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Universidade de São Paulo Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” A influência da temperatura na condução de dois processos fermentativos para produção de cachaça Vivian Santoro Braga Dissertação apresentada para obtenção do título de Mestre em Ciências. Área de concentração: Ciência e Tecnologia de Alimentos Piracicaba 2006

VivianBraga (1)

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  • Universidade de So Paulo Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz

    A influncia da temperatura na conduo de dois processos fermentativos

    para produo de cachaa

    Vivian Santoro Braga

    Dissertao apresentada para obteno do ttulo de Mestre em Cincias. rea de concentrao: Cincia e Tecnologia de Alimentos

    Piracicaba 2006

  • Vivian Santoro Braga Engenheiro Agrnomo

    A influncia da temperatura na conduo de dois processos fermentativos para produo

    de cachaa

    Orientador: Prof. Dr. JORGE HORII

    Dissertao apresentada para obteno do ttulo de Mestre em Cincias. rea de concentrao: Cincia e Tecnologia de Alimentos

    Piracicaba 2006

  • Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)

    DIVISO DE BIBLIOTECA E DOCUMENTAO - ESALQ/USP

    Braga, Vivian Santoro A influncia da temperatura na conduo de dois processos fermentativos para

    produo de cachaa / Vivian Santoro Braga. - - Piracicaba, 2006. 90 p.

    Dissertao (Mestrado) - - Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, 2006.

    1. Aguardente 2. Bebidas alcolicas 3. Cachaa 4. Fermentao alcolica 5. Levedura 6. Temperatura I. Ttulo

    CDD 663.53

    Permitida a cpia total ou parcial deste documento, desde que citada a fonte O autor

  • 3

    Deus, pela vida, por agraciar-me com sade, paz, uma famlia

    maravilhosa e permitindo-me alcanar mais uma vitria.

    OFEREO

    Aos meus pais, Luiz e Selma,

    pelo exemplo de vida, pelo incentivo nos momentos mais difceis,

    por mostrarem sempre o caminho da verdade,

    por tantas vezes que abdicaram de vossos sonhos para realizar os meus,

    por todas as alegrias que proporcionaram-me,

    pelo amor incondicional e apoio na realizao deste trabalho.

    E minha irm Graziela, pela amizade, generosidade

    e companheirismo em todas as situaes.

    DEDICO

  • 4

    AGRADECIMENTOS

    Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, em especial ao Departamento de

    Agroindstria, Alimentos e Nutrio (LAN) pela oportunidade de realizao do curso.

    Universidade Estadual Paulista (UNESP), em especial Faculdade de Cincias

    Agronmicas, Campus de Botucatu (FCA), pela formao profissional e apoio de seus

    funcionrios e professores.

    Ao meu orientador, Prof. Dr. Jorge Horii, por sua amizade e confiana que possibilitaram

    a oportunidade de iniciar este trabalho; pela compreenso durante todos os momentos e pelo

    incentivo e apoio nas dificuldades que surgiram no decorrer do curso.

    Ao Prof. Dr. Andr Ricardo Alcarde e Profa. Dra. Sandra Helena da Cruz pelas valiosas

    sugestes.

    Aos tcnicos de laboratrio do Departamento de Agroindstria, Alimentos e Nutrio do

    Setor de Acar e lcool Rosemary Leonessa da Silva e Sylvino Luiz Torrezan pela amizade e

    auxlio durante o desenvolvimento do projeto.

    s tcnicas do laboratrio de Microbiologia de Alimentos do Departamento de

    Agroindstria, Alimentos e Nutrio (LAN), Denise de Almeida Leme Baptista e Rosalina de

    Ftima Oncagne.

    A todos os funcionrios, do Setor de Acar e lcool do Departamento de Agroindstria,

    Alimentos e Nutrio (LAN), Daniela, Dito, Fbio, Gil, Joana, Regina e Vana, em especial,

    Pedro, pelo auxlio e amizade.

    bibliotecria Beatriz Helena Giongo pelo auxlio na correo e organizao das

    referncias bibliogrficas.

    amiga Cristiane Pilon pela amizade, apoio e auxlio nas etapas preliminares do trabalho,

    alm de seu constante incentivo.

    Aos amigos Adilson de Oliveira Jnior e Antonio Sampaio Baptista pela amizade, auxlio

    nas anlises estatsticas e durante o desenvolvimento deste trabalho.

  • 5

    Ao amigo Andr Eduardo Belluco pela amizade, incentivo e auxlio no desenvolvimento

    deste trabalho.

    Aos amigos Fernando, Jos Rubens, Matheus, Nilo e Thais pelo apoio em todos os

    momentos.

    A todos aqueles que contriburam direta ou indiretamente para a realizao deste trabalho.

  • 6

    "Se um dia tiver que escolher entre o mundo e o amor... Lembre-se: se escolher o mundo ficar sem o amor, mas se escolher o amor, com ele conquistar o mundo."

    Albert Einstein

  • 7

    SUMRIO

    RESUMO ___________________________________________________________________ 9

    ABSTRACT ________________________________________________________________ 10

    1 INTRODUO __________________________________________________________ 11

    2 REVISO DE LITERATURA _______________________________________________ 12

    2.1 Importncia econmica da aguardente ________________________________________ 12

    2.2 Caracterizao da aguardente e da cachaa ____________________________________ 13

    2.3 Caracterizao e qualidade da matria-prima___________________________________ 15

    2.3.1 Produo de etanol atravs de outras fontes __________________________________ 18

    2.4 Fatores relacionados ao processo fermentativo _________________________________ 19

    2.4.1 Conduo da fermentao visando produo de aguardentes____________________ 20

    2.4.2 Linhagens ____________________________________________________________ 22

    2.4.3 Contaminao _________________________________________________________ 24

    2.4.3.1 Contaminao por leveduras ____________________________________________ 25

    2.4.3.2 Contaminao por bactrias _____________________________________________ 25

    2.4.4 Temperatura __________________________________________________________ 26

    2.5 Carbamato de etila _______________________________________________________ 28

    2.6 Compostos volteis ______________________________________________________ 30

    2.6.1 lcoois superiores _____________________________________________________ 30

    2.6.2 steres _______________________________________________________________ 32

    2.6.3 Aldedos _____________________________________________________________ 32

    2.6.4 cidos orgnicos_______________________________________________________ 33

    2.6.5 Furfural e hidroximetil-furfural____________________________________________ 34

    2.6.6 Metanol ______________________________________________________________ 34

    2.6.7 Cobre, Arsnio e Chumbo________________________________________________ 35

    2.7 Destilao______________________________________________________________ 35

    2.7.1 Alambique____________________________________________________________ 36

    2.7.2 Colunas de destilao ___________________________________________________ 36

    3 MATERIAL E MTODOS _________________________________________________ 38

    3.1 Local__________________________________________________________________ 39

  • 8

    3.2 Microrganismos _________________________________________________________ 39

    3.3 Meios de cultivo para fermentao___________________________________________ 40

    3.3.1 Meio YEPD___________________________________________________________ 40

    3.3.2 Meio com caldo de cana-de-acar _________________________________________ 40

    3.4 Tratamentos ____________________________________________________________ 41

    3.5 Conduo da fermentao _________________________________________________ 41

    3.5.1 Conduo da fermentao para anlise cromatogrfica do destilado _______________ 41

    3.5.1.1 Destilao do vinho para as anlises cromatogrficas _________________________ 42

    3.6 Anlises fsico-qumicas __________________________________________________ 42

    3.6.1 Concentrao de leveduras _______________________________________________ 42

    3.6.2 Acar redutor total_____________________________________________________ 42

    3.6.3 Determinao do teor alcolico____________________________________________ 42

    3.6.4 Anlise cromatogrfica do vinho___________________________________________ 42

    3.7 Anlise estatstica________________________________________________________ 43

    3.7.1 Estudo 1: Crescimento celular, acar residual e teor alcolico do vinho____________ 43

    3.7.2 Estudo 2: Amostras cromatografadas _______________________________________ 43

    4 RESULTADOS E DISCUSSO _____________________________________________ 44

    4.1 Estudo 1: Anlise de crescimento celular, acar residual e teor alcolico do vinho_____ 44

    4.2 Estudo 2: Anlise cromatogrfica do destilado _________________________________ 48

    5 CONCLUSES___________________________________________________________ 56

    REFERNCIAS _____________________________________________________________ 57

    APNDICES________________________________________________________________ 77

  • 9

    RESUMO

    A influncia da temperatura na conduo de dois processos fermentativos para a produo de cachaa

    O presente trabalho teve como objetivo estudar o comportamento de trs linhagens de leveduras, sendo duas da espcie S. cerevisiae, (Y-904 e CAT) e uma da espcie S. bayanus, (EC) em duas temperaturas de fermentao 20 e 32 C, usando dois meios, YEPD (meio controle) e caldo de cana-de-acar clarificado. As fermentaes foram realizadas em cmara de BOD, esttico, em frascos de erlenmeyer, com 200 mL de meio e 1 g de fermento seco. A concentrao de acar foi padronizada para 150,0 g L-1 de ART (acares redutores totais) e 15,2 brix, nos ensaios que se utilizou o caldo de cana como substrato. As fermentaes que se utilizou apenas o caldo de cana foram realizadas em bales de cinco litros, em ambas as temperaturas, nas quais as trs linhagens de levedura foram avaliadas, atravs da anlise cromatogrfica do destilado. Para a obteno dos destilados foi montado em laboratrio um destilador feito totalmente de vidro. Nos ensaios que se utilizou o meio controle e o caldo de cana nas duas temperaturas de fermentao, as leveduras foram avaliadas quanto ao crescimento celular, o acar residual e o teor alcolico. As amostras dos destilados provenientes das fermentaes que utilizaram apenas o caldo de cana como mosto, foram avaliadas quanto: steres, aldedos, acidez voltil, lcoois superiores, lcool metlico, furfural, carbamato de etila, acrolena e cobre. As trs linhagens ensaiadas apresentaram diferenas estatsticas entre si e entre os meios utilizados. O objetivo no foi a comparao entre as duas temperaturas e sim avaliar o comportamento das linhagens e verificar a possibilidade de se efetuar fermentaes a 20 e a 32 C. Pela anlise cromatogrfica alguns componentes volteis como steres, aldedos, acidez voltil, lcoois superiores e lcool metlico, apresentaram diferenas estatsticas, isto , a formao desses compostos foi influenciada pela temperatura e pelas linhagens utilizadas. O teor de steres aumentou com o decrscimo da temperatura para S. bayanus. A acidez voltil aumentou com o acrscimo da temperatura, assim como ocorreu com a formao de lcoois superiores e de lcool metlico que foi mais elevada a 32 C do que a 20 C. Enquanto que outros componentes como: furfural, carbamato de etila, acrolena e cobre no apresentaram diferenas em relao a variao da temperatura ou pelas leveduras utilizadas. Palavras-chave: Cachaa, Temperatura, Leveduras, Compostos volteis, Bebidas alcolicas.

  • 10

    ABSTRACT

    Influence of the temperature in the conduction of two fermentative processes for cachaa production.

