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O CEU – CENTRO DE ARTES E ESPORTES UNIFICADOS DO MUNICÍPIO DE JACUNDÁ COMO PROGRAMA DE POLÍTICA PÚBLICA CULTURAL.
RESUMO
As políticas públicas culturais no Brasil são recentes e praticamente tomam
forma com a constituição de 1988 e começam a se materializar na década de
90. Uma delas é a que propicia a instalação do programa CEU - Centro de
Artes e Esportes Unificados em territórios de alta vulnerabilidade sociocultural.
Este trabalho traz como tema o Ceu – Centro de Artes e Esportes Unificados
do Município de Jacundá como Programa de Política Pública Cultural no qual
se procurou, através da implantação deste equipamento, fazer um estudo das
políticas públicas culturais no Brasil no âmbito de autores que se dedicaram ao
estudo deste tema, analisando o CEU de Jacundá à luz das teorias da Política
pública cultural. O estudo trás o percurso histórico e o conceito dos termos
essenciais que compõem este trabalho e a análise da pesquisa feita
teoricamente e no próprio CEU de Jacundá.
Palavras-chave: Política, políticas públicas, políticas públicas Culturais, Cultura, CEU.
ABSTRACT
Cultural policies in Brazil are recent and officially begin in the 1990s One of
them is the one that provides the installation of CEU program - Arts Centre and
Unified Sports in high vulnerability sociocultural territories. This work has as its
theme the Heaven - Arts Center and Unified Sports of Jacundá Municipality and
Cultural Public Policy Program in which it sought, through the deployment of
this equipment, make a study of cultural policies in Brazil as part of authors who
dedicated to the study of this topic, analyzing the CEU Jacundá to the theories
of cultural public policy. The study behind the historical background and the
concept of the essential terms that make this work and the analysis of the
research done theoretically and CEU Jacundá own.
Keywords: Politics, public policy, public culture policy, CEU.
Introdução
A cultura brasileira sempre viveu uma relação conflituosa com o Estado
brasileiro que a relegou a um segundo plano, não lhe dando a mesma
prioridade como deu para a educação, a saúde, o meio ambiente, etc., como se
a mesma não fizesse parte das necessidades do ser humano.
No entanto, com a promulgação da Constituição de 1988 que assegura
a cultura como um direito a todos, essa realidade vem aos poucos mudando o
cenário cultural brasileiro.
Nesta conjuntura entram em cena as políticas públicas culturais como
forma de corrigir essas distorções que cultura sofreu ao longo dos anos e no
âmbito desta questão o governo brasileiro como promotor das políticas públicas
e no contexto do PAC – 2 cria as PECs (Praça dos Esportes e da Cultura, hoje
CEU, Centro de Artes e dos Esportes unificados) como programa de política
cultural na qual. através de um mapeamento sociocultural se detecta espaços
municipais de alta vulnerabilidade para se erguer um equipamento que ofereça
um modelo de gestão compartilhada e várias ações socioculturais, esportivas,
tecnológicas, de lazer e socioassistenciais para a comunidade do entorno com
o intuito de combater as incorreções soco espaciais da comunidade.
Diante disso este estudo tem como objetivo analisar a implantação do
CEU das Artes e dos Esportes Unificados nas imediações dos bairros de Santa
Rita e Boa Esperança no município de Jacundá, como mecanismo de inclusão,
produção, acesso e reprodução da cultura, dos esportes e outras ações para a
comunidade local no contexto das políticas públicas, além de identificar que
fatores contribuíram para a necessidade da implantação do Ceu nas
imediações dos dois bairros, verificando a importância da funcionalidade do
equipamento para a comunidade local.
O presente estudo está dividido e três partes. Na primeira, em que se
introduz o conceito de políticas públicas foi necessário, antes de tudo promover
a diferença entre os termos política e política pública. Neste tópico introdutório
os autores consultados foram ALCKMIM (2009), BOBBIO et al (1998), LIMA
(2012) na conceituação do que vem a ser o termo Política; LIMA (2012),
BEZERRA e GUERRA (2012),SOUZA (2006), CALABRE e BOULLOSA (2014),
auxiliaram na conceituação do termo Políticas Públicas. No segundo tópico, em
que se introduziu o termo políticas públicas culturais, os autores referenciados
foram CHAUÍ (1989) na conceituação do termo Cultura, CALABRE e
BOULLOSA (2014) e RUBIM (2007) que ajudaram na conceituação do termo
Políticas Públicas Culturais e Políticas Públicas Culturais no Brasil,
respectivamente. Por fim, TSUKUMA (2014) e LIMA (2012) na abordagem
sobre o Programa CEU, seu conceito, estrutura e funcionamento.
Para desenvolver este trabalho se partiu de uma metodologia que teve
como base uma pesquisa bibliográfica em que se fez um levantamento através
de livros, revistas, periódicos, sites para descrever teorias que abordassem os
principais conceitos deste estudo, como o de política, políticas públicas, cultura
e políticas públicas culturais e o CEU. Além da pesquisa bibliográfica,
procedeu-se com questionários destinados a equipe gestora do CEU de
Jacundá e a comunidade que frequentava o equipamento, além de visita in
loco. A pesquisa bibliográfica foi feita através de leitura sistematizada, com
fichamento de cada obra, de modo a ressaltar os pontos pertinentes ao assunto
em estudo abordado pelos autores seguido de resumo e resenha, para sua
melhor apreensão e compreensão. Visando alcançar os objetivos do estudo,
após toda a sistematização do material levantado, procedeu-se com a
produção de um texto-síntese para dar início ao estudo propriamente dito.
Diferença entre política e política pública.
Para se fazer a diferenciação entre esses dois termos, inicia-se este
estudo perguntando-se o que têm em comum a luta das mulheres contra uma
sociedade machista; dos portadores de necessidade especiais para
pertencerem de fato à sociedade; a dos negros discriminados pela nossa
cordialidade; dos homossexuais igualmente discriminados e desrespeitados;
dos índios massacrados e exterminados nos 500 anos de nossa história; dos
jovens que chegam ao mercado de trabalho saturado com milhões de
desempregados; na luta de milhões de trabalhadores sem terra num país de
latifúndios; enfim, na luta de todas as minorias por uma sociedade inclusiva,
que se somarmos, constituem a maioria da população? Responde-se: tais
atitudes e omissões fazem parte de nossa ação política perante a vida. Somos
responsáveis politicamente (no sentido grego da palavra) pela luta por justiça
social e uma sociedade verdadeiramente democrática e para todos. Ou seja, a
política, como afirma MAAR (2010) é uma referência permanente em toda a
dimensão do nosso cotidiano na medida em que esse se desenvolve como vida
em sociedade.
