante à casa “porque a casa não é ape-nas a casa”: cada divisão. Cada cadeira, cada mesa, cadapedacinho do quintal.

E quando chega a hora de escrever? Será em casa queos autores se sentem mais calmos e inspirados? Maria deSousa admite que gosta de escrever no café, “acho que façouma casa no café”, revelou.

A poetisa faz parte da direcção da editora Do Lado Es-querdo e refere que “a casa é ameaçadora, mas ao mes-mo tempo reconfortante”. Desligada do resto, onde “a nos-sa intimidade está a nu”, “quando estamos a sós, em casa,não temos máscaras. Estamos a sós connosco.”

Já a autora de contos infanto-juvenis, Rita Tobarda, vêa casa como “um espaço de transição, um espaço interior,que protege”. “A ideia de casa que me surge é um espa-ço de transição, um espaço dentro que protege lá de fora,mas que também pode estar em constante ruína.” Aliás,mãe de três filhos, explica que só a partir da uma ou duasda manhã consegue escrever em paz… “Mas às sete ho-ras já tenho de estar de pé!”

Os oradores admitiram que têm uma forma diferentede olhar a escrita. “Temos a poesia e o livro é como uma‘casa da escrita’”, para Maria de Sousa. Enquanto, para Pau-lo Miranda, a poesia permite “acampar nos livros”, ou mes-mo “habitá-los numa relação de reciprocidade em que elestambém nos habitam”, como concluiu Rita TabordaDuarte.

Bruno Lopes, com [email protected]

� Na Arquivo Livraria, na segunda-feira, houve um mo-mento que nos fez questionar a apropriação sobre a obrade arte, a poesia, a música... o mundo. Fomos convida-dos a questionar o mundo e a arte. A arte numa visãonietzschiana, como resultado da actuação humana, quese encontra tomada por uma força activa, ou numa visãode apropriação onde a arte existe e compreende-se no mo-mento da sua propagação, difusão e circulação criandoresistência ao tempo, conseguindo gerar assim cultura.

O debate Mudemos de assunto – música e poesia, ar-tes próximas?, marcado para o fim da tarde, no âmbi-to da Ronda Poética, juntou Xana, a mítica vocalista dosRádio Macau, Paulo Lameiro, director artístico da So-ciedade Artística Musical dos Pousos (SAMP) e TelmoRodrigues, estudioso e especialista em Bob Dylan,numa conversa sobre a proximidade e os laços fami-liares entre a poesia e a música, moderada por Hugo Fer-reira, da Omnichord Records.

Um tema que se impunha debater após todo o bruá emtorno da entrega do Nobel da Literatura a Bob Dylan, au-tor que é conhecido, essencialmente, por ser um dos prin-cipais letristas e músicos do final do século XX e princí-pios do XXI.

O director artístico da SAMP aproveitou, para prin-cipiar o debate, o facto de Hugo Ferreira lhe ter atribuídoa categoria de “musicólogo”. Lameiro explicou que ti-nha descoberto “a relação da poesia com a música numaaula de musicologia, no Conservatório. “Será que po-demos escrever sons sem ser de vozes? Porque os pri-meiros sons a escreverem-se eram meramente só de pa-lavras”, afirmou.

Xana, a letrista que, um dia, já pensou em pintar o céu,

Conversa com Xana, Paulo Lameiro, Telmo Rodrigues e Hugo Ferreira

Serão música e poesia artes próximas?

afirmou que não se considera uma poetisa e utilizou poe-mas que lia aos 17 e 18 anos para falar da musicalidade pró-pria que encontrava nas palavras das obras. “Uma mu-sicalidade que não era a da música, pois as palavras eramautónomas”.

Já Telmo Rodrigues, especialista de Bob Dylan, apre-sentou uma perspectiva crítica que culminou num dis-curso que, facilmente, prenderia o público por horas, de-fendendo que “o poema cantado é estranho”. “Ou é umacanção ou é um poema.” O investigador que, na sua dis-sertação de doutoramento analisou a possibilidade de seclassificar as letras das música como poemas, afirmou que“na música rock-pop está alguma da melhor poesia do fi-nal do século XX”. Atribuiu a essência do poema à auto-ridade do poeta, em detrimento de interpretações de ou-tras pessoas a cantar obras de Dylan.

