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Oliveira Soares Malinowski; Carlos Eduardo Malinowiski.

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A CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS NO ÂMBITO DOS

JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS

Manuella de Oliveira Soares Malinowski (mestranda em processo civil e cidadania da Unipar, professora da Universidade Estadual do Mato Grosso

do Sul, advogada e juiza leiga); Carlos Eduardo Malinowski (mestrando em processo civil e cidadania da

Unipar, professor da Universidade Estadual do Mato Grosso do Sul e advogado).

RESUMO A Lei nº 9099/95 foi criada com objetivo maior de dar acesso à justiça à população carente. Com isso previu a possibilidade das partes fazerem uso do jus postulandi para causas até vinte salários mínimos e serem isentas de condenação em custas e honorários advocatícios em primeiro grau. A falta de condenação em honorários advocatícios desestimula a contratação de advogado no âmbito dos juizados especiais. Nesse diapasão, o objetivo desse trabalho é demonstrar que o ideal é que se faça uma reforma legislativa urgente na Lei nº 9099/95, ou, no mínimo, que se fixe uma indenização aos advogados, pago pela parte sucumbente, a fim de que sejam remunerados pelo trabalho desempenhado. Palavras-chave: Advogado. Honorários sucumbenciais. Indenização. ABSTRACT Law No. 9099/95 was created with the larger goal of providing access to justice to the poor. With that foresaw the possibility of the parties to make use of jus postulandi causes for up to twenty minimum wages and be free of condemnation in costs and attorneys' fees in the first degree. The lack of conviction in legal fees discourages hiring a lawyer under the special courts. In this vein, the aim of this paper is to show that the ideal is to make legislative reform urgent in Law No. 9099/95, or at least that is secure compensation for lawyers, paid by the loser party, so they are paid for work performed. Key-words: Advocate. Fees sucumbenciais. Indemnification.

1. Introdução

Em busca de atender ao princípio constitucional do acesso à justiça,

plasmado no art. 5º, XXXV da Carta Maior, a Lei n. 9099/95 criou os Juizados

Especiais Cíveis, com o fito de atender a demanda social pelo ingresso no judiciário.

Os Juizados Especiais Cíveis foram criados pela Lei n. 9099/95, atendendo

ao fundamento básico do princípio constitucional do acesso à justiça (CF, art. 5º,

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XXXV), que é preocupação constante da sociedade que busca de forma contínua o

ingresso nos tribunais.

Para facilitar o acesso à justiça, o legislador decidiu por orientar os Juizados

Especiais pelos princípios da oralidade, da simplicidade, da informalidade, da

economia processual e da celeridade, buscando sempre promover a conciliação.

Neste diapasão, afim de que fosse facilitado o acesso à Justiça de pessoas

mais carentes, a Lei dos Juizados Especiais confere, dentre outros, o direito à

própria parte de postular em juízo, ou seja, dispensa a presença de advogado nas

causas cujo valor não exceda vinte vezes o salário mínimo, sendo a atuação do

profissional apenas obrigatória nas causas entre vinte e quarenta salários mínimos.

No escopo de se atingir a classe mais humilde da população, cuja

hipossuficiência econômica é presumida, a Lei nº 9099/95 previu em seu artigo 55

que, em regra, a sentença de primeiro grau não condenará o vencido em custas e

honorários de advogado. Tudo para o fim de facilitar o acesso à justiça.

Todavia, o que se percebe, quase vinte anos depois da publicação da Lei, é

que o instrumento que foi criado para facilitar este acesso à justiça dos

economicamente carentes não atinge seu objetivo, já que a realidade mostra que na

maioria das vezes o postulante de um direito deixa de contratar um advogado

porque terá que arcar com o pagamento dos honorários sozinhos, já que a parte

sucumbente não arcará com nada. Ademais, como os valores das demandas são

baixos, embora a complexidade dos assuntos tenha sido cada vez maior, é comum

que não se encontre profissionais dispostos a abraçar as causas que tramitam no

âmbito dos Juizados Especiais, uma vez que julgada procedente a ação, seus

honorários (contratuais) serão de pequena monta.

Além disso, a Lei nº 9099/95obrigou que a parte fosse assistida por um

advogado nas causas cujo valor supera 20 salários mínimos. Porém, mesmo nessas

situações, não previu a condenação em honorários pela parte sucumbente em

primeiro grau.

Nesse contexto o presente trabalho demonstrará a importância do

arbitramento de honorários advocatícios no âmbito dos Juizados Especiais, até

porque se assim não for feito, permanece a afronta constitucional.

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2. O advogado na Constituição Federal

Principalmente após o advento da Constituição Federal de 1988, o Poder

Judiciário passou a participar mais ativamente no processo democrático,

demonstrando preocupação com a vontade popular de ter uma justiça célere e

distributiva.