Neste contexto, ARENDT (citada por Alckmin, 2009) expõe que a política
é algo como uma necessidade imperiosa para a vida humana e, na verdade,
tanto para a vida do indivíduo, maior para a sociedade. Como o homem não é
autárquico, porém depende de outros em sua existência, precisa haver um
provimento da vida relativo a todos, sem o qual não seria possível justamente o
convívio. Tarefa e objetivo da política é a garantia da vida no sentido mais
amplo.
Noutra conjuntura, como afirma Bobbio et all (1998) o termo política na
concepção clássica e original é derivação do adjetivo originado de polis
(politikós), que significa tudo o que se refere à cidade e, consequentemente, o
que é urbano, civil, público, e até mesmo sociável e social, o termo Política se
expandiu graças à influência da grande obra de Aristóteles, intitulada Política,
que deve ser considerada como o primeiro tratado sobre a natureza, funções e
divisão do Estado, e sobre as várias formas de Governo, com a significação
mais comum de arte ou ciência do Governo, isto é, de reflexão, não importa se
com intenções meramente descritivas ou também normativas, dois aspectos
dificilmente discrimináveis, sobre as coisas da cidade. Em outras palavras e
entendendo o Estado hoje como WEBER (citado por Bobbio et all, 1998) o
explica “uma empresa institucional de caráter político onde o aparelho
administrativo leva avante, em certa medida e com êxito, a pretensão do
monopólio da legítima coerção física, com vistas ao cumprimento das leis”, é
que se define Política como a ciência que se refere ao universo das relações de poder, dos partidos políticos e dos processos decisórios nas esferas parlamentares de deliberação pública. (Calabre e Boullosa, 2015).
Dessa forma, e ainda segundo Bobbio et al (1998) o conceito de Política,
entendida como forma de atividade ou de práxis humana, está estreitamente
ligado ao de poder. Este tem sido tradicionalmente definido como "consistente
nos meios adequados à obtenção de qualquer vantagem" (grifo dos autores)
ou, analogamente, como "conjunto dos meios que permitem alcançar os efeitos
desejados" (idem). Sendo um destes meios, além do domínio da natureza, o
domínio sobre os outros homens, o poder é definido por vezes como uma
relação entre dois sujeitos, dos quais um impõe ao outro a própria vontade e
lhe determina, malgrado seu, o comportamento.
No pensamento de Bobbio et al (1998) o poder político pertence à
categoria do poder do homem sobre outro homem, não à do poder do homem
sobre a natureza. Esta relação de poder é expressa de mil maneiras, onde se
reconhecem fórmulas típicas da linguagem política: como relação entre
governantes e governados, entre soberano e súditos, entre Estado e cidadãos,
entre autoridade e obediência, etc.
Nesta conjuntura, os autores apontam que para se achar o elemento
específico do poder político, parece mais apropriado o critério de classificação
das várias formas de poder que se baseia nos meios de que se serve o sujeito
ativo da relação para determinar o comportamento do sujeito passivo. Com
base neste critério, pode-se distinguir três grandes classes no âmbito de um
conceito amplíssimo do poder. Estas classes são: o poder econômico, o. poder
ideológico e o poder político.
Resumidamente e de acordo com Bobbio et al (1998), o primeiro é o que
se vale da posse de certos bens, necessários ou considerados como tais,
numa situação de escassez, para induzir aqueles que não os possuem a
manter um certo comportamento, consistente sobretudo na realização de um
certo tipo de trabalho. O poder ideológico se baseia na influência que as idéias
formuladas de um certo modo, expressas em certas circunstâncias, por uma
pessoa investida de certa autoridade e difundidas mediante certos processos,
exercem sobre a conduta dos consociados: deste tipo de condicionamento
nasce a importância social que atinge, nos grupos organizados, aqueles que
sabem, os sábios, sejam eles os sacerdotes das sociedades arcaicas, sejam os
intelectuais ou cientistas das sociedades evoluídas, pois é por eles, pelos
valores que difundem ou pelos conhecimentos que comunicam, que se
consuma o processo de socialização necessário à coesão e integração do
grupo. Finalmente, o poder político se baseia na posse dos instrumentos
mediante os quais se exerce a força física (as armas de toda a espécie e
potência): é o poder coator no sentido mais estrito da palavra. Todas estas três
formas de poder, concluem os autores, fundamentam e mantêm uma
sociedade de desiguais, isto é, dividida em ricos e pobres com base no
primeiro, em sábios e ignorantes com base no segundo, em fortes e fracos,
com base no terceiro: genericamente, em superiores e inferiores.
Nesta conjuntura, pode-se destacar também que na ciência política, o
termo política se trata da forma de atuação de um governo em relação a
determinados temas sociais e econômicos de interesse público: política
educacional, política de segurança, política salarial, política habitacional,
política ambiental, etc.
Já a política dentro do âmbito de um sistema político é uma forma de
governo que engloba instituições políticas para governar uma Nação.
Monarquia e República são os sistemas políticos tradicionais. Dentro de cada
um desses sistemas podem ainda haver variações significativas ao nível da
organização. Por exemplo, o Brasil é uma República Presidencialista, enquanto
Portugal é uma República Parlamentarista.
Num significado mais abrangente, o termo pode ser utilizado como um
conjunto de regras ou normas de uma determinada instituição. Por exemplo,
uma empresa pode ter uma política de contratação de pessoas com algum tipo
de deficiência ou de não contratação de mulheres com filhos menores. A
política de trabalho de uma empresa também é definida pela sua visão, missão,
valores e compromissos com os clientes.
De acordo com Rua (1998, citada por LIMA, 2012) é natural que com o
passar do tempo, seja necessário proceder a uma alteração de algumas leis ou
políticas estabelecidas por um determinado país. No Brasil, a expressão
reforma política remete para as alterações propostas para o melhoramento do
sistema político e eleitoral. Essas propostas são debatidas no Congresso
Nacional e são aceitas ou recusadas.