    The present work had the aim of studying the behavior of three yeast strains, considering two from Saccharomyces cerevisiae species (Y-904 and CAT) and one from Saccharomyces bayanus species (EC), in two fermentation temperatures, 20 and 32 C, utilizing two mediums, YEPD (control medium) and clarified sugarcane juice. The fermentations were carried out in stable BOD chambers, in bottles of Erlenmeyer, with 200 mL of each medium and 1 g of dried yeast. The sugarcane concentration was standardized to 150g/L of ART (total reductor sugar) and to 15,2 brix in the essay that was used the sugarcane juice as medium. The fermentations that were used only the sugarcane juice were carried out into 5 liters balloons capacity, in both temperatures, where the three yeasts strains were evaluated through chromatography analysis of the distillates. In order to obtain the distillates, it was built a all-glass distillation apparatus. The yeasts were analyzed as the cell growth, the residual sugar and the alcoholic concentration at the essays which were used the control medium and the sugar cane juice in both temperatures. It was evaluated esters, aldehydes, acidity, higher alcohols, methyl alcohol, furfural, acrolein and copper in the distillates samples which came from the fermentations that used only the sugarcane juice as wort. The three yeast strains showed differences between each other and between the mediums. The aim of this study was not to compare the results between the temperatures, but it was to evaluate the behavior of the strains and find out the possibility of making fermentations at 20 and 32C. The chromatography analysis showed statistical differences from volatile compounds as: esters, aldehydes, acidity, higher alcohols and methyl alcohol. These results show that the formation of these compounds was influenced by temperature and by the yeats strains used. The content of esters increased when temperature decreased for S. bayanus. The acidity increased when the temperature also increased, the same occurred with higher alcohol formation and methyl alcohol formation. The methyl alcohol formation was higher at 32 C than 20 C. The others compounds as: furfural, ethyl carbamate, acrolein and copper did not show differences related to the temperature variation and the yeasts strains used. Key words: Cachaca, Temperature, Yeasts, Volatile compounds, Alcoholic beverages.

  • 11

    1 INTRODUO

    A aguardente se destaca no cenrio nacional como sendo a bebida alcolica mais

    consumida no pas gerando uma elevada receita no mbito nacional, alm de servios diretos e

    indiretos, mas infelizmente ainda sendo consumida predominantemente pelas classes sociais

    menos favorecida, devido a isso se torna indispensvel o aumento de conhecimento das tcnicas

    de produo, possibilitando assim, um produto de melhor qualidade, que se possa agregar valores

    e obteno de maior amplitude de comercializao dentro das classes sociais e do mercado

    externo.

    A melhoria da qualidade da cachaa passar necessariamente pela padronizao de

    procedimentos que permitam obter produtos de composio semelhante ao longo do processo

    produtivo. Atualmente, a maioria dos produtores trabalha com caldo de cana bruto, em

    concentrao de acar varivel e em processo fermentativo de pouco monitoramento quanto as

    suas variveis.

    Assim, a busca de qualidade exige procedimentos tcnicos adequados em toda a cadeia

    produtiva, iniciando na colheita de cana-de-acar com maturao aceitvel, tratamento do caldo

    para a reduo de impurezas e microrganismos, inoculao correta de fermento, em concentrao

    monitorada e reciclos controlados, alm das condies ambientais e de equipamentos

    desenvolvidos para fermentao alcolica industrial.

    Conseguindo-se regularidade nos parmetros fermentativos agora poder-se- padronizar a

    destilao e demais operaes at o controle total da qualidade.

    Objetivos

    O escopo desta pesquisa foi estudar:

    o efeito de espcies e de linhagens na composio do destilado; o efeito do estabelecimento de temperatura constante na composio de elementos

    volteis da aguardente ou cachaa.

    uma conduo de processo fermentativo que possa produzir um produto diferenciado tanto em funo das caractersticas fsico-qumicas quanto sensoriais.

  • 12

    2 REVISO DE LITERATURA

    2.1 Importncia econmica da aguardente

    A cachaa, bebida genuinamente nacional produzida praticamente em todo o pas, era a

    bebida destilada mais consumida no mundo (DRINKS INTERNATIONAL, 1994). Entretanto,

    ela passou a ser a terceira bebida destilada mais consumida no mundo e a primeira no Brasil

    (ABRABE, 2005).

    A produo brasileira de aguardente se encontra na faixa de 1,5 bilho de litros/ano,

    entretanto, em 1990, os valores da Carteira de Comrcio Exterior do Banco do Brasil (CACEX)

    demonstraram que o volume de exportao no passava de 0,2 % do produzido, e que apesar da

    sua tradio e importncia, ocorreu um crescimento em direo dos aumentos de produo, sem

    se preocupar com a qualidade final do produto entregue ao consumidor. A partir dessa data,

    foram criados grupos de trabalho formados por pesquisadores e tcnicos com o objetivo de alertar

    os produtores para a necessidade de se incrementar medidas que viessem possibilitar a melhoria

    da qualidade da bebida. Para mudar essa situao foi necessrio o desenvolvimento e o

    fortalecimento de conceitos, sem falar na atualizao do sistema e da tcnica de produo de

    aguardente, melhorando a qualidade e a produtividade, resultando em maior lucratividade para o

    produtor. (MUTTON; MUTTON, 2005).

    A exemplo da promoo realizada por outros pases, de suas bebidas locais, como o

    caso da Tequila no Mxico, no Brasil foi iniciado em 1997 um processo de criao de incentivos

    oficiais para a promoo da cachaa brasileira no mercado externo, atravs da implementao do

    Programa Brasileiro de Desenvolvimento da Aguardente de Cana, Caninha ou Cachaa

    (PBDAC). Atravs da divulgao da cachaa em feiras e congressos a Associao Brasileira de

    Bebidas (ABRABE) procura incentivar a melhoria da qualidade do produto e expandir sua venda

    no mercado externo. Iniciativas vm sendo tomadas com o propsito de incentivar os pequenos e

    mdios produtores de cachaa artesanal e adequar o seu produto s exigncias de qualidade do

    mercado externo. (OLIVEIRA et al., 2001).

    Os desafios em relao ao mercado externo tm sido basicamente relacionados

    conquista de novos mercados e sobrepor a algumas barreiras prevalecentes nesse mercado, como

    o caso dos EUA que no aceitam a importao do produto com o nome de cachaa no rtulo,

  • 13

    mantendo-o como rum, categoria essa sujeita a taxas de importao mais elevadas alm de

    descaracterizar o produto (MERCADO, 2002).

    Setenta por cento da cachaa consumida pura no Brasil (MORAES, 2001). Os principais

    pases importadores so Alemanha, Portugal e Estados Unidos, respectivamente. Em 2003, o

    volume exportado foi de 5,2 milhes de litros de cachaa, e em 2004 aumentou para 10,2 milhes

    de litros (BRASIL, 2005). Atualmente as exportaes representam em torno de 1 % da produo

    total (PBDAC, 2006).

    2.2 Caracterizao da aguardente e da cachaa

    A aguardente de cana possui graduao alcolica de 38 a 54 % em volume, a 20 C,

    obtida de destilado alcolico simples de cana-de-acar (Saccharum officinarum L.) ou pela

    destilao do mosto fermentado de cana-de-acar, podendo ser adicionada de acares at

    6 g L-1 (BRASIL, 1997).

    Cachaa a denominao tpica e exclusiva para aguardente de cana produzida no Brasil

    (BRASIL, 2001), com graduao alcolica de 38 a 48 % v/v a 20 C com caractersticas

    sensoriais peculiares (BRASIL, 2002).

    A aguardente de cana ou caninha est submetida Legislao Nacional (BRASIL, 1974),

    de responsabilidade do Ministrio da Agricultura e Abastecimento (MAAb), atual MAPA

    (Ministrio da Agricultura, Pecuria e Abastecimento), que estabelece os denominados padres

    de identidade e de qualidade aos quais a bebida deve atender.

    Atualmente, a cachaa e a aguardente devem seguir os padres de identidade e qualidade

    descritos na Tabela 1 (BRASIL, 2005).

  • 14

    Tabela 1 - Caractersticas fsicas e qumicas para a aguardente de cana-de-acar e cachaa,

    estabelecidas pela legislao brasileira (BRASIL, 2005).

    Limite Componente Unidade

    mnimo mximo

    Graduao alcolica de aguardente % em volume de lcool etlico

    a 20 C 38 54

    Graduao alcolica de cachaa % em volume de lcool etlico

    a 20 C 38 48

    Acidez voltil, expressa em cido

    actico mg 100 mL-1 de lcool anidro - 150

    steres totais, expressos em acetato

    de etila mg 100 mL-1 de lcool anidro - 200

    Aldedos totais, em acetaldedo mg 100 mL-1 de lcool anidro - 30

    Soma de Furfural e

    Hidroximetilfurfural mg 100 mL-1 de lcool anidro - 5

    Soma dos lcoois isobutlico (2-metil

    propanol), isoamlicos (2-metil-1-

    butanol + 3 metil-1-butanol) e n-

    proplico (1-propanol)

    mg 100 mL-1 de lcool anidro - 360

    Coeficiente de Congneres* mg 100 mL-1 de lcool anidro 200 650

    * Congneres = (Acidez Voltil + steres + Aldedos + Furfural + lcoois Superiores)

    De acordo com a Instruo Normativa n 13 de 30 de junho de 2005, foram definidas

    quantidades mximas permitidas de alguns contaminantes anteriormente no mencionados como

    carbamato de etila, acrolena, lcool sec-butlico, lcool n-butlico, chumbo e arsnio, e alterao

    na concentrao mxima permitida para lcoois superiores, que anteriormente era de

    300 mg 100 mL -1 de lcool anidro e passou a 360 mg 100 mL -1 de lcool anidro. O prazo

    mximo para adequao e controle dos contaminantes da cachaa, com incio na data da

    publicao da Instruo Normativa n 13, de trs anos, com exceo do carbamato de etila que

    de cinco anos.

  • 15

    Tabela 2 - Teores mximos de contaminantes permitidos por Brasil (2005).

    Limite Componente Unidade

    mnimo Mximo

    lcool Metlico mg 100 mL-1 de lcool anidro - 20

    Carbamato de etila g L-1 - 150

    Acrolena (2-propenal) mg 100 mL-1 de lcool anidro - 5

    lcool sec-butlico (2-butanol) mg 100 mL-1 de lcool anidro - 10

    lcool n-butlico (1-butanol) mg 100 mL-1 de lcool anidro - 3

    Cobre mg L-1 - 5

    Chumbo mg L-1 - 200

    Arsnio g L-1 - 100

    No mbito internacional, a formao e o controle dos compostos secundrios de bebidas

    fermentadas e fermento-destiladas foram extensivamente estudados, nas dcadas de 60 e 70 e

    ainda so objetos de pesquisas, em vrios pases; (REED; PEPPLER, 1973; SMEDT; LIDDLE,

    1978; PUECH, 1983; PIGGOTT, 1989). No Brasil, porm, estas informaes ainda no se

    encontram disseminadas e nem mesmo acessveis maioria dos fabricantes, especialmente os que

    operam em escala artesanal e que respondem por uma parcela significativa da produo nacional

    (MAIA 1994).

    Parmetros de qualidade ainda so escassos, uma vez que a legislao em vigor pouco

    rege sobre este atributo, impondo limites para garantia da sade pblica, e que pouco ou nada se

    refere qualidade global do produto (RIBEIRO; HORII, 1998).