Neste desígnio, não há duvida de que o advogado tem papel importantíssimo

e indispensável para a efetivação do princípio do acesso à justiça, que não implica

apenas em possibilitar a um maior número de pessoas demandar em juízo. A

garantia constitucional do acesso à justiça (CF, art. 5º, XXXV) apresenta-se de forma

ampla, desdobrando-se numa série de outras garantias, para o fim de culminar em

uma solução justa do conflito introduzido no âmbito do Poder Judiciário.

A Constituição Federal trouxe disposto no art.133 que o advogado é

indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e

manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei.

Refletindo acerca das funções do advogado, Frigini (1995, p.132) declara:

No entanto, a função do advogado vai mais além do exercício dojus postulandi, isto porque incumbe-lhe também colaborar para que a

Justiça se efetive,independentemente de estar deste ou daquele lado da lide. Neste caso, estar defendendo a posição de seu constituinte; naquele, coloca-se como figura de apoio, elemento de pacificação social, prestando especial serviço público.

No mesmo sentido é o posicionamento de Gonçalves (2010, p. 25),

defendendo que o exercício da advocacia deve ser considerado como uma missão

constitucional, exercida perante o Poder Judiciário e em nome dos cidadãos, além

de almejar o desempenho de função social. Isto impede o enclausuramento na

busca de interesses privados, fomentando a realização da Justiça e da paz social,

finalidade que deve ser a última de todo processo litigioso.

O Estatuto da Advocacia, Lei n.8.906/1994, regulamenta a profissão da

advocacia em todo território nacional, dispondo sobre as garantias do exercício da

profissão, restrições legais, direitos do advogado, etc. O artigo 2º do referido

Estatuto repete o princípio constitucional que o advogado é indispensável à

administração da justiça.

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Assim, neste sentido, a possibilidade da utilização do jus postulandi nas

causas menores de vinte salários mínimos no âmbito dos Juizados Especiais é um

atentado à busca do acesso efetivo à justiça, ainda que facilite o acesso ao

judiciário.

O processo é uma unidade complexa de caráter técnico e de difícil domínio,

daí por que o seu trato é reservado, via de regra, a profissionais que tenham

conhecimentos especializados e estejam em condições de praticar os atos múltiplos

que ocorrem durante o seu desenvolvimento. A redação de petições, a inquirição de

testemunhas, a elaboração de defesas, o despacho com o juiz e o modo de

colocações dos problemas exigem pessoa habilitada, sem o que muitas seriam as

dificuldades a advir, perturbando o seu normal andamento (NASCIMENTO, 2010,

p.516).

Em função de sua complexidade, o processo exige conhecimento técnico e é

de difícil domínio, o que torna quase impossível competir em pé de igualdade uma

parte que ingressa sem assistência de advogado com a parte que contratou o

profissional.

Não há dúvida de que a presença do advogado é indispensável. Ele é quem

facilita a exata formação do contraditório, contribuindo para a melhor ordem e

celeridade, sem riscos de ver perecer direitos sagrados, por insuficiência de

conhecimentos técnico-processuais.

Contudo, nada adiantará que, em teoria, o direito de ação esteja assegurado a todos e os processos se desenvolvam até mesmo com rapidez, se disso não se puderem valer efetivamente todos os interessados. Sob esse anulo avulta o problema da participação de técnicos na condução do processo. Desde que essa é uma exigência indeclinável de sua realização, pois não está ao alcance de leigos conduzi-lo, forçoso é convir que a assistência desses especialistas- os advogados- não pode ser privilegio; há de estará disposição de todos quantos deles necessitem. (RODRIGUES, 1994, p.40)

Do mesmo modo, quando a Lei nº 9099/95 obriga as partes nas causas com

valores superiores a vinte salários mínimos a contratarem um advogado e não faz

previsãode condenação de honorários à parte sucumbente, também fere princípios

constitucionais.

Tem-se percebido que a falta de acompanhamento por um advogado nas

causas menores de vinte salários mínimos tem ocasionado prejuízo para a parte,

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pois como leiga não consegue satisfazer as necessidades técnicas do processo,

principalmente se no lado oposto estiver umprofissional capacitado.

Neste sentido, Giglio (2007, p.121) afirma que não há duvidas de quea

intervenção• de advogado é proveitosa para melhor ordenação e celeridade dos

processos, contribuindo para a busca da efetividade processual.

Assim, o amplo acesso à justiça está atrelado ao acompanhamento da parte

por um profissional habilitado, o qual deve receber honorário como pagamento da

sua prestação serviço.

