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XXXIX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – São Paulo - SP – 05 a 09/09/2016
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A Constituição do Acontecimento na Sociedade do Espetáculo1
Nívia Rodrigues PEREIRA2
Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas)
Resumo
Neste estudo, objetiva-se aprofundar as pesquisas no campo da comunicação e do
jornalismo averiguando algumas estratégias de produção de sentido na sociedade do
espetáculo. Essa discussão busca compreender, de forma mais ampliada, os caminhos e
metodologias dos critérios de notícia para a imprensa online no âmbito comunicacional
problematizando acontecimento, midiatização e produção de sentido. Como corpus foi
analisada a matéria “Cadeirante fez 28 cursos a distância e hoje acumula dois empregos” e a
foto correspondente, ambas integrantes do álbum de fotos “Conheça histórias de sucesso na
educação”3, presente na editoria UOL Educação. Busca-se discutir o papel da internet na
sociedade do espetáculo e, nesse contexto, o uso da imagem e do texto para a construção de
sentido tendo como objeto uma matéria jornalística.
Palavras-chave
Palavras-Chave: jornalismo; produção de sentido; mediação; internet; sociedade do
espetáculo.
1. Introdução
A escolha dos temas abordados pela imprensa implica em vários fatores de interesse pela
notícia, e isto vai além da simples relevância no mundo social. A legitimação dada a um
fato graças à abordagem da mídia provoca reflexões sobre o fazer jornalístico e sobre os
processos de significação do que é noticiado e construído, entre outros fatores, pelo uso do
discurso e das ferramentas comunicacionais.
1 Trabalho apresentado no GP Gêneros Jornalísticos, XVI Encontro dos Grupos de Pesquisas em Comunicação,
evento componente do XXXIX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação. 2 Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social Interações Midiáticas da PUC
Minas. E-mail: [email protected]
3 http://educacao.uol.com.br/album/2012/04/23/conheca-historias-de-gente-que-se-superou.htm
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A espetacularização da sociedade, a necessidade do urgente, a mediação dos meios de
comunicação, a relação espaço-temporal são alguns dos fatores que contribuem para
promover a visibilidade / invisibilidade do acontecimento na vida cotidiana. A partir dessas
premissas, a informação ganha contornos específicos ao se considerar o uso das tecnologias
digitais que potencializam, por exemplo, características já presentes em outros ambientes de
leitura, como a leitura em papel, dando outra dinâmica ao encadeamento das informações.
O tempo “real”, a descentralização dos discursos, a não linearidade, a quebra de territórios e
fronteiras físicas são inerentes a esse ambiente.
Faz-se necessário entender como a informação´, por meio da notícia, é produzida e recebida
pelos sujeitos. Na sociedade do espetáculo, a presentificação, o positivismo, a disseminação
do discurso dominante, a busca pelo fetiche promovem a alienação do sujeito,
impossibilitando que ele extrapole o que é visível e pense criticamente sobre a sociedade
em que está inserido. Considerando o papel central que a mídia detém na sociedade
contemporânea, busca-se problematizar os critérios de noticiabilidade que regem o gênero
notícia no jornalismo da internet e o papel desses veículos de comunicação na produção de
sentido construída nesse contexto mediado.
Este artigo, apresentado ao Grupo de Pesquisa de Gêneros Jornalísticos, busca discutir o
enquadramento jornalístico na contemporaneidade e levantar hipóteses sobre o papel
desenvolvido na esfera discursiva para a construção da realidade dos sujeitos envolvidos. O
ponto de partida é a análise da notícia produzida na internet como gênero jornalístico e o
uso da linguagem verbal e não-verbal como recurso discursivo. No caso do corpus
analisado, busca-se verificar como a mídia, por meio da notícia, enquadra os sujeitos
retratados nas matérias como casos indicadores de sucesso.
2. Referencial teórico
2.1 A sociedade do espetáculo
O período pós-guerras foi marcado por um olhar crítico e pessimista sob as relações
humanas. A importância da propaganda e da imagem para o nazismo e o avanço e a
dependência do capitalismo contribuíram para o advento de uma sociedade voltada para o
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entretenimento e a aparência. Debord (2006) e outros autores, seguindo uma corrente mais
voltada para o marxismo, problematizaram-na como sendo a sociedade da espetacularização
e da representação. Para o autor, “o espetáculo não é um conjunto de imagens, mas uma
relação social entre pessoas, mediada por imagens” (DEBORD, 2006: 14).