    2.3 Caracterizao e qualidade da matria-prima

    A matria-prima para a fabricao da cachaa a cana-de-acar, fator primordial na

    qualidade do produto e produtividade de uma fbrica de aguardente (RIBEIRO, 2002a). A cana-

    de-acar uma planta pertencente classe das Monocotiledneas, famlia Poaceae (Gramineae),

    gnero Saccharum e espcie Saccharum spp (ANDRADE, 2001).

  • 16

    Stupiello (1992) conceitua qualidade da matria-prima como o conjunto de caractersticas

    compatveis com as exigncias da indstria que devem atender a uma conjuno de parmetros

    tecnolgicos e microbiolgicos que definam a sua qualidade e tenham influncia fundamental no

    processamento. Segundo Clarke e Legendre (1999), dentre os fatores de qualidade da matria-

    prima que influem no rendimento do processo de produo de aguardente esto a variedade, o

    contedo de slidos solveis e de acares, o teor de impurezas e fibra na cana e os fatores de

    estresse e deteriorao, causados por atraso no processamento.

    Na produo de aguardente de qualidade deve ser utilizada a cana colhida sem queima e

    processada no mesmo dia; isto se deve ao fato de que quando a cana queimada para efetuar o

    corte, h uma modificao considervel na fisiologia do colmo, dependendo da intensidade do

    fogo e da temperatura ambiente por ocasio da queima. A perda de acares pode atingir 14,5 %

    e pode ser resultante da exsudao aps a queima; alm de causar a inverso gradativa do acar

    pelas enzimas hidrolticas no colmo e causar um incremento na contaminao microbiana pela

    multiplicao no lquido exsudado e impregnao de partculas do solo na superfcie do colmo.

    Ainda pode ocorrer a deteriorao por transpirao, resultando depreciao do produto e

    favorecendo a ao microbiolgica (YOKOYA, 1995).

    O planejamento de colheita na cultura da cana-de-acar se baseia no conceito de que a

    cana tem uma poca, durante o ano, onde ocorre mxima concentrao de sacarose nos colmos,

    em maturao fisiolgica completa ou bastante avanada (COPERSUCAR, 1983). A maturao,

    processo fisiolgico envolvendo a sntese dos acares nas folhas, translocao dos produtos

    formados e estocagem da sacarose no colmo (amadurecimento), um dos principais fatores da

    variao da composio tecnolgica da cana-de-acar (PARAZZI, 1988).

    De acordo com Brieger (1968) a cana-de-acar deve ser colhida e industrializada quando

    atingir teores mnimos de acares suficientes para permitir a sua extrao e transformao em

    produtos comerciais, como a aguardente, por exemplo.

    O perodo de safra da cana-de-acar no Brasil atinge cerca de 150 dias (BRIEGER;

    PARANHOS, 1964). Tal perodo determinado em funo de diversos fatores, destacando-se,

    entre eles, os teores de sacarose e os de acar redutores, contidos no caldo (Van DILLEWJN,

    1952, BONNET, 1962; BRIEGER; PARANHOS, 1964; ALEXANDER, 1973). Por essa razo,

    no se recomenda iniciar a colheita para a produo de acar, enquanto as canas no atingirem

    os padres tecnolgicos mnimos para a sua industrializao (COPERSUCAR, 1980).

  • 17

    Em funo das condies climticas no Brasil tm-se duas pocas de colheita e moagem

    da cana-de-acar e lcool. No chamado Norte Aucareiro (Estados da Regio Nordeste), a safra

    inicia-se em agosto/setembro e vai at maro/abril. No Sul Aucareiro (Estados produtores do

    centro-sul, incluindo Minas Gerais) a safra inicia-se em maio e se estende at

    novembro/dezembro. So essas tambm as principais pocas para produo de aguardente, j que

    nesse perodo a cana se apresenta madura, o que resulta em melhores rendimentos (ANDRADE,

    2001).

    A Figura 1 representa as diferentes pocas de maturao e colheita na cultura da cana-de-

    acar. O perodo de maturao da cana-de-acar na maioria das variedades tem pico em agosto

    e setembro.

    Figura 1. Ciclo da cana-de-acar e variaes climticas da regio centro sul.

    Fonte: Material dado em aula (HORII, 2004).

    A partir da curva de maturao da variedade, pode-se classific-la em precoce, mdia ou

    tardia, em termos de incio de maturao, Figura 2a, (FERNANDES, 1977 apud SILVA, 2003).

    Com base nesse conceito, so estabelecidas as propores de plantio de cada variedade.

  • 18

    Entretanto, deve ser salientado que a curva de maturao observada para a pol da cana tem

    estreita relao biolgica com os teores de slidos solveis (brix) e com os acares redutores da

    cana-de-acar (Fig. 5b).

    As variedades de curto perodo de crescimento e que amadurecem mais cedo, a maturao

    acelerada, e as variedades com perodo de crescimento mais longo, a maturao retardada.

    Com base nesse fato, as variedades foram classificadas em precoces, mdias e tardias (Fig. 5a).

    Figura 2 - Influncia da maturao dos colmos na acumulao de sacarose (pol) da cana-de-

    acar: a) efeito varietal (FERNANDES, 1977)1; b) interaes com outros

    parmetros tecnolgicos (brix e acares redutores) na safra.

    Fonte: Silva et al. (2003).

    2.3.1 Produo de etanol atravs de outras fontes

    Nos pases em que no h produo de cana-de-acar outras matrias-primas so

    utilizadas na produo de lcool etlico e de bebidas alcolicas. As mais utilizadas so as frutas e

    os cereais.

    1 FERNANDES (1977) apud SILVA, et al. (2003).

  • 19

    Os sucos de frutas so geralmente boa fonte de acares fermentescveis, e as frutas so

    desta forma, usadas como matria-prima para a produo de bebidas alcolicas, devido a sua

    relativa abundncia, alto contedo de acar e baixo custo, fazem das uvas uma escolha favorvel

    (WATSON, 1989). Outras matrias-primas comearam a serem utilizadas, mesmo aquelas no

    diretamente fermentescveis como os cereais. Atualmente os cereais so amplamente utilizados

    na produo de algumas bebidas alcolicas, como a cerveja, o usque, saqu, dentre os quais

    podemos citar: o milho, a cevada, o trigo, o centeio, entre outros (COLE; NOBLE, 1995).

    O milho bastante utilizado em virtude de seu alto teor de amido, e produzido em

    grande escala nos Estados Unidos, e representa matria-prima bsica para a produo de usque e

    outras bebidas. O lcool de milho um produto de alta qualidade, prprio para a produo de

    bebidas finas, setor em que seu emprego pode ser largamente ampliado. Quando colhido

    apresenta uma composio mdia de: 10,93 % de umidade, 9,88 % de protena, 4,17 % de

    matria graxa, 71,95 % de hidratos de carbono, 1,71 % de fibras e 1,36 % de matria mineral,

    alm de vitaminas e outros elementos nutritivos (TEIXEIRA, 1966).

    Os cereais apresentam a vantagem de poderem ser armazenados, e quando armazenados

    de forma correta no h melhoria na qualidade do gro, mas a manuteno da mesma (SANTOS

    et al., 1994), assim, as caractersticas e a qualidade do gro so mantidas, possibilitando a

    produo de bebidas utilizando a mesma matria-prima durante todo o ano e no apenas durante

    os meses de safra, como ocorre com a cana-de-acar, variando a qualidade em funo do estdio

    de maturao, da variedade, das condies edafoclimticas, entre outras.

    2.4 Fatores relacionados ao processo fermentativo

    A fermentao alcolica a fase na qual so produzidos os principais componentes

    qumicos da aguardente, sendo que muitos dos quais podem influenciar no aroma e no sabor da

    bebida, conseqentemente, na caracterizao e na qualidade (SUOMALAINEN; LEHTONEN,

    1979).

    O acar que se encontra no mosto utilizado pela levedura para a produo de etanol,

    gs carbnico, massa celular, cidos succnico e actico, glicerol, lcoois superiores, steres,

    aldedos, entre outros produtos.

    As leveduras so microrganismos eucariontes (possuem estrutura interna complexa),

    unicelulares, desprovidos de clorofila e podem ser encontrados em quase todo lugar no ambiente.

  • 20

    A habilidade de converter acares em etanol caracterstica de um pequeno grupo de

    microrganismos, sendo Saccharomyces cerevisiae, dentre as leveduras, a que mais se destaca pela

    alta produo e tolerncia a concentraes elevadas de etanol (SCHWAN; CASTRO, 2001).

    Segundo Ribeiro et al. (1987), as clulas de leveduras apresentam necessidades

    nutricionais durante o processo de fermentao alcolica, influenciando diretamente na

    multiplicao e no crescimento celular e tambm na eficincia da transformao de acar em

    lcool. O nitrognio devido a sua importncia para as leveduras considerado um elemento

    essencial para a multiplicao e crescimento das leveduras. Este nutriente entra como constituinte

    de vrias substncias orgnicas encontradas nas leveduras, como os aminocidos, protenas,

    enzimas, pirimidinas, purinas, pigmentos respiratrios (citocromos), lecitina, vitaminas e cefalina

    (WHITE, 1954).

    Mudanas durante o processo fermentativo so fundamentais na obteno de bebida de

    qualidade, pois promovem uma mudana na proporo dos componentes no-lcoois, que

    formam o bouquet caracterstico da bebida (LIMA, 1964).

    2.4.1 Conduo da fermentao visando produo de aguardentes

    Para que ocorra uma vigorosa fermentao, necessrio que as exigncias nutricionais da

    levedura (fermento) sejam supridas, permitindo, assim, a produo e garantindo a viabilidade

    celular (SCHWAN; CASTRO, 2001).

    O preparo do mosto envolve operaes que permitem melhorar as condies de

    fermentao do caldo de cana. Inicia-se pela sua filtrao e decantao, com ajustes no teor de

    acar, acidez, nutrientes e temperatura (RIBEIRO, 2002a).

    A preparao da cana para a moagem no feita nas pequenas destilarias porque exige

    equipamento especial que eleva muito o investimento (LIMA, 1999a), e para o preparo do mosto

    o caldo de cana proveniente da moenda filtrado em tela fina (peneiras), passando em seguida

    por decantador, para eliminar a terra e o bagacilho. Na filtrao, so eliminados os pedaos

    maiores de bagao arrastados com o caldo. O bagacilho, partculas de terra e outras impurezas

    menores, so extrados durante a decantao. As impurezas do caldo so fontes de infeces na

    fermentao, provocando o desenvolvimento de microrganismos indesejveis. O bagacilho alm

    de favorecer as contaminaes, quando arrastado para o alambique, provoca a formao

    indesejvel de furfural e metanol (RIBEIRO, 2002b).

  • 21

    Assim como nos laboratrios no imprescindvel a esterilizao do caldo, por

    aquecimento a temperaturas letais para os microrganismos presentes, porm esse procedimento

    caro para aplicao industrial, e sobretudo em pequenas instalaes (LIMA, 1999a).