“A casa éameaçadora,mas ao mesmotemporeconfortante”.Desligada doresto, onde “anossaintimidadeestá a nu”,“quandoestamos a sós,em casa, nãotemosmáscaras.Estamos a sósconnosco”

“Será quepodemosescrever sonssem ser devozes? Porqueos primeirossons aescreverem-seerammeramente sóde palavras”

36 Jornal de Leiria 23 de Março de 2017

Viver

Jacinto Silva [email protected]

� Poesia na casa de Deus: Será o poema uma oração? foi oprimeiro grande tema em debate, na primeira edição dofestival Ronda Poética. Sob a forma de tertúlia, o eventodecorreu na recuperada e requalificada Igreja da Miseri-córdia, actual Centro de Diálogo Intercultural, de Leiria.Foi a primeira vez que o agora dessacralizado templo es-teve aberto ao público para um grande evento de índolecultural

Para falar sobre a oração enquanto poema e canal de co-municação com o divino e transcendente, estiveram emLeiria o teólogo e opinador frei Bento Domingues, a crí-tica literária e autora Maria João Cantinho e o poeta Car-los Lopes Pires. A moderação coube a Acácio de Sousa.

No painel anunciado esteve ausente o actor Luís MiguelCintra que foi impedido de estar presente, por motivos pes-soais.

Para iniciar e introduzir novos motivos de discussão natertúlia, David Teles Ferreira declamou vários poemas dosautores presentes e de Maria Teresa Horta, bem como ora-ções bíblicas. O início do evento teve como percutor o Cân-tico dos Cânticos.

“A finalidade da poesia é não ter nenhuma. É como asflores, é como as rosas, não tem porquê. À oração tambémbasta que mexa com a nossa vida…”, afirmou Frei BentoDomingues, a quem foi dada a palavra, em primeiro lu-gar. O teólogo recordou ainda que “na Bíblia, também estáo amor erótico, o que não deveria estar lá eram os mas-sacres... há certas descrições que eu passo à frente porquenão fazem sentido”, afirmou, adiantando que a genera-lidade dos cristãos costuma dizer que se algo está escri-to na Bíblia é porque tem um elevado grau de credibilidade.“Ora, na Bíblia está tudo! Podemos encontrar lá o pior e omelhor porque ela é um livro de muitas épocas e de mui-tos géneros literários e responde a problemas levantadospelos seres humanos. Acho curioso quando as pessoas di-zem 'palavra de Deus'... mas quem é que já ouviu Deus fa-lar?”, questionou.

Sem medir palavras, frei Bento Domingues afirmou ain-da que “quando se invoca o nome de Deus para matar, esseDeus que se mate!”

A oração é um poema de ajudaPara o teólogo, a Bíblia está cheia de violência, mas tam-bém está “cheia de um deus de puro amor e misericórdia”.Ainda há dias, uma rapariga evangélica, no final de um de-bate, veio ter comigo e disse-me: 'parece que não acredi-ta em Deus, porque na Bíblia é que está toda a verdade'.Essa é mais uma asneira. A Bíblia tem de ser interpreta-da, porque se não o for, onde está depois o amor? A reli-gião é a respiração da vida humana. Somos seres limita-dos e a religião nasce do limite.... E por isso, o que é a ora-ção? É um poema de ajuda. A oração não serve para con-vencer a Deus. Ele já está convencido. A oração não é paraDeus é para nós, que precisamos de ajuda e auxílio.”

Onde está a ligação entre Filosofia e Poesia?Haverá uma junção entre a Filosofia e a Poesia? Acácio deSousa questionou sobre este assunto Maria João Cantinho,que, além de escritora, é especialista na análise de alego-rias. A autora, centrando-se também no Cântico dos Cân-ticos, disse que são tantas as interpretações deste texto que

No novoCentro deDiálogoIntercultural,de Leiria,estavamexpostas duasobras daartista plásticade Leiria,Sílvia Patrício,quereinterpretoua obraAnunciações,de MariaTeresa Horta,e também olivro do AntigoTestamento,Cântico dosCânticos, pararepresentar oCanto doAmor e as suasAlegoriasPoéticas, numtrabalhocriativoconcebido emexclusivo paraa tertúliaPoesia na casade Deus: Seráo poema umaoração?

ele pode ser visto até como a origem do amor sagrado. "Oamor erótico não é menos sagrado do que o amor religioso,mas a alegoria neste Cântico vai muito além de qualquerrótulo ou tipologia que lhe tenham querido dar”. Até por-que, afirmou, o Cântico dos Cânticos está ligado à funda-ção do Estado de Israel “e há uma série de interpretaçõesque lhe trazem uma carga alegórica fortíssima”.