3. A importância do advogado no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis

A Constituição Federal de 1988, no seu artigo 5º, estabelece que todos são

iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, tendo esse preceito caráter

meramente formal.

Na seara processual o princípio da igualdade considera que todas as partes

devem ter o mesmo tratamento, independentemente das condições fáticas, sem

levar em consideração suas características individuais.

Todavia, sabe-se que efetivamente as partes, em muitos casos não são iguais

e, por isso, não merecem tratamento igual. No âmbito dos juizados especiais isso é

ainda mais evidente.

O processo com seus inúmeros atos e regras não é um jogo em que quem

souber manejar de forma eficiente as regras será o vencedor, e sim um instrumento

de justiça e de preservação dos valores protegidos constitucionalmente. Quando o

desenvolvimento do processo não tiver respeitado todos os escopos da jurisdição a

decisão final será injusta e inconstitucional.

O problema é que nos juizados a desigualdade das partes é evidente na

maioria dos casos. Desigualdade econômica, cultural e social.

A maioria das ações que tramitam nos Juizados é composta, de um lado, de

pessoa simples, hipossuficientes, e de outro, grandes empresas ou grupos

econômicos ou ainda, no âmbito dos juizados federais, o Estado.

O Estado e as empresas podem suportar as delongas dos litígios, já que não

necessitam de dinheiro. Ademais, podem fazer gastos maiores, o que os ajuda na

apresentação de argumentos mais eficazes.

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O efetivo acesso à justiça, como ordem jurídica justa, é um direito

fundamental de todos, por isso a aplicação do princípio da igualdade deve dar

condições iguais a todos na fruição dos direitos fundamentais.

A própria falta de recursos para contratação de um advogado atrapalha no

acesso à justiça. A falta de qualificação técnica não efetiva princípios constitucionais,

o que mais adiante será discutido.

Além disso, temos os litigantes “eventuais” e os “habituais”, como defende

Cappellletti (1988, p. 25 e 26). Os habituais seriam aqueles que sempre estão em

juízo e por isso são bem mais preparados que aqueles que raramente litigam. Os

“habituais” têm maior experiência com o direito, o que lhes permite melhor

planejamento da demanda; têm mais oportunidade de desenvolver relações

informais com juízes de todas as instâncias; diluem os riscos da demanda por maior

número de casos e ainda podem testar várias estratégias frente ao grande número

de casos.

Marinoni (1993, p.73) ressalta que “os mais humildes sempre temem

represálias quando pensam em recorrer à justiça. Temem sanções até mesmo da

parte adversária”.

A Lei nº 9099/95 em seu artigo 9º traz que nas causas de valor até vinte

salários mínimos, as partes comparecerão pessoalmente, podendo ser assistidas

por advogado; nas de valor superior, a assistência é obrigatória.

A Lei 10.259/01 (âmbito federal), em seu art. 10 seguiu a mesma proposta da

Lei 9.099/95, facultando a contratação de advogados: as partes poderão designar,

por escrito, representantes para a causa, advogado ou não.

O que se percebe é que em muitas situações as pessoas se iludem com o

fato de poderem pleitear seus direitos sem estarem assistidas por um advogado.

Chegam despreparadas na secretaria do Juizado, são atendidas por pessoas que

também não têm conhecimento técnico, como já abordado no item anterior, e vão

para a audiência sem nenhum preparo.

O primeiro desafio consiste na dificuldade de se reconhecer um direito

juridicamente exigível, problema altamente relevante para os mais necessitados. Tal

obstáculo não atinge apenas os mais pobres, incluindo até os membros da

sociedade bem informados. Falta à maioria da população conhecimento básico não

apenas para fazer objeção a negócios jurídicos que lhe sejam prejudiciais, mas até

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mesmo para perceber que tais negócios sejam passiveis de objeção (MIGUEL,

2005, p.63).

Durante as audiências, não é raro encontrar os conciliadores e juízes leigos

explicando para as partes o que elas devem fazer e o que significa cada ato

processual. Mas o questionamento é: como auxiliar uma parte sem prejudicar a

outra? O conciliador e o juiz leigo muitas vezes fazem o papel do advogado, que não

está presente no ato. Nesses casos, sempre estará se infringindo um princípio. O

princípio da imparcialidade é ferido quando a parte é orientada a fazer alguma coisa

que não sabia e que pode trazer consequências vantajosas para si na demanda.

Nesse momento o juiz leigo acaba “ajudando” a parte e prejudicando a outra, pois se

não tivesse repassado a informação, com certeza a outra teria vantagem.

Mas por outro lado, não seria injusto evitar este auxílio e não estaria sendo

negado o acesso à justiça àquela parte que compareceu sem advogado na

demanda e não possui conhecimentos técnicos para tanto, que será prejudicada por

isso?