    Na fabricao artesanal de cachaa, os produtores utilizam leveduras selvagens, ou seja,

    que j se encontram na superfcie dos colmos (RIBEIRO, 2002b), as quais so provenientes da

    manipulao na colheita, transporte e moagem da cana (SCHWAN; CASTRO, 2001). Porm a

    quantidade de leveduras selvagens na cana pequena, razo principal dos insucessos que

    ocorrem na prtica quando se prepara o inculo (p inicial, p-de-cuba ou p de fermentao)

    pelo chamado processo caipira (LIMA, 1999b). As espcies de leveduras presentes variam de

    regio para regio, sendo afetadas principalmente pelas variedades de cana utilizadas, pelas

    condies climticas da regio e pelas peculiaridades operacionais de cada produtor (RIBEIRO,

    2002c). O fermento caipira nada mais que o resultado do aproveitamento das leveduras naturais

    do mosto de forma concentrada, mediante certos tratamentos cuja finalidade ativar a sua

    multiplicao (LIMA, 1999b).

    No processo de produo da cachaa artesanal, os produtores no utilizam ingredientes

    qumicos. Todos os nutrientes originam-se de fontes naturais. O fub e o farelo de arroz so os

    nutrientes mais empregados. Alguns produtores utilizam exclusivamente o caldo de cana

    (RIBEIRO, 2002d).

    Nas pequenas destilarias costume preparar, no incio de cada safra, apenas um p de

    fermentao e depois seguir o trabalho normal cortando, ou seja, dividindo o mosto em

    fermentao para diversas dornas, entretanto, embora seja de uso generalizado, no o melhor

    meio de iniciar a safra (LIMA, 1999b).

    No preparo do p-de-cuba selvagem utilizado o farelo arroz, o fub de milho, caldo de

    limo ou de laranja azeda e existe ainda a possibilidade de se alterar o modo de preparo

    alterando-se a quantidade dos ingredientes utilizados. Apesar de neste mtodo serem fornecidos

    todos os nutrientes (protenas, vitaminas) e condies fsicas (acidez e temperatura) propcias

    para o desenvolvimento de leveduras, ocorrem dois inconvenientes serissimos. O primeiro deles

    que, aliado s leveduras, o nmero de microrganismos contaminantes ser enorme, podendo,

    assim, interferir na qualidade e produtividade da fermentao. E a outra desvantagem deste

    mtodo a mo-de-obra e o tempo necessrio para que o p-de-cuba obtido tenha quantidade

    suficiente de leveduras para iniciar a fermentao alcolica (SCHWAN; CASTRO 2001).

  • 22

    Em geral, a fermentao pode ser conduzida por trs diferentes sistemas: convencional em

    batelada, descontnuo-alimentado e contnuo, que so escolhidos pelos produtores de acordo com

    o tipo de indstria. O mtodo convencional o comumente adotado pelos produtores de

    aguardente artesanal e consiste em colocar o inculo e todo o meio a ser fermentado juntos na

    dorna de fermentao. Aps 24 horas, destila-se o produto, lava-se a dorna e inicia-se novo

    processo. Esse mtodo interfere significativamente no metabolismo das leveduras, fazendo com

    que as clulas sejam mais sensveis aos efeitos txicos do etanol. No sistema de bateladas

    sucessivas, h o aproveitamento do fermento em vrias fermentaes subseqentes. No sistema

    descontnuo alimentado, a dorna alimentada aos poucos, de modo que mantenha um teor de

    acar pr-estabelecido e inferior ao utilizado no sistema de batelada. No processo contnuo,

    alimenta-se a dorna com fluxo contnuo de substrato, em concentrao conveniente, e retira-se

    tambm de forma contnua parte do lquido (sem levedura) a ser destilado (SCHWAN; CASTRO

    2001).

    2.4.2 Linhagens

    A influncia das espcies ou linhagens de leveduras na formao de compostos do aroma

    (steres, lcoois superiores, aldedos, cidos graxos, entre outros) em fermentao de diferentes

    bebidas alcolicas, tais como vinho, cerveja, usque, conhaque e rum, de relativa importncia

    (NYKNEN; NYKNEN, 1977; SOLES et al., 1982; CABRERA et al., 1988; GIUDICI et al.,

    1990; MATEO et al., 1991; LONGO et al., 1992; MATEO et al., 1992; LURTON et al., 1995).

    As condies de fermentao e as leveduras so apontadas como os fatores que mais

    influenciam o sabor das bebidas alcolicas (SUOMALAINEN, 1971; SUOMALAINEN;

    LEHTONEN, 1979). Suomalainen e Nyknen (1966) relatam que os mesmos compostos

    aparecem como principais componentes nas diversas bebidas alcolicas, independentemente da

    matria-prima utilizada, o que evidencia a importncia das leveduras na formao do sabor das

    bebidas alcolicas. Segundo Lehtonen e Jounela-Erikson (1983), a natureza e a quantidade dos

    compostos formados na fermentao so grandemente afetadas pelas condies de fermentao,

    tais como a temperatura e nutrientes do meio de fermentao.

    Suomalainen e Nyknen (1966) estudaram a capacidade de leveduras comerciais de S.

    cerevisiae sintetizar vrios compostos de aroma em meio sinttico contendo sacarose como fonte

    de carbono sem adio de nitrognio. Os autores verificaram grande similaridade entre a

  • 23

    composio qualitativa das substncias volteis presentes nos destilados desta fermentao com a

    dos destilados obtidos na produo do usque de origem escocesa, embora certas diferenas

    quantitativas fossem evidentes. Estas similaridades indicaram que as leveduras eram as

    responsveis pela maior parte dos compostos aromticos produzidos.

    Suomalainen (1971) relata que dentro de um grupo de mais de 100 componentes volteis

    verificou-se que as mesmas substncias aparecem na frao de componentes do aroma em

    cervejas, vinhos e bebidas destiladas. Em vista disso, parece evidente que a matria-prima

    utilizada na produo de bebidas contribui de maneira limitada para o aroma.

    Diferentes espcies e linhagens de leveduras so responsveis por elevada variabilidade

    (at cinco vezes) na concentrao de lcoois superiores em cerveja Engan (COLE; NOBLE,

    1995).

    Segundo Korhola et al., (1989), as espcies e linhagens de leveduras diferem na sua

    capacidade de produzir lcoois superiores. Giudici et al. (1990) examinaram a capacidade de

    produzir lcoois superiores em 100 linhagens de S. cerevisiae e verificaram que para as linhagens

    testadas a produo de lcoois superiores uma caracterstica individual e as diferenas foram

    estatisticamente significativas. Parfait e Jouret (1975) mostraram que S. pombe produz

    relativamente pouca quantidade de lcool fsel.

    Na produo de usque, assim como em outras bebidas alcolicas, so utilizadas para

    fermentao, leveduras especficas como Saccharomyces cerevisiae, enquanto o malte e outros

    cereais podem estar contaminados com uma grande variedade de organismos, leveduras e

    bactrias (WATSON, 1981, 1984).

    Na produo de cidra, Saccharomyces cerevisiae no era a principal levedura constituinte

    da microflora das mas, por isso leveduras no pertencentes Saccharomyces ssp.

    predominavam no incio das fermentaes, pois se multiplicavam rapidamente produzindo gs e

    lcool e uma variedade de distintos flavores, e tambm, favoreciam as contaminaes bacterianas

    necessitando o uso de SO2. Com o aumento do nvel de lcool, esses microrganismos comeavam

    a morrer e a microbiota sucessiva era tomada por Saccharomyces uvarum; essa levedura era

    responsvel por completar a converso de todo acar em lcool e pela gerao de vinhos com

    melhores flavores (LEA, 1995).

    Atualmente poucos produtores de cidra no Reino Unido esperam pela estabilizao

    natural de Saccharomyces. Culturas especficas de leveduras tm sido adicionadas aos meios de

  • 24

    fermentao para a produo de cidra, sendo que, inicialmente elas eram isoladas das prprias

    fbricas dessa bebida, enquanto que outras companhias fizeram uso de conhecidas leveduras de

    vinho de instituies de pesquisa mundial. Alm da habilidade dessas leveduras se multiplicarem

    rapidamente e de dominarem a fermentao, elas foram recomendadas, pois esto livres de

    contaminao ou da produo de sulfeto de hidrognio, e da capacidade de flocular e compactar-

    se no final da fermentao (LEA; DRILLEAU, 2003).

    Leveduras secas de vinho tm sido amplamente utilizadas na indstria de cidra no Reino

    Unido; em termos comerciais a tecnologia de preparo e armazenagem dessas leveduras tem sido

    perfeita. Entre as leveduras que se destacam esto Uvaferm CM e BC Lalvin EC1118 e Siha

    Nmero 3. O uso de inculos contendo S. bayanus e S. uvarum uma prtica utilizada

    mundialmente, pois a primeira levedura promove um comeo rpido, mas a segunda se adapta

    melhor ao ambiente seco promovido pela escassez de acar (LEA; DRILLEAU, 1995).

    As linhagens de levedura Saccharomyces bayanus e S. uvarum so usadas no incio das

    fermentaes na produo de vinhos em mostos de baixa acidez, pois sintetizam os cidos mlico

    e succnico (RAINIERI et al., 1998), inibindo a fermentao maloltica (CARIDINI; CORTE,

    1997) e produzindo mais glicerol do que Saccharomyces cerevisiae e menos cido actico e

    etanol (BERTOLINI et al., 1996; CASTELLARI et al., 1994).

    Com a utilizao dessas leveduras possvel diminuir a quantidade de sulfitos

    adicionados para estabilizao de vinhos (CARIDINI; CORTE, 1997), sendo uma grande

    vantagem para os consumidores sensveis ao sulfito. Saccharomyces bayanus e S. uvarum

    tambm so descritos por diferentes autores como sendo uma linhagem que produz altas

    concentraes de compostos volteis, assim como beta-phenylethanol e seus acetatos (SERRA et

    al., 2005).

    2.4.3 Contaminao

    Em destilarias de lcool importante se avaliar os microrganismos contaminantes e seus

    reflexos sobre o processo fermentativo (CAMOLEZ; MUTTON, 2005). Para Oliva-Neto e

    Yokoya (1997) os maiores prejuzos causados pela contaminao bacteriana so a degradao da

    sacarose e a formao de cidos orgnicos que ocasionam a perda de acar e intoxicao das

    leveduras.

  • 25

    A contaminao por microrganismos deteriorantes geralmente leva a impedimentos

    tecnolgicos no processo de maltagem e na produo de cervejas, incluindo a deteriorao de

    material cru, problemas na filtrao e outros efeitos deletrios, tanto no processamento quanto no

    produto final, a cerveja. Dentre esses efeitos incluem-se turbidez na cerveja e a formao de

    flavores e aromas indesejveis (HAIKARA; LAITILA, citados por LOWE et al., 2005).

    2.4.3.1 Contaminao por leveduras

    Cabrini e Gallo (1999) definiram levedura contaminante como qualquer levedura presente

    no processo fermentativo que no seja aquela selecionada para a conduo da produo de lcool,

    que atuam prejudicando o processo fermentativo, causando problemas operacionais e

    aumentando o tempo de fermentao.

    Segundo Camolez e Mutton (2005), a presena de contaminantes na fermentao resulta

    em srios prejuzos para as leveduras refletindo-se de modo direto sobre a produtividade e o

    rendimento do processo fermentativo. Em experimento visando a produo de lcool, houve

    maior formao de glicerol e de cidos totais como resultado das contaminaes e/ou desvios no

    metabolismo das leveduras, assim como queda no rendimento fermentativo.

    2.4.3.2 Contaminao por bactrias

    Segundo Alcarde e Yokoya (2003) a contaminao bacteriana um dos fatores

    preponderantes dentre aqueles que afetam a fermentao alcolica industrial, posto que o mais

    freqente agente presente.