Graças ao poder dos meios de comunicação estabeleceu-se de forma crescente a
disseminação de um produto de consumo cujas imagens intervêm e interferem nas relações,
tornando-as parte preponderante e decisiva na produção de sentidos. O conteúdo já é
produzido tendo como base uma representação de mundo recortada, com os papéis
preestabelecidos para a manutenção de uma dimensão simbólica que privilegia a estética e a
superficialidade.
Como parte da ordem do sensível, a espetacularização é oferecida aos sujeitos, que a
consomem devido à dificuldade de selecionar o que vai ser visto, seja pela imposição, seja
pelo excesso de imagens. O reflexo dessa recepção sem questionamentos equivale ao “sol
que nunca se põe” (DEBORD, 2006: 17) no império britânico: aonde quer que se olhe,
haverá aceitação e passividade frente ao “império” das imagens. Nesse cenário, a imagem
representa a mercadoria por excelência (NOVAES, 2005: 10), que molda o sujeito frente ao
cenário de alienação e vulnerabilidade e, ao mesmo tempo, é moldada e construída por ele.
Ao se apropriar da imagem, o sujeito teria a possibilidade de resignificá-la de forma crítica,
trazendo o conhecimento daquilo que não estaria sob a ótica da sociedade, mas não é o que
acontece. O torpor causado pelo excesso contribui para que se atinja a intencionalidade da
cegueira e da alienação. As imagens midiatizadas, por exemplo, que para muitos
representariam uma prova inconteste do real, apresentam-se como elementos que reforçam
esse estado de hipnose.
Esse ambiente é percebido em várias situações. A comunicação praticada nas organizações,
por exemplo, faz uso de veículos institucionais visando contribuir para a redução desse
distanciamento, porém continua a direcionar o olhar e a produção de sentido nos processos
comunicacionais. Nas relações de trabalho, a pretensa liberdade que permitiria aos sujeitos
“poder fazer” (DEBORD, 2006: 20) revela-se, na verdade, um falso ordenamento pela
impossibilidade de execução. O distanciamento entre o trabalhador e o produto nas linhas
de produção ocasionaram um esvaziamento nas relações sociais no trabalho.
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Por seu turno, o estatuto da fotográfica, da pintura, da escultura e de outros artefatos
imagéticos é o estatuto da presentificação e da representação. A ilusão provocada pelas
imagens leva à crença de que elas são a coisa representada ao trazer o ausente,
supostamente, para o presente. As raízes das teorias da imagem trazem conceitos que
reforçam esse olhar: mímesis, da filosofia grega (remete à imitação e cópia); do cristianismo
eikon (semelhança), eidos (forma) e eidolon (fórmula), são alguns exemplos.
Percebe-se, ao fazer um apanhado histórico, a relação direta do poder das imagens com o
sagrado, seja no cristianismo, seja nas manifestações de outras crenças. A imagem religiosa
representa o divino e a veneração a ele e, dessa forma, “o ser sagrado é o ser proibido que
não pode ser violado, do qual não ousamos nos aproximar, porque ele não pode ser tocado”
(RODRIGUES, 1979: 25). Na sociedade do espetáculo, o culto passa a ser substituído pela
exposição massiva, que pode ser entendida como uma profanação ou como algo que foi
violado. “E se consagrar (sacrare) era o termo que designava a saída das coisas da esfera do
humano, profanar significa ao contrário restituir ao livre uso dos homens” (AGAMBEN,
2005: 14). Para Benjamin (1955), a reprodução em larga escala da imagem, por meio da
rapidez da reprodutibilidade técnica, trouxe e a perda da singularidade e da aura que a
tornava única libertando-a do domínio da tradição e transpondo-a da ocorrência única para a
ocorrência em massa.
Segundo Wolff (2005), são quatro os principais defeitos do objetivo imagético: ignora o
conceito, na medida em que é irracional ao não explicar o contexto situacional; mostra
apenas pela afirmação, já que mostra o que é e carece da negação; só conhece o indicativo,
desconsiderando o subjuntivo e o condicional; e pressentifica o fato, ao excluir o pretérito e
o futuro.
2.2 O papel da internet na sociedade do espetáculo
Com as tecnologias informáticas, a transmissão de informações através dos meios de
comunicação ganhou novas peculiaridades. A internet apresenta-se como uma mídia com
potencial de maior agregação e interação com outros meios e entre os sujeitos que a
utilizam. Essas facilidades de associação constituem importantes ferramentas de
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globalização em que troca, mistura, apropriação e contaminação de elementos das mais
diferentes esferas estão presentes. As antigas ágoras, espaço de trocas, discussão e
circulação de saberes, foram substituídas pelos encontros mediados pelo virtual.