O princípio da igualdade entre as partes também estaria ferido se o juiz

percebesse a desigualdade técnica das partes e nada fizesse para igualá-las,

ferindo a máxima de que as partes devem ser tratadas iguais na medida de suas

desigualdades.

A ofensa ao princípio do acesso à justiça como sinônimo de acesso a uma

ordem jurídica justa também seria lesado se fosse permitido às partes que litigassem

sozinhas e ao seu modo, pleiteando o que de direito, sem conhecimento técnico e

específico para tanto. A pergunta que deve ser feita é: será que a sentença seria a

resposta que as partes buscavam? Será que o Poder Judiciário prestou um serviço

adequado?

Portanto, quando uma parte comparece ao juizado desacompanhada de

advogado, vários princípios são feridos. Nesses casos, o acesso à justiça foi

alcançado? Qual deles deverá prevalecer?

As partes que postulam sem advogado têm dificuldade em relação ao direito

material e, principalmente em relação ao direito processual. Quando é dado prazo

para que as mesmas se manifestem, ou para apresentar a contestação, ou

embargos ou, ainda, impugnação a contestação, não sabem o que fazer. Se não

sabem o que é uma contestação, mais ainda não têm conhecimento do que vem a

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ser preliminar, mérito, julgamento com ou sem resolução de mérito, pedido

contraposto e por aí vai.

É intuitivo que, em um país pobre como o Brasil, pouca gente conhece seus

direitos, e menos ainda como exercê-los. A democratização da Justiça, na verdade,

deve passar pela democratização do ensino e da cultura, e mesmo pela

democratização da própria linguagem, como instrumento de intercâmbio de ideais e

informações (MARINONI, 1993, p.48).

Apenas advogados têm conhecimento técnico em relação ao direito material e

processual. Mesmo as pessoas mais capacitadas e com mais cultura têm dificuldade

em entender as normas jurídicas. As leis muitas vezes são efêmeras, distanciando

ainda mais os leigos da realidade jurídica.

Como as partes não têm conhecimento das leis, em sentido amplo,

nãoconseguem acessar a justiça, até porque não se pode acessar o que não se

conhece e nem se pede proteção sem a consciência de poder ser protegido

(FARINELLI, 2009, p. 93-95).

O que falta ao povo é educação, já que a mesma é essencial para formação

política e intelectual do cidadão, que conscientizado, luta por seus direitos.

A desinformação da massa da população acerca de seus direitos é um dos obstáculos judiciais importantes para acesso à justiça. E esse é um problema de educação. Por isso mesmo a democratização da justiça deve passar pela democratização do ensino e da cultura, e também pela democratização da linguagem, como instrumento de intercambio de ideias e informações. (ABREU, 2004, p. 60).

Outra situação, pior, é aquela que uma parte comparece com advogado e a

outra não. Nesse caso, a diferença é ainda mais gritante. A parte que é assessorada

por um advogado, sem duvida alguma, tem muito mais chance de ter seu pedido

acolhido.

O parágrafo 1º do artigo 9º da Lei nº 9099/95 apregoa que se uma das partes

comparecer assistida por advogado, ou se o réu for pessoa jurídica ou ainda firma

individual, terá a outra parte, se quiser, assistência judiciária prestada por órgão

instituído junto ao Juizado Especial, na forma da lei local.

Esse dispositivo comprova exatamente o que foi defendido, que não haverá

paridade de armas se somente uma das partes estiver acompanhada de advogado.

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Porém, embora a Lei tenha reconhecido a importância do advogado e de se

obedecer ao princípio da igualdade processual dos litigantes, colocou como sendo

facultativa a assistência de advogado pela parte que faz uso do jus postulandi.

Primeiro, a parte mais humilde e mais pobre, que não tem noção do quão faz

falta a assistência de um advogado, muitas vezes nega a assistência do profissional

por entender que tem capacidade de resolver sozinha o problema, ou por não ter

dinheiro para a contratação de um profissional, que provavelmente cobrará de

honorários quase o valor total da demanda.

Segundo, uma vez não tendo condições financeiras para a contratação de um

advogado, teria que ser assistida pela defensoria pública ou outro órgão que lhes

faça as vezes. Sabe-se queo atendimento da defensoria publica é insuficiente no

atendimento dos mais necessitados e que não há outros órgãos públicos que

prestam esse tipo de serviço.

Portanto, mesmo o legislador tendo consciência da falibilidade do jus

postulandi, não exigiu seu afastamento, ao menos quando as partes encontram-se

em pé de desigualdade.