    O crescimento de bactrias acticas em uvas ou atravs do processo de produo de

    vinhos influencia a qualidade do vinho, principalmente porque ela aumenta a acidez voltil.

    Embora outros microrganismos do vinho, assim como leveduras e bactrias lticas possam

    produzir cido actico, populaes significantes de bactrias acticas so as maiores responsveis

    pela produo desse cido em vinho (GONZLEZ et al., 2005). E o crescimento excessivo delas

    no mosto pode fazer com que a fermentao alcolica no se complete (DRYSDALE; FLEET,

    1988,1989).

    As bactrias lticas, tanto na forma de cocos (Streptococcus e Leuconostoc) como em

    bastonetes (Lactobacillus) tem mostrado mais atuantes na fermentao alcolica (AMORIM;

  • 26

    OLIVEIRA, 1982). A presena dessas bactrias causa incremento na acidez do vinho pela

    produo de cidos ltico e actico e acarretam quedas na percentagem de clulas vivas das

    leveduras e do rendimento alcolico (ALTERTHUM et al., 1984).

    Oliveira-Freguglia e Horii (1998), demonstraram que a contaminao por L. fermentum

    causa floculao, alm de ter grande influncia sobre a viabilidade de Saccharomyces cerevisiae,

    podendo reduzir a valores prximos a 0 em cerca de 12 horas aps o trmino da fermentao

    alcolica. Um fator de relevante importncia, que a toxidez de seus produtos metablicos se

    manifesta mesmo atenuada por um tratamento trmico ou antimicrobiano.

    2.4.4 Temperatura

    A temperatura indiscutivelmente um dos parmetros mais importantes que afetam a

    fermentao (FLEET; HEARD, 1993; KILLIAN; OUGH, 1979; SUOMALAINEN;

    LEHTONEN, 1979; WATSON, 1987). A temperatura influencia no metabolismo da levedura e

    na produo de compostos volteis (FLEET; HEARD, 1993; KILLIAN; OUGH, 1979;

    SUOMALAINEN; LEHTONEN, 1979). O perfil aromtico dos vinhos resultante destes

    componentes que so formados e retidos, a maior parte deles, durante a fermentao, desde que

    estejam presentes em concentraes elevadas (PRETORIUS, 2000). As baixas temperaturas

    reduzem o crescimento de bactrias acticas e lcticas, facilitando o controle da fermentao

    alcolica (MEURGUES, 1996).

    A indstria de vinho tem se preocupado consideravelmente em controlar a temperatura de

    fermentao. Vinhos produzidos a baixas temperaturas (10-15 C) so conhecidos por

    desenvolverem certas caractersticas de sabor e aroma (FEUILLAI et al., 1997; JACKSON,

    1994), alm de aumentar a durao da fermentao alcolica, por diminuio da velocidade de

    crescimento da levedura e modificando a ecologia da fermentao do vinho. A competio por

    nutrientes durante fermentaes a baixas temperaturas maior entre as leveduras inoculada e as

    selvagens (FLEET; HEARD, 1993), podendo levar paralisao da fermentao (LLAURAD,

    2002).

    As leveduras selvagens, no pertencentes espcie Saccharomyces cerevisiae contribuem

    significativamente para as fermentaes conduzidas abaixo de 20 C, de modo que essa

    influncia ecolgica deveria ser refletida na composio qumica e sensorial do vinho (FLEET;

    HEARD, 1993; LAMBRECHTS; PRETORIUS, 2000). Embora baixas temperaturas de

  • 27

    fermentao tenham interessantes aplicaes na indstria de produo de vinhos, existe tambm

    um efeito adverso no crescimento celular, porque ela aumenta o estresse da levedura durante a

    produo de vinho (BAUER; PRETORIUS, 2000), o qual pode ser controlado inoculando-se

    leveduras selecionadas na fermentao alcolica (FEUILLAT et al., 1997).

    Embora no se saiba exatamente o que causa a paralisao da fermentao alguns fatores

    importantes so: composio do mosto, que determinado pela variedade da uva, clima, entre

    outros, e prticas tecnolgicas como clarificao do mosto e a temperatura de fermentao

    (INGLEDEW; KUNKEE, 1985; AYESTARAN et al., 1995).

    A realizao da fermentao em temperaturas baixas, demonstra como efeito inicial, o

    prolongamento da fase Lag (NOVO et al., 2003).

    Existem evidncias que mostram que as clulas de levedura possam se adaptar ao estresse

    provocado pela queda de temperatura. A composio da membrana lipdica modificada para

    corrigir as mudanas de fluidez causadas por baixas temperaturas (SUUTARI et al., 1990). A

    membrana composta por cidos graxos principalmente varivel e influenciada por vrios fatores

    como a temperatura, oxignio, limitao de nutrientes e taxa de crescimento (HUNTER; ROSE,

    1972; RATLEDGE; EVANS, 1989). A membrana de composio lipdica das leveduras, assim

    como em outros microrganismos, muda de acordo com as variaes de temperatura; quanto

    menor a temperatura, mais insaturada a membrana de composio lipdica (WATSON, 1987).

    Alguns outros metablitos e atividades enzimticas se modificam a baixas temperaturas de

    fermentao, como o glicerol (RANKINE; BRIDSON, 1971; CASTELLARI et al., 1995), e

    alguns carboidratos de reserva como a trealose ou glicognio, (NOVO et al., 2003; THEVELEIN,

    1998), assim como a assimilao e metabolismo do nitrognio.

    A adaptao de alguns meios e temperaturas antes da inoculao pode afetar no apenas a

    habilidade das clulas sobreviverem, mas tambm a qualidade e a composio dos vinhos

    (LLAURAD et al., 2002).

    No experimento conduzido entre linhagens de Saccharomyces e dois nveis de

    temperatura, 13 e 25 C, Torija et al. (2003), demonstraram que nas fermentaes a 13 C, S.

    bayanus teve as mais altas concentraes de cidos graxos de cadeia mdia e foi a nica

    linhagem que mostrou diferenas significativas entre as duas temperaturas durante toda

    fermentao. As maiores concentraes de compostos volteis foram detectadas entre as

    fermentaes conduzidas s baixas temperaturas. Porm isso no foi observado em S. cerevisiae,

  • 28

    onde as quantidades de compostos volteis no vinho final foram similares s duas temperaturas.

    A maior diferena dentre os compostos volteis produzidos entre as espcies foi a produo de 2-

    phenyl-ethanol. S. bayanus produziu trs vezes mais comparando com S. cerevisiae, o qual

    geralmente produzido durante os primeiros estgios de fermentao. A produo de acetatos,

    steres de etila e cidos graxos de cadeia mdia foi mxima em S. cerevisiae a 13 C.

    2.5 Carbamato de etila

    O carbamato de etila (CE) ou uretana um composto considerado potencialmente

    carcinognico. O Canad foi o primeiro pas a ter legislao especfica sobre o assunto se

    tornando um referencial para os Estados Unidos e a Comunidade Europia, seguindo assim, o

    teor mximo deste contaminante estabelecido para bebidas destiladas. O Brasil sendo um dos

    maiores produtores de destilados alcolicos do mundo torna-se imprescindvel o conhecimento

    dos nveis de ocorrncia do carbamato de etila nos destilados e principalmente na cachaa, pois

    alm dos aspectos ligados sade pblica, a sua presena em concentraes superiores a

    150 g L-1 constitui uma barreira para exportaes para a Europa e Amrica do Norte

    (ANDRADE-SOBRINHO et al., 2002).

    O carbamato de etila formado nas bebidas destiladas por diferentes vias, podendo ser

    pela reao entre o etanol e precursores nitrogenados, como a uria, o fosfato de carbamila e o

    cianeto, sendo este ltimo considerado um precursor de carbamato de etila durante e aps o

    processo de destilao (OUGHT et al., 1988; STEVENS; OUGHT, 1993; TEGMO-LARSSON;

    SPITTLER, 1990).

    Nas bebidas destiladas o carbamato de etila encontrado em altas concentraes nas

    aguardentes de frutas, entretanto o problema no est somente na fermentao ou durante a

    destilao, mas no prprio destilado (AYLOTT et al., 1990; MacKENZIE et al., 1990; RIFFIKIN

    et al.a 1989).

    Riffikin et al.a (1989) estudaram a formao de carbamato de etila durante a destilao de

    usques. As destilaes foram realizadas em alambique feito totalmente de cobre e em destilador

    feito totalmente de vidro, e verificaram que a formao de CE ocorreu somente quando a

    destilao foi realizada em presena de cobre. O aumento dos nveis naturais de carbamato de

    etila aps a destilao, ocorreu apenas quando o cobre esteve presente durante e aps a

    destilao, e esta foi dependente do tempo; quanto maior o tempo de armazenamento, maior a

  • 29

    formao de carbamato de etila. No fermentado destilado em equipamento de vidro, nenhuma

    formao significante de carbamato de etila ocorreu, ficando abaixo de 5 g L-1.

    O mecanismo de formao de carbamato de etila dependente do contato do cobre com

    alguns compostos proticos presentes no mosto, durante a destilao nas fases lquidas e vapor

    (RIFFKIN a;b, 1989).

    Andrade-Sobrinho et al. (2002) analisaram 126 amostras de aguardentes de cana de

    diferentes regies produtoras no pas e verificou que o teor mdio de carbamato de etila foi de

    0,77 mg L-1, variando de 0,013 a 5,7 mg L-1 e que apenas 21 % das amostras analisadas

    apresentaram teores menores que 0,150 mg L-1, valor considerado internacionalmente aceitvel.

    Tendo como um dos fatores responsveis por essa variao a influncia do sistema de destilao

    empregado. Devido necessidade de aumentar os valores de produo, muitos produtores

    abandonaram o sistema de destilao tradicional em alambique (sistema descontnuo) e adotaram

    a destilao em coluna (sistema contnuo), os quais diferem no apenas no sistema de destilao,

    mas tambm da natureza do material utilizado na confeco dos aparelhos destiladores. As

    amostras destiladas em alambique apresentaram um maior percentual de amostras com teor de

    carbamato de etila menor ou igual a 0,150 mg L-1 e nas faixas de 0,401 1,00 mg L-1 e acima de

    1,00 mg L-1 notou-se um crescente aumento percentual das amostras destiladas em coluna.

    Isto provavelmente conseqncia no apenas do sistema de destilao em si, mas do

    material empregado na confeco dos aparelhos destiladores. A maior parte dos alambiques

    construda de cobre, enquanto as colunas so de ao inoxidvel.

    Com o objetivo de melhorar as caractersticas sensoriais das bebidas destiladas em

    colunas feitas exclusivamente em ao inoxidvel, empregou-se partes em cobre no aparelho

    destilador, assim as propriedades organolpticas negativas so notadamente diminudas (FARIA,

    1993). Por outro lado pode favorecer consideravelmente a formao de carbamato de etila, pois o

    cido ciandrico, no sendo fixado na coluna (parte ascendente do fluxo) atinge o condensador,

    complexando-se com os ons Cu(II) originados da corroso do condensador pelos vapores cidos

    da bebida. Atravs da reduo do Cu(II) a Cu(I) e com a formao de cianognio, seguido de seu

    desproporcionamento, ocorre a formao de ons cianato (BEATTIE; POLYBLANK, 1995).