Políticas públicas consistem em ações tomadas pelo Estado que têm
como objetivo atender os diversos setores da sociedade civil. Essas políticas
são muitas vezes feitas juntamente e com o apoio de ONGs (Organizações
Não Governamentais) ou empresas privadas. Quanto aos seus tipos, as
políticas públicas podem ser distributivas, redistributivas e regulatórias, sendo
que podem atuar na área industrial, institucional, agrícola, educacional e da
assistência social. (RUA, 1998, citada por LIMA, 2012 p. 12)
Adentrando no tema, Rua (1998, citado por LIMA, 2012) esclarece que a
política consiste no conjunto de procedimentos formais e informais que
expressam relações de poder e que se destinam à resolução pacífica dos
conflitos quanto aos bens públicos. Quando o termo política assume o sentido
expresso pelo termo policy, segundo Secchi (2010, citado por LIMA, 2012), é
mais concreto e tem relação com orientações para a decisão e ação, sendo
que o termo política pública (public policy) a ela está vinculado.
Para Bezerra e Guerra (2013) o termo política pública surgiu como
uma subárea da Ciência Política por volta de 1930, e se constituiu como campo
de conhecimento e disciplina nos Estados Unidos, onde as análises não tinham
o papel do Estado como foco, diferentemente dos estudos desenvolvidos na
Europa. As autoras em questão fazem um alerta quando dizem que é
importante observar os espaços em que esta teoria foi desenvolvida porque
são países com democracias estáveis e consolidadas e isso tem forte
influência na constituição da mesma. Com relação a este alerta, Souza (2006)
esclarece que na Europa, a área de política pública vai surgir como um
desdobramento dos trabalhos baseados em teorias explicativas sobre o papel
do Estado e de uma das mais importantes instituições do Estado - o governo -,
produtor, por excelência, de políticas públicas. Nos EUA, ao contrário, a área
surge no mundo acadêmico sem estabelecer relações com as bases teóricas
sobre o papel do Estado, passando direto para a ênfase nos estudos sobre a
ação dos governos.
Ainda neste contexto de nascimento da política pública e de acordo com
os estudos de Souza (2006) considera-se que a área de políticas públicas
contou com quatro grandes “pais” (grifo da autora) fundadores: H. Laswell, H.
Simon, C. Lindblom e D. Easton. Cada um dando valiosas contribuições ao
corpo teórico da área em questão, aqui apresentadas resumidamente. Laswell
(1936) introduz a expressão policy analysis (análise de política pública), ainda
nos anos 30, como forma de conciliar conhecimento científico/acadêmico com
a produção empírica dos governos e também como forma de estabelecer o
diálogo entre cientistas sociais, grupos de interesse e governo. Simon (1957)
introduziu o conceito de racionalidade limitada dos decisores públicos (policy
makers), argumentando, todavia, que a limitação da racionalidade poderia ser
minimizada pelo conhecimento racional. Lindblom (1959; 1979) questionou a
ênfase no racionalismo de Laswell e Simon e propôs a incorporação de outras
variáveis à formulação e à análise de políticas públicas, tais como as relações
de poder e a integração entre as diferentes fases do processo decisório o que
não teria necessariamente um fim ou um princípio. Easton (1965) contribuiu
para a área ao definir a política pública como um sistema, ou seja, como uma
relação entre formulação, resultados e o ambiente.
Com relação ao conceito do que vem a ser uma política pública, Bezerra
e Guerra (2013) escrevem que:Várias são as definições existentes para política pública. Lynn
(1980) define políticas públicas “como um conjunto de ações do
governo que irão produzir efeitos específicos”; Dye (1984) define
política pública como "o que o governo escolhe fazer ou não fazer";
e Laswell afirma que “análises sobre política pública implicam
responder às seguintes questões: quem ganha o quê, por que e que
diferença faz”. (BEZERRA e GUERRA, 2013, p. 2).
Nota-se, pelo que foi colocado em tela que o termo apresenta uma
conotação polissêmica e multidisciplinar, mas que nunca foge da ação do
governo sobre o fenômeno. No entanto, ainda é Souza (2006) que colabora
para a apreensão de um conceito mais esclarecedor quando afirma que se
pode entender política pública como o campo do conhecimento que busca, ao
mesmo tempo, “colocar o governo em ação” (grifo da autora) e/ou analisar essa
ação (variável independente) e, quando necessário, propor mudanças no rumo
ou curso dessas ações (variável dependente). A formulação de políticas
públicas constitui-se no estágio em que os governos democráticos traduzem
seus propósitos e plataformas eleitorais em programas e ações que produzirão
resultados ou mudanças no mundo real.
Isso leva a duas intepretações muito pertinentes colocadas por Calabre e
Boullosa (2015) quando apresentam as políticas públicas através de duas
escolas: a Análise Racional de Políticas Públicas (ARPP) e a Indagação
Pública (policy inquiry). A ARPP é uma escola de estudos e práticas de políticas públicas que nasce de uma compreensão mais gerencialista dos processos de governo e admite que os atores que realmente contam nos processos de políticas públicas são justamente os do governo. Para as autoras:
Neste sentido, os atores da sociedade civil, mercado e terceiro setor,
por exemplo, podem vir a fazer parte dos processos de políticas
públicas no máximo em pequenas e pontuais participações. Esta
escola também coloca bastante ênfase na dimensão técnica dos
instrumentos de políticas públicas, defendendo que a dimensão
política deve ser um atributo maior da política e não das políticas
públicas. A ênfase é tanta que muitas vezes até a noção de
instrumento de políticas públicas passa a ser substituída
simplesmente por políticas públicas. Quem compartilha destes
valores, costuma dizer, por exemplo, que o Vale Cultura é uma
política pública. (CALABRE e BOULLOSA, 2015, p.11)
Em outras palavras, portanto, as políticas públicas são os planos,
programas, projetos e ações implementadas pelo poder executivo dos
diferentes níveis dos governos.
Já na escola da polici inquiry, as autoras expressam que a mesma
“propõe a compreensão das políticas públicas como processos de construção
pública dos governos voltados para problemas públicos. Para começar, esta
escola defende que o termo público contido na expressão políticas públicas
seja derivado da qualidade do problema, e não do ator, como na ARPP. Assim,
a política é pública porque o problema é público” (CALABRE e BOULLOSA,
2015). Ainda de acordo com as autoras:Ao focar no problema e não no ator, admite-se uma maior diversidade
na composição dos atores de um processo de políticas públicas.