No parágrafo 2º do mesmo artigo, confirma-se que conforme a complexidade

da causa fica quase impossível o acesso a uma ordem jurídica justa sem o

acompanhamento de advogado. A lei reza que o Juiz alertará as partes da

conveniência do patrocínio por advogado, quando a causa o recomendar. Portanto,

não há dúvidas de que a intervenção do advogado é proveitosa e essencial para a

busca da efetividade processual (GIGLIO, 2007, p. 121).

Nos Juizados Especiais Federais o problema é agravado. A ausência de

defesa técnica em causas previdenciárias, tributárias e contratuais, que são bem

mais complexas, é ainda mais prejudicial à parte que é presumivelmente

hipossuficiente e demanda sozinha.

Nas causas que são da competência da Justiça Federal, se de um lado está o

cidadão despreparado e sem conhecimento técnico nenhum, de outro há os

procuradores federais, que são absolutamente preparados, com alto grau de

instrução para esse tipo de demanda.

Em se tratando especialmente dos Juizados Especiais Federais, nas complexas lides previdenciárias e com mudanças legislativas recorrentes, não é possível admitir que o segurado não esteja acompanhado por um profissional. Não se trata de simplesmente

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colocar no papel (na forma de petição inicial) aquilo que o segurado está tentando nos dizer, pois muitas vezes ele nem sabe exatamente o que quer pedir. É o caso, por exemplo, de um segurado que está incapaz para o trabalho e busca no Juizado Especial Federal o reconhecimento do seu direito. Ocorre, entretanto, que ele perdeu a qualidade de segurado e voltou a contribuir após esse período. A data apurada pelo perito como de início da incapacidade foifixadanoperíodoemquenãohaviaqualidadede segurado. A legislação previdenciária teria vários caminhos para orientar o segurado e fazer o pedido do benefício: a) provar que antes de ter perdido a qualidade já havia incapacidade; ou b) provar que houve agravamento da doença ou da lesão após o reinício das contribuições; ou c) reaquisição da qualidade de segurado após o pagamento das contribuições mínimas da carência. Enfim, será que o serventuário da justiça, apesar de toda sua boa vontade, teria conhecimento técnico e específico para orientar o segurado e fazer os pedidos necessários para que o segurado pudesse alcançar a proteção social pretendida? E o pior é que o segurado, sem advogado, acaba produzindo coisa julgada e perde a única oportunidade de provar o alegado sob todos os meios em direito admitidos. E o prejuízo não acaba aí: os acordos propostos pelos INSS, na maioria das vezes, maldosos, cujos termos incluem, dentre outros, que a parte JAMAIS poderá fazer o mesmo pedido novamente, afrontam tudo que se pensa sobre justiça social. É um desrespeito, uma ilusão pensar que o segurado será beneficiado. Citemos, como exemplo, um segurado que busca o benefício por incapacidade, cujo laudo resultou em incapacidade temporária. Assim que o segurado assina o acordo, o INSS encaminha cartinha para que se submeta a uma nova perícia. E qual será o resultado da perícia? Capacidade laboral, óbvio! No mês seguinte o seguradotem a cessação do benefício. (DONOSO; SERAU JR, 2012, p.195).

A experiência desses anos de Juizados Especiais tem demonstrado que os

mesmos não estão sendo eficientes, principalmente quando a parte pleiteia seus

direitos sem a presença de um advogado.

A experiência tem demonstrado que as partes, muitas vezes, são

hipossuficientes a ponto de não conseguir sequer demonstrar o seu real desejo

quando procuram atendimento nos Juizados Especiais Federais. O funcionário da

Justiça Federal não é advogado, não pode dar orientação jurídica, de modo que,

nessas situações, o advogado se mostra indispensável até para a formulação do

pedido inicial, independentemente do valor da causa ser superior ou inferior a vinte

salários mínimos. Constatando-se a total impossibilidade de o interessado deduzir

seu pleito, deve ser encaminhado à Defensoria Pública da União, que lhe dará a

necessária assistência (SANTOS, 2007, p.56).

Assim, não como defender o acesso à justiça quando há desigualdade entre

as partes litigantes.

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4.Honorários advocatícios no âmbito dos Juizados Especiais

A Lei nº 9099/95 traz algumas incoerências no seu bojo. A princípio determina

no caput do artigo 9º que não é necessário a presença de advogado nas causas até

vinte salários mínimos, sendo que nas de valor superior, a assistência é obrigatória.

Por outro lado, no parágrafo 1º do mesmo artigo, deixa como facultativa a

assistência do advogado, nas causas até vinte salários mínimos, mesmo que a outra

parte compareça acompanhada pelo profissional. Por fim, o artigo, no parágrafo 2º,

permite ao juiz alertar às partes da conveniência do patrocínio por advogado,

quando a causa o recomendar.

