2
Liga da Dor - UFCSPA Junho-2013 Lenita Ferraz Apesar dos diversos avanços nas variadas áreas de entendimento da dor, ela continua sendo um problema significante para muitos indivíduos. Os estímulos recebidos pelo nosso organismo desencadeiam respostas mentais que ocorrem em nível microscópico (neuronal) e macroscópico (funcionamento psicológico). A dor, como estímulo, não foge a essa regra: a atividade cerebral de determinadas regiões corticais associadas à dor pode ser modulada por intervenções cognitivas e é dentro desse cenário que as intervenções em saúde mental nos pacientes que apresentam dor crônica (DC) tornam-se obrigatórias. A Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) é, atualmente, a psicoterapia de escolha no tratamento de indivíduos com DC. Trata-se de um conjunto de abordagens usadas na compreensão e no tratamento de diversas condições médicas e de transtornos psiquiátricos específicos. Fundamenta-se em três proposições fundamentais: 1) a atividade cognitiva (pensamento) influencia o comportamento; 2) a atividade cognitiva pode ser mudada e alterada; 3) o comportamento desejado pode ser modificado mediante a mudança cognitiva. Baseando-se nesses conceitos, as técnicas cognitivo-comportamentais propõem-se a promover o aprendizado de habilidades que permitam uma resolução mais adaptativa de seus problemas e a modificação de reações emocionais, cognitivas e comportamentais prejucidiais. A grande variedade de respostas dos pacientes aos vários tratamentos sugere que fatores adicionais (sensoriais, afetivos, cognitivos e comportamentais) à patologia física contribuem para a experiência e resposta nociceptiva à dor, mesmo após a resolução da patologia em questão. Os pensamentos, usualmente automáticos e não conscientes, têm um profundo impacto no ajustamento à dor e a função do terapeuta cognitivo-comportamental é ajudar o paciente a adquirir maior noção de controle sobre os efeitos da dor em sua vida, além de ajudá-lo a identificar, avaliar e modificar pensamentos e expectativas distorcidos, modificando comportamentos nocivos aprendidos e melhorando sua auto-eficácia. Modelo comportamental na dor crônica O comportamento de dor pode ser considerado como aprendido e refere-se a condutas mal-adaptativas ou disfuncionais em resposta à dor, as quais estão associadas à manutenção da dor e à incapacidade. O medo da dor pode ficar associado a situações que o paciente pode começar a evitar por assumir que determinado movimento desencadeará ou piorará sua dor. O aumento do número de atividades evitadas pode levar à inatividade e à dificuldade em aderir aos tratamentos. Além disso, a expectativa do paciente ao ter que passar por uma situação que provoque dor produz ansiedade antecipatória e tensão muscular, o que piora a dor. O comportamento pode ser aprendido pela observação de alguém com dor, por isso não se mostra terapêutico fazer, de forma isolada, grupos de pessoas com DC reunirem-se para conversar. Outra forma de aprendizado é através do condicionamento operante, que modula comportamentos em razão do efeito que estes provocam no ambiente. A dor, por exemplo, aumenta a atenção das pessoas sobre o indivíduo que a refere, e este pode utilizá-la mesmo que incoscientemente para compensações pessoais, reforçando assim o comportamento doloroso. Modelo cognitivo na dor crônica As pessoas que sofrem com DC desenvolvem pensamento na tentaiva de dar sentido à sua dor. Têm pensamentos automáticos a respeito das causas,dos significados, do controle, do impacto na vida, da noção de perigo e de efeitos relacionados à sua dor que frequentemente não correspondem à realidade, podendo apresentar distorções. Sentimentos como medo, ansiedade, tristeza, insegurança e raiva podem aparecer durante a experiência dolorosa, distorcendo-a e estimulando crenças relacionadas à piora do quadro clínico. Os pensamentos catastróficos são a distorção cognitiva mais estudada na literatura relativa à percepção e ao ajuste à dor. Quando a dor é compreendida como lesão tecidual ou doença progressiva, tende a produzir mais sofrimento e comportamentos disfuncionais do que se for enxergada como resultado de um problema estável que espera resolução. Indicações e contra-indicações de TCC em DC A terapia cognitivo-comportamental é indicada quando: a condição de dor do paciente torna-se crônica; a dor em si torna-se fora de manejo; a dor afeta o funcionamento psicológico ou o estresse emocional axacerba a dor; o paciente apresenta dificuldade em lidar com seu tratamento médico; o paciente vivencia um estresse psicossocial. A técnica cognitiva é desaconselhada em caso de: pacientes com disfunção cognitiva importante; pacientes que não se interessam ou que estão pouco motivados para tal abordagem pacientes que apresentam quadros graves (não compensados) de transtornos psiquiátricos. TCC em dor crônica O processo terapêutico da TCC em DC distribui-se nas seguintes etapas: Avaliação: objetivam identificar déficits e excessos na vida do indivíduo com DC. Comorbidades psiquiátricas devem ser investigadas e hierarquizadas no tratamento. Deve-se avaliar como o paciente

wer

Embed Size (px)