  • 30

    Os ons cianato por reao com etanol produzem o carbamato de etila:

    Quando o cobre empregado na parte ascendente do fluxo, como ocorre nos alambiques,

    esperado que ocorra uma fixao de cianeto (MacKENZIE et al., 1990), com a formao de

    compostos como: CuCN, Cu(CN)2, Cu2(CN)3, Cu3(CN)4, diminuindo a concentrao de cianeto

    no destilado (BOSCOLO, 2001) e consequentemente, reduzindo o teor de carbamato de etila

    (ANDRADE-SOBRINHO, 2002).

    Vrios fatores so importantes para a formao de carbamato de etila em bebidas

    destiladas, porm ainda no existe uma explicao satisfatria sobre a sua influncia nas cachaas

    (ANDRADE-SOBRINHO, 2002).

    2.6 Compostos volteis

    Na fermentao bem sucedida praticamente todo o acar convertido em etanol,

    normal que uma pequena porcentagem seja convertida em outros sub-produtos (BERRY;

    SLAUGHTER, 1995).

    Embora diferentes bebidas possam ser facilmente distinguidas uma das outras

    organolepticamente, mtodos analticos no revelam maiores diferenas em sua composio

    qumica, a diferena mais importante aparece no contedo quantitativo desses compostos nas

    diferentes bebidas (SUOMALAINEN; LEHTONEN, 1978).

    2.6.1 lcoois superiores

    lcoois superiores so importantes componentes para a formao do aroma e sabor de

    bebidas alcolicas, porm, dificultam a destilao dos vinhos, entretanto, poucas pesquisas

    NCO + EtOH EtOCONH2

    2Cu(II) + 4CN 2Cu(CN)2

    2Cu(CN)2 2CuCN + C2N2 C2N2 + 2OH NCO +CN + H2O

  • 31

    desenvolvidas com aguardentes deram nfase formao de lcoois superiores na fermentao

    alcolica de caldo de cana (CHERUBIN, 1998).

    Os lcoois superiores so conhecidos por apresentarem um impacto negativo na qualidade

    final do vinho. A formao desses lcoois dependente da temperatura de fermentao

    (ETIEVANT, 1991). Um aumento na temperatura de fermentao resulta num aumento da

    concentrao total de lcoois produzidos (BARDI et al., 1997).

    Segundo Webb e Ingraham (1963) e Almeida e Barreto (1973), o leo fsel obtido na

    frao de ponto de ebulio entre 90 e 150 C da destilao de um meio fermentado, sendo

    composto principalmente pelos lcoois: isoamlicos (3 metil butanol-1), amlico (2 metil

    butanol - 1) e n-proplico. Suomalainen e Nyknen (1966) complementam que a quantidade

    desses lcoois representa apenas 0,05 a 0,15 % do acar consumido pelas leveduras durante a

    fermentao alcolica.

    As leveduras so capazes de sintetizar todos os aminocidos necessrios para seu

    crescimento e, de maneira geral, com o aumento do fornecimento de fonte nitrogenada, ocorre

    reduo na produo de lcoois superiores (YRAP, 1967; SUOMALAINEN; KAHANP,

    1963).

    Webb e Ingraham (1963) relatam que Ehrlich, em 1907, observou que os lcoois

    superiores so formados a partir dos aminocidos, pois constatou que a adio de leucina durante

    a fermentao alcolica estimulou a produo de lcool isoamlico. Contudo, o fornecimento de

    fonte de nitrognio inorgnico inibiu a produo do leo fsel. No mesmo trabalho, tambm

    citam que em 1911, Neubauer e Fromherz estudaram o mecanismo de formao de lcoois

    superiores e propuseram que os aminocidos so desaminados com produo de cetocidos, os

    quais so descarboxilados e reduzidos, produzindo lcoois superiores em cadeia carbnica com

    um carbono a menos que o correspondente aminocido de origem.

    A produo de lcoois superiores pode ser uma caracterstica das linhagens das leveduras,

    para esclarecer esse fato, Webb e Kepner (1961) estudaram a formao de lcoois superiores por

    algumas linhagens de leveduras e relataram diferenas principalmente em relao aos teores de

    lcool n-proplico.

  • 32

    2.6.2 steres

    Os steres constituem a maior classe dos compostos aromticos nas bebidas alcolicas, e

    so produzidos pelas leveduras durante a fermentao numa reao entre os lcoois, produzidos

    durante a fermentao pelas leveduras, e acil co-enzima A (Co A), a qual formada pela ativao

    do cido correspondente com o auxlio do ATP. A Acetil-CoA resultante da descarboxilao

    oxidativa do cido pirvico e a prxima reao no requer ATP mas cido lipico, pirofosfato de

    tiamina e NAD (NORDSTRM, 1963; PEDDIE, 1990).

    Vrios fatores influenciam na concentrao de steres no vinho, como: nvel de oxignio;

    temperatura e pH de fermentao; linhagem da levedura (KILIIAN; OUGHT, 1979; NYKNEN;

    NYKNEN, 1977; RAMSAY; BERRY, 1984).

    O ster mais abundante encontrado nas bebidas o acetato de etila (possui aroma frutado),

    porm existem outros de grande importncia, os quais, acetato de isoamila (aroma de pra),

    acetato de isobutila (aroma de banana), acetato 2-phenylethyl (aroma de mel, frutado, flores e

    caproato de etila (aroma de ma) (PEDDIE, 1990).

    Os steres, de modo geral so desejveis, pois favorecem o aroma da aguardente, sendo

    oriundos da fermentao, da destilao e do envelhecimento (AMERINE et al., 1972; SIMPSON,

    1971). O acetato de etila que corresponde a cerca de 80 % do contedo total de steres da

    aguardente, formado durante a fermentao e na destilao, como produto de reao de

    esterificao entre lcool etlico e cido actico, confere odor e gosto desagradvel, sendo um dos

    componentes indesejveis (HASHIZUME, 1976).

    2.6.3 Aldedos

    Os compostos carbonilos so um dos principais componentes responsveis pelo flavour

    das bebidas, particularmente os aldedos (ROSE, 1977). Geralmente so formados durante a

    fermentao e so considerados produtos intermedirios da rota biossinttica de cidos ou lcoois

    formados atravs da descarboxilao de alfa-cetocidos pela ao da piruvato descarboxilase

    (SUOMALAINEN; LEHTONEN, 1978).

    Os aldedos com at oito tomos de carbono tm aromas penetrantes, geralmente

    enjoativos, considerados indesejveis em bebidas destiladas. Os aldedos maiores que, contm

    acima de dez tomos de carbono, apresentam aroma agradvel. Esses aldedos podem ser

  • 33

    formados pela reduo de cidos graxos, mas so de ocorrncia restrita na fermentao alcolica

    (PIGGOTT, 1989; POTTER, 1980).

    O principal aldedo associado fermentao alcolica propriamente dita o acetaldedo

    (PIGGOTT, 1989; REED, 1973; RIGOTT, 1989). O acetaldedo o composto predominante em

    bebidas destiladas, representando 90 % da concentrao total de aldedos em usque, conhaque e

    rum (NYKNEN; NYKNEN, 1991). Normalmente no apresentam problemas em relao

    legislao; conforme constatao de Stupiello (1992), no qual 71 % das aguardentes analisadas

    continham teores relativamente baixos, inferiores a 20,0 mg 100 mL-1 de lcool anidro.

    Nascimento et al. (1997a) analisaram aldedos em 56 aguardentes e 10 usques importados

    e concluram que as aguardentes comerciais contm menores concentraes de aldedos que as

    artesanais e que, de modo geral, as aguardentes foram de 12,7 mg 100 mL-1 de lcool anidro e

    nos usques, 16,0 mg 100 mL mL-1 de lcool anidro, sendo que o aldedo presente em maior

    concentrao foi o acetaldedo.

    Outro aldedo importante em bebidas destiladas a acrolena (2-propenal), formada pela

    desidratao do glicerol durante a destilao, a sua presena em aguardente indesejvel devido

    ao seu forte odor pungente (GUTIERREZ, 1997). Nascimento et al. (1997a) relataram teores

    mdios de acrolena na ordem de 0,067 mg 100 mL-1 de lcool anidro em usques importados,

    0,094 em aguardentes comerciais e 0,364 em aguardentes artesanais.

    2.6.4 cidos orgnicos

    Os cidos orgnicos volteis so os mais comuns em bebidas destiladas, sendo o cido

    actico o mais abundante (ROSE, 1977). Os cidos alifticos de cadeia no ramificada e seus

    steres de etila constituem o segundo grupo mais abundante de componentes no-lcoois

    encontrados em bebidas destiladas (GUYMON, 1974).

    As leveduras sintetizam praticamente os mesmos cidos, independentemente da natureza

    do substrato, sendo que os cidos caprlico e cprico so os maiores componentes do rum, usque

    escocs e conhaque, em propores relativas bastante similares, salvo alguma exceo. Portanto

    as propores dos compostos no vinho so determinadas em grande extenso pela linhagem da

    levedura e condies de fermentao e, em menor extenso, pelo substrato (NYKNEN et al.,

    1968; SUOMALAINEN; LEHTONEN, 1979).

  • 34

    Os cidos sintetizados pelas leveduras no meio de fermentao, so os mesmos da frao

    lipdica das clulas de leveduras (SUOMALAINEN, 1971). Esses cidos podem prontamente

    passar da clula da levedura para o meio durante a fermentao, onde atravs de reaes de

    esterificao produzem seus respectivos steres de etila (SUOMALAINEN; NURMINEN, 1976;

    SUOMALAINEN et al., 1974). A composio de cidos graxos da levedura influenciada pelas

    condies de fermentao, como: presena de oxignio, temperatura de fermentao e

    suplementao do meio (TAYLOR; KIRSHOP, 1977; SUOMALAINEN; LEHTONEN, 1979).

    2.6.5 Furfural e hidroximetil-furfural

    O aquecimento do vinho durante a destilao promove a pirogenao da matria orgnica

    presente no vinho, principalmente das hexoses e cetoses, gerando aldedos furnicos como o

    furfural e o hidroximetil-furfural (LEHNINGER, 1990). A reao ocorre mais em pH cido e

    temperatura elevada, como o caso da destilao de vinhos obtidos pela fermentao do caldo de

    cana (CHERUBIN, 1998).

    Apesar da elevada toxidez, o furfural e o hidroximetil-furfural geralmente no apresentam

    problemas por causa das reduzidas concentraes verificadas nas aguardentes (CHERUBIN,

    1998). Os valores mdios de hidroximetil-furfural e furfural disponveis na literatura so

    respectivamente 0,321 e 0,148 mg 100mL-1 de lcool anidro; nos usques importados, 0,48 e

    0,261 mg 100mL-1 de lcool anidro nas aguardentes artesanais (NASCIMENTO et al., 1997a).

    2.6.6 Metanol

    O metanol um constituinte naturalmente presente nas bebidas alcolicas, em

    quantidades pequenas em relao aos demais componentes. O aparecimento de metanol aumenta

    acentuadamente quando se associam ao meio de fermentao polpas ou sucos de frutas ricas em

    pectina, tais como laranja, limo, ma, abacaxi, etc (GLICKSMAN, 1976; POTTER, 1980;

    WINDHOLSZ, 1976).

    O metanol um lcool particularmente indesejvel na aguardente. Sua ingesto, mesmo

    em doses muito pequenas, mas por longos perodos, pode levar cegueira e a morte

    (WINDHOLSZ, 1976).