"Veja-se o caso do Anjo Melancólico, que é um elementoque faz parte da poesia, uma figura de impotência de umser que quer salvar o humano e a história e não conseguefazê-lo e que atravessa também a história como ideia decatástrofe...”

Daqui salta-se para a poesia, pois ela também não ésalvação, mas um resgate da linguagem que a consegueencontrar na conotação do poema como oração ecomo salmo.

“Isso encontra-se muito na Igreja Católica e na poesiajudaica, sobretudo na contemporânea, como a de Paul Ce-lain, que passa a ideia de que a alegoria está muito presentena poesia... e na oração”, disse, adiantando que qualquerpoema de Celain é uma oração em homenagem aos quemorreram no Holocausto e uma rememoração.

“A poesia não é palavreado, caminha para o silêncio”Para o debate, o poeta e escritor Carlos Lopes Pires levouas áreas e domínios que existem dentro de cada um de nósque nunca conseguimos tocar totalmente, que nem sequerconseguimos expressar; os "pontos cegos da existência".

Pires explicou que todos damos conta de que existimos,mas nenhum consegue perceber o que é a existência ou"existêncialidade". “É este ‘ponto cego da existência’, quetambém existe nas coisas que nos rodeiam em que po-demos encontrar ‘o mais do que as coisas’. Uma pedra ouuma mesa, são mais do que essa pedra ou mesa.” Con-cretizando, afirmou que é esse “ponto cego”, que nuncaconseguiremos compreender e apreender, tocar e sentirtotalmente, que podemos chamar de “transcendência”.

“Toda a poesia digna desse nome tem de tocar a ‘trans-cendência’. O poeta é uma espécie de místico que fez votode silêncio porque a poesia não é palavreado, caminha parao silêncio. O silêncio é, talvez, aquilo que estará no 'pon-to cego da existência'”, disse, concordando com freiBento Domingues, afirmou também que a "poesia não ser-ve absolutamente para nada”.

Não é um objecto, no sentido de que falamos dela nodia-a-dia. “Deixaria de ter natureza transcendente e seriaum objecto utilitário. E esse é um erro de muita gente, in-cluindo muitos poetas. Confundem poesia com coisas tran-sitórias e utilitárias do dia-a-dia. Se ela servisse para isso,não serviria para nada que tivesse a ver com transcen-dência."

Lopes Pires adiantou que o poeta não precisa de fa-lar ou nomear deus. Pelo contrário, a poesia que no-meia deus é a sua negação, porque precisa de o nomearpara fazer de conta de que está a falar de algo. “Se Deusé alguma coisa, de certeza que nada tem a ver com oque pensamos. Se existe, não merece que lhe demosestes nomes que lhe costumamos dar. O que mereceé que a poesia tenha esse carácter inalcançável, do'ponto cego de existência' e o alvo maravilhoso da poe-sia que é a própria vida."

Por fim, Carlos Lopes Pires admitiu que, embora sen-do agnóstico, na sua poesia há um certo aspecto re-

ligioso, com livros editados com nomes como Livrosdos Salmos, Livros dos Cânticos, Sinal de Jonas... as Es-tações de Deus.

"A existência não é uma coisa concreta é algo que nãose consegue apanhar. A poesia, como dizia Levinas, ca-minha para o Outro e ao fazê-lo, fá-lo para a transcen-dência."

Mas Maria João Cantinho saiu-lhe ao caminho e, falandosobre a relação com o Outro, disse que também Paul Ce-lain amplificou esse gesto de “um ir ao caminho do Ou-tro”. “Reconheço mais Celain nas suas palavras do que asde Levinas, porque este último tem mais a ver com o re-conhecimento do Outro, mas isso não implica sair ao ca-minho do Outro."