Ainda, se não bastasse, determina a participação obrigatória do advogado,

em causas de qualquer valor, em casos de recurso para turma recursal (artigo 41,

§2º).

Porém, mesmo frente a esses artigos, o artigo 55 não previu a condenação de

honorários advocatícios à parte sucumbente em primeiro grau, embora tenha

previsto em grau de recurso.

No mínimo incongruentes as determinações da Lei. Se o objetivo da Lei é dar

acesso à Justiça facilitando às pessoas carentes o acesso ao judiciário, com a

garantia de um processo barato, não é justificável que fique a cargo da parte o uso

ou não do advogado em algumas ações; que se exija o procurador em causas com

valores maiores de vinte salários mínimos e em sede recursal, e que só faça

previsão de pagamento de honorários em segundo grau.

A respeito do pagamento de honorários advocatícios aos advogados,

Gonçalves (2010, p. 40) alerta que a profissão de advogado começou a aflorar

somente após três séculos da fundação de Roma, lembrado que nessa época não

havia remuneração alguma para o advogado, visto que a advocacia era considerada

um múnus público, já que quem dela se utilizava era pelo gosto à oratória.

A compensação patrimonial pelo trabalho desenvolvido apareceu somente

com Deocleciano, sendo que as medidas que condenava a parte sucumbente ao

pagamento de honorários tinha, no direito romano, o caráter de pena. No mesmo

sentido foi a Constituição de Zenão, em 487.

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Entretanto, o caráter de pena da sucumbência foi abolido por meio do

princípio do ressarcimento do prejuízo do vencedor (Adolfo Weber) que

fundamentou este princípio através da culpa aquiliana no direito Romano e da

equidade, segundo Gonçalves (2010, p. 45).

No Brasil, a primeira lei que tratou das sucumbências foi a Lei n. 4.632/1965,

que alterou a redação do art. 64 do CPC de 1939. Atualmente, a Lei n. 8.906/1994

traz explicitamente o direito dos advogados em receber seus honorários, sejamos

convencionais, os fixados por arbitramento judicial e os sucumbenciais.

Destarte, tem-se que os honorários advocatícios são uma contraprestação

econômica devida aos advogados pelos serviços técnicos por eles prestados, tendo

nítido caráter alimentar.

Há dois tipos de honorários advocatícios: aqueles decorrentes de contratação

entre o advogado e o cliente para remunerar determinado serviço profissional; e

aqueles fixados pelo juiz, na sentença, decorrente da atividade desenvolvida pelo

advogado no processo. No primeiro, o valor é fixado com base na tabela de

honorários da Ordem dos Advogados do Brasil, e no segundo com fulcro no artigo

20 do CPC, que leva em consideração, entre outros parâmetros, o trabalho realizado

pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.

Em ambos os casos, a Lei nº 9099/95 acaba por tolher o direito constitucional

do advogado de ser remunerado pelo serviço desempenhado. No primeiro caso, que

está relacionado com os honorários contratados entre cliente e advogado, a Lei n.

9099/95 vai contra a administração da justiça porque, ao fixar às causas de pequeno

valor a permissão do jus postulandi pela parte, desestimula a contratação de

advogado.

No segundo caso, porque a lei prevê a condenação dos honorários

advocatícios apenas em sede recursal, mesmo nas causas em que a presença do

profissional é obrigatória em primeiro grau.

Nesse contexto, observa-se que os Juizados Especiais Cíveis tornaram-se

um importante instrumento de acesso à justiça, permitindo que pessoas de menor

poder aquisitivo pudessem buscar a solução para os seus conflitos do cotidiano que,

anteriormente, não costumavam ser apreciados pela Justiça brasileira devido à

dificuldade do cidadão comum em contratar um advogado para postular em seu

favor.

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Por outro lado, prejudicou muito no sentido de não entender que o acesso à

justiça não se limita ao ingresso da ação, mas também ao desenvolvimento de uma

demanda onde se respeitam todos os princípios constitucionais, bem como onde se

tem o assessoramento de um profissional técnico capaz e habilitado para a tarefa.

Nesse contexto, uma vez a lei não prevendo o pagamento de honorários

advocatícios sucumbenciais, prejudica a parte em relação à contratação de um

advogado.

A lei errou duas vezes: primeiro, porque não exigiu a presença de um

advogado em todos os tipos de demandas iniciadas no âmbito dos Juizados

Especiais; segundo, porque mesmo nos casos em que a contratação é obrigatória,

não fez previsão de condenação de honorários sucumbenciais.

Em ambas as situações, há uma afronta direta e literal à Constituição Federal.