A conexão em rede amplifica esse processo de interação das ações informacionais graças,
entre outros, a uma importante peculiaridade da internet, que é o hipertexto: uma série de
nós em que cada nó traz consigo uma infinita possibilidade de conexões. As informações
não estão ligadas de forma linear e, por isso, não seguem uma regra, podendo ligar
diferentes dados em diferentes mídias.
“A linguagem do hipertexto tornou-se o espaço discursivo
capaz de elaborar diretrizes orientadoras para o processo da
comunicação global ou contemporâneo. Essa linguagem
articula tanto o mundo simbólico como a dinâmica complexa
e plural do mundo contemporâneo.” (NOJOSA,2014. p. 77)
O excesso de recursos e possibilidades pode, muitas vezes, confundir o sujeito devido ao
grande número de informações intrincadas e não hierarquizadas. É o que Marcuschi chama
de “stress cognitivo”: “(...) uma leitura proveitosa do hipertexto exige um maior grau de
conhecimentos prévios e maior consciência do que é buscado, já que é um convite a
escolhas muitas vezes inconsequentes” (MARCUSCHI, p. 01). Esse leitor melhor
preparado utiliza o link de forma a direcionar o olhar e ampliar o entendimento do texto
sem se “perder” no espaço virtual, permitindo a ele reorientar o sentido original, aderir ou
rejeitar o que acessa de forma consciente.
Na sociedade do espetáculo, o real e o agora dão lugar a um mundo visto pela ótica do
imaginário e do direcionamento de olhar, conduzido pelas imagens. O que, numa visão
superficial, une os sujeitos na virtualidade, na realidade os afasta, pois não permite o acesso
e o contato fora desse ambiente.
A necessidade do consumo “aqui e agora” contribui também para a não contestação do
conteúdo midiático sendo que a distração imediata é o objetivo almejado. Nessa nova
ordem, o “ser” teve seu lugar tomado pelo “ter”, verbo esse que vem sendo superado pelo
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“parecer” (DEBORD, 2006: 18). Um exemplo é a valorização das redes sociais digitais e a
vida perfeita apresentada nas imagens publicadas pelos seus usuários. Parecer belo, parecer
feliz, parecer inteligente, parecer engajado, virou moeda de troca materializada por meio de
likes, que aumentam o capital social do sujeito na sua rede de relações.
2.2 Acontecimento jornalístico
“Notícia” relaciona-se à informação, resumo, novidade, lembrança, memória,
acontecimento, interesse púbico. A notícia pode ser compreendida como “um conjunto de
informações que se relaciona em um mesmo espaço temático, tendo um caráter de
novidade, proveniente de uma fonte e podendo ser diversamente tratado” (CHARADEAU,
2006, p. 132). A publicidade também é uma característica importante, pois “à notícia, cabe
a função essencial de assinalar os acontecimentos, ou seja, tornar público um fato (implica
em algum gênero de ação), através de uma informação (onde se relata a ação em termos
compreensíveis).” (SODRÉ; FERRARI, 1986, p. 17).
O acontecimento é o que rompe com o cotidiano (QUERÉ, 2012) e necessita do discurso
para torná-lo legítimo e inteligível para o mundo (CHARADEAU, 2006). Para selecionar
em uma gama quase infinita o fato com características de acontecimento que melhor
representa o simbólico e sirva de referência em determinado contexto social, o processo de
construção jornalístico perpassa pela seleção do que é “noticiável”. Os critérios de
noticiabilidade são os mais variados possíveis e envolvem o contexto social, os poderes
constituídos, as metodologias próprias da profissão, entre outros.
Charaudeau (2010), por seu turno, revela que a notícia é construída em função das relações
de tempo, espaço e hierarquia. Ao destrinchar as três relações apresentadas por Charaudeau
percebe-se que: a) A urgência demostra as reduções na escala de tempo, nomeada por
Wolton (1995) como tirania do acontecimento. O espaço público midiatizado, segundo
Wolton (1995), representa um espaço de informação banalizada, na medida em que perde o
aprofundamento devido à necessidade de rapidez de veiculação da notícia; b) A
proximidade, por sua vez, revela um interesse particular sobre a notícia, seja uma
proximidade espacial, seja uma proximidade do imaginário; c) Já a hierarquia impõe
determinada seleção e reconfiguração do acontecimento, que construído ou não pelos
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media, é da ordem do inesperado, “[...] é o que vem de fora, o que surge, o que acontece, o
que se produz, o excepcional, que se desconecta da duração” (QUÉRÉ, 2012, p. 21).