DESCRIPTION

fdr

Citation preview

Page 1: wer

Liga da Dor - UFCSPA Junho-2013

Lenita Ferraz

Apesar dos diversos avanços nas variadas áreas de entendimento da dor, ela continua sendo um problema significante para muitos indivíduos. Os estímulos recebidos pelo nosso organismo desencadeiam respostas mentais que ocorrem em nível microscópico (neuronal) e macroscópico (funcionamento psicológico). A dor, como estímulo, não foge a essa regra: a atividade cerebral de determinadas regiões corticais associadas à dor pode ser modulada por intervenções cognitivas e é dentro desse cenário que as intervenções em saúde mental nos pacientes que apresentam dor crônica (DC) tornam-se obrigatórias.

A Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) é, atualmente, a psicoterapia de escolha no tratamento de indivíduos com DC. Trata-se de um conjunto de abordagens usadas na compreensão e no tratamento de diversas condições médicas e de transtornos psiquiátricos específicos. Fundamenta-se em três proposições fundamentais: 1) a atividade cognitiva (pensamento) influencia o comportamento; 2) a atividade cognitiva pode ser mudada e alterada; 3) o comportamento desejado pode ser modificado mediante a mudança cognitiva. Baseando-se nesses conceitos, as técnicas cognitivo-comportamentais propõem-se a promover o aprendizado de habilidades que permitam uma resolução mais adaptativa de seus problemas e a modificação de reações emocionais, cognitivas e comportamentais prejucidiais.

A grande variedade de respostas dos pacientes aos vários tratamentos sugere que fatores adicionais (sensoriais, afetivos, cognitivos e comportamentais) à patologia física contribuem para a experiência e resposta nociceptiva à dor, mesmo após a resolução da patologia em questão. Os pensamentos, usualmente automáticos e não conscientes, têm um profundo impacto no ajustamento à dor e a função do terapeuta cognitivo-comportamental é ajudar o paciente a adquirir maior noção de controle sobre os efeitos da dor em sua vida, além de ajudá-lo a identificar, avaliar e modificar pensamentos e expectativas distorcidos, modificando comportamentos nocivos aprendidos e melhorando sua auto-eficácia.

Modelo comportamental na dor crônica

O comportamento de dor pode ser considerado como aprendido e refere-se a condutas mal-adaptativas ou disfuncionais em resposta à dor, as quais estão associadas à manutenção da dor e à incapacidade.

O medo da dor pode ficar associado a situações que o paciente pode começar a evitar por assumir que determinado movimento desencadeará ou piorará sua dor. O aumento do número de atividades evitadas pode levar à inatividade e à dificuldade em aderir aos tratamentos. Além disso, a expectativa do paciente ao ter que passar por uma situação que provoque dor produz ansiedade antecipatória e tensão muscular, o que piora a dor.

O comportamento pode ser aprendido pela observação de alguém com dor, por isso não se mostra terapêutico fazer, de forma isolada, grupos de pessoas com DC reunirem-se para conversar. Outra forma de aprendizado é através do condicionamento operante, que modula comportamentos em razão do efeito que estes provocam no ambiente. A dor, por exemplo, aumenta a atenção das pessoas sobre o indivíduo que a refere, e este pode utilizá-la – mesmo que incoscientemente – para compensações pessoais, reforçando assim o comportamento doloroso.