5. Solução imediata para falta de previsão de pagamento de honorários

advocatícios sucumbenciais

Como a Lei Federal n. 9099/95 que deu origem aos Juizados não fez previsão

de condenação de honorários sucumbenciais àquelas partes que se utilizam de

profissional habilitado no decorrer da demanda, a mesma deve ser revista, por ferir

diretamente a Constituição Federal.

O melhor e mais adequado seria que fosse realizada uma reforma na

legislação, a fim de que o artigo 55 da Lei passe a determinar condenação em

honorários advocatícios quando a parte fizesse uso de um profissional. Tal alteração

garantiria, conforme já supra exposto, de fato o acesso à justiça como ordem jurídica

justa, fazendo com que a lei realmente atingisse sua finalidade social.

Todavia, como se sabe que o processo legislativo em nosso país é um pouco

truncado e, para não dizer, lento, há que se pensar numa solução prática urgente

para a resolução do problema.

Nesse patamar, a solução que deve ser aplicada de imediato é a condenação

da parte sucumbente em perdas e danos, para que a parte vencedora seja

ressarcida dos gastos que sofreu pela contratação do advogado. A parte sempre

tem que ter assegurado o direito da contratação de um advogado, até porque, como

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já dito, o acesso à justiça compreende o direito da ampla defesa, consagrado

constitucionalmente, o que sem profissional técnico habilitado fica difícil.

Nessa seara, o novo Código Civil de 2002 trouxe inovações ao ordenamento

jurídico no que tange a recomposição de perdas e danos nas obrigações

pecuniárias, consagrando em seus arts. 389 e 404 - que tratam do princípio da

restituição integral - como forma de preservação do crédito inadimplido. Assim, para

que a parte faça jus a uma completa reparação, o valor gasto na contratação de seu

advogado deve fazer parte da recomposição das perdas e danos.

Na justiça do trabalho, onde também não há previsão de condenação de

honorários sucumbenciais, os artigos 389 e 404 do Código Civil vêm sendo aplicado

como forma de reparação total ao prejuízo sofrido pela parte.

Neste sentido:

VÍNCULODEEMPREGODECLARADOEMJUÍZO– CABIMENTODA MULTADO ART.477-CLT – A controvérsia em torno do liame empregatício não afasta o direito do obreiro à multa prevista no artigo 477, parágrafo 8, da CLT em valor equivalente ao salário, ausente qualquer restrição à penalidade atrelada ao reconhecimento judicial do vínculo de emprego. Aplicável, ainda, o art. 389 do novo código civil: não cumprida à obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado, assegurando, da forma mais ampla possível, a reparação. E para que se faça jus a uma completa reparação, a prática trabalhista esta incluindo além de outras parcelas, os honorários de advogado.1

Com isso, pode-se entender, e também com base em Gonçalves (2010, p.

53), que a partir do momento em que para melhor defender seus interesses a parte

contrata um advogado, profissional de sua confiança, deve ser ressarcida pela outra

parte que deu causa a essa contratação, pagando, portanto, os honorários de seu

advogado.

Dallegrave Neto (2007, p. 128.) sustenta que “os honorários advocatícios

impostos pelo novo Código Civil não estão relacionados com a mera sucumbência

processual (CPC, art.20, § 3º), mas como princípio da reparação integral do dano

(art. 944donovo CCB)”.

1BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região. – Proc. 13322-2001-015-09-00-8 – (27793-2003) – Rel.

Juiz Luiz Eduardo Gunther – DJPR 05.12.2003. grifado.

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Portanto, devem ser aplicados os artigos 389 e 404 do Código Civil, onde há

previsão de pagamento de honorários advocatícios na reparação dos danos.

Para ilustrar, mutatis mutandis, segue posicionamento do juiz do trabalho

Souto Maior (2003, p.9):

O novo Código não se limita a fixar que descumprimento da obrigação sujeita o inadimplente ao pagamento de perdas e danos, que eram, na sistemática do antigo Código, nas obrigações de pagamento em dinheiro, limitados aos juros de mora e custas (arts.1.056e1.061, do antigo Código). O novo Código é bem mais severo com o devedor inadimplente e nos termos do art. 389, o devedor que não cumpre a obrigação de pagar, no prazo devido, responde por perdas e danos, mais juros, atualização monetária e honorários advocatícios. Este dispositivo enfraquece ainda mais o entendimento que não considerava devidos os honorários advocatícios no processo do trabalho. Ora, como se vê do novo texto legal, os honorários não decorrem simplesmente da sucumbência no processo, mas do próprio inadimplemento da obrigação (art.389, do novo Código Civil). Bem possível que se venha dizer que este dispositivo não se aplica ao direito do trabalho, mas este entendimento simplório e equivocado, data venia, somente servirá