  • 35

    2.6.7 Cobre, Arsnio e Chumbo

    A cachaa artesanal , geralmente, produzida em alambiques de cobre. Acredita-se que

    esse metal confira melhor qualidade ao produto quando comparados aos alambiques

    confeccionados com outros materiais como o ao inox; porm, podem contaminar o produto

    quando o manejo (principalmente a higiene) da produo inadequado (FARIA, 1989;

    NASCIMENTO et al., 1998).

    A contaminao da aguardente brasileira por ons de cobre considerada um entrave

    exportao da bebida (NASCIMENTO et al, 1998). A legislao brasileira limita o teor de cobre

    em bebidas destiladas em 5 mg L-1, entretanto a legislao de outros pases no tolera mais que

    2 mg L-1 de cobre nos destilados alcolicos (CARDOSO, et al., 2003).

    Durante o processo de destilao, forma-se o azinhavre [CuCO3Cu(OH)2] nas paredes

    internas dos alambiques de cobre. Esse composto dissolvido pelos vapores alcolicos cidos,

    contaminando o destilado (LIMA-NETO et al, 1994).

    A ausncia de cobre no destilador e mesmo em colunas de destilao conduz a um efeito

    organolptico no produto, o qual apresenta aroma tpico de sulfeto (NASCIMENTO et al., 1998).

    Nascimento et al. (1997b), avaliaram a presena de metais nas caninhas brasileiras e

    concluram que as amostras que continham teores bastante elevados de ons metlicos eram

    provenientes de pequenos produtores, geralmente aguardentes artesanais, cujas plantas de

    produo no possuem qualquer controle qumico da qualidade dos seus produtos.

    Estudo preliminar constatou presena significativa de metais pesados na aguardente

    produzida no Jequitinhonha, e isso conseqncia das precrias condies de higiene e da

    clandestinidade de muitos alambiques, alm da contaminao do solo, da gua e do ar decorrente

    da produo industrial e de atividades mineradoras (UFMG, 2006).

    O Chumbo e o Arsnio ocorrem devido a contaminaes nos equipamentos, solo e gua,

    os quais se acumulam no organismo do homem, assim como o Cobre, e o Arsnio tem efeito

    carcinognico (INMETRO, 2006).

    2.7 Destilao

    Na manufatura de bebidas alcolicas destiladas, a destilao separa, seleciona e concentra

    pelo uso do calor a frao dos componentes oriundos da fermentao do mosto; assim, a

  • 36

    composio das bebidas depende em grande extenso da forma pela qual ela conduzida

    (SUOMALAINEN; NYKNEN, 1966; SUOMALAINEN, 1971).

    Os vinhos contm um grande nmero de compostos volteis que destilam segundo trs

    critrios: ponto de ebulio, afinidade com o lcool ou gua e teor alcolico no vapor durante a

    destilao (LAUT, 1990), sendo que em funo do grau de volatilidade, o destilado dividido

    em trs fraes: cabea, corao e cauda (SUOMALAINEN; NYKNEN, 1966).

    O comportamento das diferentes impurezas (compostos secundrios) em relao ao lcool

    etlico no decorrer de qualquer operao de destilao est relacionado s suas diferentes

    solubilidades no etanol, segundo Ernesto Sorel, citado por Novaes (1994).

    H um grande nmero de tipos de aparelhos destilatrios disponveis, oferecendo uma

    ampla faixa de flexibilidade para o refinamento das bebidas destiladas, sendo os mais difundidos

    o alambique e a coluna contnua (BOZA, 1996).

    2.7.1 Alambique

    No alambique efetuam-se duas destilaes do vinho, sendo originalmente realizada no

    mesmo corpo, porm, com o objetivo de minimizar o nvel de impurezas e aumentar a

    produtividade da operao. O mtodo foi aperfeioado utilizando dois corpos, sendo denominado

    o primeiro corpo, wash still ou caldeira de esgotamento e o segundo, low wines still ou

    caldeira de destilao, e a tcnica denominada dupla destilao (HIRSCH, 1937).

    2.7.2 Colunas de destilao

    A coluna consiste em uma forma de alambiques interconectados em srie, de operao

    contnua; de fcil manejo, consome menos combustvel, requer mo-de-obra menos hbil,

    permite maior produtividade e uniformidade do produto (LIMA, 1964).

    Guymon (1949), citado por Amerine et al. (1972) demonstrou que a diferena analtica

    entre os destilados obtidos em coluna e alambique foi pequena, porm, so prontamente

    distinguidos por anlise sensorial e argumenta que se a lenta destilao em alambique no

    contribusse singularmente para o carter da bebida, provavelmente esse procedimento no teria

    sobrevivido na regio de Cognac.

  • 37

    Segundo Reed e Nagodawithana (1991), o efeito da destilao sobre o flavor e o odor da

    bebida, pode ser drstico atravs da remoo quantitativa das fraes cauda e cabea durante a

    destilao. LAnson (1971) citado por Reed e Nagodawithana (1991), demonstrou que a coluna

    contnua tem maior capacidade em mover congneres de maior e menor ponto de ebulio.

    Assim, a concentrao de congneres nas bebidas pode ser manipulada pelo tipo e operao do

    aparelho destilador.

    Durante a destilao de vinhos, as impurezas de baixo ponto de ebulio so coletadas na

    frao conhecida como cabea. Essa frao tem um volume de 5 a 15 % do produto, dependendo

    do tipo e condies de destilao, e possui teor alcolico mnimo de 80 %, alm de compostos

    altamente indesejveis como acetaldedo, acetato de etila e 1,1-dietoxietano, bem como dixido

    de enxofre e seus derivados, caso tenha sido usado na preparao do mosto (WILLIANS;

    STRAUSS, 1976).

    Lucena (1957) recomenda para se obter uma aguardente de boa qualidade, a adoo da

    seguinte prtica: a frao cabea separada quando o alcometro marcar 80 a 85 GL em seguida

    destila o corao de 80 85 GL 45 GL, originando um produto com uma riqueza alcolica

    mdia de 55 a 65 GL, e finalmente a cauda, sendo que os produtos extremos so adicionados na

    destilao da prxima batelada de vinho. Segundo Laut (1990), procedimento semelhante

    utilizado na regio de Cognac, da primeira destilao originam trs fraes: cauda, corao e

    cabea; as fraes cabea e a cauda so redestiladas com a batelada posterior enquanto a frao

    corao usada na segunda destilao bonne chauffe, que d origem a 4 fraes: cabea, corao

    (1) (cognac), corao (2) e a cauda, a cabea e a cauda so incorporadas bateladas de vinho

    subseqentes e a frao corao (2) redestilada juntamente com o corao proveniente da

    primeira destilao.

  • 38

    3 MATERIAL E MTODOS

    Levando-se em considerao que a safra de cachaa tendo a cana-de-acar como

    matria-prima tem incio por volta de maio com o fim das chuvas e o incio das temperaturas

    mais amenas, cuja conseqncia na regio centro-sul o incio da maturao das variedades mais

    precoces. Embora seja incio da maturao, as variedades conhecidas como precoce, super ou

    hiper precoce dependendo de condies edafo-climticas, ainda apresentam parte area bem

    desenvolta, com palmito quase sem acar, mas ainda rico em gua, sais minerais e aminocidos

    entre outros componentes. O corte alto, manual e mecnico, leva boa parte desse topo do colmo

    para a indstria ou para processamento. O hbito de corte manual tambm na altura do palmito

    e a maturao verificada pelo critrio de brix do p, meio e ponta observa-se ainda uma relao

    normalmente distante de 1.00, ou seja, muito mais prxima de 0.80. A riqueza em aminocidos

    pode levar formao de lcoois superiores como tem sido observado em anos mais chuvosos e

    de crescimento da cana mais intensos. H de se observar ainda que dependendo do ano, as

    temperaturas mdias podem estar com mnimas entre 10 e 15 C e mximas entre 20 e 25 C ou

    mais elevadas como tem acontecido em anos prximos passados. Estas variaes trazem reflexos

    no processamento, dependendo da escala, do nvel tecnolgico e do perodo trabalhado,

    principalmente na fermentao.

    Em muitas regies do pas ocorre dificuldade na formao do p-de-cuba inicial, nas

    rodadas iniciais, na manuteno da fermentao, na completude da fermentao, embora muitas

    cachaas do incio de safra sejam consideradas as de melhor bouquet.

    Assim pequenas indstrias tm a fermentao retardada pela baixa temperatura e o

    rendimento pode ser muito baixo no somente pela deficiente extrao de caldo frequentemente

    realizada apenas com 1 ou 2 ternos de moenda mas tambm pela falta de recursos para

    manuteno de temperatura compatvel nas dornas de fermentao. Observa-se com freqncia a

    parada de fermentao com brix de atenuao de ordem de 3 a 5 brix. Ainda assim, alguns

    produtores associam as primeiras rodadas de destilao ou produo como de melhor bouquet

    na safra. Possivelmente pela baixa concentrao de fermento no caldo, associada a limpeza das

    dornas e aparelho de destilao; ao baixo teor de compostos sulfurados e de resduos decantados

    no vinho; poca fria que seleciona linhagens mais adaptadas s condies de menor temperatura

    e provavelmente a produo maior associada menor evaporao dos compostos mais volteis.

  • 39

    No decorrer da safra, com o progressivo aquecimento da temperatura mdia ambiental

    mais a energia trmica liberada pela fermentao leva a mdia de temperatura da fermentao,

    gradativamente para 30 a 35 C ou mais, podendo atingir prximo a 40 C em final de safra.

    Dessa forma, foram escolhidas duas temperaturas fixas para conduo dos experimentos:

    20 e 32 C.

    A primeira equivalente ao incio de safra e que pelos indicativos de qualidade poderia ser

    mantido toda a safra desde que as dornas fossem devidamente equipadas para manuteno de tal

    temperatura constante, ainda que com prejuzo da produtividade, mas pela obteno da qualidade

    desejada no vinho fermentado.

    A segunda temperatura, 32 C foi fixada tendo em vista ser possvel sua manuteno com

    aquecimento/resfriamento, em qualquer instalao industrial, com um pouco de equipamentos

    para tal e em processo j bastante explorado para lcool, com alta produtividade.

    3.1 Local

    O experimento foi realizado no setor de Acar e lcool do Departamento de

    Agroindstria, Alimentos e Nutrio da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da

    Universidade de So Paulo.

    3.2 Microrganismos

    Os microrganismos utilizados nesta pesquisa foram duas linhagens de leveduras, da

    espcie Saccharomyces cerevisiae, Y-904 da AB Brasil e DANSTIL CAT; e uma linhagem da

    espcie Saccharomyces bayanus, EC 1118 da Lalvin, desidratadas, vivas, mantidas sob vcuo e

    gentilmente cedidas por AB Brasil e LNF respectivamente. Os microrganismos foram escolhidos

    considerando que as duas primeiras linhagens so comumente utilizadas em destilarias de lcool,

    enquanto a segunda utilizada e recomendada pelos prprios produtores para a produo de

    vinhos e adaptada a baixas temperaturas.