Afinal, se tomarmos como ponto de partida, por exemplo, o acesso à
cultura, sabemos que são muitos os atores que se mobilizam por este
problema, que tentam, em seus diferentes modos, ajudar a tratar ou a
governar este problema público. (CALABRE e BOULLOSA, 2015
p.12)
Ou seja, estes atores podem como já colocados em tela, pertencer às
esferas do governo, ao mercado ou à sociedade civil organizada, incluindo o
terceiro setor. De acordo com as autoras, quem compartilha destes valores
costuma dizer, por exemplo, que o Vale Cultura é um instrumento de políticas
públicas ativado pelo governo federal em conjunto com outros atores da
sociedade.
Cultura e Política pública cultural
Para se falar em política pública cultural vale compreender o que vem a
ser cultura dentro de uma esfera conceitual, para tanto é pertinente observar
com o que Chauí (1989) expõe a respeito do termo dentro de uma visão
sociológica, quando explica que:Vinda do verbo latino colere, na origem cultura significa o cultivo, o
cuidado. Inicialmente, era o cultivo e o cuidado com a terra, donde
agricultura, com as crianças, donde puericultura, e com os deuses e o
sagrado, donde culto. Como cultivo, a cultura era concebida como
uma ação que conduz a plena realização das potencialidades de
alguma coisa ou de alguém; era fazer brotar, frutificar, florescer e
cobrir de benefícios. (CHAUÍ, 2008. p.55)
Ou seja, o termo cultura estava carregado de conotações práticas sem a
simbologia com a qual é hoje caracterizada. Ainda seguindo o pensamento da
autora, a mesma afirma que “no correr da historia do ocidente, esse sentido foi-
se perdendo ate que, no século XVIII, com a Filosofia da Ilustração, a palavra
cultura ressurge, mas como sinônimo de outro conceito, torna-se sinônimo de
civilização. Sabemos que civilização deriva-se de ideia de vida civil, portanto,
de vida politica e de regime politico. Com o Iluminismo, a cultura é o padrão ou
o critério que mede o grau de civilização de uma sociedade”. (CHAUÌ, 2008).
No entanto, no século XIX, com a filosofia alemã, a ideia de cultura vai
sofrer uma mutação importante porque vai ser elaborada em cima da diferença
entre natureza e história, inaugurando o novo mundo humano. Neste contexto,
para Chauí (1998) a ordem natural ou física e regida por leis de causalidade
necessária que visam o equilíbrio do todo. A ordem vital ou biológica e regida
pelas normas de adaptação do organismo ao meio ambiente. A ordem humana,
porem, é a ordem simbólica, isto é, da capacidade humana para relacionar-se
com o ausente e com o possível por meio da linguagem e do trabalho.
A autora afirma ainda que é essa concepção ampliada da cultura que,
finalmente, será incorporada a partir da segunda metade do século XX, pelos
antropólogos europeus que buscarão desfazer a ideologia etnocêntrica e
imperialista da cultura, inaugurando a antropologia social e a antropologia
politica, nas quais cada cultura exprime, de maneira historicamente
determinada e materialmente determinada, a ordem humana simbólica com
uma individualidade própria ou uma estrutura própria.
E qual a importância de tudo isso para a construção de um novo
conceito de cultura? É a mesma autora que explica esta importância ao
instaurar que:A partir de então, o termo cultura passa a ter uma abrangência que
não possuía antes, sendo agora entendida como produção e criação
da linguagem, da religião, da sexualidade, dos instrumentos e das
formas do trabalho, das formas da habitação, do vestuário e da
culinária, das expressões de lazer, da musica, da dança, dos
sistemas de relações sociais, particularmente os sistemas de
parentesco ou a estrutura da família, das relações de poder, da
guerra e da paz, da noção de vida e morte. A cultura passa a ser
compreendida como o campo no qual os sujeitos humanos elaboram
símbolos e signos, instituem as práticas e os valores, definem para si
próprios o possível e o impossível, o sentido da linha do tempo
(passado, presente e futuro), as diferenças no interior do espaço (o
sentido do próximo e do distante, do grande e do pequeno, do visível
e do invisível), os valores como o verdadeiro e o falso, o belo e o feio,
o justo e o injusto, instauram a ideia de lei, e, portanto, do permitido e
do proibido, determinam o sentido da vida e da morte e das relações
entre o sagrado e o profano. (CHAUÍ, 2008, p.57)
Ou seja, é inaugurado o conceito moderno de cultura abrangendo numa
só palavra todas as possibilidades de realização humana.
Feitas tais considerações a respeito do termo cultura, passa-se a tecer o
quadro teórico para se compreender o que vem a ser política pública cultural.
Entendendo política pública como o Estado em ação (Souza, 2006), é que se
depreende que uma política cultural deva ser algum tipo de mecanismo
partindo do governo para produzir resultado ou mudança no mundo real. Diante
disso, é importante acatar o que Canclini (2004, citado por Calabre e Boullosa,
2015) expõe a respeito do que vem a ser uma política pública cultural quando
diz que é:O conjunto de intervenções realizadas pelo Estado, as instituições
civis e grupos comunitários organizados a fim de orientar o
desenvolvimento simbólico, satisfazer as necessidades culturais da
população e obter consenso para um tipo de ordem ou de
transformação social. “Porém esta maneira de caracterizar o âmbito
das políticas culturais necessita ser ampliada tendo em conta o
caráter transnacional dos processos simbólicos e materiais na
atualidade” (CANCLINI, 2005, p. 40, citado por CALABRE e
BOULLOSA, 2015, p. 19).
Colocação corroborada por Calabre e Boullosa (2015) quando ampliam
a informação ao mostrar que as políticas culturais são frutos das ações do
Estado, instituições civis e grupos comunitários, ou seja, são decisões
partilhadas que devem possuir um grau significativo de corresponsabilidade
entre os agentes envolvidos.
No entanto, continuam as autoras “para alcançar esse patamar de
relação entre Estado e sociedade se necessita da construção de instrumentos
e vias de implementação de políticas públicas de caráter democrático e
participativo. Este pode se dar através da construção de planos municipais de
cultura, de conselhos gestores de políticas, da implantação do modelo de
orçamento participativo, do estímulo à instalação de instâncias de consulta e de
discussão públicas partilhadas, entre outras possibilidades”. (CALABRE e
BOULLOSA, 2015).