Deus no pó, no mar, nas pedras e na criança à nossa frenteA escritora adiantou ainda que, na poesia, o amor não cabenuma definição, é a consciência de estarmos no mundoe a poesia faz-nos viver o sagrado, a imanência, das coi-sas. “A transcendência, para mim, não faz sentido. É umapalavra vazia. É possível que haja deus, mas não vejo porque razão deus não há-de estar numa criança que en-contramos à nossa frente. Respeito mais a imanência, poisé esse gesto que me traz à poesia. Não é por acaso que omeu livro se chama Do Ínfimo, pois é aí que encontramosdeus, Encontramo-lo no pó, no mar, nas pedras... tambémestá nas igrejas, mas não é preciso ir lá para encontrar deus.E isso para mim, é o verdadeiro amor".

Temperando o debate com uma pitada de pragmatis-mo, frei Bento Domingues, afirmou que a maior dificul-dade é ir além do poema. "Ele é uma imanência cheia detranscendências. É a consistência da linguagem, o arran-jo e o ritmo da linguagem - porque eu creio que a poesiaé parente da música -, porque todas as artes requerem umcerto ritmo e pretendem encontrá-lo em materiais dife-rentes. "Há uma relação entre oração, poesia e música. Oproblema é que a consistência da linguagem, o valor dopoema desperta em nós uma outra vida e maneira de ser,que deve ser lida e aprofundada nos poemas. O que é pró-prio da poesia é ser aquele arranjo de palavras que produzaquele 'não sei quê', de encantamento”, disse, explican-do que “o poema transborda e faz-nos transbordar e porisso é que é metafórico, porque faz viajar a nossa imagi-nação.”

De outra forma, adiantou, “estaremos a falar de outrotipo de linguagem. Num poema autêntico nada se podeacrescentar, nada se lhe pode tirar.”

Tertúlia “O poeta é uma espécie de místico que fez voto de silêncioporque a poesia não é palavreado”

“A poesia não servepara nada”

Jornal de Leiria 23 de Março de 2017 37

Debate O papel das pequenas editoras

Quem edita a “literatura do subterrâneo”?

Jacinto Silva [email protected]

� Foi com esta provocação que a jornalista Joana EmídioMarques deu início à tertúlia Marginalidade & Obscuridadevs Canonicidade & Alienação - Porque nos são tão úteis aspequenas editoras?, na Arquivo Livraria, no sábado à tar-de.

Esta acção, inserida no Festival Ronda Poética, rapida-mente, evoluiu para um aceso debate entre a jornalista emoderadora e os editores Carlos Alberto Machado, res-ponsável pela Companhia das Ilhas, e Diogo Vaz Pinto, poe-ta e jornalista, e David Teles Pereira, ambos da Edições Lín-gua Morta - Beatriz Reno Lopes, da Hierro Lopes Editora,não pôde estar presente, como fora anunciado.

Tomando a palavra, Carlos Alberto Machado afirmouque há um "meio termo". "Entre uma grande e uma pe-quena editora há diferenças de natureza, que não são deescala ou dimensão... ou de mais ou menos público", dis-se, sublinhando, por exemplo, o tipo de autores que umase outras publicam.

"Uma pequena editora não tem de alimentar uma má-quina de 'profissionais do livro': os que andam à volta, osque vão aos cocktails e aos serões literários... As grandeseditoras têm uma filosofia de exclusão, de 'terra queima-da'... Não podemos pensar que é apenas é um problemade escala. Se eu recebesse dois milhões de euros, o que fa-ria com a Companhia das Ilhas? Nada! Ficaria igual." A edi-tora de Machado está sediada nas Lajes do Pico, nos Aço-res, foi criada em 2012 e já editou mais de 100 livros, in-cluindo, textos teatrais.

“O meio literário português é nojento!”David Teles Pereira, poeta e editor da Língua Morta, crí-tico literário do jornal i, falou da sua própria experiênciacom a sua pequena editora. A Língua Morta existe desde2010 e tem mais de 70 livros editados, um número que esteeditor considera exagerado, porque, há dias em que dizsentir-se no meio de um "esquema de ponzi". "Andamosa fazer de conta que há muitos autores e livros, mas na ver-dade nada se passa", criticou. "Andamos a fazer de conta

que há interesse nas coisas novas e, na verdade, há pou-co interesse do público."