Esclarecer esses apontamentos auxilia em como vislumbrar o modus operandi dos
processos comunicacionais. O conceito e as definições trazidas por Erving Goffman (2012)
também contribuem para o entendimento do papel da produção, da recepção e da
significação da informação. O sociólogo afirma que a experiência pessoal é baseada no
enquadramento (frames) do cotidiano, de acordo com a realidade dos indivíduos. “Pensar o
acontecimento como práxis exige ir além das formas para entrever as mediações que
religam a palavra à ação e constituem as chaves do processo de liberação” (BARBERO,
2014, p. 20). Antunes (2009) relata que os frames estão localizados nos diversos campos
sociais aos quais a notícia se insere e é produzida: nas relações estabelecidas pelos
produtores da notícia, dentro dos media, nos receptores etc. O jornalista, como ator social,
age na construção dessa realidade e, consequentemente, na produção de sentido e na
significação apreendida pela audiência.
3. Análise
A educação é considerada, a grosso modo, um dos temas de destaque nas publicações
jornalísticas e os portais noticiosos na internet, por exemplo, mantêm seções dedicadas ao
tema. Direito garantido constitucionalmente no Brasil4, promotora da organização e do
protagonismo, a educação já se relaciona em várias frentes com a comunicação, seja na
prática da educomunicação5, no uso dos meios de comunicação como ferramentas
educacionais ou como pauta das notícias divulgadas. Entender o modo como essa interseção
se dá, contribui para o entendimento dos paradigmas da comunicação e da informação,
considerando a dinâmica da prática jornalística e da educação como agente desse processo.
4 Constituição da República Federativa do Brasil, Capítulo II – Dos Direitos Sociais, Artigo 6°: São
direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência
social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.
5 Práticas educativas interligadas ao estudo dos sistemas de comunicação.
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O site UOL Educação6, que integra o portal de notícias UOL7, publicou um álbum contendo
69 fotos, em que cada imagem redireciona para uma matéria, produzidas entre 2010 e 2015,
enfocando casos considerados pelos jornalistas/editores de notícias como “de sucesso”.
Grande parte deles trata da ascensão de representantes sem atuação política ou com
visibilidade nos media limitada a assuntos negativos, seja por gênero, etnia, classe social,
idade, local de procedência etc: transexuais, negros, pobres, nordestinos, idosos. Essa
“minoria” midiatizada é composta de grupos vulneráveis diante da legitimidade
institucional e diante das políticas públicas.
O site optou por disponibilizar as informações referentes aos casos em um álbum de fotos.
O uso da imagem e a decisão em disponibilizar este tipo de matéria por meio do acesso ao
álbum de fotos demonstra uma intencionalidade maior em atrair e comover o público.
Segundo Bressane (2014), “é a partir da noção de escolha que as atitudes dos
interlocutores e a carga expressiva presentes numa manifestação discursiva são
compreendidas”.
Principalmente na internet, a grande concorrência entre os diversos acontecimentos, e os
vários recursos e suportes proporcionados pelo meio, exige dos produtores da notícia uma
análise das ferramentas que possam aproximar esse espectador e alimentar a produção de
sentido que se deseja. É a oportunidade de reforçar os estereótipos e de chamar a atenção
para as matérias. O exótico está exposto sem exigir grande esforço do espectador para
acessá-lo e é essa uma das características que representa o jornalismo das imagens, tão
presente no cotidiano hipermidiático.
Na fotografia 05/69 “19.mar.2012 - Cadeirante faz 28 cursos a distância e acumula dois
empregos” (FIG. 01) parece intencional do recurso imagético na internet para atrair a
atenção pelo exotismo. O cadeirante é mostrado em estado de êxtase em meio a dezenas de
imagens religiosas, com o topo da cabeça iluminado por dois fachos de luz (teria ele
conseguido o feito graças à iluminação divina?), num ambiente simples em que,
provavelmente, o personagem passa grande parte da sua vida quando está fora do trabalho.
Ao mesmo tempo em que demonstra o “caso de sucesso”, a fotografia conduz o olhar
6 http://educacao.uol.com.br/
7 http://www.uol.com.br/
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também para uma condição um pouco sombria de solidão e de religiosidade. A sacralidade
da foto é reforçada pela presença desses elementos que sacralizam também o cadeirante. A
imagem sugere o ambiente de religiosidade e a fé como elementos centrais para alavancá-lo
a integrar um dos casos de sucesso apresentados pelo álbum de fotos.
Há uma forte carga de subjetividade embutida também no texto, que já tem início com o
relato do quanto foi “penosa” a vida do personagem quando jovem, principalmente devido
às seqüelas da paralisia cerebral que o acometeu. Em seguida, o texto destaca as estratégias
usadas pelo personagem para se profissionalizar e o motivo que o levou a fazer tantos
cursos em diversas áreas.