Nesta conjuntura, a pergunta que se levanta é como se dá a produção
da política cultural no Brasil?
Para Rubim (2007) a história das políticas culturais do Estado nacional
brasileiro pode ser condensada pelo acionamento de expressões como:
autoritarismo, caráter tardio, descontinuidade, desatenção, paradoxos,
impasses e desafios. No entanto, segundo Calabre (2007) a elaboração de políticas para o setor, ou seja, a preocupação na preparação e realização de ações de maior alcance, com um caráter perene, datam do século XX. O estudo de tais políticas também é um objeto de interesse recente. Sobre as décadas de 1930 e 1940 existe um número razoável de trabalhos que tratam da ação do estado sobre a cultura. É importante ressaltar que na maioria dos casos as ações não são necessariamente tratadas como políticas culturais.
De acordo com Rubim (2007) as políticas culturais no Brasil surgem
desde a criação do Departamento de Cultura de São Paulo e a atuação do
governo Vargas nos anos 1930/40, passando pela Política Nacional de Cultura
da Ditadura Militar nos anos 1970, pela criação do Ministério da Cultura na
redemocratização dos anos 1980, até chegar às atuais transformações
promovidas pela gestão de Gilberto Gil, entre outras referências possíveis.
Nesta conjuntura temporal vale ressaltar três fatos importantes que vão
contribuir para o desenho democrático-participativo das políticas públicas
culturais no Brasil: A passagem de Mário de Andrade frente à Secretaria
Municipal de Cultura de São Paulo no período de 1935 a 1938 (RUBIN, 2007),
a de Marilena Chauí na Secretaria de Estado de Cultura de São Paulo no
período de 1989 a 1992 e a Promulgação da Constituição de 1988 (CALABRE
e BOULLOSA, 2015)
Para Rubim (2007) a passagem de Mário de Andrade pelo
Departamento de cultura da cidade de São Paulo é relevante pelas inovações
que o mesmo implantou como: 1. Estabelecer uma intervenção estatal
sistemática abrangendo diferentes áreas da cultura; 2. Pensar a cultura como
algo “tão vital como o pão”; 3. Propor uma definição ampla de cultura que
extrapola as belas artes, sem desconsiderá-las, e que abarca, dentre outras, as
culturas populares; 4. Assumir o patrimônio não só como material, tangível e
possuído pelas elites, mas também como algo imaterial, intangível e pertinente
aos diferentes estratos da sociedade; 5. Patrocinar duas missões etnográficas
às regiões amazônica e nordestina para pesquisar suas populações,
deslocadas do eixo dinâmico do país e da sua jurisdição administrativa, mas
possuidoras de significativos acervos culturais (modos de vida e de produção,
valores sociais, histórias, religiões, lendas, mitos, narrativas, literaturas,
músicas, danças etc.).
Para Calabre e Boullosa (2015), a contribuição de Marilena Chauí está
no fato de detectar durante sua gestão à frente da Secretaria de Cultura da cidade de São Paulo, em finais da década de 1980 e início dos anos 90 três importantes eixos que necessitavam ser trabalhados pela nova administração: em primeiro lugar, a mudança na mentalidade dos servidores públicos; em segundo, a definição de prioridades voltadas para as carências e demandas das classes populares; e, em terceiro, a invenção de uma nova cultura política. De acordo com Chauí (citada por Calabre e Boullosa, 2015):
(...) no eixo da invenção de uma nova cultura política estava o
estímulo para a formação de diferentes formas de auto-organização
dos grupos sociais, em especial das classes populares, com o
objetivo de estimular a criação do sentimento e da prática da
cidadania – em uma sociedade extremamente desigual, o acesso real
ao conjunto dos direitos e mesmo ao sentimento, à crença, de poder
acessá-lo precisam ser construídos. Com a retomada do olhar sobre
a cultura como uma das áreas das políticas públicas e com a
ampliação do conceito sobre os limites da própria área (que extrapola
o campo do fazer artístico) vem sendo consolidado um novo cenário
no qual o conjunto dos profissionais deve atuar na busca da
construção de uma efetiva cidadania cultural. Cenário este que requer
tanto a renovação do perfil dos administradores públicos quanto a
alteração da cultura política e da mentalidade dos servidores públicos.
(CALABRE E BOULLOSA, 2015, p. 21)
Nas palavras da autora, as politicas culturais necessitam, para ser
realmente reconhecidas, passar por uma transformação de mentalidades dos
que fazem a cultura e a sua política como também daqueles que consomem a
mesma dentro de uma conjuntura jurídica, uma vez que a cultura é um direito
de todo cidadão. Neste contexto, Calabre e Boullosa (2015) apontam os
direitos culturais levantados por Marilena Chauí: O direito de produzir cultura,
seja pela apropriação dos meios culturais existentes, seja pela invenção de
novos significados culturais; O direito de participar das decisões quanto ao
fazer cultural; O direito de usufruir os bens da cultura, criando locais e
condições de acesso aos bens culturais para a população; O direito de estar
informado sobre os serviços culturais e sobre a possibilidade de deles
participar ou deles usufruir; O direito à formação cultural e artística pública e
gratuita nas Escolas e Oficinas de Cultura do Município; O direito à
experimentação e à invenção do novo nas artes e nas humanidades; O direito a
espaços para reflexão, debate e crítica; O direito à informação e à
comunicação.
Outro fator que deve ser considerado em relação às políticas culturais
brasileiras é a promulgação da Constituição de 1988 que assegura uma série
de vantagens para a cultura nacional. A respeito, Calabre e Boullosa (2015)
asseguram que:Deve-se considerar que desde a década de 1980, em especial com a
promulgação da Constituição de 1988, em diferentes níveis de
governo, vêm sendo colocados em prática alguns mecanismos de
participação. Em outras palavras, há a busca de construção de
políticas públicas setoriais de viés participativo e democrático,
materializadas, por exemplo, na convocação de conferências de
políticas setoriais (nacionais, estaduais e municipais) ou na utilização
do mecanismo de orçamento participativo – ainda que tal processo
tenha sido acelerado na última década. Esse novo modelo de gestão
pública, a da gestão participativa que vem se desenhando, considera
que a problemática de desenvolvimento extrapola o campo do
econômico, enfatizando um conceito alargado de qualidade de vida e
de ampliação das capacidades humanas. (CALABRE e BOULLOSA,
2015, p.22).