"A Língua Morta teve a sorte e a maldição de surgir numaépoca em que as grandes editoras começaram a abdicarde uma parte do catálogo e nós aproveitámos. Ocupámosum espaço que as editoras deixaram vazio. A maioria dasgrandes editoras portuguesas abdicaram do seu catálogode poesia, resumiu, adiantando que a Língua Morta nãoé uma solução, pois os dois editores não estão dispostosa "continuar este trabalho para sempre".

"Não temos a mesma escala e sentimos sempre que es-tamos a prestar um mau serviço aos autores que publicamos.Os nossos braços não chegam aos mesmo sítio onde chegaa Leya ou a Porto Editora... Jamais teríamos surgido se as gran-des casas fizessem o seu trabalho bem feito", resumiu.

Diogo Vaz Pinto colocou em cima da mesa a questão daética e da escolha. "O cidadão já nem sequer é cidadão éum mero consumidor. O seu voto em termos daquilo queconsome vale menos do que o seu voto na urna. O que or-ganiza a nossa vida são as decisões do consumo. Na Lín-gua Morta, tentamos dominar as nossas acções, de umaforma minimamente ética. A nossa sociedade faz uma sé-rie de comportamentos éticos diários sobre os quais nãoreflecte. Somos os responsáveis e temos a culpa máximapelo meio editorial que temos: não temos uma posição deforça, mas de fraqueza. As editoras pequenas são só aqui-lo que conseguem ser e algumas delas são mais projectosfúteis do que editoras. Para mim, a Leya é a religião cató-lica. O que vou eu dizer ao Papa? Ele não me ouve. Querlá saber de mim! Temos de criar uma relação familiar comalgum conflito, mas sem andar aos estalos... Podemos fa-lar, debater e, quanto a mim, o meio literário portuguêsé nojento! É nojento! Porque, por exemplo, todas as pes-soas amam o Herberto Helder, mas o Vítor Silva Tavaresdizia uma coisa muito clarificadora. 'O que era para ele umaobra-prima? Era aproximar-nos de um livro e, de repen-te estávamos perante um Inferno. O ângulo dele era o In-ferno. E o Inferno não é uma abstracção."

Joana Emídio Marques, dirigindo mais uma provoca-ção a Carlos Alberto Machado questionou se "as peque-nas editoras são associadas à ideia de marginalidade, onde

"Andamos afazer de contaque há muitosautores elivros, mas naverdade nadase passa",criticou."Andamos afazer de contaque háinteresse nascoisas novas e,na verdade, hápoucointeresse dopúblico."

o autor é um 'pequeno marginal e um génio do futuro'?Aprofundando a pergunta e o tema, adiantou ainda: "sea marginalidade permite procurar autores que vão ficarpara o futuro ou estão a editar tanto lixo quanto uma gran-de editora?"

Machado retorquiu que "todos os autores são legítimos.Têm capacidade intelectual e não os podemos apelidar deingénuos. A tentativa de tentar criar cânones teve o seutempo. Não me interessa saber se os autores que publi-camos vão ser famosos daqui a cinco, dez ou mil anos. Pro-curo estar com eles, tratá-los bem e fazer o melhor que sei...Comecei a editar na Companhia das Ilhas porque gosto delivros, de falar com os escritores, ler os livros e quando eleschegam da gráfica, relê-los e dar-lhes as voltas todas. Seforem interessantes para outras pessoas, óptimo. Na ver-dade, a minha editora e a Língua Morta não preencherambem um vazio, porque ele já existia. A Assírio & Alvim co-meçou há muito e, antes de ter sido comida pela Porto Edi-tora, já tinha abandonado o projecto e a poesia. Ainda hojeé assim... se a poesia pode dar uns trocos, edita-se, se nãodá, não se edita! Saramago também nunca conseguiu ven-der poesia!"