para criar uma situação incoerente e esdrúxula no ordenamento jurídico, visto como um todo. Afinal, não se pode esquecer que o direito do trabalho, embora ramo específico do conhecimento jurídico, integra-se a um ordenamento que, no todo, regula o conjunto das relações jurídicas que se perfazem na sociedade. A incoerência que se criaria com tal entendimento, consiste em que do ordenamento jurídico, aplicado como um todo se extrairiam duas conclusões contraditórias: a primeira, já consagrada, no sentido de que o crédito trabalhista é um crédito privilegiado, tendo preferência sobre qualquer outro; a segunda, de que o inadimplemento de uma obrigação de pagar um crédito quirografário imporiaaodevedorjuros, correção monetária e honorária advocatícia, enquanto que o inadimplemento de dívida trabalhista resultaria ao inadimplente uma obrigação adicional restrita a juros e correção monetária. Desse modo, um trabalhador que não recebesse seus direitos não teria direito às perdas e danos de forma integral, mas, sepor conta de não ter recebido seus direitos descumprisse alguma obrigação de natureza civil, arcaria com as perdas e danos, integralmente. Evidente que esta „lógica‟ não pode ser construída dentro de um sistema que se pretende, senão justa, pelo menos coerente. Reforce-se este argumento com a observação de que as perdas e danos nos termos do art. 404, em casos de obrigações de pagar em dinheiro (caso mais comum na realidade trabalhista) abrangem atualização monetária, juros, custas e honorários, sem prejuízo de pena convencional que se não houver e não sendo os juros suficientes para suprir o prejuízo dão margem ao juiz para conceder indenização suplementar.”

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Portanto, até que a Lei n. 9099/95 seja reformada, os juízes atuantes no

âmbito dos Juizados Especiais Cíveis devem aplicar, subsidiariamente, os artigos

389 e 404 do Código Civil, já que a parte sucumbente deve indenizar a parte

vencedora dos danos que a mesma sofreu, no que estão incluídos os honorários

pagos ao advogado.

Além disso, pode-se dizer que uma vez o vencido não pagando os honorários

que são devidos (ou ao menos deveriam ser, por ordem dos princípios

constitucionais da ampla defesa, acesso à justiça e de que o advogado é essencial à

administração da justiça), o mesmo sofrerá um enriquecimento sem causa, já que o

vencedor terá que arcar sozinho com as despesas junto ao seu advogado, o que

coaduna com o pensamento de Figueira (2009, p.78). O mesmo autor defende que

“a não fixação dos honorários representa uma diminuição do próprio direito da parte

vencedora reconhecida pela justiça e uma ofensa ao direito da isonomia previsto da

Constituição Federal, pois ao vencedor e vencido é conferido o mesmo tratamento”.

Portanto, a condenação do vencido a uma reparação de danos ao vencedor

para que esse arque com o custo da contratação de seu advogado, vai ao encontro

com os objetivos da Lei, que é dar à classe mais carente o acesso à justiça digno,

respeitando toda a ordem constitucional.

6. Conclusão

Fazendo uma análise da Lei nº 9099/95, chega-se à conclusão que

infelizmente a mesma não tem atingido os objetivos almejados pelo legislador, que

era, principalmente, garantir o acesso à justiça para a população mais necessitada.

Com as incoerências previstas na Lei, não compensa à parte a contratação

de um advogado para lhe orientar no deslinde da causa, garantindo realmente o

acesso a uma ordem jurídica justa, que respeita os princípios da ampla defesa, da

isonomia das partes e da dignidade da pessoa humana.

Quando a Lei nega o pagamento de honorários sucumbenciais à parte

vencedora, desestimula a contratação do profissional para as causas de valor até

vinte salários mínimos; desanima o trabalho do advogado e, por fim, ainda trata

ambas as partes, vencidos e vencedores, de maneira igualitária, o que ofende o

princípio da isonomia das partes.

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Sem um profissional habilitado, não há que se falar em acesso à justiça.

A necessidade de uma reforma na lei é urgente para o fim de, primeiro,

afastar o jus postulandi na seara dos Juizados Especiais; e segundo, para

determinar a condenação de honorários sucumbenciais ao vencido.

Todavia, frente ao moroso processo legislativo que há no país, uma saída

imediata, ao menos para a questão dos honorários sucumbenciais, é a condenação

da parte vencida, pelo juiz, em uma reparação civil, com base nos artigos 389 e 404

do Código Civil, que compense os prejuízos causados pelo sucumbente.

Se assim não for entendido, a cada dia que passar os Juizados Especiais

estarão mais desacreditados pela sociedade, já que cada vez mais não cumprem

com a função social para que foram criados.

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