De fato, mas não se pode esquecer que um dos principais problemas a
ser enfrentado hoje é exatamente o da real institucionalização da área da
cultura no conjunto do que chamamos políticas públicas. O desafio que se
coloca é o de transformar a lei e a garantia efetiva dos direitos culturais em
realidade.
O CEU – Centro de Artes e Esportes unificados do município de Jacundá como programa de Política Pública Cultural.
Segundo Tsukumo (2014) o Centro de Artes e Esportes Unificados –
CEU - é um equipamento público estatal, instalado em áreas de vulnerabilidade
social, que integra atividades socioculturais, socioassistenciais, recreativas,
esportivas, de formação e de qualificação. Idealizado em conjunto pelos
Ministérios da Cultura, Esporte, Desenvolvimento Social e Combate à Fome,
Justiça e do Trabalho e Emprego, integra em um mesmo espaço físico
programas e ações setoriais, com o objetivo de promover, em áreas de
vulnerabilidade social, a ampliação do acesso a serviços públicos, o
desenvolvimento econômico e social, a cidadania e a garantia de direitos. O
CEU visa à integração das políticas nacionais, estaduais e municipais de
cultura, esporte, assistência social, justiça e trabalho e emprego, a fim de
oferecer serviços públicos dos seus respectivos sistemas nacionais, na medida
da sua consolidação e da adesão por parte dos entes federados. O CEU têm
como ponto de partida a Mobilização Social no município para formação do
Grupo Gestor tripartite, que deverá orientar democraticamente sobre o seu uso
e programação. O Grupo Gestor tem como princípio a participação social, por
meio da garantia da gestão compartilhada do CEU entre o poder público local,
a comunidade beneficiária e a sociedade civil organizada. Os CEUs são
executados com recursos do Governo Federal repassados aos entes
federados, que são responsáveis pelas obras, aquisição de equipamentos e
mobiliário, mobilização social e pela posterior gestão do equipamento.
Ainda de acordo com Tsukumo (2014) a gestão dos CEUs é de
responsabilidade do ente federado (município ou Distrito Federal) e consiste
em coordenar ações para o pleno e adequado funcionamento do CEU,
incluindo orçamento municipal para contratação de equipe, manutenção das
instalações prediais, de equipamentos e mobiliário, promoção de eventos e
atividades permanentes e/ou sazonais, e desenvolvimento de ações de
mobilização social da comunidade.Segundo Tsukumo (2014) o Ministério da Cultura desenvolve ações para
apoiar os processos de mobilização social, formação do Grupo Gestor,
planejamento participativo de usos e programação e elaboração dos Planos de
Gestão, além de acompanhar e monitorar a implementação dos CEUs a partir
da conclusão das obras.
Para tanto, desde 2014, é realizado o mapeamento sociocultural dos
chamados Territórios de Vivência dos CEUs, áreas envoltórias aos
equipamentos nas quais se estabelecem as redes socioculturais e o cotidiano
de vida da comunidade. O mapeamento é a ferramenta inicial para promoção
da sustentabilidade do CEU por meio da articulação dos agentes socioculturais
presentes no território (TSUKUMO, 2014).
A implantação do Centro das Artes e dos Esportes Unificados (CEU) nas
proximidades de dois bairros da cidade de Jacundá (Santa Rita e Boa
Esperança) é uma realidade concreta. O Equipamento faz parte do Programa
de Aceleramento de Crescimento – PAC 2 e de acordo com Tsukumo (2014)
foi idealizado em conjunto pelos ministérios da Cultura, Esporte,
Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Justiça, Trabalho e Emprego, e
Planejamento, Orçamento e Gestão, o Centro de Artes e Esportes Unificados
integrando num mesmo espaço físico programas, serviços e ações setoriais,
visando à promoção da cidadania e à redução da pobreza nos territórios onde
foi construído.
O equipamento público tem 3.000 metros quadrados em planta baixa e
apresenta em seu complexo 01 biblioteca, 01 cineteatro de 60 lugares,
laboratório de informática, 02 salas multiuso, 01 espaço do CRAS (com
banheiro), 01 sala de gestão (com banheiro), 01 banheiro externo (completo),
quadra esportiva, praça com equipamento de ginástica, 01 pista de skate, 01
parquinho infantil, 01 cozinha. Localiza-se na rua Tiradentes s/nº, bairro Santa
Rita, CEP: 68590-000. O equipamento foi inaugurado no dia 14 de junho de
2014 e funciona das 08h00 às 22h00, de segunda a domingo. Aos finais de
semana os instrumentos externos (quadra, pista de skate, praça de ginástica e
parquinho) são frequentados pela população local, mas sob a atenção de um
vigilante conhecido da comunidade que está ligado diretamente com o
coordenador geral. O CEU de Jacundá foi construído numa área de alta
vulnerabilidade, na qual existia antes um cemitério desativado e que abrigava
drogados, ladrões, traficantes e delinquentes juvenis que materializavam ações
perigosas na região como assaltos, uso e comércio de drogas, além de
homicídios.
A gestão do CEU é tripartite, mas os cinco componentes do poder
público é que desenvolvem as atividades administrativas, sendo que os
representantes da sociedade civil organizada e da comunidade civil do entorno
assumem posturas consultivas e deliberativas a respeito dos recursos e ações
desenvolvidas no equipamento. A gestão do CEU está ligada diretamente ao
gabinete do prefeito, uma vez que o coordenador geral e demais
representantes do poder público são indicações do gestor público. O CEU tem
estatuto próprio e regimento interno que dita as diretrizes do equipamento.
As atividades sócio-culturais-desportivas desenvolvidas no complexo,
segundo o coordenador cultural Leoneze Nunes são: oficina de teatro (48
alunos), oficina de música (iniciação musical, 60 alunos), projeto de esporte
com ênfase no futsal (iniciativa privada – o empresário remunera o instrutor, 45
alunos). De acordo com o coordenador geral, aguardam-se recursos para o
início de um projeto de leitura (90 participantes) e para compras de
instrumentos para a formação de uma banda marcial. As atividades do CRAS
atendem a uma demanda comunitária de aproximadamente 200 pessoas entre
crianças, adolescente e adulta. Também são apoiados projetos de dança (Hip
Hop), escolinha de reforço para as séries iniciais do ensino básico (45 alunos),
sessão de filmes para a comunidade, jogos de tabuleiro, skate, além de jogos
de quadra (handebol, basquetebol e voleibol).