Diogo Vaz Pinto socorreu-se de um termo para ten-tar uma explicação: "alienação". O público sofre de "alie-nação". "Hoje, toda a gente ama mais o George Clooneydo que o marido... e o Clooney nem sequer existe. OGeorge Clooney é uma ficção de porta-chaves! Quan-do morreu o Bowie ou o Lou Reed, houve movimen-tos fenomenais, no Facebook de malta a chorar. Tenhoa sensação de que quando morrer a avó, o cão ou atéo periquito, dessas pessoas que se andaram a carpir sólhes vai cair uma lágrima ou outra. Eu até prefiro as coi-sas que a Leya publica, quase tudo o que tenho lido daspequenas editoras são coisas 'sem ossos', são açordas...ao contrário, demorei imenso tempo a conseguir entrarem Rimbaud. Tive de ouvir várias pessoas a explicar queaquilo era muito bom e eu não acreditava. Demoreimuito a conseguir transcender-me e a perceber Rim-baud... Tem de haver crítica, como dizia Vítor Silva Ta-vares: 'aquilo que é positivo, leva crítica. Aquilo que énegativo, leva crítica'! Quem não critica, mama!

RICARDO GRAÇA JACINTO SILVA DURO

38 Jornal de Leiria 23 de Março de 2017

Viver

Jacinto Silva [email protected]

� Se a Ronda Poética 2017 fosse uma peça de teatro, oprimeiro acto chamar-se-ia Casa Alta (fotografia embaixo). Esse é também o título do livro de poesia, de PauloCosta, ilustrado pela artista plástica Sílvia Patrício, ondese centraram todas as atenções no dia de abertura do fes-tival que, durante seis dias encheu Leiria com poesia.

Na apresentação, o autor explicou que a Casa Alta erauma tentativa de descrever a casa dos avós maternos ondebrincava com os primos, com os artigos de costura da tiae para onde trazia, da rua, os animais da casa. “Revela ex-certos da minha vida e sem saber como dou comigo a levá--los para estes versos. É um trabalho orgânico e inacaba-do”, resumiu.

Para fazer a apresentação do livro o poeta convidouMaria João Cantinho. A poetisa e ensaísta leu um dospoemas de Casa Alta para explicar a obra. "Uma tra-vessia suspensa nos antípodas/E uma ordem estabe-lecida, como se nunca fossemos da terra para além dasmargens definitivas". Referindo que há uma ideia depassagem e de viagem como partes que constituemesta poética, no sentido intencional de juntar o vagar.O Vagar é o título de um poema, em que o sujeito poé-tico se suspende. "Defronto uma ilha nos limites doespanto. Recupero tempo nos sentidos e o nada me in-terpela o pensamento", citou.

Para Cantinho isto é estar à mercê do espanto e dabeleza e ser tomado pela coragem do tempo e procu-rar a inocência. Talvez sejam, mais do que a simplestarefa do Homem, entende, salientando que esta é atarefa poética por excelência. Por isso, resumiu: "es-tás dentro de ti na tua espera do mundo, congregas ovazio e a coragem do tempo". Também o director daESAD.CR, do IPLeiria, João dos Santos analisou a obra,do ponto de vista da artista plástica Sílvia Patrício. Oformato do livro vem da forma como “a Sílvia o en-tendeu, numa leitura breve e rápida”, afirmou. E o quefoi que ela viu? “Viu uma paisagem. E abordou,quase todos os poemas, como se de um horizonte setratassem. Há fotografias com rasura, há outras quesão duplicadas com as linhas do desenho e há algu-mas que são complementadas com o esconder do tex-to”, analisou. A receita da venda da Casa Alta revertena totalidade para associação Impulsar, de Leiria.

FOTOS: RICARDO GRAÇA

Apresentação literária Paulo Costa e Sílvia Patrício

Uma Casa alta cheia de “vidas”

Em cima, InêsFonseca Santose convidadosdiscutem aCasa como sítiode intimidade,à esquerda, oAtlas Hostelrecebeu oprimeiroPoetry Slam deLeiria, Àdireita, oPalácio dosAtaídesrecebemdeclamação depoesia,animada pelaescola de balletde Clara Leão epianos a seismãos deFabrícioCordeiro,André Barros eTiago Ferreira.À direita, umdos momentosda acção de ruaDeclamatório,com MercíliaFrancisco