A partir do intertítulo da matéria “EAD e inclusão social”, o texto busca apresentar a
modalidade de ensino como propulsora da inclusão social. Para isso, utiliza-se de dados do
Ministério da Educação apresentados afirmam que as graduações à distância em faculdades
particulares têm mais que o dobro do número de alunos atendidos por programas sociais
que oferecem bolsas integrais e parciais e financiamento público. Metade do texto e um dos
dois boxes publicados foram utilizados para destacar a EAD.
Para além do que é apresentado no texto e na foto, é preciso entender o fato relatado como
um problema social mais amplo. A notícia deixou de retratar questões importantes como a
exclusão social ainda imposta a determinadas minorias; o efetivo reconhecimento de
diplomas conquistados por meio da educação à distância no mercado de trabalho; se o
grande número de cursos contribuiu de forma efetiva para a elevação dos salários
(quantidade versus qualidade); se a participação nos cursos contribuiu para uma efetiva
inserção social; se a diversidade dos cursos, que vão de “Chaveiro” a “Jornalismo”,
passando por “Como usar um osciloscópio”, não generalizaria demais a formação, o que
poderia ser visto como falta de foco profissional e ser desvalorizado pelos empregadores
etc.
Esse artigo deve ser visto como um complemento dos estudos da temática nele contida,
principalmente no que se refere aos frames jornalísticos e à construção de sentido na
internet. O jornalismo, como toda forma de comunicação, traz em seu cerne algum tipo de
enquadramento e de direcionamento para uma produção de sentido. Em se tratando do
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ambiente virtual, o uso de uma arquitetura estratégica, baseada no hipertexto, fomentam a
interação é ainda mais possível levar o sujeito ao sentido pretendido.
Para se conhecer o nível de produção de sentido da audiência e a interferência do
enquadramento na produção do conteúdo da notícia, seria necessária uma pesquisa de
recepção aprofundada. Fatalmente um estudo desse tipo apresentará resultados baseados
também no contexto social e cultural do público, isso porque a recepção é um processo e
não um momento único nas interações comunicativas.
4. Bibliografia
AGAMBEN, Giorgio. O que é um dispositivo? Revista Outra Travessia. Florianópolis,
n.5, 2005. p.9-16.
ANTUNES, Elton. Enquadramento: considerações em torno de perspectivas temporais para
a notícia. Galáxia, São Paulo, n. 18, dez. 2009. p. 85-89.
CHARAUDEAU, Patrick. Discurso das Mídias. São Paulo: Contexto, 2006.
CHARAUDEAU, Patrick. Uma teoria dos sujeitos de linguagem. In: MARI, H. et alii.
Análise do discurso: fundamentos e práticas. Belo Horizonte: Núcleo de Análise do
Discurso-FALE/UFMG, 2001. p. 23-38
DEBORD, Guy. A sociedade do espetáculo. Rio de Janeiro: Contraponto. 2006.
GOFFMAN, Erving. Os quadros da experiência social: uma perspectiva de análise.
Petrópolis: Vozes, 2012.
KOCH, Ingedore G. Villaça. Hipertexto e construção do sentido. São Paulo: Alfa, 2007.
p. 23-38.
NOJOSA, Nobre Urbano. Da rigidez do texto à fluidez do hipertexto. IN: FERRARI,
Pollyana (Org.). Hipertexto, hipermídia: as novas ferramentas da comunicação digital.
São Paulo: Contexto, 2014. p. 69-77.
NOVAES, ADAUTO. A imagem e o espetáculo. IN: Muito além do espetáculo.
NOVAES, Adauto. São Paulo: SENAC, 2005. p. 08-15.
PAIVA, Raquel; BARBALHO, Alexandre (orgs) Comunicação e cultura das minorias.
São Paulo: Paulus, 2005.
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QUERÉ, Louis. A dupla vida do acontecimento: por um realismo pragmatista. In:
FRANÇA, Vera Regina Veiga; OLIVEIRA, Luciana. Acontecimento: reverberações. Belo
Horizonte: Autêntica, 2012. p. 21-38.
RORIGUES, José Carlos. Tabu do Corpo. Rio de Janeiro: Achiamé, 1979.
SODRÉ, Muniz; FERRARI, Maria Helena. Técnicas de Reportagem: notas sobre a
narrativa jornalística. São Paulo: Summus, 1986.
WOLFF, Francis. Por trás do espetáculo: o poder das imagens. IN: Muito além do
espetáculo. NOVAES, Adauto. São Paulo: SENAC, 2005. p. 16-45.
ANEXO 01
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