De acordo com o coordenador do CEU as políticas de prevenção a
violência que são adotadas no Programa do CRAS e nas atividades de cultura
e lazer incluem palestras com profissionais da área da assistência social,
saúde, educação, além de projeção de filmes seguida de debates ou rodas de
conversa pertinentes ao tema desenvolvido na película. Apresentações de
dança e teatro para a comunidade também são estratégias para a
sensibilização do público do entorno com o equipamento, além de garantir o
direito de acesso aos bens culturais oferecidos pelo CEU.
Tais ações impactam de forma positiva na comunidade que segundo
Leoneze Nunes acaba participando ativamente nos encontros de mobilização
social para discussões e avaliações que ocorrem a cada três meses.
A população do entorno garante que o equipamento contribuiu muito
para a redução do índice de criminalidade e uso de drogas na região, embora,
ainda de acordo com o coordenador ainda existam focos de usuários e jovens
que consomem bebidas alcoólicas nos arredores da praça. Para Leoneze
Nunes tais focos devem diminuir ao longo do tempo uma vez que muitos
desses jovens são incorporados pelas atividades do CEU. Como exemplo, cita
o grupo de Hip Hop cuja formação conta com usuários de drogas assistidos
pela equipe do CRAS.
Além disso, a instalação do equipamento impactou na paisagem urbana
trazendo saneamento, asfalto das vias públicas adjacentes ao CEU, iluminação
pública e valorização dos imóveis do entorno.
No entanto, como afirma Leoneze Nunes há alguns pontos que
impactam negativamente no pleno uso e funcionamento do CEU. Como se
trata de um espaço aberto e haja todo um cuidado com a vigilância do
equipamento, grupos de jovens ainda utilizam o espaço para fazer “farras” com
bebidas alcoólicas e uso de drogas, pichações e até mesmo tentativa de
depredação, o que faz com que em primeiro plano, o coordenador acionar a
polícia. Mas o coordenador justifica tais atos pelo ainda curto período de
implantação do CEU (um ano e meio de funcionamento) e em sua opinião tais
ações relatadas em tela tendem a diminuir ou desaparecer com os projetos e
programas que estão sendo desenvolvidos no equipamento e outros que virão.
Outra face desses impactos negativos é com relação a recursos financeiros.
Como o dinheiro federal vem diretamente para a conta da prefeitura e não para
uma conta exclusiva do CEU, há uma dependência muito grande quanto ao
repasse para o setor administrativo. O coordenador relatou que ha uma
relutância muito forte por parte do poder público municipal em criar um CNPJ
para o CEU, preferindo que o mesmo continue vinculado ao gabinete.
Diante desta conjuntura, o grupo gestor vai no ano de 2016 revisar o
Estatuto e modificá-lo para acrescentar duas mudanças: cercamento da praça
e a cobrança de taxas de uso público pelo setor privado para se ter um caixa
para serviços operacionais do equipamento.
O Programa CEU de Jacundá é uma política pública cultural porque
atende a nível estrutural uma demanda da população através de ações que
mobilizam essa população do entorno do equipamento, fazendo surgir no
cenário urbano da cidade uma nova realidade sociocultural, caracterizando
dessa forma a materialização desse modelo de política cultural.
Importante observar que o CEU em questão como política pública aciona
para dois tipos de abordagem, os quais Lima (2012) classifica como estatista e
multicêntrica.
Contextualizando o equipamento a partir do protagonismo do estado,
observa-se que dentro do conceitual teórico, as políticas públicas,
analiticamente, são monopólio de atores estatais. Segundo esta concepção, o
que determina se uma política é ou não pública é a personalidade jurídica do
formulador. Em outras palavras, é política pública somente quando emanada
de ator estatal (HECLO, 1972; DYE, 1972; MENY E THOENIG, 1991;
HOWLETT E RAMESH, 2003 citados por LIMA, 2012), o que evidentemente
coloca o CEU de Jacundá como uma política pública cultural. Tal conjuntura
também pode ser comparada a ARPP (análise racional das políticas públicas),
colocada já em tela por Calabre e Boulosa (2015) quando definem as políticas
públicas como os planos, programas, projetos e ações implementadas pelo
poder executivo dos diferentes níveis dos governos.
A abordagem estatista aplicada ao CEU de Jacundá se justifica com o
argumento que Lima (2012) defende ao propor que a mesma facilita os
estudos, na medida em que reduz o universo autoral, focando no Estado, que
tem como principal meio de ação as políticas públicas, para atender às
demandas da sociedade. Assim, os estudos sobre as mesmas serviriam tanto
para o estado melhorar a sua atuação quanto para que a sociedade pudesse
cobrar adequadamente melhorias.
Por outro lado, também se pode contextualizar o CEU de Jacundá na
abordagem multicêntrica defendida por Lima (2012) quando afirma nessa
abordagem que a perspectiva de política pública vai além da perspectiva de
políticas governamentais, na medida em que o governo, com sua estrutura
administrativa, não é a única instituição a servir à comunidade política, isto é, a
promover “políticas públicas” (HEIDEMANN, 2010, p.31, citado por LIMA,
2012).
Ou mesmo, na medida em que os atores que compõem o equipamento
público de Jacundá se entrelaçam também se pode contextualizá-lo na escola
da indagação pública uma vez que, de acordo com Calabre e Boullosa (2015)
ao focar no problema e não no ator, admite-se uma maior diversidade na
composição dos atores de um processo de políticas públicas e estes atores
podem pertencer às esferas do governo, ao mercado ou à sociedade civil
organizada, incluindo o terceiro setor.