  • 40

    3.3 Meios de cultivo para fermentao

    Os meios escolhidos para o presente trabalho foram o YEPD (Meio 1), um meio semi-

    sinttico convencional para cultivo e manuteno de leveduras e que tem carter de comparao

    de tratamento controle. J o caldo de cana-de-acar (Meio 2), clarificado e padronizado para

    acares tem similaridades com o tratamento de mosto convencional para fermentao alcolica

    industrial.

    3.3.1 Meio YEPD

    As clulas desidratadas foram inoculadas para fermentao em meio YEPD Yeast extract

    peptone dextrose (Tabela 3) e caldo de cana clarificado e padronizado a aproximadamente

    150,0 g L-1 de ART, para o processo fermentativo.

    Tabela 3 - Meio de cultivo YEPD para fermentao.

    Meio Composio

    Extrato de levedura 10 g

    Peptona 10 g

    Dextrose 150 g

    H2O destilada 1.000 mL

    Os meios de cultivo foram esterilizados em autoclave, sob 1 atm (unidade de atmosfera de

    presso), a 121 C e durante 15 minutos.

    3.3.2 Meio com caldo de cana-de-acar

    Para o preparo do meio com caldo de cana, foi utilizada cana-de-acar cultivada na

    referida Instituio. Os colmos foram cortados sem a sua queima no campo, despalhados

    manualmente e submetidos moagem, em um terno de moenda, sem embebio. O caldo foi

    filtrado em peneira de malha fina com algodo e clarificado.

    A clarificao foi feita adicionando-se 1,5 g L-1 de NaH2PO4.H2O, seguido por

    esterilizao em autoclave. Aps esta etapa o material foi mantido em repouso por 48 horas.

  • 41

    Aps a clarificao o sobrenadante foi sifonado e o mosto obtido, isento de impurezas

    slidas em suspenso, foi ajustado a 15,2 brix aproximadamente 150 g L-1, convenientemente

    diludo com gua, e novamente seguido por autoclavagem, para posterior uso nos ensaios.

    3.4 Tratamentos

    Os ensaios foram realizados a 20 C e a 32 C para estabelecer uma tecnologia especfica

    para cada temperatura, em busca de um produto diferenciado. Assim, em cada temperatura foram

    utilizados dois meios, YEPD como controle e caldo de cana clarificado, com ART ajustado, e trs

    leveduras sendo uma Saccharomyces bayanus EC e duas Saccharomyces cerevisiae (Y-904 e

    CAT), em 5 repeties por ensaio.

    3.5 Conduo da fermentao

    Em cada erlenmeyer de 500 mL foram colocados 200 mL de meio, previamente

    esterilizado em autoclave sob temperatura de 121 C, durante 20 minutos. Depois foi aguardado o

    tempo suficiente para o mosto atingir a temperatura ambiente e foi inoculado 1 g de fermento

    seco para cada 200 mL de mosto. Os frascos foram mantidos em cmara de BOD, esttico, at o

    trmino da fermentao, para posteriores anlises.

    3.5.1 Conduo da fermentao para anlise cromatogrfica do destilado

    Devido ao pequeno volume recolhido nos primeiros ensaios no foi possvel a deteco

    dos componentes volteis dos destilados, por isso foi necessrio realizar fermentaes para obter

    um volume maior dos destilados.

    Para as anlises cromatogrficas o preparo do meio foi o mesmo como descrito em 3.3.2.

    A conduo da fermentao foi a mesma como descrita em 3.5, entretanto as fermentaes foram

    realizadas em bales de capacidade de 5 litros e cada balo recebeu 3 litros do meio, a proporo

    de inculo permaneceu a mesma, 5 g L-1 de fermento.

  • 42

    3.5.1.1 Destilao do vinho para as anlises cromatogrficas

    Para a destilao do vinho foi montado em laboratrio um destilador feito totalmente de

    vidro. Foi destilado 1 litro de vinho de cada vez, do qual foram recolhidos os 70,0 mL iniciais do

    destilado para as anlises cromatogrficas.

    3.6 Anlises fsico-qumicas

    A seguir esto descritas as anlises realizadas no vinho e no destilado.

    3.6.1 Concentrao de leveduras

    A concentrao de leveduras foi determinada por turbidimetria de acordo com TRIBOLI,

    1987.

    3.6.2 Acar redutor total

    A concentrao de acares redutores do mosto e do vinho foi determinada pelo mtodo

    de Miller (1959), conforme descrito por Triboli (1987).

    3.6.3 Determinao do teor alcolico

    A determinao do teor alcolico do vinho foi realizada atravs da destilao da amostra

    em microdestilador Tecnal modelo TE 012 recolhendo-se 25 mL do destilado em balo

    volumtrico e determinando-se a densidade relativa da soluo em densmetro digital ANTON

    PAAR (DMA 45), transformando-se em grau alcolico (v v-1) por tabela apropriada.

    3.6.4 Anlise cromatogrfica do vinho

    As amostras foram cromatografadas em cromatgrafo de fase gasosa CG modelo 37 D,

    equipado com detector de ionizao de chama e coluna de ao inoxidvel de 3 m x 1/8, contendo

    Hallcomid M-18 e Carbowax 1500. As condies de operao para determinao de lcoois

    superiores foram as seguintes: temperatura da coluna 98 C, temperatura do injetor 140 C,

  • 43

    temperatura do detector 250 C; gs de arraste nitrognio/fluxo 40 mL min-1 e os volumes

    injetados de microlitros. As anlises cromatogrficas foram realizadas pelo Instituto de

    Tecnologia de Pernambuco-ITEP.

    3.7 Anlise estatstica

    3.7.1 Estudo 1: Crescimento celular, acar residual e teor alcolico do vinho

    O experimento foi conduzido utilizando o delineamento inteiramente casualizado, em

    esquema fatorial (2 temperaturas x 2 meios x 3 linhagens) e 5 repeties por tratamento,

    totalizando 60 unidades experimentais. Foram feitas anlises para os dois nveis de temperatura

    separadamente.

    As informaes referentes s variveis dependentes obtidas, ou seja, crescimento celular,

    acar residual e teor alcolico foram analisadas utilizando o programa SANEST (ZONTA &

    MACHADO, 1984). De acordo com a anlise de varincia, foi possvel verificar o efeito do meio

    ou das linhagens isoladamente, bem como a interao entre os fatores. No caso de obteno de

    interao significativa a anlise dos dados permite avaliar: o efeito do meio para cada linhagem e

    o efeito das linhagens para cada meio. A comparao de mdias foi realizada empregando-se o

    teste de Tukey, com nvel de significncia de 5 %.

    3.7.2 Estudo 2: Amostras cromatografadas

    O delineamento experimental utilizado no segundo estudo tambm foi o inteiramente

    casualizado, em esquema fatorial (2 temperaturas x 3 linhagens) e trs repeties, resultando num

    total de 18 unidades experimentais.

    A anlise de varincia dos dados referentes s variveis dependentes obtidas (teor

    alcolico; steres; aldedos; acidez voltil; soma dos lcoois isobutlico, isoamlicos e n-

    proplicos e lcool metlico) foi realizada utilizando o pacote estatstico SANEST (ZONTA &

    MACHADO, 1984). A anlise permitiu verificar a significncia de cada fator isoladamente e a

    existncia ou no de interao entre eles. Foi utilizado o teste de Tukey, com nvel de

    significncia de 5 %, para comparao das mdias de cada tratamento.

  • 44

    4 RESULTADOS E DISCUSSO

    As fermentaes foram realizadas em experimentos consecutivos, com um meio de

    referncia ou padro de cultivo, a uma dada temperatura (20 ou 32 C), comparando as 3

    linhagens atravs de 5 repeties em cultivo esttico, em cmara de BOD, conforme descrito em

    3.5 na metodologia.

    As fermentaes foram consideradas terminadas aps 120 h a 20 C tanto no meio de

    referncia como no mosto de caldo de cana-de-acar. O tempo final de 120 horas foi

    estabelecido atravs de ensaios preliminares de acar redutor residual e teor alcolico do

    fermentado.

    O mesmo critrio foi adotado para fermentao a 32 C para qual foi estabelecido o tempo

    de 48 horas como o final do ensaio.

    4.1 Estudo 1: Anlise de crescimento celular, acar residual e teor alcolico do vinho

    As variveis dependentes avaliadas neste estudo (crescimento celular, acar residual e

    teor alcolico do vinho) foram afetadas de forma significativa pelas variveis independentes

    (linhagem e meio) e pela interao entre elas na maioria dos casos (Apndice L e M).

    As Tabelas 4 e 5 trazem os valores mdios de crescimento celular encontrado no meio

    controle (YEPD) e em caldo de cana-de-acar clarificado e ajustado para acares redutores, nas

    temperaturas de 20 e 32 C, para as 3 linhagens ensaiadas.

    Na Tabela 4 esto apresentados os valores mdios encontrados para crescimento celular,

    acar residual e teor alcolico no vinho obtido de fermentao conduzida a 20 C.

  • 45

    Tabela 4 - Valores mdios para crescimento celular, acar residual e teor alcolico a 20 C.

    Crescimento celular g L-1

    Acar residual g L-1

    Teor Alcolico % v v-1 Linhagem1

    Meio 12 Meio 22 Meio 12 Meio 22 Meio 12 Meio 22

    Lin 1 7,79 B ab 8,40 A a 1,16 B a 8,50 A a 7,83 B a 9,51 A b

    Lin 2 8,00 B a 8,45 A a 1,26 A a 1,73 A b 7,79 B a 8,79 A c

    Lin 3 7,75 A b 7,67 A b 1,21 B a 2,21 A b 7,62 B a 10,01 A a Valores seguidos pela mesma letra (letras maisculas, na mesma linha, comparam as linhagens dentro de cada meio letras minsculas, na mesma coluna, comparam o efeito do meio entre as linhagens) no so estatisticamente diferentes, pelo teste de Tukey, em nvel de 0,05 de probabilidade. DMS 5 % para o efeito dos meios dentro de cada linhagem: Crescimento celular = 0,18; Acar residual = 0,59; Teor alcolico = 0,28 DMS 5 % para o efeito das linhagens dentro de cada meio: Crescimento celular = 0,22; Acar residual = 0,72; Teor alcolico = 0,33 1 Linhagem 1: Y-904; Linhagem 2: CAT; Linhagem 3: EC 2 Meio 1: YEPD; Meio 2: Caldo de cana

    Pelos dados apresentados na Tabela 4, foi observado que as linhagens de levedura da

    espcie S. cerevisiae, 1 e 2 apresentaram maior crescimento celular (8,40 e 8,45 g L-1,

    respectivamente) no meio com caldo de cana do que no meio controle (7,79 e 8,0 g L-1). A

    linhagem 3, da espcie S. bayanus, no apresentou diferena de crescimento celular nos

    diferentes meios avaliados.

    No meio YEPD e no caldo de cana a linhagem 3 foi aquela que apresentou menor

    crescimento celular entre todas as linhagens julgadas.

    As fermentaes realizadas com as linhagens Y-904 e EC foram aquelas que

    apresentaram os maiores teores de acar residual, 8,50 e 2,21 g L-1, respectivamente, no meio

    com caldo de cana em comparao com o meio controle. As fermentaes conduzidas com a

    linhagem CAT no apresentaram diferenas quanto ao teor de acar residual encontrado nos

    dois meios utilizados. No meio YEPD no foram encontradas diferenas estatsticas nas

    concentraes de acar residual remanescente nos vinhos provenientes de fermentaes com as