Modelo cognitivo na dor crônica

As pessoas que sofrem com DC desenvolvem pensamento na tentaiva de dar sentido à sua dor. Têm pensamentos automáticos – a respeito das causas,dos significados, do controle, do impacto na vida, da noção de perigo e de efeitos relacionados à sua dor – que frequentemente não correspondem à realidade, podendo apresentar distorções. Sentimentos como medo, ansiedade, tristeza, insegurança e raiva podem aparecer durante a experiência dolorosa, distorcendo-a e estimulando crenças relacionadas à piora do quadro clínico. Os pensamentos catastróficos são a distorção cognitiva mais estudada na literatura relativa à percepção e ao ajuste à dor. Quando a dor é compreendida como lesão tecidual ou doença progressiva, tende a produzir mais sofrimento e comportamentos disfuncionais do que se for enxergada como resultado de um problema estável que espera resolução. Indicações e contra-indicações de TCC em DC

A terapia cognitivo-comportamental é indicada quando:

a condição de dor do paciente torna-se crônica;

a dor em si torna-se fora de manejo;

a dor afeta o funcionamento psicológico ou o estresse emocional axacerba a dor;

o paciente apresenta dificuldade em lidar com seu tratamento médico;

o paciente vivencia um estresse psicossocial.

A técnica cognitiva é desaconselhada em caso de:

pacientes com disfunção cognitiva importante;

pacientes que não se interessam ou que estão pouco motivados para tal abordagem

pacientes que apresentam quadros graves (não compensados) de transtornos psiquiátricos.

TCC em dor crônica

O processo terapêutico da TCC em DC distribui-se nas seguintes etapas:

Avaliação: objetivam identificar déficits e excessos na vida do indivíduo com DC. Comorbidades psiquiátricas devem ser investigadas e hierarquizadas no tratamento. Deve-se avaliar como o paciente

Page 2: wer

Liga da Dor - UFCSPA Junho-2013

enfrentou crises vitais e acidentais anteriores e tentar associá-las à evolução da dor.

Objetivos do tratamento: deve-se estabelecer uma lista de problemas, indentificando-os em curtos (próximos dias), médios (próximas semanas e meses) ou longos prazos (um ou mais anos) e abordá-los dos menores para os maiores.

Familiarização: explica-se como funciona o tratamento, qual o papel do terapeuta e do paciente e ressalta-se a importância da realização das tarefas fora das sessões.

Psicoeducação: são apresentados conceitos como o de que a dor é uma situação relacionada ao estresse, de que sua natureza é multidimensional e de que o paciente pode ter controle sobre ela.

Conceituação cognitivo-comportamental: investigam-se os diversos aspectos associados à dor que estão presentes na vida do paciente.

Principais intervenções cognitivas e comportamentais: a aplicação das intervenções deve ser flexível, não-aleatória e, sempre que possível, individualizada. Estão em as principais intervenções:

-relaxamento muscular progressivo e respiração (auxiliam paciente a perceber que pode controlar algumas de suas resposta fisiológicas e que estas podem estar envolvidas na produção ou alívio da dor);

-prática de exercícios (promove maior senso de controle sobre o funcionamento físico, aliberação de endorfinas diminui a percepção da dor);

-distração (por meio dos pensamentos e da imaginação, o foco da dor pode ser desviado);

-reestruturação cognitiva (identificação e modificação do pensar disfuncional);

-comunicação assertiva (habilitar o paciente a comunicar-se e comportar-se em qualquer situação na qual tenha que expressar seus pensamentos, sentimentos e necessidades, facilitando as relações interpessoais);

-escrita expressiva (ajuda paciente a escrever sobre seus mais profundos pensamentos e sentimentos, ajudando a avaliá-los e enfrentá-los ao invés de negá-los);

-resolução de problemas (melhorar a capacidade de solucionar problemas para diminuir nível de estresse e ansiedade em situações corriqueiras).

Prevenção de recaída: auxiliar o paciente a detectar suas situações de risco, sinais prodrômicos de recaída e a desenvolver planos de como lidar com tais situações.

Término do tratamento: o término do tratamento não ocorre de forma abrupta. É realizado colaborativamente com o paciente, ocorrendo quando

a lista de problemas e os objetivos do tratamento estiverem resolvidos suficientemente.

Referências Bibliográficas:Dor: Manual Para o Clínico. TEIXEIRA, M. J. São Paulo: Editora Atheneu, 2006 (Terapia cognitivo-comportamental no tratamento da dor crônica – Alexandre Annes Henriques, Ana Paula Mezacaza Filippon, Aristides Volpato Cordioli; Psicoterapias. CORDIOLI, A. V. Porto Alegre: Editora Artmed, 2008 (Psicoterapias para transtornos somatoformes – Ana Paula Mezacaza Filippon, Betina Mariante Cardoso, Rogério Wolf de Aguiar)