Importante observar que o CEU enquanto política pública cultural
inaugura um novo conceito de política pública ao considerar a gestão
compartilhada com os três grupos sociais, o governo, a sociedade civil
organizada e a comunidade do entorno do CEU, refletindo dessa forma o que
Mario de Andrade (Rubim, 2007) pretendeu ao estabelecer uma intervenção
estatal sistemática abrangendo diferentes áreas da cultura, pensar a cultura
como algo “tão vital como o pão”; e propor uma definição ampla de cultura que
extrapola as belas artes, sem desconsiderá-las, e que abarcasse, dentre
outras, as culturas populares. Nessa conjuntura também entram os
pressupostos de Marilena Chauí (Calabre e Boullosa, 2015) ao propor na perspectiva de políticas culturais a mudança na mentalidade dos servidores públicos, a definição de prioridades voltadas para as carências e demandas das classes populares e a invenção de uma nova cultura política e no caso específico do CEU, o exercício de todos os direitos constitucionais referentes a Cultura.
Considerações
Entendendo políticas públicas como um conjunto de ações do governo
que irão produzir efeitos específicos ou como o que o governo escolhe fazer ou
não fazer ou ainda responder questões quem ganha o quê, por que e que
diferença faz (BEZERRA e GUERRA (2013); Cultura como um como produção
e criação da linguagem, da religião, da sexualidade, dos instrumentos e das
formas do trabalho, das formas da habitação, do vestuário e da culinária, das
expressões de lazer, da musica, da dança, dos sistemas de relações sociais,
particularmente os sistemas de parentesco ou a estrutura da família, das
relações de poder, da guerra e da paz, da noção de vida e morte(CHAUÍ,2008)
e Políticas Públicas como o conjunto de intervenções realizadas pelo Estado,
as instituições civis e grupos comunitários organizados a fim de orientar o
desenvolvimento simbólico, satisfazer as necessidades culturais da população
e obter consenso para um tipo de ordem ou de transformação social
(CALABRE e BOULLOSA, 2015) é que se pretendeu, neste estudo, analisar o
CEU de Artes e dos Esportes unificados do município de Jacundá como um
programa de política pública cultural.
Nesta conjuntura, ao longo da pesquisa e produção deste estudo pode-
se constatar que o Centro de Artes e dos Esportes Unificados do município de
Jacundá está viabilizando muito lentamente mudanças socioculturais na
comunidade do entorno em que está implantado no âmbito de suas ações no
campo das políticas públicas culturais.
Como programa de política pública cultural, o CEU de Jacundá está
diminuindo o nível de problemas sociais (crimes, uso de drogas, álcool,
vandalismo, pichações) no seu entorno, principalmente entre a comunidade
jovem dos bairros de Santa Rita e Boa Esperança.
Ao propiciar acesso às linguagens artístico culturais (teatro, dança, artes
visuais e música) e o esporte, o programa de ações do CEU tem trazido
benefícios a comunidade do entorno principalmente entre crianças e
adolescentes, aumentando-lhes a autoestima (a inclusão proporciona isso) e a
ocupação de tempo ocioso dos frequentadores do equipamento.
Também se observou que a implantação do CEU das Artes e dos
Esportes Unificados nas imediações dos bairros Santa Rita e Boa Esperança
como mecanismo de inclusão, produção, acesso e reprodução da cultura, do
esportes e outras ações para a comunidade local no contexto das políticas
públicas foi significativo, pois além de trazer cultura, lazer, inclusão digital,
serviços socioassistenciais, urbanizou o entorno do equipamento, valorizando
economicamente os bairros ao propiciar-lhes rede de esgoto, asfalto das vias
públicas e iluminação. Com isso, os imóveis do entorno do CEU valorizaram-se
e muitos moradores não pensa mais em se mudar do bairro.
Identificou-se que os fatores que contribuíram para a necessidade da
implantação do equipamento nas imediações dos dois bairros estavam ligados
a alta vulnerabilidade dos mesmos com relação a problemas sociais,
urbanização e descaso do poder público local. Ao se mapear o município, a
equipe do Ministério da Cultura detectou a alta vulnerabilidade sociocultural
daqueles espaços.
Neste contexto, verificou-se que a importância da funcionalidade do
equipamento para a comunidade de seu entorno estava no fato de revalorizar e
ressignificar as atitudes das pessoas (a gestão é tripartite e a comunidade civil
do entorno é participante) e também do espaço urbano.
Constatou-se também que para se tornar realmente um programa de
políticas culturais o CEU de Jacundá necessita passar por algumas mudanças
e se adequar completamente a filosofia do programa.
Diante disso, se visualizou que embora as ações socioculturais,
esportivas, socioassistenciais, tecnológicas (inclusão digital) estejam de fato
implantadas e a gestão é tripartite (ou pelo menos era para ser), o CEU de
Jacundá em sua primeira gestão ainda conserva alguns vícios da gestão
centralizada que caracteriza a maioria das políticas no Brasil. Na ideia original
preconiza-se que o CEU deve ser autônomo contanto com uma equipe própria
de gestão. Para isso, deve se tornar uma pessoa jurídica. No entanto, no CEU
de Jacundá isso não acontece porque o equipamento está ligado diretamente
ao gabinete do prefeito e seu coordenador geral bem como todos os 15
participantes do grupo gestor são indicações do prefeito, oque faz com que os
recursos direcionados para o CEU caia diretamente na conta da prefeitura.
Mas essa diretriz é justificada oficialmente no Estatuto do CEU de
Jacundá que prevê pelo menos nos dois primeiros anos de funcionamento do
equipamento que o Grupo gestor seja indicado pelo prefeito. A próxima gestão,
no entanto, deve ser feita através de eleição. Tal feito inclui a seguinte
perspectiva: a que justifica a ênfase no Estado e seu poder para dominar e ao
mesmo tempo incluir a sociedade no processo de gestão (postula-se que esses
dois primeiros anos de gestão em que o grupo é indicado pelo prefeito como
um ensaio para a gestão descentralizada, em que se preconiza a ideia de
Chauí com relação a mudança de mentalidade dos servidores, trazendo um
novo modelo de gestão governamental)
Também, concluiu-se, neste estudo que mesmo sendo uma política
pública cultural cuja estrutura de funcionamento ainda esteja atrelada ao
protagonismo do governo, o CEU de Jacundá, em seu 1 ano e meio de
funcionamento vem mudando a face sociocultural dos bairros em que está
implantado, trazendo melhorias físicas para seu entorno e dando a chance de
protagonismo e acesso a cultura, esporte, lazer e inclusão digital a
comunidade, mostrando a todos que numa sociedade democrática, o correto é
o cidadão ter acesso aos seus direitos e fazê-los valer.
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